Language of document : ECLI:EU:C:2018:995

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

ELEANOR SHARPSTON

apresentadas em 6 de dezembro de 2018 (1)

Processo C566/17

Związek Gmin Zagłębia Miedziowego w Polkowicach

contra

Szef Krajowej Administracji Skarbowej

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Wojewódzki Sąd Administracyjny we Wrocławiu (Tribunal Administrativo da Província de Wroclaw) (Polónia)]

«Reenvio prejudicial — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado — Direito à dedução do imposto pago a montante sobre a entrega de bens e a prestação de serviços utilizados de modo indissociável para efeitos de atividades económicas e não económicas — Determinação da parte dedutível do imposto pago a montante — Princípio da neutralidade fiscal — Questão de saber se, e em que medida, o cálculo do imposto a montante deve ser previsto por lei — Inexistência de normas nacionais sobre os métodos de repartição do imposto pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos de atividades económicas e não económicas»






1.        O presente pedido de decisão prejudicial surge no contexto de um litígio relativo ao âmbito do direito à dedução do IVA pago a montante sobre os bens e serviços utilizados por sujeitos passivos, de modo indissociável, para efeitos das suas atividades, tanto económicas como não económicas.

2.        Embora pareça decorrer da economia da Diretiva 2006/112/CE (2) que tal direito só pode ser invocado na medida em que os bens e os serviços sejam utilizados para efeitos do primeiro tipo de atividade, esta diretiva não prevê métodos ou critérios de repartição do imposto pago a montante em tais situações. O órgão jurisdicional de reenvio pretende obter orientações sobre se o facto de o direito nacional também não conter normas específicas que abordem essa questão afeta a medida em que um sujeito passivo pode exercer o direito à dedução do IVA pago a montante sobre tais bens e serviços. Coloca‑se, em especial, a questão de saber se existe no direito da União um princípio geral ou um direito fundamental que se oponha a que o órgão jurisdicional nacional, em tais circunstâncias, aplique essas restrições ao direito à dedução no caso em apreço no processo principal.

 Diretiva 2006/112/CE

3.        O artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE define «sujeito passivo» como «qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade». Nos termos do artigo 13.o desta diretiva, os organismos públicos não são considerados sujeitos passivos «relativamente às atividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando, no âmbito dessas atividades ou operações, cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações».

4.        O título X da Diretiva 2006/112/CE («Deduções») está dividido em vários capítulos. O artigo 168.o, no capítulo 1, com a epígrafe «Origem e âmbito do direito à dedução», dispõe que «[q]uando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado‑Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor […] [(3)]: a) O IVA devido ou pago nesse Estado‑Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo» (4).

5.        No capítulo 2 («Pro rata de dedução»), o artigo 173.o, n.o 1, dispõe que, «[n]o que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efetuar tanto operações com direito à dedução […] como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações». Este artigo especifica, além disso, que «[o] pro rata de dedução é determinado, em conformidade com [a fórmula prevista n]os artigos 174.o e 175.o» (5).

 Direito nacional

 Constituição da República da Polónia

6.        Nos termos do artigo 217.o da Constituição da República da Polónia, as medidas relativas à cobrança de impostos, incluindo a determinação dos sujeitos passivos, as taxas de imposto, bem como as regras relativas à concessão de reduções e desagravamentos e as categorias de pessoas isentas de tributação, são previstas por lei.

 Lei do IVA

7.        A Diretiva 2006/112/CE foi transposta para o ordenamento jurídico polaco através da Ustawa o podatku od towarów i usług (Lei do imposto sobre bens e serviços) de 11 de março de 2004, conforme alterada (6).

8.        O artigo 15.o, n.o 6, da Lei do IVA dispõe que não são considerados «sujeitos passivos» as autoridades públicas e os seus órgãos na medida em que exerçam funções definidas por disposições pertinentes e para cujo exercício tenham sido designados, com exceção das atividades exercidas nos termos de contratos de direito privado.

9.        O artigo 86.o, n.o 1, da Lei do IVA transpõe para a ordem jurídica interna o artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE. Dispõe que, «[q]uando os bens e serviços sejam utilizados para a prática de operações sujeitas a tributação, [um] sujeito passivo na aceção do artigo 15.o tem o direito de deduzir do valor do imposto devido o valor do imposto pago a montante […]» (sublinhado meu).

10.      O artigo 90.o, n.os 1 a 3, da Lei do IVA reflete os artigos 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112/CE, na medida em que estas disposições regulamentam o pro rata da dedução do IVA relativamente a bens e serviços utilizados por um sujeito passivo tanto para atividades económicas que conferem direito à dedução do IVA como para atividades quanto às quais o IVA não é dedutível.

11.      A partir de 1 de janeiro de 2016, foram aditados ao artigo 86.o da Lei do IVA os n.os 2a a 2h. Estas disposições contêm uma lista não exaustiva dos métodos que um sujeito passivo pode utilizar para determinar o pro rata de dedução do IVA pago a montante relativamente a bens e serviços utilizados tanto para efeitos das atividades tanto económicas como não económicas desse sujeito passivo.

 Matéria de facto, tramitação processual e questão prejudicial

12.      A Związek Gmin Zagłębia Miedziowego w Polkowicach (a seguir «União de Municípios») é uma entidade de direito público à qual vários municípios confiaram a tarefa de dar cumprimento à sua obrigação legal de gestão dos resíduos que lhes incumbe nas zonas geográficas pelas quais são individualmente responsáveis. A União de Municípios recebe uma taxa de gestão de resíduos em contrapartida do cumprimento desta obrigação. Nos termos do direito nacional, a União de Municípios não é considerada sujeito passivo neste domínio e as suas atividades não são, por conseguinte, sujeitas a IVA.

13.      Entre 2013 e 2015, a União de Municípios prestou serviços adicionais, a título oneroso, que consistiam na disponibilização e transporte de contentores para vários tipos de resíduos. A prestação destes serviços constitui uma atividade económica para efeitos da Diretiva 2006/112/CE. Alguns destes serviços estão sujeitos a IVA a diferentes taxas, ao passo que outros estão isentos de IVA.

14.      Durante esse período, a União de Municípios efetuou investimentos e despesas correntes. Algumas dessas despesas respeitavam a bens e serviços adquiridos tanto para as suas atividades económicas como para as não económicas.

15.      A União de Municípios tinha dúvidas quanto à forma correta de calcular o pro rata da dedução do IVA pago a montante sobre tais bens e serviços. Consequentemente, apresentou ao Szef Krajowej Administracji Skarbowej (Diretor da Administração Fiscal, Polónia) (7) um pedido de informação vinculativa sobre a sua situação nos termos das regras do IVA.

16.      Em 17 de outubro de 2016, o Diretor da Administração Fiscal (8) declarou que, para determinar o pro rata da dedução do imposto pago a montante, a União de Municípios devia, em primeiro lugar, determinar o pro rata do imposto pago a montante associado à sua atividade económica, ou seja, às operações sujeitas a IVA ou dele isentas e, em segundo lugar, uma vez que algumas das suas atividades estavam isentas de IVA, aplicar ao montante assim obtido a fórmula estabelecida no artigo 90.o da Lei do IVA. O Diretor da Administração Fiscal declarou igualmente que a escolha do método de cálculo era da exclusiva responsabilidade do sujeito passivo.

17.      A União de Municípios recorreu desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio. Alegou que a Lei do IVA não prevê qualquer repartição inicial do IVA pago a montante e que, por conseguinte, o seu direito à dedução de tal imposto só pode estar submetido à aplicação da fórmula definida no artigo 90.o da Lei do IVA.

18.      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio afirma que, à data dos factos, o ordenamento jurídico nacional não continha normas que estabelecessem critérios ou métodos de cálculo do pro rata da dedução do IVA pago a montante relativamente a bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos das atividades tanto económicas como não económicas de um sujeito passivo. O órgão jurisdicional de reenvio indica que, no caso das pessoas coletivas que exerçam funções de direito público previstas por lei, embora só uma pequena parte desses bens e serviços se destine efetivamente a uma atividade económica, sendo a parte restante utilizada para atividades que não são abrangidas pelo âmbito da Diretiva 2006/112/CE, a inexistência de tais normas conduziu à prática administrativa de lhes reconhecer o direito à dedução da totalidade do IVA pago a montante sobre tais bens e serviços (9). O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que esta prática foi desenvolvida com base no Acórdão do Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo, Polónia), de 24 de outubro de 2011 (10), em conjugação com o princípio, enunciado no artigo 217.o da Constituição da República da Polónia, segundo o qual o direito de cobrar impostos e taxas é da exclusiva competência do legislador.

19.      Nestas circunstâncias, o órgão jurisdicional de reenvio suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 168.o, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE […] e o princípio da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado opõem‑se a uma prática nacional que concede o pleno direito à dedução do imposto pago a montante sobre bens e serviços utilizados tanto para efeito de operações sujeitas a IVA (tributadas e isentas) como para efeito de operações que não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA, uma vez que o direito nacional não prevê quaisquer métodos ou critérios de repartição do imposto pago a montante sobre as referidas operações?»

20.      A União de Municípios, a República da Polónia e a Comissão apresentaram observações escritas. Na audiência de 20 de setembro de 2018, foram apresentadas alegações orais por todas as partes, bem como pelo recorrido no processo principal.

 Observações preliminares

21.      Como expliquei atrás (11), a principal obrigação legal da União de Municípios é a prestação de serviços de interesse público. O órgão jurisdicional de reenvio salienta, com razão, que tais atividades não constituem uma atividade económica na aceção do artigo 9.o da Diretiva 2006/112/CE e não são abrangidas pelo seu âmbito de aplicação. Por conseguinte, nos termos do seu artigo 13.o, a União de Municípios não é um sujeito passivo para este efeito.

22.      Resulta do despacho de reenvio que apenas uma parte residual das atividades da União de Municípios é de natureza económica, na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE e que, por conseguinte, a mesma só é considerada sujeito passivo para efeitos desta diretiva no que respeita a estas últimas atividades.

23.      A União de Municípios não cobra IVA a jusante sobre os serviços que presta no âmbito da sua missão de interesse público. Pelo contrário, tem a obrigação de acrescentar o IVA a jusante, à taxa aplicável, ao preço dos serviços adicionais que fornece aos seus clientes e cobrar‑lhes esse imposto.

24.      Os fornecedores da União de Municípios aplicam o IVA a montante às taxas aplicáveis sobre os bens e serviços que esta última adquire, independentemente da finalidade para a qual esta venha a utilizar tais bens e serviços. Podem, assim, distinguir‑se três categorias de bens e serviços: i) bens e serviços utilizados exclusivamente para efeitos da atividade económica; ii) a bens e serviços utilizados exclusivamente para efeitos da atividade de interesse público; e iii) bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos de ambos os tipos de atividades (12).

25.      No processo principal, é pacífico que o IVA pago a montante que onera a primeira categoria de bens e serviços é integralmente dedutível, ao passo que o IVA pago a montante que onera a segunda categoria de bens e serviços não é dedutível.

 Apreciação da questão prejudicial

26.      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter orientações quanto à compatibilidade com o direito da União da prática administrativa que consiste em conceder aos sujeitos passivos que exercem simultaneamente uma atividade de interesse público e uma atividade económica, tais como a União de Municípios, o direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos tanto das atividades económicas do sujeito passivo como das suas atividades não económicas (a terceira categoria acima referida).

27.      As dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio parecem decorrer da inexistência de normas, não só na Lei do IVA como também na Diretiva 2006/112/CE, que regulem esta matéria.

28.      Segundo jurisprudência constante, a Diretiva 2006/112/CE não harmoniza os métodos ou os critérios que os Estados‑Membros estão obrigados a aplicar quando adotam disposições que permitem uma repartição do IVA pago a montante consoante as correspondentes despesas digam respeito a atividades económicas ou a atividades não económicas (13).

29.      O Tribunal de Justiça declarou, em particular, que o regime de dedução proporcional previsto nos artigos 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112/CE só é aplicável a casos em que os bens e serviços são utilizados por um sujeito passivo para realizar simultaneamente operações económicas que dão direito a dedução e operações económicas que não dão direito a dedução (14). Não se destina, portanto, a ser aplicado no contexto do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável tanto para as atividades económicas de um sujeito passivo como para as suas atividades não económicas.

30.      Para respeitar a competência residual dos Estados‑Membros e por razões práticas relacionadas com a diversidade e complexidade das situações factuais, que não permitem ao Tribunal de Justiça privilegiar um método ou uma fórmula em detrimento de outro, o Tribunal de Justiça recusou‑se a substituir‑se ao legislador da União e às autoridades nacionais para determinar um método geral de cálculo do pro rata entre atividades económicas e atividades não económicas (15).

31.      Nestas condições, incumbe aos Estados‑Membros estabelecer os métodos e os critérios adequados, no respeito dos princípios subjacentes ao sistema comum do IVA, para permitir que os sujeitos passivos efetuem os cálculos necessários (16). Embora os Estados‑Membros tenham, assim, a obrigação de determinar tais métodos e critérios, gozam de um certo poder de apreciação no que toca a tais regras (17), desde que não desrespeitem a finalidade e colocação do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE na economia do IVA (18).

32.      Começarei, portanto, a minha análise pela investigação dos limites desse poder de apreciação. Fá‑lo‑ei em várias fases: em primeiro lugar, examinarei a questão de saber se a Diretiva 2006/112/CE ou o princípio da neutralidade fiscal se opõem à concessão a um sujeito passivo do direito à dedução integral do IVA pago a montante quanto a bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos tanto das suas atividades económicas como das não económicas. Se a resposta a esta questão for afirmativa, abordarei, em seguida, as implicações desta conclusão, em termos do poder de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem e das obrigações dos órgãos jurisdicionais nacionais. Por fim, examinarei a questão de saber se a União de Municípios pode, todavia, invocar outras disposições da Diretiva 2006/112/CE ou princípios gerais de direito da União para obter o direito à dedução integral.

 A Diretiva 2006/112/CE ou o princípio da neutralidade fiscal opõemse ao direito à dedução integral?

33.      Começarei por recordar as características básicas do regime do IVA, conforme são definidas pela Diretiva 2006/112/CE.

34.      O Tribunal de Justiça tem reiteradamente explicado que as «características essenciais» do IVA são as seguintes: i) a aplicação geral do IVA às transações (fornecimentos) que tenham por objeto bens ou serviços (princípio da universalidade); ii) a fixação do seu montante proporcionalmente ao preço recebido pelo sujeito passivo em contrapartida dos bens e dos serviços que forneça; iii) a cobrança do imposto em cada fase do processo de produção e de distribuição, incluindo o da venda a retalho, qualquer que seja o número de transações ocorridas anteriormente; e iv) a dedução do IVA devido por um sujeito passivo dos montantes pagos nas fases anteriores do processo de produção e de distribuição, de modo que o imposto só se aplique efetivamente, numa dada fase, ao valor acrescentado nessa fase e que a carga final desse imposto seja, em definitivo, suportada pelo consumidor, que não tem direito a deduzir o IVA a montante (19). Em termos económicos, o IVA é, portanto, um imposto geral não cumulativo, em cascata, que incide sobre o volume de negócios.

 Posição do direito à dedução do IVA a montante no sistema comum do IVA

35.      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito à dedução do IVA a montante faz parte integrante do mecanismo do IVA e constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA (20).

36.      Todavia, este direito não é autónomo, pelo que não deve ser analisado de forma isolada.

37.      Em primeiro lugar, o elemento central do sistema do IVA é que cada sujeito passivo cobra o IVA, em nome do Estado, aos seus clientes, adicionando‑o ao preço dos produtos e serviços fornecidos. Este IVA a jusante não é propriedade do sujeito passivo: por definição, tem de ser entregue ao tesouro público dentro de determinados prazos. Em segundo lugar, o sujeito passivo tem o direito de limitar o âmbito dessa obrigação apenas no caso e na medida em que tiver pago previamente o IVA a montante aos seus fornecedores, que o incluíram no preço dos seus bens ou serviços e que o cobraram, igualmente por conta do Estado.

38.      Assim se resume a própria essência do direito à dedução do IVA nos termos do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE. Pode dizer‑se que, enquanto o princípio da tributação é primário, o direito à dedução tem caráter acessório.

39.      Daqui resulta inevitavelmente que o direito à dedução se destina apenas a aliviar o sujeito passivo, enquanto cobrador de impostos por conta do Estado, do peso do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, assim, a neutralidade quanto à carga fiscal sobre todas essas atividades, independentemente dos respetivos fins ou resultados, desde que tais atividades estejam elas próprias sujeitas a IVA (princípio da neutralidade fiscal) (21).

40.      Além disso, este direito está sujeito a um certo número de condições.

41.      Observei, designadamente, nas Conclusões que apresentei no processo Stradasfalti (22) que a frase «desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das […] operações tributáveis» constante do artigo 17.o, n.o 2, da Sexta Diretiva (23) (que precedeu a Diretiva 2006/112/CE) constitui uma restrição ao âmbito de tal direito. Vários anos mais tarde, o Tribunal de Justiça confirmou expressamente a minha posição ao declarar que resulta da parte introdutória do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE, que prevê as condições de constituição e o alcance do direito a dedução, que só as operações que foram tributadas a jusante podem dar direito à dedução do IVA que tenha incidido sobre a aquisição de bens e de serviços utilizados para a realização dessas operações (24). Daqui resulta que o direito à dedução pressupõe que o próprio sujeito passivo tenha efetuado entregas de bens ou prestações de serviços tributáveis no âmbito da sua atividade económica.

42.      Daqui decorre igualmente que o facto que dá origem a esse direito não é o momento em que o IVA a montante é aplicado, mas o momento em que o sujeito passivo utiliza os bens ou serviços adquiridos a montante para efeitos da sua atividade económica. Quando os bens ou os serviços são utilizados para efeitos de operações tributáveis a jusante, a dedução do imposto que incidiu sobre os mesmos a montante torna‑se necessária a fim de evitar uma dupla tributação (25).

43.      O Tribunal de Justiça declarou reiteradamente, além disso, que o direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efetuadas com essa aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução. Assim, para o IVA ser dedutível, as operações efetuadas a montante devem apresentar um nexo direto e imediato com operações a jusante com direito a dedução (26). Na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, o sujeito passivo tem direito à dedução do IVA a montante desde que os custos dessa operação façam parte das suas despesas gerais e sejam, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens fornecidos ou dos serviços prestados pelo próprio sujeito passivo. Estes custos têm, com efeito, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo (27).

44.      Inversamente, logo que seja interrompido o nexo direto e imediato entre as despesas incorridas a montante e as atividades económicas exercidas subsequentemente pelo sujeito passivo, deixa de poder ser deduzido o IVA pago a montante. A jurisprudência do Tribunal de Justiça esclarece que é o que se passa, em particular, quando os bens ou os serviços adquiridos por um sujeito passivo são utilizados para efeitos de operações isentas ou que não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA. Nestas duas situações, não é cobrado imposto a jusante sobre estas operações e, por conseguinte, não pode ser deduzido o imposto a montante (28).

45.      A própria estrutura do sistema comum do IVA implica que a dedução do imposto a montante está associada à cobrança do imposto a jusante (29). Por conseguinte, concordo plenamente com a advogada‑geral J. Kokott no sentido de que um sujeito passivo não pode invocar o direito à dedução do imposto a montante sem pagar o imposto sobre as operações a jusante. À luz da lógica da Diretiva 2006/112/CE, esta «invocação assimétrica» fica assim, em princípio, excluída (30).

46.      Parece‑me, portanto, perfeitamente claro que a União de Municípios não pode invocar a Diretiva 2006/112/CE para obter o direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre bens e serviços adquiridos de modo indissociável para efeitos tanto das suas atividades não económicas como das suas atividades económicas.

47.      Embora esses bens e serviços apresentem um nexo com a atividade económica da União de Municípios, só uma pequena parte dos mesmos foi efetivamente utilizada para efeitos de uma atividade relativamente à qual a União de Municípios cobrava IVA a jusante.

48.      É evidente que a União de Municípios deve poder deduzir a fração correspondente do IVA pago a montante, nos termos do artigo 168.o, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE. Contudo, seria contrário ao princípio da simetria acima referido conferir à União de Municípios o direito de deduzir também a parte restante do IVA pago a montante, que não corresponde a qualquer IVA cobrado a jusante.

49.      O advogado‑geral M. Szpunar analisou as implicações da concessão de tal direito nas conclusões que apresentou no processo Český rozhlas (31). Concluiu que tal seria contrário à lógica do sistema comum do IVA e, mais especificamente, aos termos categóricos e claros do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE. Esta análise pode ser transposta para o caso em apreço.

50.      Assim, se a União de Municípios tivesse o direito de deduzir a totalidade do IVA pago a montante, esse valor excederia necessariamente, de modo considerável, o IVA cobrado a jusante. A União de Municípios teria então direito a obter o reembolso dessa diferença, ao abrigo do artigo 183.o da Diretiva 2006/112/CE (32). Em consequência desse reembolso, tanto a sua atividade económica como uma parte da sua atividade pública seriam totalmente exoneradas de IVA, apesar de, quanto a esta última atividade, a União de Municípios se encontrar no final da cadeia de operações e, por conseguinte, nos termos do artigo 13.o da Diretiva 2006/112/CE, a sua posição ser equiparada à de um consumidor final. Uma vez que o IVA a jusante não é repercutido sobre os clientes da União de Municípios no quadro da atividade de serviço público, a parte dos bens e serviços adquiridos a montante utilizados para efeitos dessa atividade permaneceria não tributada ao longo de toda a cadeia de operações. Por outras palavras, criaria uma isenção ratione personae para uma certa categoria de bens e serviços fornecidos a um sujeito passivo que exercesse tanto atividades tributáveis como não tributáveis. Tal isenção não existe na Diretiva 2006/112/CE e violaria igualmente o princípio da universalidade do IVA e a própria lógica do sistema do IVA (33).

51.      Com base nestas considerações, chego à conclusão provisória de que o artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE se opõe manifestamente à concessão aos sujeitos passivos, que exerçam tanto atividades não tributáveis como atividades tributáveis, do direito à dedução integral do IVA pago a montante relativamente a bens e serviços utilizados de modo indissociável para ambos os tipos de atividades.

 Princípio da neutralidade fiscal

52.      Nas observações que apresentou em apoio do seu pedido relativo ao direito à dedução integral, a União de Municípios invoca o princípio da neutralidade fiscal, que considera ser um direito fundamental dos sujeitos passivos. Alega que quaisquer restrições a este direito devem ser interpretadas de forma estrita.

53.      É certo que o princípio da neutralidade fiscal é inerente ao sistema comum do IVA (34) e é um princípio fundamental subjacente ao referido sistema (35). Contudo, os argumentos da União de Municípios não me convencem.

54.      Em primeiro lugar, é certamente correto que o princípio da neutralidade fiscal constitui a tradução, pelo legislador da União, em matéria de IVA, do princípio geral da igualdade de tratamento (36). Todavia, enquanto este último princípio tem dignidade constitucional nos termos do direito da União, o princípio da neutralidade fiscal necessita de uma elaboração legislativa que só pode ser feita através de um ato de direito derivado e pode, por conseguinte, nesse ato legislativo, ser objeto de precisões (37). Aliás, como o Tribunal de Justiça já declarou, o princípio da neutralidade fiscal não é uma norma de direito primário, mas um princípio de interpretação que deve ser aplicado paralelamente com outros princípios coexistentes do sistema do IVA (38). Contrariamente ao que afirma a União de Municípios, não pode, portanto, decorrer desse princípio um direito fundamental dos sujeitos passivos.

55.      Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça declarou que o princípio da neutralidade fiscal não se aplica a operações que não sejam abrangidas pelo âmbito de aplicação do sistema do IVA. Por conseguinte, perante a inequívoca limitação constante da frase introdutória do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE, não permite alargar o âmbito de aplicação da dedução ao IVA a jusante para além das operações utilizadas estritamente para efeitos da atividade económica de um sujeito passivo (39).

56.      Sob pretexto de invocar o respeito do princípio da interpretação estrita das exceções ao direito à dedução, a União de Municípios apresenta uma interpretação que conduz à eliminação de tais restrições e que — na minha opinião — é manifestamente contra legem.

57.      Permitir que um sujeito passivo que exerça tanto atividades não tributáveis como atividades tributáveis invoque um direito à dedução integral implicaria conceder‑lhe uma vantagem no que diz respeito tanto às suas operações a montante (o direito a deduzir o IVA a montante) como às operações a jusante (o direito de não cobrar o IVA a jusante). Evidentemente, tal implicaria que o efeito económico do IVA não seria neutro, mas positivo (a seu favor). A situação da União de Municípios seria, portanto, melhor do que a que resultaria da aplicação do princípio da neutralidade fiscal.

58.      Daí resultaria a concessão a esse sujeito passivo de um tratamento mais favorável do que o reservado a outras categorias de operadores económicos em situações comparáveis e implicaria, portanto, uma distorção da concorrência no mercado interno, que o princípio da neutralidade fiscal visa, precisamente, evitar (40). Resultaria igualmente na concessão de uma vantagem económica injustificada a um sujeito passivo relativamente a um consumidor final (41).

59.      Se fosse seguida esta interpretação, bastaria que uma entidade abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 13.o da Diretiva 2006/112/CE exercesse uma atividade económica, ainda que em medida muito marginal ‑ como, por exemplo, a disponibilização pelo município de uma máquina de venda automática de refrigerantes no edifício da Câmara Municipal ou a venda de árvores de Natal aos residentes locais ‑ para poder deduzir a totalidade do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável tanto para as suas atividades públicas como para as económicas. Não pode ter sido a intenção do legislador da União prever tal vantagem ilícita.

60.      Chego, portanto, à conclusão preliminar de que tanto o artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE como os princípios subjacentes ao sistema comum do IVA, em particular o da neutralidade fiscal, se opõem manifestamente à concessão a um sujeito passivo, que exerça tanto atividades não tributáveis como atividades tributáveis, do direito à dedução integral do IVA pago a montante.

 Poder de apreciação dos EstadosMembros e obrigações dos órgãos jurisdicionais nacionais

61.      Resulta da análise que antecede que o objetivo subjacente ao sistema do IVA e a sua finalidade comum é a correspondência entre a dedução do imposto a montante e a cobrança do mesmo a jusante (42). Ao exercerem o seu poder de apreciação no que respeita às regras de repartição do IVA, os Estados‑Membros devem evitar, tanto quanto possível, com uma preocupação de igualdade entre as diferentes categorias de sujeitos passivos e entre sujeitos passivos que exercem tanto atividades tributáveis como não tributáveis e consumidores finais, as situações de consumo final não tributado (43).

 Obrigação geral de conferir plena eficácia ao direito da União

62.      Nestas circunstâncias, os Estados‑Membros devem exercer o seu poder de apreciação de modo a assegurar que a dedução será feita apenas quanto à parte do IVA que respeite a operações que confiram direito a dedução. Devem, pois, zelar para que o cálculo do pro rata entre atividades económicas e atividades não económicas reflita objetivamente a quota de imputação real das despesas a montante a cada uma destas duas atividades (44).

63.      Segundo entendi a situação existente na Polónia até 1 de janeiro de 2016, a prática administrativa descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio consistia na concessão do direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos tanto das atividades económicas de um sujeito passivo como das suas atividades não económicas.

64.      Esta prática perturba o equilíbrio entre a dedução do IVA pago a montante e a cobrança do IVA a jusante, afetando o nível de tributação e conduzindo a uma desigualdade de tratamento entre diferentes categorias de sujeitos passivos e entre os Estados‑Membros e, por conseguinte, a distorções da concorrência no mercado interno. Consequentemente, é suscetível de comprometer o princípio da uniformidade de aplicação do sistema comum do IVA (45).

65.      Uma vez que qualquer alteração do âmbito do direito à dedução do IVA tem impacto no nível da carga fiscal e deve ser aplicada de forma semelhante em todos os Estados‑Membros, esta prática afeta a própria essência do funcionamento do sistema comum do IVA (46). O considerando 39 da Diretiva 2006/112/CE, que indica que «o cálculo do pro rata de dedução [deve] ser efetuado da mesma maneira em todos os Estados‑Membros», confirma que era essa, com efeito, a intenção do legislador da União.

66.      Além disso, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, alínea b), da Decisão 2007/436/CE (47), os recursos próprios da União baseiam‑se, designadamente, no IVA (48). Daqui resulta que existe uma relação direta entre a cobrança das receitas provenientes do IVA e a colocação à disposição do orçamento da União dos recursos correspondentes. Qualquer falha na cobrança das primeiras, em especial através do alargamento do âmbito do direito à dedução do IVA pago a montante, conduz à erosão da base tributável e gera, portanto, uma redução dos segundos. A fim de assegurar a proteção dos interesses financeiros da União, como exige o artigo 325.o TFUE, incumbe aos Estados‑Membros adotar as medidas necessárias com vista a garantir, de modo efetivo e integral, o apuramento e a cobrança do IVA nos seus territórios (49).

67.      Daqui decorre que a aplicação da prática nacional em questão no processo principal seria manifestamente contrária à finalidade e aos princípios básicos do sistema comum do IVA instituído pela Diretiva 2006/112/CE e suscetível de entravar a sua eficácia e, por conseguinte, de prejudicar os interesses financeiros da União.

68.      Embora os Estados‑Membros sejam livres de escolher o método aplicável de repartição do IVA dedutível, nos termos do disposto no artigo 288.o TFUE, devem, contudo, assegurar que o âmbito do direito à dedução corresponde ao exigido pela Diretiva 2006/112/CE. Não gozam de qualquer poder de apreciação a este respeito (50).

69.      Em tais circunstâncias, o legislador nacional é o primeiro responsável pela adoção das medidas necessárias para respeitar essas obrigações (51).

70.      Depreendo do despacho de reenvio que o legislador polaco alterou a Lei do IVA com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2016 e que essa alteração pôs termo à prática administrativa de conceder o direito à dedução integral do IVA sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável tanto para efeitos das operações económicas de um sujeito passivo como das suas operações não económicas (52).

71.      Contudo, o processo principal respeita ao período compreendido entre 2013 e 2015. Incumbe, portanto, ao órgão jurisdicional nacional conferir plena eficácia à Diretiva 2006/112/CE também durante esse período, interpretando a legislação aplicável, tanto quanto possível, à luz do artigo 168.o, alínea a), dessa diretiva, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça, ou, quando necessário, deixando de aplicar essa legislação (53). Se os métodos de interpretação reconhecidos pelo direito nacional a este respeito permitirem interpretar uma disposição da ordem jurídica interna de forma a evitar um conflito com outra norma de direito interno ou, para esse efeito, reduzir o alcance dessa disposição, aplicando‑a somente na medida em que seja compatível com a referida norma, o órgão jurisdicional nacional tem a obrigação de utilizar os mesmos métodos com vista a atingir o resultado pretendido pela diretiva (54). Evidentemente, estas obrigações não devem exigir que o órgão jurisdicional recorra a uma interpretação contra legem das disposições nacionais aplicáveis (55).

72.      O Tribunal de Justiça declarou igualmente, neste contexto, que a exigência de uma interpretação do direito nacional conforme ao direito da União inclui a obrigação dos órgãos jurisdicionais nacionais de alterarem, sendo caso disso, a sua jurisprudência assente, caso esta se baseie numa interpretação do direito nacional que seja incompatível com os objetivos de uma diretiva. Por conseguinte, um órgão jurisdicional nacional não pode validamente considerar que lhe é impossível interpretar uma disposição nacional em conformidade com o direito da União pelo simples facto de essa disposição ter, de forma constante, sido interpretada num sentido que não é compatível com este direito (56).

73.      Concluo que, em princípio, a Diretiva 2006/112/CE deve ser interpretada no sentido de que exige que um órgão jurisdicional nacional, num processo relativo a um sujeito passivo como a União de Municípios, interprete a sua legislação nacional, tanto quanto possível, de modo a assegurar que as deduções só sejam feitas relativamente à parte do IVA pago a montante que reflita objetivamente a medida em que as despesas incorridas a montante tenham sido utilizadas para efeitos da atividade económica desse sujeito passivo.

 Exceção em razão de princípios gerais e de direitos fundamentais

74.      Uma vez que o litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio tem por objeto uma transposição, em particular, do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE e, consequentemente, a aplicação do direito da União na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (57), o órgão jurisdicional de reenvio deve igualmente assegurar o respeito dos direitos fundamentais garantidos pela Carta aos sujeitos passivos em causa no processo principal. A obrigação de garantir a cobrança eficaz dos recursos da União não pode ir contra o respeito desses direitos (58).

75.      Por outras palavras, o princípio segundo o qual o direito nacional deve ser interpretado em conformidade com o direito da União atinge os seus limites quando a sua aplicação aos factos do processo principal leve a uma violação dos direitos fundamentais consagrados na Carta ou de princípios gerais do direito da União (59). Sobretudo, o Tribunal de Justiça declarou que, se um órgão jurisdicional nacional estiver convencido de que essa interpretação levaria a uma violação de tais direitos ou princípios, é dispensado da obrigação de aplicar essa interpretação, ainda que o cumprimento de tal obrigação permitisse corrigir uma situação nacional incompatível com o direito da União (60).

76.      Examinarei, consequentemente, em seguida, a questão de saber se a obrigação de aplicar tal interpretação no processo principal seria suscetível de conduzir a uma violação de um direito fundamental ou de um princípio geral do direito da União. Para esse efeito, começarei por identificar os direitos fundamentais ou os princípios gerais pertinentes, examinando em seguida as consequências da aplicação da interpretação do direito da União que atrás expus aos factos do processo principal.

77.      A União de Municípios alega que decorre não só do direito polaco como também do direito da União que não lhe pode ser aplicado um método de cálculo que afeta o seu direito à dedução integral do IVA pago a montante, salvo no caso de tal método ser expressamente previsto por lei.

78.      Estou disposta a admitir a tese segundo a qual o princípio de que nenhum imposto pode ser cobrado se não for previsto por lei (por outras palavras, o princípio da legalidade fiscal: nullum tributum sine lege) faz efetivamente parte da ordem jurídica da União. Pode ser considerado uma manifestação específica, no contexto do direito fiscal, da liberdade de empresa, do direito fundamental à propriedade e do princípio geral da segurança jurídica.

79.      Contudo, não creio que a União de Municípios possa obter vencimento no processo principal, invocando o direito da União para reivindicar um direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos de atividades económicas e não económicas. Como demonstrarei em seguida, o princípio da legalidade fiscal no direito da União respeita ao direito do Estado‑Membro de cobrar impostos, ao passo que o litígio no processo principal tem por objeto apenas o método de cálculo do montante do imposto devido.

80.      Começarei por analisar o alcance do princípio de legalidade fiscal no direito da União. Atendendo ao artigo 6.o, n.o 3, TUE (61) e ao artigo 52.o, n.o 3, da Carta (62), procederei a esta análise por referência, em primeiro lugar, à CEDH e, seguidamente, às tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros.

 Análise à luz da CEDH

81.      O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH») estabeleceu o princípio da legalidade fiscal no contexto do artigo 1.o do Protocolo Adicional (63). Este artigo dispõe que «[n]inguém pode ser privado do que é sua propriedade a não ser por utilidade pública e nas condições previstas pela lei e pelos princípios gerais do direito internacional» sem «prejuízo do direito que os Estados possuem de pôr em vigor as leis que julguem necessárias para a regulamentação do uso dos bens, de acordo com o interesse geral, ou para assegurar o pagamento de impostos ou outras contribuições ou de multas».

82.      O TEDH declarou, em particular, que um imposto corresponde a uma ingerência no direito à fruição pacífica da propriedade e, consequentemente, está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o do Protocolo Adicional (64). Reconheceu que os Estados contratantes gozam de uma «ampla margem de apreciação» em matéria fiscal (65) e que lhes deve «ser concedido um maior grau de respeito e de latitude no exercício das suas funções tributárias, de acordo com o critério da legalidade» (66). Declarou, além disso, que este critério se limita à verificação de que o imposto está «em conformidade com o direito nacional e que a própria lei é de qualidade suficiente para permitir a um requerente prever a consequência da sua conduta», o que exige que «as disposições aplicáveis de direito interno sejam suficientemente acessíveis, precisas e previsíveis» (67).

83.      O conceito de «lei» na aceção do artigo 1.o do Protocolo Adicional refere‑se ao mesmo conceito que se encontra noutras passagens da CEDH (68). Reveste, por conseguinte, um alcance autónomo e amplo, que não se limita aos atos que emanem do legislador. Inclui as constituições, a legislação ordinária em sentido estrito, o direito derivado e os tratados internacionais de que um Estado contratante seja parte (69).

84.      Sobretudo, a jurisprudência deve ser considerada abrangida pelo âmbito do conceito de «lei», na aceção do artigo 1.o do Protocolo Adicional (70). Assim, «uma jurisprudência clara, coerente e pública pode constituir uma base suficiente para uma ingerência ‘lícita’ nos direitos garantidos pela Convenção, sempre que essa jurisprudência se baseie numa interpretação razoável do direito primário» (71).

85.      Por fim, o TEDH reconheceu que é objetivamente impossível atingir uma precisão absoluta na redação das leis, especialmente no domínio da fiscalidade. Por conseguinte, muitas leis são inevitavelmente formuladas em termos gerais e a sua interpretação e aplicação devem ser definidas pela prática (72).

86.      Daqui resulta que o princípio da legalidade nos termos do artigo 1.o do Protocolo Adicional implica que os elementos essenciais do imposto devem ser previstos por lei ou pela jurisprudência, não existindo tal requisito quanto a determinados outros elementos secundários que definem o âmbito da responsabilidade fiscal.

 Análise à luz das tradições constitucionais comuns aos EstadosMembros

87.      O princípio da legalidade fiscal parece ser reconhecido na maioria dos Estados‑Membros. Em alguns deles, faz parte de uma tradição constitucional de longa data (73). Na maior parte dos Estados‑Membros, este princípio está expressamente consagrado num ato de hierarquia constitucional, ao passo que noutros decorre do princípio constitucional do Estado de direito (74).

88.      Regra geral, as constituições dos Estados‑Membros consagram este princípio em termos bastante genéricos (75), incumbindo aos tribunais constitucionais e comuns a tarefa da sua interpretação. Algumas, contudo, especificam os elementos que devem ser definidos por lei. É esse o caso, em particular, de França (76), da Grécia (77), de Portugal (78) e da Polónia (79).

89.      Uma análise pormenorizada da legislação e da jurisprudência de uma amostra de onze Estados‑Membros (80) revela que as tradições constitucionais destes Estados‑Membros coincidem ao exigirem que todos os elementos essenciais inerentes ao imposto sejam previstos por lei. Em oito desses onze Estados‑Membros, os seguintes elementos são considerados essenciais: a designação do sujeito passivo, o facto gerador de imposto, a base de incidência do imposto, a taxa do imposto e as garantias processuais de que os sujeitos passivos gozam (81).

90.      Apenas alguns Estados‑Membros consideram essenciais certos elementos adicionais. Estes elementos adicionais incluem a indicação do beneficiário do imposto (Estónia), o processo de pagamento (Polónia e Estónia), os prazos aplicáveis à exigibilidade do imposto (Estónia), as normas de concessão de reduções e desagravamentos e as categorias de sujeitos passivos isentas de tributação (Polónia e Grécia) bem como os processos de pagamento e cobrança do imposto e a definição das penas e sanções (Portugal).

91.      Além disso, parece ser geralmente aceite nos Estados‑Membros que, embora não seja objetivamente possível definir numa lei todas as regras relativas a um imposto, a lei deve, contudo, permitir ao sujeito passivo ter conhecimento prévio e calcular o montante do imposto exigível.

92.      Por exemplo, embora a ordem constitucional alemã pareça exigir que a legislação fiscal permita ao sujeito passivo calcular o imposto devido, não são exigidos elementos pormenorizados que permitam o cálculo da dívida fiscal com precisão aritmética. Basta que a legislação permita ao sujeito passivo prever o alcance da carga fiscal de modo a poder adaptar o seu comportamento. Do mesmo modo, em Portugal, o princípio da legalidade não parece impor a exigência estrita de a legislação aplicável fornecer ao contribuinte os elementos necessários para calcular, sem a menor dúvida, o montante exato do imposto devido. É necessário, contudo, que — à luz dos elementos essenciais definidos pela lei — a carga fiscal seja quantificável e, em certa medida, previsível e calculável. Afigura‑se que, também na Grécia, o método de cálculo do rendimento para efeitos da sua tributação não é considerado um dos elementos constitutivos do imposto.

93.      No que respeita à questão de saber o que constitui a «lei», parece ser geralmente aceite nesses Estados‑Membros que, em princípio, um imposto deve ser definido num ato juridicamente vinculativo de aplicação geral adotado pelo legislador e devidamente publicado. Dito isto, em vários Estados‑Membros, a própria legislação pode ser completada por instrumentos derivados adotados pelo poder executivo no âmbito de competências especificamente delegadas (82) ou da sua competência geral (83). Em vários outros Estados‑Membros, certos elementos específicos, geralmente de natureza técnica, parecem ser determinados pelas autoridades competentes através de decisões tributárias não vinculativas ou de recomendações (84).

94.      Outra característica comum a estes onze Estados‑Membros parece ser a exigência de precisão, clareza e previsibilidade da legislação fiscal (85). Por conseguinte, pode existir uma proibição de aplicação de legislação fiscal por analogia, e uma exigência de, em caso de dúvida, interpretar a legislação a favor do sujeito passivo (86).

95.      Em vários Estados‑Membros que examinei, parece não existir, à semelhança da Polónia, qualquer norma específica em matéria de repartição do IVA pago a montante por sujeitos passivos que exerçam simultaneamente atividades não tributáveis e tributáveis (87).

96.      Nos Países Baixos (88), na Suécia (89) e no Reino Unido, a inexistência de tal legislação foi sanada através de atos derivados adotados pelas autoridades fiscais competentes. Nestes três Estados‑Membros, os sujeitos passivos parecem ter uma obrigação geral de escolher e aplicar um método adequado de repartição, sujeito a revisão pelas autoridades competentes.

97.      Assim, por exemplo, no Reino Unido, por força da Section 26(3) da Value Added Tax Act 1994 (Lei do IVA), a Her Majesty’s Revenue and Customs (a autoridade fiscal central no Reino Unido), adotou instrumentos legais que enumeram exemplos de critérios e métodos de repartição (90). Além disso, nos termos da Section 102ZA(1) dessa lei, a referida autoridade pode aprovar um método proposto por um sujeito passivo ou indicar‑lhe outro método mais adequado.

98.      A prática dos tribunais desse Estado‑Membro parece‑me confirmar que, na falta de critério ou método vinculativo, a escolha de um método que assegure uma repartição equitativa e razoável do imposto pago a montante incumbe ao sujeito passivo e depende das suas circunstâncias específicas. Parece também aceite que o direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre operações utilizadas de modo indissociável para atividades não económicas e atividades económicas violaria o princípio da neutralidade fiscal.

99.      Na Alemanha, as normas de transposição para o ordenamento interno dos artigos 173.o e 174.o da Diretiva 2006/112/CE parecem ser consideradas aplicáveis por analogia, para efeitos da determinação da parte dedutível do IVA pago a montante sobre operações utilizadas de modo indissociável para atividades não económicas e atividades económicas.

100. É interessante observar que, na República Checa, o Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo) se baseou no Acórdão do Tribunal de Justiça no processo Český rozhlas (91), bem como nas Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar nesse processo (92), para julgar improcedente o argumento de um recorrente segundo o qual tinha direito à dedução integral dado que a legislação aplicável não previa qualquer método de repartição do IVA pago a montante. O Nejvyšší správní soud parece considerar que o recorrente era obrigado a escolher o método mais adequado e calcular ele próprio a parte dedutível do IVA pago a montante (93).

101. Parece resultar desta amostra que as tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, à semelhança da jurisprudência do TEDH relativa ao artigo 1.o do Protocolo Adicional, exigem que os elementos essenciais de um imposto sejam previstos por lei de forma suficientemente clara, precisa e previsível, mas não impõem uma obrigação de regulamentar de forma exaustiva todos os pormenores.

102. Com exceção dos elementos analisados nos n.os 96 a 100 das presentes conclusões, não tenho conhecimento de medidas ou decisões em nenhum dos restantes Estados‑Membros que regulem o método de repartição da parte dedutível do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para a atividade não económica e para a atividade económica ou que excluam qualquer limitação ao direito à dedução deste imposto com o fundamento de que o direito fiscal nacional não especifica nenhum método ou critério para o cálculo do montante do imposto devido. Deste ponto de vista, a prática administrativa descrita no despacho de reenvio parece destacar‑se como exceção.

 Análise à luz da Carta e dos princípios gerais do direito da União

103. O artigo 16.o da Carta reconhece a liberdade de empresa, «de acordo com o direito da União e as legislações e práticas nacionais». Nos termos do artigo 17.o, n.o 1, da Carta, «[t]odas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte». Esta disposição especifica ainda que «[n]inguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil» e que «[a] utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral».

104. Na medida em que a obrigação do sujeito passivo possa ser considerada uma mera entrega ao tesouro público do IVA a jusante que tenha cobrado aos seus clientes em nome do Estado em questão, o direito de propriedade é irrelevante. As disposições da Carta que visam proteger esse direito são relevantes, contudo, no que respeita ao âmbito do direito a deduzir o IVA pago a montante (94).

105. Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito de propriedade e a liberdade de exercer uma atividade económica não são prerrogativas absolutas. O seu exercício pode ser objeto de restrições justificadas por objetivos de interesse geral, desde que essas restrições correspondam efetivamente a esses objetivos e não constituam, relativamente à finalidade prosseguida, uma intervenção excessiva e intolerável que atente contra a própria substância das liberdades assim garantidas. No que diz respeito, mais especificamente, à liberdade de exercer uma atividade económica, o Tribunal de Justiça considerou — à luz da redação do artigo 16.o da Carta, que se distingue da redação das outras liberdades fundamentais consagradas no título II da mesma, ao mesmo tempo que se aproxima de determinadas disposições do título IV da Carta — que esta liberdade pode ser sujeita a um amplo leque de intervenções do poder público suscetíveis de estabelecer, no interesse geral, limitações ao exercício da atividade económica (95).

106. Além disso, o princípio da segurança jurídica é igualmente relevante no contexto do caso em apreço. Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, este princípio exige que as normas de direito sejam claras, precisas e previsíveis quanto aos seus efeitos, em especial quando possam comportar consequências desfavoráveis para os indivíduos e as empresas (96). Por outro lado, o princípio da segurança jurídica impõe‑se com especial rigor quando se trata de uma regulamentação suscetível de comportar encargos financeiros, a fim de permitir aos interessados conhecer com exatidão o âmbito das obrigações que tal regulamentação lhes impõe (97). Por fim, o princípio da segurança jurídica opõe‑se, salvo circunstâncias excecionais justificadas por um objetivo de interesse geral, a que um legislador nacional estabeleça que um ato que se enquadra no direito da União tenha o seu início em data anterior à sua publicação (proibição da retroatividade) (98).

 Conclusão provisória sobre o sentido do princípio da legalidade fiscal

107. Saliente‑se, a este respeito, que a determinação do nível de proteção conferido pelo direito da União à luz das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros e da Carta não é uma ciência exata.

108. A questão de saber se um determinado imposto respeita o nível de proteção que decorre do princípio da legalidade fiscal assim interpretado só pode ser apreciada casuisticamente, tomando como referência a situação de um sujeito passivo na ordem jurídica em causa considerada no seu conjunto. Na minha opinião, o Tribunal de Justiça deve, portanto, resistir à tentação de identificar, no seu acórdão, uma lista exaustiva dos elementos que definem um imposto que devem ser previstos por lei.

109. Simultaneamente, reconheço que é necessário definir determinados parâmetros comuns de conformidade com esse princípio. Tanto quanto pude apurar, o nível de proteção no contexto da tributação varia ligeiramente entre os Estados‑Membros analisados anteriormente. Em meu entender, essas diferenças quanto ao nível exigido de exaustividade ou precisão refletem apenas o facto de diferentes Estados‑Membros recorrerem a diferentes meios para alcançarem um resultado comum. Não tenho razões para crer que a situação seja outra nos restantes Estados‑Membros.

110. Considero que, de um modo geral, todos os elementos essenciais que definem as características substantivas de um imposto devem ser definidos de forma inequívoca pelas disposições aplicáveis. No caso em apreço, tal corresponde aos elementos que tenham impacto direto ou indireto sobre o âmbito da responsabilidade do sujeito passivo como devedor do IVA a montante. O imposto em questão é previsto pela lei adequada quando as normas aplicáveis, consideradas no seu conjunto, permitem ao contribuinte prever e calcular o montante do imposto devido e determinar o momento em que o mesmo se torna exigível.

111. Por outro lado, não aceito que a mera inexistência nas disposições aplicáveis de um elemento acessório, que não é suscetível de produzir tal impacto, equivalha, por si só, a uma violação do princípio de legalidade fiscal.

112. Assim, por exemplo, a inexistência de um método para o cálculo do montante do imposto devido não é, em si, lesiva dos direitos de um sujeito passivo, quando disposições aplicáveis de outro modo contenham um conjunto dos parâmetros necessários para lhe permitir prever e determinar esse montante (99). Neste mesmo espírito, se uma dada situação não for regulada exaustivamente, o mero facto de o sujeito passivo ter de escolher uma de várias linhas de conduta possíveis no âmbito da margem de apreciação que o Estado‑Membro decidiu conceder‑lhe, não tem, em si, efeitos adversos sobre os seus direitos, salvo se resultar num aumento do âmbito da sua responsabilidade fiscal.

113. Em contrapartida, a aplicação de um novo requisito ou de uma nova formalidade, que conduza retroativamente a um aumento do montante do imposto exigível, não satisfaz manifestamente o nível de proteção acima definido, por muito acessório ou insignificante que tal requisito ou formalidade possa ser. Não é esse, todavia, o caso do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE que — lido à luz da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça — define inequivocamente o âmbito do direito à dedução do IVA pago a montante (100).

114. Em suma, quanto ao que é relevante para o caso em apreço, considero que os seguintes elementos devem ser considerados parte do nível de proteção funcional comum: um imposto deve ser definido por regras juridicamente vinculativas previamente acessíveis aos sujeitos passivos de modo suficientemente claro, preciso e exaustivo a fim de permitir ao sujeito passivo em questão prever e determinar o montante do imposto devido num dado momento com base nos textos e nos dados disponíveis ou acessíveis. Consequentemente, essas regras não podem impor ou agravar a carga fiscal retroativamente.

115. Concluo, portanto, que este nível de proteção implica, em particular, que, caso as regras aplicáveis não contenham qualquer método de cálculo do montante do imposto devido, as autoridades fiscais competentes devem permitir que o sujeito passivo em questão recorra a um método da sua escolha, desde que, tendo em conta a natureza da atividade económica exercida, esse método seja adequado para refletir objetivamente a medida em que as despesas incorridas a montante tenham sido utilizadas para efeitos de uma atividade económica, seja baseado em critérios objetivos e dados credíveis e permita à autoridade competente verificar a exatidão da sua aplicação.

 Pode a União de Municípios invocar o princípio geral da legalidade fiscal para reivindicar o direito à dedução integral?

116. Nos termos da jurisprudência atrás referida (101), é apenas ao órgão jurisdicional de reenvio que incumbe determinar se a aplicação do direito da União ao processo principal conduzirá a uma violação dos princípios gerais do direito da União. Contudo, no âmbito do reenvio prejudicial, o Tribunal de Justiça só é competente para fornecer ao órgão jurisdicional nacional todos os elementos de interpretação do direito da União que possam permitir‑lhe apreciar a questão da conformidade (102).

117. Tendo presente esse objetivo, passarei agora a apresentar vários elementos que o órgão jurisdicional de reenvio pode considerar relevantes ao analisar as consequências da aplicação do princípio da legalidade fiscal — visto à luz da CEDH, das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros e da Carta — aos factos do processo principal.

 Situação da União de Municípios à luz do direito polaco

118. Resulta claramente das explicações do órgão jurisdicional de reenvio e das alegações orais que, à data dos factos, ou seja, até 1 de janeiro de 2016, a Lei do IVA não previa um método ou critério para o cálculo da parte dedutível do IVA pago a montante sobre bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos tanto das atividades económicas de um sujeito passivo como das suas atividades não económicas.

119. Todos os participantes na audiência concordaram que os termos utilizados no artigo 86.o, n.o 1, da Lei do IVA são muito semelhantes aos do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE. Em particular, a primeira disposição inclui a expressão «quando», que me parece definir claramente o âmbito do direito à dedução, limitando‑o ao IVA a montante que corresponda estritamente aos bens e serviços utilizados para efeitos das atividades tributáveis. Nenhum dos dados de que o Tribunal de Justiça dispõe sugere que a primeira dessas disposições deva ser interpretada de forma diferente desta última (103).

120. Os seguintes elementos poderão revelar‑se pertinentes a este respeito:

121. Em primeiro lugar, os representantes da Polónia e do Diretor da Administração Fiscal confirmaram na audiência — sem que a União de Municípios o contestasse — que, em princípio, a obrigação geral de calcular e declarar o montante do imposto devido bem como de pagar esse imposto dentro dos prazos previstos incumbe claramente ao sujeito passivo (104).

122. Em segundo lugar, os participantes na audiência concordaram, nas suas alegações orais, em que, nos termos do direito polaco, os sujeitos passivos como a União de Municípios estão sujeitos a normas muito detalhadas em matéria de contabilidade para efeitos de supervisão orçamental e de finanças públicas, as quais implicam, designadamente, a obrigação de registar todas as operações, incluindo as relevantes para efeitos de IVA.

123. A este respeito, o representante da União de Municípios alegou que, na falta de um método previsto por lei, a determinação do valor do IVA pago a montante dedutível é muito complexa e trabalhosa, ao passo que o representante do Diretor da Administração Fiscal insistiu — mais uma vez, sem que os outros participantes o contestassem — que as entidades públicas, como a União de Municípios, estão muito mais bem colocadas do que as próprias autoridades tributárias para proceder aos cálculos necessários.

124. Em terceiro lugar, os participantes confirmaram, nas suas alegações orais, que, quando um sujeito passivo tem dúvidas quanto à correta interpretação das disposições aplicáveis, tem o direito de requerer e obter das autoridades uma informação tributária vinculativa que aprecie a sua situação específica e indique de que modo a lei deve ser corretamente aplicada (105). O representante do Diretor da Administração Fiscal confirmou que, à semelhança da União de Municípios no processo principal, vários outros sujeitos passivos em situações comparáveis tinham recorrido a esse procedimento e tinham obtido tais informações vinculativas quanto à parte dedutível do IVA pago a montante.

125. Em quarto lugar, o representante do Diretor da Administração Fiscal explicou na audiência que, tanto antes de 1 de janeiro de 2016 como após esta data, os sujeitos passivos eram livres de aplicar um método da sua escolha para a repartição do IVA. Declarou que a autoridade competente só poderia opor‑se a tal escolha se esse método não fosse adequado, no sentido de que não refletisse objetivamente a medida em que as despesas efetuadas a montante foram utilizadas para efeitos das operações do sujeito passivo que conferem direito a dedução. Confirmou igualmente que o direito à dedução não pode ser recusado unicamente com o fundamento de que a autoridade não concordou com o método utilizado pelo sujeito passivo. Nenhuma destas declarações foi contestada pelo representante da União de Municípios.

126. Na minha opinião, decorre da conjugação das disposições e das circunstâncias acima referidas que, à data dos factos, todos os elementos essenciais do IVA com impacto sobre o montante do IVA exigível (o tributum) eram previstas por lei (lex) de um modo que permitia aos sujeitos passivos efetuar os cálculos necessários e declarar o montante de IVA devido, com base nos documentos e outros dados na sua posse.

127. Nestas circunstâncias, o método efetivamente utilizado para calcular a parte dedutível do IVA pago a montante parece ser apenas um dos meios técnicos que o sujeito passivo tem inevitavelmente de aplicar para determinar corretamente o âmbito do seu direito à dedução quando decide exercer esse direito. A necessidade de escolher um método adequado, implícita à data dos factos, parece ser um corolário evidente desse direito, e não uma obrigação adicional autónoma que devesse ser especificamente prevista por lei (106).

128. Tendo em conta a possibilidade de a União de Municípios obter uma informação tributária vinculativa individual, a inexistência de um método específico nas disposições aplicáveis não parece ter tornado o exercício do direito à dedução impossível ou excessivamente difícil, nem ter conduzido a uma incerteza inultrapassável quanto ao âmbito das suas obrigações perante o tesouro público.

129. Pelo contrário, resulta das alegações que, dado o amplo leque de situações factuais possíveis, seria otimista e talvez demasiado exigente esperar que o legislador nacional regulasse exaustivamente todos os aspetos técnicos do comportamento de um sujeito passivo para efeitos de tributação (107). Esta conclusão está em perfeita consonância com a jurisprudência do TEDH e com a situação nos outros Estados‑Membros (108).

130. Considero, portanto, que a legislação aplicável à data dos factos à União de Municípios não continha qualquer lacuna na definição do imposto.

 Observações finais

131. As considerações precedentes afastam, na minha opinião, todos os argumentos invocados pela União de Municípios. À luz do nível de proteção que acima expus (109), a interpretação das normas aplicáveis em conformidade com a Diretiva 2006/112/CE, conforme interpretada por jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (110), não é suscetível de conduzir, no processo principal, a uma violação de um direito fundamental ou de um princípio geral do direito da União.

132. Em particular, esta interpretação não parece conduzir a qualquer incerteza jurídica ou aplicação retroativa de novas obrigações que não estejam previstas por lei. De igual modo, uma vez que todos os elementos constitutivos do imposto (tributum) eram, aquando dos factos, previstos por lei, esta interpretação não parece conduzir à imposição, por força da Diretiva 2006/112/CE, de uma obrigação não prevista no ordenamento jurídico nacional (111). Por último, não parece tornar o exercício do direito à dedução do IVA pago a montante impossível ou excessivamente difícil.

133. As conclusões a que cheguei nos n.os 73 e 115 das presentes conclusões não são postas em causa pelo facto de, quando um ato do direito da União exige medidas nacionais de execução — como no caso em apreço — as autoridades e os órgãos jurisdicionais nacionais poderem, ao abrigo do artigo 53.o da Carta, aplicar os padrões nacionais de proteção dos direitos fundamentais e os princípios gerais do direito da União (112).

134. As informações de que o Tribunal de Justiça dispõe sugerem que — apesar da existência das práticas administrativas referidas na questão prejudicial — não parece existir qualquer conflito entre a posição que proponho que o Tribunal de Justiça adote no caso em apreço e os princípios que decorrem do artigo 217.o da Constituição polaca.

135. Como o órgão jurisdicional de reenvio explicou, à luz desta disposição, as medidas relativas à cobrança de impostos, incluindo a determinação dos sujeitos passivos, as taxas de imposto, bem como as regras relativas à concessão de reduções e desagravamentos e às categorias de pessoas isentas de tributação, devem ser previstas por lei. Parece decorrer das alegações orais dos representantes da Polónia e do Diretor da Administração Fiscal perante o Tribunal de Justiça que esta disposição é interpretada de forma constante pelo Trybunał Konstytucyjny [Tribunal Constitucional (Polónia)] no sentido de exigir que sejam previstos por lei os elementos essenciais de um imposto que tenham impacto sobre a responsabilidade fiscal do sujeito passivo, e não todos os elementos desse imposto (113).

136. Em meu entender, estes requisitos não parecem obstar a que o órgão jurisdicional de reenvio interprete a legislação nacional em conformidade com o direito da União pelo modo atrás exposto.

137. Todavia, se o órgão jurisdicional de reenvio considerar que a legislação nacional, interpretada desse modo, não satisfaz o nível de proteção assegurado pela Constituição polaca, não pode limitar‑se a conceder à União de Municípios o direito à dedução integral do IVA pago a montante à custa do orçamento geral da União e em violação do princípio da igualdade de tratamento (114).

138. Não aceito que uma mera divergência entre os níveis de proteção nacional seja suscetível de exonerar o órgão jurisdicional nacional da sua obrigação primária de conferir plena eficácia ao direito da União. Assim será, por maioria de razão, quando o resultado seja a concessão de uma considerável vantagem económica ilícita, que não corresponde à intenção do legislador da União (115). Pelo contrário, ao interpretar a legislação nacional, o órgão jurisdicional de reenvio deve usar de todos os seus recursos para, à luz de um exame global da ordem jurídica nacional no seu conjunto, escolher a solução que respeite as características essenciais da ordem jurídica da União, concretamente o primado, a unidade e a efetividade do direito da União (116).

139. Atendendo às considerações precedentes, concluo, além do que afirmei nos n.os 73 e 115 das presentes conclusões, que o órgão jurisdicional nacional só pode ser exonerado da sua obrigação de interpretar o direito nacional em conformidade com o direito da União Europeia se essa interpretação implicar uma violação do princípio segundo o qual o imposto deve ser definido por regras juridicamente vinculativas, previamente acessíveis aos sujeitos passivos de modo suficientemente claro, preciso e exaustivo a fim de permitir ao sujeito passivo em questão prever e determinar o montante do imposto devido num dado momento com base nos textos e nos dados que estão disponíveis ou são acessíveis ao referido sujeito passivo. Assim seria se dessas regras decorresse uma incerteza quanto ao montante do imposto devido ou se as mesmas impusessem ou agravassem, de modo retroativo, o referido montante.

 Conclusão

140. À luz do que precede, sugiro que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo às questões que lhe foram submetidas pelo Wojewódzki Sąd Administracyjny we Wrocławiu (Tribunal Administrativo da Província de Wroclaw) (Polónia):

—      A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretada no sentido de que exige que um órgão jurisdicional nacional, num processo relativo a um sujeito passivo como a Związek Gmin Zagłębia Miedziowego w Polkowicach (União de Municípios), interprete a sua legislação nacional, tanto quanto possível, de modo a assegurar que as deduções só sejam feitas relativamente à parte do IVA pago a montante que reflita objetivamente a medida em que as despesas incorridas a montante tenham sido utilizadas para efeitos da atividade económica desse sujeito passivo.

—      Caso as regras aplicáveis não contenham qualquer método de cálculo do montante do imposto devido, as autoridades fiscais competentes devem permitir que o sujeito passivo em questão recorra a um método da sua escolha, desde que, tendo em conta a natureza da atividade económica exercida, esse método seja adequado para refletir objetivamente a medida em que as despesas incorridas a montante tenham sido utilizadas para efeitos de uma atividade económica, seja baseado em critérios objetivos e dados credíveis e permita à autoridade competente verificar a exatidão da sua aplicação.

—      Um órgão jurisdicional nacional só pode ser exonerado da sua obrigação de interpretar o direito nacional em conformidade com o direito da União Europeia se essa interpretação implicar uma violação do princípio segundo o qual o imposto deve ser definido por regras juridicamente vinculativas, previamente acessíveis aos sujeitos passivos de modo suficientemente claro, preciso e exaustivo a fim de permitir ao sujeito passivo em questão prever e determinar o montante do imposto devido num dado momento com base nos textos e nos dados que estão disponíveis ou são acessíveis ao referido sujeito passivo. Assim seria se dessas regras decorresse uma incerteza quanto ao montante do imposto devido ou se as mesmas impusessem ou agravassem, de modo retroativo, o referido montante.


1      Língua original: inglês.


2      Diretiva do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).


3      A seguir «IVA a jusante».


4      A seguir «IVA a montante».


5      O artigo 174.o define os elementos a incluir no numerador e no denominador da fração que deve ser utilizada para calcular o pro rata de dedução do IVA a montante. O artigo 175.o prevê que o pro rata de dedução deve ser calculado ou estimado anualmente a título provisório pelo sujeito passivo, de acordo com as suas previsões, sob controlo da administração, e deve ser regularizado no ano seguinte quando for conhecido o pro rata definitivo.


6      Dziennik Ustaw (Jornal Oficial), 2011, n.o 177, item 1054 (a seguir «Lei do IVA»).


7      A seguir «Diretor da Administração Fiscal».


8      Em meu entender, este tipo de ato administrativo é, em substância, uma declaração formal das autoridades que expressa a sua opinião sobre a correta interpretação e aplicação de uma determinada disposição da legislação fiscal às circunstâncias factuais de um dado sujeito passivo. Este procedimento é previsto nos artigos 14.ob a 14.os do Ordynacja podatkowa de 29 de agosto de 1997 (lei processual em matéria fiscal), Dziennik Ustaw (Jornal Oficial) de 1997, n.o 137, Item 926, conforme alterada.


9      A seguir «direito à dedução integral».


10      Processo I FPS 9/10. O órgão jurisdicional de reenvio afirmou que, na sua decisão, o Naczelny Sąd Administracyjny tinha declarado que a fórmula estabelecida no artigo 90.o da Lei do IVA não se destinava a ser aplicada ao IVA pago a montante relativamente a bens e serviços utilizados de modo indissociável para efeitos tanto das atividades económicas de um sujeito passivo como das suas atividades não económicas. O órgão jurisdicional de reenvio explicou que, na fundamentação dessa decisão, o Naczelny Sąd Administracyjny declarou que, uma vez que o legislador polaco não tinha estabelecido os métodos e critérios para a repartição do IVA pago a montante entre operações sujeitas a IVA e operações não sujeitas a IVA, os sujeitos passivos tinham direito à dedução integral do IVA pago a montante sobre tais bens e serviços.


11      V. n.os 12 a 14 das presentes conclusões.


12      V. n.o 14 das presentes conclusões.


13      Acórdão de 13 de março de 2008, Securenta (C‑437/06, EU:C:2008:166, n.o 33).


14      Acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 26). O Tribunal de Justiça explicou, além disso, que, consequentemente, sob pena de comprometer o objetivo de neutralidade garantido pelo sistema comum de IVA, as operações não abrangidas pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2006/112/CE que não conferem, portanto, direito à dedução, devem ser excluídas do cálculo do pro rata de dedução previsto no artigo 173.o [Acórdãos de 29 de abril de 2004, EDM (C‑77/01, EU:C:2004:243, n.o 54), e de 27 de setembro de 2001, Cibo Participations (C‑16/00, EU:C:2001:495, n.o 44)].


15      Acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 32).


16      Acórdão de 13 de março de 2008, Securenta (C‑437/06, EU:C:2008:166, n.o 34).


17      Acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 27).


18      V., por analogia, Acórdão de 14 de setembro de 2006, Wollny (C‑72/05, EU:C:2006:573, n.o 28).


19      V., neste sentido, por exemplo, Acórdão de 3 de outubro de 2006, Banca popolare di Cremona (C‑475/03, EU:C:2006:629, n.o 28 e jurisprudência referida).


20      V., neste sentido, Acórdão de 10 de julho de 2008, Sosnowska (C‑25/07, EU:C:2008:395, n.os 14 e 15).


21      Acórdão de 23 de novembro de 2017, Di Maura (C‑246/16, EU:C:2017:887, n.o 23 e jurisprudência referida).


22      Conclusões no processo C‑228/05, EU:C:2006:425, n.os 82 e 83 (sublinhado meu).


23      Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54) (atualmente artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE).


24      Acórdão de 28 de novembro de 2013, MDDP (C‑319/12, EU:C:2013:778, n.o 42).


25      V., neste sentido, Acórdão de 30 de março de 2006, Uudenkaupungin kaupunki (C‑184/04, EU:C:2006:214, n.o 24), e Despacho de 5 de junho de 2014, Gmina Międzyzdroje (C‑500/13, EU:C:2014:1750, n.o 19).


26      Acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 23).


27      Acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 24).


28      Acórdãos de 16 de fevereiro de 2012, Eon Aset Menidjmunt (C‑118/11, EU:C:2012:97, n.o 44), e de 22 de outubro de 2015, Sveda (C‑126/14, EU:C:2015:712, n.o 32).


29      Acórdão de 16 de junho de 2016, Mateusiak (C‑229/15, EU:C:2016:454, n.o 24).


30      V. Conclusões que apresentou nos processos VDP Dental Laboratory (C‑401/05, EU:C:2006:537, n.os 95 a 97), e MDDP (C‑319/12, EU:C:2013:421, n.os 38 e 39).


31      C‑11/15, EU:C:2016:181, n.o 51.


32      Esta disposição prevê que, quando, relativamente a um dado período de tributação, o montante das deduções exceder o do IVA devido, os Estados‑Membros podem efetuar o reporte do excedente no período seguinte ou proceder ao respetivo reembolso segundo as modalidades por eles fixadas. Neste caso, o excedente seria necessariamente estrutural e, em caso de reporte, só se acumularia ao longo do tempo. Em última análise, este desequilíbrio conduz necessariamente a um reembolso efetivo.


33      Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar no processo Český rozhlas (C‑11/15, EU:C:2016:181, n.o 51).


34      Acórdão de 28 de novembro de 2013, MDDP (C‑319/12, EU:C:2013:778, n.o 25).


35      Acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C‑174/08, EU:C:2009:669, n.o 40).


36      Acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C‑174/08, EU:C:2009:669, n.o 41).


37      Acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C‑174/08, EU:C:2009:669, n.os 42 e 43).


38      V. Acórdão de 19 de julho de 2012, Deutsche Bank (C‑44/11, EU:C:2012:484, n.o 45), em que o Tribunal de Justiça subscreveu a conclusão a que cheguei no n.o 60 das minhas Conclusões nesse processo (EU:C:2012:276).


39      Acórdão de 13 de março de 2014, Malburg (C‑204/13, EU:C:2014:147, n.os 42 e 43).


40      Acórdão de 29 de outubro de 2009, NCC Construction Danmark (C‑174/08, EU:C:2009:669, n.o 44).


41      Acórdão de 14 de setembro de 2006, Wollny (C‑72/05, EU:C:2006:573, n.o 35).


42      V., neste sentido, Acórdão de 14 de setembro de 2006, Wollny (C‑72/05, EU:C:2006:573, n.os 33 e 37).


43      V., neste sentido, Acórdão de 14 de setembro de 2006, Wollny (C‑72/05, EU:C:2006:573, n.o 48).


44      Acórdão de 13 de março de 2008, Securenta (C‑437/06, EU:C:2008:166, n.os 34 e 37). O Tribunal de Justiça declarou, a este respeito, que os Estados‑Membros estão habilitados a aplicar, sendo caso disso, quer uma chave de repartição segundo a natureza do investimento, quer uma chave de repartição segundo a natureza da operação, quer ainda qualquer outra chave adequada, sem estarem obrigados a limitar‑se a um único destes métodos (n.o 38 desse acórdão).


45      V., neste sentido, Acórdão de 12 de julho de 1988, Direct Cosmetics e Laughtons Photographs (138/86 e 139/86, EU:C:1988:383, n.o 23). V. igualmente Acórdão de 6 de maio de 2010, Comissão/França (C‑94/09, EU:C:2010:253, n.o 40).


46      V., neste sentido, Acórdão de 6 de setembro de 2012, Portugal Telecom (C‑496/11, EU:C:2012:557, n.o 35).


47      Decisão 2007/436/CE, Euratom, do Conselho, de 7 de junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (JO 2007, L 163, p. 17).


48      Por exemplo, em 2014, que é um dos exercícios fiscais relativamente aos quais a União de Municípios pretende obter o direito à dedução integral, os recursos provenientes do IVA representavam 13,2% do orçamento global da União. V. Quadro Financeiro Plurianual para o período 2014‑2020 e orçamento da UE 2014, p. 24.


49      V., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392, n.os 51 e 52). Se a Polónia pretendesse manter um tratamento mais favorável dos sujeitos passivos como a União dos Municípios, poderia — sob reserva da conformidade com as disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado — prever um subsídio, financiado pelos seus recursos próprios, em vez de permitir a isenção do IVA pago a montante à custa do orçamento da União.


50      V., por analogia, Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 38 e jurisprudência referida).


51      V., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 64).


52      V. n.o 11 das presentes conclusões.


53      V., neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2015, Taricco e o. (C‑105/14, EU:C:2015:555, n.o 49).


54      Acórdão de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.o 116).


55      Acórdão de 11 de setembro de 2018, IR (C‑68/17, EU:C:2018:696, n.o 63).


56      V., neste sentido, Acórdão de 19 de abril de 2016, DI (C‑441/14, EU:C:2016:278, n.os 33 e 34 e jurisprudência referida). V. igualmente Acórdão de 17 de abril de 2018, Egenberger (C‑414/16, EU:C:2018:257, n.os 72 e 73).


57      JO 2010, C 83, p. 389 (a seguir «Carta»).


58      V., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 68 e jurisprudência referida).


59      Existem na jurisprudência recente vários exemplos de situações em que o Tribunal de Justiça tem considerado que a eficácia da União pode ter de dar prioridade à proteção dos direitos fundamentais. V., neste sentido, Acórdãos de 16 de fevereiro de 2017, C. K. e o. (C‑578/16 PPU, EU:C:2017:127) [proibição dos tratamentos desumanos ou degradantes no âmbito do Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31)]; de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936) (princípio nulla poena sine lege no contexto do artigo 325.o TFUE); e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário) (C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586) [direito a um recurso efetivo no contexto da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros (JO 2002, L 190, p. 1)].


60      V., neste sentido, Acórdãos de 7 de janeiro de 2004, X (C‑60/02, EU:C:2004:10, n.os 61 e 63), e de 5 de dezembro de 2017, M.A.S e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 61).


61      Este artigo dispõe que «[d]o direito da União fazem parte, enquanto princípios gerais, os direitos fundamentais tal como os garante a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais [assinada em Roma em 4 de novembro de 1950 (a seguir ‘CEDH’)] e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros».


62      Esta disposição da Carta prevê que, «[n]a medida em que a […] Carta contenha direitos correspondentes aos direitos garantidos pela [CEDH], o sentido e o âmbito desses direitos são iguais aos conferidos por essa Convenção», sem prejuízo de o direito da União poder conferir uma «proteção mais ampla». Assim, os critérios desenvolvidos pelo TEDH ao interpretar as disposições correspondentes da CEDH devem ser aplicados na determinação do nível mínimo de proteção garantido pela Carta (Acórdão de 28 de fevereiro de 2013, Reapreciação Arango Jaramillo e o./BEI, C‑334/12 RX‑II, EU:C:2013:134, n.o 28).


63      Protocolo Adicional à Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinado em Paris em 20 de março de 1952 (a seguir «Protocolo Adicional»).


64      TEDH, 9 de julho de 2002, Orion Břeclav s.r.o./República Checa, CE:ECHR:2002:0709DEC004378398, p. 7.


65      TEDH, 29 de janeiro de 2003, Masa Invest Group/Ucrânia, CE:ECHR:2005:1011DEC000354003, p. 12.


66      TEDH, 14 de maio de 2013, N.K.M./Hungria, CE:ECHR:2013:0514JUD006652911, § 50.


67      TEDH, 20 de setembro de 2011, OAO Neftyanaya Kompaniya Yukos/Rússia, CE:ECHR:2011:0920JUD001490204, § 559 (sublinhado meu).


68      TEDH, 14 de outubro de 2010, Shchokin/Ucrânia, CE:ECHR:2010:1014JUD002375903, § 51.


69      Grgić, A., Mataga, Z., Longar, M., e Vilfan, A., Conselho da Europa — Direção‑Geral dos Direitos Humanos e dos Assuntos Jurídicos, Le droit à la propriété dans la convention européenne des Droits de l’Homme Un guide sur la mise en oeuvre de la convention européenne des Droits de l’Homme et de ses protocoles, Précis sur les droits de l’homme n.o 10, setembro de 2007, p. 13 (disponível através da seguinte ligação: https://rm.coe.int/168007ff64).


70      TEDH, 9 de novembro de 1999, Špaček/República Checa, CE:ECHR:1999:1109JUD002644995, § 54.


71      TEDH, 25 de julho de 2013, Khodorkovskiy e Lebedev/Rússia, CE:ECHR:2013:0725JUD001108206, §§ 881 a 885.


72      TEDH, 29 de janeiro de 2003, Masa Invest Group/Ucrânia, CE:ECHR:2005:1011DEC000354003, p. 12 e 13.


73      É esse o caso, nomeadamente, do Reino Unido, onde este princípio foi inicialmente adotado na Bill of Rights de 1689 (ainda aplicável), de França, onde decorre da Déclaration des droits de l’homme et du citoyen, de 26 de agosto de 1789 (idem), e da Polónia, onde foi consagrado no Artykuły henrykowskie de 1573, que se manteve em vigor até 24 de outubro de 1795.


74      Parece ser esse o caso da Áustria e da Alemanha.


75      Parece ser esse o caso, em particular: da Bélgica (artigo 170.o, n.o 1, da Constituição belga), de Chipre (artigo 24.o, n.o 2, da Constituição cipriota), da Estónia (artigo 113.o da Constituição estónia), da Finlândia (artigo 81.o, n.o 1, da Constituição finlandesa), da Itália (artigo 23.o da Constituição italiana), da Irlanda (artigos 22.2.1. a 22.2.6. da Constituição irlandesa), dos Países Baixos (artigo 104.o da Constituição neerlandesa), da República Checa (artigo 11.o, n.o 5, da Carta dos Direitos Fundamentais checa), da Lituânia (artigo 127.o, n.o 3, da Constituição lituana), do Luxemburgo (artigo 99.o da Constituição luxemburguesa), da Roménia (artigos 56.o, n.o 3, e 139.o, n.o 1, da Constituição romena), da Eslováquia (artigo 59.o, n.o 2, da Constituição eslovaca) e da Suécia (artigo 4.o da secção 1 da Regeringsformen, que — conjuntamente com três outros atos — compõe a Constituição sueca).


76      O artigo 14.o da Déclaration des droits de l’homme et du citoyen, de 26 de agosto de 1789, exige que os seguintes elementos sejam previstos por lei: base de incidência, taxa do imposto e procedimento de cobrança de impostos de qualquer tipo.


77      O artigo 78.o, n.os 1 e 4, da Constituição grega exige que os seguintes elementos sejam previstos por lei: indicação do sujeito passivo, tipo de rendimento, bem, despesa ou operação sujeitos a tributação, taxa do imposto, isenções e créditos fiscais.


78      O artigo 103.o, n.o 2, da Constituição portuguesa exige que os seguintes elementos sejam previstos por lei: incidência, taxa do imposto, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes.


79      V. artigo 217.o da Convenção polaca referido no n.o 6 das presentes conclusões.


80      Ou seja: Bulgária, República Checa, Estónia, França, Alemanha, Grécia, Países Baixos, Polónia, Portugal, Suécia e Reino Unido.


81      A situação à luz da CEDH parece ser muito semelhante a este respeito (v. n.os 85 e 86 das presentes conclusões).


82      Parece ser esse o caso na República Checa, na Estónia, na Alemanha, na Grécia, na Polónia e no Reino Unido.


83      Parece ser esse o caso em França.


84      Parece ser esse o caso nos Países Baixos e na Suécia.


85      Observe‑se que decorre da jurisprudência do TEDH um requisito semelhante, já discutido nas presentes Conclusões (v. n.o 82 das presentes conclusões).


86      Parece ser este o caso na Bulgária (antes de 1 de janeiro de 2017), na República Checa, na Alemanha, na Grécia (a partir de 2000), nos Países Baixos, na Suécia e no Reino Unido.


87      Além da Polónia, parece ser esse o caso da Bulgária, da República Checa, da Grécia e da Suécia.


88      Assim, nos Países Baixos, uma decisão pertinente do Staatssecretarissen van Financiën (Ministro das Finanças) em matéria de dedução do IVA indica metros quadrados, metros cúbicos, rendimento relevante ou custos como critérios possíveis para o cálculo da parte dedutível do IVA pago a montante.


89      V., na Suécia, as instruções não vinculativas da administração fiscal n.o 131 446423‑15/111, de 25 de agosto de 2015, e n.o 202 377677‑17/111, de 19 de dezembro de 2017.


90      V. VAT Notice 700 de 17 de dezembro de 2014 (guia do IVA que abrange as regras e os procedimentos), Section 32(5).


91      Acórdão de 22 de junho de 2016 (C‑11/15, EU:C:2016:470).


92      Conclusões apresentadas no processo Český rozhlas (C‑11/15, EU:C:2016:181).


93      Acórdão de 30 de agosto de 2016, n.o 5 Afs 124/2014‑178.


94      V. n.o 39 das presentes conclusões.


95      Acórdão de 28 de novembro de 2013, Conselho/Manufacturing Support & Procurement Kala Naft (C‑348/12 P, EU:C:2013:776, n.os 121 a 123).


96      Acórdão de 10 de setembro de 2009, Plantanol (C‑201/08, EU:C:2009:539, n.o 46).


97      Acórdão de 16 de setembro de 2008, Isle of Wight Council e o. (C‑288/07, EU:C:2008:505, n.o 47).


98      Acórdão 26 de abril de 2005, «Goed Wonen» (C‑376/02, EU:C:2005:251, n.o 33).


99      O mesmo se poderia dizer, a priori, de requisitos processuais ou técnicos. Contudo, uma vez que esta questão não é abrangida pelo âmbito das presentes conclusões, não a aprofundarei.


100      V. n.os 41, 48 e 55 das presentes conclusões.


101      V. jurisprudência referida nos n.os 74 e 75 das presentes conclusões.


102      Acórdão de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft (C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 126).


103      Quanto à interpretação do artigo 168.o da Diretiva 2006/112/CE, v. n.os 41, 48 e 55 das presentes conclusões.


104      Segundo entendi, essa obrigação decorre do artigo 103.o, n.o 1, da Lei do IVA, que parece transpor o artigo 250.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE.


105      V. nota 8 das presentes conclusões.


106      V. n.o 112 das presentes conclusões.


107      Observe‑se, a este respeito, que o representante do Diretor da Administração Fiscal insistiu — sem que os outros participantes o contestassem — que seria objetivamente impossível fazê‑lo.


108      V. n.os 85 e 91 das presentes conclusões.


109      V. a análise do princípio da legalidade fiscal nos n.os 78 a 115 das presentes conclusões.


110      Ou seja, em conformidade com os parâmetros analisados nos n.os 35 a 60 das presentes conclusões.


111      A situação no caso em apreço pode ser confrontada com a que estava em causa no processo Pfeiffer (Acórdão de 5 de outubro de 2004, C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.o 108).


112      V. Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Melloni (C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 60). Neste processo, contudo, o Tribunal de Justiça concluiu que, precisamente porque as normas relevantes tinham sido completamente harmonizadas a nível da União, o órgão jurisdicional nacional já não podia aplicar o nível mais elevado de proteção dos direitos fundamentais previsto pela sua lei constitucional nacional.


113      Acórdão do Trybunał Konstytucyjny, de 16 de junho de 1998, U 9/97, n.o 51. Apurou‑se também na audiência que aquele tribunal não teve ainda oportunidade de examinar a constitucionalidade da inexistência de métodos de repartição do IVA pago a montante.


114      V. n.os 61, 64 e 65 das presentes conclusões.


115      V. n.os 57 a 59 das presentes conclusões.


116      Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 47).