Language of document : ECLI:EU:C:2012:400

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 28 de junho de 2012 (1)

Processo C‑215/11

Iwona Szyrocka

contra

SiGer Technologie GmbH

[pedido de decisão prejudicial, apresentado pelo Sąd Okręgowy we Wrocławiu (Tribunal distrital de Wrocław) (Polónia)]

«Procedimento europeu de injunção de pagamento — Regulamento n.° 1896/2006 — Requisitos formais do pedido — Período de tempo durante o qual podem ser exigidos juros de mora — Período até à data do pagamento»





I —    Introdução

1.        No presente processo o Sąd Okręgowy we Wrocławiu submeteu ao Tribunal de Justiça um pedido prejudicial sobre a interpretação do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, que cria um procedimento europeu de injunção de pagamento (a seguir «regulamento») (2).

II — Quadro normativo

A —    Legislação comunitária

2.        O artigo 1.° do regulamento dispõe:

«1. O presente regulamento tem por objetivo:

a)      Simplificar, acelerar e reduzir os custos dos processos judiciais em casos transfronteiriços de créditos pecuniários não contestados, através da criação de um procedimento europeu de injunção de pagamento; e

b)      Permitir a livre circulação das injunções de pagamento europeias em todos os Estados‑Membros, através do estabelecimento de normas mínimas cuja observância torne desnecessário qualquer procedimento intermédio no Estado‑Membro de execução anterior ao reconhecimento e à execução.

2. O presente regulamento não obsta a que um requerente reclame um crédito na aceção do artigo 4.° através da instauração de outro procedimento previsto na legislação de um Estado‑Membro ou no direito comunitário.»

3.        O artigo 4.° do regulamento dispõe:

«É criado o procedimento europeu de injunção de pagamento para a cobrança de créditos pecuniários líquidos exigíveis na data em que é apresentado o requerimento de injunção de pagamento europeia.»

4.        O artigo 7.° do regulamento dispõe:

«1. O requerimento de injunção de pagamento europeia deve ser apresentado utilizando o formulário normalizado A, constante do Anexo I.

2. O requerimento deve incluir:

[…];

b)      O montante do crédito, incluindo o crédito principal e, se for caso disso, os juros, as sanções contratuais e os custos;

c)      Se forem reclamados juros sobre o crédito, a taxa de juro e o período em relação ao qual os juros são reclamados, salvo se o capital for automaticamente acrescido de juros legais por força da legislação do Estado‑Membro de origem;

d)      A causa de pedir, incluindo uma descrição das circunstâncias invocadas como fundamento do crédito e, se necessário, dos juros reclamados;

e)      Uma descrição das provas que sustentam os pedidos;

[…]

3. No requerimento, o requerente deve declarar que as informações prestadas são verdadeiras tanto quanto, em consciência, seja do seu conhecimento e que está ciente de que a prestação deliberada de informações falsas pode dar lugar à aplicação das sanções adequadas previstas na legislação do Estado‑Membro de origem.

[…]».

5.        O artigo 8.° do regulamento prevê:

«O tribunal ao qual é apresentado um requerimento de injunção de pagamento europeia analisa, no prazo mais curto possível, se estão preenchidos os requisitos estabelecidos nos artigos 2.°, 3.°, 4.°, 6.° e 7.° e se o pedido parece fundamentado. Esta análise pode assumir a forma de um procedimento automatizado.»

6.        O artigo 9.° do regulamento dispõe assim:

«1. Se não estiverem preenchidos os requisitos previstos no artigo 7.°, e a menos que o pedido seja manifestamente infundado ou que o requerimento seja inadmissível, o tribunal deve conceder ao requerente a possibilidade de completar ou retificar o requerimento. O tribunal utiliza, para o efeito, o formulário normalizado B, constante do Anexo II.

2. Quando convidar o requerente a completar ou retificar o requerimento, o tribunal deve fixar o prazo que considerar adequado às circunstâncias, podendo, se assim o entender, prorrogar esse prazo.»

7.        O artigo 12.° do regulamento estabelece:

«1. Se estiverem preenchidos os requisitos referidos no artigo 8.°, o Tribunal emite uma injunção de pagamento europeia no prazo mais curto possível, utilizando para o efeito o formulário normalizado E constante do Anexo V.

[…]

3. Na injunção de pagamento europeia, o requerido é avisado de que pode optar entre:

a)      Pagar ao requerente o montante indicado na injunção;

ou

b)      Deduzir oposição à injunção de pagamento mediante apresentação de uma declaração de oposição, que deve ser enviada ao tribunal de origem […].

4. Na injunção de pagamento europeia, o requerido é informado de que:

a)      A injunção foi emitida exclusivamente com base nas informações prestadas pelo requerente e não verificadas pelo tribunal;

b)      A injunção de pagamento adquirirá força executiva, a menos que seja apresentada uma declaração de oposição junto do tribunal ao abrigo do artigo 16.°;

c)      Se for apresentada declaração de oposição, a ação prossegue nos tribunais competentes do Estado‑Membro de origem, de acordo com as normas do processo civil comum, a menos que o requerente tenha expressamente solicitado que, nesse caso, se ponha termo ao processo.

[…]».

8.        O n.° 3 do artigo 16.° do regulamento prevê:

«3. O requerido deve indicar na declaração de oposição que contesta o crédito em causa, não sendo obrigado a especificar os fundamentos da contestação.»

9.        O artigo 17.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do regulamento especifica:

«1. Se for apresentada declaração de oposição no prazo previsto no n.° 2 do artigo 16.°, a ação prossegue nos tribunais competentes do Estado‑Membro de origem, de acordo com as normas do processo civil comum, a menos que o requerente tenha expressamente solicitado que, nesse caso, se ponha termo ao processo.»

10.      O artigo 25.° do regulamento dispõe:

«1. A soma das custas judiciais do procedimento europeu de injunção de pagamento e do processo civil comum subsequente à declaração de oposição à injunção de pagamento europeia num Estado‑Membro não deve ser superior às custas judiciais de um processo civil comum que não seja precedido do procedimento europeu de injunção de pagamento nesse Estado‑Membro.

2. Para efeitos do presente regulamento, as custas judiciais incluem as custas e os encargos a pagar ao tribunal, cujo montante é fixado nos termos da lei nacional.»

11.      O artigo 26.° do regulamento sob a epígrafe «Articulação com o direito processual nacional», estabelece:

«As questões processuais não reguladas expressamente pelo presente regulamento regem‑se pela lei nacional.»

B —    Lei nacional

12.      No seu despacho de reenvio, o Sąd Okręgowy we Wrocławiu citou numerosas disposições do Código de Processo Civil polaco (a seguir «C.P.C.») que podem ser relevantes no presente litígio, entre os quais os artigos 126.°, 128.° e 187.°, n.° 1, que preveem o conteúdo dos atos processuais e dos pedidos em juízo e indicam os atos a apresentar para efeitos de notificação à outra parte, bem como os artigos 130.°, n.° 1, e 394.°, n.° 1, ponto 1, que regulam a tramitação a seguir em caso de vícios de forma que inquinam o pedido apresentado e as vias de recurso contra decisões dos tribunais na matéria.

13.      Além disso, o órgão jurisdicional nacional mencionou os artigos 481.°, n.° 1, do Código Civil polaco, com base no qual se o devedor efetuar tardiamente o pagamento de uma prestação pecuniária, o credor pode exigir juros pela mora, mesmo que não tenha sofrido prejuízos e o atraso resultar de circunstâncias não imputáveis ao devedor (3), e 190.° do C.P.C., que permite reclamar em juízo as prestações vincendas quando a relação jurídica que vincula as partes a isso se não opõe.

III — Matéria de facto e questões prejudiciais

14.      A requerente, Iwona Szyrocka, residente na Polónia, apresentou em 23 de fevereiro de 2011, no Sąd Okręgowy we Wrocławiu, um requerimento de injunção de pagamento europeia contra a SiGer Technologie GmbH, com sede em Tangermünde (Alemanha).

15.      No âmbito desse procedimento foram suscitadas as seguintes questões:

¾        O exame que antecede a emissão de injunção de pagamento nos termos do artigo 8.° do regulamento inclui também uma apreciação do respeito dos requisitos formais previstos pela lei interna do Estado onde o pedido é apresentado, ou apenas dos requisitos enumerados no regulamento em causa ? (4);

¾        O crédito sobre os juros de mora deve ser exigível a partir da data em que é apresentado o pedido de injunção europeia de pagamento?;

¾        A parte deve indicar sempre no pedido o montante dos juros e se pode pedir os juros vincendos, isto é, os juros calculados até ao momento do pagamento do crédito pecuniário objeto do pedido?;

¾        Sob que modalidade deve o tribunal conceder esses juros, atendendo à redação do formulário normalizado (E) relativo à injunção de pagamento europeia (Anexo V ao Regulamento n.° 1896/2006)?

16.      O órgão jurisdicional de reenvio, considerando que subsistem dúvidas quanto à interpretação do Regulamento n.° 1896/2006, submeteu ao Tribunal de Justiça as oito questões prejudiciais seguintes:

«1.      Deve o artigo 7.° do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, que cria um procedimento europeu de injunção de pagamento, ser interpretado no sentido de que:

a)      regulamenta de modo exaustivo todos os requisitos que um requerimento de injunção de pagamento europeia deve preencher, ou no sentido de que

b)      apenas define as normas mínimas estabelecidas para esse requerimento e que, para as questões não reguladas nesse diploma, é aplicável a lei nacional?

2.      Em caso de resposta afirmativa à questão 1, alínea b), se o requerimento não preencher os requisitos formais exigidos pela legislação do Estado‑Membro [por exemplo, se não for anexada uma cópia do requerimento destinada à outra parte ou (indicado o valor da causa)], deve pedir‑se ao requerente que complete o requerimento ao abrigo da lei nacional nos termos do artigo 26.° do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 ou nos termos do artigo 9.° do mesmo regulamento?

3.      Deve o artigo 4.° do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 ser interpretado no sentido de que os requisitos do crédito pecuniário nele referidos, isto é, tratar‑se de um crédito líquido e exigível na data em que é apresentado o requerimento de injunção de pagamento europeia, se referem exclusivamente ao crédito principal ou também ao crédito de juros de mora?

4.      Deve o artigo 7.°, n.° 2, alínea c) do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 ser interpretado no sentido de que, no procedimento europeu de injunção de pagamento, se a legislação do Estado‑Membro de origem não previr o acréscimo automático dos juros, se podem reclamar, além do crédito principal:

a)      totalidade dos juros, incluindo os juros vincendos (calculados entre uma data de vencimento precisamente determinada e um dia de pagamento indeterminado, por exemplo, ‘a contar de 20 de março de 2011 até à data do pagamento’);

b)      apenas os juros contados entre uma data de vencimento precisamente determinada e a data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção de pagamento;

c)      apenas os juros contados entre uma data de vencimento precisamente determinada e a data em que é apresentado o requerimento?

5.      Em caso de resposta afirmativa à questão 4, alínea a), como deve ser formulada nos termos do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 a decisão do tribunal sobre os juros da injunção de pagamento?

6.      Em caso de resposta afirmativa à questão 4, alínea b), quem deve indicar o montante dos juros: o requerente ou o tribunal oficiosamente?

7.      Em caso de resposta afirmativa à questão 4, alínea c), o requerente tem o dever de indicar no requerimento o montante dos juros calculados?

8.      Se o requerente não calcular os juros reclamados até à data em que é apresentado o requerimento, o tribunal tem a obrigação de os calcular oficiosamente, ou deve solicitar ao requerente que complete o requerimento nos termos do artigo 9.° do Regulamento (CE) n.° 1896/2006?»

IV — Tramitação no Tribunal de Justiça

17.      Apresentaram observações escritas a Comissão e os Governos austríaco, português, do Reino Unido, finlandês e polaco.

18.      Na audiência de 18 de abril de 2012 intervieram a Comissão e os Governos finlandês e polaco.

V —    Quanto à primeira questão prejudicial

19.      Com a primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que esclareça se os requisitos formais que o pedido de injunção de pagamento europeia deve respeitar são apenas os indicados no artigo 7.° do regulamento ou se, pelo contrário, há que atender a outros requisitos impostos pela legislação nacional.

20.      O exame do texto do regulamento evidencia que o procedimento que visa obter uma injunção de pagamento europeia e os eventuais procedimentos nacionais análogos são independentes.

21.      Esta constatação decorre, em primeiro lugar, do facto de o recurso ao processo europeu ser, nos termos do artigo 1.° e do décimo considerando do regulamento, um meio suplementar e facultativo à disposição do requerente, que não substitui nem harmoniza os mecanismos de cobrança de créditos não contestados previstos no direito interno, mas que está disponível como meio suplementar de proteção dos seus direitos.

22.      Assim, não está vedada ao interessado a obtenção de uma injunção de pagamento graças a um outro procedimento previsto pela legislação de um Estado‑Membro ou pelo direito comunitário.

23.      A consideração a que se refere o n.° 20 é reforçada, em segundo lugar, pelo décimo sexto considerando, nos termos do qual o tribunal emite a injunção apenas com base nas informações constantes no formulário anexo ao regulamento, redigido com os elementos indicados no artigo 7.°, sem que a legislação europeia preveja a possibilidade de completar o seu conteúdo recorrendo a fontes externas.

24.      O uso de formulários normalizados para gerir as várias fases do procedimento está previsto no décimo primeiro considerando para facilitar o acesso ao referido procedimento, reduzindo os custos e os prazos e para harmonizar a sua gestão.

25.      Deste modo, torna‑se ainda mais evidente a autonomia do procedimento europeu relativamente aos procedimentos nacionais, uma vez que o recurso a esses formulários permite evitar as formalidades e as disparidades decorrentes das normas nacionais, bem como estabelecer um instrumento processual em princípio idêntico em todo o território da União e, portanto, diferente daqueles procedimentos análogos em vigor nos Estados‑Membros.

26.      Por último, o artigo 26.° do regulamento confirma também a autonomia do procedimento europeu relativamente aos procedimentos nacionais, uma vez que dispõe que o direito nacional só se aplica às questões processuais não regulados expressamente no referido regulamento.

27.      Assim, quando o legislador decidiu, em relação aos aspetos concretos do procedimento, aplicar a regulamentação nacional paralelamente à do regulamento, fê‑lo expressamente através de remissões para a referida regulamentação (5).

28.      O disposto no artigo 26.° e as remissões mencionadas no n.° 27 e na nota 5 supra não teriam sentido se realmente se tivesse pretendido completar as disposições do regulamento, incluindo nos aspetos que este regula, pela regulamentação dos Estados‑Membros, uma vez que, em tal caso, não seria necessário especificar que a lei nacional só se pode aplicar às questões processuais não reguladas no regulamento, nem indicar as situações em que, pelo contrário, se deve aplicar o direito dos Estados‑Membros.

29.      A autonomia do procedimento comunitário face ao procedimento nacional também fica patente se considerarmos o objetivo com o qual o regulamento foi adotado, como decorre dos seus artigos e da exposição de motivos.

30.      Com efeito, o artigo 1.°, n.° 1, ao indicar expressamente o objetivo do regulamento esclarece que este (6), ao instituir um procedimento de injunção de pagamento, visa simplificar, acelerar e reduzir os custos dos processos judiciais em casos transfronteiriços de créditos pecuniários não contestados (7), e permitir a livre circulação das injunções de pagamento europeias em todos os Estados‑Membros, através do estabelecimento de normas mínimas cuja observância torna desnecessário qualquer procedimento intermédio no Estado‑Membro de execução anterior ao reconhecimento e à execução (8).

31.      O vigésimo nono considerando do regulamento precisa, além disso, que o seu objetivo é instituir, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, um mecanismo uniforme, rápido e eficiente de liquidação de créditos uma vez que, o sexto e o oitavo considerandos, os entraves ao acesso a uma justiça eficaz em casos transfronteiriços e as distorções da concorrência no mercado interno decorrentes do desequilíbrio no funcionamento dos meios processuais facultados aos credores nos diferentes Estados‑Membros tornaram necessária uma legislação comunitária que garanta condições idênticas para os credores e os devedores em toda a União Europeia (9), dado que os atrasos de pagamento são uma das principais ameaças à sobrevivência de empresas e provocam a perda de numerosos postos de trabalho.

32.      Por estes motivos, foi criado um conjunto único de normas processuais mínimas comuns para obter uma injunção de pagamento europeia que, no entanto, só pode contribuir para a realização do objetivo indicado nos n.os 30 e 31 se garantir a autonomia deste procedimento relativamente aos procedimentos semelhantes já previstos pelos Estados‑Membros.

33.      Com efeito, se as disposições nacionais pudessem completar a regulamentação controvertida seria posto em causa o objetivo do regulamento porque, nesse caso, o resultado não seria harmonizar e simplificar os procedimentos, mas criar tantos procedimentos diferentes quanto os ordenamentos jurídicos dos Estados‑Membros, compostos, além do mais, por normas tanto nacionais, como do direito da União.

34.      Por outro lado, é evidente que o acesso em condições de igualdade ao procedimento por parte de qualquer credor e devedor da União só pode obter‑se na medida em que se garante o conhecimento ex ante e em abstrato das normas que devem ser aplicadas, sem necessidade de comprovar concretamente em cada caso, qual a legislação nacional em vigor no tribunal requerido no momento em que é tomada a decisão de emitir a injunção.

35.      Essa possibilidade de conhecer a regulamentação aplicável só pode ser efetiva se o procedimento a observar, for o mais simples possível, e se for desde o início único em todo o território da União (sem prejuízo das remissões para as disposições nacionais).

36.      Daí que, à luz da redação e da finalidade da regulamentação controvertida, se deva adotar uma interpretação do regulamento que garanta a autonomia do procedimento assim estabelecido face aos procedimentos em vigor nos diferentes Estados‑Membros.

37.      Em especial, deve‑se considerar que os requisitos processuais para a emissão de uma injunção de pagamento devem ser apenas os previstos no artigo 7.° do regulamento e que, quando estes se verifiquem, a injunção é emitida sem ter em conta a regulamentação interna, uma vez que essa injunção, como ato de origem europeia e não estatal (10), acresce aos instrumentos nacionais de cobrança de créditos sem os substituir.

38.      No que diz respeito ao caso em apreço, considero que, se os requisitos de forma indicados no artigo 7.° forem respeitados, a emissão da injunção de pagamento europeia não pode ser recusada só porque não estão preenchidos os requisitos adicionais impostos pelo direito nacional que regula procedimentos semelhantes e referidos na audiência, como os relativos ao número de cópias dos pedidos apresentados e a indicação do valor da causa na moeda nacional.

39.      Importa realçar que as eventuais questões relativas às custas judiciais, suscitadas pelo Governo polaco na audiência e nas suas observações, escritas, não podem impedir a concessão da medida requerida, uma vez que o montante das referidas custas será fixado nos termos da legislação nacional em conformidade com o disposto no artigo 25.° do regulamento.

40.      Assim, no que se refere à primeira questão prejudicial proponho ao Tribunal de Justiça que responda declarando que o artigo 7.° do regulamento, com exceção dos casos em que este remete expressamente para o direito dos Estados‑Membros, regula de forma exaustiva os requisitos que o pedido de injunção de pagamento europeia deve respeitar.

41.      A resposta dada à primeira questão torna desnecessário o exame da segunda.

VI — Quanto à terceira e quarta questões prejudiciais

42.      Com a terceira questão prejudicial, o Sąd Okręgowy we Wrocławiu pretende saber se o artigo 4.° do regulamento deve ser interpretado no sentido de que as características do crédito pecuniário enumeradas nessa disposição, ou seja a «liquidez» e a exigibilidade do crédito na data em que é apresentado o requerimento de injunção de pagamento europeia, se referem exclusivamente ao crédito principal ou também ao crédito de juros de mora.

43.      Com a quarta questão prejudicial, o Sąd Okręgowy we Wrocławiu colocou uma série de questões relativas aos juros que podem ser exigidos com fundamento no procedimento em análise.

44.      Em especial, pretende saber se, nos termos do artigo 7.°, n.° 2, alínea c), é possível reclamar, além do crédito principal:

a)      a totalidade dos juros, incluindo os juros vincendos, calculados entre uma data de vencimento precisamente determinada e um dia de pagamento indeterminado;

b)      apenas os juros contados entre uma data de vencimento precisamente determinada e a data em que é apresentado o requerimento, ou emitida a injunção de pagamento;

c)      apenas os juros contados entre uma data de vencimento precisamente determinada e a data em que é apresentado o requerimento?

45.      Considero que estas duas questões devem ser apreciadas conjuntamente, uma vez que entendo que o órgão jurisdicional nacional pretendeu, no essencial, perguntar ao Tribunal de Justiça se, à luz do conjunto das disposições do regulamento, em especial dos seus artigos 4.° e 7.°, n.° 2, alínea c), é possível reclamar o pagamento de qualquer tipo de juros, incluindo os vincendos, isto é, os juros calculados desde a data do seu vencimento até ao momento do pagamento (no caso em apreço, juros de mora).

46.      Antes de mais, observo que não partilho do raciocínio do tribunal de reenvio na medida em que chega a conclusões diferentes quanto à possibilidade de reclamar os denominados juros vincendos, consoante o artigo 4.° do regulamento seja ou não interpretado no sentido de que as características do crédito pecuniário nele indicadas isto é, a «liquidez» e a exigibilidade do crédito no momento em que é apresentado o requerimento de injunção de pagamento europeia, se devam aplicar exclusivamente ao crédito principal ou também aos juros moratórios (11).

47.      Isto porque, em primeiro lugar, deste modo, o referido artigo 4.° não seria interpretado à luz dos outros artigos do regulamento relativos aos juros.

48.      Com efeito, o artigo 4.° do regulamento dispõe que o procedimento europeu de injunção de pagamento é criado para a cobrança de créditos pecuniários líquidos exigíveis na data em que é apresentado o requerimento e, referindo‑se genericamente e de modo particularmente amplo ao termo «crédito», não distingue expressamente entre o capital e os juros.

49.      Contudo, a par dessa disposição importa também tomar em consideração o artigo 7.° do regulamento, que prevê que no requerimento de injunção sejam incluídos «o montante do crédito, o crédito principal e, se for caso disso, os juros, as sanções contratuais e os custos» [n.° 2, alínea b)] e, se forem reclamados juros sobre o crédito, a taxa de juro e o período em relação ao qual os juros são reclamados [n.° 2, alínea c)], mas também «a causa de pedir, incluindo uma descrição das circunstâncias invocadas como fundamento do crédito e, se necessário dos juros reclamados» [n.° 2, alínea d)].

50.      Enquanto o artigo 4.° indica, em termos gerais, o conteúdo do requerimento de injunção de pagamento (a cobrança de créditos e, por conseguinte, a pretensão do pagamento de uma quantia em dinheiro), o artigo 7.° descreve formalmente os elementos em que se divide o referido crédito, distinguindo entre capital, juros, sanções contratuais e custos [n.° 2, alínea b)].

51.      Em segundo lugar, o raciocínio do órgão jurisdicional, tal como referido no n.° 46 não tem em conta que a possibilidade de reclamar juros, incluindo os vincendos, decorre da própria natureza do crédito principal e do crédito de juros, bem como das relações entre ambos.

52.      Com efeito, os juros constituem uma obrigação pecuniária que só se distingue da principal apenas pela sua natureza acessória em relação à primeira, de que depende, e pelo facto de o seu montante depender do decurso do tempo e variar em função do mesmo.

53.      Não existem mais diferenças substanciais entre as duas obrigações [de modo que o artigo 7.°, quando refere, no n.°2, alíneas c) e d), que o requerimento de injunção de pagamento que tem por objeto créditos pecuniários constituídos por juros e capital, só diferencia os primeiros do segundo porque o crédito de juros é eventual] e, em princípio, a obrigação de juros segue normalmente o crédito principal e as vicissitudes deste, de modo que se pode afirmar que os juros podem ser reclamados na medida em que existe um crédito de capital suscetível de ser reclamado em juízo.

54.      A relação acima referida entre o crédito principal e o crédito de juros articula‑se da seguinte forma:

1)      os juros são devidos pelo facto de a obrigação de crédito principal dever ser paga (isto é, exigível) e quando o respetivo pagamento não tenha sido efetuado (no que diz respeito aos juros de mora, no prazo acordado ou previsto por lei);

2)      com o decurso do tempo os direitos acessórios incorporam‑se no crédito principal convertendo‑se num elemento determinado do seu montante.

55.      A resposta à questão relativa à possibilidade de requerer o pagamento dos juros, incluindo os vincendos através da injunção europeia de pagamento, não pode, assim, depender da interpretação unicamente do artigo 4.°, nem do facto de esses juros acessórios serem considerados líquidos e vencidos nos termos desse mesmo artigo.

56.      E isto porque os créditos vencidos suscetíveis de serem cobrados judicialmente (sejam capital, juros, sanções contratuais ou custos) devem ser determinados apreciando conjuntamente os artigos 4.° e 7.° e, sobretudo, porque a eventual possibilidade de reclamar juros decorre do referido nexo de acessoriedade entre estes e o crédito principal.

57.      Face ao exposto, há que examinar o mérito da questão submetida pelo Sąd Okręgowy we Wrocławiu relativamente à possibilidade de reclamar, mediante o procedimento em análise, também os juros vencidos até ao momento do pagamento ou apenas os juros devidos até ao momento em que é apresentado o requerimento de injunção ou emitida a injunção em causa.

58.      A resposta decorre do exame dos artigos e do objetivo do regulamento, bem como da apreciação do objeto da regulamentação na sua totalidade e das características da intervenção da autoridade requerida.

59.      Em primeiro lugar, há que salientar que o artigo 7.°, já referido, que regula em termos gerais os requisitos formais do requerimento e prevê expressamente a possibilidade de reclamar os juros obriga [n.° 2, alínea c)] o credor a indicar a taxa e o período em relação ao qual os juros são reclamados, mas não a data precisa até à qual são reclamados.

60.      Esta disposição não limita o seu âmbito de aplicação unicamente aos juros devidos até ao momento em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção europeia de pagamento, e não obriga a quantificar exatamente os juros devidos.

61.      As mesmas considerações valem para o artigo 4.°, que deve ser interpretado em conjugação com o artigo 7.° para determinar os créditos que podem ser objeto da injunção de pagamento em causa, como sublinhado nos n.os 47 a 50 e 56, supra.

62.      Daqui resulta que, as disposições do regulamento que determinam os créditos suscetíveis de serem reclamados judicialmente, regulando as modalidades em que deve ser redigido o requerimento, não impedem que se reclame também os juros vincendos, para os quais não é possível indicar nem a data até à qual são reclamados, nem o montante total definitivo.

63.      Também se chega à mesma conclusão se se examinar a finalidade do regulamento.

64.      Como já salientámos quando do exame da primeira questão prejudicial (12), o regulamento introduz uma disciplina de caráter processual uniforme destinada a criar títulos judiciais que têm por objeto créditos pecuniários transfronteiriços de pequeno montante, suscetíveis de circular nos Estados‑Membros, quando são respeitadas as normas mínimas que tornam supérfluo qualquer processo intermédio anterior ao reconhecimento e à execução, o que teria como resultado prático simplificar e acelerar as ações em causa (quinto considerando do regulamento) e permitir a cobrança rápida e eficaz de créditos não contestados (sexto considerando do regulamento).

65.      Se se acolhesse uma interpretação do regulamento que exclui qualquer possibilidade de reclamar além do capital, os denominados juros vincendos, não se cumpririam as exigências salientadas no n.° 64.

66.      Com efeito, se se obrigasse os credores a limitar o seu pedido unicamente ao montante do capital, eventualmente acrescido de juros devidos no momento em que o requerimento é apresentado ou, no máximo, no momento em que a injunção é emitida, esses credores estariam obrigados a apresentar vários requerimentos: o primeiro para obter o pagamento do crédito principal e dos juros vencidos, os outros para obter os juros referentes ao período posterior.

67.      Deste modo, tornar‑se‑ia mais difícil a instituição de um único título judicial, apto a circular no interior dos Estados‑Membros e o montante global do crédito seria dividido nos seus diferentes elementos, o que levaria a uma multiplicação de títulos judiciais suscetíveis de aumentar os litígios e os prazos e custos respetivos, dificultando a cobrança das quantias devidas, mais que não fosse porque seria necessário iniciar vários procedimentos.

68.      Acresce que o credor podia ser levado a pedir ao juiz uma injunção de pagamento com base no direito nacional dos Estados‑Membros, e não a título do regulamento em análise, quando, na primeira situação, como é aliás o caso da Polónia segundo o órgão jurisdicional de reenvio, é possível obter um título que tenha por objeto a totalidade do seu crédito, incluindo os juros até à data do pagamento, dado que, na segunda situação, só poderiam ser reclamados o crédito principal e uma parte dos juros.

69.      Por último, chega‑se à mesma conclusão estabelecida no n.° 62 se se tomar em consideração o objeto do regulamento na sua totalidade e as características da intervenção da autoridade requerida.

70.      Antes de mais, como salientei nos n.os 20 e 36, o regulamento criou um procedimento uniforme e autónomo relativamente aos procedimentos nacionais relativos à emissão de uma injunção de pagamento, que regula unicamente os aspetos processuais ligados à emissão da injunção europeia de pagamento, tal como resulta também do Livro Verde relativo a um procedimento europeu de injunção de pagamento e medidas para simplificar e acelerar as ações de pequeno montante (citado no quinto considerando do regulamento). Este Livro Verde indica, desde o início, como objetivo principal, a criação de um procedimento específico rápido e económico, disponível em todos os Estados‑Membros, para a cobrança de créditos não contestados.

71.      Em segundo lugar, a emissão de uma injunção europeia de pagamento prescinde de um exame sobre o fundamento do pedido.

72.      Com efeito, à luz dos artigos 8.° e 12.°, n.° 4, apenas se exige, uma mera verificação de um ponto formal, do cumprimento dos requisitos processuais estabelecidos no regulamento, da existência do crédito, que se baseia nas informações fornecidas pelo credor no formulário que apresentou, e que não pressupõe a comprovação da veracidade das declarações feitas. Por este motivo, uma vez aceite o requerimento de injunção de pagamento, o devedor é informado de que a injunção foi emitida apenas com base nas informações fornecidas pelo requerente.

73.      Isto é assim porque, no âmbito do procedimento europeu, o tribunal não tem uma competência de plena jurisdição, a qual apenas pertence ao tribunal que decide sobre a eventual oposição e, portanto, a natureza da intervenção da autoridade requerida depende do momento da sua intervenção.

74.      Na fase não contraditória, regulada pela legislação da União, o órgão jurisdicional examina unicamente a regularidade formal do requerimento pedido com base nas informações fornecidas pelo credor. No processo de oposição, regulado pelo direito dos Estados‑Membros, e que se refere à efetiva comprovação do alegado crédito, o tribunal exerce, pelo contrário, uma competência de plena jurisdição (13).

75.      A eventual menor proteção do devedor na fase que termina com a emissão de uma injunção europeia de pagamento resulta inevitavelmente da necessidade de tornar este procedimento o mais simples e uniforme possível. Esta menor proteção é compensada, em primeiro lugar, pelo facto de, nos termos do artigo 16.°, n.° 3, do regulamento, o devedor poder deduzir oposição sem estar obrigado a especificar os fundamentos para tal, conseguindo, por força do artigo 17.° que o procedimento prossiga em conformidade com as regras do processo civil comum; em segundo lugar, pela circunstância de o credor dever declarar, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 3, a exatidão das informações fornecidas e ter consciência de que qualquer falsa declaração pode desencadear sanções (14).

76.      Portanto, só na sequência de uma oposição, como a Comissão realçou na audiência, o órgão jurisdicional competente procederá a um exame completo quanto ao mérito das questões relativas à existência e ao montante dos créditos, de capital e de juros, incluindo os vincendos, se for caso disso, com base numa análise aprofundada do direito material aplicável (ou, eventualmente, das leis aplicáveis) à relação contratual.

77.      O regulamento tem por objeto dispositivos processuais e versa sobre o modo como, quando existe um crédito, é possível obter uma injunção de pagamento que circule nos Estados‑Membros. Não contém, ao invés, nenhuma disposição de direito material relativa, designadamente, à questão, na parte que aqui interessa, da natureza dos juros que podem ser reclamados.

78.      Com base nas considerações que precedem, à luz do texto do regulamento controvertido, do objetivo para o qual foi adotado, do objeto da regulamentação em exame e da natureza da intervenção da autoridade requerida deve‑se, portanto, afirmar que, no que concerne ao procedimento de formação do título judicial, há que aplicar o regulamento (e o direito nacional na medida em que se façam remissões para este, ou para dispositivos processuais não regulados) no que diz respeito ao tipo de juros (bem como a todos os elementos do crédito) que podem, ser reclamados, deve‑se logicamente aplicar o direito material que regula a relação jurídica entre as partes.

79.      Se o referido direito material reconhecer ao credor a possibilidade de reclamar os denominados juros vincendos, este poderá obtê‑los recorrendo também ao procedimento previsto no regulamento.

80.      No caso da referida lei reconhecer apenas os juros vencidos até o dia em que o requerimento é apresentado ou emitida a injunção de pagamento pelo juiz, o credor deverá, porém, adaptar o seu requerimento a essa disciplina.

81.      Daqui resulta que, no caso presente, quando, em conformidade com o direito material que regula a relação (que segundo o despacho de reenvio é o direito polaco), o credor tem o direito ao pagamento dos denominados juros vincendos, o órgão jurisdicional de reenvio deverá também conceder esses juros quando da emissão da injunção de pagamento.

82.      Aliás, não existem razões para que um crédito que compreenda os denominados juros vincendos em conformidade com o direito material aplicável ao contrato, muitas vezes escolhido expressamente pelas partes ou do qual têm conhecimento prévio, deva ver reduzido o seu montante na sequência do recurso ao procedimento previsto no regulamento em exame, mesmo que não exista nenhuma disposição expressa nesse sentido.

83.      O Governo do Reino Unido defende que os juros podem ser reclamados só até à data da emissão da injunção de pagamento.

84.      Isto, porque, as instruções para preencher o requerimento de injunção de pagamento, que fazem parte do Anexo I do regulamento, indicam, na parte que se refere à secção 7 do formulário de requerimento, exclusivamente o procedimento a seguir para obter os juros até ao dia da decisão do tribunal que conhece do pedido do credor (numa preocupação de exatidão, esclarece‑se que para o efeito não é necessário preencher a última casa da referida secção).

85.      Um último argumento em apoio desta solução pode deduzir‑se do facto de o formulário para a emissão de injunção de pagamento (formulário E, anexo V do regulamento) permitir ao juiz competente indicar na coluna «Juros» a data de emissão da injunção no caso de tal ser requerido pelo credor.

86.      A este propósito, remeto para as considerações já desenvolvidas e observo, contrariamente ao Governo do Reino Unido, que as referidas instruções têm um valor puramente exemplificativo das situações que em concreto poderão verificar‑se.

87.      Saliento que o formulário do requerimento de injunção de pagamento permite adaptar o pedido de juros às exigências concretas do credor, à margem das instruções para preencher o referido requerimento.

88.      Com efeito, é possível indicar o código a inserir na secção 7 do formulário em causa, relativo aos juros, com o número 06 e a letra E (que significam «outro»), para depois preencher o espaço em baixo na mesma secção que contém a indicação «[e]specificar no caso do código 6 e/ou E» e, eventualmente, a secção 11 sob a epígrafe «Declarações e outras informações (se necessário)».

89.      Assim, o credor pode, tranquilamente reclamar os juros até à data pretendida, eventualmente até ao momento do pagamento, sem os quantificar imediatamente com precisão.

90.      Tal resulta também do facto de a fórmula de conclusão do formulário do pedido de requerimento de injunção de pagamento não impor a indicação do montante específico, mas fazer unicamente referência ao «montante do crédito principal indicado abaixo» (capital), «acrescido […] dos juros», sem portanto utilizar a expressão «indicado abaixo» em relação aos juros.

91.      Quanto ao formulário para a emissão de injunção de pagamento (formulário E Anexo V do regulamento), em cuja parte dispositiva se inclui, no que se refere aos juros, a indicação «Montante», importa realçar que nada impede o tribunal de ordenar ao devedor que pague não um montante preciso, calculado em referência a uma data especificamente indicada, mas «o montante vencido no momento do pagamento».

92.      O Governo português adere à solução preconizada pelo Governo do Reino Unido, em particular porque o artigo 12.°, n.° 3, alínea a), do regulamento prevê que, na injunção de pagamento, o requerido seja informado de que pode pagar ao requerente o montante indicado na injunção.

93.      A este respeito, remeto para as considerações anteriores e sublinho que, no momento da receção da injunção notificada, o destinatário está perfeitamente em condições de calcular mediante uma simples operação matemática, o montante devido no momento do pagamento; no caso de não estar de acordo com o montante determinado em função da taxa de juro e da data a partir da qual os juros são devidos, tal como indicados na injunção, poderá deduzir oposição.

94.      Além disso, a redação normalizada dos formulários já referidos e as instruções juntas não podem privar o credor do direito de reclamar todos os juros que lhe são devidos no momento do pagamento, quando o direito material aplicável à relação contratual o permite, visto que da análise global do texto do regulamento se depreende que essa possibilidade não está excluída.

95.      Ao invés, a solução defendida pelos Governos português e do Reino Unido colocaria claramente em causa os objetivos prosseguidos pelo regulamento, a saber, a simplificação e a aceleração da regulação dos litígios, bem como a cobrança rápida e eficaz dos créditos não contestados, e poderia levar os credores a privilegiar o recurso aos processos injuntivos nacionais, que garantiriam a satisfação integral dos seus pedidos, em vez do procedimento em exame.

96.      Por conseguinte, para concluir, proponho que, o Tribunal de Justiça responda à terceira e quarta questões prejudiciais declarando que os artigos 4.° e 7.°, n.° 2, alínea c), do regulamento devem ser interpretados no sentido de que no procedimento de injunção de pagamento europeia é possível exigir, além do crédito principal, todos os tipos de juros suscetíveis de serem reclamados com base no direito material aplicável à relação contratual e, portanto, em função da situação, tanto os juros calculados a contar do dia do seu vencimento, indicado por uma data precisamente determinada e um dia de pagamento indeterminado, como os juros calculados até à data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção.

VII — Quanto à quinta questão prejudicial

97.      Com a quinta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em caso de resposta afirmativa à questão 4, alínea a), como deve, nos termos do regulamento, ser formulada a decisão do tribunal relativa aos juros no formulário de injunção de pagamento.

98.      A este respeito, observo que no fim desse formulário se encontra um espaço em branco no qual se pode indicar, depois do capital, os juros.

99.      No que se refere à questão dos denominados juros vincendos e ao facto de estes poderem ser reconhecidos a título do direito material aplicável ao contrato, o tribunal, não podendo quantificar o seu montante, limitar‑se‑á a ordenar, no espaço em branco indicado no n.° 98, na rubrica «Juros», na coluna «Data», o pagamento dos juros devidos até ao momento do pagamento, indicando na coluna «Montante» a respetiva taxa.

100. É claro que se deve considerar admissível qualquer outro modo de indicar os juros materialmente equivalente que permita expressar de forma clara a decisão do tribunal (a este respeito, remeto para as soluções propostas nas suas alegações pela Comissão, bem como, pelos Governos polaco e austríaco).

101. Nos casos [compreendidos no âmbito da quarta questão prejudicial, alínea a) e da quinta questão prejudicial segundo declara o órgão jurisdicional de reenvio] em que os juros são reclamados até à data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção, o tribunal pode calcular o montante em causa, dado que conhece a taxa de juro e o período de referência, e indicar no espaço em branco que se encontra no fim do formulário mencionado no n.° 98, o montante devido a título de juros.

102. Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à quinta questão prejudicial declarando que, em conformidade com o Regulamento n.° 1896/2006, a decisão sobre a inclusão dos juros no formulário do requerimento de injunção de pagamento pode ser formulada da seguinte forma:

¾        No caso dos denominados juros vincendos suscetíveis de serem concedidos por força do direito material aplicável ao contrato, o tribunal indicará, no espaço previsto no fim do formulário do requerimento para a emissão da injunção de pagamento para indicar o montante a pagar, na rubrica «Juros» na coluna «Data», que os referidos juros são devidos até ao momento do pagamento, especificando na coluna «Montante», a taxa de juro; sendo, em todo o caso admissível qualquer outra indicação diferente, desde que seja materialmente equivalente e reflita claramente o conteúdo da decisão;

¾        No caso de os juros serem pedidos até à data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção o tribunal poderá calcular o montante em causa e indicar no espaço previsto para o efeito no fim do formulário acima referido o montante dos juros devidos.

103. À luz da resposta dada à quarta e quinta questões prejudiciais não é necessário responder à sexta e à sétima questões.

VIII — Quanto à oitava questão prejudicial

104. Com a oitava questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, no caso de o requerente apenas calcular o montante dos juros devidos até à data em que é apresentado o requerimento, deve calcular esse montante oficiosamente ou deve solicitar ao requerente que complete as informações em falta nos termos do artigo 9.° do regulamento.

105. A este propósito, remetemos para as considerações anteriores e insisto no facto de o credor não estar obrigado, nos termos do artigo 7.° do regulamento a calcular, sob pena de inadmissibilidade ou de rejeição do pedido, o montante de juros, ainda que o possa fazer.

106. O órgão jurisdicional pode efetuar esse cálculo quando o requerente lhe tenha fornecido os elementos necessários para o efeito (como divisa, taxa de juro, momento a partir do qual os juros devem ser calculados).

107. Caso os dados necessários para o cálculo não estejam indicados, ou forem incompletos, o tribunal a menos que o crédito seja manifestamente infundado ou o pedido inadmissível (15) dará ao requerente em conformidade com o artigo 9.° do regulamento, a possibilidade de completar ou retificar o pedido num prazo que considere razoável.

108. Em consequência, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à oitava questão prejudicial declarando que:

¾        se o requerente não tiver calculado os juros até à data em que é apresentado o requerimento, o tribunal efetua esse cálculo, quando o credor tenha fornecido os elementos necessários para o efeito;

¾        se os dados necessários para o cálculo não forem indicados ou forem incompletos, o tribunal a menos que o crédito seja manifestamente infundado ou o pedido inadmissível dará a possibilidade ao requerente, em conformidade com o artigo 9.° do regulamento, de completar ou retificar o pedido num prazo que considere razoável.

IX — Conclusão

109. Com base nas considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda da seguinte forma às questões submetidas pelo Sąd Okręgowy we Wrocławiu:

«1)      O artigo 7.° do Regulamento (CE) n.° 1896/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, que cria um procedimento europeu de injunção de pagamento, deve ser interpretado no sentido, com exceção dos casos em que este remete expressamente para o direito dos Estados‑Membros, regula de forma exaustiva os requisitos que o pedido de injunção de pagamento europeia deve respeitar.

2)      Os artigos 4.° e 7.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1896/2006 devem ser interpretados no sentido de que no procedimento de injunção de pagamento europeia é possível exigir, além do crédito principal, todos os tipos de juros suscetíveis de serem reclamados com base no direito material aplicável à relação contratual, e portanto, em função da situação, tanto os juros calculados a contar do dia do seu vencimento, indicado por uma data precisamente determinada e um dia de pagamento indeterminado, como os juros calculados até à data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção.

3)      Em conformidade com o Regulamento n.° 1896/2006, a decisão sobre a inclusão dos juros no formulário do requerimento de injunção de pagamento pode ser formulada da seguinte forma:

a)      No caso dos denominados juros vincendos suscetíveis de serem concedidos por força do direito material aplicável ao contrato, o tribunal indicará, no espaço previsto no fim do formulário do requerimento para a emissão da injunção de pagamento para indicar o montante a pagar, na rubrica ‘Juros’ na coluna ‘Data’, que os referidos juros são devidos até ao momento do pagamento, especificando na coluna ‘Montante’, a taxa de juro; sendo em todo o caso admissível qualquer outra indicação diferente, desde que seja materialmente equivalente e reflita claramente o conteúdo da decisão;

b)      No caso de os juros serem pedidos até à data em que é apresentado o requerimento ou emitida a injunção, o tribunal pode calcular o montante em causa e indicar no espaço previsto para o efeito no fim do formulário acima referido o montante dos juros devidos.

4)      Se o requerente não tiver calculado os juros até à data em que é apresentado o requerimento, o tribunal efetua esse cálculo, quando o credor tenha fornecido os elementos necessários para o efeito.

5)      Se os dados necessários para o cálculo não forem indicados ou forem incompletos, o tribunal a menos que o crédito seja manifestamente infundado ou o pedido inadmissível dará a possibilidade ao requerente, em conformidade com o artigo 9.° do Regulamento n.° 1896/2006, de completar ou retificar o pedido num prazo que considere razoável.»


1 —      Língua original: italiano.


2 —      JO L 399, p. 1.


3 —      Em conformidade com as informações prestadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, no n.° 8 do seu despacho, segundo a interpretação desta norma pelo Sąd Najwyższy (Tribunal Supremo polaco) no seu parecer de 5 de abril de 1991, a obrigação de pagamento de juros de mora é uma obrigação sujeita a um termo. Na verdade, o crédito torna‑se exigível no termo do prazo de pagamento e é objeto de sucessivos aumentos por cada dia de atraso. Os juros de mora nascem, assim, a partir do primeiro dia de mora e o credor adquire o respetivo direito, a título autónomo, por cada dia de atraso. O pagamento de juros é considerado uma prestação periódica acessória relativamente à do capital. Na ordem jurídica polaca é admissível um pedido de pagamento de juros vincendos até ao dia do efetivo pagamento e pode ser apresentado com o pedido relativo ao capital.


4 —      Esta questão depende sobretudo do facto de a credora não ter indicado o valor da causa na divisa polaca (apesar de ser necessário para calcular a taxa a aplicar) e de não ter preenchido corretamente a secção 7 do formulário A relativo aos juros, sem especificar, com o símbolo adequado o período para o seu cálculo, e de não ter especificado os montantes sobre os quais deviam ser concedidos os juros.


5 —      Como é o caso, por exemplo, do artigo 7.°, n.° 3, relativo às sanções a aplicar por falsas declarações indicadas no requerimento, do artigo 10.° n.° 2, no que se refere às consequências relativas à parte do pedido inicial para a qual a jurisdição nacional considerou que os requisitos para a emissão de uma injunção não estavam reunidos, do artigo 11.°, n.° 3, que reconhece ao interessado, em caso de indeferimento do seu pedido, o direito de utilizar qualquer outro procedimento disponível e do artigo 12.°, n.° 5, segundo o qual o tribunal garante que a injunção de pagamento é notificada ao devedor em conformidade com o direito nacional.


6 —      Os mesmos objetivos são mencionados no nono considerando.


7 —      E isto recorrendo a formulários normalizados para a gestão do procedimento, nos termos do décimo primeiro e décimo sexto considerandos.


8 —      E isto em razão do princípio da confiança mútua na administração da justiça nos Estados‑Membros, como indicado pelo vigésimo sétimo considerando.


9 —      Segundo o quinto considerando, a criação do procedimento europeu uniforme para a cobrança de créditos não contestados visa simplificar e acelerar as ações de pequeno montante.


10 —      Na medida em que é emitida com base numa disciplina processual comum aos Estados‑Membros e introduzida por um regulamento.


11 —      Não concordo, portanto, com o que o juiz a quo afirmou no n.° 9 da fundamentação do seu despacho de reenvio, isto é, que «[s]e for admitido que os requisitos previstos no artigo 4.° do regulamento se aplicam igualmente aos juros, isso significa que um requerente apenas pode pedir o reconhecimento de juros em relação ao período que decorre entre a data de vencimento dos juros e, no máximo, a data em que é apresentado o requerimento. Nesta hipótese, as outras questões submetidas pelo tribunal nacional não teriam de ser respondidas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia».


12 —      V., em especial, n.os 30 e 31.


13 —      Considero que o regulamento em causa introduziu um sistema de injunção de pagamento que podemos dizer puro (pelo menos em princípio), isto é, um sistema em que o tribunal emite uma injunção de pagamento sem apreciar a conformidade do pedido (noutros sistemas ditos «com prova», esta fiscalização tem lugar e o credor deve assim fazer prova do seu crédito). Nos sistemas «puros», a proteção aparentemente menor dos direitos do devedor é compensada pela extrema facilidade com a qual pode deduzir oposição à injunção de pagamento (sem sequer ter de indicar os fundamentos).


14 —      Trata‑se de uma disposição que lembra o instituto do affidavit, típico das ordens jurídicas da common law.


15 —      Salvo se os juros vincendos são automaticamente acrescentados ao capital por força do direito do Estado‑Membro de origem, como previsto no artigo 7.°, n.° 2, alínea c).