Language of document : ECLI:EU:C:2003:206

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

8 de Abril de 2003 (1)

«Aproximação das legislações - Marcas - Directiva 89/104/CEE - Motivos de recusa de registo - Artigo 3.°, n.° 1, alíneas b), c) e e) - Marca tridimensional constituída pela forma do produto - Carácter distintivo - Interesse geral em preservar a disponibilidade de certos sinais»

Nos processos apensos C-53/01 a C-55/01,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pelo Bundesgerichtshof (Alemanha), destinados a obter, nos procedimentos iniciados por

Linde AG (C-53/01),

Winward Industries Inc. (C-54/01)

e

Rado Uhren AG (C-55/01),

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 3.°, n.° 1, alíneas b), c) e e), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J.-P. Puissochet, R. Schintgen e C. W. A. Timmermans, presidentes de secção, C. Gulmann, D. A. O. Edward, A. La Pergola, V. Skouris, F. Macken (relator), J. N. Cunha Rodrigues e A. Rosas, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,


secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

-    em representação da Linde AG, por H. Messer e C. von Mettenheim, Rechtsanwälte (C-53/01),

-    em representação da Winward Industries Inc., por M. Schaeffer, Rechtsanwalt (C-54/01),

-    em representação da Rado Uhren AG, por D. von Schultz, Rechtsanwalt (C-55/01),

-    em representação do Governo austríaco, par H. Dossi, na qualidade de agente (C-53/01 a C-55/01),

-    em representação do Governo do Reino Unido, por R. Magrill, na qualidade de agente, assistido por D. Alexander, barrister (C-53/01 a C-55/01),

-    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por N. B. Rasmussen e P. F. Nemitz, na qualidade de agentes (C-53/01 a C-55/01),

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Winward Industries Inc., representada por M. Schaeffer, da Rado Uhren AG, representada por D. von Schultz, do Governo do Reino Unido, representado por P. Ormond, na qualidade de agente, assistida por M. Tappin, barrister, e da Comissão, representada por N. B. Rasmussen e P. F. Nemitz, na audiência de 17 de Setembro de 2002,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 24 de Outubro de 2002,

profere o presente

Acórdão

1.
    Por despachos de 23 de Novembro de 2000, que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 8 de Fevereiro de 2001, o Bundesgerichtshof submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação do artigo 3.°, n.° 1, alíneas b), c) e e), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1, a seguir «directiva»).

2.
    Essas questões foram suscitadas no âmbito de três litígios entre, respectivamente, a Linde AG (a seguir «Linde»), a Winward Industries Inc. (a seguir «Winward») e a Rado Uhren AG (a seguir «Rado»), por um lado, e o Deutsches Patent- und Markenamt (Instituto Alemão de Patentes e Marcas), por outro, tendo por objecto o indeferimento por este dos pedidos de registo de marcas das referidas sociedades, por ausência de carácter distintivo.

Enquadramento jurídico

Regulamentação comunitária

3.
    A directiva tem por objecto, segundo o seu primeiro considerando, aproximar as legislações dos Estados-Membros relativas às marcas, a fim de suprimir as disparidades existentes susceptíveis de colocar entraves à livre circulação dos produtos, bem como à livre prestação de serviços, e de falsear as condições de concorrência no mercado comum.

4.
    O artigo 2.° da directiva, intitulado «Sinais susceptíveis de constituir uma marca», determina:

«Podem constituir marcas todos os sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respectiva embalagem, na condição de que tais sinais sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.»

5.
    O artigo 3.° da directiva, que enumera os motivos de recusa ou de nulidade do registo, prevê:

«1.    Será recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efectuados, os registos relativos:

a)    Aos sinais que não possam constituir uma marca;

b)    Às marcas desprovidas de carácter distintivo;

c)    Às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;

d)    Às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio;

e)    Aos sinais constituídos exclusivamente:

    -    pela forma imposta pela própria natureza do produto,

    -    pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico,

    -    pela forma que confira um valor substancial ao produto;

[...]

3.    Não será recusado o registo de uma marca ou este não será declarado nulo nos termos do n.° 1, alíneas b), c) ou d), se, antes da data do pedido de registo e após o uso que dele foi feito, a marca adquiriu um carácter distintivo. Os Estados-Membros podem prever, por outro lado, que o disposto no primeiro período se aplicará também no caso em que o carácter distintivo tiver sido adquirido após o pedido de registo ou o registo.

[...]»

A regulamentação nacional

6.
    Nos termos do § 3 da Gesetz über den Schutz von Marken und sonstigen Kennzeichnungen (lei alemã sobre protecção das marcas e outros sinais distintivos), de 25 de Outubro de 1994 (BGBl. 1994 I, p. 3082, a seguir «Markengesetz»), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1995 e transpôs a directiva para o direito alemão:

«1)    Podem ser registados como marcas todos os sinais, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, os desenhos, as letras, os números, os sinais acústicos e as estruturas tridimensionais, designadamente a forma de um produto ou da sua embalagem, bem como outras formas de apresentação, como as cores e combinações de cores, que sejam adequados para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

2)    Não podem ser protegidos como marcas os sinais exclusivamente constituídos por uma forma

1. imposta pela própria natureza do produto,

2. necessária à obtenção de um resultado técnico,

ou

3. que conceda valor substancial ao produto.»

7.
    Nos termos do § 8, n.° 1, da Markengesetz, será recusado o registo como marcas dos sinais susceptíveis de protecção nos termos do respectivo § 3, que não possam ser objecto de representação gráfica.

8.
    O § 8, n.° 2, da Markengesetz dispõe:

«Será recusado o registo das marcas

1.    desprovidas de todo e qualquer carácter distintivo para os produtos ou serviços,

2.    exclusivamente compostas de sinais ou indicações susceptíveis de, no comércio, servir para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes,

3.    exclusivamente compostas de sinais ou indicações que se tornaram habituais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio para designar o produto ou a prestação de serviços.

[...]»

9.
    O § 8, n.° 3, da Markengesetz prevê que o disposto no n.° 2, pontos 1, 2 e 3, desta disposição não são aplicáveis quando, antes da data da decisão relativa ao registo da marca e após o uso que dela foi feito relativamente aos produtos ou serviços para os quais é pedido o registo, a referida marca se impôs nos meios comerciais interessados.

Litígios no processo principal e questões prejudiciais

10.
    Três litígios estão na origem dos presentes pedidos de decisão prejudicial.

11.
    No primeiro litígio (C-53/01), a Linde pediu o registo de um veículo enquanto marca tridimensional para os produtos «carrinhos de manutenção a motor e outros veículos de manutenção com cabina condutor, em especial empilhadoras de forquilha». Esse pedido foi indeferido pelo Deutsches Patent- und Markenamt, por falta de carácter distintivo.

12.
    O Bundespatentgericht (tribunal federal em matéria de propriedade industrial) (Alemanha) negou provimento ao recurso da Linde da referida decisão de indeferimento por a marca em causa ser totalmente desprovida de carácter distintivo. Salientou, designadamente, que «o comércio apenas vê, em tal representação do produto, o próprio produto, não lhe atribuindo qualquer função distintiva enquanto tal representação se inserir no quadro que lhe é familiar. A forma do produto não ultrapassa o design industrial moderno. Nos seus elementos não técnicos, não se distingue das formas habituais para que o comércio nela veja não apenas uma qualquer variação de formas conhecidas mas também o sinal distintivo de uma empresa».

13.
    No segundo litígio (C-54/01), a Winward pediu o registo de uma lanterna de bolso enquanto marca tridimensional. Esse pedido de registo foi indeferido pelo Deutsches Patent- und Markenamt, com fundamento em a marca para a qual o registo era pedido ser desprovida de carácter distintivo na acepção do § 8, n.° 2, ponto 1, da Markengesetz.

14.
    O Bundespatentgericht afastou também a possibilidade de registo da referida marca por ser desprovida de carácter distintivo. Em sua opinião, «trata-se de uma forma característica de lanterna que é vulgar no mercado, apesar de alguma elegância. Neste sector, o consumidor não verá na forma do produto qualquer indicação no sentido de que provém de determinada empresa. Tendo em conta as diferenças mínimas relativamente aos produtos da concorrência, até mesmo o consumidor atento de forma alguma estará em condições de identificar de memória determinado fabricante».

15.
    O terceiro litígio (C-55/01) diz respeito a um pedido de registo apresentado pela Rado, relativo a uma marca tridimensional já registada enquanto marca internacional sob o n.° 640 196, de que a referida sociedade é proprietária, marca essa que consiste na representação gráfica de um relógio de pulso. Esse pedido foi indeferido pelo Deutsches Patent- und Markenamt, por falta de carácter distintivo e em virtude da existência de um imperativo de disponibilidade («Freihaltebedürfnis»).

16.
    Foi negado provimento ao recurso da referida decisão interposto pela Rado para o Bundespatentgericht. De acordo com este órgão jurisdicional, a representação tridimensional da caixa do relógio com o mostrador, coberto ou não, e um bracelete segmentado da mesma largura da caixa é desprovida, na sua apresentação concreta, do carácter distintivo necessário. O Bundespatentgericht considerou também que «[a] protecção apenas se pode fundar num design original que dê uma indicação quanto à sua origem, permitindo neutralizar o imperativo de disponibilidade da ‘forma elementar’ do produto e a ausência de carácter distintivo. Para justificar a originalidade do produto ou dos seus componentes, cabe acolher um critério sobremaneira estrito, visto que o produto e seus componentes constituem a forma mais importante de os descrever, que a respectiva monopolização cria o risco de entravar os concorrentes na realização dos seus produtos e que o imperativo de disponibilidade é no mínimo admissível».

17.
    Estas três decisões do Bundespatentgericht foram objecto de recurso de anulação para o Bundesgerichtshof.

18.
    De acordo com este órgão jurisdicional, a sorte desses recursos depende da interpretação do artigo 3.°, n.° 1, alíneas b), c) e e), da directiva.

19.
    O Bundesgerichtshof considera não existir qualquer indício susceptível de justificar que o carácter distintivo abstracto previsto no artigo 2.° da directiva deva ser recusado às marcas tridimensionais. Esta disposição exige que a marca seja adequada para distinguir em abstracto os produtos ou serviços. A exigência de carácter distintivo concreto dos produtos ou serviços que são objecto de um pedido de registo decorre do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva.

20.
    O Bundesgerichtshof considera também deverem ser afastados os motivos de recusa de registo constantes do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva. A este respeito, argumenta, no que se refere às marcas cujo registo é pedido pela Linde e pela Rado, que, para além das características gerais, imputáveis à técnica, da forma elementar dos produtos em causa, tais marcas apresentam um conjunto de características formais não impostas exclusivamente pela própria natureza do produto nem por considerações técnicas ou atinentes ao valor do produto. No processo C-54/01 (Winward), o Bundesgerichtshof verifica também que a marca em causa apresenta características que excedem a forma elementar, imputável à técnica, de uma lanterna de bolso, que não são impostas exclusivamente pela própria natureza do produto nem necessárias à consecução de um resultado técnico.

21.
    O órgão jurisdicional de reenvio considera, assim, dever investigar-se se as marcas em causa nos três processos são desprovidas de todo e qualquer carácter distintivo na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, ou se existe motivo de recusa do registo por força da alínea c) da mesma disposição.

22.
    Decorre da decisão de reenvio no processo C-53/01 (Linde) que as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto estão sujeitas a exigências mais estritas em matéria de carácter distintivo do que as demais marcas, por força da jurisprudência do Bundespatentgericht relativa ao § 8, n.° 2, ponto 1, da Markengesetz, a saber, a disposição nacional que corresponde ao artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva. Para justificar esses critérios mais estritos quanto ao carácter distintivo, o Bundespatentgericht funda-se num imperativo de disponibilidade das formas facilmente concebível e na diferença entre, por um lado, o direito das marcas, que tem por vocação referir a proveniência, e, por outro, os direitos que protegem as criações, em especial a legislação em matéria de desenhos e modelos.

23.
    O Bundesgerichtshof argumenta, contudo, quanto ao caráter distintivo, não ver qualquer razão para estabelecer exigências mais estritas relativamente às marcas tridimensionais, constituídas pela forma do próprio produto, do que relativamente às marcas tradicionais. Em sua opinião, tais exigências acrescidas quanto ao carácter distintivo da marca não podem justificar-se por recurso a indícios concretos que sejam testemunha de um interesse do comércio em manter disponível para outras empresas a forma do produto.

24.
    De acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça rejeitou também qualquer diferenciação, quando da apreciação do carácter distintivo de uma marca, em função do interesse estabelecido em manter disponível uma denominação geográfica (v. acórdão de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C-108/95 e C-109/97, Colect., p. I-2779, n.° 48). O interesse em manter uma disponibilidade geral das formas gráficas não deve ter qualquer incidência - sem prejuízo da eventual tomada em consideração dessa exigência no âmbito do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva - sobre o carácter distintivo concreto a que se refere essa mesma disposição, alínea b).

25.
    Quanto à interpretação a dar ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, o Bundesgerichtshof considera que esta disposição é aplicável de forma autónoma a todos os tipos de marcas, ou seja, também às marcas constituídas pela forma do produto, independentemente do artigo 3.°, n.° 1, alínea e). Assim, o imperativo de disponibilidade das formas tridimensionais de produtos deve ser tomado em consideração no âmbito do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), e não por força de uma interpretação lata do n.° 1, alínea e), do mesmo artigo. Para o Bundesgerichtshof, decorre de tal posicionamento que o registo como marca apenas é possível, na maioria dos casos, para as marcas que adquiram carácter distintivo em função do uso delas feito nos termos do artigo 3.°, n.° 3, primeiro período, da directiva.

26.
    Foi nestas condições que o Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais, todas elas redigidas em termos idênticos nos três referidos processos:

«1)    Ao determinar o carácter distintivo na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva [...], nas marcas tridimensionais constituídas pela forma da mercadoria, deve utilizar-se um critério mais estrito do que o aplicado noutros tipos de marcas?

2)    O artigo 3.°, n.° 1, alínea c), em conjugação com a alínea e) do mesmo preceito da directiva, tem um significado autónomo em relação a marcas tridimensionais constituídas pela forma da mercadoria? Em caso afirmativo, ao examinar o artigo 3.°, n.° 1, alínea c) - e, por outro lado, a alínea e) -, deve ser tido em consideração o interesse do comércio em manter a livre disponibilidade da forma do produto, de tal modo que o registo, em princípio, seja excluído e só seja possível, em regra, no caso de marcas que preenchem os requisitos previstos no artigo 3.°, n.° 3, primeiro período, da directiva?»

27.
    Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 15 de Março de 2001, os três processos foram apensos para efeitos de processo escrito, audiência e acórdão.

Quanto à primeira questão

28.
    Na primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, para apreciar o caráter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, de uma marca tridimensional constituída pela forma do produto, cabe aplicar um critério mais estrito do que o utilizado para outros tipos de marcas.

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

29.
    A Winward e a Linde consideram que, à luz do carácter distintivo, a protecção das marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto não pode estar sujeita a condições mais exigentes do que as aplicáveis a outros tipos de marcas.

30.
    Para a Winward, o Tribunal de Justiça recusou já deduzir do imperativo da disponibilidade condições suplementares em matéria de carácter distintivo (v., nesse sentido, acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 48).

31.
    A Winward e a Rado argumentam dever utilizar-se um critério de análise uniforme para todos os tipos de marcas, a fim de se determinar se um sinal é adequado para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas. O artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva é a única disposição derrogatória expressa para as marcas tridimensionais. Pelo contrário, o n.° 1, alínea b), do referido artigo não estabelece qualquer distinção entre, por um lado, as marcas constituídas por uma forma e, por outro, os outros tipos de marca. Para apreciar o carácter distintivo concreto de uma marca constituída por uma forma, não cabe, pois, aplicar critérios mais rigorosos do que quando estão em causa outros tipos de marcas.

32.
    O Governo austríaco entende dever considerar-se, quando a forma de um sinal tridimensional permanece conforme à expectativa do consumidor quanto à forma dada ao produto ou à embalagem, que os meios interessados não verão em tal forma indicação susceptível de identificar o produto como proveniente de determinada empresa. Para esse governo, não se trata, a este respeito, de definir um critério mais estrito para apreciar o carácter distintivo das marcas tridimensionais, devendo atender-se ao facto de a variedade de formas atribuível aos produtos e respectivos acondicionamentos ser susceptível, em determinados sectores do comércio, de tornar mais difícil a tarefa dos referidos meios para reconhecer a forma de um produto ou de um acondicionamento enquanto marca.

33.
    O Governo do Reino Unido considera que o artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva não estabelece distinção entre as marcas constituídas pela forma do produto e os demais sinais susceptíveis de constituir uma marca na acepção do artigo 2.° da mesma directiva. O artigo 3.°, n.° 1, alínea e), desta é a única disposição que incide especificamente sobre o registo dos sinais tridimensionais. Correctamente interpretada, a referida directiva atende plenamente ao interesse que representa para o comércio o facto de as formas dos próprios produtos se manterem disponíveis para serem usadas pelos concorrentes.

34.
    Contudo, tanto o Governo do Reino Unido como o Governo austríaco argumentam que, apesar de o critério de apreciação do carácter distintivo ser idêntico para todas as marcas, na prática, uma empresa terá provavelmente mais dificuldades em demonstrar o carácter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, quando se trate de uma marca tridimensional constituída pela forma do produto do que quando esteja em causa uma marca verbal ou figurativa.

35.
    Ora, tratando-se de marcas verbais ou figurativas, o consumidor médio está habituado a que palavras, logotipos e sinais idênticos sejam susceptíveis de desempenhar um papel importante na indicação da origem comercial dos produtos em que são apostos. Pelo contrário, em numerosos produtos, os seus principais traços são influenciados pela respectiva função, e produtos do mesmo tipo apresentam, por essa razão, inúmeras similitudes, pelo que nenhuma forma se singulariza em especial. Além disso, o carácter distintivo da forma deve também ser apreciado à luz das variações normais do produto em causa. Sendo que os diferentes traços da forma resultam de variações normais do produto, o Governo do Reino Unido argumenta ser improvável que o consumidor médio atribua a tal facto o significado de uma marca.

36.
    A Comissão sustenta que, para além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, que exclui o registo da forma de um produto caso a empresa possa monopolizar essa forma em prejuízo dos seus concorrentes ou dos consumidores, a directiva não contém critérios específicos quanto às formas que são objecto de um pedido de registo. Para apreciar o carácter distintivo de uma marca, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, não cabe, pois, aplicar um critério mais estrito às marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto do que o utilizado para outros tipos de marcas.

Apreciação do Tribunal de Justiça

37.
    Recorde-se, antes de mais, que o artigo 2.° da directiva prevê que todos os sinais podem constituir marcas na condição de serem, por um lado, susceptíveis de representação gráfica e, por outro, adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

38.
    Daqui decorre que um sinal tridimensional que representa a forma de um produto pode, em princípio, constituir uma marca na condição de estarem preenchidos esses dois critérios (v. acórdão de 18 de Junho de 2002, Philips, C-299/99, Colect., p. I-5475, n.° 73).

39.
    Em seguida, por força da regra prevista no artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, será recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efectuados, os registos relativos às marcas desprovidas de carácter distintivo.

40.
    O carácter distintivo de uma marca na acepção da referida disposição significa que esta marca é adequada a identificar o produto para o qual é pedido o registo como sendo proveniente de uma empresa determinada e, portanto, a distinguir esse produto dos das outras empresas (v. acórdão Philips, já referido, n.° 35).

41.
    Além disso, o carácter distintivo de uma marca deve ser apreciado relativamente, por um lado, aos produtos ou serviços para os quais foi pedido o respectivo registo e, por outro, à percepção dos meios interessados, constituídos pelos consumidores desses produtos ou serviços. Trata-se, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, da presumível percepção dum consumidor médio da categoria de produtos ou serviços em causa, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido (v. acórdãos de 16 de Julho de 1998, Gut Springenheide e Tusky, C-210/96, Colect., p. I-4657, n.° 31, e Philips, já referido, n.° 63).

42.
    Por último, o Tribunal de Justiça salientou, no n.° 48 do acórdão Philips, já referido, que os critérios de apreciação do carácter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto não são diferentes dos aplicáveis às restantes categorias de marcas. Com efeito, o artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva não faz qualquer distinção entre categorias diferentes de marcas, quando da apreciação do respectivo carácter distintivo.

43.
    Só o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva individualiza explicitamente determinados sinais constituídos pela forma de um produto, enumerando os motivos específicos de recusa do registo de tais sinais. Por força desta disposição, é recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efectuados, os registos relativos aos sinais constituídos exclusivamente pela forma imposta pela própria natureza do produto, pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma que confere um valor substancial ao produto.

44.
    Sendo o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva um obstáculo preliminar capaz de impedir que um sinal constituído exclusivamente pela forma de um produto possa ser registado, daqui resulta que, se um único dos critérios mencionados nesta disposição estiver preenchido, tal sinal não pode ser registado enquanto marca. Além disso, este nunca poderá adquirir um carácter distintivo pelo uso que dele tenha sido feito nos termos do n.° 3 da referida disposição (v. acórdão Philips, já referido, n.os 74 a 76).

45.
    Contudo, na hipótese de esse obstáculo preliminar ter sido afastado, mantém-se necessário verificar se deve ser recusado o registo de um sinal tridimensional constituído pela forma de um produto, por força de um dos vários motivos de recusa mencionados na referida disposição, alíneas b) a d).

46.
    No que se refere ao artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, saliente-se que nem a economia da directiva nem a redacção da referida disposição indicam que devam ser aplicados critérios mais estritos do que os utilizados para as outras categorias de marcas quando da apreciação do carácter distintivo de uma marca tridimensional constituída pela forma do próprio produto.

47.
    Com efeito, como decorre do n.° 40 do presente acórdão, o critério do carácter distintivo exige, relativamente a qualquer marca, que ela seja adequada a identificar o produto como proveniente de determinada empresa e, assim, a distingui-lo dos das demais empresas.

48.
    Não é menos verdade, como argumentam a justo título os Governos austríaco e do Reino Unido, bem como a Comissão, que, na prática, o carácter distintivo de uma marca constituída pela forma de um produto pode, à luz dos critérios recordados nos n.os 40 e 41 do presente acórdão, revelar-se mais difícil de ser provado do que o de uma marca verbal ou figurativa. Esta dificuldade, que pode estar na origem da recusa de registo de marcas dessa natureza, não exclui, contudo, que elas possam adquirir carácter distintivo em função do uso que delas é feito e serem, em consequência, registadas como marcas com fundamento no artigo 3.°, n.° 3, da directiva.

49.
    Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que, para apreciar o caráter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, de uma marca tridimensional constituída pela forma do produto, não cabe aplicar um critério mais estrito do que o utilizado para outros tipos de marcas.

Quanto à segunda questão

50.
    Na primeira parte da segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), desta reveste também significado para as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

51.
    No que se refere à segunda parte da segunda questão, cabe observar que ela se refere a duas hipóteses distintas consoante a resposta que o Tribunal de Justiça considere dever dar à primeira parte desta questão.

52.
    Na hipótese de, além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, a alínea c) desta disposição revestir também significado para as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, para efeitos de interpretação desta última disposição, cabe atender ao interesse geral do comércio em manter disponível a forma do produto, de tal forma que o registo seja em princípio excluído, sendo apenas possível, regra geral, para as marcas que preencham as condições estabelecidas no artigo 3.°, n.° 3, primeiro período, da directiva.

53.
    Em caso de resposta negativa à primeira parte da segunda questão, a saber, na hipótese de unicamente o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva ser aplicável às marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, contudo, se, para efeitos de interpretação da disposição, cabe atender também ao interesse geral do comércio em manter disponível a forma do produto.

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

54.
    A Linde sustenta que, para além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, o n.° 1, alínea c), da mesma disposição mantém significado autónomo relativamente às marcas tridimensionais. O imperativo de disponibilidade, que atenda às necessidades concretamente verificadas da concorrência, deve ser examinado à luz desta última disposição, após verificação do facto de o imperativo absoluto de disponibilidade decorrente do referido artigo 3.°, n.° 1, alínea e), não ser obstáculo ao registo da marca tridimensional depositada.

55.
    A Linde entende dever considerar-se a existência de tal imperativo de disponibilidade apenas relativamente a determinadas formas, impostas por necessidades técnicas ou estéticas decorrentes da natureza do produto ou da sua embalagem, a saber, no âmbito de aplicação do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva. No que se refere a outras formas de produtos e embalagens, basta examinar caso a caso o carácter distintivo e o imperativo de disponibilidade.

56.
    A Winward considera que os obstáculos absolutos ao registo, enumerados no artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, se aplicam exclusivamente quando exista um imperativo absoluto de disponibilidade da forma depositada. A referida disposição não enuncia de forma exaustiva as regras de impossibilidade de apropriação dos sinais tridimensionais constituídos pela forma de um produto, não devendo ser de aplicação quando existam, para além da forma cujo registo é pedido, outras formas que permitam atingir o resultado técnico esperado.

57.
    Para a Winward, o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva é aplicável independentemente da alínea e) da mesma disposição, inclusive quanto a marcas que representam a forma do produto, mas é no âmbito desta última disposição que cabe verificar se existe um imperativo de disponibilidade.

58.
    Por seu lado, a Rado argumenta que, apesar de as alíneas c) e e) do n.° 1 do artigo 3.° da directiva prosseguirem objectivos similares, a saber, impedir a apropriação exclusiva de formas de que o comércio tem necessidade para o design de produtos idênticos, essas duas disposições são aplicáveis independentemente uma da outra. Contudo, em sua opinião, o âmbito de aplicação da alínea c) do referido artigo vai para além do da alínea e) da mesma disposição.

59.
    A Rado sustenta, à luz do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, que as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto estão sujeitas aos mesmos critérios de apreciação que os demais tipos de marcas e que não cabe acolher uma interpretação restritiva no sentido de o interesse em preservar a disponibilidade de tais marcas tridimensionais impedir em princípio o respectivo registo.

60.
    O Governo do Reino Unido argumenta que o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva constitui a «primeira linha de defesa» na luta para impedir a monopolização injustificada, através do direito das marcas, das formas dos próprios produtos. O artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva reveste significado autónomo relativamente à alínea e) da mesma disposição, excluindo o registo de sinais que não podem ser por esta excluídos. Contudo, o Governo do Reino Unido sustenta que, caso o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva seja interpretado de forma suficientemente útil, é provável que a alínea c) da mesma disposição apenas seja chamada a ser aplicada de forma limitada. Seja como for, o interesse do comércio em manter as formas dos produtos disponíveis para uso é salvaguardada pela aplicação dessas duas disposições da directiva.

61.
    A Comissão argumenta que a redacção da directiva de forma alguma indica que só o artigo 3.°, n.° 1, alínea e), deve ser aplicado às marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto. Em sua opinião, tais marcas, caso não seja recusado o respectivo registo por força dessa disposição, mantêm-se contudo sujeitas aos motivos de recusa mencionados no artigo 3.°, n.° 1, alínea c). Esta última disposição deve ser aplicada de forma autónoma quando do exame de um pedido de registo de marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

62.
    A Comissão recorda que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a aplicação do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva não depende da existência de um imperativo de disponibilidade concreto, actual ou sério na acepção da jurisprudência alemã (v., neste sentido, acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 35). Para além do exame das condições precisas enumeradas nessa disposição, não há que tomar em consideração um imperativo de disponibilidade mais amplo. Com efeito, para a Comissão, o interesse do comércio em manter disponíveis determinadas formas consta já do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva.

Apreciação do Tribunal de Justiça

63.
    No que se refere à primeira parte da segunda questão, saliente-se que, de acordo com o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, será recusado o registo de marcas descritivas, a saber, as constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar as características dos produtos ou dos serviços relativamente aos quais o registo é pedido.

64.
    Por força do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, será recusado o registo dos sinais constituídos exclusivamente pela forma imposta pela própria natureza do produto, pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma que confira um valor substancial ao produto.

65.
    Estes motivos específicos de recusa de registo de determinados sinais constituídos pela forma do produto, expressamente mencionados no artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, constituem, como decorre do n.° 44 do presente acórdão, um obstáculo preliminar susceptível de impedir que tais sinais possam ser registados (v. acórdão Philips, já referido, n.os 74 e 76).

66.
    Contudo, quando tal obstáculo preliminar tenha sido afastado, não decorre da redacção do artigo 3.°, n.° 1, da directiva nem da própria economia desta disposição que os demais motivos de recusa de registo constantes dessa disposição, incluindo os da alínea c) do n.° 1, não possam ser igualmente aplicados aos pedidos de registo de marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

67.
    Com efeito, decorre claramente do artigo 3.°, n.° 1, da directiva que cada um dos motivos de recusa de registo mencionados nessa disposição é independente dos demais, exigindo exame separado.

68.
    Daqui decorre que, caso o registo de um sinal tridimensional constituído pela forma do produto não seja recusado nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, pode contudo ser recusado o respectivo registo se tal sinal estiver abrangido por uma ou várias das categorias mencionadas nas alíneas b) a d) da mesma disposição.

69.
    No que se refere, em especial, ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, nada, em princípio, se opõe à aplicabilidade desta disposição ao pedido de registo de uma marca tridimensional constituída pela forma de um produto. Com efeito, a referência às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir para designar as características do produto ou da prestação de serviço, para além das expressamente enumeradas na referida disposição, é suficientemente ampla para abranger uma grande variedade de marcas, incluindo as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

70.
    Tendo em conta o que precede, cabe responder à primeira parte da segunda questão que, para além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), deste diploma reveste também significado para as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

71.
    No que se refere à segunda parte da segunda questão, recorde-se a título liminar que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, cabe interpretar os diferentes motivos de recusa de registo enumerados no artigo 3.° da directiva à luz do interesse geral subjacente a cada um deles (v. acórdãos, já referidos, Windsurfing Chiemsee, n.os 25 a 27, e Philips, n.° 77).

72.
    No que se refere, mais precisamente, à segunda hipótese considerada pelo órgão jurisdicional de reenvio, relativa ao artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da directiva, saliente-se que, para determinados sinais tridimensionais constituídos pela forma de um produto, o Tribunal de Justiça julgou já que a ratio dos motivos de recusa do registo previstos nessa disposição consiste em evitar que a protecção do direito da marca leve a conferir ao seu titular um monopólio sobre soluções técnicas ou características utilitárias de um produto, que possam ser procuradas pelo utilizador nos produtos dos concorrentes (v. acórdão Philips, já referido, n.os 78 a 80).

73.
    De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva prossegue um fim de interesse geral, que exige que os sinais ou indicações descritivas das características dos produtos ou serviços para as quais é pedido o registo possam ser livremente utilizados por todos, nomeadamente como marcas colectivas ou em marcas complexas ou gráficas. Esta disposição impede, portanto, que tais sinais ou indicações sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca (v., neste sentido, acórdão Windsurfing Chiemsee, já referido, n.° 25).

74.
    O interesse geral que subjaz ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva implica que todas as marcas exclusivamente constituídas por sinais ou indicações que possam servir para designar as características de um produto ou de um serviço, na acepção dessa disposição, devem estar à livre disposição de todos, não podendo ser objecto de registo, sob reserva da aplicação do n.° 3 da mesma disposição.

75.
    A autoridade competente chamada a aplicar às referidas marcas o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva está obrigada a determinar, relativamente aos produtos ou aos serviços para os quais tenha sido pedido o registo, à luz do exame concreto de todos os elementos pertinentes que caracterizam o referido pedido e, designadamente, à luz do referido interesse geral, se o motivo de recusa de registo previsto na dita disposição se aplica ao caso em análise. Tal exame concreto é também exigido face a um pedido de registo de uma marca tridimensional constituída pela forma de um produto. Pelo contrário, a referida autoridade não pode opor a tal pedido uma recusa de princípio.

76.
    Daqui decorre que uma marca tridimensional constituída pela forma de um produto deve, como qualquer outra categoria de marcas, ser sujeita ao exame da sua conformidade com o conjunto de critérios enumerados nas alíneas b) a e) do artigo 3.°, n.° 1, da directiva, devendo estes ser interpretados e aplicados, em cada caso, à luz do interesse geral que subjaz a cada um deles.

77.
    Tendo em conta o que precede, cabe responder, no que se refere à segunda parte da segunda questão, que, quando do exame, em cada caso concreto, do motivo de recusa de registo previsto no artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, há que atender ao interesse geral que subjaz a essa disposição, a saber, que todas as marcas tridimensionais constituídas pela forma de um produto e compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir para designar as características de um produto ou de um serviço, na acepção dessa disposição, devem estar à livre disposição de todos, não podendo ser objecto de registo, sob reserva da aplicação do artigo 3.°, n.° 3, da referida directiva.

Quanto às despesas

78.
    As despesas efectuadas pelos Governos austríaco e do Reino Unido e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Bundesgerichtshof, por despachos de 23 de Novembro de 2000, declara:

1.
    Para apreciar o caráter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, de uma marca tridimensional constituída pela forma do produto, não cabe aplicar um critério mais estrito do que o utilizado para outros tipos de marcas.

2.
    Para além do artigo 3.°, n.° 1, alínea e), da Primeira Directiva 89/104, o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), deste diploma reveste também significado para as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto.

    Quando do exame, em cada caso concreto, do motivo de recusa de registo previsto no artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Primeira Directiva 89/104, há que atender ao interesse geral que subjaz a essa disposição, a saber, que todas as marcas tridimensionais constituídas pela forma de um produto e compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir para designar as características de um produto ou de um serviço, na acepção dessa disposição, devem estar à livre disposição de todos, não podendo ser objecto de registo, sob reserva da aplicação do artigo 3.°, n.° 3, da referida directiva.

Rodríguez Iglesias
Puissochet
Schintgen

Timmermans

Gulmann
Edward

La Pergola

Skouris
Macken

Cunha Rodrigues

Rosas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Abril de 2003.

O secretário

O presidente

R. Grass

G. C. Rodríguez Iglesias


1: Língua do processo: alemão.