Language of document : ECLI:EU:C:2018:982

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GERARD HOGAN

apresentadas em 5 de dezembro de 2018 (1)

Processo C450/17 P

Landeskreditbank BadenWürttemberg — Förderbank

contra

Banco Central Europeu (BCE)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito —Regulamento (UE) n.o 1024/2013 — Artigo 6.o, n.o 4 — Regulamento (UE) n.o 468/2014 — Artigo 70.o, n.o 1 — Mecanismo Único de Supervisão (MUS) — Competências do Banco Central Europeu (BCE) — Exercício descentralizado pelas autoridades nacionais — Classificação de uma instituição como entidade significativa — Supervisão direta pelo BCE — Exceção — Existência de circunstâncias específicas — Classificação desadequada de uma entidade supervisionada como significativa»






1.        Considera‑se geralmente que o colapso do principal banco de investimento dos EUA, Lehman Brothers, em setembro de 2008, marca o início de uma profunda crise fiscal e bancária que se alastrou a quase todas as economias avançadas. Esta crise foi de tal forma grave e prolongada — exigindo recapitalizações bancárias e nacionalizações em vários Estados‑Membros — que representou uma ameaça existencial à estabilidade fiscal de vários países da zona euro e até, em alguns momentos, à própria sobrevivência do Euro.

2.        Por conseguinte, esta crise deixou um longo rastro. Desde então, legisladores e reguladores têm tido dificuldade em reconciliar‑se com a enormidade desta crise bancária e compreender como é que um sistema de regulação que aparentava ser perfeitamente adequado acabou por falhar quando foi colocado à prova naqueles dias sombrios de 2008 em diante. Um dos ensinamentos retirados pelo legislador da União foi que práticas bancárias obscuras e a não compreensão da natureza do risco sistémico que as maiores instituições bancárias potencialmente representam estão no cerne das falhas regulatórias expostas pela crise de 2008.

3.        Em muitos aspetos, tudo isto constitui o contexto do presente recurso interposto pelo Landeskreditbank Baden‑Württemberg — Förderbank (a seguir «recorrente»), no qual este pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE (T‑122/15, EU:T:2017:337) (a seguir «acórdão recorrido»). Neste acórdão, o Tribunal Geral negou provimento ao seu recurso de anulação da Decisão BCE/MUS/15/1 do Banco Central Europeu (a seguir «BCE»), de 5 de janeiro de 2015. Por sua vez, esta decisão do BCE fora adotada ao abrigo do artigo 6.o, n.o 4, e do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63) (a seguir «Regulamento de base»). O efeito prático desta decisão foi o BCE ter recusado reconhecer o recorrente como entidade menos significativa na aceção do artigo 6.o, n.o 4, deste regulamento (a seguir «decisão impugnada»).

4.        A classificação do recorrente como entidade significativa implicou a supervisão prudencial direta desta entidade pelo BCE em vez de pelas autoridades alemãs competentes. O recorrente alega que deveria ser classificado como entidade menos significativa devido à existência de «circunstâncias específicas», nos termos do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do BCE, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (JO 2014, L 141, p. 1) (a seguir «Regulamento‑Quadro do MUS»). No entanto, antes de considerar este argumento é necessário, em primeiro lugar, expor as disposições legislativas relevantes.

I.      Quadro jurídico

A.      Regulamento de base

5.        O artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento de base dispõe que «[o] presente regulamento confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, com vista a contribuir para a segurança e a solidez das instituições de crédito e para a estabilidade do sistema financeiro na União e em cada Estado‑Membro, tendo plena e diligentemente em conta a unidade e a integridade do mercado interno, e por base a igualdade de tratamento das instituições de crédito com vista a evitar a arbitragem regulamentar».

6.        O artigo 2.o do Regulamento de base, com a epígrafe «Definições», estabelece:

«Para efeitos do presente regulamento, aplicam‑se as seguintes definições:

[…]

(9) “Mecanismo Único de Supervisão” (MUS): o sistema de supervisão financeira composto pelo BCE e pelas autoridades nacionais competentes de Estados‑Membros participantes, tal como descrito no artigo 6.o do presente regulamento.»

7.        O artigo 4.o do Regulamento de base, com a epígrafe «Atribuições conferidas ao BCE», estabelece, no n.o 1, que «[n]os termos do artigo 6.o, cabe ao BCE, de acordo com o n.o 3 do presente artigo, exercer em exclusivo, para fins de supervisão prudencial, [nove atribuições elencadas] relativamente à totalidade das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes».

8.        O artigo 6.o do Regulamento de base, com a epígrafe «Cooperação no âmbito do MUS», estabelece:

«1. O BCE exerce as suas atribuições no âmbito de um mecanismo único de supervisão composto pelo BCE e pelas autoridades nacionais competentes. O BCE é responsável pelo funcionamento eficaz e coerente do MUS.

[…]

4. No [que] se refere às atribuições previstas no artigo 4.o, com exceção do n.o 1, alíneas a) e c), o BCE dispõe dos poderes previstos no n.o 5 do presente artigo, e as autoridades nacionais competentes dispõem dos poderes previstos no n.o 6 do presente artigo, no âmbito e sob reserva dos procedimentos a que se refere o n.o 7 do presente artigo, em matéria de supervisão das seguintes instituições de crédito, companhias financeiras ou companhias financeiras mistas, ou sucursais — que estejam estabelecidas nos Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes:

–        Aquelas que sejam menos significativas em base consolidada, ao nível mais elevado de consolidação nos Estados‑Membros participantes, ou individualmente no caso específico das sucursais — que estejam estabelecidas em Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes. O caráter significativo é avaliado com base nos seguintes critérios:

i)      dimensão;

ii)      importância para a economia da União ou de um Estado‑Membro participante;

iii)      importância das atividades transfronteiriç[a]s.

No que respeita ao primeiro parágrafo acima, uma instituição de crédito, uma companhia financeira ou uma companhia financeira mista não é considerada menos significativa, a não ser que tal se justifique por circunstâncias específicas a mencionar na metodologia, se se verificar uma das seguintes condições:

i)      o valor total dos seus ativos exceder 30 mil milhões de euros; ou

ii)      o rácio entre a totalidade dos seus ativos e o PIB do Estado‑Membro participante de estabelecimento exceder 20%, salvo se o valor total dos seus ativos [for] inferior a 5 mil milhões de euros;

iii)      após notificação, pela autoridade nacional competente, de que esta considera que a instituição em causa assume caráter significativo para a economia nacional, o BCE tomar uma decisão que confirma esse caráter significativo, após ter realizado uma avaliação completa da instituição de crédito, incluindo uma avaliação do seu balanço.

O BCE pode também, por iniciativa própria, considerar que uma instituição tem caráter significativo se tiver filiais bancárias estabelecidas em mais de um Estado‑Membro participante e os seus ativos ou passivos transfronteiriços representarem uma parte considerável da totalidade dos seus ativos ou passivos, sob reserva das condições estabelecidas na metodologia.

Aquelas instituições para as quais foi solicitada ou recebida diretamente assistência financeira pública do [Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF)] ou do [Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE)] não podem ser consideradas menos significativas.

Não obstante os parágrafos anteriores e a menos que circunstâncias específicas justifiquem outra solução, o BCE exerce as atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento no que respeita às três instituições de crédito mais significativas em cada Estado‑Membro participante.

[…]

5. No que respeita às instituições de crédito a que se refere o n.o 4, e no âmbito do n.o 7:

a)      O BCE emite regulamentos, orientações ou instruções gerais, dirigidos às autoridades nacionais competentes, de acordo com os quais as autoridades nacionais competentes exercem as suas atribuições previstas no artigo 4.o, à exceção do n.o 1, alíneas a) e c), e adotam as decisões de supervisão.

Essas instruções podem ter como objeto os poderes específicos previstos no artigo 16.o, n.o 2, em relação a grupos ou categorias de instituições de crédito para efeitos de assegurar a coerência dos resultados da supervisão no âmbito do MUS;

b)      Quando necessário para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, o BCE pode, a qualquer momento, por iniciativa própria e após consulta às autoridades nacionais competentes ou a pedido de uma autoridade nacional competente, decidir exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito a que se refere o n.o 4, incluindo no caso em que tenha sido solicitada ou recebida indiretamente assistência financeira do FEEF ou do MEE;

c)      O BCE supervisiona o funcionamento do sistema, com base nos poderes e nos procedimentos previstos no presente artigo, nomeadamente no n.o 7, alínea c);

d)      O BCE pode, a qualquer momento, exercer os poderes previstos nos artigos 10.o a 13.o;

e)      O BCE também pode, numa base ad hoc ou de forma contínua, solicitar informações às autoridades nacionais competentes sobre o exercício das atribuições por elas exercidas no âmbito do presente artigo.

6. Sem prejuízo do n.o 5 do presente artigo, as autoridades nacionais competentes exercem e são responsáveis pelas atribuições de supervisão a que se refere o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), d) a g), e i), adotando todas as decisões de supervisão relevantes dirigidas às instituições de crédito a que se refere o n.o 4, primeiro parágrafo, do presente artigo, no âmbito e sob reserva dos procedimentos a que se refere o n.o 7 do presente artigo.

[…]

7. O BCE, em consulta com as autoridades nacionais competentes, e com base numa proposta do Conselho de Supervisão, adota e publica o enquadramento legal sobre as modalidades práticas de aplicação do presente artigo. […]

[…]»

B.      RegulamentoQuadro do MUS

9.        O artigo 1.o do Regulamento‑Quadro do MUS, com a epígrafe «Objeto e finalidade», dispõe:

«1.      O presente regulamento estabelece regras em relação a todos os seguintes aspetos:

a)      o enquadramento legal referido no artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento [de base], nomeadamente para organizar as modalidades práticas de aplicação do artigo 6.o do Regulamento [de base] relativas à cooperação no âmbito do MUS, de modo a incluir:

i)      a metodologia específica para a apreciação e controlo da classificação de uma entidade supervisionada como significativa ou menos significativa, de acordo com os critérios definidos no artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento [de base], e as disposições resultantes dessa avaliação;

[…]»

10.      O artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS, com a epígrafe «Circunstâncias específicas conducentes à classificação de uma entidade supervisionada significativa como menos significativa», estabelece:

«1. A expressão “circunstâncias específicas”, referida no artigo 6.o, n.o 4, segundo e quinto parágrafos do Regulamento [de base] (a seguir “circunstâncias específicas”) significa que se verificam circunstâncias específicas e factuais que, na opinião do BCE, tornam desadequada a classificação de uma entidade supervisionada como significativa, tendo em conta os objetivos e princípios do Regulamento [de base] e, em particular, a necessidade de garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão.

2. A expressão “circunstâncias específicas” será interpretada em sentido estrito.»

11.      O artigo 71.o do Regulamento‑Quadro do MUS, com a epígrafe «Avaliação da existência de circunstâncias específicas», prevê, no seu n.o 1:

«1.      A existência de circunstâncias específicas que justifiquem a classificação como menos significativa de uma entidade que, se assim não fosse, seria uma entidade supervisionada significativa será determinada numa base individual e especificamente para a entidade supervisionada ou grupo supervisionado em causa, mas não para categorias de entidades supervisionadas.»

II.    Antecedentes do litígio e decisão impugnada

12.      O recorrente é o banco de investimento e desenvolvimento (Förderbank) de Bade‑Vurtemberga (Alemanha). Criado pelo artigo 1.o, n.o 1, da Lei relativa à banca regional de crédito de Bade‑Vurtemberga, é uma pessoa coletiva de direito público totalmente detida pelo Land de Bade‑Vurtemberga.

13.      Em 25 de junho de 2014, o BCE informou o recorrente, em substância, de que, atenta a sua dimensão, estava sob a supervisão exclusiva do BCE e não sob a supervisão partilhada ao abrigo do MUS, nos termos do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base, e convidou‑o a apresentar as suas observações.

14.      Em 10 de julho de 2014, o recorrente contestou esta análise, alegando, designadamente, a existência de circunstâncias específicas na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e dos artigos 70.o e 71.o do Regulamento‑Quadro do MUS.

15.      Em 1 de setembro de 2014, o BCE adotou uma decisão que classificou o recorrente como entidade significativa na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base.

16.      Em 6 de outubro de 2014, o recorrente pediu a revisão dessa decisão ao abrigo do artigo 24.o, n.os 1, 5 e 6, do Regulamento de base, em conjugação com o artigo 7.o da Decisão [2014/360/UE do Banco Central Europeu], de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (JO 2014, L 175, p. 47). Em 23 de outubro de 2014, teve lugar uma audiência na Comissão de Reexame.

17.      Em 20 de novembro de 2014, a Comissão de Reexame emitiu um parecer no qual concluiu pela legalidade da decisão do BCE.

18.      Em 5 de janeiro de 2015, o BCE adotou a decisão impugnada, que revogou e substituiu a decisão de 1 de setembro de 2014, mantendo simultaneamente a classificação do recorrente como entidade significativa.

19.      Na decisão impugnada, o BCE observou que o valor dos ativos do recorrente era superior a 30 mil milhões de euros e recusou acolher os argumentos deste último no sentido de que, no seu caso, havia «circunstâncias específicas» na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base que justificavam que este continuasse a estar sujeito à supervisão prudencial direta das autoridades alemãs.

20.      O BCE salientou, em substância, o seguinte:

–        a classificação do recorrente como entidade significativa não era contrária aos objetivos do Regulamento de base;

–        o perfil de risco de uma entidade não era uma questão relevante na fase da sua classificação;

–        ainda que considerasse que havia circunstâncias específicas no caso do recorrente, teria também de verificar se essas circunstâncias justificavam a reclassificação do recorrente como entidade menos significativa;

–        nos termos do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, o conceito de «circunstâncias específicas» tinha de ser objeto de uma interpretação estrita e, portanto, só quando a supervisão direta do BCE fosse desadequada é que uma entidade «significativa» podia ser reclassificada como «menos significativa»;

–        a tomada em consideração do princípio da proporcionalidade para efeitos de interpretação não exige que o BCE verifique se a aplicação dos critérios previstos no artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base a uma entidade foi proporcional e a análise do caráter «desadequado» da classificação de uma entidade significativa não equivalia a realizar um exame de proporcionalidade desse tipo;

–        a adequação dos quadros de supervisão nacionais e a sua capacidade para aplicar um padrão de supervisão elevado não levavam a concluir que o exercício de supervisão prudencial direta pelo BCE era desadequado, uma vez que o Regulamento de base não a fazia depender da demonstração do caráter desadequado dos quadros ou dos padrões de supervisão nacionais.

III. Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

21.      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de março de 2015, o recorrente requereu a anulação da decisão impugnada. O recorrente invocou cinco fundamentos de recurso, relativos (i) à violação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS na escolha dos critérios aplicados pelo BCE; (ii) a erros manifestos de apreciação dos factos; (iii) à violação do dever de fundamentação; (iv) a um desvio de poder, por o BCE não ter exercido o seu poder de apreciação, e (v) à violação, por parte do BCE, do seu dever de tomar em consideração todas as circunstâncias relevantes do caso.

22.      No acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso de anulação interposto pelo recorrente.

IV.    Pedidos das partes ao Tribunal de Justiça

23.      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        anular a decisão impugnada, ordenando a manutenção dos efeitos da decisão substituída do BCE, de 1 de setembro de 2014;

–        a título subsidiário, anular o acórdão recorrido e remeter o processo ao Tribunal Geral;

–        condenar o BCE nas despesas do processo.

24.      Por sua vez, o BCE e a Comissão concluem pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        negar provimento ao recurso, e

–        condenar o recorrente nas despesas.

V.      Recurso da decisão do Tribunal Geral

25.      O recorrente invoca três fundamentos de recurso, relativos (i) à violação do direito da União na interpretação e aplicação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS; (ii) à desvirtuação da decisão impugnada e a uma apreciação incorreta dos requisitos aplicáveis à fundamentação; (iii) a erros processuais cometidos pelo Tribunal Geral, através da introdução de elementos que não fazem parte do objeto do presente processo.

A.      Primeiro fundamento de recurso, relativo à violação do direito da União na interpretação e aplicação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o do RegulamentoQuadro do MUS

26.      O primeiro fundamento está dividido em três partes.

1.      Interpretação incorreta do segundo parágrafo do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o, n.o 1, do RegulamentoQuadro do MUS

27.      Na primeira parte, o recorrente alega que o Tribunal Geral interpretou incorretamente o segundo parágrafo do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

28.      O recorrente invoca três argumentos.

a)      Interpretação literal incorreta

29.      Em primeiro lugar, o recorrente considera que o Tribunal Geral concluiu incorretamente que só existem «circunstâncias específicas» (2) que conduzem à classificação de uma entidade como entidade menos significativa se a supervisão direta pelas autoridades nacionais for mais adequada para alcançar os objetivos do Regulamento de base do que a supervisão direta pelo BCE. Segundo o recorrente, a interpretação literal do Tribunal Geral do termo «desadequada» (3) baseou‑se exclusivamente na jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o princípio da proporcionalidade segundo a qual a questão de saber se um ato da União é adequado se centra em determinar se este é apto a realizar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa (4). Afirmou que o Tribunal Geral se baseou, assim, em terminologia surgida num contexto completamente diferente e não no significado normal do termo.

30.      Além disso, alegou que o Tribunal Geral assumiu incorretamente que apenas a versão em língua inglesa do Regulamento‑Quadro do MUS (e, por conseguinte, o termo «inappropriate») é decisiva, violando assim o princípio de que todas as versões linguísticas são igualmente autênticas. O recorrente alega que os conceitos «geeignet», «aptes», «idóneos», «idonei» e «geschickt» utilizados, respetivamente, nas versões linguísticas alemã, francesa, espanhola, italiana e neerlandesa do Acórdão de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (5), não correspondem aos termos «unangemessen», «inapproprié», «inadecuada», «inappropriata» e «niet passend» utilizados no artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

31.      Segundo o recorrente, os termos «desadequada» e «circunstâncias específicas» são conceitos jurídicos indeterminados. O artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e o artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS devem, assim, ser interpretados tendo por referência o seu objetivo e estrutura geral à luz de regras hierarquicamente superiores.

32.      O BCE e a Comissão alegam que este argumento deve ser julgado improcedente. Estou completamente de acordo.

33.      Antes de mais, importa observar que o recorrente não contesta a validade do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base ou do artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS. Ao invés, o que está em causa neste processo ‑ e no anterior processo no Tribunal Geral ‑ é a correta interpretação destas disposições. Além disso, uma vez que os ativos do recorrente eram superiores a 30 mil milhões de euros (6), daí resulta, por conseguinte, por força do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo do Regulamento de base, que «não é considerad[o] menos significativ[o], a não ser que tal se justifique por circunstâncias específicas». Pode ainda observar‑se que o recorrente não contesta a apreciação do BCE de que os seus ativos excedem em muito o limite legislativo aplicável.

34.      Em meu entender, resulta claramente da expressão «a não ser que tal se justifique por circunstâncias específicas» que consta artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base que a classificação como entidade menos significativa de uma entidade que cumpre qualquer um dos critérios pormenorizados previstos nesta disposição constitui uma exceção à regra geral calde que a supervisão prudencial direta de uma entidade que cumpre estes padrões deve ser exercida pelo BCE. Nos termos do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS, estas «circunstâncias específicas» existem quando a classificação de uma entidade como significativa é «desadequada», tendo em conta os objetivos e princípios do Regulamento de base e, em particular, a necessidade de assegurar a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, e, acrescentaria eu, a necessidade de proteção contra riscos sistémicos potencialmente escondidos, colocados por grandes instituições bancárias com ativos de capital significativos. Isto é corroborado pelo facto de o artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS prever que a expressão «circunstâncias específicas» que figura artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base deve ser interpretada de forma estrita. A inferência óbvia que daqui se extrai é que a classificação como menos significativa de uma entidade que preenche qualquer um dos critérios relevantes tem uma natureza bastante excecional e é uma exceção à regra. Por sua vez, tudo isto significa que quando algum dos critérios especificados no artigo 6.o, n.o 4, é preenchido, qualquer entidade bancária, como o recorrente, que pretenda demonstrar a existência de «circunstâncias específicas» na aceção desta disposição tem de fazê‑lo não mediante uma simples afirmação, mas tem antes de demonstrá‑lo de forma particularmente convincente.

35.      Considero que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao concluir, no n.o 44 do acórdão recorrido, que a redação do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS se centra na questão de saber se a supervisão direta de uma entidade pelo BCE, que, em princípio, não deveria ser classificada como menos significativa (7) e, por conseguinte, ser sujeita à supervisão direta do BCE, é ou não adequada. Como acertadamente assinala o Tribunal Geral, não é feita qualquer referência no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base nem no artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS a uma análise da necessidade de supervisão direta da entidade pelo BCE ou ao facto de a supervisão direta pelas autoridades nacionais ser tão apta para alcançar os objetivos do Regulamento de base como a supervisão efetuada apenas pelo BCE (8).

36.      A este respeito, o regime legal é claro. Parte‑se da premissa de que qualquer entidade bancária que cumpra algum dos critérios pormenorizados especificados no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base é considerada «significativa» pelo legislador da União, necessitando por isso de supervisão direta pelo BCE. No caso de uma entidade como o recorrente, quando os seus ativos excedem o limite de 30 mil milhões de euros, o legislador da União parte do pressuposto ex ante de que é necessária a supervisão direta do BCE, a não ser que seja demonstrada de forma convincente a existência de circunstâncias específicas que neguem este pressuposto, na aceção do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

37.      Quais são, então, as circunstâncias específicas invocadas pelo recorrente em apoio da sua alegação de que deve ser considerado abrangido pela exceção do artigo 6.o, n.o 4? Os principais argumentos invocados neste contexto estão relacionados com as leis que regulam o seu modelo de negócio e a natureza das suas operações de retalho. Especificamente, este afirma que esses objetivos legislativos definem o seu objetivo central de concessão de financiamento para atribuições públicas específicas e obrigam o Estado federal (Land) do Bade‑Vurtemberga a conceder‑lhe recursos que lhe permitam o cumprimento destas atribuições. Afirma também que o seu modelo de negócio é essencialmente avesso ao risco e, uma vez que está quase inteiramente localizado no território de um Estado‑Membro, a própria simplicidade da sua estrutura garante uma boa gestão de risco e até a sua falta de relevância sistémica enquanto instituição de crédito no quadro mais amplo do sistema bancário alemão.

38.      Em meu entender, mesmo que estes argumentos fossem aceites como factualmente corretos, são essencialmente irrelevantes para as questões em apreço. Não existe nada no Regulamento de base nem no Regulamento‑Quadro do MUS que sugira que a estrutura jurídica da entidade bancária, as leis que regulam o exercício das suas funções bancárias ou o seu modelo de negócio, ou mesmo a natureza do risco que este coloca à estabilidade bancária são relevantes para a sua designação como entidade significativa ao abrigo do Regulamento de base. Importa recordar que o terceiro período do artigo 1.o do Regulamento de base obriga o BCE a «ter plenamente em conta os diferentes tipos, modelos empresariais e dimensões das instituições de crédito», pelo que o quadro legislativo pretende que o BCE exercerá um controlo de supervisão em relação a instituições de crédito com diferentes modelos de negócio. Uma das outras lições que o legislador da União extraiu da crise financeira de 2008 foi que muitas das premissas simplistas que tinham sido anteriormente feitas sobre a natureza do risco financeiro ou a falta de relevância sistémica de instituições de crédito específicas acabaram por se revelar infundadas quando foram efetivamente postas à prova. No fundo, é por esta razão que o Regulamento de base parte do pressuposto ex ante de que uma instituição de crédito com ativos desta dimensão deve estar sujeita à supervisão do BCE, independentemente de essa instituição apresentar — ou não ‑ um risco sistémico real para a estabilidade financeira. Daqui decorre, por conseguinte, que a aparente inexistência de risco sistémico não significa, por si só, que a classificação da instituição de crédito em questão como entidade significativa na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base seja, assim, desadequada.

39.      Proponho que a referência do Tribunal Geral (9) ao n.o 67 do Acórdão de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400) para interpretar o termo «desadequada» não pode ser considerada juridicamente incorreta. Embora o n.o 67 do Acórdão de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400) esteja inquestionavelmente relacionado com o princípio da proporcionalidade, o Tribunal Geral referiu o número em causa apenas para ilustrar, no n.o 46 do acórdão recorrido, que uma análise da questão de saber se algo é ou não adequado é diferente da análise da questão de saber se excede o necessário.

40.      Além disso, receio que os argumentos do recorrente relativos às diferentes versões linguísticas do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS e do n.o 67 do Acórdão Gauweiler (C‑62/14, EU:C:2015:400) não sejam convincentes. Considero que o significado comum dos termos «geeignet», «aptes», «idóneos», «idonei» e «geschickt» utilizados, respetivamente, nas versões linguísticas alemã, francesa, espanhola, italiana e neerlandesa do Acórdão de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 67), é o antónimo do significado comum dos termos «unangemessen», «inapproprié», «inadecuada», «inappropriata» e «niet passend» utilizados no artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS. Por conseguinte, resulta claramente da letra do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS que a supervisão de uma entidade por uma autoridade nacional competente só é permitida quando a supervisão direta pelo BCE é desajustada, inapropriada ou «desadequada» à luz dos objetivos do Regulamento de base. Isto poderá ocorrer, por exemplo, quando a supervisão prudencial não seria adequadamente realizada pelo BCE.

b)      Princípio da proporcionalidade

41.      Em segundo lugar, o recorrente considera que o Tribunal Geral não interpretou o artigo 6.o, n.o 4, do segundo parágrafo, do Regulamento de base e o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS em conformidade com o princípio da proporcionalidade aplicável em matéria de competência, nos termos do artigo 5.o, n.o 4, TUE.

42.      O recorrente alega que o Tribunal Geral considerou incorretamente que o princípio da proporcionalidade aplicável em matéria de competência não é relevante para a interpretação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS (10), com base no facto de que «as autoridades nacionais […] atuam no quadro da aplicação descentralizada de uma competência exclusiva da União e não no exercício de uma competência nacional» (11). O recorrente considera que o princípio da proporcionalidade previsto no artigo 5.o, n.o 4, TUE se aplica também às competências exclusivas da União e, por conseguinte, deve ser respeitado pelo BCE ao atuar como autoridade europeia de supervisão e, em especial, ao classificar uma entidade como significativa ou menos significativa.

43.      O recorrente considera que resulta de uma análise global dos artigos 4.o e 6.o do Regulamento de base que o BCE goza de competência exclusiva no que respeita à supervisão de entidades significativas, ao passo que as autoridades nacionais mantêm as suas competências preexistentes a respeito de entidades menos significativas. Os considerandos 15, 28 (12) e 37 a 40 (13) do Regulamento de base não apoiam a conclusão contrária do Tribunal Geral.

44.      O recorrente alega também que, uma vez que a base legal do Regulamento de base é o artigo 127.o, n.o 6, TFUE, o Conselho não pode atribuir poderes às autoridades nacionais competentes, contrariamente às conclusões do Tribunal Geral nos n.os 63 e 72 do acórdão recorrido. Prossegue afirmando que, nos termos do artigo 5.o, n.o 4, TUE, a supervisão direta pelo BCE não é necessária quando as autoridades nacionais competentes são capazes de alcançar os objetivos do Regulamento de base. Considera que existem «circunstâncias específicas», nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base quando, devido às circunstâncias específicas e factuais do caso, a supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais competentes é pelo menos tão apta para alcançar os objetivos do Regulamento de base como a supervisão direta pelo BCE. Neste caso, é necessária a reclassificação de uma entidade significativa como menos significativa.

45.      O BCE e a Comissão alegam que este argumento deve ser julgado improcedente. Concordo com este entendimento.

46.      Antes de mais, importa observar que o recorrente não alega que qualquer disposição do Regulamento de base ou do Regulamento‑Quadro do MUS viole o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 5.o, n.o 4, TUE (14).

47.      Ao invés, o recorrente considera que, uma vez que os artigos 4.o e 6.o do Regulamento de base apenas concedem poderes exclusivos de supervisão ao BCE a respeito de entidades significativas, enquanto as autoridades nacionais permanecem, em princípio, competentes no que se refere a entidades menos significativas, o BCE, ao apreciar se deve reclassificar uma entidade como menos significativa devido à existência de «circunstâncias específicas», está vinculado pelo princípio da proporcionalidade. Assim, o BCE deve apreciar casuisticamente se a supervisão prudencial de uma determinada entidade poderia igualmente ser realizada pelas autoridades nacionais competentes, caso em que a entidade deveria ser qualificada de menos significativa.

48.      Resulta do exposto que é necessário analisar se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na sua avaliação da repartição de competências entre o BCE e as autoridades nacionais relevantes, nos termos dos artigos 4.o e 6.o do Regulamento de base, relativamente a entidades menos significativas antes de analisar a aplicação do princípio da proporcionalidade por este órgão jurisdicional.

1)      Repartição de competências

49.      O Tribunal Geral declarou, no n.o 63 do acórdão recorrido, que «foi delegada pelo Conselho ao BCE uma competência exclusiva quanto às atribuições previstas no artigo 4.o, n.o 1, do [R]egulamento de base e que o artigo 6.o desse mesmo regulamento tem por único objetivo permitir a execução descentralizada no âmbito do MUS (15) dessa competência pelas autoridades nacionais, sob o controlo do BCE, relativamente às entidades menos significativas e quanto às atribuições previstas no artigo 4.o, n.o 1, alíneas b) e d) a i), do [R]egulamento de base, conferindo ao BCE a competência exclusiva para determinar o conteúdo do conceito de “circunstâncias específicas” na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, desse mesmo regulamento, a qual foi instaurada pela adoção dos artigos 70.o e 71.o do Regulamento‑Quadro do MUS».

50.      Concordo inteiramente com a análise do Tribunal Geral. O artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base atribui ao BCE competência exclusiva para exercer as nove atribuições específicas relativamente à «totalidade» das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes (16) no âmbito do artigo 6.o deste regulamento. Poderá ser aqui recordado que não se faz, no artigo 4.o do Regulamento de base, nenhuma distinção para este efeito entre entidades significativas e entidades menos significativas. No entanto, o artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base estabelece, a respeito das entidades menos significativas, que o BCE tem algumas responsabilidades (17) no que se refere às atribuições referidas artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), d) a g) e i), enquanto as autoridades nacionais competentes têm outras responsabilidades no que respeita a estas atribuições. O BCE só é responsável pelas atribuições elencadas no artigo 4.o, n.o 1, alínea a) e c), do Regulamento de base no que se refere a entidades menos significativas.

51.      O artigo 6.o, n.o 5, alínea a), do Regulamento de base estabelece que o BCE emite regulamentos, orientações ou instruções gerais, dirigidos às autoridades nacionais competentes a respeito do exercício das atribuições especificadas no artigo 4.o (18) A fim de assegurar elevados padrões de supervisão, o BCE pode decidir exercer todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais entidades menos significativas (19). Além disso, o BCE tem o poder de supervisionar o funcionamento do sistema (20), exercer a qualquer momento os poderes de investigação previstos nos artigos 10.o a 13.o do Regulamento de base (21) e solicitar informações às autoridades nacionais competentes sobre o exercício das suas atribuições (22).

52.      Diferentemente, as autoridades nacionais competentes devem exercer e ser responsáveis pelas atribuições referidas no artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base, exceto as das alíneas a) e c), e adotar todas as decisões de supervisão relevantes dirigidas às entidades menos significativas em conformidade com o enquadramento adotado pelo BCE, em «consulta com as autoridades nacionais competentes […]», nos termos do artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento de base (23). Com base neste enquadramento, o BCE adotou o Regulamento‑Quadro do MUS, incluindo os seus artigos 70.o e 71.o, que preveem as regras para estabelecer a existência de «circunstâncias específicas» (24).

53.      Tendo em conta a grande amplitude de competências atribuídas ao BCE relativamente a entidades menos significativas e o papel claramente secundário ou acessório desempenhado pelas autoridades nacionais competentes a este respeito ao abrigo do Regulamento de base, não posso concordar com a alegação do recorrente de que estas autoridades mantêm as suas competências preexistentes relativamente às referidas entidades. Assim, o BCE exerce uma supervisão prudencial exclusiva das entidades menos significativas no que se refere às nove atribuições especificadas no artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base e é coadjuvado (25) neste exercício a respeito das atribuições especificadas nas alíneas b), d) a g) e i) do artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base.

54.      Além disso, no que respeita à alegação do recorrente relativa à base legal do Regulamento de base, não posso concordar com a sua análise do acórdão recorrido, porquanto o Tribunal Geral não concluiu, nos n.os 63 e 72 deste acórdão, que foram atribuídos poderes às autoridades nacionais competentes. Esses números referem‑se especificamente à competência exclusiva do BCE/União. Em todo caso, uma vez que o Regulamento de base prevê que o BCE, e não os Estados‑Membros, exerce a supervisão prudencial exclusiva das entidades menos significativas no que se refere às nove atribuições especificadas no artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base, o argumento do recorrente sobre a base legal do Regulamento de base exposto no n.o 44, supra, não pode ser acolhido e deve ser julgado improcedente.

2)      Aplicação do princípio da proporcionalidade

55.      Contrariamente às alegações do recorrente referidas no n.o 42, supra, o Tribunal Geral não considerou que o princípio da proporcionalidade era irrelevante para a interpretação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS. Com efeito, o Tribunal Geral analisou esta questão aprofundadamente, nos n.os 66 a 85 do acórdão recorrido, e referiu a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre este princípio, nos n.os 66 a 68 deste acórdão.

56.      Resulta claramente da redação do artigo 5.o, n.o 4, TUE que o princípio da proporcionalidade se aplica ao conteúdo e à forma de qualquer ação da União, incluindo, como alega o recorrente, às ações da União quando esta atua no âmbito da sua competência exclusiva.

57.      Em meu entender, o princípio da proporcionalidade não pode alterar a repartição de competências entre os Estados‑Membros e a União, que é regida pelo princípio da atribuição, nos termos do artigo 5.o, n.os 1 e 2, TUE. De acordo com o artigo 5.o, n.o 1, TUE «[a] delimitação das competências da União rege‑se pelo princípio da atribuição princípio da atribuição». O artigo 5.o, n.o 2, TUE estabelece que «[e]m virtude do princípio da atribuição, a União atua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados‑Membros lhe tenham atribuído nos Tratados para alcançar os objetivos fixados por estes últimos. As competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados‑Membros». Por conseguinte, o princípio da proporcionalidade não pode ser invocado para devolver uma competência da União aos Estados‑Membros ou vice‑versa. O «exercício das competências da União rege‑se [no entanto] pelos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade» (26).

58.      Ao interpretar os conceitos de «circunstâncias específicas» do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base e «desadequada» do artigo 70.o, n.o [1], do Regulamento‑Quadro do MUS à luz do princípio da proporcionalidade, o BCE não pode classificar como menos significativa uma entidade que, se assim não fosse, seria significativa, exceto se esta ação for, inter alia, adequada para alcançar os objetivos legítimos prosseguidos pelo Regulamento de base e não for além do necessário à prossecução desses objetivos.

59.      Por conseguinte, não basta demonstrar que as autoridades nacionais competentes podem alcançar os objetivos do Regulamento de base (27), como alega o recorrente, uma vez que isto apenas cumpre o requisito de adequação da ação no âmbito do teste da proporcionalidade. Pelo contrário, o facto de a supervisão das autoridades nacionais competentes ser mais apta para alcançar os objetivos do Regulamento de base (28) ‑ assegurando, assim, que a classificação como menos significativa de uma entidade que, se assim não fosse, seria significativa não vai além do necessário à prossecução desses objetivos ‑ deve também ser demonstrado.

60.      Qualquer tentativa de classificar como menos significativa uma entidade que, se assim não fosse, seria significativa nos termos do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base com o fundamento de que os objetivos deste regulamento também podem ser alcançados através de supervisão direta pelas autoridades nacionais competentes não só é contrária à repartição de competências entre Estados‑Membros e o BCE prevista nessa disposição como não cumpre o princípio da proporcionalidade.

61.      Em todo caso, considero que o argumento da proporcionalidade apresentado pelo recorrente no presente recurso equivale, em substância, a uma contestação indireta da validade do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base. Como já fiz notar, o regime legal é claro, na medida em que se presume que as entidades bancárias que preencham alguma das condições aí enumeradas são consideradas significativas, a menos que sejam claramente demonstradas circunstâncias específicas. Isto é corroborado pelo disposto no artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, que estabelece que a expressão «circunstâncias específicas» deve ser interpretada de forma estrita.

62.      Embora admita que a potencial aplicação do princípio da proporcionalidade não pode ser excluída, num caso em isso seja adequado, ao mesmo tempo, o princípio não pode ser aplicado de uma forma que efetivamente prejudicaria o efeito útil do regime legal estabelecido pelo legislador da União. No entanto, isto efetivamente o que o recorrente procurou alcançar no que respeita a este recurso.

63.      Neste contexto, não posso evitar pensar que o recorrente falhou de forma singular na apresentação de quaisquer argumentos baseados na existência de circunstâncias específicas na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base. Ao invés, afigura‑se que o argumento da proporcionalidade equivale a um argumento de que seria possível ‑ ou até desejável ‑ que o recorrente fosse regulado diretamente por autoridades de supervisão nacionais, cabendo assim ao BCE o ónus de demonstrar que o contrário era de alguma forma necessário. No entanto, este argumento é completamente incoerente com o contexto claro do regime legal e, como acabo de afirmar, equivale, em substância, a uma contestação indireta da sua validade.

64.      Por todas estas razões, considero que o argumento da proporcionalidade, conforme apresentado pelo recorrente, é improcedente.

c)      Violação do princípio da interpretação «ut res magis valeat quam pereat» e da obrigação de não exigir uma «probatio diabolica»

65.      Em terceiro lugar, o recorrente alega que o Tribunal Geral violou o princípio de interpretação ut res magis valeat quam pereat e a obrigação de não exigir uma probatio diabolica. O argumento aqui apresentado corresponde, com efeito, à alegação de que a exceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, não deve ser excessivamente difícil de demonstrar.

66.      O recorrente considera que o conceito de «circunstâncias específicas» que figura no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base não pode ser interpretado no sentido de que a presunção de que as entidades que cumprem os critérios neste estabelecidos devem ser classificadas como entidades significativas nunca pode ser ilidida. Embora os critérios relativos à existência de «circunstâncias específicas» nos termos do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS estejam sujeitos a «interpretação estrita», alega que deve ainda existir margem para aplicar esses critérios. Segundo o recorrente, nos n.os 46 e 80 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não compreende este aspeto e, ao fazê‑lo, torna praticamente impossível para o recorrente demonstrar a existência dessas circunstâncias específicas.

67.      O recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito no n.o 80 do acórdão recorrido, ao declarar que uma «supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais [deve permitir] assegurar mais eficazmente os objetivos e princípios do Regulamento de base» e que este aspeto deve ser provado pelas entidades significativas. Alega que nem o Regulamento de base nem o Regulamento‑Quadro do MUS estabelecem essa hierarquia entre a supervisão «mais eficaz» para alcançar os objetivos do Regulamento de base e a supervisão «menos eficaz» para o fazer. O critério do Tribunal Geral de que a supervisão pelas autoridades nacionais é «mais eficaz», é, segundo o recorrente, desadequado e priva as entidades significativas de qualquer possibilidade realista de efetivamente apresentarem a prova exigida pelo Tribunal Geral, uma vez que essas entidades têm de demonstrar os factos relativos à forma como as várias autoridades de supervisão atuam, factos que não fazem parte da esfera de competência das referidas entidades. A regra das «circunstâncias específicas» prevista no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base e no artigo 70.o do Regulamento‑Quadro do MUS pretende evitar incoerências resultantes de uma aplicação simplista do critério da dimensão num determinado caso, que conduziria à atribuição de competências excessivas ao BCE.

68.      Na sua contestação, o BCE e a Comissão consideram que é possível demonstrar a existência de «circunstâncias específicas» nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base. A este respeito, referiram vários exemplos de decisões adotadas pelo BCE.

69.      Na sua réplica, o recorrente alega que as decisões do BCE referidas por este e pela Comissão não foram aplicados os critérios adotados pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido. Segundo o recorrente, essas decisões do BCE provam, pelo contrário, que o BCE adotou as suas decisões de forma arbitrária e oportunista.

70.      Considero que a presente alegação do recorrente deve ser julgada improcedente. A título preliminar, observo que, quando atua como tribunal de recurso, o Tribunal de Justiça não está em condições de apreciar se os exemplos de decisões do BCE apresentados pelo BCE e pela Comissão apoiam o seu argumento de que a aplicação da interpretação artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base feita pelo Tribunal Geral não exige uma «probatio diabolica». Trata‑se de uma questão de facto que não faz parte da competência do Tribunal de Justiça em sede de recurso.

71.      Conforme já referi, resulta claramente do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS que a expressão «circunstâncias específicas» que consta do Regulamento de base deve ser interpretada de forma estrita. A classificação de uma entidade significativa como entidade menos significativa devido à existência de circunstâncias específicas, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base deve, por conseguinte, ser considerada excecional por natureza.

72.      Talvez seja desnecessário procurar uma definição exaustiva do que são «circunstâncias específicas» para efeitos do presente recurso. Não obstante, atendendo ao objetivo regulatório dos dois regulamentos — que, afinal de contas, visa garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão através da aplicação das mesmas regras substantivas relativas à supervisão prudencial desta entidade, independentemente da questão de saber se isto é feito a nível nacional ou ao nível do BCE — afigura‑se que a exceção prevista no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base dirige‑se principalmente àquelas circunstâncias especiais e incomuns em que a designação da entidade como significativa equivaleria, na prática, a um obstáculo à aplicação coerente desses elevados padrões de supervisão.

73.      Em resposta, o recorrente afirma que é na verdade impossível provar que a supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais competentes permite assegurar de modo mais eficaz os objetivos do Regulamento de base, uma vez que isso exigiria conhecimentos sobre a forma como as várias autoridades de supervisão atuam.

74.      Pela minha parte, considero este argumento pouco convincente. Posso concordar que é mais fácil satisfazer o critério defendido pelo recorrente do que o adotado pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido. Contudo, ambos os critérios exigem um conhecimento profundo da forma como o BCE e uma determinada autoridade nacional competente atuam. Tendo em conta que a forma como o BCE e as autoridades nacionais competentes atuam é uma questão de domínio público, não vejo por que razão é impossível demonstrar num determinado caso que a supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais competentes é mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base. Além disso, o recorrente é uma entidade com muito bons recursos, que possui, presume‑se um amplo conhecimento da prática e regulação bancárias. Caso existissem efetivamente «circunstâncias específicas» suscetíveis de justificar a não aplicação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base, de modo a que a supervisão direta fosse devolvida do BCE às autoridades nacionais competentes, imagina‑se que o recorrente não tardaria a destacar essas considerações específicas. No entanto, permaneceu estranhamente silencioso sobre esta mesma questão, preferindo invocar argumentos que, atendendo aos factos deste recurso, devem ser considerados bastante teóricos relativos ao princípio da proporcionalidade e à sua interação com o disposto no artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento de base.

2.      Erro manifesto de apreciação de factos

75.      Na segunda parte do primeiro fundamento de recurso, o recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito nos n.os 101 a 112 do acórdão recorrido, ao não analisar as circunstâncias específicas invocadas pelo recorrente e ao não apreciar se, no caso do recorrente, existiam «circunstâncias específicas» nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base. O Tribunal Geral não fez essa apreciação e apenas declarou, no n.o 108 do acórdão recorrido, que o recorrente não tinha alegado que a supervisão nacional seria mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base do que uma supervisão direta pelo BCE.

76.      O BCE e a Comissão defendem que este argumento deve ser julgado improcedente. Estou de acordo.

77.      Conforme já observei, importa notar que o recorrente não contesta o facto de que, na petição apresentada na primeira instância, os factos que apresentou em apoio do seu argumento de que devia ser reclassificado como entidade menos significativa se destinavam exclusivamente a demonstrar que a supervisão direta pelo BCE era desnecessária (29).

78.      Em meu entender, se o Tribunal Geral, por sua própria iniciativa, tivesse analisado os factos apresentados pelo recorrente para apreciar se a supervisão direta das autoridades nacionais competentes seria mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base, teria violado a proibição de decidir ultra petita (30). Esta questão, que não foi suscitada pelo recorrente na petição apresentada na primeira instância, não está abrangida pela exceção de questões de ordem pública que o Tribunal Geral pode suscitar por sua própria iniciativa.

79.      O recorrente questiona também a apreciação do Tribunal Geral nos n.os 109 a 111 do acórdão recorrido, através da qual esse tribunal julgou improcedente a sua alegação de que, devido à diversidade de quadros jurídicos e de autoridades de supervisão, as autoridades nacionais são mais capazes de cooperar entre si do que com o BCE para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial, uma vez que o recorrente não apresentou nenhuma prova que demonstrasse que a cooperação entre as autoridades alemãs relevantes era mais fácil do que com o BCE.

80.      Resulta do n.o 109 do acórdão recorrido que só na réplica apresentada em primeira instância é que o recorrente forneceu algumas provas destinadas a demonstrar que a autoridade nacional competente seria mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base. Independentemente da questão de saber se o Tribunal Geral deveria ter apreciado esta prova como constituindo, como alegavam o BCE e a Comissão, um novo fundamento de recurso e, por conseguinte, inadmissível, considero que, de facto, o recorrente não alegou que a apreciação do Tribunal Geral no n.o 111 do acórdão recorrido é incorreta. No presente recurso, o recorrente alega apenas que não foi notificado de que devia apresentar essa prova e que, em todo caso, isto lhe imporia um ónus impossível.

81.      Uma vez que o próprio recorrente suscitou esta questão, cabe‑lhe apresentar provas da mesma. Além disso, à luz da minha resposta na secção anterior (31), não considero convincente a alegação do recorrente de que não pode produzir prova relativa aos quadros jurídicos nacionais, à atuação das autoridades nacionais e do BCE, que são todas questões do domínio público. Se, de facto, a supervisão deste recorrente ao nível do BCE era suscetível de prejudicar a aplicação dos adequados elevados padrões de regulação bancária, basta, mais uma vez, afirmar que é inquestionável que o recorrente possui os conhecimentos e recursos necessários para defender a sua posição. Mais uma vez, não posso deixar de observar que não o fez, tendo preferido, para este efeito, invocar argumentos essencialmente abstratos, baseados na proporcionalidade.

3.      Incorreto não reconhecimento de que o BCE não exerceu o seu poder de apreciação e violou a sua obrigação de apreciar o processo

82.      Na terceira parte do primeiro fundamento, o recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao concluir que o BCE não violou a sua obrigação de utilizar o seu poder de apreciação com o fundamento de que «a argumentação apresentada pelo recorrente no procedimento administrativo visava apenas demonstrar que os objetivos do Regulamento de base podiam ser alcançados através de uma supervisão direta do recorrente pelas autoridades nacionais». O Tribunal Geral declarou incorretamente, no n. o 140 e seguintes do acórdão recorrido, que não se pode «acusar o BCE de não ter exercido o seu poder de apreciação ao rejeitar de imediato uma argumentação desprovida de pertinência».

83.      Segundo o recorrente, é igualmente incorreta a conclusão do Tribunal Geral, no n. o 149 do acórdão recorrido, calde que «as circunstâncias que o BCE é acusado de não ter tomado em consideração não eram relevantes face à redação do artigo 70. o, n. o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS», pelo que «não podia utilmente acusar‑se o BCE de não ter tomado em consideração essas circunstâncias na aplicação desta disposição».

84.      O recorrente alega que os factos apresentados não eram irrelevantes para a análise do BCE e para o exercício do seu poder de apreciação, uma vez que o recorrente os tinha invocado em apoio do critério jurídico correto a aplicar ao abrigo do artigo 70. o, n. o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS. Em todo caso, o BCE e o Tribunal Geral não podem simplesmente julgar improcedente um argumento de uma parte por ser «irrelevante» apenas com o fundamento de que, em seu entender, este argumento assenta no critério jurídico errado. Pelo contrário, o BCE tem de ter em consideração todos os factos relevantes e exercer plenamente o seu poder de apreciação. Na decisão impugnada, o BCE não cumpriu este requisito.

85.      O BCE e a Comissão alegam que este argumento deve ser julgado improcedente. Concordo com este entendimento.

86.      Uma vez que o critério jurídico correto para «circunstâncias específicas», nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base, e para «desadequada», nos termos do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS, consiste em saber se a prossecução dos objetivos do Regulamento de base poderia ser mais bem assegurada através da supervisão direta pelas autoridades nacionais competentes, considero que o Tribunal Geral concluiu corretamente, nos n.os 140 e 149 do acórdão recorrido, que os argumentos ou provas destinados a cumprir um critério jurídico diferente, nomeadamente, que a supervisão pelas autoridades alemãs relevantes seria suficiente para alcançar esses objetivos, são irrelevantes. Assim, o Tribunal Geral concluiu com razão que o BCE não tinha abusado dos seus poderes ao não exercer o seu poder de apreciação na aplicação do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS e que este não deixou de ter em conta todas as circunstâncias relevantes.

87.      Acrescentaria que, caso o Tribunal Geral ou mesmo o BCE tivessem atuado com base em prova que simplesmente demonstrava que a supervisão pelas autoridades alemãs competentes seria suficiente para alcançar os objetivos do Regulamento de base, mas que não ia mais longe, comprovando que a prossecução dos objetivos deste regulamento poderia ser mais bem assegurada através da supervisão direta pelas autoridades nacionais competentes, teriam cometido um erro de direito.

B.      Segundo fundamento de recurso, relativo à desvirtuação da decisão impugnada e à incorreta apreciação dos requisitos aplicáveis à fundamentação

88.      O segundo fundamento de recurso está dividido em duas partes.

1.      O Tribunal Geral desvirtuou a fundamentação da decisão impugnada

89.      O recorrente alega que, nos n.os 31 e 34 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral desvirtuou a fundamentação da decisão impugnada e, por conseguinte, cometeu um erro de direito (32).

90.      Em primeiro lugar, o recorrente considera que, no n.o 31 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral inverteu a ordem das frases contidas na decisão impugnada e, em segundo lugar, ligou esta decisão ao parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014 (33), apesar de essa ligação não constar da própria decisão impugnada. O recorrente salienta que o facto de a decisão impugnada apenas referir que a classificação da entidade supervisionada como significativa não está em contradição com as finalidades do Regulamento de base. A decisão impugnada não afirma ser por este motivo que a supervisão do recorrente não é «desadequada» na aceção do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS. O Tribunal Geral concluiu que a Comissão de Reexame tinha salientado que o recorrente tinha de demonstrar a existência de circunstâncias que indicavam que a supervisão direta pela autoridade nacional competente seria mais eficaz para garantir os objetivos do Regulamento de base. No entanto, o recorrente considera que não existe esta alegada conexão entre os critérios estabelecidos no parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014 e a decisão impugnada. A decisão impugnada não refere a passagem citada daquele parecer nem nenhuma outra passagem do mesmo. Ao mesmo tempo, o parecer não menciona o critério da «contradição» com os objetivos do Regulamento de base, referido pela decisão impugnada.

91.      O recorrente alega que, após fazer referência à sua incorreta reprodução da decisão impugnada no n.o 31 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral analisou, no n.o 34 deste acórdão, o conteúdo da decisão impugnada e, em particular, a conceção do BCE relativamente ao critério de avaliação aplicável. O recorrente observa que, segundo o Tribunal Geral, decorre da decisão impugnada, interpretada à luz do parecer, que o BCE considera que a aplicação do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS não pode conduzir à classificação de uma entidade como menos significativa, exceto se a supervisão direta pelas autoridades alemãs competentes for mais eficaz para garantir os objetivos do Regulamento de base do que a supervisão pelo BCE (34). O recorrente alega que a decisão impugnada não menciona uma única vez este critério.

92.      O BCE e a Comissão alegam que este argumento deve ser julgado improcedente. Concordo com este entendimento.

93.      Além do dever de fundamentação da sua decisão por parte do BCE, previsto no artigo 22.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento de base e no artigo 33.o, n.os 1 e 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, o artigo 296.o TFUE estabelece claramente que os atos jurídicos (35) devem ser fundamentados.

94.      Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentar um ato lesivo, que constitui o corolário do princípio do respeito dos direitos de defesa, tem por fim, por um lado, fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se o ato foi devidamente fundamentado ou se enferma eventualmente de um vício que permita impugnar a sua validade perante o juiz da União e, por outro, permitir a este último exercer a sua fiscalização da legalidade desse ato. A fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve revelar de forma clara e inequívoca o raciocínio da instituição autora do ato, de forma a permitir que os interessados conheçam os fundamentos das medidas adotadas e que o órgão jurisdicional competente exerça a sua fiscalização. No entanto, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e ao contexto em que o mesmo foi adotado. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o ato diga direta ou individualmente respeito podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que o caráter suficiente de uma fundamentação deve ser apreciado à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa. Em especial, um ato lesivo está suficientemente fundamentado quando ocorreu num contexto conhecido do interessado, que lhe permita compreender o alcance da medida adotada a seu respeito (36).

95.      A título preliminar, observo que a simples afirmação pelo recorrente de que o Tribunal Geral inverteu a ordem de frases da decisão impugnada não demonstra, por si só, que o sentido desta decisão foi desvirtuado.

96.      Além disso, considero que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que o parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014 (37) está relacionado com a decisão impugnada e, por isso, faz parte do contexto em que esta decisão se insere (38).

97.      O próprio recorrente não só afirma que o parecer foi «anexado» à decisão impugnada e foi referido por esta como fazendo parte do contexto histórico em que essa decisão foi adotada, como também afirma que, de acordo com o artigo 24.o, n.o 9, do Regulamento de base (39) e com o artigo 18.o da Decisão do Banco Central Europeu, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (40), o BCE tem a obrigação de anexar (41) o parecer da Comissão de Reexame a todas as novas decisões.

98.      Considero que resulta de forma evidente do artigo 24.o, n.os 7 (42) e 9, do Regulamento de base que o parecer da Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão apresentado pelo Conselho de Supervisão e a decisão adotada pelo Conselho do BCE nos termos deste artigo estão intrinsecamente ligados. Isto é verdade mesmo se o parecer não é vinculativo para o Conselho de Supervisão nem para o Conselho do BCE (43).

99.      Atendendo à obrigação prevista no artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento de base de o Conselho de Supervisão ter em conta o parecer da Comissão de Reexame e de apresentar imediatamente um novo projeto decisão ao Conselho do BCE, bem como o facto de a decisão impugnada chegar à mesma conclusão que o parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014, o Tribunal Geral constatou corretamente que o parecer pode ser tomado em consideração para avaliar se a decisão impugnada contém uma fundamentação adequada (44).

100. A primeira parte do segundo fundamento deve, assim, ser julgada improcedente.

2.      O Tribunal Geral não concluiu que a decisão impugnada não estava adequadamente fundamentada

101. Na segunda parte do segundo fundamento, o recorrente alega que, porquanto o Tribunal Geral desvirtuou a fundamentação da decisão impugnada e substituiu a fundamentação do BCE pela sua própria fundamentação, não teve em conta o facto de que o BCE não respeitou o dever de fundamentação. Segundo o recorrente, a fundamentação da decisão impugnada é ilógica e contraditória em si mesma.

102. Uma vez que esta parte do segundo fundamento tem como premissa a inexistência de uma ligação entre a decisão impugnada e o parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014 e que esta não faz parte do contexto em que a decisão impugnada foi adotada, considero que também esta parte deve ser julgada improcedente, por ser inoperante.

103. No entanto, por razões de exaustividade, proponho abordar vários argumentos invocados pelo recorrente.

104. O recorrente considera que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao não reconhecer que a decisão impugnada não indica os fundamentos jurídicos em que se baseia, uma vez que, na decisão impugnada, o BCE apenas justapõe diferentes critérios jurídicos. Assim, a decisão impugnada não indica claramente os factos que o BCE tencionava ter em conta para decidir se a classificação de uma entidade como significativa é desadequada.

105. O recorrente observa que o Tribunal Geral declarou, no n.o 133 do acórdão recorrido, que não existe contradição «entre, por um lado, o parecer da Comissão de Reexame mencionar que a existência de “circunstâncias específicas” implica que os objetivos do [R]egulamento de base, e, designadamente, a necessidade de garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial, devam ser mais bem assegurados pela supervisão direta das autoridades nacionais e, por outro, a decisão impugnada, que refere o facto de a supervisão direta do recorrente pelo BCE dever ser contrária aos objetivos do [R]egulamento de base para que o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS seja aplicável».

106. Também considero que não existe contradição entre estas duas afirmações e que, atendendo à ligação entre os documentos em questão, a primeira serve apenas para esclarecer a segunda à luz do quadro jurídico relevante. O artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base exige a existência de «circunstâncias específicas» para reclassificar como menos significativa uma entidade que, se assim não fosse, seria significativa, assegurando deste modo que a supervisão prudencial direta será realizada pelas autoridades nacionais competentes em vez de pelo BCE. Nos termos do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS, existem «circunstâncias específicas» quando, inter alia, a classificação de uma entidade supervisionada como significativa é desadequada, tendo em conta os objetivos e princípios do Regulamento de base. O ênfase colocado, tanto no parecer como na decisão impugnada, sobre os objetivos do Regulamento de base está, assim, em plena conformidade com o quadro jurídico em causa e não é contraditória. Na realidade, o recorrente contesta o requisito, referido na decisão impugnada e no parecer da Comissão de Reexame (45), e confirmado pelo Tribunal Geral (46), de demonstrar que a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial é mais bem assegurada através da supervisão direta pelas autoridades nacionais competentes. Esta é uma questão substantiva e não de adequação de fundamentos (47).

107. O recorrente considera ainda que o Tribunal Geral não reconheceu que o BCE não analisou na decisão impugnada os argumentos por este invocados no decurso do procedimento administrativo. No n.o 130 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que o BCE não é obrigado a apresentar uma fundamentação detalhada que refute a argumentação do recorrente, porquanto esta era «manifestamente desprovida de pertinência» à luz da interpretação defendida pelo BCE. O recorrente alegou no Tribunal Geral e continua a alegar no Tribunal de Justiça que não consegue deduzir da decisão impugnada ou do parecer da Comissão de Reexame os fundamentos pelos quais a sua argumentação era alegadamente «desprovida de pertinência».

108. Considero que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao declarar, no n.o 130 do acórdão recorrido, que o recorrente podia facilmente deduzir da decisão impugnada e do parecer da Comissão de Reexame por que motivo a sua argumentação, que, em meu entender, defendia claramente um critério de «circunstâncias específicas» totalmente distinto do adotado na decisão impugnada e no parecer, era «manifestamente desprovida de pertinência».

109. Por conseguinte, a segunda parte do segundo fundamento de recurso deve ser julgada inoperante e, em todo caso, improcedente.

C.      Terceiro fundamento de recurso, relativo a erros processuais do Tribunal Geral através da introdução de elementos que não eram objeto do processo

110. O recorrente considera que o acórdão recorrido viola o seu direito a ser ouvido e a exigência de cumprimento do princípio do contraditório, que são princípios fundamentais do direito da União. Segundo o recorrente, o Tribunal Geral baseou a fundamentação do acórdão recorrido em duas questões decisivas que não faziam parte do processo, nomeadamente, a exigência de prova de que a supervisão pela autoridade competente alemã era mais adequada do que a supervisão pelo BCE e a prova de colaboração entre esta autoridade e o Ministério das Finanças do Estado federal (Land).

111. O recorrente observa que o Tribunal Geral considerou, no n.o 46 do acórdão recorrido, que «circunstâncias específicas» «[têm necessariamente de ser interpretadas no sentido de que] o exercício de uma supervisão prudencial direta pelo BCE, imposta pela classificação de uma entidade de “significativa”, é menos eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base do que o exercício de uma supervisão prudencial direta dessa entidade pelas autoridades nacionais». O Tribunal Geral baseou o seu entendimento no facto de o recorrente não ter alegado que a supervisão direta pela autoridade competente alemã seria mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base do que a supervisão direta pelo BCE (48). Uma vez que este critério não foi mencionado pelo BCE nem pelo Tribunal Geral no decurso do processo e que não é referido nas disposições legislativas relevantes, o Tribunal Geral violou o direito do recorrente a ser ouvido e a exigência de cumprimento do princípio do contraditório. Assim, o Tribunal Geral proferiu um «acórdão surpresa».

112. O recorrente alega ainda que o Tribunal Geral considerou que a sua argumentação substantiva era desprovida de pertinência, porquanto este não alegou que a supervisão direta pela autoridade competente alemã seria mais eficaz para alcançar os objetivos do Regulamento de base.

113. No decurso do processo, o recorrente alegou, relativamente ao objetivo da aplicação coerente de elevados padrões prudenciais, que não só estava sujeito a diferente legislação europeia e nacional como também a diferentes autoridades de supervisão nacionais. No entanto, o Tribunal Geral julgou improcedente este argumento, com o fundamento de que «[a] este propósito, basta observar que o recorrente não refere a existência de nenhum entendimento ou colaboração entre as autoridades do Land de Bade‑Vurtemberga e as autoridades alemãs que permita uma colaboração mais estreita do que com o BCE» (49). O recorrente considera que o facto de a prova de um entendimento deste tipo ou de outra forma de «colaboração» entre a autoridade alemã relevante, o Deutsche Bundesbank e o Estado federal (Land) ser necessária para demonstrar que a supervisão direta pela autoridade alemã relevante é mais eficaz para alcançar o objetivo de aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial não fora anteriormente referida, no decurso do processo, nem pelo BCE nem pelo Tribunal Geral.

114. O BCE e a Comissão alegam que este fundamento deve ser julgado improcedente. Concordo com este entendimento.

115. Nos n.os 45 e 46 da petição apresentada no Tribunal Geral, o recorrente alegou que o critério de «circunstâncias específicas» descrito no parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014, nomeadamente, de que os «objetivos do [Regulamento de base] e, em particular, o cumprimento de elevados padrões de supervisão, seriam mais bem alcançados se a entidade que preenche os critérios que determinam que esta tem caráter significativo fosse classificada como menos significativa e, por conseguinte, permanecesse sob a supervisão direta da [autoridade nacional competente] relevante» era incorreta, uma vez que não resultava do Regulamento de base nem do Regulamento‑Quadro do MUS (50). O BCE respondeu amplamente a este argumento na sua contestação apresentada no Tribunal Geral, em especial nos seus n.os 26 e 50 (51).

116. Por conseguinte, resulta da petição e da contestação acima referidas que o critério de «circunstâncias específicas» adotado pelo Tribunal Geral foi amplamente discutido perante este pelas partes, garantindo assim que o direito do recorrente a ser ouvido e a exigência de cumprimento do princípio do contraditório foram respeitados.

117. O facto de, no n.o 88 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral ter concluído que o recorrente apenas tinha alegado nas suas cartas de 10 de julho de 2014 (52) e de 6 de outubro de 2014 (53) que não era necessária a supervisão prudencial do BCE para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, sem alegar que a supervisão nacional seria mais eficaz para alcançar esses objetivos, não demonstra que o critério de «circunstâncias específicas» adotado pelo Tribunal Geral não tenha sido debatido perante este pelas partes (54), sendo claramente contrariado por uma leitura dos articulados das partes apresentados no Tribunal Geral, conforme demonstrado nos n.os 115 e 116 das presentes conclusões.

118. No que diz respeito ao argumento do recorrente relativo ao n.o 111 do acórdão recorrido (55), considero que deve ser julgado improcedente. No n.o 111 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral apenas julgou improcedente, por falta de fundamento, o argumento suscitado pelo recorrente na réplica apresentada no Tribunal Geral de que a supervisão prudencial pelas autoridades alemãs competentes relevantes seria mais eficaz para alcançar o objetivo de elevados padrões de supervisão prudencial referido no artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

119. Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

120. Uma vez que nenhum dos fundamentos de recurso invocados pelo recorrente em apoio do seu recurso pode ser julgado procedente, entendo que deve ser negado provimento ao recurso na íntegra.

VI.    Quanto às despesas

121. Por força do artigo 184.o, n.o 2, do seu Regulamento de Processo, se for negado provimento ao recurso de uma decisão do Tribunal Geral, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas. Ao abrigo do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal de Geral em virtude do seu artigo 184.o, n.o 1, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

122. Tendo o BCE e a Comissão pedido a condenação do recorrente nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas, bem como nas despesas do BCE e da Comissão.

VII. Conclusão

123. Atendendo ao exposto, sou da opinião de que o Tribunal de Justiça deve:

–        Negar provimento ao recurso;

–        Condenar o Landeskreditbank Baden‑Württemberg — Förderbank a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia.


1      Língua original: inglês.


2      V. artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base.


3      V. artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS e n.o 46 do acórdão recorrido.


4      Acórdão de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 67).


5      C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 67.


6      Afigura‑se resultar dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que o valor total dos ativos do recorrente era, na data relevante, de 70 682 mil milhões de euros.


7      De acordo com os critérios pormenorizados estabelecidos no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento de base.


8      V. n.os 44 e 46 do acórdão recorrido.


9      V. n.o 45 do acórdão recorrido.


10      V. n.os 66 a 72 do acórdão recorrido.


11      V. n.o 72 do acórdão recorrido.


12      V. n.os 56 e seguintes do acórdão recorrido.


13      V. n.o 58 do acórdão recorrido.


14      V., por exemplo, n.os 61 a 72 do Acórdão de 12 de maio de 2011, Luxemburgo/Parlamento e Conselho (C‑176/09, EU:C:2011:290). Neste processo, o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegava que uma disposição de uma diretiva violava o princípio da proporcionalidade, uma vez que o critério que definia o âmbito de aplicação desta diretiva era irrelevante para os seus objetivos.


15      Nos termos do artigo 2.o, n.o 9, do Regulamento de base «“Mecanismo Único de Supervisão (MUS)” [é] o sistema de supervisão financeira composto pelo BCE e pelas autoridades nacionais competentes de Estados‑Membros participantes, tal como descrito no artigo 6.o do presente regulamento».


16      Resulta claramente da leitura do considerando 15 do Regulamento de base que se pretendia a concessão de certas atribuições de supervisão específicas ao BCE. Além disso, de acordo com o considerando 28 do Regulamento de base «[a]s atribuições de supervisão não conferidas ao BCE deverão continuar a incumbir às autoridades nacionais». Os exemplos das atribuições que continuam a incumbir às autoridades nacionais referidas deste considerando não se sobrepõem às atribuições conferidas ao BCE nos termos do artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento de base (v. n.o 57 do acórdão recorrido). Contrariamente ao que alega o recorrente, o Tribunal Geral não considera em momento algum que a lista de atribuições de supervisão que devem continuar a incumbir às autoridades nacionais é exaustiva. Na verdade, resulta claramente da utilização da palavra «incluir» neste considerando que a lista de atribuições é exemplificativa.


17      Elencadas no artigo 6.o, n.o 5, do Regulamento de base.


18      Excluindo as atribuições especificadas no artigo 4.o, alíneas a) e c), do Regulamento de base.


19      Artigo 6.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de base.


20      Artigo 6.o, n.o 5, alínea c), do Regulamento de base.


21      Artigo 6.o, n.o 5, alínea d), do Regulamento de base.


22      Artigo 6.o, n.o 5, alínea e), do Regulamento de base.


23      Artigo 6.o, n.o 6, do Regulamento de base. As autoridades nacionais competentes devem, no entanto, informar o BCE das medidas tomadas ao abrigo do artigo 6.o, n.o 6, do Regulamento de base e coordenar estreitamente essas medidas com o BCE. Além disso, devem informar periodicamente o BCE sobre as atividades realizadas.


24      Artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento de base.


25      V. considerando 37 do Regulamento de base.


26      O sublinhado é meu.


27      V. n.o 74 do acórdão recorrido.


28      V. n.os 40, 75 e 80 do acórdão recorrido.


29      V. n.o 104 do acórdão recorrido.


30      Resulta das regras que regulam a tramitação processual nos tribunais da União Europeia, nomeadamente, do artigo 21.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e dos artigos 76.o e 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, que, em princípio, o litígio é determinado e circunscrito pelas partes e que o juiz da União não pode decidir ultra petita: v., por exemplo, Acórdão de 3 de maio de 2018, EUIPO/European Dynamics Luxembourg e o. (C‑376/16 P, EU:C:2018:299, n.o 33).


31      V., nomeadamente, n.o 74, supra.


32      V. Acórdão de 27 de janeiro de 2000, DIR International Film e o./Comissão (C‑164/98 P, EU:C:2000:48, n.os 44 a 49).


33      V. n.o 17, supra.


34      V. n.o 128 do acórdão recorrido.


35      Assim, os atos legislativos e administrativos devem ser fundamentados. V. também artigo 41.o, n.o 2, alínea c), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, relativo ao direito a uma boa administração e ao dever da Administração de fundamentar as suas decisões.


36      Acórdão de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba (C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.os 49, 50, 53 e 54).


37      Resulta claramente do artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento de base que a Comissão de Reexame é um órgão interno do BCE. O argumento do recorrente segundo o qual o parecer da Comissão de Reexame e a decisão impugnada podem ser relacionados para efeitos da análise da adequação dos fundamentos da decisão impugnada, uma vez que os dois documentos são redigidos por autores diferentes, não pode ser acolhido, visto que ambos os documentos são emanados pela mesma instituição e fazem parte do procedimento previsto no artigo 24.o do Regulamento de base.


38      De acordo com o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento de base, a Comissão de Reexame de natureza administrativa está encarregada de proceder a uma revisão administrativa interna das decisões tomadas pelo BCE no exercício dos poderes que lhe são conferidos por esse regulamento após um pedido de revisão apresentado nos termos do artigo 24.o, n.o 5.


39      Esta disposição estabelece que «[o] parecer emitido pela Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão apresentado pelo Conselho de Supervisão e a decisão adotada pelo Conselho do BCE nos termos do presente artigo devem ser fundamentados e notificados às partes».


40      Nos termos desta disposição, «[o] parecer da Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão submetido pelo Conselho de Supervisão e a nova decisão adotada pelo Conselho do BCE devem ser notificados às partes pelo Secretário do Conselho do BCE, incluindo a fundamentação pertinente».


41      Este termo não é utilizado pelos próprios textos legais.


42      Nos termos do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento de base «[d]epois de se pronunciar sobre a admissibilidade do pedido de revisão, a Comissão de Reexame emite um parecer dentro de um prazo adequado à urgência da questão, mas que não pode exceder dois meses a contar da receção do pedido, e remete o processo ao Conselho de Supervisão, para ser elaborado um novo projeto de decisão. O Conselho de Supervisão tem em conta o parecer da Comissão de Reexame e apresenta sem demora o novo projeto de decisão ao Conselho do BCE. O novo projeto de decisão revoga a decisão inicial, substitui essa decisão por outra de conteúdo idêntico, ou substitui a decisão inicial por uma decisão alterada. O novo projeto de decisão é considerado adotado, salvo se o Conselho do BCE formular objeções no prazo máximo de 10 dias úteis». (O sublinhado é meu).


43      V. artigo 16.o, n.o 5, da Decisão do Banco Central Europeu, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento.


44      V. n.o 127 do acórdão recorrido.


45      V. n.os 31, 32 e 128 do acórdão recorrido.


46      V. n.o 81 do acórdão recorrido.


47      Acórdão de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France (C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.o 67).


48      V. n.o 88 do acórdão recorrido.


49      V. n.o 111 do acórdão recorrido.


50      V. também n.os 8 e 9 da réplica do recorrente apresentada no Tribunal Geral.


51      O sublinhado é meu. V. também n.os 4, 10 e 76 da tréplica do BCE apresentada no Tribunal Geral.


52      V. n.o 14, supra.


53      V. n.o 16, supra.


54      E, de facto, foi especificamente referido no n.o 6.7 do parecer da Comissão de Reexame de 20 de novembro de 2014.


55      V. n.o 113, supra.