Language of document : ECLI:EU:C:2002:650

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

PHILIPPE LÉGER

apresentadas em 12 de Novembro de 2002 (1)

Processo C-104/01

Libertel Groep BV

contra

Benelux-Merkenbureau

«Marca cromática - Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988 - Artigo 2.° - Sinal susceptível de representação gráfica - Sinal adequado a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas - Cor sem forma nem contornos - Exclusão»

1.
    Pode uma cor em si mesma, sem forma nem contornos, constituir uma marca na acepção da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho (2), para determinados produtos e serviços e, em caso afirmativo, em que condições? São estas, no essencial, as questões colocadas pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos) no presente processo.

I - Enquadramento jurídico

2.
    O enquadramento jurídico relevante compreende a Convenção da União de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial (3), a legislação comunitária e a Lei Uniforme Benelux sobre as Marcas.

A - Convenção de Paris

3.
    A Convenção de Paris, a que aderiram todos os Estados-Membros, constitui o instrumento de base das normas internacionais que regem a propriedade industrial.

4.
    A mesma não contém a definição de sinais susceptíveis de constituírem uma marca.

5.
    No artigo 6.° quinquies, A), prevê que qualquer marca de fábrica ou de comércio regularmente registada no país de origem será admitida a registo e como tal protegida nos outros países da União, com as restrições indicadas nesse artigo. No artigo 6.° quinquies, B), 2), indica que será recusado o registo das marcas quando forem desprovidas de qualquer carácter distintivo ou então exclusivamente compostas por sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, o lugar de origem dos produtos ou a época da produção, ou que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio do país em que a protecção é requerida.

6.
    Nos termos do artigo 6.° quinquies, C), para apreciar se a marca é susceptível de protecção deverão ter-se em conta todas as circunstâncias de facto, principalmente a duração do uso da marca.

B - Legislação comunitária

7.
    A legislação comunitária abrange a directiva e o Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho (4).

1.    Directiva

8.
    A directiva foi adoptada pelo Conselho com o objectivo de suprimir as disparidades entre as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas susceptíveis de distorcer as condições de concorrência no mercado comum. Visa aproximar as disposições dessas legislações que tenham uma incidência mais directa sobre o funcionamento do mercado interno (5). Incide apenas sobre as disposições relativas às marcas adquiridas pelo registo (6).

9.
    A directiva prevê, assim, as condições em que um sinal pode ser registado como marca (7). O artigo 2.°, que tem por epígrafe «Sinais susceptíveis de constituir uma marca», dispõe:

«Podem constituir marcas todos os sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respectiva embalagem, na condição de que tais sinais sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.»

10.
    O artigo 3.° da directiva, que refere os motivos de recusa ou de nulidade, está assim redigido:

«1.    Será recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efectuados, os registos relativos:

a)    aos sinais que não possam constituir uma marca;

b)    às marcas desprovidas de carácter distintivo;

c)    às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;

d)    às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio;

e)    aos sinais constituídos exclusivamente:

    -    pela forma imposta pela própria natureza do produto,

    -    pela forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico,

    -    pela forma que confira um valor substancial ao produto;

[...]

3.    Não será recusado o registo de uma marca ou este não será declarado nulo nos termos do n.° 1, alínea b), c) ou d), se, antes da data do pedido de registo e após o uso que dele foi feito, a marca adquiriu um carácter distintivo. Os Estados-Membros podem prever, por outro lado, que o disposto no primeiro período se aplicará também no caso em que o carácter distintivo tiver sido adquirido após o pedido de registo ou o registo.»

11.
    Nos termos do artigo 4.° da directiva, pode ser recusado o registo de uma marca, ou, tendo sido efectuado, ser declarado nulo, se a marca for idêntica a uma marca anterior ou se apresentar um risco de confusão com a mesma, relativamente a produtos e serviços idênticos ou similares àqueles para os quais a marca anterior está protegida.

12.
    Com o objectivo de garantir a função de origem da marca, a directiva define em seguida a protecção de que gozam as marcas registadas nos Estados-Membros (8). O artigo 5.° prevê:

«1.    A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

a)    de qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

b)    de um sinal relativamente ao qual, devido à sua identidade ou semelhança com a marca e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam, exista, no espírito do público, um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca.

2.    Qualquer Estado-Membro poderá também estipular que o titular fique habilitado a proibir que terceiros façam uso, na vida comercial, sem o seu consentimento, de qualquer sinal idêntico ou semelhante à marca para produtos ou serviços que não sejam semelhantes àqueles para os quais a marca foi registada, sempre que esta goze de prestígio no Estado-Membro e que o uso desse sinal, sem justo motivo, tire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou os prejudique.»

13.
    Contudo, a directiva não exclui a aplicação às marcas de disposições do direito dos Estados-Membros que não estejam abrangidas pelo direito de marcas, tais como disposições relativas à concorrência desleal, à responsabilidade civil ou à defesa dos consumidores (9). Assim, a directiva prevê, no seu artigo 5.°, n.° 5:

«Os n.os 1 a 4 não afectam as disposições aplicáveis num Estado-Membro relativas à protecção contra o uso de um sinal feito para fins diversos dos que consistem em distinguir os produtos ou serviços, desde que a utilização desse sinal, sem justo motivo, tire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou os prejudique.»

14.
    Todavia exige-se que as marcas registadas sejam efectivamente usadas sob pena de caducidade (10). Nos termos do artigo 10.° da directiva, esta caducidade ocorre se, num prazo de cinco anos, a marca não tiver sido objecto de uso sério pelo seu titular. Nos termos do artigo 10.°, n.° 2, alínea a), é considerado uso sério «[o] uso da marca por modo que difira em elementos que não alterem o carácter distintivo da marca na forma sob a qual foi registada».

2.    Regulamento

15.
    Como a directiva, o regulamento tem por objecto a eliminação dos obstáculos à livre circulação de mercadorias e à livre prestação de serviços e a instituição de um regime que assegure não haver falseamento da concorrência (11). Prevê a criação de uma marca protegida e que produza os seus efeitos em todo o território dos Estados-Membros da Comunidade, sem pôr em causa o direito das marcas desses Estados.

16.
    As disposições do regulamento relativas à aquisição dos direitos sobre a marca e aos efeitos da marca estão redigidas nos mesmos termos que as da directiva. Assim, o artigo 4.° retoma as disposições do artigo 2.° da directiva no que se refere aos sinais susceptíveis de constituir uma marca comunitária, o artigo 7.°, as do artigo 3.°, já referidas, relativas aos motivos de recusa de registo, e o artigo 9.°, as do artigo 5.°, já referidas, sobre os direitos conferidos pela marca. Do mesmo modo, a marca comunitária apenas é protegida na medida em que seja utilizada. O artigo 15.° do regulamento retoma as disposições do artigo 10.° da directiva, já referidas, relativas à utilização da marca.

C - Lei Uniforme Benelux sobre as Marcas

17.
    Ïs três Estados-Membros da União Económica Benelux estabeleceram o seu direito das marcas através de uma lei comum, a Lei Uniforme Benelux sobre as Marcas (12). Esta lei foi alterada com efeitos em 1 de Janeiro de 1996 por um protocolo, assinado em Bruxelas em 2 de Dezembro de 1992, que visava a transposição da directiva para os ordenamentos jurídicos dos três países do Benelux (13).

18.
    O artigo 1.° da LBM estabelece:

«São consideradas como marcas individuais as denominações, os desenhos, as impressões, os carimbos, as letras, os algarismos, as formas dos produtos ou da sua apresentação e os demais sinais que sejam adequados para distinguir os produtos de uma empresa.

Todavia, não podem ser consideradas como marcas as formas impostas pela natureza do próprio produto, ou que afectem o seu valor essencial ou produzam resultados industriais.»

19.
    O artigo 6.° bis da LBM estabelece:

«1.    O Benelux-Merkenbureau recusar-se-á a registar um depósito quando considerar que:

a)    o sinal depositado não constitui uma marca na acepção do artigo 1.°, nomeadamente por lhe faltar todo e qualquer carácter distintivo tal como previsto no artigo 6.° quinquies, B), alínea 2), da Convenção de Paris;

[...]

3.    O Benelux-Merkenbureau informará o depositário, imediatamente e por escrito, da sua intenção de recusar o registo no todo ou em parte, indicando-lhe as razões e dando-lhe a faculdade de lhes dar resposta num prazo a fixar pelo regulamento de aplicação.

4.    Se as objecções do Benelux-Merkenbureau contra o registo não forem retiradas no prazo fixado, o registo do depósito será recusado no todo ou em parte. O Benelux-Merkenbureau informará o depositante, imediatamente e por escrito, indicando os fundamentos da recusa e mencionando a via de recurso desta decisão, referida no artigo 6.° ter.

5.    A recusa de registo do depósito em relação a todos os produtos ou uma parte dos mesmos implica a nulidade total ou parcial do depósito. Esta nulidade não produz efeitos antes de ter terminado, sem ser utilizado, o prazo de recurso previsto no artigo 6.° ter ou sem que tenha sido indeferido irrevogavelmente o pedido de registo.»

20.
    O artigo 6.° ter da LBM está assim redigido:

«O depositante pode, nos dois meses subsequentes à comunicação referida no artigo 6.° bis, n.° 4, interpor para a Cour d'appel de Bruxelas, para o Gerechtshof de Haia ou para a Cour d'appel do Luxemburgo um recurso destinado a obter uma ordem de registo do depósito [...]. O tribunal territorialmente competente determina-se pelo domicílio do depositante, do mandatário ou pelo endereço postal mencionado no momento do depósito.»

II - Matéria de facto e tramitação processual

21.
    Em 27 de Agosto de 1996, a Libertel Groep BV (14) requereu no Instituto Benelux de Marcas (15) o registo da cor laranja.

22.
    Este pedido foi formalizado no requerimento de registo através de uma superfície rectangular de cor laranja no espaço reservado à representação do sinal. Na rubrica destinada, designadamente, a indicar a cor do sinal, era acrescentado «laranja» (16).

23.
    Os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo desta cor integram as classes 9 e 35 a 38 na acepção do Acordo de Nice relativo à classificação internacional dos produtos e serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado. A Libertel especificou que se trata, relativamente aos produtos da classe 9, de materiais de telecomunicações e, para os serviços das classes 35 a 38, de serviços de telecomunicações bem como da gestão material, financeira e técnica de meios de telecomunicações (17).

24.
    Por carta de 21 de Fevereiro de 1997, o IBM informou o mandatário da Libertel de que o pedido era provisoriamente recusado dado aquela não ter demonstrado que a cor laranja tinha adquirido carácter distintivo pelo uso (18).

25.
    A Libertel apresentou observações com vista a fazer prova de tal aquisição.

26.
    Por carta de 10 de Setembro de 1997, o IBM notificou a recusa do registo da referida cor por falta de carácter distintivo.

27.
    Ao recurso interposto pela Libertel desta decisão para o Gerechtshof de Haia (Países Baixos) foi negado provimento pela mesma razão.

28.
    A Libertel interpôs recurso de cassação da decisão do Gerechtshof de Haia para o Hoge Raad der Nederlanden.

III - As questões prejudiciais

29.
    O Hoge Raad der Nederlanden, por despacho de 23 de Fevereiro de 2001, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)    Uma simples cor específica, reproduzida enquanto tal ou designada por um código internacional, é susceptível de apresentar, para certos produtos e serviços, um carácter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva?

2)    Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

    a)    Em que circunstâncias se pode admitir que uma simples cor específica possui carácter distintivo no sentido acima referido?

    b)    O facto de o registo ser pedido para um número importante de produtos ou serviços ou apenas para um produto ou serviço específico ou para um grupo específico de produtos ou serviços pode alterar a resposta à primeira questão?

3)    Para apreciar o carácter distintivo que pode apresentar determinada cor enquanto marca, é necessário examinar se existe um interesse geral que justifique que esta cor se mantenha à disposição de todos, como é o caso dos sinais que designam uma proveniência geográfica?

4)    Para responder à questão de saber se um sinal depositado enquanto marca possui carácter distintivo na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva, o Instituto de Marcas Benelux deve limitar-se a uma apreciação deste carácter distintivo em abstracto ou deve ter em conta todas as circunstâncias concretas do caso em apreço e, designadamente, o uso que será dado a este sinal e o modo como é utilizado?»

IV - Apreciação

A - Objecto do litígio

30.
    Importa recordar que, de acordo com jurisprudência constante, compete apenas ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (19). Apesar disso, o Tribunal de Justiça considera que tem por missão interpretar todas as disposições de direito comunitário de que os órgãos jurisdicionais nacionais têm necessidade para decidir sobre os litígios que lhes são submetidos, ainda que essas disposições não sejam expressamente referidas nas questões que lhe são submetidas por esses órgãos jurisdicionais (20).

31.
    Assim, no acórdão de 25 de Fevereiro de 1999, Swaddling (21), o Tribunal de Justiça interpretou um acto de direito derivado, quando o reenvio incidia unicamente sobre a interpretação de determinados artigos do Tratado CE.

32.
    No caso concreto, o órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao Tribunal de Justiça várias questões prejudiciais sobre o artigo 3.° da directiva com o objectivo de determinar se, e eventualmente em que condições, uma cor sem forma nem contornos é susceptível de apresentar um carácter distintivo para certos produtos e serviços.

33.
    Ora, como a Comissão sublinha correctamente (22), o exame destas questões exige que seja determinado previamente se uma cor constitui por si só um sinal susceptível de constituir uma marca na acepção do artigo 2.° da directiva.

34.
    Com efeito, apenas os sinais que preencham as condições previstas neste artigo podem ser registados como marca. Como confirma o artigo 3.°, n.° 1, alínea a), da directiva, os sinais que não preencham essas condições são, por natureza, insusceptíveis de constituir uma marca.

35.
    Importa, pois, apreciar se o artigo 2.° da directiva deve ser interpretado no sentido de que uma cor por si só, sem forma nem contornos, constitui um sinal susceptível de representação gráfica adequado a distinguir os produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas.

B - Argumentos das partes intervenientes

36.
    A Libertel (23), o IBM (24), o Governo neerlandês (25), o Governo do Reino Unido (26) e a Comissão (27) consideram que uma cor, só por si, pode ser registada como marca.

37.
    Segundo a Comissão, uma cor, enquanto característica visual é, por definição, susceptível de representação gráfica (28). Além disso, uma cor pode, de um modo geral, ter um carácter distintivo. A Comissão sublinha que as cores podem constituir um elemento importante da comunicação entre uma empresa e os seus clientes ou os consumidores; com efeito, captam a atenção, podem possuir um significado intrínseco e provocar determinadas associações no espectador (29).

38.
    A Comissão, a Libertel e o IBM invocam em apoio da sua tese a declaração comum do Conselho da União Europeia e da Comissão que consta da acta da reunião do Conselho em que a directiva foi adoptada. Nos termos desta declaração, o «Conselho e a Comissão são da opinião que o artigo 2.° [da directiva] não exclui a possibilidade de registar como marca uma combinação de cores ou uma única cor [...] desde que elas sejam adequadas a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas» (30).

39.
    A Comissão, o Governo do Reino Unido e o IBM sublinham, por fim, que a sua posição é compartilhada pelo Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI). Segundo o IHMI, uma cor só por si pode, em termos gerais, ser protegida como marca por força do artigo 4.° do regulamento, dado que entra na categoria designada pela expressão «todos os sinais» que deve ser interpretada no sentido mais amplo. Refere que limitar a protecção das marcas de cor a uma representação específica seria contrário ao espírito do direito comunitário das marcas e que não é necessário um contorno ou uma delimitação no caso de uma representação gráfica na acepção do artigo 4.° do regulamento (31).

C - Análise

40.
    Contrariamente às intervenientes, entendemos que o artigo 2.° da directiva se opõe a que uma cor sem forma nem contornos possa ser registada como marca.

41.
    Consideramos, com efeito, que uma cor só por si não preenche as condições previstas neste artigo no sentido em que, por um lado, não constitui um sinal susceptível de representação gráfica e, por outro, não é adequada a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

42.
    Contudo, antes de examinar cada uma das condições controvertidas, parece-nos útil lembrar sucintamente algumas características essenciais do conceito de «cor».

1.    O conceito de «cor»

43.
    «A cor é um conceito que todos compreendem intuitivamente, mas que é difícil de definir em termos universais» (32). Contudo, admite-se que a cor é uma sensação. Trata-se da percepção através do aparelho visual e da transmissão ao cérebro dos efeitos de um feixe luminoso sobre a matéria. A cor não constitui, portanto, uma realidade objectiva pré-existente de que nos limitemos a tomar consciência, como uma película colocada sobre um objecto. Ela depende, por um lado, da natureza e da intensidade da luz e, por outro, do aparelho visual do observador. Assim, a cor de um objecto altera-se em função da sua iluminação e da distância a que o mesmo é observado. A sua percepção varia igualmente em função dos indivíduos (33).

44.
    A cor foi objecto de vários modos de organização. Newton, a quem é atribuída a primeira interpretação da decomposição de uma luz complexa por um prisma, fixou em sete o número de cores principais do espectro (34). Os pintores distinguem as cores fundamentais, o amarelo, o vermelho e o azul, a partir das quais é possível produzir as outras cores, chamadas «compostas». Para as aplicações industriais da cor, os profissionais elaboraram diferentes colecções de amostras rigorosamente especificadas mediante códigos que permitem definir um grande número de tonalidades (35). Contudo, a visão humana apenas pode distinguir com precisão um número limitado de matizes de cores (36). Além disso, o número de palavras específicas para denominar as cores é ainda mais reduzido (37). O número de cores que podem ser identificadas e descritas com precisão por um observador é, pois, bastante restrito.

45.
    Por fim, a cor é uma linguagem. Como se trata de uma sensação que traduz a aparência das coisas, pode suscitar sentimentos no observador. Pode também transmitir informações. Estes sentimentos, como as informações, são fenómenos meramente culturais. Baseiam-se em convenções de ordem psicológica, simbólica, religiosa ou outras, que variam no tempo e no espaço (38). Contudo, na realidade, a cor não tem existência autónoma. Procedendo de uma interacção entre um feixe luminoso e a matéria, é sempre o atributo de qualquer coisa. Se, em função da sua intensidade, da sua luminosidade, a cor de um objecto atrai o nosso olhar, o que o cérebro apercebe e regista não é a cor enquanto tal, mas o objecto que apresenta essa cor. Assim, a memória visual, cujo carácter forte e duradouro a experiência demonstrou (39) é constituída pelas representações mentais dos objectos que nos rodeiam.

46.
    É tendo em conta estas observações que cabe apreciar as duas condições previstas no artigo 2.° da directiva.

2.    Sinal susceptível de representação gráfica

47.
    Importa lembrar que, de acordo com jurisprudência constante, para a interpretação de uma disposição de direito comunitário, há que ter em conta não apenas os seus termos, mas também o seu contexto e os objectivos prosseguidos pela regulamentação em que está integrada (40).

48.
    Consideramos que os argumentos adiantados pelas intervenientes a favor da admissão de uma cor por si só como marca, baseados no texto do artigo 2.° da directiva e na intenção do legislador, não são convincentes.

49.
    Relativamente, antes de mais, à redacção do artigo 2.° da directiva, idêntico neste particular na maioria das versões linguísticas, nenhuma conclusão pode ser retirada, em nosso entender, da expressão «todos os sinais», bem como do carácter indicativo da lista dos sinais enumerados nesse artigo e que são susceptíveis de serem representados graficamente.

50.
    Ao invés, a ambiguidade do artigo em causa quanto à questão de saber se uma cor por si só deve ser considerada um sinal susceptível de constituir uma marca resulta do facto de a sua transposição nos diferentes ordenamentos dos Estados-Membros ter dado lugar a soluções diferentes. Assim, o registo de uma cor enquanto tal é excluído expressamente pela legislação portuguesa (41). Está previsto, nos direitos francês e italiano, unicamente no que concerne respectivamente, a matizes de cores (42) ou a tonalidades cromáticas (43). É admitido no direito alemão (44). Por fim, não é objecto de nenhuma resposta expressa nos direitos do Benelux, dinamarquês, grego, irlandês, austríaco, finlandês, sueco e do Reino Unido. O mesmo sucede em relação ao direito espanhol após a entrada em vigor, em 31 de Julho de 2002, da nova lei de marcas (45).

51.
    No que se refere, em seguida, à declaração comum do Conselho e da Comissão, já referida, a mesma afigura-se-nos desprovida de valor jurídico, por duas razões.

52.
    Por um lado, o Tribunal de Justiça declarou, no acórdão de 26 de Fevereiro de 1991, Antonissen (46) que uma declaração constante da acta da reunião do Conselho no decurso da qual foi adoptada uma disposição de direito derivado não pode ser considerada para efeitos de interpretação desta quando o conteúdo dessa declaração não encontre qualquer expressão no texto da disposição em causa, e aquela não tenha, assim, alcance jurídico. Esta posição foi confirmada pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 29 de Maio de 1997, VAG Sverige (47).

53.
    Por outro lado, importa realçar que o Conselho e a Comissão indicaram, no preâmbulo dessa declaração, que esta não prejudicava a interpretação da directiva pelo Tribunal de Justiça (48). O Conselho e a Comissão tiveram, portanto, a preocupação de eles próprios limitarem expressamente os efeitos jurídicos da sua declaração. É, pois, excessivo inferir consequências da intenção do legislador para a interpretação do artigo 2.° da directiva.

54.
    A este propósito, é oportuno sublinhar que o acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (49), a que aderiram os Estados-Membros e a Comunidade nas matérias da sua competência, apenas cita, no artigo 15.°, as combinações de cores (50). Esta restrição permite presumir que uma cor, per se, foi considerada, no âmbito das negociações dos acordos OMC, como inadequada para ser registada como marca. Esta apreciação é corroborada pelo facto de o texto original deste artigo, datado de 1990, mencionar as cores (51).

55.
    O exame da economia da directiva e do objectivo subjacente à condição apreciada leva igualmente à exclusão de uma cor, por si só considerada, dos sinais susceptíveis de constituir uma marca.

56.
    Resulta, com efeito, da economia da directiva, que esta prevê a protecção da marca antes de qualquer uso, a partir do seu registo. Este está, assim, subordinado a um determinado número de condições que devem ser verificadas pelo organismo competente.

57.
    Assim, o sinal em causa deve ter aptidão genérica para constituir uma marca em obediência aos artigos 2.° e 3.°, n.° 1, alínea a), da directiva. Além disso, não deve colidir com nenhum dos outros motivos de recusa previstos no artigo 3.°, n.° 1, nem com direitos anteriores referidos no artigo 4.° da directiva.

58.
    Dado que a apreciação destas condições deve ocorrer, a priori, à margem da tomada em consideração de um uso eventual, apenas pode ter lugar a partir do sinal tal como este aparece descrito no requerimento de registo.

59.
    Se o sinal preenche as condições previstas, é registado como marca. É, em seguida, a partir da marca registada que a autoridade competente poderá apreciar se o sinal de um concorrente é idêntico a este ou apresenta risco de confusão com o mesmo, em conformidade com o artigo 5.° da directiva. Por fim, é igualmente por referência ao sinal registado que será apreciada a questão de saber se o titular da marca dela fez um uso suficiente para que o seu direito não caduque, em conformidade com o artigo 10.° da directiva.

60.
    Resulta, pois, da economia da directiva que é a partir da representação gráfica do sinal que figura no requerimento de registo que se efectua o exame do conjunto das condições relativas à aquisição dos direitos sobre a marca e que são determinados os direitos e as obrigações decorrentes do registo desta.

61.
    A economia da directiva leva, portanto, a interpretar a primeira condição do seu artigo 2.° como destinada a permitir conhecer precisamente o sinal que será utilizado pelo depositante para distinguir os seus produtos e serviços.

62.
    Esta interpretação é confortada pelo objectivo que subjaz à condição controvertida. Como expôs o advogado-geral D. Ruiz-Jarabo Colomer nas conclusões que apresentou no processo Sieckmann (C-273/00), pendente no Tribunal de Justiça (52), a condição relativa à aptidão para uma representação gráfica é imposta pelo princípio da segurança jurídica.

63.
    Segundo o advogado-geral, «[u]ma marca registada confere um monopólio ao seu titular, o qual faz um uso exclusivo, com exclusão de qualquer outra pessoa, dos sinais que a constituem. A consulta do registo deve permitir conhecer, em toda a dimensão inerente à publicidade dos registos, a natureza e o âmbito dos sinais, das indicações e dos símbolos registados como marcas, e é com esse objectivo que se exige a sua representação gráfica. Se uma empresa se apropria de certos sinais e indicações determinadas, a fim de distinguir os seus produtos e serviços dos das outras empresas, há que conhecer detalhadamente os símbolos de que se apropriou, para que os outros saibam com o que contam» (53). Assim, o monopólio conferido pelo registo da marca tem como contrapartida uma verdadeira obrigação de informação dos terceiros quanto ao sinal protegido.

64.
    Assim sendo, não basta qualquer representação gráfica. Deve preencher duas condições. A representação deve, em primeiro lugar, ser clara e precisa para que se possa saber, sem qualquer dúvida possível, o que é objecto da exclusividade. Além disso, deve ser inteligível por aqueles que pretendam consultar o registo, isto é, os outros produtores e os consumidores, ou seja, não deve exigir um esforço exagerado para determinar o sinal que será efectivamente utilizado pelo depositante (54).

65.
    Entendemos que uma cor só por si não preenche estas condições. A título liminar, cabe precisar que não fazemos distinção entre uma cor reproduzida no pedido de registo e uma cor simplesmente designada por um código internacional. Neste último caso, não nos parece exagerado o esforço pedido a um consumidor ou a um concorrente para consultar a colecção de amostras correspondente para ver a tonalidade reivindicada pelo depositante. Salvo no caso de essa colecção de amostras ser dificilmente acessível, parece-nos que tal designação permite claramente e sem ambiguidades compreender qual a cor escolhida pelo depositante.

66.
    Entendemos, no entanto, que a reprodução ou a designação de uma cor enquanto tal não permite determinar qual será o sinal utilizado pelo depositante para distinguir os seus produtos e os seus serviços.

67.
    Como indicámos no n.° 45 das presentes conclusões, a cor é sempre atributo de qualquer coisa. Diferentemente dos sinais enumerados no artigo 2.° da directiva, tais como palavras, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respectiva embalagem, uma cor só por si não tem existência autónoma.

68.
    Por outras palavras, não é possível determinar com exactidão de que modo aparecerá a cor reivindicada nos produtos para os quais é pedido o registo. Assim, tanto poderá constituir a coloração da totalidade da superfície externa destes ou da respectiva embalagem, como aparecer unicamente sobre uma parte destes, ou em desenhos bem precisos, rodeada pela cor genérica dos produtos.

69.
    O mesmo sucede no que se refere aos serviços. Por hipótese, os serviços não possuem qualquer forma material em si mesmos, nem, portanto, qualquer cor. A marca apenas poderá pois ser aposta em documentos, veículos ou outros objectos que sirvam para a sua prestação. Ainda aí, a cor reivindicada poderá constituir na íntegra a respectiva tonalidade ou aparecer unicamente sobre uma parte daqueles, no âmbito de desenhos bem precisos.

70.
    Aliás, o facto de o depositante pedir o registo da cor só por si e pretender, assim, que lhe seja atribuído o seu uso exclusivo, permite pensar que se reserva todas estas possibilidades.

71.
    Esta apreciação é ainda mais pertinente quando o depositante, como no processo Heidelberger Bauchemie, já referido, requer o registo de várias cores per se (55). A ausência de qualquer organização destas cores num conjunto ou numa determinada disposição no pedido de registo permite manifestamente, na realidade, uma pluralidade de combinações possíveis.

72.
    A reivindicação de uma cor sem forma nem contornos dificilmente permitirá, pois, à autoridade competente verificar verdadeiramente se estão reunidas as outras condições exigidas para o registo de uma marca. Com efeito, consoante cubra a totalidade do produto ou figure num desenho bem preciso, a cor pode aparecer ao consumidor como meramente ornamental ou como componente de um sinal distintivo. Igualmente, é possível interrogarmo-nos sobre as condições em que a autoridade competente poderá apreciar verdadeiramente o risco de confusão do sinal assim reivindicado com uma marca anterior em cuja composição entra a cor reivindicada ou um cambiante desta.

73.
    Entendemos ainda que o registo como marca de uma cor, só por si, não permite aos outros operadores que consultem o registo determinar quais são os seus direitos.

74.
    Com efeito, nos termos do artigo 5.° da directiva, o titular pode proibir que um terceiro faça uso, na vida comercial, para qualquer produto ou serviço idêntico ou similar àqueles para os quais a marca foi registada, não só de um sinal idêntico a este mas ainda de um sinal relativamente ao qual possa existir, no espírito do público, um risco de confusão com a referida marca.

75.
    Se a marca registada é a própria cor só por si, os outros operadores dificilmente poderão determinar de que modo têm ainda possibilidade de fazer uso dessa cor para produtos e serviços idênticos ou simplesmente similares àqueles para os quais tenha sido autorizado o registo da referida cor.

76.
    Além disso, esta incerteza não diz respeito unicamente à cor tal como é reproduzida no registo ou é designada por um código internacional, mas a um grande número de cambiantes próximos desta. Com efeito, como vimos nos n.os 43 e 44 das presentes conclusões, a possibilidade de o público distinguir sem risco de confusão os cambiantes das cores é limitada pelas propriedades da visão humana e pelo carácter variável da cor dos objectos em função da luz e da distância a que os observamos.

77.
    Consideramos que tal incerteza é contrária ao princípio da segurança jurídica subjacente à exigência de aptidão para uma representação gráfica. Importa lembrar que, no acórdão de 29 de Setembro de 1998, Canon (56), o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente a importância que há que atribuir a este princípio no âmbito das marcas (57).

78.
    Atendendo ao conjunto destes elementos consideramos que uma cor sem forma nem contornos não pode ser considerada um sinal susceptível de representação gráfica na acepção do artigo 2.° da directiva.

79.
    Uma cor, per se, também não preenche a segunda condição prevista no artigo 2.° da directiva, segundo a qual só podem constituir marcas os sinais adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

3.    Capacidade para distinguir os produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas

80.
    Consideramos que o artigo 2.° da directiva exclui as categorias de sinais ou de indicações que sejam intrinsecamente insusceptíveis de ter carácter distintivo.

81.
    Esta análise não está em contradição com a jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (58) e do Tribunal de Justiça (59), segundo a qual o carácter distintivo de uma marca, deve ser analisado relativamente aos produtos ou aos serviços em relação aos quais o registo é pedido (60). Com efeito, esta jurisprudência foi desenvolvida no quadro da apreciação dos motivos absolutos de recusa previstos no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) a e), do regulamento e nas disposições correspondentes da directiva, em processos respeitantes aos sinais abrangidos por uma categoria expressamente citada pelos artigos 4.° do regulamento ou 2.° da directiva, ou no quadro da aplicação do artigo 3.°, n.° 3, da directiva que se refere à aquisição do carácter distintivo pelo uso (61).

82.
    Aliás, recusar esta interpretação significaria privar em grande parte de efeito útil a segunda condição prevista no artigo 2.° da directiva e, em larga medida, o artigo 3.°, n.° 1, alínea a), da mesma, de acordo com o qual será recusado o registo aos sinais que não possam constituir uma marca (62). Com efeito importa recordar que a condição segundo a qual deve ser recusado o registo às marcas desprovidas de carácter distintivo é expressamente retomada no artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da directiva.

83.
    Além disso, embora até hoje ainda não tenha sido chamado a pronunciar-se quanto à questão de saber se o pedido do registo de um sinal ou de uma indicação não previstos nos artigos 2.° da directiva (63) ou 4.° do regulamento pode ser recusado unicamente com base nessas disposições, o Tribunal de Justiça salientou, não obstante, por variadas vezes, o carácter geral das condições previstas nos artigos 2.° e 3.°, n.° 1, alínea a), da directiva (64). Do mesmo modo, no acórdão Philips Electronics, já referido (65), indicou que «resulta claramente da redacção do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e da economia da directiva que esta disposição visa essencialmente excluir do registo os sinais que não possuem aptidão geral para constituir uma marca».

84.
    Trata-se pois, nesta fase da análise, de apreciar se uma cor é só por si susceptível de apresentar carácter distintivo atendendo unicamente às suas qualidades intrínsecas. Entendemos que não, por duas razões.

85.
    Por um lado, como acabámos de ver, o pedido de registo de uma cor só por si não permite determinar qual o sinal que aparecerá efectivamente nos produtos ou em referência aos serviços respectivos. Ora, a apreciação da aptidão para ter carácter distintivo implica, em nosso entender, conhecer precisamente qual é esse sinal.

86.
    Por outro, entendemos que uma cor não pode só por si desempenhar a função de indicar a origem dos produtos ou serviços. Com efeito, importa lembrar que o Tribunal de Justiça definiu essa função como visando «garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto que exibe a marca, permitindo-lhe distinguir, sem confusão possível, aquele produto de outros que tenham proveniência diversa» (66). A marca deve, pois, assegurar a garantia de proveniência do produto portador dessa marca (67). Trata-se, por conseguinte, de um sentido muito preciso.

87.
    Ora, como vimos no n.° 45 das presentes conclusões, embora uma cor só por si, isto é, enquanto entidade abstracta, possa ter um significado ou suscitar sentimentos, estes consistem unicamente nos que lhe atribuem as convenções em vigor numa sociedade numa dada época (68). Além disso, mesmo este significado ou esses sentimentos, que podem basear-se em fenómenos culturais solidamente implantados, dependem das condições em que a cor nos aparece (69). Daí que uma cor só pode ter um sentido preciso se for vista no âmbito de uma forma ou de um desenho determinado (70).

88.
    É portanto errado, em nosso entender, considerar que uma cor sem forma nem contornos possa ter um sentido tão preciso como o de indicar sem confusão possível a origem de um produto ou de um serviço.

89.
    Não é menos verdade que o IHMI procedeu por várias vezes ao registo como marca de uma cor per se. Assim, foram registadas, designadamente, a cor lilás/púrpura para chocolate (71), a cor magenta para equipamentos e serviços de telecomunicações (72) e a cor amarela para produtos anti-corrosão (73). O IHMI considerou que cada uma destas cores tinha adquirido, para a designação dos produtos ou dos serviços em causa, carácter distintivo pelo uso que delas tinha sido feito (74).

90.
    Estes registos parecem-nos discutíveis, atendendo ao sinal realmente apercebido pelos consumidores e que estes se habituaram a reconhecer como indicando a origem dos produtos e dos serviços em questão. Com efeito, como referimos, a cor é sempre um atributo de qualquer coisa. Por conseguinte, o que os consumidores se habituaram a reconhecer não é a cor enquanto tal, mas um objecto dessa cor (75). A cor está, portanto, sempre associada mentalmente a um outro elemento. A maior parte das vezes, trata-se de um logotipo ou de uma palavra (76). No mínimo, este outro elemento será a forma do produto posto à venda.

91.
    Se este outro elemento faltar, os consumidores deixarão de estar em condições de identificar com exactidão a origem do produto ou do serviço em questão. Por outras palavras, se o logotipo ou a palavra que se habituaram a ver no produto ou na sua embalagem já aí não figurar, ou se a forma desse produto se alterar, os consumidores poderão ter dúvidas quanto à origem deste, mesmo que a cor permaneça a mesma.

92.
    Por conseguinte, reduzir os sinais à cor abstracta e registar esta como marca equivale, em nosso entender, a tomar uma parte da marca pelo todo. A marca não é constituída pela cor por si só, mas por esta cor associada a outro elemento ou aplicada a um objecto.

93.
    Esta análise foi adoptada por determinados serviços nacionais. Assim, o serviço competente do Reino Unido não registou a cor verde, por si só, a pedido da sociedade petrolífera BP, para os produtos e serviços oferecidos nas estações de distribuição de combustíveis, mas sim esta cor aplicada às superfícies externas dos locais ou dos edifícios em conformidade com os esboços anexos aos pedidos de registo (77). Igualmente, este serviço não registou a cor rosa, por si só, para materiais de isolamento, mas «the colour pink, as defined by pantone n° 196C, applied to the entire surface of the goods» (78). Em matéria de serviços, a autoridade irlandesa competente registou a favor da United Parcel Service of America a marca correspondente à seguinte definição: «The mark consits of the colour brown as shown on the form of application, being the predominant colour applied to the visible surface of the uniforms worn by staff in the performance of the services» (79).

94.
    Aliás, esta análise, segundo a qual não é a cor por si só que pode adquirir carácter distintivo com o uso, corresponde às disposições em vigor no United States Patent and Trademark Office (Serviço de Patentes e Marcas dos Estados Unidos) (80). A este propósito, importa sublinhar que a marca da sociedade Qualitex, que permitiu ao Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos pronunciar-se pela primeira vez quanto à protecção das cores como marcas e a admitir a sua possibilidade, não é constituída pelo cambiante verde dourado em si mesmo, mas por «a particular shade of green-gold applied to the top and the surfaces of the goods» (81).

95.
    Tendo em conta estes elementos, entendemos que os exemplos acima referidos de registos de uma cor per se como marca não infirmam a nossa interpretação do artigo 2.° da directiva (82).

96.
    Ao invés, os registos citados no n.° 93 das presentes conclusões demonstram, em nosso entender, que os operadores económicos que utilizam uma cor para identificar os seus produtos ou serviços devem poder beneficiar da protecção conferida pelo regime das marcas sem necessidade de registar a cor por si só. Além disso, estes operadores podem igualmente recorrer às disposições do direito dos seus Estados-Membros relativas à concorrência desleal, à responsabilidade civil ou à defesa dos consumidores, como resulta do sexto considerando e do artigo 5.°, n.° 5, da directiva.

97.
    Assim, nenhum elemento permite pensar que a protecção desses operadores contra os concorrentes que, pela utilização da mesma cor ou de um cambiante desta, pretendam retirar proveito da reputação ou do carácter distintivo da marca daqueles é impedida ou diminuída pela exclusão das cores enquanto tais das categorias de sinais previstas no artigo 2.° da directiva.

98.
    Ao invés, existem boas razões para acreditar que o registo como marca de cores enquanto tais pode ter consequências negativas para a livre concorrência que, como vimos no n.° 8 das presentes conclusões, constitui a finalidade da directiva.

99.
    Com efeito, o registo de uma cor apenas enquanto tal conduz, por aplicação do artigo 5.° da directiva e, pelo menos, devido à impossibilidade de os outros operadores económicos poderem determinar precisamente se e de que modo podem ainda utilizar essa cor, a atribuir o seu uso exclusivo ao titular da marca. Além disso, como vimos no n.° 76 das presentes conclusões, este uso exclusivo não incide unicamente sobre a cor tal como figura no pedido de registo ou como é designada por um código internacional, mas pode alargar-se a um grande número de cambiantes desta. Por outras palavras, é bem provável que o registo como marca de um tom particular de azul leve a atribuir ao seu titular o uso exclusivo do azul (83).

100.
    Seguidamente, tendo em conta os sentimentos que podem suscitar no observador e a sua natureza mais ou menos visível, o número de cores realmente utilizáveis para um produto ou um serviço em particular é ainda mais restrito. Para de tal nos convencermos, remeter-se-á para as «cores das sociedades de distribuição de combustíveis», citadas como exemplo pelos partidários do registo de cores per se como marca (84). O número de cores utilizadas por estas sociedades nas superfícies externas dos seus edifícios e nos logotipos é inferior ao das cores que têm um nome específico e a maioria delas são utilizadas simultaneamente por várias sociedades (85).

101.
    Bastaria, portanto, que várias cores enquanto tais fossem registadas como marca para conferir um verdadeiro monopólio de utilização da cor a alguns operadores económicos. Ora, tal monopólio pode ser susceptível de falsear as condições de concorrência.

102.
    Com efeito, como a Comissão muito correctamente sublinhou nas suas observações escritas (86), as cores revestem hoje grande importância para as empresas. Cada vez mais estas utilizam uma cor para os seus produtos e objectos relacionados com a prestação dos seus serviços (87). Estas cores servem para captar a atenção dos consumidores (88). Além disso, graças aos sentimentos que suscitam, permitem às empresas situar os seus produtos e serviços no nosso imaginário (89). As cores tornaram-se, pois, um verdadeiro instrumento de comunicação entre as empresas e os consumidores. É provável que a sua utilização tenda a crescer, considerando que a imagem ocupa actualmente um lugar preponderante na comunicação.

103.
    Por conseguinte, é legítimo pensar que um operador económico que fosse privado da possibilidade de utilizar as cores ou mesmo um determinado número delas seria desfavorecido relativamente aos seus concorrentes, e que um monopólio de utilização das cores pode mesmo criar dificuldades ao acesso de novos operadores a um mercado determinado.

104.
    Tendo presentes estas considerações, a finalidade do direito de marca pode igualmente justificar que o uso exclusivo das cores enquanto tais não possa ser atribuído a determinados operadores económicos e que as mesmas continuem à disposição de todos.

105.
    Atentos os fundamentos expostos, propomos que o Tribunal de Justiça responda que o artigo 2.° da directiva deve ser interpretado no sentido de que uma cor por si só, sem forma nem contornos, não constitui um sinal susceptível de representação gráfica adequado a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

106.
    Tendo em conta esta resposta, ficam sem objecto as outras questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio no que se refere ao litígio no processo principal. Entendemos que não há que dar-lhes resposta.

V - Conclusão

107.
    Em face das considerações que precedem, propomos que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo às questões colocadas pelo Hoge Raad der Nederlanden:

«O artigo 2.° da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, deve ser interpretado no sentido de que uma cor por si só, sem forma nem contornos, não constitui um sinal susceptível de representação gráfica adequado a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.»


1: -     Língua original: francês.


2: -     Directiva de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1, a seguir «directiva»).


3: -     Convenção de 20 de Março de 1883 (a seguir «Convenção de Paris»).


4: -     Regulamento de 29 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), alterado (a seguir «regulamento»).


5: -     Primeiro e terceiro considerandos.


6: -     Quarto considerando.


7: -     Sétimo considerando.


8: -     Nono e décimo considerandos.


9: -     Sexto considerando.


10: -     Oitavo considerando.


11: -     Primeiro considerando.


12: -     Lei assinada em Bruxelas, em 19 de Março de 1962, Moniteur belge de 14 de Outubro de 1969 (a seguir «LBM»).


13: -     Moniteur belge de 12 de Março de 1996.


14: -     A seguir «Libertel».


15: -     A seguir «IBM».


16: -     Despacho de reenvio, n.° 3.6.


17: -     Conclusões do procurador-geral junto do Hoge Raad der Nederlanden, nota 1 (anexo 1 ao despacho de reenvio).


18: -     Despacho de reenvio, n.° 3.1.


19: -     V., por exemplo, acórdão de 15 de Dezembro de 1995, Bosman (C-415/93, Colect., p. I-4921, n.° 59).


20: -     Acórdão de 18 de Março de 1993, Viessmann (C-280/91, Colect., p. I-971, n.° 17). V., igualmente, acórdão de 8 de Fevereiro de 2001, Lange (C-350/99, Colect., p. I-1061, n.os 20 a 25).


21: -     C-90/97, Colect., p. I-1075, n.° 21.


22: -     N.° 69 das respectivas observações escritas.


23: -     N.° 7.2 das suas observações escritas.


24: -     N.° 4.1 das suas observações escritas.


25: -     N.° 23 das suas observações escritas.


26: -     N.° 13 das suas observações escritas.


27: -     N.° 74 das suas observações escritas.


28: -     N.° 71 das suas observações escritas.


29: -     N.° 73 das suas observações escritas.


30: -     JO IHMI n.° 5/96, p. 607.


31: -     Decisão da Terceira Câmara de Recurso de 18 de Dezembro de 1998, processo R 122/1998-3, n.os 17 e 18. Neste processo, o requerente pedia o registo da cor «light green» para pastilha elástica destinada a utilizações cosmética, médica e não medicinal.


32: -     «La couleur», dossier pour la science n.° 27 (disponível em http://www.pourlascience.com).


33: -     Idem. V., igualmente, Manuel de la couleur, Solar, 2001, pp. 6 e 138.


34: -     Vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, indigo, violeta (por referência às sete notas da gama).


35: -     V. os dicionários cromáticos, os sistemas Pantone, RAL, ACC, etc. (por exemplo, o sistema ACC, Acoat Color Codification, pode definir até 2,4 milhões de cores).


36: -     Segundo Pastoureau, M., Dictionnaire des couleurs de notre temps, Bonneton, Paris, 1999, uma pequena centena de matizes, talvez duas centenas as pessoas mais treinadas.


37: -     Em geral, menos de uma dúzia na nossa sociedade ocidental: branco, vermelho, preto, verde, amarelo, azul, cinzento, castanho, rosa, violeta e alaranjado. Utilizamos também, para designar as cores, palavras relacionadas com plantas (por exemplo, limão, lilás), animais (por exemplo, camurça, corvo), substâncias minerais (por exemplo, rubi, turquesa), fenómenos naturais (por exemplo, aurora, horizonte) ou substâncias diversas (por exemplo, palha, ferrugem). Contudo, a identificação precisa dos matizes de cores assim designadas caracteriza-se por uma grande subjectividade.


38: -     Por exemplo, o azul, que, na Europa, constitui actualmente uma cor «fria», era considerado, na Idade Média e no Renascimento, uma cor «quente». Também actualmente, no Japão, interessa menos saber se a cor é vermelho, azul ou amarelo do que saber se se trata de uma cor baça ou brilhante (Pastoureau, M., já referido).


39: -     De acordo com a Encyclopédie Hachette Multimédia, em 2500 diapositivos apresentados em vários dias, reconhecem-se 90%. Inversamente, a memória específica das cores é bastante efémera. Para de tal nos convencermos, esta enciclopédia propõe uma experiência divertida: trata-se de ler uma frase de cinco ou seis palavras cujas letras aparecem escritas em quatro cores diferentes (por exemplo, azul, vermelho, amarelo e verde) e tentar reproduzi-la com canetas de feltro dessas cores utilizando a cor correcta para cada letra. É muito difícil recordarmo-nos, ainda que só de algumas letras da cor correcta, ao passo que é fácil lembrarmo-nos da frase (http://www.ani.ehmel.hachette-multimedia.fr).


40: -     V., por exemplo, acórdão de 14 de Junho de 2001, Kvaerner (C-191/99, Colect., p. I-4447, n.° 30).


41: -     Nos termos do artigo 166.°, n.° 1, alínea d), do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 26/95, de 24 de Janeiro de 1995, não podem ser registadas como marcas, designadamente «As cores, salvo se forem combinadas entre si ou com gráficos, dizeres ou outros elementos por forma peculiar e distintiva.»


42: -     O artigo L 711-1 do code de la proprieté intellectuelle francês, com as alterações da Lei de 4 de Janeiro de 1991, prevê que podem constituir uma marca os sinais figurativos tais como «les dispositions, combinaisons ou nuances de couleurs» (disposições, cores combinadas entre si ou matizes de cores).


43: -     O artigo 16.° da lei de marcas italiana, alterada pelo Decreto Legislativo de 4 de Dezembro de 1992, prevê: «[p]odem ser objecto de registo enquanto marca de empresa todos os novos sinais susceptíveis de serem representados graficamente, designadamente [...] as combinações de cores ou as tonalidades cromáticas, desde que sejam aptas para distinguir os produtos ou os serviços de uma empresa dos de outras empresas».


44: -     O § 3 da Gesetz über den Schutz von Marken und sonstigen Kennzeichen (lei alemã sobre a protecção de marcas e outros sinais), de 25 de Outubro de 1994, enuncia: «[s]ão susceptíveis de serem protegidos como marcas todos os sinais [...] incluindo as cores e as combinações de cores, adequadas a distinguir os produtos ou os serviços de uma empresa dos de outras empresas». Contudo, o Bundespatentgericht (Tribunal Federal de Patentes) (Alemanha) continua a interrogar-se quanto à aptidão de uma cor considerada abstractamente para constituir uma marca e submete ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial no processo Heidelberger Bauchemie (C-49/02), pendente no Tribunal de Justiça, que iremos referir mais adiante em detalhe.


45: -     A evolução da legislação espanhola é elucidativa no que concerne à ambiguidade do texto da directiva sobre a questão em causa no sentido de que o artigo 11.° da Lei n.° 32/88 sobre as marcas prevê expressamente que uma cor por si só não pode ser registada e que apenas o pode ser se delimitada por uma forma. A lei nova retomou os termos da directiva e deixou por resolver a questão da aptidão de uma cor para por si só constituir uma marca.


46: -     C-292/89, Colect., p. I-745, n.° 18.


47: -     C-329/95, Colect., p. I-2675, n.° 23.


48: -     Este preâmbulo está assim redigido: «As declarações do Conselho e da Comissão a seguir reproduzidas, não são parte integrante do acto jurídico e não prejudicam, por esse motivo, a sua interpretação através do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.»


49: -     Que constitui o anexo 1 C do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (OMC), aprovado em nome da Comunidade, em relação às matérias da sua competência, pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994 (JO L 336, p. 1).


50: -    O artigo 15.°, n.° 1, deste acordo está assim redigido: «Qualquer sinal, ou qualquer combinação de sinais, susceptível de distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas poderá constituir uma marca. Esses sinais, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, letras, numerais, elementos figurativos e combinações de cores, bem como qualquer combinação desses sinais, serão elegíveis para registo enquanto marcas. No caso de os sinais não serem intrinsecamente susceptíveis de distinguir os produtos ou serviços em questão, os membros podem subordinar a elegibilidade para efeitos de registo à presença de um carácter distintivo adquirido através da utilização. Os membros podem exigir como condição do registo que os sinais sejam perceptíveis visualmente.»


51: -     Gervais, D., The TRIPS Agreement: drafting history and analysis, Sweet & Maxwell, 1998, p. 105.


52: -     Neste processo, é perguntado ao Tribunal de Justiça se um odor pode constituir uma marca.


53: -     N.° 36 das suas conclusões.


54: -     Ibidem, n.° 38.


55: -     Neste processo, foi submetido ao Serviço de Marcas e de Patentes alemão um pedido de registo das cores azul/amarela. A marca pedida é objecto da seguinte descrição: «A marca apresentada é constituída pelas cores da firma da requerente, que são utilizadas sob todas as formas imagináveis, em especial em embalagens e etiquetas. A descrição precisa das cores é a seguinte: RAL 5015/HKS 47 - azul e RAL 1016/HKS 3 - amarelo.»


56: -     C-39/97, Colect., p. I-5507, n.° 27.


57: -     No n.° 21, o Tribunal de Justiça declarou que, de qualquer forma, por razões de segurança jurídica e de boa administração, há que garantir que as marcas cuja utilização poderia ser contestada com êxito nos órgãos jurisdicionais não sejam registadas.


58: -     O Tribunal de Primeira Instância enunciou esta regra desde o primeiro acórdão proferido em matéria de marca comunitária (acórdão de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI «BABY-DRY», T-163/98, Colect., p. II-2383, n.° 21), tendo-a regularmente reafirmado nos acórdãos posteriores (v., designadamente, acórdão de 5 de Abril de 2001, Bank für Arbeit und Wirtschaft/IHMI «Easybank», T-87/00, Colect., p. II-1259, n.° 21).


59: -     Acórdão de 18 de Junho de 2002, Philips Electronics (C-299/99, Colect., p. I-5475, n.° 59).


60: -     Consideramos que as disposições do regulamento e da directiva redigidas em termos idênticos devem ter a mesma interpretação.


61: -     Acórdão de 4 de Outubro de 2001, Merz & Krell (C-517/99, Colect., p. I-6959, n.° 30).


62: -     O artigo 7.°, n.° 1, alínea a), do regulamento é ainda mais explícito, uma vez que refere que será recusado o registo dos sinais que não estejam em conformidade com o artigo 4.° desse regulamento.


63: -     Estão actualmente pendentes no Tribunal de Justiça vários processos nesse sentido. Além dos processos Sieckmann e Heidelberger Bauchemie, já referidos, foi igualmente submetida a questão de saber se uma marca pode ser constituída por ruídos ou sons (processo Shield Mark, C-283/01, pendente no Tribunal de Justiça).


64: -     Acórdãos já referidos, Canon, n.° 27 e Merz & Krell, n.os 23 e 24.


65: -     N.° 37, sublinhado nosso.


66: -     V., designadamente, acórdãos de 17 de Outubro de 1990, HAG GF (C-10/89, Colect., p. I-3711, n.° 14); Canon, já referido, n.° 28, e Merz & Krell, já referido, n.° 22.


67: -     Acórdão de 23 de Abril de 2002, Boehringer Ingelheim e o. (C-143/00, Colect., p. I-3759, n.° 29).


68: -     Assim, o negro representa o luto, o branco a pureza (Pastoureau, M., já referido, pp. 31 e 157).


69: -     O uso de um véu negro evoca o luto; contudo, um vestido preto numa soirée não tem necessariamente esse significado.


70: -     Klinkenberg, J.-M., «Qu'est-ce que le signe?», em Le langage, éditions sciences humaines, p. 105. O autor cita o seguinte exemplo, que foi buscar ao Código da Estrada: associado a uma forma circular, o vermelho significa proibição; associado a uma forma triangular, adverte de um perigo.


71: -     Registo n.° 31336, de 27 de Outubro de 1999.


72: -     Registo n.° 212787, de 3 de Agosto de 2000.


73: -     Registo n.° 396176, de 9 de Janeiro de 2001.


74: -     Como não existe, nas estatísticas do IHMI, uma rubrica que incida especificamente sobre as cores per se, é difícil afirmar que nenhuma marca deste tipo tenha sido registada a priori. Contudo, a jurisprudência do IHMI permite deduzir que, se tais registos foram admitidos, foram-no apenas a título muito excepcional (v., por exemplo, processo R 122/1998-3, já referido, n.os 17, 18 e 21).


75: -     V., neste sentido, n.° 70 das conclusões que apresentámos no processo Toshiba Europe (acórdão de 25 de Outubro de 2001, C-112/99, Colect., p. I-7945).


76: -     Se o automobilista pode associar o verde às estações BP é porque no logotipo desta companhia as letras «BP» surgem sobre um fundo verde e determinadas partes da superfície exterior dos edifícios das estações de serviços da referida companhia são da mesma cor. Igualmente, a palavra «Milka» figura nas tabletes de chocolate para as quais a cor lilás/púrpura foi registada como marca pelo IHMI.


77: -     High Court of Justice in Northern Ireland, Chancery Division, 16 de Junho de 2000, BP Amoco PLC v. John Kelly Ltd and Glenshane Tourist Services Ltd.


78: -     Registo n.° 2004215, de 25 de Outubro de 1996. A representação da marca no registo mostra o desenho de um material isolante.


79: -     Registo n.° 221818, de 27 de Outubro de 1998. A representação da marca no registo mostra um uniforme da cor reivindicada.


80: -     Segundo o Trademark Manual of Examining Procedures, revisto em Junho de 2002, o registo de uma marca está subordinado ao seu uso prévio. A section 1202.05, que tem por título «Color as a mark», prevê: «Color marks are marks that consists solely of one or more colors used on particular objects. For marks used in connection with goods, the color may be used on the entire surface of the goods, on a portion of the goods, or on all part of the packaging for the goods [...] Similarly, service marks may consist of color used on all or part of materials used in the advertising and rendering of the services [...] Color marks are never inherently distinctive, and cannot be registered on the Principal Register without a showing of acquired distinctiveness [...]» (http://www.uspto.gov.).


81: -     Registo n.° 1633711. A representação da marca no registo mostra o desenho do produto. No acórdão Qualitex Co. v. Jacobson Products Co. 514 U.S. 159(1995), o Supremo Tribunal de Justiça declarou que uma cor só pode ser registada como marca se se demonstrar que adquiriu com o tempo «a secondary meaning», isto é, que os consumidores lhe reconhecem uma função de origem. O Supremo Tribunal de Justiça confirmou a sua posição no acórdão Wal-Mart Stores Inc. v. Samara Brothers, Inc., 165 F.3d 120(2000).


82: -     Na mesma linha vão os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, de 25 de Setembro de 2002, Viking-Umwelttechnik/IHMI «justaposição das cores verde e cinzenta» (T-316/00, ainda não publicado na Colectânea) e de 29 de Outubro de 2002, KWS Saat/IHMI «tom de laranja» (T-173/00, ainda não publicado na Colectânea) proferidos depois da audiência no presente processo. Nesses acórdãos o Tribunal considera, desde logo, que as cores ou combinações de cores, enquanto tais, são susceptíveis de constituir uma marca comunitária na medida em que sejam adequadas para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outra empresa (acórdãos já referidos, Viking-Umwelttechnik/IHMI «justaposição das cores verde e cinzenta», n.° 23, e KWS Saat/IHMI «tom de laranja», n.° 25). Além disso, neste último acórdão, o Tribunal de Primeira Instância considera que um tom laranja, enquanto tal, é susceptível de apresentar carácter distintivo para determinados serviços. Realce-se, desde já, que a questão de saber se uma cor enquanto tal, sem forma nem contornos, é susceptível de constituir uma marca comunitária na acepção do artigo 4.° do regulamento não foi discutida no Tribunal de Primeira Instância. No que se refere, em seguida, aos fundamentos em que o Tribunal de Primeira Instância se baseou para admitir que um tom de cor laranja, enquanto tal, pode ter carácter distintivo para determinados serviços, os mesmos não nos levam a pôr em causa a nossa análise.


83: -     Esta apreciação é idêntica à do IHMI. V., no que se refere à cor azul, a decisão da Segunda Câmara de Recurso, de 29 de Fevereiro de 2000, processo R 342/1999-2, que recusou o pedido de registo apresentado pela sociedade ARAL. V. igualmente a decisão R 122/1998-3, já referida, n.° 29.


84: -     V. observações escritas da Libertel, n.° 7.1.


85: -     Por exemplo, o amarelo pelas Shell, Agip e BP, o azul pelas ARAL, Total e ELF, o vermelho pela Total e pela ELF, o alaranjado pela Total e pela Esso, etc.


86: -     N.° 73.


87: -     Segundo o Géodys 2000/2001, La marque dans tous ses états, «numerosos industriais criam, na sua estrutura de design, uma equipa especializada em cores e materiais. Foi a Moulinex que começou, em 1997, a colorir de amarelo ou verde os seus pequenos electrodomésticos [...] Actualmente, a Apple produz em cores os seus IMac, a Nurofen as suas caixas de medicamentos e a Philips os seus televisores», p. 218.


88: -     Segundo Kapferer, J.-N., «a cor é a primeira referência de uma marca para o consumidor em ‘self-service’», em Les marques, Capital de l'entreprise, Les chemins de la reconquête, Les éditions d'organisation 1995, Paris, p. 355.


89: -     As cores aciduladas encarnam como valor a regressão e lembram ao consumidor as cores da infância, as cores gritantes a transgressão, dando-lhe a impressão de se libertar das convenções, os tons naturais a autenticidade, conferindo aos produtos um aspecto rústico de quietude, as cores high tec (verde metalizado) a segurança, induzindo confiança, pelo facto de serem sinónimo de perfeição (Géodys 2000/2001, já referido, p. 218).