Language of document : ECLI:EU:C:2018:533

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

5 de julho de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamento (CE) n.o 44/2001 — Competências especiais — Artigo 5.o, ponto 3 — Matéria extracontratual — Lugar da verificação do facto danoso — Lugar da materialização do dano e lugar do evento causal que está na origem do dano — Pedido de reparação do prejuízo alegadamente causado por comportamentos anticoncorrenciais cometidos em diferentes Estados‑Membros — Artigo 5.o, ponto 5 — Exploração de uma sucursal — Conceito»

No processo C‑27/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia), por decisão de 12 de janeiro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 19 de janeiro de 2017, no processo

AB «flyLALLithuanian Airlines», em liquidação,

contra

«Starptautiskā lidosta “Rīga”» VAS,

«Air Baltic Corporation» AS,

sendo intervenientes:

«ŽIA Valda» AB,

«VA Reals» AB,

Lietuvos Respublikos konkurencijos taryba,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, A. Rosas, C. Toader (relatora), A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 16 de novembro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da AB «flyLAL‑Lithuanian Airlines», por R. Audzevičius, advokatas,

–        em representação da «Starptautiskā lidosta “Rīga”» VAS, por R. Simaitis, M. Inta e S. Novicka, advokatai,

–        em representação da «Air Baltic Corporation» AS, por R. Zaščiurinskaitė, D. Pāvila, D. Bublienė, I. Norkus e G. Kaminskas, advokatai,

–        em representação da «ŽIA Valda» AB e da «VA Reals» AB, por P. Docka, advokatas,

–        em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e R. Dzikovič, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo letão, por I. Kucina e J. Davidoviča, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por M. Wilderspin, G. Meessen e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 28 de fevereiro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o, pontos 3 e 5, do Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a AB «flyLAL‑Lithuanian Airlines» (a seguir «flyLAL»), uma sociedade de direito lituano em liquidação, bem como as intervenientes «ŽIA Valda» AB et «VA Reals» AB, a duas sociedades de direito letão, a «Starptautiskā lidosta “Rīga”» VAS (a seguir «Aeroporto de Riga») e a «Air Baltic Corporation» AS (a seguir «Air Baltic»), que visa obter a declaração de que são contrários aos artigos 101.o e 102.o TFUE alegados comportamentos anticoncorrenciais adotados pelo Aeroporto de Riga e pela Air Baltic, bem como a reparação por estes do prejuízo ocasionado pelos referidos comportamentos.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Convenção de Bruxelas

3        O artigo 5.o da Convenção de 27 de setembro de 1968, relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32), conforme alterada pelas sucessivas Convenções relativas à adesão de novos Estados‑Membros a esta Convenção (a seguir «Convenção de Bruxelas»), tem a seguinte redação:

«O requerido com domicílio no território de um Estado contratante pode ser demandado num outro Estado contratante:

[…]

3.      Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu o facto danoso;

[…]

5.      Se se tratar de um litígio relativo à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento, perante o tribunal do lugar da sua situação.»

 Regulamento n.o 44/2001

4        Os considerandos 11, 12 e 15 do Regulamento n.o 44/2001 enunciam:

«(11)      As regras de competência devem apresentar um elevado grau de certeza jurídica e devem articular se em torno do princípio de que em geral a competência tem por base o domicílio do requerido e que tal competência deve estar sempre disponível, exceto em alguns casos bem determinados em que a matéria em litígio ou a autonomia das partes justificam outro critério de conexão. No respeitante às pessoas coletivas, o domicílio deve ser definido de forma autónoma, de modo a aumentar a transparência das regras comuns e evitar os conflitos de jurisdição.

(12)      O foro do domicílio do requerido deve ser completado pelos foros alternativos permitidos em razão do vínculo estreito entre a jurisdição e o litígio ou com vista a facilitar uma boa administração da justiça.

[…]

(15)      O funcionamento harmonioso da justiça a nível comunitário obriga a minimizar a possibilidade de instaurar processos concorrentes e a evitar que sejam proferidas decisões inconciliáveis em dois Estados‑Membros competentes. […]»

5        O artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento, que atribui uma competência geral aos tribunais do Estado do domicílio do demandado, tem a seguinte redação:

«Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas no território de um Estado‑Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado.»

6        O artigo 5.o do referido regulamento prevê:

«Uma pessoa com domicílio no território de um Estado‑Membro pode ser demandada noutro Estado‑Membro:

[…]

3.      Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso;

[…]

5.      Se se tratar de um litígio relativo à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento, perante o tribunal do lugar da sua situação;

[…]»

 Direito lituano

7        Segundo o artigo 782.o do Civilinio proceso kodeksas (Código de Processo Civil), o juiz é obrigado a verificar oficiosamente se os órgãos jurisdicionais lituanos são competentes para decidir um processo que lhe foi submetido.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

8        A companhia aérea lituana flyLAL explorava, nomeadamente, voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius (Lituânia).

9        Em 2004, a companhia aérea letã Air Baltic começou a explorar voos com origem e destino nesse aeroporto, parte dos quais tinha os mesmos destinos que eram servidos pela flyLAL.

10      Após ter sofrido perdas financeiras, a flyLAL entrou em liquidação.

11      Uma vez que considerava que a Air Baltic a tinha expulsado do mercado ao aplicar preços predatórios em certas ligações aéreas com origem e destino no Aeroporto de Vilnius, os quais foram financiados pela redução, em benefício da Air Baltic, das tarifas dos serviços aeroportuários prestados pelo Aeroporto de Riga (Letónia), a flyLAL intentou no Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius, Lituânia), em 22 de agosto de 2008, uma ação contra a Air Baltic e o Aeroporto de Riga, com vista à reparação dos danos, no valor de 57 874 768,30 euros, alegadamente causados pelos comportamentos anticoncorrenciais a que estes se tinham dedicado. A flyLAL alegou também que, depois de ter sido assim expulsa do mercado, a Air Baltic desviou a maioria dos voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius para o Aeroporto Internacional de Riga. A ŽIA Valda e a VA Reals, acionistas da flyLAL, intervieram no processo principal em apoio desta última.

12      Conforme resulta da decisão de reenvio, no âmbito de um processo distinto do processo principal, o Latvijas Republikas Konkurences padome (Conselho da Concorrência da República da Letónia), por Decisão de 22 de novembro de 2006, declarou que o sistema de descontos praticado pelo Aeroporto de Riga a partir de 1 de novembro de 2004, que previa descontos que iam até aos 80% nos serviços de descolagem, de aterragem e de segurança das aeronaves, violava o artigo 82.o, segundo parágrafo, alínea c), CE, atual artigo 102.o, segundo parágrafo, alínea c), TFUE, e condenou‑o a cessar essa prática. Duas companhias aéreas, entre as quais a Air Baltic, tinham beneficiado deste sistema.

13      Por Decisão de 27 de janeiro de 2016, o Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) julgou os pedidos da flyLAL parcialmente procedentes, condenando a Air Baltic a pagar‑lhe a quantia de 16 121 094 euros a título de danos, acrescida de juros de mora à taxa anual de 6%. No entanto, julgou a ação da flyLAL improcedente na parte em que era dirigida contra o Aeroporto de Riga, bem como no que se refere aos pedidos da ŽIA Valda e da VA Reals.

14      Uma vez que o Aeroporto de Riga e a Air Baltic suscitaram no Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) uma exceção de incompetência internacional dos tribunais lituanos para conhecerem do litígio no processo principal, esse órgão jurisdicional observou, em primeiro lugar, na referida decisão, que este aspeto tinha sido decidido por um Acórdão do Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia) de 31 de dezembro de 2008.

15      Nesse acórdão, o Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia), que negara provimento aos recursos interpostos pelo Aeroporto de Riga e pela Air Baltic contra um Despacho do Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) de 25 de setembro de 2008, que ordenava, a título de medidas provisórias e conservatórias, o arresto dos bens móveis e/ou imóveis e dos direitos de propriedade da Air Baltic e do Aeroporto de Riga, declarara também que os tribunais lituanos eram competentes para conhecer do litígio no processo principal com base no artigo 5.o, pontos 3 e 5, do Regulamento n.o 44/2001. O referido acórdão foi objeto de um pedido de reconhecimento e execução na Letónia, apresentado no Augstākās tiesas Senāts (Senado do Supremo Tribunal, Letónia), por ocasião do qual este órgão jurisdicional submeteu ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial que deu origem ao Acórdão de 23 de outubro de 2014, flyLAL‑Lithuanian Airlines (C‑302/13, EU:C:2014:2319).

16      O Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) declarou em seguida que os tribunais lituanos eram competentes com base no artigo 5.o, pontos 3 e 5, do Regulamento n.o 44/2001, na medida em que, por um lado, os comportamentos anticoncorrenciais que causaram um dano à flyLAL, nomeadamente a aplicação de preços predatórios, o alinhamento dos horários dos voos, a publicidade ilegal, a supressão dos voos diretos, bem como o desvio do tráfego de passageiros para o Aeroporto Internacional de Riga, tinham ocorrido na Lituânia e, por outro, a Air Baltic operava na Lituânia através da sua sucursal.

17      A flyLAL, o Aeroporto de Riga e a Air Baltic, bem como a ŽIA Valda e a VA Reals, recorreram desta Decisão de 27 de janeiro de 2016 do Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) para o órgão jurisdicional de reenvio, isto é, o Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia).

18      Esse órgão jurisdicional recorda que resulta do Acórdão de 23 de outubro de 2014, flyLAL‑Lithuanian Airlines (C‑302/13, EU:C:2014:2319), que o litígio no processo principal é de natureza civil e comercial e que está abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 44/2001. No entanto, afirma ter dúvidas quanto à interpretação do artigo 5.o, pontos 3 e 5, do Regulamento n.o 44/2001. Esclarece que a sua obrigação de verificar a sua competência, nesta fase do processo, decorre do artigo 782.o do Código de Processo Civil.

19      No que respeita ao conceito de «lugar onde ocorreu […] o facto danoso», previsto no artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, após ter recordado a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual este conceito diz respeito simultaneamente ao lugar da materialização do dano e ao do evento causal que está na origem do dano, o órgão jurisdicional de reenvio considera, em primeiro lugar, que a determinação do lugar do evento causal não é isenta de dificuldades, uma vez que, no caso vertente, foram cometidos atos suscetíveis de causar um dano, conjunta ou isoladamente, em diferentes Estados‑Membros, ou seja, na Lituânia e na Letónia.

20      A este respeito, precisa que é facto assente que a Air Baltic beneficiou de uma redução de 80% nos preços dos serviços prestados pelo Aeroporto de Riga. Este sistema de descontos deu origem a uma Decisão do Conselho da Concorrência da República da Letónia, de 22 de novembro de 2006, que declarou a existência de uma violação do artigo 82.o, segundo parágrafo, alínea c), CE, atual artigo 102.o, segundo parágrafo, alínea c), TFUE. Segundo as recorridas no processo principal, estes descontos basearam‑se em atos regulamentares, adotados pela autoridades letãs, e a sua execução tinha lugar apenas na Letónia, designadamente através da aplicação dos referidos descontos, da prestação de serviços no Aeroporto de Riga, bem como do proveito retirado pela Air Baltic. Em contrapartida, a flyLAL alega que este sistema de descontos, apesar de constituir um abuso de posição dominante, se baseia num acordo anticoncorrencial celebrado entre as recorridas no processo principal em violação do artigo 81.o CE, atual artigo 101.o TFUE. Segundo esta, graças aos benefícios tirados deste acordo e às subvenções cruzadas praticadas, a Air Baltic pôde executar atos anticoncorrenciais no Aeroporto de Vilnius, incluindo a prática de preços predatórios e de operações relacionados com o alinhamento dos horários dos voos, a publicidade ilegal e a supressão dos voos depois de a flyLAL se ter retirado do mercado em causa. Assim, em seu entender, o prejuízo alegado surgiu na Lituânia.

21      Em segundo lugar, no que respeita ao lugar da materialização do dano, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o dano alegadamente sofrido pela flyLAL consiste numa perda de receitas ocorrida durante os anos de 2004 a 2008 no mercado dos voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius. A este respeito, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a forma como esse prejuízo deve ser qualificado, bem como sobre o lugar da sua ocorrência, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos prejuízos que consistem exclusivamente numa perda financeira, ilustrada pelos Acórdãos de 19 de setembro de 1995, Marinari (C‑364/93, EU:C:1995:289), de 10 de junho de 2004, Kronhofer (C‑168/02, EU:C:2004:364), e de 16 de junho de 2016, Universal Music International Holding (C‑12/15, EU:C:2016:449).

22      Em terceiro lugar, o referido órgão jurisdicional interroga‑se sobre a interpretação do conceito de «exploração de uma sucursal», na aceção do artigo 5.o, ponto 5, do Regulamento n.o 44/2001.

23      A este respeito, não tem dúvidas de que a sucursal da Air Baltic na Lituânia, cuja atividade consiste no transporte aéreo internacional de passageiros, mercadorias e correio, preenche as condições exigidas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça para ser qualificada de «sucursal» na aceção do referido artigo. Afirma também que resulta do estatuto desta sucursal que esta dispunha do poder de fixar os preços dos voos da Air Baltic com origem e com destino no Aeroporto de Vilnius. Não obstante, segundo esse órgão jurisdicional, não há dados que demonstrem que a sucursal procedeu efetivamente a essa fixação.

24      Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se a atividade da sucursal da Air Baltic na Lituânia pode justificar a aplicação do artigo 5.o, ponto 5, do Regulamento n.o 44/2001.

25      Nestas condições, o Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Em circunstâncias como as do presente caso, deve o conceito de “lugar onde ocorreu […] o facto danoso”, na aceção do artigo 5.o, [ponto] 3, do Regulamento [n.o 44/2001], ser entendido como o lugar da celebração do acordo ilícito entre as recorridas que viola o artigo 82.o, [segundo parágrafo,] alínea c), [CE] [atual artigo 102.o, segundo parágrafo, alínea c), TFUE] ou como o lugar da prática dos atos pelos quais procederam à exploração da vantagem económica obtida com o referido acordo, através da aplicação de preços predatórios (subvenções cruzadas) quando estavam em concorrência com a recorrente nos mesmos mercados?

2)      No presente caso, pode o dano (perda de receitas) sofrido pela recorrente devido aos atos ilícitos especificados das recorridas ser considerado um dano na aceção do artigo 5.o, [ponto] 3, do Regulamento [n.o 44/2001]?

3)      Nas circunstâncias do presente caso, deve considerar‑se que os atos de exploração da sucursal da Air Baltic […] na […] Lituânia constituem a exploração de uma sucursal na aceção do artigo 5.o, [ponto] 5, do Regulamento [n.o 44/2001]?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Observações preliminares

26      A fim de responder às questões submetidas, importa recordar que é apenas em derrogação à regra geral enunciada no artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 44/2001, que atribui a competência aos tribunais do Estado‑Membro no território do qual o demandado está domiciliado, que o capítulo II, secção 2, deste regulamento prevê um certo número de atribuições de competências especiais, entre as quais figura a do artigo 5.o, pontos 3 e 5, do referido regulamento. Na medida em que tanto a competência dos tribunais do lugar onde ocorreu o facto danoso, na aceção do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, como a competência dos tribunais do lugar da situação de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento para os litígios relativos à sua exploração, na aceção do artigo 5.o, ponto 5, do mesmo regulamento, constituem regras de competência especial, estas devem ser interpretadas de maneira autónoma e estrita, o que não permite uma interpretação que vá além dos casos expressamente previstos no referido regulamento (v., neste sentido, em matéria de exploração de uma sucursal, Acórdão de 22 de novembro de 1978, Somafer, 33/78, EU:C:1978:205, n.os 7 e 8, e, em matéria de responsabilidade extracontratual, Acórdão de 16 de junho de 2016, Universal Music International Holding, C‑12/15, EU:C:2016:449, n.o 25 e jurisprudência referida).

27      Segundo jurisprudência constante, estas regras de competência especial previstas no artigo 5.o, pontos 3 e 5, do referido regulamento baseiam‑se na existência de um elemento de conexão particularmente estreito entre o litígio e os tribunais que podem ser chamados a dele conhecer, que justifica uma atribuição de competência a estes últimos por razões de boa administração da justiça e de organização útil do processo (v., neste sentido, em matéria de exploração de uma sucursal, Acórdãos de 22 de novembro de 1978, Somafer, 33/78, EU:C:1978:205, n.o 7, e de 6 de abril de 1995, Lloyd's Register of Shipping, C‑439/93, EU:C:1995:104, n.o 21, bem como, em matéria de responsabilidade extracontratual, Acórdãos de 16 de junho de 2016, Universal Music International Holding, C‑12/15, EU:C:2016:449, n.o 26, e de 17 de outubro de 2017, Bolagsupplysningen e Ilsjan, C‑194/16, EU:C:2017:766, n.o 26).

28      Relativamente ao conceito de «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» constante do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, resulta da jurisprudência constante que estes termos se referem simultaneamente ao lugar da materialização do dano e ao lugar do evento causal que está na origem desse dano, de modo que o requerido pode ser demandado, à escolha do requerente, perante o tribunal de um ou de outro destes lugares (v., designadamente, Acórdãos de 19 de abril de 2012, Wintersteiger, C‑523/10, EU:C:2012:220, n.o 19; de 28 de janeiro de 2015, Kolassa, C‑375/13, EU:C:2015:37, n.o 45; e de 16 de junho de 2016, Universal Music International Holding, C‑12/15, EU:C:2016:449, n.o 28 e jurisprudência referida).

29      É à luz destas considerações que há que responder às questões prejudiciais submetidas.

 Quanto à segunda questão

30      Com a sua segunda questão, que há que analisar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de reparação de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, a perda de receitas alegada pela parte vítima destes comportamentos pode constituir um dano que permite fundamentar a competência dos tribunais do Estado‑Membro do «lugar onde ocorreu […] o facto danoso». Na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio refere também a ocorrência deste dano, há que compreender esta questão como reportando‑se, designadamente, à determinação do lugar da materialização do dano, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 28 do presente acórdão.

31      Como foi recordado pelo advogado‑geral no n.o 37 das suas conclusões, há que distinguir entre o dano inicial, diretamente decorrente do evento causal, cujo lugar de ocorrência pode justificar a competência à luz do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, das consequências adversas subsequentes que não são suscetíveis de fundamentar uma atribuição de competência com base nesta disposição.

32      A este respeito, nos n.os 14 e 15 do Acórdão de 19 de setembro de 1995, Marinari (C‑364/93, EU:C:1995:289), o Tribunal de Justiça declarou que o conceito de «lugar onde ocorreu o facto danoso» não pode ser interpretado de modo extensivo ao ponto de englobar qualquer lugar onde se podem fazer sentir as consequências danosas de um facto que causou já um dano efetivamente ocorrido noutro lugar. Por conseguinte, precisou que este conceito não pode ser interpretado como abrangendo o lugar onde a vítima alega ter sofrido um prejuízo patrimonial consecutivo a um dano inicial ocorrido e sofrido por esta noutro Estado.

33      Nestas condições, com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em primeiro lugar, se uma perda de receitas, como a alegada pela flyLAL, pode ser qualificada de «dano inicial», na aceção desta jurisprudência, ou se constitui apenas um prejuízo financeiro consecutivo que não pode justificar, por si só, a aplicação do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001.

34      Como resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça, sob reserva da apreciação dos factos que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio realizar, a perda de receitas alegada pela flyLAL consiste nas perdas alegadamente sofridas devido à dificuldade de explorar de maneira rentável voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius, na sequência dos preços predatórios praticados pela Air Baltic, que foram alegadamente financiados graças às reduções das taxas aeroportuárias de que a Air Baltic beneficiara a montante, através de um acordo anticoncorrencial celebrado com o Aeroporto de Riga. No caso em apreço, como alegou a flyLAL na audiência, estão nomeadamente em causa perdas de vendas nas ligações aéreas com origem e destino no Aeroporto de Vilnius afetadas por estes comportamentos.

35      O Tribunal de Justiça já decidiu, no contexto de uma alegada violação da proibição de revenda de produtos fora de uma rede de distribuição seletiva, resultante da proposta, em sítios Internet, de produtos abrangidos por essa rede, que a redução do volume de vendas e a perda de receitas daí decorrentes sofridas pelo distribuidor autorizado constituem um dano suscetível de tornar aplicável o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 (v., neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Concurrence, C‑618/15, EU:C:2016:976, n.os 33 e 35).

36      Importa também considerar que uma perda de receitas que consiste, designadamente, numa perda de vendas alegadamente sofrida na sequência de comportamentos anticoncorrenciais contrários aos artigos 101.o e 102.o TFUE é suscetível de ser qualificada de «dano» para efeitos da aplicação do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, que permite justificar, em princípio, a competência dos tribunais do Estado‑Membro em cujo território ocorreu o facto danoso.

37      Em segundo lugar, a segunda questão visa determinar o lugar da materialização desse dano.

38      Decorre da decisão de reenvio, por um lado, que os comportamentos alegadamente anticoncorrenciais das recorridas no processo principal tiveram por objeto o mercado dos voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius, acarretando, segundo a flyLAL, uma distorção da concorrência nesse mercado. Por outro lado, estes comportamentos causaram um prejuízo à flyLAL.

39      No caso vertente, no que respeita a perdas que uma companhia aérea sofreu em voos operados com origem e destino na capital do Estado‑Membro em que a referida companhia tem sede, deve considerar‑se que o mercado essencialmente afetado é o do Estado‑Membro no qual a referida companhia desenvolve o essencial das suas atividades de vendas referentes a esses voos, a saber, o mercado lituano.

40      Quando o mercado afetado pelo comportamento anticoncorrencial se localiza no Estado‑Membro em cujo território o alegado dano supostamente ocorreu, há que considerar que o lugar da materialização do dano, para efeitos da aplicação do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, se localiza nesse Estado‑Membro. Esta solução, fundada na concordância destes dois elementos, corresponde, com efeito, aos objetivos de proximidade e de previsibilidade das regras de competência, na medida em que, por um lado, os tribunais do Estado‑Membro no qual se situa o mercado afetado são os mais bem colocados para apreciar essas ações de indemnização e, por outro, um operador económico que se dedica a comportamentos anticoncorrenciais pode razoavelmente esperar ser demandado nos tribunais do lugar onde os seus comportamentos falsearam as regras de uma sã concorrência.

41      Além disso, como salientou o advogado‑geral no n.o 52 das suas conclusões, esta determinação do lugar da materialização do dano está em conformidade com as exigências de coerência previstas no considerando 7 do Regulamento (CE) n.o 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de julho de 2007, relativo à lei aplicável às obrigações extracontratuais (Roma II) (JO 2007, L 199, p. 40), na medida em que, segundo o artigo 6.o, n.o 3, alínea a), deste regulamento, a lei aplicável às ações de responsabilidade civil relacionadas com uma restrição de concorrência é a lei do país em que o mercado seja afetado ou seja suscetível de ser afetado.

42      Tendo em conta que o litígio no processo principal implica vários recorridos, há, por outro lado, que recordar que esta competência opera também em caso de pluralidade de autores de um dano, na medida em que o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 permite determinar a competência de um tribunal por força do lugar da materialização do dano alegado relativamente a todos os autores alegadamente responsáveis, desde que este se materialize na área de jurisdição do tribunal chamado a decidir (v., neste sentido, Acórdão de 3 de abril de 2014, Hi Hotel HCF, C‑387/12, EU:C:2014:215, n.o 40).

43      Tendo em conta estas considerações, há que responder à segunda questão que o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de indemnização de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, o «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» se refere, numa situação como a que está em causa no processo principal, concretamente ao lugar da materialização de uma perda de receitas que consiste numa perda de vendas, isto é, ao lugar do mercado afetado pelos referidos comportamentos no qual a vítima alega ter sofrido essas perdas.

 Quanto à primeira questão

44      Embora a primeira questão diga respeito, segundo os seus termos, à prática de preços predatórios relacionados com o artigo 102.o TFUE, tem também por objeto a situação relativa à celebração, a montante, de um acordo anticoncorrencial contrário ao artigo 101.o TFUE.

45      Com esta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de indemnização de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, o conceito de «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» pode ser entendido como sendo o lugar da celebração de um acordo anticoncorrencial contrário ao artigo 101.o TFUE ou o lugar onde foram praticados os atos que exploraram a vantagem financeira resultante desse acordo, que consistiram nomeadamente na aplicação de preços predatórios constitutiva de um abuso de posição dominante previsto no artigo 102.o TFUE.

46      Antes de mais, importa observar, como foi recordado no n.o 28 do presente acórdão, que o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 confere ao demandante a faculdade de recorrer ao tribunal do lugar da materialização do dano ou ao tribunal do lugar do evento causal que está na origem do dano, pelo que um tribunal pode legalmente ser chamado a decidir com fundamento numa destas duas regras de atribuição de competência.

47      No caso vertente, o processo principal caracteriza‑se pela existência de uma cadeia de eventos em que cada um deles pode constituir, por si só, o «evento causal que está na origem do dano» alegado, ficando todavia também em aberto a situação em que o dano resulta da interação destes. Assim, o órgão jurisdicional de reenvio faz referência, por um lado, a comportamentos anticoncorrenciais no âmbito dos quais o Aeroporto de Riga concedeu descontos preferenciais à Air Baltic, relativos aos serviços de descolagem, de aterragem e de proteção das aeronaves, o que reforçou a posição dominante desta última no mercado dos voos com destino e origem no Aeroporto Internacional de Riga, bem como a um acordo anticoncorrencial alegadamente celebrado entre o referido aeroporto e a Air Baltic para esse efeito, e, por outro lado, a atos de exploração da vantagem financeira resultante desse acordo, nomeadamente através da aplicação, pela Air Baltic, de preços predatórios em certos voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius. Uma vez que é alegada no processo principal a existência de um acordo ilegal por força do artigo 101.o TFUE, a prática dos preços predatórios pode limitar‑se a uma execução desse acordo ou pode constituir, por sua vez, uma infração distinta à luz do 102.o TFUE.

48      Nestas circunstâncias particularmente complexas, a determinação concreta do lugar do evento causal que está na origem do dano depende assim, designadamente, da questão de saber se os comportamentos anticoncorrenciais alegados são constitutivos de um acordo anticoncorrencial, por força do artigo 101.o TFUE, e/ou de um abuso de uma posição dominante, por força do artigo 102.o TFUE.

49      Sem prejuízo das verificações que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar no que respeita, no caso vertente, à relação entre os diferentes comportamentos anticoncorrenciais em causa, há que observar que, na medida em que resulta das circunstâncias factuais do processo principal que o acordo anticoncorrencial, alegadamente celebrado em violação do artigo 101.o TFUE, constitui o evento causal que está na origem do dano alegado, a competência para conhecer, ao abrigo do «evento causal que está na origem do dano» e relativamente a todos os autores desse acordo, de um dano alegadamente causado por este pode caber, por força do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001, ao tribunal do lugar onde o acordo foi efetivamente celebrado (v., neste sentido, Acórdão de 21 de maio de 2015, CDC Hydrogen Peroxide, C‑352/13, EU:C:2015:335, n.o 50). Neste caso, o lugar da celebração do alegado acordo anticoncorrencial pode ser identificado como sendo a Letónia.

50      Esta solução deve também ser a escolhida se se determinar que a prática pela Air Baltic de preços predatórios em certos voos com origem e destino no Aeroporto de Vilnius se limitava a atos de execução desse acordo.

51      Em contrapartida, se a prática de preços predatórios constituir uma infração distinta do artigo 102.o TFUE, o tribunal do lugar onde o comportamento anticoncorrencial em causa foi executado é competente ao abrigo do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001.

52      Com efeito, diferentemente de um dano resultante de um acordo ilícito entre diversos participantes, o evento causal que está na origem do dano nos casos de exploração abusiva de uma posição dominante não se baseia num acordo, mas reside na execução dessa exploração, isto é, nos atos praticados pela empresa dominante para a pôr em prática, concretamente propondo e aplicando preços predatórios no mercado em causa.

53      No caso de os eventos que estão na origem do processo principal fazerem parte de uma estratégia comum com vista a expulsar a flyLAL do mercado dos voos com destino e origem no Aeroporto de Vilnius e que concorreram em conjunto para a realização do dano alegado, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio identificar o evento que reveste uma importância particular para a execução dessa estratégia no âmbito da cadeia de eventos em causa no processo principal.

54      Esta análise será levada a cabo unicamente para identificar os elementos de conexão com o Estado do foro que justificam a sua competência ao abrigo do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 (Acórdão de 16 de junho de 2016, Universal Music International Holding, C‑12/15, EU:C:2016:449, n.o 44), devendo o órgão jurisdicional de reenvio limitar‑se a este respeito a uma análise prima facie do litígio sem apreciação do respetivo mérito, na medida em que, como salientou, em substância, o advogado‑geral nos n.os 89 a 92 das suas conclusões, a determinação dos elementos de responsabilidade civil extracontratual, entre os quais o facto gerador do prejuízo, está abrangida pelo direito nacional aplicável.

55      Com efeito, uma solução que consista em fazer depender a identificação do elemento de conexão de critérios de apreciação oriundos do direito material nacional seria contrária ao objetivo de segurança jurídica, uma vez que, em função do direito aplicável, a atuação de uma pessoa que teve lugar num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro do tribunal chamado a decidir poderia ser qualificada ou não de evento causal para efeitos de atribuição de competência ao abrigo do artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 (Acórdão de 16 de maio de 2013, Melzer, C‑228/11, EU:C:2013:305, n.o 35).

56      Como salientou o advogado‑geral no n.o 96 das suas conclusões, a escolha de um evento específico como sendo pertinente para efeitos de determinação da competência jurisdicional evita a multiplicação de foros competentes. Isto está em conformidade com o caráter especial da competência prevista no artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 e com a necessidade de uma interpretação restritiva, respeitando simultaneamente uma melhor previsibilidade.

57      Tendo em conta estas considerações, há que responder à primeira questão que o artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de indemnização de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, o conceito de «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» pode ser entendido como sendo o lugar da celebração de um acordo anticoncorrencial contrário ao artigo 101.o TFUE ou o lugar onde os preços predatórios foram propostos e aplicados, se estas práticas forem constitutivas de uma infração do artigo 102.o TFUE.

 Quanto à terceira questão

58      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio questiona o Tribunal de Justiça, em substância, sobre a interpretação do conceito de «litígio relativo à exploração de uma sucursal» no sentido do artigo 5.o, ponto 5, do Regulamento n.o 44/2001, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal.

59      A este respeito, cumpre recordar que o Tribunal de Justiça identificou dois critérios que determinam se uma ação judiciária relativa à exploração de uma sucursal tem conexão com um Estado‑Membro. Em primeiro lugar, o conceito de «sucursal» pressupõe a existência de um centro de operações que se manifesta de forma durável face ao exterior, como prolongamento de uma casa‑mãe. Este centro deve ter uma direção e estar materialmente equipado para poder negociar com terceiros, os quais são assim dispensados de se dirigir diretamente à casa‑mãe. Em segundo lugar, o litígio deve dizer respeito seja a atos relativos à exploração de uma sucursal seja a obrigações assumidas por esta em nome da casa‑mãe, quando estas obrigações devem ser executadas no Estado em que essa sucursal está situada (v., neste sentido, Acórdão de 19 de julho de 2012, Mahamdia, C‑154/11, EU:C:2012:491, n.o 48 e jurisprudência referida).

60      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, não há dúvida de que os requisitos exigidos pelo primeiro critério, conforme previstos pela jurisprudência, estão preenchidos no caso vertente. Esse órgão jurisdicional interroga‑se unicamente, no âmbito da apreciação do segundo critério, sobre se o litígio no processo principal diz respeito à «exploração» da sucursal que a Air Baltic detém na Lituânia.

61      A este respeito, o referido órgão jurisdicional afirma que, embora esta sucursal disponha, em conformidade com o seu estatuto, do poder de estabelecer relações económicas com terceiros, e designadamente de fixar os preços dos seus serviços, não há dados que demonstrem que esta tenha efetivamente fixado os preços dos voos nos mercados em causa no processo principal. Além disso, a sucursal não elaborou uma contabilidade separada da da casa‑mãe.

62      Uma vez que institui uma derrogação à regra geral de competência prevista no artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 44/2001, o artigo 5.o, ponto 5, deste regulamento deve ser interpretado de forma estrita, como foi recordado no n.o 26 do presente acórdão.

63      Por conseguinte, como salientou o advogado‑geral nos n.os 137 e 142 das suas conclusões, no caso de ações fundadas na responsabilidade civil extracontratual, para que o litígio seja relativo à exploração de uma sucursal, esta deve efetivamente participar em certos atos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual.

64      No caso em apreço, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio identificar o eventual papel da sucursal da Air Baltic na prática dos comportamentos anticoncorrenciais alegados. À luz das indicações que resultam da decisão de reenvio, cabe‑lhe apreciar, nomeadamente, se as atividades exercidas por esta sucursal consistiram em atos efetivos de proposta e aplicação dos preços predatórios alegados e se esta participação no abuso de posição dominante alegado foi suficientemente significativa para se considerar que apresenta um nexo estreito com o litígio no processo principal.

65      Quanto à circunstância de a sucursal da Air Baltic não ter elaborado documentos contabilísticos distintos dos da sociedade‑mãe, há que salientar que este facto não constitui um critério pertinente para determinar se esta sucursal participou efetivamente na prática de preços predatórios que a flyLAL acusa a Air Baltic de ter seguido.

66      Tendo em conta estas considerações, há que responder à terceira questão que o artigo 5.o, ponto 5, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «litígio relativo à exploração de uma sucursal» abrange a ação de indemnização de um prejuízo alegadamente causado por um abuso de posição dominante que consiste na aplicação de preços predatórios, quando uma sucursal da empresa que detém a posição dominante participou, de uma maneira efetiva e significativa, nessa prática abusiva.

 Quanto às despesas

67      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      O artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de indemnização de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, o «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» se refere, numa situação como a que está em causa no processo principal, concretamente ao lugar da materialização de uma perda de receitas que consiste numa perda de vendas, isto é, ao lugar do mercado afetado pelos referidos comportamentos no qual a vítima alega ter sofrido essas perdas.

2)      O artigo 5.o, ponto 3, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, no âmbito de uma ação de indemnização de um prejuízo causado por comportamentos anticoncorrenciais, o conceito de «lugar onde ocorreu […] o facto danoso» pode ser entendido como sendo o lugar da celebração de um acordo anticoncorrencial contrário ao artigo 101.o TFUE ou o lugar onde os preços predatórios foram propostos e aplicados, se estas práticas forem constitutivas de uma infração do artigo 102.o TFUE.

3)      O artigo 5.o, ponto 5, do Regulamento n.o 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «litígio relativo à exploração de uma sucursal» abrange a ação de indemnização de um prejuízo alegadamente causado por um abuso de posição dominante que consiste na aplicação de preços predatórios, quando uma sucursal da empresa que detém a posição dominante participou, de uma maneira efetiva e significativa, nessa prática abusiva.

Assinaturas


*      Língua do processo: lituano.