Language of document : ECLI:EU:C:2010:757

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

N. JÄÄSKINEN

apresentadas em 9 de Dezembro de 2010 (1)

Processo C‑324/09

L’Oréal SA

Lancôme parfums et beauté & Cie

Laboratoire Garnier & Cie

L’Oréal (UK) Limited

contra

eBay International AG

eBay Europe SARL

eBay (UK) Limited

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Reino Unido)]

«Sociedade de informação – Motor de busca – Publicidade a partir de palavras‑chave (‘Keyword advertising’) – Operador de sítio de comércio electrónico – Palavras‑chave que correspondem a marcas – Directiva 89/104/CEE (‘directiva sobre as marcas’) – Artigos 5.° e 7.° – Regulamento (CE) n.° 40/94 (‘regulamento da marca comunitária’) – Artigos 9.° e 13.° – Responsabilidade de um operador de sítio de comércio electrónico pela informação que armazena – Directiva 2000/31/CE (‘directiva sobre o comércio electrónico’) – Artigo 14.° – Obrigação dos Estados‑Membros de assegurar aos titulares de direitos a possibilidade de requerer medidas inibitórias contra intermediários prestadores de serviços utilizados por um terceiro para violar esses direitos – Directiva 2004/48/CE (‘directiva relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual’) – Artigo 11.° – Liberdade de expressão – Liberdade de comércio – Directiva 76/768/CEE (‘directiva dos produtos cosméticos’)»





I –    Introdução

1.        O litígio no processo principal opõe a L’Oréal SA e as suas filiais (a seguir «L’Oréal»), por um lado, e as três filiais da eBay Inc. (a seguir «eBay»), juntamente com certas pessoas singulares, por outro. Tem por objecto a colocação à venda de produtos, por estas pessoas, no sítio de comércio electrónico do eBay. Alegadamente a colocação à venda destes produtos viola direitos de propriedade intelectual da L’Oréal.

2.        O eBay, demandado no processo nacional, explora um sistema de comércio electrónico popular e sofisticado na Internet. Construiu um sistema que facilita consideravelmente a venda e compra na Internet por particulares, com um potente motor de busca, um sistema de pagamento seguro e extensa cobertura geográfica. Também concebeu mecanismos de controlo da conformidade para combater as vendas de produtos contrafeitos. Para atrair novos clientes para o seu sítio Internet, o eBay também comprou a prestadores de serviços remunerados de referenciamento na Internet (como o AdWords do Google) palavras‑chave, incluindo marcas prestigiadas. O uso de uma palavra‑chave seleccionada no motor de busca desencadeia a exibição de um anúncio publicitário e de um link patrocinado, que conduz directamente para o sítio de comércio electrónico do eBay.

3.        A L’Oréal, demandante no processo nacional, é uma sociedade mundial com uma gama muito vasta de produtos que gozam de protecção da marca, incluindo marcas prestigiadas com reputação mundial. A sua principal preocupação, no presente processo, é a venda no sítio de comércio electrónico do eBay de diversos produtos da L’Oréal contrafeitos. Para a L’Oréal, a situação é agravada pelo facto de alguns dos produtos não se destinarem a ser vendidos no Espaço Económico Europeu (a seguir «EEE»), mas virem aqui parar através das vendas do eBay. Alguns dos produtos cosméticos são vendidos sem a embalagem original. Segundo a L’Oréal, mediante a compra de palavras‑chave, o eBay atrai clientes para o seu sítio de comércio electrónico para adquirirem produtos da marca L’Oréal em violação dos seus direitos de marca. Para deter os vendedores individuais de uma forma eficaz, a L’Oréal pretende obter decisões judiciais contra o eBay para que as suas marcas tenham uma melhor protecção.

4.        Para o Tribunal de Justiça, o presente pedido de decisão prejudicial toca uma questão jurídica premente relacionada com a aplicação da protecção da marca no novo ambiente do comércio electrónico e dos serviços da sociedade da informação na Internet. O Tribunal de Justiça deverá encontrar o equilíbrio adequado entre a protecção dos interesses legítimos do titular do direito da marca, por um lado, e os das empresas e particulares que utilizam as novas oportunidades de mercado oferecidas pela Internet e pelo comércio electrónico. Algumas das questões podem ser respondidas com base na jurisprudência existente, outras exigem a interpretação de diversos diplomas legislativos da União Europeia (a seguir «UE»).

5.        O principal desafio do Tribunal de Justiça reside na dupla ponderação que é chamado a realizar. O Tribunal de Justiça deverá, não só, interpretar as disposições do direito da UE, neste cenário complexo, mas garantir simultaneamente que a interpretação dada aos instrumentos em questão permanecerá aplicável em cenários com diferentes parâmetros. As marcas em questão são prestigiadas e os produtos são produtos de luxo, mas as disposições aplicáveis do direito da UE aplicam‑se a todas as marcas e a todos os tipos de produtos. O sítio de comércio electrónico é mundial e possui muitas características específicas. Embora as respostas devam tomar em consideração as especificidades do processo submetido ao órgão jurisdicional nacional, devem, simultaneamente, basear‑se numa visão global do modo como este sistema deve funcionar em termos gerais. Na minha opinião, este processo é mais complicado, em muitos aspectos, do que o processo Google France e Google (2).

6.        No presente processo, o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar, designadamente, i) a situação jurídica ao abrigo do direito das marcas da UE, nos termos da Directiva 89/104 («directiva sobre as marcas») (3), do operador de um sítio de comércio electrónico que a) adquire palavras‑chave idênticas a marcas a prestadores de serviços remunerados de referenciamento na Internet, para que os resultados dos motores de busca exibam um link que conduz até ao sítio Internet do operador do sítio de comércio electrónico, e b) armazena no seu próprio sítio Internet, em nome dos seus clientes, ofertas para venda de produtos contrafeitos, desembalados, ou originários de países que não pertencem ao Espaço Económico Europeu (EEE); ii) a definição do âmbito de aplicação da isenção da responsabilidade dos prestadores de serviços da sociedade da informação, prevista no artigo 14.° da Directiva 2000/31 (a seguir «directiva sobre o comércio electrónico») (4); iii) a definição do âmbito de aplicação do direito de obter uma medida inibitória contra intermediários cujos serviços sejam utilizados por terceiros, previsto no artigo 11.° da Directiva 2004/48 («directiva relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual») (5) e iv) certas disposições da Directiva 76/768 («directiva dos produtos cosméticos») (6).

II – Quadro jurídico

A –    Direito da UE (7)


 Directiva 76/768

7.        O artigo 6.°, n.° 1, da Directiva 76/768 dos produtos cosméticos impõe aos Estados‑Membros que tomem todas as disposições necessárias para que os produtos cosméticos não possam ser colocados no mercado sem que o recipiente e a embalagem mencionem em caracteres indeléveis, facilmente legíveis e visíveis, as indicações especificadas nessa disposição. Estas incluem, designadamente, a) o nome e o endereço ou sede social do fabricante ou do responsável pela colocação no mercado do produto cosmético, estabelecido na Comunidade; b) o conteúdo nominal no momento do acondicionamento; c) a data de validade mínima; d) as precauções especiais de utilização; e) o número de lote de fabrico ou a referência que permita identificar o fabrico; f) a função do produto, salvo se esta for posta em evidência pela apresentação do produto; e g) uma lista de ingredientes.

 Directiva 89/104 (8)

8.        O artigo 5.° da Directiva 89/104 sobre as marcas, intitulado «Direitos conferidos pela marca» tem a seguinte redacção:

«1.      A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

a)      De qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

[…]

3.       Pode nomeadamente ser proibido, caso se encontrem preenchidas as condições enumeradas nos n.os 1 e 2:

[…]

b)      Oferecer os produtos para venda ou colocá‑los no mercado ou armazená‑los para esse fim, ou oferecer ou fornecer serviços sob o sinal;

c)      Importar ou exportar produtos com esse sinal;

d)      Utilizar o sinal nos documentos comerciais e na publicidade.

[…]»

9.        O artigo 6.°, n.° 1, da Directiva 89/104, intitulado «Limitação dos efeitos da marca», tem o seguinte teor:

«1.      O direito conferido pela marca não permite ao seu titular proibir a terceiros o uso, na vida comercial,

[…]

b)      De indicações relativas à espécie, à qualidade, à quantidade, ao destino, ao valor, à proveniência geográfica, à época de produção do produto ou da prestação do serviço ou a outras características dos produtos ou serviços;

c)      Da marca, sempre que tal seja necessário para indicar o destino de um produto ou serviço, nomeadamente sob a forma de acessórios ou peças sobressalentes,

desde que esse uso seja feito em conformidade com práticas honestas em matéria industrial ou comercial.»

10.      O artigo 7.° da Directiva 89/104, intitulado «Esgotamento dos direitos conferidos pela marca» refere:

«1.       O direito conferido pela marca não permite ao seu titular proibir o uso desta para produtos comercializados na [Espaço Económico Europeu (EEE)] sob essa marca pelo titular ou com o seu consentimento.

2.       O n.° 1 não é aplicável sempre que existam motivos legítimos que justifiquem que o titular se oponha à comercialização posterior dos produtos, nomeadamente sempre que o estado desses produtos seja modificado ou alterado após a sua colocação no mercado.»

 Directiva 2000/31

11.      O nono considerando da Directiva 2000/31 sobre o comércio electrónico tem a seguinte redacção:

«A livre circulação dos serviços da sociedade da informação pode em muitos casos constituir um reflexo específico, no direito comunitário, de um princípio mais geral, designadamente o da liberdade de expressão, consagrado no n.° 1 do artigo 10.° da Convenção para a protecção dos Direitos do Homem e das liberdades fundamentais, ratificada por todos os Estados‑Membros. Por esta razão, as directivas que cobrem a prestação de serviços da sociedade da informação devem assegurar que essa actividade possa ser empreendida livremente, à luz daquele preceito, apenas se subordinando às restrições fixadas no n.° 2 daquele artigo e no n.° 1 do artigo 46.° do Tratado. A presente directiva não tem por objectivo afectar as normas e princípios nacionais fundamentais respeitantes à liberdade de expressão.»

12.      Os considerandos 42, 43 e 45 a 48 da Directiva 2000/31 referem:

«(42) As isenções da responsabilidade estabelecidas na presente directiva abrangem exclusivamente os casos em que a actividade da sociedade da informação exercida pelo prestador de serviços se limita ao processo técnico de exploração e abertura do acesso a uma rede de comunicação na qual as informações prestadas por terceiros são transmitidas ou temporariamente armazenadas com o propósito exclusivo de tornar a transmissão mais eficaz. Tal actividade é puramente técnica, automática e de natureza passiva, o que implica que o prestador de serviços da sociedade da informação não tem conhecimento da informação transmitida ou armazenada, nem o controlo desta.

(43)      Um prestador pode beneficiar de isenções por simples transporte ou armazenagem temporária («caching») quando é inteiramente alheio à informação transmitida. Isso exige, designadamente, que o prestador não altere a informação que transmite. Esta exigência não se aplica ao manuseamento técnico que tem lugar no decurso da transmissão, uma vez que este não afecta a integridade da informação contida na transmissão.

[…]

(45)      A delimitação da responsabilidade dos prestadores intermediários de serviços, fixada na presente directiva, não afecta a possibilidade de medidas inibitórias de diversa natureza. Essas medidas podem consistir, designadamente, em decisões judiciais ou administrativas que exijam a prevenção ou a cessação de uma eventual infracção, incluindo a remoção de informações ilegais, ou tornando impossível o acesso a estas.

(46)      A fim de beneficiar de uma delimitação de responsabilidade, o prestador de um serviço da sociedade da informação, que consista na armazenagem de informação, a partir do momento em que tenha conhecimento efectivo da ilicitude, ou tenha sido alertado para esta, deve proceder com diligência no sentido de remover as informações ou impossibilitar o acesso a estas. A remoção ou impossibilitação de acesso têm de ser efectuadas respeitando o princípio da liberdade de expressão. A presente directiva não afecta a possibilidade de os Estados‑Membros fixarem requisitos específicos que tenham de ser cumpridos de forma expedita, previamente à remoção ou à impossibilitação de acesso à informação.

(47)      Os Estados‑Membros só estão impedidos de impor uma obrigação de vigilância obrigatória dos prestadores de serviços em relação a obrigações de natureza geral. Esse impedimento não diz respeito a obrigações de vigilância em casos específicos e, em especial, não afecta as decisões das autoridades nacionais nos termos das legislações nacionais.

(48)      A presente directiva não afecta a possibilidade de os Estados‑Membros exigirem dos prestadores de serviços, que acolham informações prestadas por destinatários dos seus serviços, que exerçam deveres de diligência que podem razoavelmente esperar‑se deles e que estejam especificados na legislação nacional, no sentido de detectarem e prevenirem determinados tipos de actividades ilegais.»

13.      O artigo 2.°, alínea a), da Directiva 2000/31 define «serviços da sociedade da informação», mediante remissão para o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas (9), como «qualquer serviço prestado normalmente mediante remuneração, à distância, por via electrónica e mediante pedido individual de um destinatário de serviços».

14.      O capítulo II da Directiva 2000/31 inclui uma secção 4, intitulada «Responsabilidade dos prestadores intermediários de serviços», constituída pelos artigos 12.° a 15.° (10).

15.      O artigo 14.° da Directiva 2000/31, intitulado «Armazenagem em servidor», prevê:

«1.      Em caso de prestação de um serviço da sociedade da informação que consista no armazenamento de informações prestadas por um destinatário do serviço, os Estados‑Membros velarão por que a responsabilidade do prestador do serviço não possa ser invocada no que respeita à informação armazenada a pedido de um destinatário do serviço, desde que:

a)      O prestador não tenha conhecimento efectivo da actividade ou informação ilegal e, no que se refere a uma acção de indemnização por perdas e danos, não tenha conhecimento de factos ou de circunstâncias que evidenciam a actividade ou informação ilegal, ou

b)      O prestador, a partir do momento em que tenha conhecimento da ilicitude, actue com diligência no sentido de retirar ou impossibilitar o acesso às informações.

2.      O n.° 1 não é aplicável nos casos em que o destinatário do serviço actue sob autoridade ou controlo do prestador.

3.      O disposto no presente artigo não afecta a faculdade de um tribunal ou autoridade administrativa, de acordo com os sistemas legais dos Estados‑Membros, exigir do prestador que previna ou ponha termo a uma infracção, nem afecta a faculdade de os Estados‑Membros estabelecerem disposições para a remoção ou impossibilitação do acesso à informação.»

16.      O artigo 15.° da Directiva 2000/31, intitulado «Ausência de obrigação geral de vigilância», prevê:

«1.      Os Estados‑Membros não imporão aos prestadores, para o fornecimento dos serviços mencionados nos artigos 12.°, 13.° e 14.°, uma obrigação geral de vigilância sobre as informações que estes transmitam ou armazenem, ou uma obrigação geral de procurar activamente factos ou circunstâncias que indiciem ilicitudes.

2.      Os Estados‑Membros podem estabelecer a obrigação, relativamente aos prestadores de serviços da sociedade da informação, de que informem prontamente as autoridades públicas competentes sobre as actividades empreendidas ou informações ilícitas prestadas pelos autores aos destinatários dos serviços por eles prestados, bem como a obrigação de comunicar às autoridades competentes, a pedido destas, informações que permitam a identificação dos destinatários dos serviços com quem possuam acordos de armazenagem.»

 Directiva 2004/48

17.      O considerando 23 da Directiva 2004/48 relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual refere:

«Sem prejuízo de outras medidas, procedimentos e recursos disponíveis, os titulares do direito deverão ter a possibilidade de requerer uma injunção contra um intermediário cujos serviços estejam a ser utilizados por terceiros para violar os direitos de propriedade industrial do titular. As condições e regras relativas a tais injunções ficarão a cargo da legislação nacional dos Estados‑Membros. No que diz respeito às violações de direitos de autor e direitos conexos, a Directiva 2001/29/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO L 167, p. 10)] já prevê um nível global de harmonização. Por conseguinte, o disposto no n.° 3 do artigo 8.° da Directiva 2001/29/CE não deve ser prejudicado pela presente directiva.»

18.      O artigo 3.° da Directiva 2004/48, intitulado «Obrigação geral», tem o seguinte teor:

«1.      Os Estados‑Membros devem estabelecer as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual abrangidos pela presente directiva. Essas medidas, procedimentos e recursos devem ser justos e equitativos, não devendo ser desnecessariamente complexos ou onerosos, comportar prazos que não sejam razoáveis ou implicar atrasos injustificados.

2.      As medidas, procedimentos e recursos também devem ser eficazes, proporcionados e dissuasivos e aplicados de forma a evitar que se criem obstáculos ao comércio lícito e a prever salvaguardas contra os abusos.»

19.      O capítulo II da Directiva 2004/48, intitulado «Medidas, procedimentos e recursos», contém uma secção 4, intitulada «Medidas provisórias e cautelares», constituída pelo artigo 9.°, com o mesmo título. Além disso, o mesmo capítulo também contém uma secção 5, intitulada «Medidas decorrentes da decisão de mérito», que inclui os artigos 10.°, 11.° e 12.°, respectivamente intitulados, «Medidas correctivas», «Medidas inibitórias» e «Medidas alternativas».

20.      O artigo 11.° da Directiva 2004/48 refere:

«Os Estados‑Membros devem garantir que, nos casos em que tenha sido tomada uma decisão judicial que constate uma violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais competentes possam impor ao infractor uma medida inibitória da continuação dessa violação. Quando esteja previsto na legislação nacional, o incumprimento de uma medida inibitória deve, se for caso disso, ficar sujeito à aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, destinada a assegurar a respectiva execução. Os Estados‑Membros devem garantir igualmente que os titulares dos direitos possam requerer uma medida inibitória contra intermediários cujos serviços sejam utilizados por terceiros para violar direitos de propriedade intelectual, sem prejuízo do n.° 3 do artigo 8.° da Directiva 2001/29/CE» (11).

III – Litígio no processo principal e questões prejudiciais

 L’Oréal

21.      A L’Oréal é uma fabricante e fornecedora de perfumes, produtos cosméticos e produtos para o cabelo. No Reino Unido, é titular de várias marcas nacionais. Também é titular de marcas comunitárias. Uma destas marcas comunitárias é uma marca figurativa que inclui as palavras «Amor Amor». As outras marcas em questão no processo principal são marcas nominativas ou marcas nominativas com uma estilização mínima. É pacífico que cada uma das marcas em questão goza de uma grande notoriedade no Reino Unido (12).

22.      A L’Oréal gere uma rede fechada de distribuição selectiva. A distribuição é, assim, controlada por meio de contratos de distribuição que proíbem aos distribuidores autorizados o fornecimento de produtos a distribuidores não autorizados.

 eBay

23.      O eBay explora um sítio de comércio electrónico onde são exibidos anúncios de bens colocados à venda por pessoas que criaram uma conta de vendedor no eBay. Os compradores licitam os produtos incluídos nos anúncios por estas pessoas. De acordo com a informação resumida no despacho de reenvio, no sítio Internet www.ebay.co.uk existe uma média de 16 milhões de anúncios.

24.      Os vendedores e os compradores têm de se registar como utilizadores, mediante a criação de um código de identificação de utilizador (13), e de aceitar os termos do acordo de utilização do eBay. O acordo não permite a venda de quaisquer artigos contrafeitos ou a violação de marcas. O acordo de utilização também impõe a observância das regras de funcionamento do eBay. Todos os vendedores do Reino Unido estão obrigados a aceitar o pagamento por PayPal, um mecanismo de pagamento seguro explorado pela PayPal (Europa) Sarl & Cie, que é actualmente uma filial da eBay Inc., uma instituição financeira luxemburguesa. O eBay cobra uma percentagem sobre as transacções realizadas no seu sítio de comércio electrónico.

25.      Um artigo é colocado à venda no eBay, por um certo período de tempo (geralmente 1, 3, 5, 7 ou 10 dias), durante o qual os utilizadores do eBay publicam licitações do artigo. As licitações são aceites com incrementos e quando o período de venda expira, o artigo é vendido a quem tiver oferecido mais. Além disso, através de uma técnica conhecida como «proxy bidding» [licitação com agente], os potenciais compradores podem fixar o preço mais elevado que estão dispostos a pagar e instruir o sítio Internet do eBay para licitar automaticamente com incrementos até esse limite.

26.      O eBay também permite a venda de artigos sem leilão e, portanto, a um preço fixo (o sistema «buy it now»). Além disso, os vendedores podem criar «lojas online» no sítio Internet, apresentando todos os artigos que têm para venda, num determinado momento, e assim funcionar como lojas virtuais no sítio Internet do eBay. O eBay concede aos vendedores com mais sucesso o estatuto «Power Seller» quando estes atingem e mantêm um historial de desempenho excelente nas vendas e cumprem as regras de funcionamento do eBay. Existem cinco níveis de «PowerSeller», do bronze ao titânio, consoante os volumes de vendas do vendedor.

27.      O eBay disponibiliza aos vendedores assistência exaustiva, mediante a classificação e descrição dos artigos que estes colocam à venda, a criação das suas próprias lojas em linha e a promoção e aumento das vendas. Assim, o eBay organiza a venda, dirige o leilão (incluindo a realização das proxy bids), proporciona um serviço de alerta para a notificação aos membros dos artigos em que estes estão interessados e promove e publicita produtos através de sítios Internet de terceiros.

28.      A L’Oréal e o eBay admitem que este último não actua como agente ao serviço dos vendedores dos produtos e não tem, de forma alguma, a posse dos produtos.

29.      Também é pacífico que o eBay utiliza um grande número de filtros de software para procurar anúncios que possam violar as suas regras de funcionamento. Quando um anúncio é assinalado por um dos filtros de software como violando potencialmente uma regra de funcionamento, é examinado por um representante dos serviços de apoio ao cliente do eBay. Todos os meses, dezenas de milhares de anúncios são removidos em consequência da filtragem ou de denúncias.

30.      O eBay também opera um programa de verificação dos direitos do titular («Verified Rights Owner», a seguir «VeRO»), que é um sistema de notificação e de remoção destinado a ajudar os titulares de direitos de propriedade intelectual a retirar do sítio Internet anúncios em infracção. Para participar no programa VeRO, os titulares de direitos devem completar e apresentar um formulário relativo aos anúncios que consideram que infringem os seus direitos. Devem identificar cada anúncio denunciado por número de artigo e, em cada caso, identificar o motivo da objecção ao anúncio através de um «código de motivo». Existem 16 códigos de motivos que identificam diferentes tipos de violação. Quando um anúncio é removido, o eBay restitui todos os pagamentos efectuados pelo vendedor. De acordo com a informação contida no despacho de reenvio, participam no programa VeRO mais de 18 000 titulares de direitos. A L’Oréal não aderiu ao programa uma vez que o considera inadequado.

31.      Sempre que o eBay Europe recebe uma notificação do programa VeRO, esta é examinada por um representante dos serviços de apoio ao cliente. Se este considera que o anúncio denunciado viola os direitos do denunciante, remove o anúncio sem mais verificações. Se necessário, o representante consulta um especialista da sua equipa. Se o especialista considerar necessário, é consultado um advogado interno. Em 2007, cerca de 90% dos anúncios denunciados através do programa VeRO foram removidos no prazo de 6 a 12 horas e cerca de 98% foram removidos no prazo de 24 horas.

32.      Perante o órgão jurisdicional nacional, o eBay salientou que era difícil decidir sobre as alegações de violação apresentadas pelos titulares de direitos. O eBay parte do princípio de que tais alegações são fundadas, salvo se a falta de fundamentação for óbvia.

33.      Além disso, o eBay aplica aos utilizadores que violem as suas regras de funcionamento vários tipos de sanções, que incluem a remoção do anúncio e a suspensão permanente ou temporária do vendedor. Em todo o mundo, o eBay suspende anualmente cerca de 2 milhões de utilizadores, incluindo cerca de 50 000 no âmbito do programa VeRO. Aos utilizadores que vendem as mais de 500 marcas classificadas pelo eBay como «marcas de alto risco» é aplicado um maior nível de controlo.

 O litígio

34.      Em 22 de Maio de 2007, a L’Oréal enviou ao eBay uma carta, notificando‑o das suas preocupações relativamente à venda generalizada, nos sítios Internet europeus do eBay, de produtos em infracção e solicitando‑lhe a adopção de medidas para resolver esta situação. A L’Oréal não ficou satisfeita com a resposta do eBay e deduziu diversas acções, incluindo a acção intentada na High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (a seguir «High Court»). O órgão jurisdicional de reenvio refere que as alegadas infracções tiveram lugar no período compreendido entre Novembro de 2006 e Abril de 2008 e que as actividades do eBay sofreram alterações ao longo do período a que se refere o presente processo.

35.      Concretamente, a acção intentada na High Court pela L’Oréal destina‑se a obter a declaração de que determinados indivíduos violaram pelo menos uma das suas marcas, enquanto utilizadores do sítio Internet de comércio electrónico do eBay, ao utilizarem sinais idênticos às marcas para produtos idênticos àqueles para os quais as marcas estão registadas.

36.      Na acção, a L’Oréal alega que o eBay é solidariamente responsável pelas violações. Também alega que o eBay é responsável a título principal pelo uso, para os produtos em infracção, das marcas Link no seu sítio Internet e em links patrocinados em motores de busca de terceiros (14). Esse link publicitário, acompanhado de uma curta mensagem comercial, constitui um anúncio publicitário («ad») (15). Quanto aos links patrocinados, é ponto assente que o eBay adquiriu palavras‑chave que consistem nas marcas Link, a fim de activar links, em motores de busca de terceiros como o Google, o MSN e o Yahoo, para o seu próprio sítio Internet.

37.      Assim, em 27 de Março de 2007, quando um argonauta introduziu as palavras «shu uemura», como frase de busca, no motor de busca Google, apareceu o seguinte anúncio publicitário do eBay como link patrocinado:

«Shu Uemura

Excelentes oportunidades de produtos Shu uemura

Compre no eBay e poupe!

www.ebay.co.uk»

38.      Clicando neste link publicitário, abria‑se uma página do sítio Internet do eBay que mostrava uma busca de «shu uemura» em «todas as categorias» com o resultado «96 artigos encontrados para shu uemura».

39.      A L’Oréal alegou que a maior parte destes artigos eram produtos em infracção (16), expressamente declarados «provenientes de Hong Kong» ou (num caso) «provenientes dos EUA».

40.      A principal acusação feita ao eBay é, portanto, o facto de este, ao utilizar as marcas da L’Oréal, dirigir os seus utilizadores para produtos em infracção. Além disso, em consequência da sua participação estreita nas actividades de pré‑venda que antecedem o anúncio, na promoção dos bens nos seus sites, e nos processos de venda e pós‑venda, o eBay está seriamente envolvido nas infracções cometidas pelos vendedores individuais.

41.      A L’Oréal alegou ainda que, mesmo que o eBay não seja ele próprio responsável por violações da marca, deverá ser emitida uma medida inibitória contra o mesmo, nos termos do artigo 11.° da Directiva 2004/48.

42.      Actualmente, a L’Oréal já não tem nenhuma acção interposta contra os vendedores individuais: o litígio nacional apenas opõe presentemente a L’Oreál e o eBay (17).

43.      Por acórdão de 22 de Maio de 2009, a High Court decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais (a seguir «acórdão de 22 de Maio de 2009»). O pedido de decisão prejudicial foi proferido pela High Court em 16 de Julho de 2009 (a seguir «despacho de 16 de Julho de 2009»).

44.      Segundo a High Court, o eBay podia ter feito mais para reduzir as vendas de produtos contrafeitos no seu sítio Internet (18). Não obstante, a High Court salienta que o facto de o eBay poder fazer mais não significa necessariamente que esteja legalmente obrigado a fazê‑lo.

 As questões prejudiciais

45.      As questões prejudiciais submetidas pela High Court no despacho de 16 de Julho de 2009 são as seguintes:

«1)      Sempre que testers (i.e. amostras para demonstração dos produtos nos pontos de venda) de perfumes e de produtos cosméticos e frascos doseadores (i.e. recipientes dos quais se pode retirar pequenas porções para fornecer aos consumidores como amostras gratuitas), que não se destinam a ser vendidos aos consumidores (e contêm frequentemente a indicação ‘não destinado a venda’ ou ‘não destinado a venda ao público’), sejam fornecidos gratuitamente aos distribuidores autorizados do titular de uma determinada marca pode considerar‑se que tais produtos são ‘comercializados’ na acepção do artigo 7.°, n.° 1, da [Directiva 89/104] e do artigo 13.°, n.° 1, do [Regulamento (CE) n.° 40/94]?

2)      Sempre que as caixas (ou outras embalagens exteriores) de perfumes e de produtos cosméticos tenham sido removidas sem o consentimento do titular da marca, tal constitui um ‘motiv[o] legítim[o]’ que justifica que o titular da marca se oponha à comercialização posterior dos produtos desembalados, na acepção do artigo 7.°, n.° 2, da [Directiva 89/104] e do artigo 13.°, n.° 2, do [Regulamento (CE) n.° 40/94]?

3)      A resposta à segunda questão supra será diferente se:

a)      em consequência da remoção das caixas (ou outras embalagens exteriores), os produtos desembalados não ostentem a informação exigida pelo artigo 6.°, n.° 1, da [Directiva 76/768], em especial, se não ostentarem a lista dos ingredientes ou a indicação ‘consumir de preferência até’?

b)      em consequência da falta dessa informação, a oferta de venda ou a venda dos produtos desembalados constituem um ilícito criminal nos termos da legislação do Estado‑Membro da Comunidade no qual são colocados à venda ou vendidos por terceiros?

4)      A resposta à segunda questão supra será diferente se a comercialização posterior prejudicar, ou for susceptível de prejudicar, a imagem dos produtos e, consequentemente, a reputação da marca? Se assim for, tal consequência pode ser presumida ou o titular da marca terá de fazer obrigatoriamente a respectiva prova?

5)      Sempre que um comerciante que explora um mercado em linha adquira junto de um operador de um motor de busca o uso de um sinal, como palavra‑chave, que é idêntico a uma marca registada, de forma que o sinal é exibido aos utilizadores pelo motor de busca num link patrocinado que conduz até ao sítio Internet do operador do sítio de comércio electrónico a exibição do sinal no link patrocinado constitui um ‘uso’ do sinal na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da [Directiva 89/104] e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do [Regulamento (CE) n.° 40/94]?

6)      Sempre que o link patrocinado mencionado na quinta questão supra conduza directamente o utilizador até anúncios publicitários ou ofertas para venda de produtos idênticos àqueles para os quais a marca está registada ostentando sob o sinal colocado no sítio Internet por terceiros, alguns dos quais violam a marca enquanto outros não a violam [devido aos] diferentes estatutos dos respectivos produtos, tal constitui um uso do sinal por parte do comerciante que explora o mercado em linha ‘para’ os produtos em infracção, na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da [Directiva 89/104] e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do [Regulamento (CE) n.° 40/94]?

7)      Sempre que entre os produtos anunciados e colocados à venda no sítio Internet mencionado na sexta questão supra se incluam produtos que não tenham sido comercializados no EEE pelo titular da marca, ou com o consentimento deste, é suficiente, para que tal uso esteja abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da [Directiva 89/104] e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do [Regulamento (CE) n.° 40/94], e não pelo âmbito de aplicação do artigo 7.°, n.° 1, da [Directiva 89/104] e do artigo 13.°, n.° 1, do [Regulamento (CE) n.° 40/94], que o anúncio publicitário ou a oferta de venda sejam dirigidos a consumidores no território coberto pela marca ou terá o titular da marca de demonstrar que o anúncio publicitário ou a oferta de venda implicam, necessariamente, a comercialização dos produtos em causa no território coberto pela marca?

8)      A resposta à quinta a sétima questões supra será diferente se o uso impugnado pelo titular da marca consistir na exibição do sinal no próprio sítio Internet do comerciante que explora o mercado em linha e não num link patrocinado?

9)      Se, para que tal uso esteja abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da [Directiva 89/104] e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do [Regulamento (CE) n.° 40/94], e não pelo âmbito de aplicação do artigo 7.°, n.° 1, da [Directiva 89/104] e do artigo 13.°, n.° 1, do [Regulamento (CE) n.° 40/94], for suficiente que o anúncio publicitário ou a oferta de venda sejam dirigidos a consumidores no território coberto pela marca:

a)      tal uso inclui ou consiste no ‘armazenamento de informações prestadas por um destinatário do serviço’, na acepção do artigo 14.°, n.° 1, da [Directiva 2000/31]?

b)      se o uso não consistir, exclusivamente, em actividades abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 14.°, n.° 1, da [Directiva 2000/31], mas inclui[r] tais actividades, estará o comerciante que explora o mercado em linha isento de responsabilidade na medida em que o uso consista em tais actividades e, se assim for, poderá haver lugar ao pagamento de uma indemnização por perdas e danos ou a outras compensações financeiras em consequência de tal uso na medida em que não esteja isento de responsabilidade?

c)      quando o comerciante que explora o mercado em linha tenha conhecimento de que, no seu sítio Internet, foram anunciados, colocados à venda e vendidos produtos em violação de marcas registadas, e de que é provável que a violação de tais marcas registadas continue a ocorrer através da publicidade, da colocação à venda e da venda dos mesmos produtos, ou de produtos semelhantes, pelos mesmos ou por outros utilizadores do sítio Internet, tal constitui ‘conhecimento’ na acepção do artigo 14.°, n.° 1, da [Directiva 2000/31]?

10)      Sempre que os serviços de um intermediário, como um [operador] de um sítio Internet, tenham sido utilizados por um terceiro para violar uma marca registada, o artigo 11.° da [Directiva 2004/48] exige que os Estados‑Membros assegurem que o titular da marca pode obter uma medida inibitória da continuação da violação da referida marca, contra o intermediário, em oposição à continuação daquele acto de violação específico e, se assim for, qual o alcance da medida inibitória que deve ser assegurada?»

IV – Observações preliminares

A –    Questões políticas em causa

46.      Recordo que a recente jurisprudência do Tribunal de Justiça (19) reforçou a protecção das marcas, sobretudo das que gozam de prestígio, e tomou em consideração não só a função essencial da marca de indicar a origem comercial de produtos e serviços, mas também as outras funções das marcas, como as funções de qualidade, de investimento e de publicidade (20). Estas outras funções são relevantes na vida comercial contemporânea, em que as marcas adquirem, muitas vezes, um valor económico independente pelo facto de serem utilizadas para comunicar mensagens mais vastas do que a simples origem dos produtos ou serviços. Na minha opinião, estes desenvolvimentos foram tidos em conta para que o direito das marcas da UE possa desempenhar uma função útil.

47.      No entanto, não se pode esquecer que, embora uma marca, ao contrário de um direito de autor ou de uma patente (21), ofereça apenas uma protecção relativa, esta protecção é oferecida por um período de tempo ilimitado, enquanto a marca for usada e o seu registo for mantido. A protecção da marca só se aplica ao uso de um sinal como marca na vida comercial e só abrange os usos relevantes para as diversas funções das marcas. Além disso, a protecção é normalmente limitada a produtos idênticos ou semelhantes, salvo se a marca gozar de prestígio. Acresce que a protecção está sujeita a limitações jurídicas, esgota‑se quando o titular da marca realizou o valor económico inerente à marca em relação aos produtos, e é territorialmente limitada.

48.      As limitações e restrições acima mencionadas são necessárias para garantir a liberdade de comércio e a concorrência (22), que pressupõem que os sinais distintivos e as expressões linguísticas estejam à disposição das empresas para a rotulagem dos produtos e serviços, que os titulares das marcas não possam impedir o uso comercial e não comercial legítimo dos sinais protegidos e que a liberdade de expressão não seja indevidamente limitada (23).

49.      Não se pode esquecer que os anúncios introduzidos pelos utilizadores no sítio de comércio electrónico do eBay são comunicações protegidas pelos direitos fundamentais de liberdade de expressão e informação previstos no artigo 11.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e no artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (24).

50.      Os sítios de comércio electrónico como o eBay criaram oportunidades sem precedentes, para as empresas e para os particulares, de realizar transacções comerciais directas uns com os outros, com riscos reduzidos em termos de entrega e pagamento. O processo principal, assim como litígios semelhantes noutros Estados‑Membros e em ordens jurídicas de países terceiros, mostra que estas oportunidades podem ser utilizadas de forma abusiva (25) e dar origem a violações dos direitos de autor e das marcas (26). Por conseguinte, é legítimo assegurar a protecção jurídica efectiva aos titulares de direitos de propriedade intelectual, também nestes novos ambientes. Não obstante, tal protecção não pode violar os direitos dos utilizadores e prestadores destes serviços.

51.      No âmbito da protecção da marca, refira‑se que as marcas não são protegidas nas transacções não comerciais. Além isso, o titular do direito da marca não se pode opor a transacções e práticas que não tenham um efeito prejudicial nas funções das marcas, como o uso puramente descritivo da marca ou o seu uso na publicidade comparativa lícita.

52.      O mesmo se aplica em relação às actividades no contexto do uso legítimo definido no artigo 6.° da Directiva 89/104 ou em relação aos produtos cuja protecção da marca se esgotou nos termos do artigo 7.° da referida directiva. Um tal uso legítimo também pode respeitar a produtos cosméticos de luxo, como os da L’Oréal. Por exemplo, é concebível que um marido pretenda vender um boião dispendioso de creme de maquilhagem, que comprou para oferecer à esposa no Natal, depois de esta lhe ter revelado que é alérgica a alguns dos ingredientes. Um comerciante pode ter adquirido um stock de perfumes de marca protegida da massa insolvente de um lojista que fora membro da rede de distribuição selectiva do titular do direito da marca, e pretender vendê‑lo utilizando os serviços de um sítio de comércio electrónico (27). Portanto, são possíveis transacções em segunda‑mão e ofertas de produtos cosméticos, apesar de estas serem mais raras do que no caso dos produtos domésticos duradouros, veículos, barcos ou artigos de design. Em todo o caso, as respostas a dar a este pedido de decisão prejudicial não poderão limitar os usos legais de um sinal em relação a quaisquer categorias de produtos aos quais o titular de uma marca não se possa legitimamente opor.

53.      Também é importante observar que a Directiva 2000/31 tem por objectivo promover a prestação de serviços da sociedade da informação e o comércio electrónico, conforme precisado no seu preâmbulo. As limitações da responsabilidade previstas nos artigos 12.°, 13.° e 14.° da referida directiva destinam‑se a permitir a prestação de serviços da sociedade da informação, sem o risco de responsabilidade jurídica que o prestador de serviços não pode, de antemão, evitar, sem perder a viabilidade económica e técnica do modelo de empresa. Portanto, ao procurar o equilíbrio entre os direitos dos titulares de marcas e as obrigações dos prestadores de serviços da sociedade da informação, como o eBay, é necessário definir a actuação que se pode legitimamente esperar de um prestador de serviços a fim de prevenir as violações do direito das marcas por terceiros.

B –    Responsabilidade primária e secundária pelas violações da marca

54.      Uma das questões que se coloca no caso em apreço é a de saber se o eBay pode ser responsabilizado a título principal pelas violações das marcas da L’Oreal devido ao facto de os produtos em infracção serem vendidos através do seu sítio de comércio electrónico. Tal responsabilidade a título principal pode consistir na responsabilidade do eBay pelas suas próprias infracções ou coincidir com a responsabilidade dos vendedores pelas infracções de que estes são responsáveis. Neste último caso, a mesma situação de facto poderá dar origem a duas infracções interligadas, mas independentes (28). Assim, suscita‑se a questão de saber se o próprio eBay violou as marcas da L’Oréal. Tal responsabilidade depende da interpretação e aplicação do direito harmonizado da UE sobre as marcas, mais precisamente dos artigos 5.°, 6.° e 7.° da Directiva 89/104 e das correspondentes disposições do Regulamento (CE) n.° 40/94.

55.      Este processo também se refere a algo que denominaremos «responsabilidade secundária»: trata‑se da eventual responsabilidade do prestador de um serviço da sociedade da informação pelas violações praticadas pelos utilizadores do serviço (29). Como observa com razão a High Court, este tipo de responsabilidade pelas violações alheias da marca não está harmonizada na legislação sobre marcas da UE, mas constitui uma questão de direito nacional. Não existe nenhuma disposição de direito da UE que imponha às empresas a obrigação de impedir as violações da marca por terceiros ou de estas se absterem de actos ou práticas que possam contribuir para ou facilitar tais violações (30). Todavia, a harmonização parcial de tal responsabilidade ou, mais precisamente, das condições em que não existe, está prevista nos artigos 12.°, 13.° e 14.° da Directiva 2000/31. Além disso, o direito da UE exige a disponibilização de medidas inibitórias contra intermediários cujos serviços sejam utilizados por terceiros para violar um direito de propriedade intelectual.

56.      Daí resulta que questões como a contributory infringement (contribuição para a violação da marca) ou a vicarious infringement (violação por facto alheio), discutidas na doutrina dos Estados Unidos da América, permaneçam fora do âmbito do presente processo prejudicial. O mesmo se aplica às construções semelhantes de outros sistemas jurídicos, como a joint tortfeasorship (responsabilidade solidária por factos ilícitos) da Common Law ou a denominada Störerhaftung na Alemanha (31).

57.      Na doutrina e jurisprudência dos EUA, a situação dos sítios de comércio electrónico é, muitas vezes, analisada utilizando uma analogia com os princípios que regulam as «feiras da ladra» ou as «vendas de garagem» (32). Embora tais analogias possam ser ilustrativas, o método mais frutuoso, no contexto do direito da UE, é a interpretação útil dos instrumentos legislativos pertinentes e a aplicação de princípios estabelecidos na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

58.      Talvez seja importante observar que nos processos judiciais nacionais relativos à responsabilidade do eBay ou de sítios de comércio electrónico semelhantes, não existe, tanto quanto sei, uma única decisão em que o operador de um sítio de comércio electrónico tenha sido declarado responsável, a título principal, pela violação das marcas de um terceiro. Segundo alguns autores, há decisões sobre responsabilidade secundária de alguns tribunais franceses e dos EUA que declaram o sítio de comércio electrónico responsável, enquanto outros tribunais franceses e dos EUA, assim como tribunais belgas e alemães negaram a existência de tal responsabilidade. No entanto, na jurisprudência alemã, os sítios de comércio electrónico foram objecto de medidas inibitórias destinadas a impedir novas violações da marca por terceiros com base na denominada Störerhaftung, não obstante os tribunais se terem recusado a atribuir a responsabilidade civil aos sítios de comércio electrónico (33).

C –    A protecção da identidade da marca e as palavras‑chave num serviço de referenciamento na Internet

59.      A High Court resume os problemas subjacentes às questões prejudiciais em quatro grupos: os problemas relativos à natureza dos produtos em infracção vendidos pelas demandadas; à existência de responsabilidade solidária (34) ou a título principal do eBay; à disponibilidade de uma defesa para o eBay, ao abrigo do artigo 14.° da Directiva 2000/31; e à existência de uma medida a favor da L’Oréal nos termos do artigo 11.° da Directiva 2004/48. Os produtos em infracção podem ser divididos em quatro grupos: produtos contrafeitos, produtos provenientes de países que não pertencem ao EEE, testers e frascos doseadores e produtos desembalados.

60.      O pedido de decisão prejudicial baseia‑se na presunção de que a disposição aplicável do direito das marcas da UE é o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104. Esta disposição regula a denominada protecção da identidade ou do uso de um sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada. Nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, esta protecção exige a identidade absoluta entre o sinal e a marca e é excluída mesmo que as diferenças entre estes sejam mínimas ou insignificantes (35).

61.      Uma palavra‑chave de um motor de busca é um conjunto de sinais, na maior parte dos casos constituídos por letras. Uma palavra‑chave é frequentemente insensível às maiúsculas ou minúsculas, mas pode ser definida como sensível a estas. Resulta do pedido de decisão prejudicial que algumas das marcas em causa são marcas nominativas com uma estilização mínima, e que uma é uma marca figurativa incluindo as palavras AMOR AMOR em letras maiúsculas manuscritas (36).

62.      A aplicação estrita do acórdão LTJ Diffusion excluiria a identidade entre a marca e a palavra‑chave e conduziria à aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104 respeitante a marcas semelhantes. Isto implicaria a aplicação do critério do «risco de confusão» previsto nesse artigo. Enquanto tal, o risco de confusão é manifesto entre marcas nominativas com uma estilização mínima ou marcas figurativas em que o elemento nominativo é dominante, por um lado, e as palavras‑chave por outro. Assim, considero que não é útil, nem necessário, alargar o debate para além das questões relacionadas com a protecção da identidade.

63.      Existem seis condições que resultam do texto da Directiva 89/104 e da jurisprudência relevante. O titular de uma marca registada só pode invocar o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 se forem satisfeitas as seguintes condições (37): 1) deve haver o uso de um sinal por um terceiro; 2) o uso deve fazer‑se na vida comercial (38); 3) o uso deve fazer‑se sem o consentimento do titular do direito da marca; 4) o sinal deve ser idêntico à marca; 5) o uso do sinal deve ser para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada; e 6) o uso do sinal deve afectar ou ser susceptível de afectar algumas das funções da marca (39).

V –    Testers e frascos doseadores

64.      Debruçar‑me‑ei, em seguida, sobre as questões prejudiciais.

65.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se os testers de perfumes e de produtos cosméticos e os frascos doseadores, que não se destinam a ser vendidos aos consumidores e que são fornecidos gratuitamente aos distribuidores autorizados, são produtos «comercializados» na acepção do artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 89/104 e do artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 40/94.

66.      O Tribunal de Justiça analisou recentemente uma questão semelhante no acórdão Coty Prestige Lancaster Group (40). O Tribunal de Justiça decidiu que em circunstâncias «em que são fornecidos «perfumes para teste» aos intermediários vinculados contratualmente ao titular da marca, para que os seus clientes possam testar esses perfumes, sem transmissão do direito de propriedade e com proibição da respectiva venda, em que o titular da marca pode, a todo o momento, exigir que essa mercadoria lhe seja devolvida e em que a apresentação desta se distingue claramente da dos frascos de perfume habitualmente postos à disposição dos referidos intermediários pelo titular da marca, o facto de esses produtos para teste serem frascos de perfume que ostentam as menções «demonstração» e «venda proibida» opõe‑se a que o consentimento do titular da marca à sua comercialização seja reconhecido tacitamente, na falta de elementos de prova em sentido contrário, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar» (41).

67.      A High Court refere na sua primeira questão prejudicial que os testers e os frascos doseadores não se destinam a ser vendidos e contêm frequentemente a indicação «não destinado a venda» ou «não destinado a venda ao público». São fornecidos sem custos aos distribuidores autorizados do titular do direito da marca. Na minha opinião, a formulação da questão implica grosso modo a existência dos elementos que o Tribunal de Justiça considerou decisivos no acórdão Coty Prestige Lancaster Group no sentido da exclusão do consentimento implícito do titular do direito da marca para a colocação no mercado dos testers e dos frascos doseadores. Portanto, pode‑se afirmar que, nessas circunstâncias, os produtos não são comercializados.

VI – Efeitos da remoção das caixas de produtos cosméticos

68.      A questão da venda de produtos de marca sem a respectiva embalagem original, no contexto de artigo 7.° da Directiva 89/104, não foi ainda, tanto quanto sei, directamente abordada pelo Tribunal de Justiça. Não obstante, penso que as respostas à segunda, terceira e quarta questões relativas a esta matéria podem ser inferidas da jurisprudência existente.

69.      No acórdão Boehringer Ingelheim e o., o Tribunal de Justiça interpretou o artigo 7.°, n.° 2, da Directiva 89/104 no sentido de que o titular da marca pode legitimamente opor‑se à comercialização posterior de um produto farmacêutico, quando o importador paralelo tiver reembalado o produto, nesta apondo de novo a marca, ou aplicado um rótulo na embalagem que contém o produto, salvo quando estejam preenchidas cinco condições, entre as quais a que impõe que a apresentação do produto reacondicionado não seja susceptível de prejudicar a reputação da marca e a do seu titular. Um produto farmacêutico reacondicionado poderá ser apresentado de forma inadequada e, portanto, prejudicar a reputação da marca, nomeadamente, quando a embalagem ou o rótulo, apesar de não serem defeituosos, de má qualidade ou pouco cuidados, sejam de natureza a afectar o valor da marca, prejudicando a imagem de seriedade e de qualidade inerente a tal produto e a confiança que ele é susceptível de inspirar no público em causa (42).

70.      Sempre que o estado dos produtos que ostentam a marca seja modificado ou alterado após a sua colocação no mercado, o titular do direito da marca tem um motivo legítimo para se opor à comercialização posterior desse produto na acepção do artigo 7.°, n.° 2, da Directiva 89/104. A avaliação da afectação do estado originário do produto centra‑se normalmente no estado do produto contido na embalagem (43).

71.      Contudo, no caso de produtos como os cosméticos de luxo, não se pode excluir, a meu ver, que a embalagem exterior dos produtos, devido ao seu design específico, que inclui o uso da marca, possa por vezes ser considerada uma parte do estado do produto. Nesses casos, o titular da marca pode opor‑se à comercialização de produtos desembalados (44).

72.      Devo acrescentar que não concordo com a análise da Comissão, segundo a qual a remoção – sem o consentimento do titular do direito da marca – das caixas ou de outras embalagens exteriores de produtos como perfumes e produtos cosméticos constitui sempre um motivo legítimo para o titular do direito da marca se opor à comercialização posterior dos produtos na acepção do artigo 7.°, n.° 2, da Directiva 89/104.

73.      Em primeiro lugar, recorde‑se que, nos termos do artigo 7.° da Directiva 89/104, o esgotamento é a regra principal. Consequentemente, a possibilidade de o titular do direito da marca se opor à comercialização posterior dos seus produtos depois de já ter realizado o valor económico inerente à marca em relação a esses produtos deve ser interpretada restritivamente.

74.      Em segundo lugar, não se pode excluir que a remoção da embalagem exterior, mesmo de produtos cosméticos, não comprometa as funções da marca, que consistem em indicar a origem e a qualidade dos produtos, nem prejudique a sua reputação. Isto poderá ser assim, por exemplo, no caso dos produtos cosméticos menos dispendiosos.

75.      Logo, a existência de motivos legítimos para o titular do direito da marca se opor à remoção posterior da embalagem terá de ser analisada caso a caso. A este respeito, a High Court apresentou dois cenários, o dos produtos desembalados sem a informação exigida pela Directiva 76/768 dos produtos cosméticos, e o caso em que a falta dessa informação constitua um crime no Estado‑Membro onde os produtos forem colocados à venda ou vendidos (45).

76.      Na minha opinião, a exigência de observância da directiva dos produtos cosméticos ou, de facto, de qualquer outra medida da UE relacionada com a segurança do produto ou a protecção do consumidor é inerente à protecção da reputação da marca. A reputação de um produto cosmético poderia ser prejudicada, por exemplo, pela ocorrência de reacções alérgicas graves num grupo de consumidores em virtude da omissão da lista de ingredientes. Todavia, a questão de saber se a venda dos produtos cosméticos desembalados é ou não criminalizada no direito nacional é irrelevante para esse efeito. O que pode prejudicar a reputação da marca é a falta de informação pertinente do consumidor, exigida pelas normas europeias harmonizadas, e não as consequências previstas para os comerciantes, nesses casos, pela legislação nacional dos Estados‑Membros.

77.      Portanto, mesmo que o direito das marcas não proteja, em si mesmo, os objectivos da Directiva 76/768 enquanto tais, a comercialização posterior de produtos protegidos por marca que não cumpram essa directiva pode, enquanto tal, conforme salientado com razão pela advogada‑geral C. Stix‑Hackl (46), causar um prejuízo substancial à reputação da marca e, assim, constituir um motivo válido para o titular se opor.

78.      Por último, no âmbito da quarta questão, a High Court pretende saber se a consequência de uma comercialização posterior dos produtos cosméticos desembalados que prejudica de uma forma efectiva ou potencial a imagem dos produtos e, consequentemente, a reputação da marca, pode ser presumida ou se o titular da marca terá de fazer obrigatoriamente a respectiva prova.

79.      Para responder a esta questão, impõe‑se uma observação marginal. É bem sabido que, como a protecção das marcas só diz respeito ao uso dos sinais na vida comercial, os actos privados de venda ou compra de produtos protegidos pela marca permanecem fora do âmbito de aplicação do direito das marcas (47).

80.      A embalagem original pode ser essencial para proteger as funções de indicação da origem e de qualidade da marca que cobre produtos cosméticos. Recordo que o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 se refere à protecção da identidade ou à protecção «absoluta» do titular contra o uso não autorizado do mesmo sinal para os mesmos produtos (sem necessidade de provar o risco de confusão entre os produtos) (48). Mesmo que, normalmente, incumba ao titular do direito da marca demonstrar a existência dos elementos que implicam a violação da marca por um terceiro, penso que, no caso do uso da mesma marca para os mesmos produtos sem o consentimento do titular do direito da marca, é o utilizador quem tem de demonstrar a legalidade do seu uso do sinal, incluindo a inocuidade do uso para a reputação da marca.

81.      Por conseguinte, entendo que se pode presumir que o efeito de uma comercialização posterior prejudica de uma forma efectiva ou potencial a imagem dos produtos e, consequentemente, a reputação da marca, em todos os casos em que as ofertas para venda ou as transacções de venda respeitantes a produtos cosméticos sem as respectivas embalagens originais ocorrerem na vida comercial, conforme definido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. Daqui resulta que o titular do direito da marca não tem de fazer a prova desse efeito, pertencendo o ónus da prova em contrário ao vendedor (49).

82.      Tenho dificuldades em conceber que uma venda, num sítio de comércio electrónico, de produtos cosméticos em quantidades superiores a um ou dois artigos, se possa realizar sem ter em vista o benefício económico e num contexto que não seja o de uma actividade comercial, ainda que de pequena escala.

VII – Serviço remunerado de referenciamento na Internet e operador de um sítio de comércio electrónico

A –    Introdução

83.      Ao contrário da primeira e quarta questões que se referem a «puras» questões sobre marcas, a quinta à décima questões exigem o alargamento da análise da marca de modo a incluir diversos aspectos dos serviços da sociedade da informação.

84.      Parece adequado abordar conjuntamente a quinta, sexta e oitava questões. Todas elas se referem à compra, por um operador de um sítio de comércio electrónico, de marcas de terceiros, como palavras‑chave, a um prestador de serviços remunerados de referenciamento na Internet, e à questão de saber se tal constitui uso de um sinal.

85.      No essencial, a High Court pretende saber se determinados aspectos do modelo de empresa do eBay incluem ou implicam que este possa ser responsabilizado pela violação da marca a título principal em relação a produtos transaccionados no seu sistema se o uso de uma marca de terceiro, no contexto destas transacções, teria exigido o consentimento do titular do direito da marca.

86.      Neste contexto, é útil recordar o acórdão Google France e Google. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça decidiu que o prestador de um serviço de referenciamento na Internet, que armazena como palavra‑chave um sinal idêntico a uma marca e que organiza a exibição de anúncios a partir de tal sinal, não faz um uso desse sinal na acepção do artigo 5.°, n.os 1 e 2, da Directiva 89/104 (50).

87.      Contudo, no acórdão Google France e Google, o Tribunal de Justiça decidiu ainda que o artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 89/104 deve ser interpretado no sentido de que o titular de uma marca está habilitado a proibir que um anunciante, a partir de uma palavra‑chave idêntica a tal marca, que esse anunciante, sem o consentimento do referido titular, seleccionou no âmbito de um serviço de referenciamento na Internet, faça publicidade a produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a referida marca está registada, quando tal publicidade não permite ou permite dificilmente ao internauta médio determinar se os produtos ou os serviços objecto do anúncio provêm do titular da marca ou de uma empresa economicamente ligada a este, ou, pelo contrário, de um terceiro (51).

88.      Tal como o Google, o eBay é um prestador de serviços da sociedade da informação. Ao contrário do Google, não fornece um serviço remunerado de referenciamento na Internet mas um sítio de comércio electrónico. O funcionamento desse sítio de comércio electrónico baseia‑se nos anúncios que os utilizadores do sistema introduziram no sistema, tendo em vista a venda de produtos a outros utilizadores. O sistema do eBay também inclui um motor de busca e as buscas são exclusivamente dirigidas para os anúncios armazenados no seu próprio sistema (52). O próprio eBay não é parte nas transacções mas tira partido económico destas.

89.      Tal como os outros anunciantes que utilizam sistemas publicitários com base em palavras‑chave, fornecidas por prestadores de serviços de referenciamento na Internet (como o AdWords do Google), o eBay selecciona palavras‑chave, que dão origem a anúncios publicitários e a links patrocinados para o seu próprio sistema. Estas palavras‑chave podem incluir sinais idênticos a marcas de terceiros. O objectivo destes anúncios publicitários e links patrocinados é obviamente publicitar os serviços fornecidos pelo eBay, mais precisamente o seu sítio de comércio electrónico, mediante a criação de uma associação na mente dos consumidores de que os produtos da marca em questão podem ser adquiridos através desse sítio de comércio electrónico. Todavia, ao contrário dos anunciantes referidos no acórdão Google France e Google, o próprio eBay não oferece produtos para venda.

90.      Para poder responder à quinta, sexta e oitava questões submetidas pelo órgão jurisdicional nacional é necessário analisar as seis condições explicadas acima no ponto 63.

B –    As condições para invocar direitos conferidos por uma marca no caso de um serviço remunerado de referenciamento na Internet


 As condições previstas no artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 89/104

91.      Quanto às primeiras cinco das seis condições referidas no ponto 63 supra, a situação é a seguinte. No que diz respeito à primeira condição, todas as partes, com excepção do eBay, parecem concordar que a apresentação, nos links patrocinados, dos sinais relevantes adquiridos como palavras‑chave, os quais são idênticos a marcas, constitui uso no sentido do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104. Tendo em conta o acórdão Google France e Google, não restam quaisquer dúvidas de que o eBay está a usar sinais idênticos a marcas quando os selecciona e adquire como palavras‑chave a um prestador de serviços remunerados de referenciamento na Internet, tendo em vista a sua exibição nos links patrocinados, se um internauta digitar o sinal no local relevante no sítio Internet do motor de busca.

92.      Relativamente à segunda, terceira e quarta condições (53), parece‑me que estas são incontroversas no presente pedido de decisão prejudicial.

93.      São necessárias mais algumas observações em relação à quinta condição, segundo a qual o uso do sinal deve ser para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada.

94.      Em primeiro lugar, refira‑se que o eBay usa as palavras‑chave que conduzem aos respectivos links patrocinados para o seu sítio de comércio electrónico. Por outras palavras, o seu objectivo é publicitar o seu próprio serviço. É inegável que esse serviço não é idêntico aos produtos abrangidos pelas marcas da L’Oréal. A questão de saber se este é o único aspecto relevante para o direito das marcas, no qual se faz uso dos sinais seleccionados como palavras‑chave, constitui matéria controvertida.

95.      Segundo a L’Oréal, através da própria selecção de sinais como palavras‑chave que são idênticas a marcas, o eBay está a publicitar produtos vendidos no seu sítio Internet. Resulta do facto de o link patrocinado conduzir directamente o utilizador até anúncios publicitários ou ofertas para venda de produtos idênticos àqueles para os quais a marca está registada que o operador de um sítio de comércio electrónico usa o sinal «para» os produtos. Entendimentos muito semelhantes foram defendidos pelos Governos francês, polaco e português.

96.      Contudo, o eBay alega que não há motivo para que se aplique a protecção concedida pelo artigo 5.° da Directiva 89/104, uma vez que se verifica o esgotamento do direito na acepção do artigo 7.° da Directiva 89/104. A este respeito, observa que, tanto no comércio electrónico, como no tradicional, os intermediários usam marcas em anúncios publicitários para informar o público de que estão envolvidos na distribuição dos produtos que ostentam essa marca. Não há nenhum motivo para proibir essa prática, em especial porque os intermediários da Internet têm ainda menos mecanismos de controlo à sua disposição, do que os intermediários do mundo do comércio não electrónico. Ser‑lhes‑ia impossível, tanto do ponto de vista jurídico, como do ponto de vista prático, criar mecanismos de controlo para assegurar que cada artigo colocado à venda é irrepreensível.

97.      O Governo do Reino Unido alega que o uso de um sinal, que é idêntico a uma marca registada, como palavra‑chave do operador de um motor de busca, não é necessariamente «para produtos ou serviços». De facto, se o sinal for muito afastado das ofertas efectivas de produtos, é pouco provável que o consumidor médio estabeleça uma ligação entre o uso do sinal pelo operador de um sítio de comércio electrónico num link patrocinado e as ofertas subsequentes para fornecer produtos com esse sinal. Em todo o caso, o uso não será abrangido pelo artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 quando o consumidor médio perceba o uso do sinal pelo operador de um sítio de comércio electrónico meramente como um link para ofertas realizadas por terceiros independentes para fornecer produtos que não são provenientes do operador de um sítio de comércio electrónico.

98.      A Comissão também alega que não há «uso» para produtos colocados à venda por terceiros no sítio Internet do operador do sítio de comércio electrónico referido no artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104, mesmo que esse operador «use» o sinal no sentido dessa disposição se o adquiriu como uma palavra‑chave que conduz para os seus links patrocinados.

99.      Em meu entender, a quinta condição refere‑se ao uso de um sinal com o objectivo de identificação dos produtos ou serviços ou de distinção (54) entre produtos ou serviços (provenientes de diferentes origens comerciais). Tal como a High Court refere, o uso de um sinal para produtos ou serviços significa o uso para o objectivo de distinção dos produtos e serviços em questão, ou seja, como uma marca enquanto tal.

100. Isto significa que uma marca é usada para produtos, quer quando é usada pelo titular da marca com o objectivo de distinguir os seus produtos dos produtos de um terceiro, como quando é usada por um terceiro para distinguir os seus produtos dos produtos do titular do direito da marca. Além isso, um terceiro pode usar a marca para distinguir entre os produtos do titular do direito da marca e outros produtos que podem ou não ser os seus próprios produtos. Se esta análise é correcta, quem se encontra na situação de um intermediário ou de um operador de um sítio de comércio electrónico também usa um sinal «para produtos» se usa um sinal que é idêntico a uma marca com o objectivo de distinguir entre os produtos que estão disponíveis através do uso dos seus serviços e os que não estão.

101. Recordo que o Tribunal de Justiça concluiu no acórdão Google France e Google (55) que, na maior parte dos casos, o internauta que introduz o nome de uma marca como termo de pesquisa quer encontrar informações ou ofertas sobre os produtos ou os serviços dessa marca. Sempre que, ao lado ou por baixo dos resultados naturais da pesquisa, são exibidos links publicitários para sítios que propõem produtos ou serviços de concorrentes do titular da referida marca, o internauta pode encarar esses links publicitários como uma alternativa aos produtos ou aos serviços do titular da marca. Tal situação constitui um uso do referido sinal para os produtos ou os serviços do referido concorrente.

102. Na minha opinião, essa análise também é aplicável nas situações em que os links publicitários relevantes não são os dos concorrentes directos do titular da marca que oferecem produtos alternativos, mas os dos sítios de comércio electrónico que propõem uma fonte alternativa dos mesmos produtos abrangidos pela marca em termos de rede de distribuição do titular da marca.

103. Por conseguinte, embora concorde com o Governo do Reino Unido e com a Comissão, em que o uso da marca pelo operador de um sítio de comércio electrónico é inerentemente diferente do uso por um vendedor de produtos, não posso aceitar que o operador de um sítio de comércio electrónico não use a marca para os produtos comercializados no sítio de comércio electrónico, quando usa um sinal idêntico a uma marca na sua própria publicidade.

104. Esta conclusão não é invalidada pelo facto de se poderem verificar situações em que, no sítio de comércio electrónico, não estejam concretamente disponíveis produtos cobertos pela marca, não obstante o operador ter feito publicidade com essa marca.

 As condições decorrentes da jurisprudência: uso susceptível de ter um efeito prejudicial em algumas das funções da marca

105. Com base na análise apresentada supra, é necessário examinar se o uso pelo eBay de sinais idênticos a marcas, como palavras‑chave, num serviço remunerado de referenciamento na Internet, afecta ou é susceptível de afectar algumas das funções dessas marcas. Esta é a sexta condição referida no ponto 63 supra.

106. No acórdão Google France e Google, o Tribunal de Justiça reiterou que a função essencial da marca é garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir esse produto ou serviço de outros que tenham proveniência diversa (56).

107. O Tribunal de Justiça observou ainda que a função de indicação de origem é prejudicada quando o anúncio de terceiro, que é apresentado ao digitar uma palavra‑chave idêntica à marca, não permite ou permite dificilmente ao «internauta normalmente informado e razoavelmente atento» saber se os produtos ou os serviços objecto do anúncio provêm do titular da marca ou de uma empresa economicamente ligada a este ou, pelo contrário, de um terceiro (57).

108. Na minha opinião o «internauta normalmente informado e razoavelmente atento» consegue perceber a diferença entre um sítio de comércio electrónico, um vendedor directo dos produtos ou serviços e a origem comercial dos produtos ou serviços. E isto porque a existência de diversas actividades económicas intermediárias, como distribuidores, correctores, casas leiloeiras, «feiras da ladra» e agentes imobiliários é conhecida de todos os adultos que vivem numa economia de mercado. Logo, não se pode presumir um erro relativamente à origem dos produtos ou serviços só porque um link conduz para o anúncio publicitário de um operador de um sítio de comércio electrónico se o próprio anúncio não induzir em erro quanto à natureza do operador.

109. Constitui uma questão de facto, que deverá ser apreciada pelo órgão jurisdicional nacional, a de saber se a natureza das actividades de alguns sítios de comércio electrónico como o eBay é, geralmente, tão conhecida que não é provável que a função de origem seja comprometida mesmo que a natureza do operador do sítio de comércio electrónico não seja explicada no anúncio publicitário.

110. Além disso, no caso dos produtos desembalados ou provenientes de países que não pertencem ao EEE, a função de origem não pode ser afectada. Estes são produtos da L’Oréal genuínos independentemente de a sua oferta para venda violar ou não a marca da L’Oréal. Quanto aos produtos contrafeitos a avaliação é a oposta.

111. Um efeito prejudicial na função de origem ocorre nos casos em que os produtos comercializados no sítio de comércio electrónico são produtos contrafeitos. Todavia, esse efeito prejudicial não resulta do uso pelo operador do sítio de comércio electrónico do sinal como uma palavra‑chave no serviço de referenciamento na Internet enquanto tal. O efeito prejudicial também se verificaria nos casos em que o sítio de comércio electrónico só fosse exibido nos anúncios espontâneos dos motores de busca e não também nos links patrocinados, ou em que o operador do sítio de comércio electrónico não usasse a marca na sua publicidade. A causa do efeito prejudicial na função de origem é o anúncio exibido na página web do operador de um sítio de comércio electrónico. Como explicarei a seguir, o uso de sinais idênticos a marcas nesses anúncios, não constitui um uso pelo operador do sítio de comércio electrónico para os produtos em questão, mas um uso pelos utilizadores do sítio de comércio electrónico.

112. Quanto à questão de um efeito prejudicial na função de publicidade penso, com base numa argumentação semelhante à utilizada no acórdão Google France e Google que excluiu um tal efeito prejudicial em relação aos links patrocinados dos sistemas de referenciamento na Internet (58), que esse efeito é excluído em relação aos sítios de comércio electrónico que utilizam a publicidade a partir de palavras‑chave (keyword advertising).

113. Como já referi, a comercialização de produtos contrafeitos sob as marcas da L’Oréal deve ter um efeito prejudicial na função de origem. Quanto às funções de qualidade e investimento, considero óbvio que os anúncios individuais de utilizadores do eBay que contêm marcas de terceiros e são exibidos no sítio Internet do eBay podem afectar negativamente estas funções. O comércio de produtos contrafeitos prejudica, e o comércio de produtos desembalados pode prejudicar, a reputação das marcas prestigiadas que abrangem os produtos cosméticos de luxo e, portanto, os investimentos realizados pelo titular do direito da marca para criar a imagem da sua marca. Consequentemente, também é comprometida a garantia implícita de qualidade inerente à marca e por esta comunicada.

114. Contudo, os artigos 6.° e 7.° da Directiva 89/104 permitem um uso bastante extensivo das marcas sem o consentimento do titular, incluindo a sua menção na publicidade. Esta questão foi recentemente clarificada, em relação às vendas de produtos usados, no acórdão Portakabin (59).

115. Se uma pessoa pode usar ou fazer referência à marca de um terceiro, o mesmo comportamento não pode ser ilícito para um operador que explora um sítio de comércio electrónico para estes utilizadores (60). Na minha opinião não há dúvida de que, por exemplo, um centro comercial pode, no seu marketing, usar marcas dos produtos ou serviços oferecidos pelas empresas que operam nas suas instalações.

116. Se tal uso fosse considerado relevante em relação a algumas das funções da marca, deveria em todo o caso ser considerado permitido, por se tratar de uma indicação relativa à espécie de produto, no sentido do artigo 6.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104, ou necessário, no sentido do artigo 6.°, n.° 1, alínea c), para a exploração de um sítio de comércio electrónico onde tais produtos são comercializados sem que o operador esteja obrigado a verificar, para cada artigo, se o direito da marca se esgotou com base no artigo 7.° Por conseguinte, tal uso não pode ser proibido pelo titular do direito da marca.

117. Em princípio, penso que não poderão ser imputados ao operador de um sítio de comércio electrónico os eventuais problemas relacionados com a conduta dos operadores de mercado individuais, salvo se existirem fundamentos de responsabilidade secundária nos termos do direito nacional. Uma sociedade que explora um centro comercial não pode ser responsável pelo facto de uma mercearia existente nas suas instalações vender maçãs podres. Nem deverá tal sociedade ser automaticamente responsabilizada pela violação da marca verificada no centro comercial se, por exemplo, um membro de uma rede de distribuição selectiva continuar a vender produtos de marca, mesmo depois de o titular da marca ter rescindido o contrato de distribuição com efeito imediato. O operador de um mercado tem o direito de presumir que os agentes económicos que utilizam os seus serviços agem legalmente e cumprem as cláusulas contratuais estipuladas sobre o uso do mercado, enquanto não for efectivamente informado do contrário.

118. Consequentemente, se o anúncio apresentado com os resultados de um motor de busca da Internet indicar de forma suficientemente clara que o operador é um mercado, o facto de alguns utilizadores desse mercado poderem violar a marca não é, enquanto tal, susceptível de ter um efeito prejudicial nas funções de qualidade, comunicação e investimento dessa marca.

C –    As condições para invocar direitos conferidos por uma marca no próprio sítio Internet do operador de um sítio de comércio electrónico

119. Contudo, por uma questão de clareza, devo acrescentar que se o uso que é objecto da queixa apresentada pelo titular da marca consistir na apresentação do sinal no próprio sítio Internet de um operador de comércio electrónico, e não na apresentação de um link patrocinado de um motor de busca, o uso em causa não é um uso da marca para produtos pelo operador do sítio de comércio electrónico, mas pelos utilizadores desse sítio. A actividade do operador consiste no armazenamento e na exibição dos anúncios que os utilizadores introduzem no seu sistema e na operação de um sistema que facilita a realização de transacções comerciais. Isto é tanto uso de marcas como a actividade de um jornal que publica anúncios classificados com a menção de marcas, em que a identidade do vendedor não é revelada no anúncio publicitário mas deve ser solicitada ao jornal. Logo, mesmo que o anúncio de bens protegidos por uma marca pelos utilizadores de um sítio de comércio electrónico possa ter efeitos prejudiciais nas funções de origem, de qualidade ou de investimento de uma marca, tais efeitos não podem ser imputados ao operador do sítio de comércio electrónico, salvo se se aplicarem as normas jurídicas nacionais e o princípio da responsabilidade secundária pelas violações da marca.

120. Refira‑se ainda que a actividade do eBay, que consiste nas funções de busca e exibição aplicáveis aos anúncios, é tecnicamente semelhante à dos motores de busca de Internet como o Google (sem o «add‑on» do serviço remunerado de referenciamento), embora o modelo de empresa seja diferente. Nos servidores do eBay, as buscas referem‑se aos anúncios armazenados pelos utilizadores do sítio de comércio electrónico, no caso dos motores de busca de Internet, às páginas de Internet que estes armazenaram nos seus servidores. Assim, no que diz respeito a estas funções, o uso e a exibição de marcas de terceiros não constitui uso de um sinal, no sentido do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 89/104, pelos motivos expostos no acórdão Google France e Google. O operador do sítio de comércio electrónico também permite aos seus clientes fazerem uso de sinais idênticos a marcas, sem que ele próprio faça uso dos referidos sinais (61).

VIII – Produtos provenientes de países que não pertencem ao EEE

121. A sétima questão refere‑se aos produtos anunciados e colocados à venda no sítio Internet mencionado na sexta questão, que não tenham sido comercializados no EEE pelo titular da marca ou com o consentimento deste. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a aplicabilidade das disposições relevantes é desencadeada por um anúncio publicitário ou por uma oferta de venda dirigida a consumidores no território coberto pela marca.

122. A L’Oréal, o Governo do Reino Unido, os Governos polaco e português e a Comissão alegam que, quando os produtos colocados à venda num sítio de comércio electrónico ainda não tenham sido colocados no mercado no EEE, através ou com o consentimento do titular da marca, é não obstante suficiente, para a aplicação do direito exclusivo conferido pela marca nacional ou comunitária, a demonstração de que o anúncio publicitário seja dirigido a consumidores no território coberto pela marca.

123. Segundo o eBay, uma marca não pode ser usada na UE enquanto os produtos em questão não forem colocados no respectivo mercado. Consequentemente, não é suficiente que o anúncio publicitário ou a oferta de venda sejam dirigidos a consumidores no território coberto pela marca.

124. A resposta proposta pelas partes, com excepção do eBay, parece‑me correcta.

125. Em primeiro lugar, à luz da doutrina dos efeitos aplicada, em especial, no domínio do direito da concorrência da UE (62), pode‑se afirmar que um comportamento que se verifica fora do território da União, mas que produz efeitos directos e juridicamente relevantes sobre o objecto da legislação da UE, não pode escapar à aplicação das regras da UE só porque os actos que causam tais efeitos ocorrem fora do território da União.

126. No contexto da prestação de serviços de Internet, a doutrina dos efeitos deve ser relativizada. Caso contrário, uma vez que as comunicações na Internet são, em princípio, acessíveis em toda a parte, o comércio electrónico e a prestação de serviços estariam sujeitos a inúmeras legislações e direitos de propriedade intelectual de vigência territorial variável, sujeitando estas actividades a riscos legais incomportáveis e conferindo aos direitos de propriedade intelectual conflituantes uma protecção desrazoavelmente ampla.

127.  Por outro lado, se tanto o efeito objectivo, como a intenção subjectiva das pessoas em questão consistem em produzir tais efeitos na UE, a avaliação tem de ser diferente. Caso contrário, as actividades dirigidas aos mercados da UE escapariam à aplicação das regras da UE relativas, por exemplo, à protecção do consumidor, à protecção de direitos de propriedade intelectual, à concorrência desleal e à segurança do produto, mediante a simples localização da actividade ou do sítio Internet da sociedade responsável pela actividade num país terceiro. Por conseguinte, a protecção da marca não pode ser limitada aos casos em que os produtos em questão são colocados no mercado na UE.

128. Como sabemos se um sítio de comércio electrónico está a «dirigir as suas actividades para» os compradores de uma determinada ordem jurídica, neste caso no interior da UE? Esta é uma questão complicada, que o Tribunal de Justiça está actualmente a apreciar em dois casos pendentes (63).

129. Na minha opinião esta é uma questão de facto que deve ser decidida pelos órgãos jurisdicionais nacionais. Pode‑se encontrar uma orientação a este respeito na Recomendação conjunta de 2001 relativa às disposições sobre a protecção das marcas e outros direitos de propriedade industrial sobre sinais na Internet da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) (64). Nos termos do artigo 2.° da recomendação conjunta, o uso de um sinal na Internet só constituirá uso num Estado‑Membro para efeitos dessas disposições, se o uso tiver um efeito comercial nesse Estado‑Membro, conforme descrito no artigo 3.° Nos termos deste último artigo, para determinar se o uso de um sinal na Internet tem um efeito comercial num Estado‑Membro, a autoridade competente tomará em consideração todas as circunstâncias relevantes. Estas poderão incluir, designadamente, cinco critérios principais divididos por elementos mais específicos especificados na disposição.

IX – Isenção do prestador de um serviço de armazenagem em servidor

130. A nona questão visa saber se, e em que medida, o eBay pode beneficiar da limitação da responsabilidade prevista no artigo 14.° da Directiva 2000/31 relativo ao aspecto do comércio electrónico da «armazenagem em servidor». A questão é, enquanto tal, nova para o Tribunal de Justiça, mas, como referi, as questões da responsabilidade secundária já foram discutidas e decididas em tribunais dos Estados‑Membros e noutras jurisdições (65). É necessário recordar certas características gerais da Directiva 2000/31 para se situar a interpretação do artigo 14.° no seu devido contexto (66).

131. Nos termos do seu artigo 1.°, a Directiva 2000/31 tem por objectivo contribuir para o correcto funcionamento do mercado interno, garantindo a livre circulação dos serviços da sociedade da informação entre Estados‑Membros, mediante a aproximação, na medida do necessário à realização do objectivo mencionado, certas disposições nacionais aplicáveis aos serviços da sociedade da informação que dizem respeito ao mercado interno, ao estabelecimento dos prestadores de serviços, às comunicações comerciais, aos contratos celebrados por via electrónica, à responsabilidade dos intermediários, aos códigos de conduta, à resolução extrajudicial de litígios, às acções judiciais e à cooperação entre Estados‑Membros.

132. A Directiva 2000/31 tem um âmbito de aplicação vasto. As regras previstas na directiva afectam inúmeras áreas do direito, mas apenas regulam certas questões específicas dessas áreas: a harmonização que a directiva prevê é, simultaneamente, horizontal e específica (67).

 Aplicabilidade da isenção ao operador de um sítio de comércio electrónico

133. A primeira parte da nona questão respeita à aplicabilidade da isenção ao operador de um sítio de comércio electrónico.

134. À luz da definição estabelecida no artigo 2.°, alínea a), da Directiva 2000/31, lido em conjugação com o artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 98/34 e com o considerando 18 da Directiva 2000/31, os serviços do operador de um sítio de comércio electrónico destinados a facilitar o contacto entre vendedores e compradores de quaisquer tipos dos produtos, como os fornecidos pelo eBay, podem ser considerados serviços da sociedade da informação e, portanto, ser abrangidos pelo âmbito de aplicação da Directiva 2000/31.

135. As disposições respeitantes à responsabilidade dos prestadores intermediários de serviços constam da secção 4 do capítulo II («Princípios») da directiva. A secção é constituída por quatro artigos: 12.° «Simples transporte», 13.° «Armazenagem temporária» («caching»), 14.° «Armazenagem em servidor» e 15.° «Ausência de obrigação geral de vigilância».

136. Poderá alegar‑se que os artigos 12.°, 13.° e 14.° da Directiva 2000/31, respeitantes à responsabilidade, devem ser interpretados como excepções à responsabilidade e, portanto, ser interpretados de forma restritiva. Na minha opinião, este não é necessariamente o caso, porque em muitos Estados‑Membros a responsabilidade de um prestador de serviços nas situações referidas nestes artigos seria excluída por falta de culpabilidade subjectiva. Assim, estas disposições são melhor qualificadas como reafirmações ou clarificações do direito existente, do que como excepções a este direito (68).

137. Enquanto que, no acórdão Google France e Google, foi abordada a responsabilidade do prestador de um serviço de referenciamento na Internet, o caso em apreço envolve a responsabilidade do operador de um sítio de comércio electrónico.

138. No acórdão Google France e Google, o Tribunal de Justiça interpretou o artigo 14.° da Directiva 2000/31 à luz do preâmbulo da directiva. Segundo o Tribunal de Justiça, resulta do considerando 42 da Directiva 2000/31 que situações de exoneração de responsabilidade estabelecidas nesta directiva abrangem exclusivamente os casos em que a actividade da sociedade da informação exercida pelo prestador de serviços reveste carácter «puramente técnic[o], automátic[o] e de natureza passiva», o que implica que o referido prestador de serviços «não tem conhecimento da informação transmitida ou armazenada, nem o controlo desta». Por conseguinte, a fim de verificar se a responsabilidade do prestador do serviço de referenciamento poderia ser limitada com base no artigo 14.° da Directiva 2000/31, deve examinar‑se se o papel desempenhado pelo referido prestador é neutro, ou seja, se o seu comportamento é puramente técnico, automático e passivo, implicando o desconhecimento ou a falta de controlo dos dados que armazena (69).

139. Tenho algumas dificuldades em aceitar esta interpretação.

140. Ao apoiar a limitação dos critérios de responsabilidade do prestador de serviços de armazenagem em servidor na «neutralidade», o Tribunal de Justiça remeteu para o considerando 42 da Directiva 2000/31. Partilho das dúvidas expressas pelo eBay quanto à questão de saber se este considerando diz respeito, de alguma forma, à armazenagem em servidor referida no artigo 14.°

141. Apesar de o considerando 42 da directiva falar de «isenções» no plural, o mesmo parece referir‑se às isenções discutidas no considerando seguinte. As isenções aí mencionadas referem‑se – expressamente – ao simples transporte e à armazenagem temporária («caching»). Lido assim, o considerando 42 torna‑se mais claro: fala do «processo técnico de exploração e abertura do acesso a uma rede de comunicação na qual as informações prestadas por terceiros são transmitidas ou temporariamente armazenadas com o propósito exclusivo de tornar a transmissão mais eficaz» (o sublinhado é meu). Na minha opinião, refere‑se precisamente ao «simples transporte» e à «armazenagem temporária» («caching»), mencionados nos artigos 12.° e 13.° da Directiva 2000/31.

142. Entendo, em vez disso, que é o considerando 46 o relativo aos prestadores de serviços de armazenagem em servidor mencionados no artigo 14.° da Directiva 2000/31, uma vez que este alude expressamente à armazenagem de informação. Por conseguinte, a limitação da responsabilidade de um prestador de serviços da armazenagem em servidor não deveria ser condicionada e limitada por referência ao considerando 42. Se se confirmasse, no presente processo, que as condições estabelecidas no acórdão Google France e Google, para a responsabilidade de um prestador de serviços de armazenagem em servidor, também se aplicam aos sítios de comércio electrónico, um elemento essencial no desenvolvimento dos serviços de comércio electrónico da sociedade da informação, os objectivos da Directiva 2000/31 seriam gravemente ameaçados e questionados.

143. Como salienta acertadamente a Comissão, a propósito do uso de um sinal idêntico a uma marca protegida no sítio Internet do operador de um sítio de comércio electrónico, esse sítio Internet apresenta certos conteúdos, ou seja o texto das ofertas que é fornecido pelos vendedores destinatários do serviço e que é armazenado a pedido destes. Desde que os anúncios sejam introduzidos pelos utilizadores sem nenhuma inspecção ou controlo prévios pelo operador do sítio de comércio electrónico, que envolvam a interacção entre pessoas singulares que representem o operador e o utilizador (70), estamos perante o armazenamento de informações prestadas pelo destinatário do serviço. Em tais circunstâncias, o operador de um sítio de comércio electrónico não tem conhecimento efectivo da actividade ou informação ilegal. E também não tem conhecimento de factos ou de circunstâncias que evidenciem a actividade ou informação ilegal. Logo, estariam preenchidas as condições de isenção da responsabilidade pela armazenagem em servidor, definida no artigo 14.° da Directiva 2000/31.

144. Todavia, no que diz respeito ao serviço remunerado de referenciamento na Internet e ao uso de um sinal idêntico à marca protegida nos links patrocinados do operador de um sítio de comércio electrónico, a informação não é armazenada por este operador que intervém como anunciante, mas pelo operador que explora o motor de busca. Por conseguinte, as condições da armazenagem em servidor, definidas no artigo 14.° da Directiva 2000/31, não se encontram preenchidas, neste ponto, no caso do operador de um sítio de comércio electrónico.

145. O acórdão Google France e Google parece sugerir que o prestador de serviços de armazenagem em servidor, previstos no artigo 14.° da Directiva 2000/31, deve permanecer neutro em relação aos dados armazenados. Já foi alegado no Tribunal de Justiça que o eBay não é neutro porque instrui os seus clientes na redacção dos anúncios publicitários e supervisa os conteúdos dos anúncios.

146. Como expliquei, a «neutralidade» não parece ser o critério mais adequado nos termos da directiva para esta questão. De facto, seria, em meu entender, surreal que o facto de o eBay intervir e orientar os conteúdos dos anúncios no seu sistema, com diversos meios técnicos, o privasse da protecção do artigo 14.° relativamente à armazenagem da informação introduzida pelos utilizadores (71).

147. Além isso, a título de observação geral que se aplica às três excepções previstas nos artigos 12.°, 13.° e 14.° da Directiva 2000/31, devo dizer algo que pode parecer óbvio. Os três artigos destinam‑se a criar excepções a certos tipos de actividades exercidas por um prestador de serviços. A meu ver, é inconcebível que estes artigos impliquem a isenção de um tipo de prestador de serviços enquanto tal.

148. De facto, é difícil aceitar que a Directiva 2000/31 impusesse três tipos de actividade distintos, que só seriam isentos se cada um deles fosse exercido de forma estanque. Se uma sociedade presta serviços de armazenagem temporária (caching) e outra serviços de armazenagem em servidor, não há dúvida de que estão ambas isentas. Contudo, uma tal separação pode ser extremamente rara. Na minha opinião, se uma sociedade desenvolve ambas as actividades – o que não parece nada excepcional em termos de realidade concreta, as isenções também deveriam aplicar‑se a essa entidade. O mesmo é válido se uma ou mais das actividades isentas forem combinadas com as actividades de um fornecedor de conteúdos de Internet (72). Seria impraticável limitar as isenções a certos tipos de empresa, em especial numa área caracterizada por alterações constantes e quase imprevisíveis. A proposta da Comissão para a Directiva 2000/31 já partiu desta perspectiva de futuro numa área que está em evolução constante.

149. Não penso que seja possível definir os parâmetros de um modelo de empresa que se enquadre perfeitamente na isenção relativa à armazenagem em servidor. E mesmo que fosse, uma definição feita hoje não subsistiria provavelmente por muito tempo. Em vez disso, devemos concentrar‑nos no tipo de actividade e afirmar claramente que, embora algumas actividades de um prestador de serviços estejam isentas de responsabilidade, na medida do necessário para se atingirem os objectivos da directiva, todas as outras não o estão e permanecem sujeitas aos regimes de responsabilidade «normais» dos Estados‑Membros, como a responsabilidade civil e a responsabilidade criminal.

150. Assim, quando se aceita que determinadas actividades de um prestador de serviços estão isentas, isso significa, inversamente, que as actividades não abrangidas por uma isenção podem implicar responsabilidade nos termos do direito nacional.

151. Logo, para o eBay, a armazenagem em servidor das informações fornecidas por um cliente pode, efectivamente, beneficiar de uma isenção se forem satisfeitas as condições previstas no artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31. Contudo, a excepção relativa à armazenagem em servidor não isenta o eBay da potencial responsabilidade em que este possa incorrer no âmbito do uso que faz de um serviço remunerado de referenciamento na Internet.

 Âmbito das actividades abrangidas pela excepção

152. Na segunda parte da nona questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, numa situação em que as actividades de um operador de um sítio de comércio electrónico incluírem não só actividades mencionadas no artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31, mas também actividades que ultrapassam esse âmbito, o operador permanece isento em relação às actividades abrangidas por essa disposição (embora não esteja isento relativamente às actividades não abrangidas) e qual é a situação das «actividades que ultrapassam esse âmbito», em especial no que diz respeito à concessão de uma indemnização por perdas e danos ou de outras compensações financeiras por actividades não isentas.

153. Resulta da argumentação apresentada supra que o operador permanece isento no que diz respeito às actividades abrangidas pelo artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31. Contudo, não está isento no que diz respeito às actividades não abrangidas. Esta situação deve ser apreciada com base nas disposições e nos princípios de direito nacional aplicáveis, em especial no que diz respeito à concessão de uma indemnização por perdas e danos ou de outras compensações financeiras por actividades não isentas.

 Obrigações do operador de um sítio de comércio electrónico em relação a futuras violações

154. A terceira parte da nona questão refere‑se ao caso em que já ocorreu alguma actividade ilegal no sítio de comércio electrónico. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber quais são as obrigações do operador de um sítio de comércio electrónico, nesse caso, relativamente a futuras violações.

155. Recorde‑se que o artigo 14.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 2000/31 reflecte o princípio da «notificação e remoção» (notice and take down). Consequentemente, o prestador de um serviço de armazenagem em servidor deve proceder com diligência no sentido de remover as informações ou impossibilitar o acesso a estas a partir do momento em que tenha conhecimento efectivo da ilicitude, ou tenha sido alertado para esta.

156. Na aplicação do princípio da «notificação e remoção» deve ser tido em conta o considerando 46 da Directiva 2000/31, nos termos do qual, a remoção ou a impossibilitação do acesso devem ser realizadas respeitando o princípio da liberdade de expressão e os procedimentos estabelecidos para o efeito a nível nacional. Além isso, a directiva não afecta a possibilidade de os Estados‑Membros fixarem requisitos específicos que tenham de ser cumpridos de forma expedita, previamente à remoção ou à impossibilitação de acesso à informação.

157. Recordo que os anúncios introduzidos por utilizadores de um sítio de comércio electrónico são comunicações comerciais e, enquanto tais, protegidas pelo direito fundamental da liberdade de expressão e informação consagrado no artigo 11.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber e de transmitir informações ou ideias, sem que possa haver ingerência de quaisquer poderes públicos e sem consideração de fronteiras.

158. Obviamente, a liberdade de expressão e informação não permite a violação dos direitos de propriedade intelectual, igualmente protegidos pela Carta, no seu artigo 17.°, n.° 2. Não obstante, a liberdade de expressão e informação implica que a protecção dos direitos do titular da marca, no contexto do comércio electrónico, não pode tomar formas que violem os direitos de utilizadores inocentes de um sítio de comércio electrónico, ou que neguem ao alegado infractor as devidas possibilidades de oposição e defesa (73). Na minha opinião, o considerando 46 e o artigo 14.°, n.° 3, da Directiva 2000/31 remetem expressamente para procedimentos a nível nacional e autorizam os Estados‑Membros a fixar requisitos específicos que tenham de ser cumpridos de forma expedita, previamente à remoção ou à impossibilitação de acesso à informação.

159. Na Finlândia, por exemplo, a legislação nacional que transpôs a Directiva 2000/31 prevê, por motivos constitucionais (74), que um prestador de serviços de armazenagem em servidor só está obrigado a remover a informação armazenada no seu sistema, após a notificação de uma ordem judicial para esse efeito, no caso de uma violação da marca, ou após uma comunicação de aviso pelo titular de um direito, no caso de uma alegada violação de direito de autor ou de direito conexo. Neste último caso, o utilizador tem a possibilidade de se opor à remoção no prazo de catorze dias (75).

160. Foi alegado que o conhecimento efectivo, referido no artigo 14.° da Directiva 2000/31, se produz com a notificação de uma decisão judicial ou com uma comunicação de aviso (76).

161. Quanto à interpretação do artigo 14.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 2000/31, a exigência do «conhecimento efectivo» é constituída, a meu ver, por dois aspectos.

162. Em primeiro lugar, é evidente que o prestador de serviços deve ter conhecimento efectivo, e não uma mera suspeita ou presunção da actividade ou informação ilegal. Também me parece que, em termos jurídicos, o «conhecimento» só pode referir‑se ao passado e/ou presente, mas não ao futuro. Por conseguinte, no caso de uma alegada violação da marca num sítio de comércio electrónico, o objecto do conhecimento deve ser uma actividade concluída ou em curso ou um facto ou uma circunstância existentes.

163. Em segundo lugar, a exigência de conhecimento efectivo parece excluir o conhecimento subentendido. Não é suficiente que o prestador de serviços devesse conhecer ou tivesse bons motivos para suspeitar de actividade ilegal. Isto também está em linha com o artigo 15.°, n.° 1, da Directiva 2000/31 que proíbe aos Estados‑Membros a imposição aos prestadores de serviços de uma obrigação geral de vigilância sobre as informações que estes transmitam ou armazenem, ou uma obrigação geral de procurar activamente factos ou circunstâncias que indiciem ilicitudes.

164. Consequentemente, o conhecimento efectivo significa o conhecimento de informação, actividade ou factos passados ou presentes que o prestador de serviços possui com base numa notificação externa ou na sua própria investigação voluntária.

165. Em princípio, isto parece excluir a possibilidade de que um prestador de serviços pudesse ter conhecimento da provável ocorrência de futuras violações. Receio que a situação não seja assim tão simples.

166. Parece‑me seguro que não há conhecimento efectivo de que B viola a marca X porque A viola ou violou a marca X. Nem pode haver conhecimento efectivo de que A viola a marca Y porque se constatou que A violou a marca X, ainda que esta pertencesse ao mesmo titular.

167. Contudo, se, em Setembro, foi descoberto que A violava a marca X, mediante o anúncio de uma oferta no sítio de comércio electrónico, não se pode excluir que o operador do sítio de comércio electrónico tinha conhecimento efectivo de informação, actividade, factos ou circunstâncias se, em Outubro, A introduzir no sítio Internet uma nova oferta do mesmo produto ou de produtos semelhantes com a marca X. Nessas circunstâncias, seria mais natural falar da mesma violação contínua, do que de duas violações separadas (77). Recordo que o artigo 14.°, n.° 1, alínea a), menciona «actividade» como um objecto de conhecimento efectivo. Uma actividade contínua abrange o passado, o presente e o futuro.

168. Assim, relativamente a um mesmo utilizador e a uma mesma marca, um operador de um sítio de comércio electrónico tem conhecimento efectivo num caso em que a mesma actividade continua sob a forma de subsequentes anúncios e também pode ser obrigado a desactivar o acesso à informação que o utilizador introduzir no futuro. Por outras palavras, a isenção de responsabilidade não se aplica no caso de o operador de sítios de comércio electrónico ter sido notificado da existência de uma infracção a um direito de marca e de o mesmo utilizador manter ou reiterar a mesma infracção.

X –    Medidas inibitórias contra intermediários

169. A décima questão respeita à possibilidade conferida ao titular do direito da marca de obter uma medida inibitória, nos termos do artigo 11.° da Directiva 2004/48 relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual, não só contra o terceiro que viola a marca, mas também contra o intermediário cujos serviços foram utilizados para violar a marca registada. O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em especial, se este artigo exige a disponibilização de uma medida inibitória por força do direito da UE, para impedir futuras violações e, em caso afirmativo, qual o âmbito de aplicação da medida inibitória a disponibilizar (78). Esta é a primeira vez que o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar o artigo 11.° da Directiva 2004/48.

170. Todas as partes concordam que as medidas inibitórias contra intermediários estão previstas na Directiva 2004/48. Todavia, enquanto o eBay alega que uma medida inibitória contra um prestador de serviços de armazenagem em servidor só pode referir‑se a um conteúdo concreto específico e claramente identificável, as outras partes consideram que as medidas inibitórias podem incluir medidas para impedir novas violações.

171. A dificuldade básica na interpretação da Directiva 2004/48 refere‑se ao equilíbrio entre uma aplicação demasiado agressiva ou demasiado tolerante dos direitos de propriedade intelectual. Esta tarefa já foi comparada com a viagem de Ulisses entre os dois monstros Cila e Caríbdis (79). Embora seja possível interpretar a directiva tendo em vista a sua finalidade de execução de uma ideologia de aplicação forte ou fraca, seria, em princípio, necessário ter em devida conta o artigo 3.° da Directiva 2004/48 em toda a interpretação da directiva. Resulta deste artigo que a Directiva 2004/48 impõe aos Estados‑Membros uma obrigação geral de estabelecerem as medidas, procedimentos e recursos necessários para assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual e de tomarem medidas adequadas contra os responsáveis por contrafacção e pirataria. Estas medidas, procedimentos e recursos devem ser suficientemente dissuasivos, mas aplicados de forma a evitar que se criem obstáculos ao comércio lícito e a prever salvaguardas contra os abusos.

172. As disposições básicas da Directiva 2004/48 constam do seu capítulo II (intitulado «Medidas, procedimentos e recursos»). São dignas de nota duas secções desse capítulo. Embora tanto a secção 4 («Medidas provisórias e cautelares» – artigo 9.°), como a secção 5 («Medidas decorrentes da decisão de mérito») refiram medidas a disponibilizar contra o infractor e o intermediário, é esta última secção 5 que é relevante neste caso. É constituída pelos artigos 10.° (Medidas correctivas), 11.° (Medidas inibitórias) e 12.° (Medidas alternativas).

173. As duas primeiras frases do artigo 11.° referem‑se às medidas inibitórias a disponibilizar contra o infractor de um direito de propriedade intelectual. A terceira frase exige que também sejam disponibilizadas medidas inibitórias contra um intermediário, cujos serviços são utilizados por um terceiro para violar um direito de propriedade intelectual. O âmbito de aplicação de medidas inibitórias contra um intermediário não está definido, mas como este aspecto é acrescentado como um elemento complementar das duas primeiras frases, penso que estas duas frases devem ser utilizadas na interpretação da terceira.

174. Recorde‑se que a primeira frase do artigo 11.° da Directiva 2004/48 exige que «nos casos em que tenha sido tomada uma decisão judicial que constate uma violação de um direito de propriedade intelectual», as autoridades judiciais dos Estados‑Membros possam impor ao infractor uma «medida inibitória da continuação dessa violação». Uma leitura literal deste texto sugere a verificação concreta de uma violação e a cessação para futuro da continuação dessa violação específica pelo infractor.

175. Quanto à natureza das medidas inibitórias a disponibilizar contra o infractor, parece que o direito da UE exige que, através desta medida inibitória, possa ser posto fim a uma violação judicialmente declarada. O impedimento de novas infracções também é possível, embora a linguagem da directiva se torne mais cuidadosa. Dada a referência ao aspecto da «continuação» da violação, a linguagem mais cuidadosa relativamente às «novas» infracções e o princípio da proporcionalidade, a minha interpretação das duas primeiras frases é a de que o direito da UE não chega a exigir a possibilidade de ser decretada uma medida inibitória contra um infractor de modo a impedir novas infracções que pudessem ocorrer no futuro (80).

176. Quanto ao intermediário, com base no texto da Directiva 2004/48, uma possível interpretação é a de que o âmbito de aplicação da medida inibitória disponível, em termos de direito da UE, contra o intermediário, não deve ser diferente da disponível contra o infractor.

177. Não estou convencido, todavia, que esta seja uma interpretação razoável.

178. Parece‑me que a aplicação da primeira frase do artigo 11.° da Directiva 2004/48 exige a identificação do infractor a quem será subsequentemente proibida a continuação da violação. Contudo, a terceira frase não menciona «o infractor», mas apenas «um terceiro» que utiliza os serviços de um intermediário para violar um direito de propriedade intelectual.

179. Esta opção de redacção tem um bom motivo: poderá haver casos, em especial no ambiente da Internet, em que a violação é óbvia mas o infractor não é identificado. Sabe‑se que um terceiro está a utilizar os serviços de um intermediário para violar um direito de propriedade intelectual, mas a verdadeira identidade desse infractor é desconhecida. Nesses casos, a protecção jurídica do titular pode exigir que possa ser obtida uma medida inibitória contra o intermediário cuja identidade é conhecida, e que pode, consequentemente, ser objecto de uma acção judicial e impedir a continuação da violação.

180. Quanto ao âmbito de aplicação ou ao conteúdo de uma medida inibitória decretada contra um intermediário, não penso que o direito da UE possa impor quaisquer requisitos específicos para além da eficácia, carácter dissuasório e proporcionalidade, exigidos pelo artigo 3.°, n.° 2, da Directiva 2004/48.

181. O requisito da proporcionalidade excluiria, na minha opinião, uma medida inibitória contra o intermediário que lhe impusesse o impedimento de novas infracções da marca. No entanto, penso que não há nada na Directiva 2004/48 que proíba medidas inibitórias contra o intermediário que imponham não só o impedimento da continuação de um acto de violação específico mas também o impedimento da repetição desse acto ou de uma violação semelhante no futuro, se tais medidas inibitórias estiverem disponíveis nos termos do direito nacional. O que é fundamental, obviamente, é que o intermediário possa saber com certeza o que é exigido dele, e que a medida inibitória não imponha obrigações impossíveis, desproporcionadas ou ilegais como uma obrigação geral de vigilância.

182. Um limite adequado do âmbito de aplicação das medidas inibitórias poderá ser o da dupla exigência da identidade. Isto significa que o terceiro infractor deve ser o mesmo (81) e que a marca violada deve ser a mesma nos casos em questão. Assim, poderá ser decretada uma medida inibitória contra um intermediário no sentido de impedir a continuação ou a repetição da violação de uma determinada marca por um determinado utilizador. Tal medida inibitória poderá ser cumprida pelo prestador de serviços da sociedade da informação mediante o simples encerramento da conta de cliente do utilizador em questão (82).

XI – Conclusão

183. Proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais apresentadas pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, do seguinte modo:

«1)      Sempre que testers de perfumes e de produtos cosméticos e frascos doseadores, que não se destinam a ser vendidos aos consumidores, sejam fornecidos gratuitamente aos distribuidores autorizados do titular de uma determinada marca, tais produtos não são «comercializados» na acepção do artigo 7.°, n.° 1, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas e do artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária.

2), 3) e 4) O titular da marca tem direito a opor‑se à comercialização posterior dos produtos desembalados, na acepção do artigo 7.°, n.° 2, da Directiva 89/104 e do artigo 13.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 40/94, sempre que a embalagem exterior de perfumes e de produtos cosméticos tenha sido removida sem o consentimento do titular da marca se, em consequência da remoção da embalagem exterior, os produtos não incluírem a informação exigida pelo artigo 6.°, n.° 1, da Directiva 76/768/CEE do Conselho, de 27 de Julho de 1976, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos produtos cosméticos, ou se a remoção da embalagem exterior puder ser considerada, enquanto tal, como uma alteração ou modificação do estado dos produtos ou se a comercialização posterior prejudicar, ou for susceptível de prejudicar, a imagem dos produtos e, consequentemente, a reputação da marca. Nas circunstâncias do processo principal, tal consequência pode ser presumida, salvo se a oferta disser respeito a um único artigo ou a um número reduzido de artigos oferecidos por um vendedor que claramente não actue no âmbito de uma actividade comercial.

5)      Sempre que um comerciante que explora um sítio de comércio electrónico adquira junto de um operador de um motor de busca o uso de um sinal, como palavra‑chave, que é idêntico a uma marca registada, de forma que o sinal é exibido aos utilizadores pelo motor de busca num link patrocinado que conduz até ao sítio Internet do operador do sítio de comércio electrónico, a exibição do sinal no link patrocinado constitui um «uso» do sinal na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 40/94.

6)      Sempre que o link patrocinado mencionado no ponto 5 supra conduza directamente o utilizador até anúncios publicitários ou ofertas de venda de produtos idênticos àqueles para os quais a marca está registada sob o sinal colocado no sítio Internet por terceiros, alguns dos quais violam a marca enquanto outros não a violam devido aos diferentes estatutos dos respectivos produtos, tal facto constitui um uso do sinal por parte do operador de um sítio de comércio electrónico «para» os produtos em infracção, na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 40/94, mas não tem um efeito prejudicial nas funções da marca, desde que um consumidor médio razoável compreenda, com base na informação incluída no link patrocinado, que o operador do sítio de comércio electrónico armazena no seu sistema anúncios ou ofertas de venda de terceiros.

7)      Quando os produtos colocados à venda num sítio de comércio electrónico ainda não tenham sido colocados no mercado no EEE, através ou com o consentimento do titular da marca, é suficiente, para a aplicação do direito exclusivo conferido pela marca nacional ou comunitária, a demonstração de que o anúncio publicitário é dirigido a consumidores no território coberto pela marca.

8)      Se o uso denunciado pelo titular do direito da marca consistir na exibição do sinal no próprio sítio Internet do operador do sítio de comércio electrónico e não num link patrocinado no sítio Internet de um operador de um motor de busca, o sinal não é usado pelo operador do sítio de comércio electrónico «para» produtos em infracção na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 e do artigo 9.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 40/94.

9) a) O uso referido no ponto 5 não inclui ou consiste no «armazenamento» pelo operador de um sítio de comércio electrónico «de informações prestadas por um destinatário do serviço», na acepção do artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno, mas o uso referido no ponto 6 pode incluir ou consistir num tal armazenamento.

9) b) Sempre que o uso não consistir, exclusivamente, em actividades abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31, mas incluir tais actividades, o operador do sítio de comércio electrónico está isento de responsabilidade na medida em que o uso consista em tais actividades, mas poderá haver lugar ao pagamento de uma indemnização por perdas e danos ou a outras compensações financeiras, nos termos do direito nacional, em consequência de tal uso na medida em que este não esteja isento de responsabilidade.

9) c) Existe «conhecimento efectivo» da actividade ou informação ilegal ou «conhecimento» de factos ou de circunstâncias na acepção do artigo 14.°, n.° 1, da Directiva 2000/31, quando o operador do sítio de comércio electrónico tenha conhecimento de que, no seu sítio Internet, foram anunciados, colocados à venda e vendidos produtos em violação de uma marca registada, e de que é provável que a violação de tal marca registada continue a verificar‑se através da publicidade, das ofertas para venda e da venda dos mesmos produtos, ou de produtos semelhantes, pelo mesmo utilizador do sítio Internet.

10)      Sempre que os serviços de um intermediário, como um operador de um sítio Internet, tenham sido utilizados por um terceiro para violar uma marca registada, o artigo 11.° da Directiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual, exige que os Estados‑Membros assegurem que o titular da marca pode obter uma medida inibitória eficaz, dissuasiva e proporcionada, contra o intermediário, para impedir a continuação ou repetição da referida violação pelo referido terceiro. As condições e procedimentos de tais medidas inibitórias estão definidos na legislação nacional.»


1 – Língua original: inglês.


2 – Acórdão de 23 de Março de 2010, Google France e Google (C‑236/08 a C‑238/08, Colect., p. I-0000).


3 – Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), conforme alterada.


4 – Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno (JO L 178, p. 1), conforme alterada.


5 – Directiva 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (JO L 157, p. 45, e rectificativo no JO L 195, p.16)


6 – Directiva 76/768/CEE do Conselho, de 27 de Julho de 1976, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos produtos cosméticos (JO L 262, p. 169, EE 15 F1 p. 206), conforme alterada.


7 – O pedido de decisão prejudicial não inclui nenhuma descrição de disposições concretas da legislação do Reino Unido. No seu acórdão de 22 de Maio de 2009 (a seguir «acórdão da High Court»), a High Court explicou que o processo não envolvia nenhuma questão específica de interpretação da legislação nacional. Por conseguinte, entendo que não é necessário reproduzir as disposições relevantes da legislação do Reino Unido sobre marcas ou comércio electrónico.


8 – Algumas das marcas da L’Oréal são marcas comunitárias. Como não existem questões específicas relativas ao Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), basta observar que os artigos 9.°, 12.° e 13.° correspondem aos artigos 5.°, 6.° e 7.° da Directiva 89/104. O que é referido abaixo relativamente à interpretação da Directiva 89/104 aplica‑se mutatis mutandis ao Regulamento (CE) n.° 40/94.


A Directiva 89/104 e o Regulamento (CE) n.° 40/94 são aplicáveis ratione temporis, e não os textos codificados da Directiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (versão codificada) (JO L 299, p. 25), e do Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1).


9 – JO L 204, p. 37, conforme alterada pela Directiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Julho de 1998 (JO L 217, p. 18).


10 – Os artigos 12.° e 13.° da Directiva 2000/31 limitam a responsabilidade do prestador de serviços nos casos de «simples transporte» e de «armazenagem temporária (‘caching’)».


11 –      O artigo 8.°, n.° 3, da Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO L 167, p. 10) prevê: «Os Estados‑Membros deverão garantir que os titulares dos direitos possam solicitar uma injunção contra intermediários cujos serviços sejam utilizados por terceiros para violar um direito de autor ou direitos conexos.»


O considerando 59 da Directiva 2001/29 tem o seguinte teor: «Nomeadamente no meio digital, os serviços de intermediários poderão ser cada vez mais utilizados por terceiros para a prática de violações. Esses intermediários encontram‑se frequentemente em melhor posição para porem termo a tais actividades ilícitas. Por conseguinte, sem prejuízo de outras sanções e vias de recurso disponíveis, os titulares dos direitos deverão ter a possibilidade de solicitar uma injunção contra intermediários que veiculem numa rede actos de violação de terceiros contra obras ou outros materiais protegidos. Esta possibilidade deverá ser facultada mesmo nos casos em que os actos realizados pelos intermediários se encontrem isentos ao abrigo do artigo 5.° As condições e modalidades de tais injunções deverão ser regulamentadas nas legislações nacionais dos Estados‑Membros.» (O sublinhado é meu).


12 – Recordo que o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104 não está limitado às marcas prestigiadas ou únicas, mas é aplicável a todos os tipos de marcas. Assim, na interpretação do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), o Tribunal de Justiça deve evitar a adopção de soluções que poderiam parecer justificadas no contexto de marcas prestigiadas únicas, mas que criariam uma esfera de protecção demasiado ampla nos outros casos.


13 – O código de identificação do utilizador funciona como um identificador único no sistema informático do eBay. Também pode ser utilizado como uma forma de pseudónimo que permite ao utilizador ocultar a sua identidade, enquanto não for concluída a transacção. Os vendedores profissionais são obrigados a fornecer o seu nome e endereço antes deste momento, mas os vendedores particulares, não. Um único particular pode criar múltiplas contas de vendedor com vários códigos de identificação do utilizador, mas o eBay pode procurar diferentes contas operadas por uma mesma pessoa.


14 – Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o eBay Europe adquiriu palavras‑chave que consistem em certas marcas («marcas Link»), as quais activam links patrocinados em motores de busca de terceiros, incluindo o Google, o MSN e o Yahoo. O efeito disto é que uma busca, por exemplo no Google, que utilize uma das marcas Link, faz exibir um link patrocinado para o sítio do eBay. Se o utilizador clicar no link patrocinado, será dirigido para um ecrã, no sítio Internet do eBay, dos resultados da busca de produtos com base na marca Link. O eBay Europe escolhe as palavras‑chave tendo em conta a actividade do seu sítio Internet no Reino Unido.


15 – No acórdão Google France e Google, o Tribunal de Justiça caracterizou o serviço remunerado de referenciamento denominado «AdWords» do Google, nos seguintes termos: «Este serviço permite aos operadores económicos, mediante a selecção de uma ou várias palavras‑chave, fazer aparecer, em caso de concordância entre essa palavra ou essas palavras e a palavra ou as palavras constantes da pesquisa lançada por um internauta no motor de busca, um link publicitário para o seu sítio. Este link publicitário aparece na rubrica ‘links patrocinados’, no lado direito do ecrã, à direita dos resultados naturais, ou na parte superior do ecrã, por baixo dos referidos resultados. […] Esse link publicitário é acompanhado de uma curta mensagem comercial. Constitui, juntamente com a mensagem, o anúncio que aparece na rubrica acima referida.»


16 – Para simplificar, utilizarei a expressão «produtos em infracção» embora esteja perfeitamente consciente de que os produtos enquanto tais não são nem o sujeito nem o objecto directo da violação da marca, que é um acto que consiste no uso ilícito de um sinal, em circunstâncias em que o titular da marca tem direito a proibir a sua utilização.


17 – Quanto aos sete indivíduos que eram demandados no processo nacional, para além das três filiais do eBay, a L’Oréal realizou um acordo com os quarto a oitavo demandados e obteve a condenação à revelia do nono e décimo demandados. Por conseguinte, não parece ser necessário incluir os nomes destes indivíduos como partes neste processo prejudicial.


18 – O eBay poderia, por exemplo, filtrar os anúncios antes de estes serem publicados no sítio Internet, utilizar filtros adicionais, exigir dos vendedores a revelação dos seus nomes e endereços no momento da elaboração dos anúncios, impor restrições adicionais aos volumes dos produtos de alto risco, adoptar regras de funcionamento para combater outros tipos de violação que não são agora abordados e, nomeadamente, a venda de produtos provenientes de países que não pertencem ao EEE sem o consentimento dos titulares das marcas, e aplicar sanções de forma mais rigorosa.


19 – V., por exemplo, acórdãos de 12 de Novembro de 2002, Arsenal Football Club (C‑206/01, Colect., p. I‑10273; de 25 de Janeiro de 2007, Adam Opel (C‑48/05, Colect., p. I‑1017); de 11 de Setembro de 2007, Céline (C‑17/06, Colect., p. I‑7041); de 12 de Junho de 2008, O2 Holdings & O2 (UK) (C‑533/06, Colect., p. I‑4231); de 18 de Junho de 2009, L’Oréal e o. (C‑487/07, Colect., p. I‑5185); Google France e Google, já referido; de 25 de Março de 2010, BergSpechte (C‑278/08, Colect., p. I-0000); de 26 de Março de 2010, Eis.de (C‑91/09, Colect., p. I-0000); e de 8 de Julho de 2010, Portakabin (C‑558/08, Colect., p. I-0000).


20 – Não existe consenso terminológico ou substancial quanto ao modo como as «funções» da marca devem ser entendidas. O mesmo se aplica às relações conceptuais existentes entre as diversas funções, nomeadamente a questão de saber se algumas (ou todas) as funções podem efectivamente ser consideradas incluídas na função essencial da marca, que é garantir aos consumidores a proveniência do produto ou do serviço. O Tribunal de Justiça identificou, como outras funções da marca, a que consiste em garantir a qualidade desse produto ou desse serviço, ou as de comunicação, de investimento ou de publicidade (v. L’Oréal e o., n.° 58). A seguir, utilizarei os termos função de origem, função de qualidade, função de comunicação, função de publicidade e função de investimento.


21 – V. Breitschaft, A., «Intel, Adidas & Co – is the jurisprudence of the European Court of Justice on dilution law in compliance with the underlying rationales and fit for the future?», European Intellectual Property Law Review 2009, 31(10), pp. 497‑504, p. 498. O autor considera que a legislação da União Europeia é susceptível de críticas pelo facto de conceder aos titulares das marcas prestigiadas uma espécie de monopólio sobre a exploração dos seus sinais, embora o direito das marcas não tivesse sido originalmente concebido para conceder um direito de propriedade intelectual exclusivo, como o direito das patentes ou dos direitos de autor.


22 – Para uma análise mais aprofundada destes aspectos, v. as conclusões do advogado‑geral Poiares Maduro, apresentadas em 22 de Setembro de 2009, no processo Google France e Google, n.os 101 a 112.


23 – À medida que a protecção jurídica das marcas de prestígio é reforçada, torna‑se cada vez mais importante assegurar que a liberdade de expressão na paródia, expressão artística, crítica do consumismo e troça dos estilos de vida relacionados com as marcas não seja indevidamente entravada. O mesmo se aplica quanto ao debate sobre a qualidade dos produtos e serviços. V., a este respeito, Senftleben, M., «The Trademark Tower of Babel – Dilution Concepts in International, US and EC Trademark Law», International review of intellectual property and competition law, vol. 40 (2009), n.° 1, pp. 45 a 77, pp. 62 a 64.


24 – V. nº 75 das conclusões do advogado‑geral S. Alber no processo Karner (acórdão de 25 de Março de 2004, C‑71/02, Colect., p. I‑3025), e TEDH, acórdãos Markt Intern Verlag GmbH e Klaus Beermann c. Alemanha de 20 de Novembro de 1989, série A, n.° 165, §§ 25 e 26, e , Casado Coca c. Espanha de 24 de Fevereiro de 1994, série A, n.° 285, §§ 35 e 36.


25 – O acórdão da High Court refere compras «teste» de produtos da L’Oréal efectuadas no sítio de comércio electrónico do eBay. Pode‑se referir, a título indicativo, uma série de compras «teste», cujo resultado foi o de que 70 % dos produtos não se destinavam a ser vendidos no EEE (sendo produtos contrafeitos, produtos provenientes de países não pertencentes ao EEE ou produtos do EEE não destinados a venda). Foram registados números de magnitude semelhante noutros contextos. A título comparativo, no litígio entre a eBay e a Tiffany Inc., constatou‑se que cerca de 75 % dos produtos «Tiffany» comercializados no sítio de comércio electrónico da eBay eram contrafeitos [v. Tiffany (NJ) Inc. v eBay Inc., United States District Court, Southern District of New York, n.º 04 Civ. 4607 RJS, 576 F.Supp.2d 463 (2008), acórdão de 14 de Julho de 2008, p. 20, confirmado em recurso, em 1 de Abril de 2010, pelo Second Circuit (tribunal de segunda instância), salvo no que diz respeito à alegação de publicidade falsa, que foi anulada e reenviada para novo julgamento, v. Tiffany (NJ) Inc. v. eBay, Inc., 600 F.3d 93, 114 (2d Cir.2010) (Tiffany II)].


26 – Tanto quanto sei, a questão da responsabilidade de um sítio Internet de comércio electrónico pela violação de marcas já foi apreciada, entre outros, por tribunais belgas, franceses, alemães, do Reino Unido e dos EUA.


27 – Uma vez que os acordos de distribuição selectiva são contratuais, não vinculam terceiros. Por conseguinte, a protecção da marca também se esgota nos casos em que um distribuidor, membro de uma tal rede, venda produtos protegidos a um terceiro, em violação dos termos do contrato de distribuição celebrado entre si e o titular da marca. O Tribunal de Justiça concluiu, no acórdão de 30 de Novembro de 2004, Peak Holding (C‑16/03, Colect., p. I‑11313, n.° 56) que não obsta a esse esgotamento o facto de a revenda no EEE se ter verificado em violação da proibição prevista num contrato de venda.


28 – Por exemplo, um caso em que A produz e rotula produtos com a marca de um terceiro sem consentimento e B coloca os produtos no mercado.


29 – A High Court caracteriza esta situação como uma «responsabilidade acessória» ao abrigo do direito inglês. Em alguns sistemas jurídicos, também se poderia falar de infracções indirectas, por comparação com as infracções directas do principal infractor.


30 – Contudo, o Regulamento (CE) n.° 3295/94 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, que estabelece medidas destinadas a proibir a introdução em livre prática, a exportação, a reexportação e a colocação sob um regime suspensivo das mercadorias de contrafacção e das mercadorias‑pirata (JO L 341, p. 8, conforme alterado) proíbe, designadamente, a introdução em livre prática, a exportação e a reexportação das mercadorias de contrafacção e das mercadorias‑pirata.


31 – O conceito alemão de Störerhaftung pode ser descrito como a responsabilidade de um «perturbador» ou «interferente», ou como a responsabilidade pela perturbação. O conceito de Störerhaftung está ligado a uma violação de direitos, mas sem responsabilidade civil. Pode dar origem a uma medida inibitória contra o «perturbador», apesar de não ser concedida uma indemnização pelos danos. V. Rühmkorf, A., «The Liability of online auction portals: Toward a Uniform Approach?», 14 n.° 4 Journal of Internet Law, Outubro de 2010, p. 3.


32 – Quanto à contribuição para a violação de uma marca registada, nos Estados Unidos, v. as conclusões do advogado‑geral M. Poiares Maduro, apresentadas em 22 de Setembro de 2009 no processo Google France e Google (C‑236/08 a C‑238/08, Colect., p. I-0000), já referido na nota 19.


33 – Para uma síntese da jurisprudência recente, v. Rühmkorf, op.cit. e Cheung, A.S.Y. – Pun, K.K.H., «Comparative study on the liability for trade mark infringement of online auction providers», European Intellectual Property Review 2009, 31(11), pp. 559‑567 e Bagnall, M., Fyfield, D., Rehag, C.; e Adams, M., «Liability of Online Auctioneers: Auction Sites and Brand Owners Hammer It Out», INTA Bulletin vol. 65, n.° 1, (1 de Janeiro de 2010), pp. 5‑7. V., também, «Report on Online auction sites and trademark infringement liability», pelo Trademarks and Unfair Competition Committee da New York City Bar Association, disponível em www.abcny.org.


34 – Recordo, no entanto, que no seu acórdão de 22 de Maio de 2009, a High Court excluiu a responsabilidade acessória do eBay, nos termos do direito inglês, com base nos fundamentos da responsabilidade invocados pela L’Oréal, a saber a responsabilidade solidária por factos ilícitos (joint tortfeasorship) constituídos pela instigação ao crime (procurement) e a associação criminosa (participation in a common design).


35 – V. acórdão de 20 de Março de 2003, LTJ Diffusion (C‑291/00, Colect., p. I‑2799, n.os 50 a 54). Na minha opinião, as diferenças entre marcas puramente nominativas e marcas nominativas estilizadas ou marcas figurativas em que o elemento nominativo é dominante são sempre significativas. Se não fosse assim, não haveria motivo para registar separadamente as marcas destas últimas categorias.


36 – Segundo as directivas relativas aos processos no IHMI (parte C: Oposição; parte 2, capítulo 1 – Identidade; versão final Novembro de 2007), as marcas nominativas são marcas constituídas por letras, números e outros sinais reproduzidos na tipografia normal utilizada pelo respectivo escritório. Isto significa que, no que se refere a estas marcas, não se exige nenhum elemento figurativo ou aparência especial. Além disso, as diferenças no uso das letras minúsculas ou maiúsculas são irrelevantes (v. ponto 3.2). Quanto às marcas figurativas, as directivas indicam que se numa das marcas i) a tipografia utilizada for distintiva, por exemplo uma tipografia em «itálico», de forma que a aparência global da marca nominativa passe a ser a de uma marca figurativa, ii) se utiliza uma tipografia normal sobre um fundo figurativo (a cor) ou iii) uma tipografia normal representada com letras coloridas, e a outra marca é uma marca nominativa, não existe identidade (v. ponto 3.3 com exemplos).


37 – V. acórdãos Arsenal (já referido na nota 19, n.° 51); de 16 de Novembro de 2004, Anheuser‑Busch (C‑245/02, Colect., p. I‑10989, n.° 59); Adam Opel (já referido na nota 19, n.os 18 a 22); e Céline (já referido na nota 19, n.° 16).


38 – O Tribunal de Justiça decidiu que o uso de um sinal ocorre na vida comercial, quando se situa no contexto de uma actividade comercial que visa um proveito económico e não no domínio privado. V. acórdão Arsenal, n.° 40.


39 – A High Court é de opinião de que a sexta condição é supérflua e cria confusão (v. acórdão de 22 de Maio de 2009, n.os 288 e 300 a 306). A doutrina também critica a recente jurisprudência do Tribunal de Justiça, pela sua incoerência ou dificuldade de aplicação. Embora compreenda, até um certo ponto, tais preocupações, penso não ser necessário entrar nesse debate nas circunstâncias muito específicas do presente pedido de decisão prejudicial, relativo a um sítio de comércio electrónico.


40 – Acórdão de 3 de Junho de 2010, Coty Prestige Lancaster Group (C‑127/09, Colect., p. I-0000).


41 – Acórdão Coty Prestige Lancaster Group (já referido, n.° 48).


42 – V. acórdão de 26 de Abril de 2007, Boehringer Ingelheim e o. (C‑348/04, Colect., p. I‑3391, n.os 40 e 43).


43 – Acórdão de 11 de Julho de 1996, Bristol‑Myers Squibb e o. (C‑427/93, C‑429/93 e C‑436/93, Colect., p. I‑3457).


44 – V., quanto à natureza especial desses produtos no direito das marcas, o acórdão de 4 de Novembro de 1997, Parfums Christian Dior (C‑337/95, Colect., p. I‑6013, n.os 42 a 44).


45 – Segundo o despacho de reenvio, o presente processo tem a ver com o facto de o eBay proibir a venda de produtos cosméticos desembalados a compradores da Alemanha, mas não a compradores de outros Estados‑Membros.


46 – V. conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl, apresentadas em 5 de Abril de 2001, no processo Zino Davidoff e Levi Strauss (acórdão de 20 de Novembro de 2001, C‑414/99, C‑415/99 e C‑416/99, Colect., p. I‑8691, n.os 120 e 121).


47 – Contudo, a distinção feita pelo eBay entre vendedores profissionais e outros não coincide necessariamente com o conceito «na vida comercial».


48 – V., por exemplo, acórdão LTJ Diffusion, n.os 48 a 50.


49 – Na minha opinião, o utilizador poderia exercer o seu ónus da prova demonstrando, por exemplo, que a marca é relativamente desconhecida e que as embalagens exteriores não incluem nenhuma informação relevante para os consumidores.


50 – Acórdão Google France e Google, n.° 2 da parte dispositiva e n.° 99 do acórdão.


51 – Acórdão Google France e Google, n.° 1 da parte dispositiva e n.° 99 do acórdão.


52 – Importa observar que os motores de busca na Internet não executam as operações de busca em toda a Internet, mas nas suas bases de dados de páginas de Internet armazenadas nos servidores do operador em questão. Isto explica, em parte, por que motivo a mesma palavra‑chave pode conduzir, e normalmente conduz, a listas de links «espontâneas» diferentes nos diferentes motores de busca.


53 – Que o uso deve fazer‑se na vida comercial; que o uso deve fazer‑se sem o consentimento do titular da marca; e que o sinal deve ser idêntico à marca.


54 – A função de identificação ou a função da marca de distinção entre produtos e serviços não é normalmente separada da função de origem. Contudo, a capacidade da marca para distinguir produtos e serviços de outros produtos ou serviços também pode ser utilizada para fins diferentes dos da indicação da origem. Por exemplo, no manual de um dispositivo de controlo remoto universal as marcas podem ser utilizadas para indicar os produtos que são compatíveis com o dispositivo. V. na doutrina escandinava, a este respeito, Pihlajarinne, T., Toisen tavaramerkin sallittu käyttö [Uso permitido de marca alheia], Lakimiesliiton kustannus, Helsínquia 2010, pp. 47‑48.


55 – Acórdão Google France e Google, n.os 68 e 69.


56 – Acórdão Google France e Google, n.° 82.


57 – Acórdão Google France e Google, n.os 83 e 84.


58 – Acórdão Google France e Google, n.os 91 a 98. Quanto à função de comunicação, parece que, na doutrina, os elementos desta função são em grande medida abrangidos pela função de distinção e de origem, pela função de publicidade e pela função de investimento. Portanto, não é necessário abordá‑la separadamente aqui.


59 – Acórdão Portakabin, n.° 91.


60 – O Tribunal de Justiça confirmou no acórdão Dior e o. (n.° 38) que, depois de o direito sobre a marca se ter esgotado, um revendedor tem a faculdade não só de revender esses produtos, mas também de utilizar a marca para anunciar ao público a comercialização posterior desses produtos. V., ainda, acórdão de 23 de Fevereiro de 1999, BMW (C‑63/97, Colect., p. I‑905, n.° 54).


61 – V. acórdão Google France e Google, n.os 55 e 56. Todavia, a conclusão de que o prestador do serviço de referenciamento não faz um uso na vida comercial (n.os 57 e 58) não se pode aplicar às actividades dos operadores de sítios de comércio electrónico relacionadas com os seus próprios sítios Internet.


62 – V. acórdão de 31 de Março de 1993, Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão (C‑89/85, C‑104/85, C‑114/85, C‑116/85, C‑117/85 e C‑125/85 a C‑129/85, Colect., p. I‑1307, n.os 12 a 14).


63 – V. conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak, apresentadas em 18 de Maio de 2010, no processo Pammer (acórdão de 7 de Dezembro de 2010, C‑585/08, ainda não publicado na Colectânea), e no processo Hotel Alpenhof (C‑144/09).


64 – http://www.wipo.int/about‑ip/en/development_iplaw/pub845.htm


65 – V., nota 33, supra.


66 – Observo que, embora esta directiva tenha sido adoptada há cerca de 10 anos, o número de acórdãos do Tribunal de Justiça que interpretaram as suas disposições é reduzido.


67 – V. Relatório da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu: Primeiro Relatório sobre a aplicação da Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 8 de Junho de 2000 relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno (Directiva sobre comércio electrónico [COM (2003) 702 final]).


68 – V. Sorvari, K., Vastuu tekijänoikeuden loukkauksesta erityisesti tietoverkkoympäristössä, [Responsabilidade pela violação dos direitos de autor na Internet] WSOY, Helsínquia 2005, pp. 513‑526; o autor analisa a aplicação da Directiva 2000/31 na Alemanha, Suécia e Finlândia.


69 – Acórdão Google France e Google, n.os 113 e 114.


70 – Este foi um factor essencial para os tribunais alemães, quando excluíram a responsabilidade criminal e civil dos operadores de sítios de comércio electrónico pelos anúncios em infracção, e limitaram a sua responsabilidade à prevenção de futuras violações dentro de limites razoáveis, tendo em conta o seu modelo de empresa definido na medida inibitória decretada pelo tribunal. V. Rühmkorf, A., ‘eBay on the European Playing Field: A Comparative Case Analysis of L’Oréal v eBay’, (2009) 6:3 SCRIPTed 685, p. 694, http://www.law.ed.ac.uk/ahrc/script‑ed/vol6‑3/ruhmkorf.asp.


71 – O considerando 40 da Directiva 2000/31 refere que as disposições desta relativas à responsabilidade não devem constituir obstáculo ao desenvolvimento e aplicação efectiva, pelas diferentes partes envolvidas, de sistemas técnicos de protecção e identificação, bem como de instrumentos de controlo técnico, que a tecnologia digital permite, dentro dos limites previstos pela Directiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (JO L 281, p. 31), e pela Directiva 97/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 1997, relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das telecomunicações (JO 1998, L 24, p. 1).


72 – Um operador pode, por exemplo, vender aos seus clientes pacotes compostos pelo fornecimento do acesso à Internet, capacidade do servidor para a página web do próprio cliente e um endereço de correio electrónico (fornecimento de serviços) e a própria página web do prestador de serviços com todos os diferentes serviços acessíveis a partir do portal do operador como página inicial (fornecimento de conteúdos). V. Sorvari, K., op.cit., p. 66. Neste exemplo, para além do «simples transporte» e da armazenagem temporária (caching), o operador também oferece armazenagem em servidor e fornecimento de conteúdos.


73 – Para uma avaliação das consequências do programa VeRO do eBay, em relação ao comércio jurídico, v. Pilutik, S., «eBay’s Secondary Trademark Liability Problem and its VeRO Program», publicado em http://www.cs.cmu.edu/~dst/Secrets/E‑Meter/eBay‑VERO‑pilutik.html.


74 – Esta exigência foi confirmada pela Comissão de Direito Constitucional do Parlamento finlandês, v. parecer PeVL 60/2001 vp – HE 194/2001 vp.


75 – Observo que, nas suas alegações, o eBay refere que os procedimentos específicos de «notificação e remoção» só foram disponibilizados na Finlândia, França e Espanha.


76 – V. Sorvari, op. cit., pp. 521‑523, e a lei sobre a prestação de serviços da sociedade da informação (Finlândia) («laki tietoyhteiskunnan palvelujen tarjoamisesta») de 5 de Junho de 2002/458, artigos 15.°, 16.° e 20.° a 25.°, disponível em inglês em www.finlex.fi/en


77 – É óbvio que existe aqui uma ligação à forma como a noção de violação é interpretada no direito nacional, ainda que as noções utilizadas no artigo 14.°, n.°1, alínea a), da Directiva 2000/31 devam ter um significado de direito da UE autónomo independente dos conceitos de direito criminal e de responsabilidade extracontratual nacionais. Por exemplo: constitui uma ou várias infracções o facto de A vender sem o consentimento do titular da marca i) produtos idênticos a diversos clientes, ii) produtos semelhantes mas não idênticos abrangidos pela mesma marca ou iii) se a actividade de venda se prolongar por um determinado período de tempo e for constituída por diferentes transacções?


78 – A High Court alega que esta disposição não deu origem a nenhuma transposição concreta uma vez que se considerou que a lei existente era conforme à mesma. O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à correcção desta conclusão.


79 – V. Norrgård, M., ‘The Role Conferred on the National Judge by Directive 2004/48/EC on the Enforcement of Intellectual Property Rights’, ERA Forum 4/2005, p. 503.


80 – V. considerandos 22, 23, 24, 25 e o artigo 11.° da Directiva 2004/48.


81 – A exigência de que o terceiro infractor fosse o mesmo significaria, essencialmente, a mesma identidade baseada na identificação do utilizador no sistema dos prestadores de serviços, caso aplicável. Além disso, poderá ser necessária a adopção de medidas razoáveis por parte do prestador de serviços para descobrir a verdadeira identidade de um utilizador que se esconde por trás de diversas identificações de utilizador: isto não constituiria uma obrigação geral de vigilância proibida pelo artigo 15.°, n.° 1, da Directiva 2000/31, mas uma obrigação aceitável de vigilância específica.


82 – V., também, os três casos alemães, vulgarmente conhecidos como «Internet Auction I, II e III», BGH I ZR 304/01, de 11 de Março de 2004 [em inglês em (2006) European Commercial Cases, parte I, 9]; BGH I ZR 35/04, de 19 de Abril de 2007 [em inglês em (2007) European Trade Mark Reports, parte 11, p. 1] e BGH I ZR 73/05, de 30 de Abril de 2008. O tribunal decidiu que os operadores de sítios de comércio electrónico beneficiavam da isenção da responsabilidade estabelecida no artigo 14.° da Directiva 2000/31. Contudo formularam critérios extensivos relativos a medidas inibitórias contra os operadores que, quanto ao seu âmbito de aplicação, podem suscitar algumas questões de compatibilidade com a Directiva 2000/31.