Language of document : ECLI:EU:C:2001:251

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

PHILIPPE LÉGER

apresentadas em 8 de Maio de 2001 (1)

Processo C-268/99

Aldona Malgorzata Jany e o.

contra

Staatssecretaris van Justitie

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo

Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage (Países Baixos)]

«Relações externas - Acordos de associação CE/Polónia e CE/República Checa - Liberdade de estabelecimento - Conceito de actividade económica - Inclusão ou não da actividade de prostituição - Possibilidade de os Estados-Membros interessados preverem condições mínimas para o reconhecimento de uma actividade económica independente»

1.
    Os acordos de associação, em razão da posição intermédia que ocupam no seio do direito comunitário (2), prestam-se a comparações com os princípios resultantes do Tratado.

2.
    Quer pertençam à categoria dos acordos concluídos numa perspectiva de cooperação para o desenvolvimento ou à dos acordos ditos de «pré-adesão» (3), a sua interpretação pressupõe muitas vezes o exame atento dos elementos que os distinguem dos princípios tradicionais do direito comunitário. Tanto mais que um determinado número de entre eles, adaptados para terem em conta finalidades específicas dos acordos, ocupam apesar de tudo um lugar preponderante no seio do mesmo.

3.
    A liberdade de circulação das pessoas faz parte, entre esses princípios, daqueles que mais vezes são abordados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. A livre circulação de trabalhadores, em especial, deu origem a um grande número de acórdãos, proferidos em aplicação do Acordo que cria uma associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia (4).

4.
    O presente processo situa-se na esteira destes precedentes pelo seu objecto, ou seja, a livre circulação de pessoas e o direito de entrada e de permanência que lhe está associado. No entanto, distingue-se dos mesmos por outros aspectos.

5.
    As disposições em causa dos acordos europeus também não dizem respeito à livre circulação de trabalhadores, mas sim à liberdade de estabelecimento. Os nacionais de países terceiros que a invocam pretendem estabelecer-se no território de um Estado-Membro para exercerem uma actividade profissional de modo independente. Ora, apesar de uma terminologia idêntica, o regime jurídico da liberdade de estabelecimento em causa no processo principal não é propriamente falando o que o Tratado institui para os nacionais da Comunidade.

6.
    Uma outra especificidade do processo principal resulta do facto de esta actividade ser a prostituição. Tendo em conta a incerteza que rodeia o seu modo de exercício, as preocupações que a mesma suscita do ponto de vista do respeito da dignidade da pessoa humana bem como as suas implicações em termos deordem pública, a prostituição surge, sob muitos aspectos, como uma actividade à qual é difícil, à partida, atribuir um regime jurídico determinado.

I - Matéria de facto e tramitação do processo principal

7.
    O litígio no processo principal opõe duas nacionais polacas, A. M. Jany e K. A. Szepietowska, e quatro nacionais checas, E. Padevetova, R. Zacalova, Z. Hrubcinova e S. Überlackerova (5), ao Staatssecretaris van Justitie (6). Estas nacionais de países terceiros estabeleceram a sua residência nos Países Baixos em diferentes datas, compreendidas entre Maio de 1993 e Outubro de 1996, com fundamento na Vreemdelingenwet e trabalham todas em Amesterdão (Países Baixos) como prostitutas.

8.
    Apresentaram ao chefe da Polícia de Amsterdam-Amstelland pedidos de autorização de residência a fim de trabalharem como prostitutas independentes (7). Tais pedidos foram indeferidos pelo Immigratie- en Naturalisatiedienst do Ministério da Justiça (8). As recorrentes no processo principal apresentaram então, junto da mesma entidade, reclamações de tais decisões, reclamações estas que foram igualmente julgadas improcedentes por decisões de 6 de Fevereiro de 1997, com fundamento em que a prostituição é uma actividade proibida ou pelo menos não é uma forma socialmente aceite de trabalho e não pode ser considerada nem um trabalho regular nem uma profissão liberal.

9.
    Por acórdãos de 1 de Julho de 1997, o Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage (Países Baixos) deu provimento aos recursos interpostos contra as decisões de indeferimento de 6 de Fevereiro de 1997 das autoridades neerlandesas e pronunciou a sua anulação por falta de fundamentação.

10.
    Por decisões de 12 e 23 de Junho bem como de 3 e 9 de Julho de 1998, o IND, pronunciando-se de novo sobre as reclamações das recorrentes no processo principal, declarou-as todas improcedentes.

11.
    Os recursos interpostos no órgão jurisdicional de reenvio têm por objecto a anulação destas novas decisões das autoridades neerlandesas.

12.
    As recorrentes no processo principal afirmam extrair directamente das disposições do artigo 44.° do acordo europeu, de 16 de Dezembro de 1991, que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República da Polónia, por outro (9), e do artigo 45.° do Acordo europeu, de 4 de Outubro de 1993, que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República Checa, por outro (10), um direito de entrada nos Países Baixos na qualidade de prostitutas independentes, nomeadamente um direito a um tratamento que não seja menos favorável do que o reservado pelo Reino dos Países Baixos aos seus próprios nacionais.

13.
    Em sua opinião, o conceito de «actividades económicas não assalariadas» constante dos acordos de associação tem o mesmo significado que o de «actividades não assalariadas», na acepção do artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 43.°, segundo parágrafo, CE), que delimita o âmbito de aplicação da liberdade de estabelecimento.

14.
    Além disso, as recorrentes no processo principal consideram que demonstraram que trabalham realmente como independentes e que satisfazem todas as obrigações legais correspondentes. Alegam que a sua qualidade de trabalhadoras independentes não pode ser posta em causa pelo facto de a sua actividade exigir poucos investimentos, sendo preponderante o factor trabalho. Em sua opinião, é sem razão que o Staatssecretaris van Justitie põe a tónica na exigência de constituição e de gestão de uma empresa.

15.
    No órgão jurisdicional de reenvio, o Staatssecretaris van Justitie alegou que a prostituição não é uma actividade económica que caia no âmbito de aplicação dos acordos de associação. A prostituição não foi expressamente excluída destes últimos, porque o facto é que já se encontra legalmente proibida no território da maior parte dos Estados contratantes.

16.
    Segundo o Staatssecretaris van Justitie, a admissão nos Países Baixos de prostitutas dos países associados ao abrigo do estabelecimento comportaria riscos de fraude, podendo ser simulada a existência de uma empresa independente ou a participação numa sociedade apenas a fim de obter um direito de permanência a coberto do acordo de associação. Nomeadamente, seria impossível investigar se as recorrentes no processo principal trabalham realmente de modo independente e se vieram de sua livre vontade para os Países Baixos. Também não é possível saber se elas podem dispor livremente dos seus próprios rendimentos ou se são contratadas por um explorador a quem devem pagar uma parte destes rendimentos.

17.
    O Staatssecretaris van Justitie considera que, mesmo admitindo que a prostituição constitui uma actividade económica, na acepção dos acordos de associação, verifica-se que, no caso sub judice, são invocados pelas recorrentes no processo principal direitos fundados nos acordos de associação sem que aquelas tenham a intenção de constituir e de gerir as suas próprias empresas. A este respeito, alega que as recorrentes no processo principal só residem nos Países Baixos durante um curto período do ano e «trazem principalmente o seu trabalho e não capital de risco».

II - Quadro jurídico

A - Regulamentação comunitária

O acordo CE-Polónia

18.
    Nos termos do seu artigo 121.°, o acordo CE-Polónia entrou em vigor em 1 de Fevereiro de 1994.

19.
    Segundo o preâmbulo desse acordo (11), as partes contratantes:

«[r]econhece[m] que a Comunidade e a Polónia desejam reforçar [os seus] laços [tradicionais] e estabelecer relações estreitas e duradouras, baseadas em interesses mútuos, que facilitem a participação da Polónia no processo da integração europeia, consolidando e alargando, assim, as relações estabelecidas anteriormente [...];

[...]

[têm consciência] das disparidades económicas e sociais existentes entre a Comunidade e a Polónia e reconhece[m], assim, que os objectivos da presente associação serão atingidos através das disposições pertinentes do presente acordo;

[...]

[têm consciência] de que o objectivo final da Polónia é o de se tornar membro da Comunidade e de que a presente associação, na opinião das partes, contribuirá para a realização deste objectivo.»

20.
    Segundo o seu artigo 1.°, n.° 2, o acordo de associação tem nomeadamente por objectivo promover a expansão do comércio e de relações económicas harmoniosas entre as partes, fomentando assim o desenvolvimento económicodinâmico e a prosperidade da Polónia, bem como estabelecer um enquadramento adequado para a integração gradual da Polónia na Comunidade.

21.
    As disposições pertinentes do acordo CE-Polónia constam do título IV «Circulação dos trabalhadores, direito de estabelecimento, prestação de serviços».

22.
    Nos termos do artigo 44.°, n.os 3 e 4, do acordo CE-Polónia, que faz parte do capítulo II intitulado «Direito de estabelecimento»:

«3.    A partir da data da entrada em vigor do presente acordo, os Estados-Membros concederão ao estabelecimento de sociedades e de nacionais da Polónia, na acepção do artigo 48.°, um tratamento não menos favorável do que o concedido às suas próprias sociedades e nacionais, e concederão à actividade das sociedades e dos nacionais da Polónia estabelecidos no seu território um tratamento não menos favorável do que o concedido às suas próprias sociedades e nacionais.

4.    Para efeitos do presente acordo, entende-se por:

a)    'Estabelecimento':

    i)    no que se refere aos nacionais, o direito de aceder a actividades económicas não assalariadas e de as exercer, bem como de criar e dirigir empresas, em especial sociedades que efectivamente controlem. O exercício de actividades não assalariadas e a constituição de empresas não incluem a procura e o exercício de actividades assalariadas no mercado de trabalho nem o direito de acesso ao mercado de trabalho de uma outra parte. O disposto no presente capítulo não é aplicável aos trabalhadores que não desempenhem exclusivamente actividades não assalariadas;

[...]

c)    'Actividades económicas': em especial as actividades de carácter industrial, comercial, artesanal, bem como as profissões liberais.»

23.
    O artigo 53.°, n.° 1, do acordo CE-Polónia, prevê que «[a]s disposições do presente capítulo são aplicáveis sem prejuízo das limitações justificadas por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública».

24.
    Nos termos do artigo 58.°, n.° 1, do acordo CE-Polónia, que consta do capítulo IV intitulado «Disposições gerais»:

«Para efeitos da aplicação do título IV do presente acordo, nenhuma das suas disposições obsta à aplicação, pelas partes, das respectivas legislações e regulamentações respeitantes à entrada e à residência, ao trabalho, às condiçõesde trabalho, ao estabelecimento de pessoas singulares e à prestação de serviços, desde que tal aplicação não anule ou comprometa as vantagens que qualquer das partes retira de uma disposição específica do presente acordo. Esta disposição não prejudica o disposto no artigo 53.°»

O acordo CE-República Checa

25.
    Nos termos do seu artigo 123.°, o acordo CE-República Checa entrou em vigor em 1 de Fevereiro de 1995.

26.
    As disposições seguintes do acordo CE-República Checa retomam, com ligeiras diferenças de redacção, o texto das disposições correspondentes do acordo CE-Polónia, só se alterando a numeração dos considerandos (com excepção do segundo) e dos artigos.

27.
    Segundo o preâmbulo desse acordo (12), as partes contratantes:

«[r]econhece[m] que a Comunidade e a República Checa desejam reforçar [os seus] laços [tradicionais] e estabelecer relações estreitas e duradouras, baseadas em interesses mútuos, que facilitem a participação da República Checa no processo da integração europeia, consolidando e alargando assim as relações estabelecidas anteriormente [...];

[...]

[têm consciência] das disparidades económicas e sociais existentes entre a Comunidade e a República Checa e reconhece[m], assim, que os objectivos da presente associação serão atingidos através das disposições pertinentes do presente acordo;

[...]

[têm consciência] de que o objectivo final da República Checa é aceder à Comunidade, e que a presente associação, na opinião das partes, ajudará a República Checa a realizar este objectivo».

28.
    Segundo o seu artigo 1.°, n.° 2, o acordo de associação tem nomeadamente por objectivo promover a expansão do comércio e de relações económicas harmoniosas entre as partes, fomentando assim o desenvolvimento económico dinâmico e a prosperidade da República Checa, bem como estabelecer um enquadramento adequado para a integração gradual da República Checa na Comunidade.

29.
    As disposições pertinentes do acordo CE-República Checa constam do título IV intitulado «Circulação dos trabalhadores, direito de estabelecimento, prestação de serviços».

30.
    Nos termos do artigo 45.° do acordo CE-República Checa, que faz parte do capítulo II intitulado «Direito de estabelecimento»:

«3.     A partir da data da entrada em vigor do presente acordo, os Estados-Membros concederão ao estabelecimento de sociedades e de nacionais da República Checa, um tratamento não menos favorável do que o concedido às suas próprias sociedades e nacionais, e concederão à actividade das sociedades e dos nacionais da República Checa estabelecidos no seu território um tratamento não menos favorável do que o concedido às suas próprias sociedades e nacionais.

4.    Para efeitos do presente acordo,

a)    Entende-se por 'estabelecimento':

    i)    no que se refere aos nacionais, o direito de aceder a actividades económicas não assalariadas e de as exercer, bem como de constituir e gerir empresas, em especial sociedades, que efectivamente controlem. O exercício de actividades não assalariadas e a constituição de empresas por nacionais não incluem a procura e o exercício de actividades assalariadas no mercado de trabalho nem o direito de acesso ao mercado de trabalho de uma parte.

        O disposto no presente capítulo não é aplicável aos trabalhadores que não desempenhem exclusivamente actividades não assalariadas;

[...]

c)    Entende-se por 'actividades económicas': em especial as actividades de carácter industrial, comercial, artesanal, bem como as profissões liberais».

31.
    O artigo 54.°, n.° 1, do acordo CE-República Checa prevê que «[a]s disposições do presente capítulo são aplicáveis sem prejuízo das limitações justificadas por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública».

32.
    Nos termos do artigo 59.°, n.° 1, do acordo CE-República Checa, que consta do capítulo IV intitulado «Disposições gerais»:

«Para efeitos da aplicação do título IV do presente acordo, nenhuma das suas disposições obsta à aplicação, pelas partes, das respectivas legislações e regulamentações respeitantes à entrada e à residência, ao trabalho, às condições de trabalho, ao estabelecimento de pessoas singulares e à prestação de serviços, desde que tal aplicação não anule ou comprometa as vantagens que qualquer daspartes retira de uma disposição específica do presente acordo. Esta disposição não prejudica o disposto no artigo 54.°»

B - Regulamentação neerlandesa

33.
    Conforme o disposto no artigo 11.°, n.° 5, da Vreemdelingenwet (13), a autorização de residência nos Países Baixos pode ser recusada a um estrangeiro por razões de interesse geral.

34.
    Resulta da decisão de reenvio que a interpretação desta disposição feita pelo Staatssecretaris van Justitie consta do capítulo B 12 da Vreemdelingencirculaire de 1994 (14). Em sua opinião, os estrangeiros só têm direito a autorização de residência se a sua presença no território nacional for susceptível de servir um interesse nacional essencial de natureza económica ou se razões humanitárias imperiosas ou obrigações resultantes de acordos internacionais impuserem a concessão de tal autorização (15).

35.
    Em aplicação da Vreemdelingencirculaire (16), os nacionais de um dos países terceiros com os quais as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros concluíram um acordo de associação, como a República da Polónia ou a República Checa, que pretendam estabelecer-se nos Países Baixos ao abrigo desses acordos, devem:

a)    preencher as condições geralmente aplicáveis ao acesso a uma actividade na qualidade de independente, bem como as condições especiais aplicáveis ao exercício da actividade em questão,

b)    dispor de recursos financeiros bastantes, e

c)    não constituir um perigo para a tranquilidade pública, a ordem pública ou a segurança nacional.

36.
    Nos termos da Vreemdelingencirculaire, um pedido de estabelecimento deve ser indeferido se a actividade encarada pelo requerente for geralmente exercida a título assalariado. O interessado pode apresentar documentos emanando tantoquanto possível de pessoas ou de instâncias independentes e descrevendo a função que pretende exercer, como por exemplo uma inscrição no registo da Câmara de Comércio ou junto de uma organização profissional, um certificado da Administração fiscal segundo o qual está sujeito ao imposto sobre o valor acrescentado, uma cópia do contrato de compra ou de locação dos imóveis utilizados para fins profissionais ou contas financeiras elaboradas por um contabilista ou por um gabinete de gestão. Em caso de suspeita de «construção fictícia», deve igualmente ser apresentado ao Ministério dos Assuntos Económicos um pedido de admissão na qualidade de independente, devendo aquela entidade verificar se o requerente tem intenção de exercer uma verdadeira actividade independente.

III - As questões prejudiciais

37.
    Considerando que o litígio no processo principal exige uma interpretação do direito comunitário, o Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage decidiu suspender a instância e colocar as cinco questões prejudiciais seguintes ao Tribunal de Justiça:

«1)    Podem cidadãos polacos e checos invocar directamente os acordos no sentido de que o direito previsto no artigo 44.° do acordo Polónia e no artigo 45.° do acordo República Checa, de acesso ao exercício de uma actividade económica não assalariada e de criarem e gerirem empresas implica o direito à admissão e estadia, independentemente da política seguida na matéria pelo Estado-Membro em causa?

2)    No caso de resposta afirmativa a este questão: um Estado-Membro pode deduzir do artigo 58.° do acordo Polónia e do artigo 59.° do acordo República Checa a faculdade de submeter o direito de acesso e de estadia a condições mais detalhadas, tais como as referidas na orientação política seguida nos Países Baixos, nomeadamente a de o estrangeiro poder dispor, em resultado do exercício da sua actividade, de meios suficientes de subsistência (o que significa, por força do disposto no capítulo A4/4.2.1 da circular de 1994, um rendimento líquido pelo menos igual ao mínimo vital no sentido da Algemene Bijstandswet - Lei geral da segurança social)?

3)    O artigo 44.° do acordo Polónia e o artigo 45.° do acordo República Checa não permitem incluir na noção de 'actividades económicas não assalariadas' a actividade de prostituição dado que esta não é abrangida pela descrição constante do corpo do n.° 4 e alínea c) dos artigo 44.° do acordo Polónia e 45.° do acordo República Checa, por razões de ordem moral, dado que (na maioria) é proibida nos Estados associados e porque dela podem resultar problemas dificilmente controláveis em matéria de liberdade de acção e de autonomia das prostitutas?

4.    O artigo 43.° (ex-artigo 52.° CEE) do Tratado CE e o artigo 44.° do acordo Polónia e o artigo 45.° do acordo República Checa permitem a distinção entre os conceitos, respectivamente, neles inseridos de 'actividade não assalariada' e 'actividades económicas não assalariadas' por forma que a actividade por conta própria de uma prostituta é abrangida pelo conceito do artigo 43.° (ex-artigo 52.° CEE) do Tratado CE mas não no constante dos artigos acima referidos dos acordos?

5.    No caso de a resposta à questão que antecede ser no sentido de que aquela distinção é admissível:

    a)    é compatível com o artigo 44.° do acordo Polónia e com o artigo 45.° do acordo República Checa e com a liberdade de estabelecimento por eles visada impor ao trabalhador por conta própria, a que se refere o n.° 3 desta disposição, exigências mínimas quanto ao início da actividade e restrições no sentido de que:

        -    deve exercer uma actividade qualificada;

        -    deve tratar-se de um plano empresarial;

        -    deve (também) ocupar-se da gestão da empresa e não (exclusivamente) com o exercício da actividade (produtiva);

        -    deve prosseguir a continuidade da empresa, nomeadamente com a implicação de que deve ter a sua sede principal no Estado-Membro interessado;

        -    devem verificar-se investimentos e a assunção de obrigações a longo prazo?

    b)    O artigo 44.° do acordo Polónia e o artigo 45.° do acordo República Checa não permitem considerar trabalhador por conta própria quem for dependente ou deva prestar contas a quem o haja recrutado ou lhe dê trabalho, verificando-se que entre o interessado e o terceiro não existe qualquer relação de trabalho a que possa opor-se a expressão 'não assalariada' constante do n.° 4 da referida disposição dos acordos?»

38.
    Analisando estas questões podem distinguir-se dois temas.

39.
    O primeiro diz respeito ao direito de entrada e de permanência dos nacionais de Estados terceiros no território de um Estado-Membro, direito susceptível de resultar da liberdade de estabelecimento prevista pelos acordos de associação que vinculam estes Estados.

40.
    O segundo respeita à questão de saber se a qualificação de «actividade económica não assalariada» pode ser atribuída à actividade de prostituição, justificando assim a aplicação das disposições dos acordos de associação relativas ao direito de estabelecimento. Se os artigos 44.° do acordo CE-Polónia e 45.° do acordo CE-República Checa forem de interpretar no sentido de que a prostituição é uma «actividade económica não assalariada» o princípio do tratamento nacional consagrado por essas disposições poderia, por esse motivo, ser aplicado no caso vertente.

41.
    Depois de examinar a questão do direito de entrada e de permanência, precisarei o alcance do conceito de «actividade económica não assalariada», antes de determinar se o mesmo se pode aplicar à prostituição.

IV - Quanto à existência de um direito de entrada e de permanência resultante da liberdade de estabelecimento (primeira e segunda questões prejudiciais)

42.
    Resulta das duas primeiras questões prejudiciais que o juiz a quo deseja ser esclarecido sobre o conteúdo dos artigos 44.° e 58.° do acordo CE-Polónia, bem como sobre o efeito directo do artigo 44.°, n.° 3, do referido acordo (17). Há portanto que examinar se esta última disposição é susceptível de fazer surgir directamente na esfera de um particular direitos que este pode invocar num órgão jurisdicional de um Estado-Membro. Em caso afirmativo, haverá que determinar se o direito de estabelecimento concedido aos nacionais polacos abrange um direito de entrada e de permanência.

A - Quanto ao efeito directo do artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação

43.
    Como foi recentemente recordado pelos advogados-gerais J. Mischo e S. Alber, a resposta à questão do efeito directo dos acordos de associação pode ser facilmente formulada, à luz da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (18).

44.
    Uma disposição de um acordo celebrado pela Comunidade com países terceiros deve ser considerada directamente aplicável sempre que, atendendo aos seus termos bem como ao objecto e à natureza do acordo, contém uma obrigaçãoclara e precisa que não está dependente, na sua execução ou nos seus efeitos, da intervenção de qualquer acto posterior (19).

45.
    O artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação impõe a cada Estado-Membro uma obrigação descrita em termos desprovidos de ambiguidade e cujos contornos se encontram perfeitamente delimitados. Do mesmo resulta claro que os Estados-Membros são obrigados a conceder às sociedades e aos nacionais polacos uma liberdade de estabelecimento e de exercício das suas actividades igual àquela de que beneficiam os seus próprios nacionais.

46.
    Ao princípio da não discriminação, aqui consubstanciado no artigo 44.°, n.° 3, foi desde há muito reconhecido efeito directo noutras disposições relativas à livre circulação de pessoas, quer se trate do Tratado quer de acordos de associação (20). A redacção deste artigo é igualmente explícita quanto ao conteúdo da regra enunciada. Não existe, além disso, qualquer condição que limite a sua aplicação.

47.
    No caso sub judice, como o Tribunal de Justiça já assinalou a propósito de outros acordos de associação, a regra da igualdade de tratamento impõe uma obrigação de resultado precisa e é, por essência, susceptível de ser invocada por um particular num órgão jurisdicional nacional para pedir a este último que afaste a aplicação das disposições discriminatórias de uma regulamentação de um Estado-Membro que faz depender o estabelecimento de um nacional polaco de uma condição que não é imposta aos seus nacionais, sem que seja exigida para este efeito a adopção de medidas de aplicação complementares (21).

48.
    O exame dos objectivos e da natureza do acordo de associação vem confirmar esta análise. Nos termos dos seus segundo e décimo quinto considerandos, bem como do seu artigo 1.°, n.° 2, o acordo visa criar uma associação destinada a promover a expansão do comércio e de relações económicas harmoniosas entre as partes contratantes, a fim de fomentar o desenvolvimentodinâmico e a prosperidade da República da Polónia, para facilitar a sua adesão à Comunidade.

49.
    Tal finalidade reconhecida a um acordo só pode ser plenamente alcançada se os actores da vida económica estiverem eles próprios em situação de fazer com que sejam respeitados os princípios enunciados.

50.
    Acrescente-se que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a circunstância de o acordo de associação ter em vista essencialmente favorecer o desenvolvimento económico da Polónia e comportar, portanto, um desequilíbrio nas obrigações assumidas pela Comunidade para com o país terceiro em causa, não é susceptível de impedir o reconhecimento pela Comunidade do efeito directo de algumas das suas disposições (22).

51.
    Em consequência, o artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação deve ser visto como tendo efeito directo, de modo que pode ser invocado pelos particulares nos órgãos jurisdicionais nacionais.

52.
    A possibilidade de invocar esta disposição não prejudica, naturalmente, a interpretação do seu conteúdo. Por conseguinte, há que determinar os efeitos que podem resultar, quanto ao direito de entrada e de permanência, da liberdade de estabelecimento, conforme a mesma resulta do regime do artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação.

B - Quanto à existência de um direito incondicional de entrada e de permanência

53.
    O juiz de reenvio questiona-se sobre a questão de saber se o regime relativo ao estabelecimento previsto pelo acordo de associação abrange a obrigação de o Estado-Membro de acolhimento atribuir, em toda e qualquer situação, um direito de entrada e de permanência em benefício dos nacionais polacos.

54.
    Em minha opinião, há que afastar a ideia segundo a qual o direito ao tratamento nacional em matéria de estabelecimento, no domínio do acordo de associação, inclui um direito incondicional de entrada e de permanência.

55.
    É um facto que não é possível qualquer liberdade de estabelecimento se o dispositivo legal instituído pelo Estado de acolhimento colocar face aos nacionais dos países terceiros uma barreira intransponível à entrada e à permanência no seu território.

56.
    É esse o sentido da jurisprudência desenvolvida quando da interpretação do Tratado ou de outros acordos de associação. O direito ao tratamento nacional em matéria de estabelecimento pressupõe que seja concedido aos nacionais de paísesterceiros que pretendam aceder a actividades de carácter industrial, comercial, artesanal ou a profissões liberais, e exercê-las na qualidade de independentes, um direito de entrada e de permanência no território do Estado de acolhimento (23).

57.
    Há no entanto que precisar por que razões podem ser fixados determinados limites a este direito. Para o efeito, cabe distinguir o regime jurídico da liberdade de estabelecimento instituído pelo acordo de associação do previsto pelo Tratado.

58.
    As similitudes entre o artigo 52.° do Tratado e o artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação poderiam levar a que se transpusesse para este último a jurisprudência elaborada em aplicação do artigo 52.° do Tratado.

59.
    Ora, o alargamento da interpretação de uma disposição do Tratado a uma disposição, redigida em termos comparáveis, similares ou mesmo idênticos, constante de um acordo concluído pela Comunidade com um país terceiro, depende nomeadamente da finalidade prosseguida por cada uma das disposições no âmbito que lhe é próprio. A este respeito, a comparação dos objectivos e do contexto do acordo, por um lado, com os do Tratado, por outro, reveste uma importância considerável (24).

60.
    O Tratado visa a criação de um mercado interno caracterizado pela abolição, entre os Estados-Membros, dos obstáculos à livre circulação de mercadorias, de pessoas, de serviços e de capitais (25). Por seu turno, o acordo de associação tem por objectivo criar um enquadramento adequado para a integração gradual da Polónia na Comunidade (26).

61.
    Deste modo, se a perspectiva de uma adesão da Polónia à União Europeia deixa prever, a prazo, a sua sujeição sem reserva a todas as regras da Comunidade, e nomeadamente às da liberdade de estabelecimento, o ritmo necessariamentegradual do processo de adesão confere ao regime de estabelecimento previsto pelo acordo de associação um conteúdo menos radical que o do regime comunitário correspondente.

62.
    Existem outros acordos de associação destinados a permitir a adesão de Estados terceiros à Comunidade, como o acordo CEE-Turquia, que não contêm qualquer regime conferindo aos nacionais do Estado terceiro um direito de estabelecimento no território dos Estados-Membros. Ao contrário do acordo CEE-Turquia, o acordo de associação não autoriza a livre circulação de trabalhadores.

63.
    Estas diferenças de conteúdo associadas a finalidades comparáveis reforçam a ideia de regimes de livre circulação provisoriamente inacabados.

64.
    Mas o principal motivo para não raciocinar por analogia é-nos dado pela própria redacção do acordo de associação.

65.
    Ao especificar que nenhuma disposição do título IV do acordo, de que faz parte o artigo 44.°, obsta à aplicação, pelas partes, das respectivas legislações e regulamentações respeitantes à entrada, à residência e ao estabelecimento de pessoas singulares, o artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação torna mais restritivo o regime do direito de estabelecimento, como o mesmo é organizado.

66.
    Enquanto todo e qualquer cidadão da União retira directamente do Tratado o direito de circular e de permanecer livremente no território dos Estados-Membros e pode, por este motivo, aí estabelecer-se livremente (27), um nacional polaco vê esta mesma liberdade limitada pelas legislações nacionais dos Estados-Membros em matéria de entrada e de permanência de estrangeiros. O direito de entrada e de permanência conferido aos nacionais polacos não constitui portanto de forma alguma uma prerrogativa absoluta.

67.
    Pode ser limitado pelo Estado-Membro de acolhimento, desde que, segundo o artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação, não se anulem ou comprometam as vantagens que qualquer das partes retira de uma disposição específica do acordo de associação.

68.
    O artigo 44.°, n.° 3, lido à luz do artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação, deve portanto ser interpretado no sentido de que o regime de estabelecimento por ele instituído não comporta a obrigação de o Estado-Membro de acolhimento atribuir um direito de entrada no seu território e de permanência no mesmo aos nacionais polacos, estando o exercício desse direito subordinado ao respeito doslimites fixados pelo Estado-Membro de acolhimento quanto à entrada, à permanência e ao estabelecimento dos nacionais polacos.

C - Quanto à condição de recursos bastantes imposta em matéria de direito de entrada e de permanência

69.
    A segunda questão prejudicial diz respeito às condições a que o Reino dos Países Baixos sujeita a entrada e a permanência dos estrangeiros no seu território, entre as quais figura a exigência de que o nacional estrangeiro disponha de meios de subsistência bastantes (28).

70.
    Entre as outras condições relacionadas com a entrada e a permanência, o juiz de reenvio menciona o princípio previsto pela lei neerlandesa segundo o qual o estrangeiro não deve constituir um perigo para a ordem pública, a segurança pública ou a saúde pública. O órgão jurisdicional neerlandês esclarece no entanto que, tendo em conta o artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação, esta disposição não se encontra compreendida na questão (29).

71.
    Limitar-me-ei, portanto, ao exame da condição de recursos. Cabe apenas referir que as outras questões prejudiciais constituirão ocasião para me debruçar sobre as condições fixadas pela legislação nacional específicas ao direito de estabelecimento, e já não à permanência de estrangeiros.

72.
    Com a sua segunda questão prejudicial, o juiz neerlandês pretende portanto saber, em suma, se os artigos 44.°, n.° 3, e 58.°, n.° 1, do acordo de associação se opõem a uma legislação nacional que subordina o direito de entrada e de permanência de um nacional polaco que pretende ter acesso a uma actividade económica e exercê-la na qualidade de independente no território do Estado-Membro de acolhimento à posse de meios de subsistência bastantes no exercício dessa actividade (30).

73.
    O artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação reserva expressamente a competência dos Estados-Membros no domínio da entrada e da permanência dos nacionais de cada parte contratante, de modo que é manifesto que a legislação nacional constitui a norma na matéria.

74.
    Todavia, o exercício pelos Estados-Membros da sua competência no domínio da entrada e da permanência de estrangeiros não pode ser exercido demodo discricionário. Já foi dito que o artigo 58.°, n.° 1, submete tal exercício à condição de o mesmo «não anul[ar] ou compromet[er] as vantagens que qualquer uma das partes retira de uma disposição específica do presente acordo».

75.
    Em consequência, há que examinar se a condição relacionada com o nível dos recursos prevista pela legislação nacional é susceptível de pôr em causa as vantagens que a República da Polónia retira do disposto no artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação (31).

76.
    Há, a fim de garantir que esta medida não anula nem compromete as vantagens que a República da Polónia retira do direito de estabelecimento, que verificar se a medida que limita o direito de entrada e de permanência, em aplicação do artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação, não é susceptível de afectar a essência deste direito.

77.
    A condição relacionada com o nível dos recursos constitui sem dúvida alguma uma restrição tanto à permanência como ao estabelecimento, na medida em que o não respeito da condição proíbe a um nacional polaco entrar no território do Estado-Membro a fim de aí exercer seja que actividade for, nomeadamente independente.

78.
    De igual modo, para ser permitida, essa medida deve prosseguir um objectivo legítimo. Deve, além disso, poder garantir a realização deste objectivo sem ultrapassar o necessário para o alcançar.

79.
    A este respeito, o facto de o Estado de acolhimento velar por que o nacional de um país terceiro que manifeste a sua intenção de se estabelecer no seuterritório disponha de meios de subsistência mínimos não me parece susceptível de afectar de modo ilegítimo o direito de estabelecimento, dado que esta medida se destina a garantir que a intenção do nacional polaco é estabelecer-se sem pretender exercer um trabalho assalariado no território do Estado-Membro de acolhimento. Sabe-se com efeito que, por força do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, a qualidade de independente não confere o direito de exercer um trabalho assalariado no mercado de trabalho do Estado de acolhimento.

80.
    A exigência de recursos suficientes constitui assim um meio de verificação da intenção manifestada pelo nacional polaco de exercer efectivamente uma actividade na qualidade de independente bem como, depois da sua instalação no território neerlandês, da realidade desta actividade.

Se o interessado não dispuser de suficientes meios de subsistência no momento em que entra no território do Estado-Membro de acolhimento, o risco é, com efeito, que seja tentado a recorrer a um complemento de rendimentos que obteria com um trabalho assalariado ou com fundos públicos. Esse risco existe também, e é ainda maior, se a ausência do mínimo vital exigido pela legislação nacional se verificar depois da entrada do interessado no território nacional, o que demonstraria o insucesso da sua empresa e anunciaria uma procura provável de recursos alternativos (32).

81.
    Há que acrescentar que a disposição em causa dificilmente pode ser considerada excessiva atendendo ao objectivo prosseguido, na medida em que consiste numa simples verificação objectiva, cuja realização é susceptível de fornecer indícios fiáveis sobre a realidade da actividade empreendida.

82.
    Por conseguinte, penso que os artigos 44.°, n.° 3, e 58.°, n.° 1, do acordo de associação não se opõem a uma legislação nacional que subordina o direito de entrada e de permanência de um nacional polaco que pretenda ter acesso a uma actividade económica e exercê-la na qualidade de independente no território do Estado-Membro de acolhimento, à condição de o mesmo dispor de meios de subsistência bastantes.

83.
    O órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre o conceito de «actividades económicas não assalariadas», conforme consta do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação.

V - Quanto ao alcance do conceito de «actividade económica não assalariada» [quarta questão prejudicial e quinta questão prejudicial, alínea a)]

84.
    As referidas questões têm origem na argumentação do Governo neerlandês, que afirma que o conceito de «actividade económica não assalariada» utilizado no acordo de associação deve ser distinguido do conceito de «actividade não assalariada» previsto no artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado.

85.
    O Governo neerlandês sustenta, em suma, que a liberdade de estabelecimento instituída pelo acordo de associação é reservada aos «verdadeiros independentes», expressão que designa os nacionais com uma qualificação profissional que pretendam criar uma empresa no Estado-Membro de acolhimento. O acordo de associação não diz assim respeito a quem pretende exercer um trabalho não qualificado, que não tenha concebido qualquer plano de empresa nem realizado o menor investimento (33).

86.
    O acordo de associação constitui um primeiro passo para a integração dos países associados na Comunidade. A interpretação proposta pelo Governo neerlandês tem assim em conta as dificuldades ligadas às disparidades socioeconómicas existentes entre estas entidades.

87.
    Por conseguinte, com a quarta questão, o juiz de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre a necessidade de distinguir os conceitos de «actividade não assalariada» e de «actividade económica não assalariada». Segundo a lógica seguida pelo Governo neerlandês, certas actividades não qualificadas, entre as quais a prostituição, caem no âmbito de aplicação do artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado, mas não necessariamente no do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação. É o sentido que se deve atribuir à quinta questão prejudicial, sub a), que respeita às condições mínimas previstas pela legislação nacional, qualificadas de restritivas pelo juiz neerlandês (34). O âmbito de aplicação do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação seria, em suma, mais limitado que o do artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado.

88.
    Com estas questões, o juiz de reenvio pergunta se o conceito de «actividade económica não assalariada», na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, deve ser interpretado no sentido de que só se aplica às actividades económicas independentes que exijam uma qualificação profissional e exercidas por um operador económico residente no território do Estado-Membro de acolhimento, segundo certas modalidades precisas, como a elaboração de um plano de empresa, a realização de investimentos e a assunção de compromissos a longo prazo, consagrando-se simultaneamente à gestão e à produção de mercadorias ou de serviços.

89.
    Há que interpretar essa disposição a partir da sua redacção e da finalidade prosseguida pelo acto em que a mesma se insere (35).

90.
    O artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação refere-se ao «direito de aceder a actividades económicas não assalariadas e de as exercer, bem como de criar e dirigir empresas». Não faz, assim, qualquer distinção em favor da ideia de uma limitação da liberdade de estabelecimento a uma categoria precisa de actividade económica independente (36).

91.
    Pela sua redacção, qualquer actividade cai no âmbito de aplicação da liberdade de estabelecimento, desde que tenha natureza económica e que seja exercida de maneira independente (37). Mesmo quando divergem do artigo 52.° do Tratado na maneira como descrevem as actividades cobertas pela liberdade de estabelecimento, os termos do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação não se prestam a uma leitura restritiva do âmbito de aplicação do mesmo quanto à natureza destas actividades. Porque, tal como o conceito de «actividade económica independente», o conceito de «actividade não assalariada» não sujeita de forma alguma a actividade em causa a qualquer uma das condições anteriormente evocadas. O benefício desta liberdade não aparece assim vinculado ao respeito de uma condição de qualificação, de residência ou de modo de exercício da profissão.

92.
    Por outro lado, como já observei várias vezes, uma identidade, ou até mesmo uma similitude ou uma proximidade dos termos utilizados, não garante uma identidade de regime jurídico se as finalidades respectivas dos actos jurídicos em causa não forem as mesmas (38). Assim, mesmo pressupondo que as mesmas expressões tivessem sido utilizadas no Tratado e no acordo de associação, nãoteríamos no entanto o direito de retirar desse facto consequências precisas quanto ao regime jurídico aplicável (39).

93.
    Por conseguinte, em conformidade com esta última jurisprudência, como com aquela que exige que em caso de disparidade entre as diversas versões linguísticas de um texto comunitário, a disposição em causa seja interpretada em função da economia geral, da finalidade e da regulamentação de que constitui um elemento (40), há que examinar estes últimos aspectos do texto em causa.

94.
    É um facto que se pode extrair do objectivo do acordo de associação destinado a criar as condições da adesão futura de um país terceiro à Comunidade a ideia de que o regime de estabelecimento por ele instituído não é tão perfeito como no Tratado.

95.
    A situação do país terceiro não seria diferente da dos Estados-Membros da Comunidade se os princípios comunitários lhe fossem totalmente aplicáveis.

96.
    Portanto, a priori não é impossível que a sua situação seja submetida a regras diferentes, ainda que correspondendo ao mesmo princípio de liberdade de estabelecimento. A tal acresce a existência de disparidades económicas e sociais que separam a Comunidade do país terceiro e que o acordo de associação pretende reduzir através de «disposições pertinentes» (41).

97.
    Tendo em conta estes objectivos, a hipótese de uma diferença entre o Tratado e o acordo de associação afectando o regime jurídico da liberdade de estabelecimento não é em si inverosímil.

98.
    Todavia, na ausência de qualquer indício resultante da letra do acordo de associação, tal só acontece se a intenção das partes contratantes for efectivamente instituir um direito de estabelecimento intermédio, o que de forma alguma se encontra demonstrado.

99.
    Tal como as disposições do acordo de associação relativas ao direito de estabelecimento, também o preâmbulo do mesmo não revela qualquer intenção das partes de definirem restritivamente o âmbito de aplicação deste direito.

100.
    Os objectivos prosseguidos pelos Estados signatários são descritos em termos gerais e não comportam qualquer referência precisa a um direito de estabelecimento cuja extensão seria limitada. Parece-me arbitrário deduzir do mero facto de que o acordo de associação visa reduzir as disparidades e reforçar os vínculos entre os Estados contratantes com vista à integração de um deles no seio da Comunidade, a ideia de que a um dos direitos enunciados neste acordo, entre outros (42), deva ser atribuído um significado restrito. Por maioria de razão, não seria justificado decidir, sem indício sério retirado do acordo de associação, que a leitura restritiva que deve ser feita do princípio em causa diz especificamente respeito à natureza, ao modo de exercício da actividade ou à condição de residência do operador.

101.
    A posição do Governo neerlandês não encontra, portanto, qualquer fundamento no acordo de associação.

102.
    O argumento segundo o qual os Estados-Membros se devem dotar dos meios para evitar que os nacionais de países terceiros invoquem o direito de estabelecimento para procurarem um emprego assalariado, em violação do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, no território da Comunidade, não deixa de ser relevante. A preocupação manifestada pelas autoridades neerlandesas em detectar as «construções fictícias» procedendo a uma análise concreta das relações efectivas constituídas entre os operadores económicos, e não limitando-seà designação jurídica conferida a estas relações pelos interessados, satisfaz seguramente as exigências de uma aplicação fiel do acordo de associação (43).

103.
    No entanto, tal diligência deve ser realizada no respeito deste texto que, se proíbe a utilização da qualidade de independente para efeitos do exercício de um emprego assalariado, não autoriza os Estados signatários a garantir esta proibição à custa da limitação da própria liberdade de estabelecimento.

104.
    Por outras palavras, o Estado de acolhimento tem o direito de verificar se as relações profissionais efectivas correspondem às relações jurídicas declaradas, a fim de lhes aplicar o regime jurídico adequado. De forma alguma pode impor uma restrição como a de que os operadores económicos independentes que não disponham de uma qualificação profissional mínima ou não preencham outras condições relacionadas com o modo como exercem uma actividade económica não independente sejam por tal motivo equiparados a assalariados.

105.
    É também injustificado deduzir de modo automático do facto de um nacional estrangeiro não possuir qualificação profissional, não dispor de plano de empresa ou não ter realizado qualquer investimento, que utiliza abusivamente a via do estabelecimento para na realidade ter acesso a um emprego assalariado no mercado de trabalho do Estado de acolhimento.

106.
    É claro que estes critérios podem ser utilizados como indícios da intenção real do interessado, mas só podem ser interpretados utilmente depois de terem sido confrontados com a natureza da actividade independente que este declara querer exercer. Com efeito, não se podem manifestar as mesmas exigências em relação a um projecto de criação de uma sociedade cuja actividade exija fortes investimentos ou competências altamente qualificadas e em relação a uma actividade cujo exercício não depende, atendendo às suas características, de nenhuma destas condições prévias.

107.
    A discussão sobre este ponto parece-me influenciada pelas especificidades da actividade em causa no processo principal, de forma que a sua compreensão se encontra alterada por considerações ligadas à ordem pública ou à moralidade pública.

108.
    Embora possa guiar a acção dos Estados-Membros na determinação da sua própria política na matéria, como permitido pelo artigo 53.°, n.° 1, do acordo de associação, penso que esta abordagem não pode ser o pretexto de uma leitura restritiva do direito instituído por este acordo, na ausência de razão precisa.

109.
    Não é totalmente impossível que outras actividades profissionais, para além da prostituição, vejam o seu exercício entravado pela interpretação proposta pelo Governo neerlandês (44).

110.
    É perigoso pressupor a priori que todas as actividades económicas exercidas de modo independente exigem, por exemplo, uma qualificação ou investimentos.

111.
    Não sei inequivocamente se estas condições fixadas pela legislação nacional são cumulativas ou alternativas. Independentemente da leitura que seja feita das mesmas, as condições que fixa afiguram-se no entanto claramente restritivas.

112.
    Devendo ser lidas como sendo de aplicação cumulativa, certas actividades exigindo uma forte qualificação sem necessariamente exigirem investimentos especiais poderiam, sem razão, ser proibidas.

113.
    Na outra hipótese, não é totalmente impossível que, mesmo em número reduzido, actividades perfeitamente lícitas sejam proibidas sem motivo legítimo.

114.
    A condição relacionada com o nível dos recursos, de que pode legitimamente depender o direito de entrada e de permanência, é já susceptível de informar as autoridades competentes sobre a intenção de os nacionais dos países terceiros não procurarem um emprego assalariado.

115.
    Acrescente-se que a segurança jurídica num domínio tão sensível como o da circulação de pessoas aceita mal uma fronteira tão fluida como a que é destinada a distinguir as actividades qualificadas das outras actividades. Na ausência de critério objectivo permitindo distinguir as pessoas qualificadas das outras ou as actividades qualificadas das que o não são, parece-me desejável não fazer qualquer distinção desta natureza.

116.
    Quanto à obrigação de residência principal nos Países Baixos, justificada, segundo o juiz de reenvio, pela necessidade de garantir a continuidade da empresa, tal motivo, que subscreve a posição do Governo neerlandês, não se afigura convincente.

Esta medida constitui uma restrição à liberdade de estabelecimento, na medida em que impede um operador económico estabelecido na Polónia de exercer umaactividade económica, de modo estável e continuado, no território do Estado-Membro de acolhimento, sem pôr termo à actividade económica exercida no território polaco. Ora, a continuidade de uma actividade não é posta em causa pela simples multiplicação pelo operador económico dos seus centros de actividade. A mesma depende da capacidade deste operador em organizar as suas actividades, a qual não pode ser subestimada. A jurisprudência do Tribunal de Justiça na matéria, em aplicação das regras do Tratado, é constante e deve para aqui ser transposta, na ausência de razão em contrário assente no acordo de associação (45).

117.
    Resulta do que precede que o conceito de «actividade económica não assalariada», na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, deve ser interpretado no sentido de que não é reservado apenas às actividades económicas independentes que exijam uma qualificação profissional e exercidas, por um operador económico residente no território do Estado-Membro de acolhimento, segundo certas modalidades precisas, como a exigência da elaboração de um plano de empresa, a realização de investimentos e a assunção de compromissos a longo prazo, devendo o operador consagrar-se simultaneamente à gestão e à produção de mercadorias ou de serviços.

VI - Quanto à qualificação da prostituição de «actividade económica não assalariada» [terceira questão prejudicial e quinta questão prejudicial, alínea b)]

118.
    Com estas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o conceito de «actividade económica não assalariada», na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, se aplica à prostituição.

119.
    A título preliminar, há que recordar a natureza especial da actividade em causa. A longevidade da prática da prostituição e a tolerância de que é alvo na maioria dos Estados da Europa Ocidental não bastaram para subtrair a mesma ao domínio das actividades reprovadas pela moral pública e vigiadas pelas autoridades encarregadas da manutenção da ordem pública. A concepção da pessoa humana que esta prática tende a encarnar e os vínculos que o seu exercício favorece comuma certa forma de delinquência (46) suscitaram reacções da sociedade as quais raramente assumiram no entanto a forma de uma proscrição definitiva.

Assim, ainda hoje, um grande número de Estados-Membros toleram, reconhecem, e até mesmo regulamentam esta actividade (47). É manifesto que esta competência não faz parte daquelas de que a Comunidade dispõe. Em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, não cabe a este último substituir pela sua a apreciação das legislações dos Estados-Membros em que esta actividade é legalmente praticada (48).

120.
    Mas, a partir do momento em que um Estado-Membro considera que uma actividade profissional pode, de modo lícito, ser exercida no seu território, é legítimo, caso ocorra um litígio implicando o exercício da livre circulação de pessoas que praticam esta actividade, averiguar a qualificação jurídica que lhe pode ser conferida. Assim, não se pode extrair qualquer argumento de considerações do foro da moral para inspirar a qualificação jurídica que deve ser aplicada à actividade em causa, tendo em conta as disposições pertinentes do direito comunitário.

121.
    Para determinar se o regime jurídico da liberdade de estabelecimento, tal como previsto no acordo de associação, é aplicável à actividade de prostituta, há que averiguar se a prostituição é uma actividade económica, na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), deste acordo, antes de examinar se a mesma pode ser considerada uma actividade independente, na acepção da mesma disposição.

A - Quanto ao carácter económico da actividade de prostituição

122.
    O artigo 44.°, n.° 4, alínea c), do acordo de associação define as actividades económicas como sendo as actividades «de carácter industrial, comercial, artesanal, bem como as profissões liberais».

123.
    Como o Governo do Reino Unido, considero, para responder à simples exigência de uma qualificação jurídica, que a prostituição é uma actividade de carácter comercial.

124.
    Na acepção que lhe é vulgarmente atribuída, o conceito de «comércio» designa tanto a troca de mercadorias como o fornecimento de serviços (49).

125.
    Em vários acórdãos do Tribunal de Justiça que recorrem ao conceito de «actividade comercial», em aplicação de diferentes princípios comunitários, encontra-se a confirmação de que as actividades de serviços constituem, em princípio, uma actividade desse tipo. Assim, a actividade de serviços que consiste em explorar slot-machines foi qualificada de natureza comercial (50), tendo-o também sido a exploração de uma discoteca (51).

126.
    Parece-me claro que as prestações de carácter sexual fornecidas pelas prostitutas devem ser qualificadas, de um ponto de vista jurídico, de prestações de serviços.

127.
    Sob o regime do Tratado, uma «actividade económica», na acepção do artigo 2.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 2.° CE), abrange as prestações de trabalho assalariado e as prestações de serviços remunerados (52).

128.
    A mesma exigência de uma contrapartida deve ser admitida, no que diz respeito ao acordo de associação, como elemento da definição simultaneamente do conceito de «actividade económica», na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea c), do acordo de associação e do de «actividade de carácter comercial», que faz parte do mesmo.

129.
    As diferenças de objectivos susceptíveis de distinguir o regime de estabelecimento previsto pelo Tratado do instituído pelo acordo de associação não se opõem, claramente, a uma transposição deste aspecto da definição.

130.
    Se, no entanto, o Tribunal negar à actividade da prostituição o carácter de «actividade económica», por a mesma não constituir uma «actividade comercial», na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea c), do acordo de associação, os próprios termos deste artigo deviam levar o Tribunal de Justiça a verificar que a mesma cai, apesar de tudo, por uma outra razão, no âmbito de aplicação daquela disposição.

131.
    Uma leitura exaustiva das versões linguísticas daquela disposição revela que, na maior parte delas, a enumeração das actividades descritas como tendo um carácter económico não é taxativa. Com efeito, exceptuando as versões espanhola e francesa, todas as outras versões incluem um termo como «em especial», «nomeadamente» ou «especialmente», que confirma a intenção inequívoca das partes contratantes de não limitarem apenas às actividades enumeradas a qualificação jurídica de «actividades económicas».

132.
    Resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que uma versão não pode prevalecer sobre todas as outras versões linguísticas (53). Parece-me que se impõe a mesma conclusão no caso sub judice em que duas versões linguísticas são contrariadas por todas as outras. A interpretação uniforme das normas comunitárias exige, com efeito, que estas versões isoladas sejam interpretadas e aplicadas à luz das versões estabelecidas nas outras línguas comunitárias. Na ausência de elementos susceptíveis de revelarem qualquer intenção de os Estados signatários restringirem o âmbito de aplicação do regime consagrado pelo acordo de associação ao direito de estabelecimento, há que seguir a letra da disposição em causa.

133.
    Em consequência, há que considerar que, se a prostituição não é uma actividade comercial, na acepção do acordo de associação, deve apesar disso ser qualificada de actividade económica, em razão da finalidade lucrativa demonstrada pela procura de uma contrapartida financeira.

B - Quanto ao carácter independente do exercício da prostituição

134.
    A questão do carácter independente da prostituição pode surpreender. A condenação do proxenetismo por numerosos Estados-Membros demonstra a realidade de um modo de exercício que limita, a maior parte do tempo, a liberdade das prostitutas (54).

135.
    No entanto, não é totalmente impossível que algumas delas se dediquem a esta actividade sem estarem automaticamente colocadas sob o jugo de um terceiro.

136.
    É um facto que, como o sublinha o órgão jurisdicional de reenvio, as condições de exercício pelas prostitutas da sua actividade são dificilmente controláveis, em especial quando se trata de verificar a existência de um eventual proxeneta e de apreciar o grau de liberdade de que dispõem em relação ao mesmo (55).

137.
    A incontestável dificuldade em agir das autoridades competentes não nos autoriza a obviar à ignorância das condições de exercício da actividade presumindo de modo definitivo que toda e qualquer actividade de prostituição implica um envolvimento numa relação de dependência em relação a um terceiro.

138.
    Esta leitura do acordo de associação subtrairia toda uma actividade económica ao regime da liberdade de estabelecimento, sem que tal subtracção seja legitimada por qualquer manifestação de intenção das partes no acordo de associação ou pelos próprios termos do acordo e quando a mesma actividade é livremente exercida no território do Estado-Membro de acolhimento por nacionais comunitários.

139.
    Nestas condições, cabe precisar os critérios que permitem ao juiz de reenvio proceder à qualificação jurídica necessária à resolução do litígio no processo principal.

140.
    A condição relacionada com o exercício da actividade, sob uma forma independente, é fixada pelo artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação.

141.
    Foi já visto atrás que as formulações adoptadas nas diferentes versões linguísticas podiam ser traduzidas não só pelo conceito de independência, mas igualmente pelo de actividade económica «não assalariada», «por conta própria» ou «na sua própria empresa» (56).

142.
    A diversidade destas expressões encontra-se em grande parte nas versões linguísticas do artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado, de modo que me parece útil evocar os elementos de interpretação desta última disposição que decorrem da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

143.
    O conceito de «actividade não assalariada» - ou de «actividade independente» - foi interpretado pelo Tribunal de Justiça no sentido de que pressupõe a ausência de todo e qualquer vínculo de subordinação entre o operador económico e a pessoa que o remunera. As actividades exercidas a título independente ou na qualidade de não assalariado são assim definidas pela negativa, pela demonstração da ausência de existência de uma relação de natureza assalariada, na acepção do artigo 48.° do Tratado (57).

144.
    Raciocinando novamente no contexto do acordo de associação, cuja finalidade, e redacção, das disposições pertinentes não revela motivos para interpretar diferentemente sobre este ponto o regime da liberdade de estabelecimento que o mesmo institui relativamente ao regime correspondente organizado pelo Tratado, há que encarar a transposição desta definição para o artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do referido acordo.

145.
    A necessidade de interpretar o critério assente na independência a fim de proceder a uma delimitação do âmbito de aplicação do regime da liberdade de estabelecimento reveste-se aqui da maior importância.

146.
    Com efeito, sob o regime da liberdade de estabelecimento, previsto pelo Tratado, este critério permite identificar as actividades que caem no âmbito de aplicação da livre circulação de trabalhadores, que assenta num regime comparável de não discriminação (58).

Pelo contrário, as disposições do acordo de associação relativas aos trabalhadores estão longe de consagrar um princípio de liberdade de circulação. Sabe-se que o artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), se opõe a que um operador independente invoque esta qualidade para aceder a um emprego assalariado. Deve acrescentar-se que o princípio da não discriminação consagrado no artigo 37.° do acordo de associação se limita apenas às condições de trabalho, de remuneração ou de despedimento (59). E além disso, este direito é consagrado sob reserva das condições e das modalidades aplicáveis em cada Estado-Membro, o que deixa a estes últimos uma substancial margem de apreciação para a fixação dos critérios de acesso às actividades assalariadas.

147.
    Por outras palavras, a liberdade de que dispõe o nacional de um país terceiro que deseje entrar no território de um Estado-Membro é limitada pela finalidade atribuída ao seu projecto de instalação pela legislação nacional. Em caso de impossibilidade de acesso a uma actividade independente, pode ver-se privado, conforme o que preveja o Estado-Membro de acolhimento, do direito de optar por uma actividade assalariada. Compreende-se assim o interesse que existe em delimitar o critério assente na independência da actividade em causa.

148.
    No que respeita mais especificamente à prostituição, este interesse é alimentado por preocupações mais graves. A ausência de independência pode com efeito traduzir-se por relações de coerção e de sujeição abrangidas por considerações de ordem pública e de protecção da dignidade e da integridade das pessoas.

149.
    Recordado o interesse específico que existe em identificar o grau de independência das prostitutas, há que examinar os dois critérios aplicáveis, ou seja, a existência de um vínculo de subordinação e o pagamento de uma remuneração.

150.
    Recorde-se com efeito que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, deve ser considerado «trabalhador», na acepção do artigo 48.° do Tratado, a pessoa que realiza, durante certo tempo, em benefício de outra pessoa e sob a sua direcção, prestações em contrapartida das quais recebe uma remuneração (60).

151.
    É óbvio que esta definição só nos interessa na medida em que serve para qualificar, por um raciocínio a contrario, as actividades não assalariadas. A verificação do carácter não independente da actividade não impõe ao Estado-Membro de acolhimento que qualifique de trabalho assalariado o que será, a maior parte das vezes, uma relação de sujeição, ou mesmo de coerção, entre uma prostituta e um proxeneta. Se esta actividade não for independente e escapar portanto ao regime de estabelecimento, a questão da sua qualificação jurídica é da estrita apreciação dos Estados-Membros em relação a este tipo especial de relações, que é tão afastado quanto é possível sê-lo de uma relação de trabalho normal.

152.
    De qualquer modo, há que considerar que a prostituição pode ser qualificada de actividade económica não assalariada, na acepção do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação, se estiver demonstrado que a prostituta exerce a sua actividade em contrapartida de uma remuneração que lhe é integral e directamente paga, sem que a escolha desta actividade ou das modalidades do seu exercício possa ser ditada por um terceiro.

153.
    Cabe ao juiz nacional verificar, caso a caso, perante os elementos de prova que lhe são fornecidos, se tais exigências se encontram satisfeitas.

154.
    A fim de ser exaustivo, há que recordar a margem de apreciação de que dispõe o Estado-Membro de acolhimento em relação ao exercício de uma actividade susceptível de afectar a ordem pública ou aos nacionais de outros Estados que exercem esta actividade, em conformidade com a jurisprudência tradicional do Tribunal de Justiça, em aplicação das regras do Tratado, e transponível para o caso vertente pelas razões já expostas.

155.
    Por um lado, quanto às medidas nacionais que têm por objecto regulamentar uma actividade específica, as modalidades de exercício da prostituição, a título independente, de que depende o reconhecimento do direito de acesso a esta actividade no território do Estado-Membro de acolhimento, não prejudicam a liberdade de este Estado adoptar uma atitude diferente se lhe parecer que, por razões de ordem pública, o exercício da prostituição devia ser regulamentado mais estritamente, ou até mesmo proibido.

Como outras actividades susceptíveis de afectar a ordem pública, não é possível abstrair das considerações de ordem moral, religiosa ou cultural que rodeiam a prostituição (61). Os riscos associados à prostituição que foram anteriormente evocados (62) justificam que as autoridades nacionais disponham de um poder de apreciação suficiente para determinar as exigências que a protecção da ordem social implica, nomeadamente no que respeita às modalidades de exercício desta actividade. Nestas condições, compete-lhes apreciar não apenas se basta restringir esta actividade, mas também se é necessário proibi-la, desde que essas restrições não sejam discriminatórias (63).

156.
    Por outro lado, a reserva de ordem pública do artigo 53.°, n.° 1, do acordo de associação permite às partes contratantes introduzir limites justificados por motivos de ordem pública em relação aos nacionais das outras partes. Como sob o regime do Tratado, pode admitir-se que o Estado-Membro de acolhimento tenha o direito, em relação ao Estado terceiro, parte no acordo de associação, de tomar medidas que não pode aplicar aos seus próprios nacionais, visto que não pode afastar estes últimos do território nacional ou impedir-lhes o acesso ao mesmo (64).

157.
    Em contrapartida, esse direito existe em relação aos nacionais do país terceiro, desde que não haja qualquer distinção arbitrária no exercício deste direito (65).

158.
    Em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o recurso por uma autoridade nacional ao conceito de ordem pública pressupõe a existência de uma ameaça real e suficientemente grave, afectando um interesse fundamental da sociedade. Se bem que o direito comunitário não imponha aos Estados-Membros uma escala uniforme de valores no que respeita à apreciação dos comportamentos que podem ser considerados contrários à ordem pública, um comportamento não pode ser visto como tendo um grau suficiente de gravidade para justificar restrições à entrada ou à permanência, no território de um Estado-Membro, de um nacional de um país terceiro caso o Estado-Membro de acolhimento não tome, em relação ao mesmo comportamento por parte dos seus próprios nacionais ou de nacionais de outros Estados-Membros, medidas repressivas ou outras medidas reais e efectivas destinadas a combater este comportamento (66).

159.
    A faculdade de o Estado-Membro de acolhimento regulamentar a actividade em causa, bem como de limitar a entrada dos nacionais estrangeiros que se dediquem a essa actividade, por motivos de ordem pública, encontra-se portanto estritamente delimitada pelas exigências de coerência e de não discriminação fixadas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

Conclusão

160.
    Perante estas considerações, proponho que seja dada a seguinte resposta às questões colocadas pelo Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage:

«1)    O artigo 44.°, n.° 3, do Acordo europeu, de 16 de Dezembro de 1991, que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República da Polónia, por outro, bem como o artigo 45.°, n.° 3, do Acordo europeu, de 4 de Outubro de 1993, que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República Checa, por outro, têm efeito directo, de modo que podem ser invocados pelos particulares nos órgãos jurisdicionais nacionais.

2)    O artigo 44.°, n.° 3, do acordo de associação CE-Polónia, lido à luz do artigo 58.°, n.° 1, do referido acordo de associação, e o artigo 45.°, n.° 3, lido à luz do artigo 59.°, n.° 1, do acordo de associação CE-República Checa, devem ser interpretados no sentido de que o regime de estabelecimento por eles instituído não abrange a obrigação de o Estado-Membro de acolhimento atribuir um direito de entrada e de permanência no seu território, respectivamente aos nacionais polacos e checos, estando o exercício deste direito subordinado ao respeito dos limites fixados pelo Estado-Membro deacolhimento quanto à entrada, à permanência e ao estabelecimento destes nacionais.

3)    Os artigos 44.°, n.° 3, e 58.°, n.° 1, do acordo de associação CE-Polónia, bem como os artigos 45.°, n.° 3, e 59.°, n.° 1, do acordo de associação CE-República Checa, não se opõem a uma legislação nacional que subordina o direito de entrada e de permanência, respectivamente, de um nacional polaco e de um nacional checo que pretendam ter acesso a uma actividade económica e exercê-la como não assalariados no território do Estado-Membro de acolhimento à condição de disporem de meios de subsistência bastantes.

4)    O conceito de 'actividade económica não assalariada', na acepção dos artigos 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação CE-Polónia, e 45.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação CE-República Checa, deve ser interpretado no sentido de que não é reservado apenas às actividades económicas independentes exigindo uma qualificação profissional e exercidas, por um operador económico residente no território do Estado-Membro de acolhimento, segundo certas modalidades precisas, como a exigência da elaboração de um plano de empresa, a realização de investimentos e a assunção de compromissos a longo prazo, devendo o operador consagrar-se simultaneamente à gestão e à produção de mercadorias ou de serviços.

5)    O conceito de 'actividade económica não assalariada', na acepção dos artigos 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação CE-Polónia, e 45.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação CE-República Checa, deve ser interpretado no sentido de que o mesmo se aplica à prostituição, se se demonstrar que a prostituta exerce a sua actividade mediante uma remuneração que lhe é integral e directamente paga, sem que a escolha desta actividade ou das modalidades do seu exercício possa ser ditada por um terceiro.»


1: -     Língua original: francês.


2: -     O acordo de associação deve «abranger todo o espaço existente entre o acordo de comércio e o acordo de adesão» (Hallstein, W., citado por Blumann, C., nas conclusões gerais do colóquio «Le concept d'association dans les accords passés par la Communauté: essai de clarification», Actes du colloque, Bruylant, 1999, p. 319). Blumann, C., acrescenta que, na sua concepção inicial, o acordo de associação devia cobrir «tudo o que ia para além do acordo de comércio mas ficava aquém do alargamento» (ibidem).


3: -     Flamand-Lévy, B., «Essai de typologie des accords externes», Actes du colloque, já referidos, p. 66.


4: -     JO 1964, 217, p. 3687; EE 11 F1 p. 19; a seguir «acordo CEE-Turquia».


5: -     Também denominadas «recorrentes no processo principal».


6: -     Nota sem objecto na versão portuguesa.


7:     NT: Embora ambos os acordos utilizem, na versão portuguesa, a expressão «não assalariada» para traduzir «indépendant», utilizar-se-á, na presente tradução, por razões de simplificação, sempre que possível, o termo «independente», como equivalente daquela expressão.


8: -     A seguir «IND».


9: -     JO 1993, L 348, p. 2, a seguir «acordo CE-Polónia».


10: -     JO 1994, L 360, p. 2, a seguir «acordo CE-República Checa».


11: -     Segundo, décimo segundo e décimo quinto considerandos.


12: -     Segundo, décimo quinto e décimo oitavo considerandos.


13: -     Nota sem objecto na versão portuguesa.


14: -     Nota sem objecto na versão portuguesa.


15: -     Há no entanto que assinalar que, segundo o Governo neerlandês, a condição que exige que o pedido de autorização de residência revista um «interesse económico essencial para os Países Baixos [...] não se aplica em relação aos nacionais das partes contratantes que exerçam actividades económicas [não assalariadas]» (ponto 28 das suas observações escritas).


16: -     Capítulo B 12, 4.2.3.


17: -     Tendo em conta a similitude entre os dois acordos de associação, os raciocínios aplicados, nas presentes conclusões, ao acordo CE-Polónia (a seguir «acordo de associação») devem considerar-se, por razões de facilidade, integralmente transponíveis para as disposições correspondentes do acordo CE-República Checa.


18: -     V. conclusões do advogado-geral S. Alber nos processos Gloszczuk (C-63/99), pendente no Tribunal de Justiça, a respeito do acordo de associação CE-Polónia; Kondova (C-235/99), pendente no Tribunal de Justiça, a respeito do acordo de associação CE-Bulgária; e as conclusões do advogado-geral J. Mischo no processo Barkoci e Malik (C-257/99), pendente no Tribunal de Justiça, a respeito do acordo de associação CE-República Checa.


19: -     V., por exemplo, acórdãos de 30 de Setembro de 1987, Demirel (12/86, Colect., p. 3719, n.° 14); de 20 de Setembro de 1990, Sevince (C-192/89, Colect., p. I-3461, n.° 15); de 5 de Julho de 1994, Anastasiou e o. (C-432/92, Colect., p. I-3087, n.° 23); de 16 de Junho de 1998, Racke (C-162/96, Colect., p. I-3655, n.° 31); de 4 de Maio de 1999, Sürül (C-262/96, Colect., p. I-2685, n.° 60), e de 11 de Maio de 2000, Savas (C-37/98, Colect., p. I-2927, n.° 39).


20: -     V., nomeadamente, acórdãos de 4 de Abril de 1974, Comissão/França (167/73, Colect., p. 187), a respeito do artigo 48.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 39.° CE); de 21 de Junho de 1974, Reyners (2/74, Colect., p. 325), a respeito do artigo 52.° do Tratado; e de 31 de Janeiro de 1991, Kziber (C-18/90, Colect., p. I-199), respeitante ao princípio da não discriminação, como consta de um acordo de associação.


21: -     V. acórdão Sürül, já referido, n.° 63.


22: -     V., como exemplo de jurisprudência recente, acórdão Savas, já referido, n.° 53.


23: -     V. acórdão de 8 de Abril de 1976, Royer (48/75, Colect., p. 221, n.os 31 e 32), nos termos do qual o direito de os nacionais dos Estados-Membros entrarem no território de outro Estado-Membro e aí permanecerem, para os fins tidos em vista pelo Tratado, nomeadamente para aí procurarem ou exercerem uma actividade profissional independente, constitui um direito directamente atribuído pelo Tratado. V. igualmente acórdão de 5 de Fevereiro de 1991, Roux (C-363/89, Colect., p. I-273, n.° 9), e acórdão Savas, já referido, n.° 60, relativo à liberdade de circulação de trabalhadores conforme instituída pelo acordo CEE-Turquia.


24: -     V., como exemplo recente de uma jurisprudência constante, acórdão de 1 de Julho de 1993, Metalsa (C-312/91, Colect., p. I-3751, n.° 11), e, como exemplo de comparação entre dois acordos de associação, acórdão de 2 de Março de 1999, Eddline El-Yassini (C-416/96, Colect., p. I-1209, n.° 61).


25: -     Artigo 3.°, alínea c), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alínea c), CE].


26: -     Artigo 1.°, n.° 2, do acordo de associação.


27: -     Artigos 8.°-A, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 18.°, n.° 1, CE) e 52.° do Tratado. V. acórdão de 29 de Fevereiro de 1996, Skanavi e Chryssanthakopoulos (C-193/94, Colect., , p. I-929).


28: -     Segundo o Governo neerlandês, «a condição exigindo meios de subsistência é, com efeito, uma condição geral de admissão que vale em princípio para todos os estrangeiros que peçam a autorização de entrada com vista a uma permanência normal (ou seja, os não requerentes de asilo)» (ponto 27 das suas observações escritas).


29: -     Ponto 4.4 da decisão de reenvio.


30: -     A seguir «condição relacionada com o nível dos recursos» ou «medida».


31: -    Recorde-se que a jurisprudência do Tribunal de Justiça há muito que se encontra fixada no domínio da livre circulação de trabalhadores, conforme instituída pelo Tratado, sobre a questão de saber se um Estado pode exigir a um nacional comunitário que ele disponha de recursos suficientes. O nacional de um Estado-Membro que exerça no território de outro Estado-Membro uma actividade assalariada de que resultam rendimentos inferiores ao mínimo de subsistência, como entendido por este último Estado, é um «trabalhador», na acepção do artigo 48.° do Tratado, de modo que pode invocar esta disposição para beneficiar da liberdade de circulação no território comunitário (acórdão de 23 de Março de 1982, Levin, 53/81, Recueil, p. 1035, n.° 18). V. igualmente acórdãos de 3 de Junho de 1986, Kempf (139/85, Colect., p. 1741); e de 14 de Dezembro de 1995, Megner e Scheffel (C-444/93, Colect., p. I-4741). De acordo com os elementos jurisprudenciais anteriormente referidos (n.° 59 das presentes conclusões), o alargamento da interpretação de uma disposição do Tratado a uma disposição comparável de um acordo concluído pela Comunidade com um país terceiro depende da finalidade de cada uma destas disposições no âmbito que lhe é específico. Já assinalei, por um lado, as diferenças de objectivos que distinguem o Tratado e o acordo de associação, que se opõem a uma simples transposição da interpretação do Tratado para este último diploma, e, por outro, os próprios termos do artigo 58.°, n.° 1, do acordo de associação, do qual resulta a manutenção em benefício dos Estados-Membros, sob certas condições, da sua legislação nacional em matéria de entrada e de permanência.


32: -     A minha opinião sobre este ponto vai no sentido da expressa pelo advogado-geral S. Alber, nas suas conclusões no processo Kondova, já referido (n.° 105), e pelo advogado-geral J. Mischo, nas suas conclusões no processo Barkoci e Malik, já referido (n.° 84).


33: -     Pontos 32 e 33 das suas observações escritas.


34: -     A lei neerlandesa exige que um nacional estrangeiro exerça um trabalho qualificado, tenha elaborado um plano de empresa, assuma tanto as tarefas de gestão como as de execução, tenha a sua residência nos Países Baixos, a fim de assegurar a continuidade da empresa, realize investimentos e assuma compromissos a longo prazo.


35: -     V., como exemplo recente de uma jurisprudência constante sobre o método de interpretação, acórdão de 23 de Março de 2000, Berliner Kindl Brauerei (C-208/98, Colect., p. I-1741, n.° 18).


36: -     Nem todas as versões linguísticas deste artigo utilizam, como as versões francesa, alemã, dinamarquesa, inglesa, italiana ou finlandesa, o conceito de «actividades económicas independentes». Mas, nessas outras versões, resulta a mesma ideia dos conceitos, cujo sentido é próximo, de «actividades económicas não assalariadas» (versões grega, neerlandesa e portuguesa), de «actividades económicas por conta própria» (versão espanhola) ou de «actividades económicas na sua própria empresa» (versão sueca).


37: -     Voltarei ao conceito de «actividade económica» e ao de «actividade independente» nos desenvolvimentos seguintes consagrados à actividade de prostituição.


38: -     N.° 59 e nota 30 das presentes conclusões.


39: -     A este respeito, a comparação das versões linguísticas do artigo 52.°, segundo parágrafo, do Tratado e do artigo 44.°, n.° 4, alínea a), i), do acordo de associação não revela qualquer tendência particular no que se refere à identidade ou às diferenças de expressões utilizadas no Tratado e no acordo de associação. Os termos utilizados são por vezes rigorosamente idênticos (versões alemã e dinamarquesa, que utilizam o conceito de «actividade económica independente») ou muito próximas (versões inglesa, neerlandesa, grega, portuguesa, finlandesa e sueca). As expressões divergem em francês, como já foi visto, mas também em italiano e em espanhol. Assinale-se que, por força do artigo 120.° do acordo de associação, todas as versões linguísticas do acordo têm o mesmo valor (artigo 122.° do acordo CE-República Checa).


40: -     V., como exemplo recente de uma jurisprudência constante, acórdão de 7 de Dezembro de 2000, Itália/Comissão (C-482/98, Colect., p. I-10861, n.os 46 a 49).


41: -     Décimo segundo considerando.


42: -     O acordo de associação trata também da circulação dos trabalhadores e das prestações de serviços. É significativo que o modo como estes princípios são descritos não deixe margem, desta vez, para qualquer dúvida razoável quanto à natureza deliberadamente restritiva da sua definição. As disposições relativas às prestações de serviços, por exemplo, não instituem um regime de livre prestação de serviços equivalente ao do Tratado: ao passo que o artigo 44.°, n.° 3, prevê que «[a] partir da entrada em vigor do presente acordo, os Estados-Membros concederão [...] um tratamento não menos favorável [...]», o artigo 55.°, n.° 1, precisa que «[a]s partes comprometem-se [...] a adoptar as medidas necessárias a fim de permitir progressivamente as prestações de serviços [...]». Num caso, o acordo de associação institui uma obrigação de resultado enquanto, no outro, a norma assemelha-se mais a uma obrigação de meios a cargo das partes contratantes, a ponto de ter sido escrito que «Central and European Countries nationals are entitled to a real right of establishment and none of them benefit from the right to supply services in the Community» (Martin, D., «Association Agreements with Mediterranean and with Eastern Countries: Similarities and Differences», Assoziierungsabkommen der EU mit Drittstaaten, Manz Verlag, Wien, 1998, p. 39). Nada no preâmbulo do acordo de associação anuncia esta diferença, de forma que, de modo bastante paradoxal, as disposições relativas ao estabelecimento e as relativas às prestações de serviços podem, tanto umas como as outras, ser consideradas a tradução no direito dos Estados signatários dos mesmos objectivos de aproximação, de redução das diferenças de desenvolvimento e da futura adesão.


43: -     Pontos 37 a 39 das suas observações escritas.


44: -     Muitas outras actividades profissionais podem sem dúvida ser consideradas como não exigindo qualificação especial e seriam portanto susceptíveis de não satisfazer a condição de «trabalho qualificado», prevista pela legislação nacional (os vendedores ambulantes, por exemplo). Podem também tratar-se de actividades cujo exercício não pode ser sempre subordinado, tendo em conta a sua natureza, a um controlo do nível de qualificação, como certas actividades artísticas (v. exemplo de um pintor, no acórdão de 18 de Junho de 1985, Steinhauser, 197/84, Recueil, p. 1819). Estas actividades também não exigem plano de empresa ou investimentos especiais.


45: -     V., nomeadamente, acórdãos de 12 de Julho de 1984, Klopp (107/83, Recueil, p. 2971); de 29 de Outubro de 1998, Comissão/Espanha (C-114/97, Colect., p. I-6717); e de 18 de Janeiro de 2001, Comissão/Itália (C-162/99, Colect., p. I-541). No que respeita especificamente à prostituição, a questão da residência múltipla parece-nos ter no entanto uma importância secundária. Tendo em conta a sua natureza, é claro, com efeito, que tal actividade não se presta a uma instalação em vários locais. A hipótese de uma prostituta não fixar a sua residência principal no território do Estado de acolhimento, deslocando-se pontualmente ao mesmo, cai mais na lógica da livre prestação de serviços, na acepção do Tratado, o que justifica então que nos interroguemos sobre o regime jurídico correspondente previsto pelo acordo de associação, relativamente ao qual se sabe que impõe obrigações menos rigorosas às partes contratantes (v. nota 40).


46: -     É sabido que a fronteira entre a prostituição e o tráfico dos seres humanos nem sempre é fácil de delimitar, tendo em conta a dificuldade em averiguar a realidade do consentimento das pessoas que se dedicam à prostituição. O proxenetismo está, além disso, mais no centro das preocupações das autoridades encarregadas da manutenção da ordem pública nos Estados-Membros, tal como a exploração sexual das crianças. Por fim, o meio da prostituição está muitas vezes ligado ao da droga.


47: -     Contrariamente ao que o juiz de reenvio indica, a prostituição não é proibida na maior parte dos «países da associação». Segundo as informações de que disponho, em dez Estados-Membros da Comunidade, pelo menos, o exercício individual da prostituição não constitui uma infracção (Reino da Bélgica, Reino da Dinamarca, República Federal da Alemanha, Reino de Espanha, República Francesa, República Italiana, Grão-Ducado do Luxemburgo, Reino dos Países Baixos, Reino da Suécia, Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte). A situação é especial na Suécia, onde são os clientes das prostitutas, mas não estas últimas, que são reprimidos penalmente (Le régime juridique de la prostitution féminine, Les documents de travail du Sénat, série: Législation comparée, n.° LC 79, 11 octobre 2000, Paris).


48: -     Acórdão de 24 de Março de 1994, Schindler (C-275/92, Colect., p. I-1039, n.° 32). O Conselho da União Europeia adoptou, em 24 de Fevereiro de 1997, uma acção comum com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à acção contra o tráfico de seres humanos e a exploração sexual de crianças (JO L 63, p. 2).


49: -     Comércio: «actividade que consiste na compra, venda, troca de mercadorias, de géneros, de valores, na venda de serviços: Fazer comércio» (Le Petit Larousse Grand Format, Dictionnaire encyclopédique, éditions Larousse, Paris, 1993); «operação, actividade de compra e de revenda de um produto, de um valor; por analogia, prestação de certos serviços» (Le Petit Robert, Dictionnaire de la langue française, éditions Dictionnaires Le Robert, Paris, 1999). (A tradução é nossa).


50: -     Acórdão de 4 de Julho de 1985, Berkholz (168/84, Recueil, p. 2251, n.° 19).


51: -     Acórdão de 5 de Outubro de 1988, Steymann (196/87, Colect., p. 6159, n.os 3 e 4).


52: -     A definição de uma «actividade económica», na acepção do artigo 2.° do Tratado é geral. Não é reservada a uma das liberdades de circulação, quer se trate de pessoas ou de serviços (acórdão de 11 de Abril de 2000, Deliège, C-51/96 e C-191/97, Colect., p. I-2549, n.° 53). Em especial, o mesmo raciocínio é aplicável, por força do artigo 60.°, primeiro parágrafo, do Tratado CE (actual artigo 50.°, primeiro parágrafo, CE), quanto à definição das «prestações de serviços» dado que, em conformidade com tal disposição, são considerados serviços as prestações realizadas normalmente mediante remuneração (acórdão Deliège, já referido, n.° 55). A mesma exigência relacionada com o pagamento de uma contrapartida aplica-se às actividades de serviços sujeitas à liberdade de estabelecimento (acórdão de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, C-55/94, Colect., p. I-4165, n.° 20, e acórdão Deliège, já referido, n.° 55).


53: -     V., como exemplo recente de uma jurisprudência constante, acórdão de 17 de Julho de 1997, Ferriere Nord/Comissão (C-219/95 P, Colect., p. I-4411, n.° 31).


54: -     O relatório do Senado francês, já referido, assinala seis Estados em oito cuja legislação é estudada, que condenam todas as formas de proxenetismo. A estes seis Estados, há que juntar a República Francesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo.


55: -     Terceira questão prejudicial.


56: -     V. nota 34.


57: -     V., nomeadamente, acórdãos de 27 de Junho de 1996, Asscher (C-107/94, Colect., p. I-3089, n.os 25 e 26), e de 8 de Junho de 1999, Meeusen (C-337/97, Colect., p. I-3289, n.° 15).


58: -     Artigo 48.° do Tratado.


59: -     O mesmo acontece quanto ao artigo 38.° do acordo de associação CE-República Checa.


60: -     Acórdão Asscher, já referido, n.° 25.


61: -     V. acórdãos Schindler, já referido, n.° 60, e de 21 de Setembro de 1999, Läärä e o. (C-124/97, Colect., p. I-6067, n.° 13).


62: -     V. n.° 119 das presentes conclusões e nota 44.


63: -     Acórdãos Schindler, já referido, n.° 61, e Läärä e o., já referido, n.° 14.


64: -     Acórdão de 18 de Maio de 1982, Adoui e Cornuaille (115/81 e 116/81, Recueil, p. 1665, n.° 7).


65: -     Ibidem.


66: -     Ibidem, n.° 8.