Language of document : ECLI:EU:C:2001:699

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

F. G. JACOBS

apresentadas em 13 de Dezembro de 2001 (1)

Processo C-287/00

Comissão das Comunidades Europeias

contra

República Federal da Alemanha

1.
    Na presente acção, proposta nos termos do artigo 226.° CE, a Comissão pretende que o Tribunal declare que a República Federal da Alemanha, ao isentar de IVA as actividades de investigação levadas a cabo por universidades estatais, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.° da Sexta Directiva IVA (2).

Sexta Directiva

2.
    Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva, estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado «as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade».

3.
    O artigo 4.° dispõe, na parte aqui relevante, o seguinte:

«1. Por ‘sujeito passivo’ entende-se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade.

2. As actividades económicas referidas no n.° 1 são todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. A exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência é igualmente considerada uma actividade económica.

[...]

5. Os Estados, as colectividades territoriais e outros organismos de direito público não serão considerados sujeitos passivos relativamente às actividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando em conexão com essas mesmas actividades ou operações cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações.

Contudo, se exercerem tais actividades ou operações, devem ser considerados sujeitos passivos relativamente a tais actividades ou operações, desde que a não sujeição ao imposto possa conduzir a distorções de concorrência significativas.

[...]»

4.
    O artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva prevê:

«Isenções no território do país

A) Isenções em beneficio de certas actividades de interesse geral

1. Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso :

[...]

i )    A educação da infância e da juventude, o ensino escolar ou universitário, a formação ou a reciclagem profissional, e bem assim as prestações de serviços e as entregas de bens com elas estreitamente conexas, efectuadas por organismos de direito público prosseguindo o mesmo fim e por outros organismos que o Estado-Membro em causa considere prosseguirem fins análogos».

Legislação nacional

5.
    O § 4, n.° 1, 21a, da Umsatzsteuergesetz (lei alemã relativa ao imposto sobre o volume de negócios, a seguir «UStG») (3) isenta de IVA o volume de negócios dos estabelecimentos de ensino superior público que possa ser imputado a actividades de investigação.

6.
    O § 48 da Hochschulrahmengesetz (lei-quadro do ensino superior) (4) determina que os estabelecimentos de ensino superior são, em geral, organismos de direito público.

7.
    Referir-me-ei a esses estabelecimentos como universidades estatais.

Tramitação processual

8.
    Em 6 de Novembro de 1998, a Comissão enviou ao Governo alemão uma notificação para cumprimento, nos termos do artigo 169.° do Tratado CE (actual artigo 226.° CE), indicando que, em seu entender, a isenção de IVA das actividades de investigação das universidades estatais era contrária ao artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva. Não obteve qualquer resposta.

9.
    Em 26 de Agosto de 1999, a Comissão enviou à República Federal da Alemanha um parecer fundamentado, nos termos do artigo 226.°, no qual voltava a expor a sua posição e convidava a República Federal da Alemanha a adoptar as medidas necessárias para pôr termo à violação no prazo de dois meses.

10.
    Na sua resposta de 4 de Abril de 2000, o Governo alemão mencionou duas disposições da Sexta Directiva que considerava justificarem a isenção. Em primeiro lugar, estando a actividade relativa a contratos de investigação estreitamente conexa com a actividade docente em universidades estatais, a isenção pode basear-se no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i). Em segundo lugar, na medida em que não provoca graves distorções de concorrência, a isenção pode basear-se no artigo 13.°, A, n.° 2, que permite aos Estados-Membros concederem a organismos que não sejam de direito público determinadas isenções, incluindo aquela a que se refere o artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), condicionadas à observância de uma ou mais condições específicas, nomeadamente a de a isenção dos serviços em causa não ser susceptível de provocar distorções de concorrência em detrimento de empresas comerciais sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado.

11.
    Em Julho de 2000, a Comissão propôs a presente acção. Na sua petição, solicitou ao Tribunal de Justiça que declarasse que a República Federal da Alemanha, ao isentar do imposto sobre o valor acrescentado as actividades de investigação levadas a cabo por universidades estatais, não cumprira as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.° da Sexta Directiva IVA. A petição enuncia os fundamentos invocados pela Comissão em apoio da sua alegação de que a isenção em causa é contrária ao artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva. Explica ainda por que motivo a Comissão não considera essa isenção justificada à luz do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), ou do artigo 13.°, A, n.° 2, da Directiva.

Admissibilidade

12.
    A República Federal da Alemanha suscita a questão prévia da inadmissibilidade da acção proposta pela Comissão, com base em dois fundamentos.

13.
    Em primeiro lugar, a República Federal da Alemanha considera que a Comissão não observou os trâmites do processo pré-contencioso previsto no artigo 226.° CE: o seu parecer fundamentado - de apenas sete frases - não enunciava claramente o objecto do litígio, conforme é exigido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (5), limitando-se a repetir o teor da notificação para cumprimento.

14.
    Em segundo lugar, a República Federal da Alemanha entende que a Comissão ampliou de forma inaceitável o objecto do litígio, violando o princípio da continuidade entre o processo pré-contencioso e a acção, que constitui a expressão do direito a ser ouvido (6): enquanto o parecer fundamentado invoca apenas a violação do artigo 2.° da Sexta Directiva, a petição refere ainda o artigo 13.°, A, da Directiva. O argumento da Comissão relativo ao artigo 13.°, A, constitui um aspecto essencial deste caso. O artigo 2.° limita-se a definir a base de incidência, estabelecendo uma lista dos vários tipos de volumes de negócios que em princípio estão sujeitos ao IVA. Contudo, do artigo 2.° não resulta directamente que as actividades aí descritas sejam automaticamente tributáveis: isso depende sobretudo dos critérios específicos de isenção fixados nos artigos 13.° e segs. Só a avaliação desses critérios permite concluir se uma actividade está ou não sujeita ao IVA.

15.
    Existe jurisprudência abundante sobre o processo que a Comissão deve observar antes de propor uma acção no Tribunal de Justiça nos termos do artigo 226.° CE. Esse processo tem como objectivo dar ao Estado-Membro em causa a oportunidade de, por um lado, dar cumprimento às obrigações decorrentes do direito comunitário e, por outro lado, exercer o direito que lhe assiste de se defender das acusações da Comissão (7).

16.
    Em primeiro lugar, a Comissão deve enviar ao Estado-Membro em causa uma notificação para cumprimento. Essa notificação visa circunscrever o objecto do litígio e indicar ao Estado-Membro convidado a apresentar as suas observações os elementos que lhe permitirão preparar a sua defesa (8).

17.
    No caso em litígio, a notificação para cumprimento da Comissão, de 6 de Novembro de 1998, inclui três parágrafos sobre a matéria de fundo. A Comissão começa por referir que a legislação alemã isenta determinados serviços de IVA, especificando em seguida que, nos termos do § 4, n.° 21a, da UStG, as actividades de investigação das universidades estatais estão isentas de IVA. Em segundo lugar, afirma (i) que um organismo público, como uma universidade estatal, está indubitavelmente sujeito ao IVA na medida em que não actue na qualidade de autoridade pública, mas desenvolva actividades a título oneroso, e (ii) que as actividades de investigação desenvolvidas por um sujeito passivo são operações tributáveis e não operações isentas, nos termos da Sexta Directiva. Em terceiro lugar, a Comissão sublinha que o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva sujeita ao IVA «as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade»; não estando as actividades de investigação isentas de IVA - nomeadamente por força do artigo 13.° da Sexta Directiva - a Comissão conclui que a República Federal da Alemanha violou o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva ao isentar de IVA as actividades de investigação de universidades estatais.

18.
    O Tribunal de Justiça já declarou que a obrigação de a Comissão elaborar um parecer fundamentado prevista no artigo 226.° CE tem como objectivo dar oportunidade ao Estado-Membro de justificar a sua posição e, se for caso disso, permitir à Comissão convencer o Estados-Membro a conformar-se voluntariamente com as exigências do Tratado. Se essa tentativa para alcançar a regularização não for bem sucedida, o parecer fundamentado tem a função de circunscrever o objecto do litígio (9).

19.
    O parecer fundamentado enuncia a posição da Comissão em quatro parágrafos. Refere, em primeiro lugar, que a legislação alemã isenta determinados serviços de IVA, especificando em seguida que, nos termos do § 4, n.° 21a, da UStG, as actividades de investigação dos estabelecimentos de ensino superior público estão isentas de IVA. Em segundo lugar, sublinha que o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva sujeita ao IVA «as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade». Em terceiro lugar, afirma que (i) um organismo público, como uma universidade estatal, está indubitavelmente sujeito ao IVA na medida em que não actue na qualidade de autoridade pública, mas desenvolva actividades a título oneroso, (ii) as actividades de investigação desenvolvidas por um sujeito passivo são operações tributáveis e não operações isentas nos termos da Sexta Directiva e (iii) consequentemente, é entendimento da Comissão que a República Federal da Alemanha violou o artigo 2.° da Sexta Directiva ao isentar de IVA as actividades de investigação de universidades estatais. Em quarto lugar, o parecer fundamentado refere que a Comissão notificou a República Federal da Alemanha dessa violação em Novembro de 1998, nos termos do artigo 226.° CE, e que não obteve qualquer resposta, embora tenha sido concedida à República Federal da Alemanha uma prorrogação do seu prazo de resposta.

20.
    Se a República Federal da Alemanha tivesse reagido à notificação para cumprimento, a Comissão teria tido a possibilidade de responder aos fundamentos e argumentos de defesa por ela invocados (10). Na ausência de resposta da República Federal da Alemanha, o parecer fundamentado limitou-se a repetir, em termos materialmente idênticos, o conteúdo da notificação para cumprimento. Só quando a República Federal da Alemanha respondeu ao parecer fundamentado é que procurou justificar a sua posição, invocando o artigo 13.°, A, como fundamento de defesa.

21.
    O Tribunal de Justiça já decidiu que, numa ação por incumprimento contra um Estado-Membro, a Comissão pode invocar a legislação comunitária pela primeira vez na petição inicial, sempre que esteja apenas a responder a um fundamento de defesa suscitado pelo Estado-Membro em causa e, ao fazê-lo, não altere nem a definição nem o fundamento do alegado incumprimento (11). Entendo que a Comissão, ao alegar na petição inicial que o artigo 13.°, A, não é aplicável, se limita a responder ao fundamento de defesa apresentado pela República Federal da Alemanha e não altera nem a definição nem o fundamento do alegado incumprimento: a principal alegação continua a ser a de que a República Federal da Alemanha violou o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva.

22.
    De acordo com esta disposição, estão sujeitas ao IVA as entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade. O artigo 13.°, A, contém uma lista de isenções obrigatórias e facultativas. A economia da legislação revela claramente que a incidência fundamental do IVA é determinada pelo artigo 2.° (12). A Comissão defende que as actividades de investigação levadas a cabo por universidades estatais constituem prestações de serviços na acepção do artigo 2.°, n.° 1, pelo que devem estar sujeitas ao IVA; porém, uma vez que a legislação alemã isenta essas actividades, a Comissão conclui que a República Federal da Alemanha violou o artigo 2.°, n.° 1. Entendo que essa posição se encontra correctamente formulada, tanto na notificação para cumprimento como no parecer fundamentado.

23.
    Acresce ainda que o facto de a República Federal da Alemanha ter respondido ao parecer fundamentado, justificando em pormenor a legislação nacional controvertida, significa que o parecer - e, consequentemente, a notificação para cumprimento, cujo teor é substancialmente o mesmo, segundo a República Federal da Alemanha - permitiram ao Estado-Membro em causa preparar a sua defesa.

24.
    A acção proposta pela Comissão é, pois, admissível.

Quanto ao mérito

25.
    A Comissão afirma que, em virtude do disposto no artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Directiva, um organismo de direito público como uma universidade estatal é considerado sujeito passivo na medida em que desenvolva uma actividade económica como a prestação de serviços. Ao realizarem investigação encomendada e remunerada nos termos de um contracto, as universidades estatais prestam, pois, serviços e, consequentemente, são sujeitos passivos nos termos do artigo 4.° da Sexta Directiva. Uma vez que o artigo 2.°, n.° 1, prevê que a prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo está sujeita ao IVA, a legislação nacional em apreço viola o artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva.

26.
    A República Federal da Alemanha invoca dois argumentos principais em sua defesa.

27.
    Alega, em primeiro lugar, que a pretensão da Comissão é improcedente, dado que o artigo 2.° da Sexta Directiva não constitui uma obrigação nem uma proibição, mas apenas uma definição da base de incidência e, como tal, não susceptível de violação.

28.
    Em segundo lugar, sustenta que a isenção das actividades de investigação levadas a cabo por universidades estatais se justifica à luz do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva.

Artigo 2.°, n.° 1, da Sexta Directiva

29.
    Não aceito o argumento da República Federal da Alemanha segundo o qual não resulta do artigo 2.° qualquer obrigação de aplicar o IVA. Esse argumento não encontra apoio na jurisprudência do Tribunal de Justiça. O Tribunal já declarou que o artigo 2.° é violado por legislação nacional que isenta de IVA determinadas operações (13) ou por Estados-Membros que não impuseram a cobrança do IVA sobre determinadas operações (14), tendo afirmado expressamente que «segundo o princípio fundamental inerente ao sistema do IVA e resultante dos artigos 2.° da Primeira e Sexta Directivas, o IVA aplica-se em cada transacção de produção ou de distribuição...» (15) e que «uma prestação de serviços [só] é efectuada ‘a título oneroso’, na acepção do artigo 2.°, ponto 1, da Sexta Directiva, e só é assim tributável...» (16).

Artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva

30.
    A República Federal da Alemanha sustenta que as actividades de investigação de universidades estatais preenchem os critérios de isenção previstos no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva. Os serviços ligados à investigação estão estritamente conexos com o ensino superior. Não é possível separar as actividades de investigação da actividade docente nas universidades.

31.
    O artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), exige que os Estados-Membros isentem de IVA «o ensino [...] universitário, [...], e bem assim as prestações de serviços e as entregas de bens com elas estreitamente conexas, efectuadas por organismos de direito público [...]».

32.
    Conforme sublinha a Comissão, essa disposição não faz qualquer referência às actividades de investigação de universidades estatais. Segundo jurisprudência assente, os termos utilizados para designar as isenções visadas pelo artigo 13.° da Directiva são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o imposto sobre o volume de negócios é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo (17), o objectivo do artigo 13.°, A, consiste em isentar de IVA determinadas actividades de interesse geral e esta disposição não exclui todas as actividades desenvolvidas no interesse geral, mas apenas as que são enumeradas e descritas de maneira muito detalhada (18). Uma vez que as actividades de investigação de universidades estatais não são especificamente mencionadas no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), apenas estarão isentas de IVA ao abrigo dessa disposição se forem «estreitamente conexas» com o ensino universitário.

33.
    O Tribunal de Justiça analisou recentemente o âmbito das operações «estreitamente conexas» com a hospitalização e a assistência médica à luz do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea b), da Sexta Directiva, que exige que os Estados-Membros isentem de IVA «a hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente conexas, asseguradas por organismos de direito público [...]». A Comissão tinha alegado que a França violara essa disposição ao sujeitar ao imposto sobre o valor acrescentado as comparticipações fixas para colheitas de amostras para análises médicas. O Tribunal entendeu que a noção de operações «estreitamente conexas» com a hospitalização e a assistência médica «não reclama [...] uma interpretação particularmente restritiva na medida em que a isenção das operações estreitamente conexas com a hospitalização ou a assistência médica se destina a garantir que o benefício destas não se torna inacessível em razão do acréscimo de custos que resultaria se elas próprias, ou as operações com elas estreitamente conexas, fossem sujeitas a IVA» (19). Essa posição aproxima-se da sugestão do advogado-geral N. Fennely, que considerou que «qualquer actividade directa e estreitamente conexa com o fornecimento de assistência médica e hospitalar, independentemente da forma, deve ser considerada abrangida pela isenção» (20).

34.
    O Tribunal de Justiça considerou, assim, relevante a finalidade das operações que se alega serem estreitamente conexas com as actividades isentas. Deve verificar-se, em particular, se o serviço em causa constitui para a clientela um fim em si ou um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador (21).

35.
    A aplicação destes princípios ao caso concreto permite-me concluir que as actividades de investigação encomendadas e remuneradas a universidades estatais não são abrangidas pelo âmbito de aplicação da isenção a favor do ensino superior, prevista no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva.

36.
    A República Federal da Alemanha alega em sua defesa que as actividades de investigação são indissociáveis da actividade docente. Ao contrário de outros estabelecimentos de ensino com uma orientação meramente prática, as universidades necessitam de investigar para ensinar, pois ambas as actividades lhes permitem desenvolver e transmitir conhecimentos. A ligação estreita existente entre as actividades de investigação e a actividade docente nas universidades está reflectida quer na Constituição alemã, que determina que a investigação e o ensino são independentes [frei] (22), quer na Hochschulrahmengesetz (23), segundo a qual a investigação nas universidades contribui para a aquisição de conhecimento científico e para o desenvolvimento da actividade docente e dos estudos (24). A República Federal da Alemanha conclui que a distinção entre actividades de investigação e actividade docente para efeitos de IVA tornaria ineficaz e burocrático separar operações isentas e operações tributáveis.

37.
    Admito que investigação e actividade docente estejam estreitamente conexas na vida universitária. Contudo, importa ter presente que, se o pedido da Comissão for acolhido, isso não significará que todas as actividades de investigação devem ser distinguidas de todas as actividades docentes para todos os efeitos. O IVA deve incidir sobre a prestação de serviços a título oneroso. Por conseguinte, sempre que uma universidade leve a cabo uma investigação a título oneroso, esse serviço está sujeito ao IVA. Ao invés, quando a investigação for feita independentemente de qualquer contrapartida, a questão do IVA não se coloca. Não considero que seja particularmente difícil distinguir serviços remunerados - que serão necessariamente objecto de contratos - de actividades gerais de ensino, incluindo a investigação efectuada sem contrapartida para aprofundar conhecimentos.

38.
    A Comissão afirma ainda que, segundo é do seu conhecimento, todos os Estados-Membros, à excepção da República Federal da Alemanha e da República da Irlanda (25), estabelecem uma distinção, no que respeita aos estabelecimentos do ensino superior, entre actividade docente, isenta de IVA nos termos do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva, e actividades de investigação, sujeitas ao IVA. Não posso, assim, aceitar que a distinção entre actividades isentas e actividades tributáveis seja tão problemática quanto a República Federal da Alemanha alega. Seja como for, é jurisprudência assente que as dificuldades práticas de transposição de uma directiva não podem justificar a sua não aplicação.

39.
    Gostaria ainda de acrescentar que a definição de actividades de investigação no direito nacional é irrelevante: a sujeição a IVA de determinada operação ou a sua isenção não podem depender da respectiva qualificação no direito nacional (26).

40.
    Pelas razões enunciadas, as actividades de investigação remuneradas levadas a cabo pelas universidades estatais não são abrangidas pelo âmbito de aplicação da isenção de IVA para o ensino superior, prevista no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), da Sexta Directiva, pelo que a República Federal da Alemanha violou o artigo 2.° da Directiva. Por conseguinte, não é necessário apreciar o argumento apresentado pela República Federal da Alemanha segundo o qual a exoneração dessas actividades do IVA contribui para a simplificação fiscal e evita custos administrativos: a República Federal da Alemanha admite que este argumento apenas seria relevante se a isenção prevista no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea i), fosse aplicável.

Conclusão

41.
    Tendo em conta o que precede, proponho ao Tribunal de Justiça que:

«1)    declare que a República Federal da Alemanha, ao isentar do imposto sobre o valor acrescentado as actividades de investigação levadas a cabo por estabelecimentos de ensino superior público, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.° da Sexta Directiva IVA;

2)    condene a República Federal da Alemanha nas despesas».


1: -     Língua original: inglês.


2: -     Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO 1997, L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54).


3: -     Lei de 27 de Abril de 1993, BGBl. I, p. 565, 160, com a redacção que lhe foi dada pelo § 4, n.° 5, da Umsatzsteuer-Änderungsgesetz (lei que altera a legislação relativa ao imposto sobre o volume de negócios), de 12 de Dezembro de 1996 (BGBl. 1996, I, p. 1851 e segs.).


4: -     Na sua versão de 19 de Janeiro de 1999, BGBl. I, p. 18.


5: -     Acórdãos de 13 de Dezembro de 1990, Comissão/Grécia (C-347/88, Colect., p. I-4747, n.° 29), e de 20 de Março de 1997, Comissão/Alemanha (C-96/95, Colect., p. I-1653, n.os 22 e 24).


6: -     Acórdão de 25 de Abril de 1996, Comissão/Luxemburgo (C-274/93, Colect., p. I-2019, n.° 11).


7: -     V., por exemplo, o acórdão de 2 de Fevereiro de 1988, Comissão/Bélgica (C-293/85, Colect., p. 305, n.° 13).


8: -     V., por exemplo, o acórdão de 15 de Dezembro de 1982, Comissão/Dinamarca (211/81, Colect., p. 4547, n.° 8).


9: -     Acórdão de 27 de Maio de 1981, Essevi e Salengo (142/80 e 143/80, Recueil, p. 1413, n.° 15).


10: -     Acórdão de 31 de Janeiro de 1984, Comissão/Irlanda (74/82, Recueil, p. 317, n.° 20).


11: -     Acórdão Comissão/Dinamarca, já referido na nota 8, n.° 16.


12: -     Acórdão de 12 de Novembro de 1998, Institute of the motor Industry (C-149/97, Colect., p. I-7053, n.° 18). V. n.° 29 infra para uma análise mais aprofundada dos efeitos do artigo 2.°


13: -     V., por exemplo, acórdãos de 21 de Fevereiro de 1989, Comissão/Itália (203/87, Colect., p. 371, n.° 11 e parte decisória); de 17 de Outubro de 1991, Comissão/Espanha (C-35/90, Colect., p. I-5073, n.° 10 e parte decisória); e de 23 de Maio de 1996, Comissão/Grécia (C-331/94, Colect., p. I-2675, n.° 19 e parte decisória).


14: -     V., por exemplo, os processos sobre portagens: acórdãos de 12 de Setembro de 2000, Comissão/França (C-276/97, Colect., p. I-6251, n.° 49 e parte decisória); de 12 de Setembro de 2000, Comissão/Irlanda (C-358/97, Colect., p. I-6301, n.° 58 e parte decisória); e de 12 de Setembro de 2000, Comissão/Reino Unido (C-359/97, Colect., p. I-6355, n.° 70 e parte decisória).


15: -     Acórdão de 6 de Julho de 1995, BP Supergas/Estado grego (C-62/93, Colect., p. I-1883, n.° 16); v. ainda o n.° 20 das presentes conclusões.


16: -     Acórdão de 3 de Março de 1994, Tolsma (C-16/93, Colect., p. I-743, n.° 14).


17: -     V., contudo, os argumentos do advogado-geral N. Fennely nas suas conclusões no processo Comissão/França (acórdão de 11 de Janeiro de 2001, C-76/99, Colect., p. I-249, n.os 21 a 23), e as minhas conclusões no processo London Zoological Society (C-276/00, apresentadas nesse dia, n.os 17 a 19).


18: -     Acórdão Institute of Motor Industry, já referido na nota 12, n.os 17 e 18, e a jurisprudência aí referida.


19: -     Acórdão Comissão/França, já referido na nota 17, n.° 23.


20: -     N.° 23 das conclusões.


21: -     N.os 24 e 27 do acórdão.


22: -     § 5, n.° 3, da Grundgesetz.


23: -     Já referida na nota 4.


24: -     § 22.


25: -     Igualmente alvo de processo de incumprimento, actualmente na fase da notificação para cumprimento.


26: -     Acórdão de 11 de Janeiro de 2001, Comissão/França, referido na nota 17, n.° 26.