Language of document : ECLI:EU:C:2019:531

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

24 de junho de 2019 (*)

«Incumprimento de Estado — Artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE — Estado de direito — Tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União — Princípios da inamovibilidade e da independência dos juízes — Redução da idade de aposentação dos juízes do Supremo Tribunal — Aplicação aos juízes em exercício — Possibilidade de continuar a exercer as funções de juiz para além dessa idade subordinada à obtenção de uma autorização por decisão discricionária do presidente da República»

No processo C‑619/18,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, entrada em 2 de outubro de 2018,

Comissão Europeia, representada por K. Banks, H. Krämer e S. L. Kalėda, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

República da Polónia, representada por B. Majczyna, K. Majcher e S. Żyrek, na qualidade de agentes,

demandada,

apoiada por:

Hungria, representada por M. Z. Fehér, na qualidade de agente,

interveniente,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, A. Prechal (relatora), M. Vilaras e E. Regan, presidentes de secção, E. Juhász, M. Ilešič, J. Malenovský, L. Bay Larsen, D. Šváby, C. Vajda, P. G. Xuereb, N. Piçarra, L. S. Rossi e I. Jarukaitis, juízes,

advogado‑geral: E. Tanchev,

secretário: M. Aleksejev, chefe de unidade,

vistos os autos e após a audiência de 12 de fevereiro de 2019,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 11 de abril de 2019,

profere o presente

Acórdão

1        Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, por um lado, ao reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal, Polónia) e ao aplicar essa medida aos juízes em exercício que foram nomeados para esse tribunal antes de 3 de abril de 2018 e, por outro, ao conceder ao presidente da República o poder discricionário de prorrogar a função judicial ativa dos juízes do referido tribunal para além da nova idade de aposentação fixada, a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições conjugadas do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Tratado UE

2        O artigo 2.o TUE tem a seguinte redação:

«A União funda‑se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados‑Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres.»

3        O artigo 19.o, n.o 1, TUE dispõe:

«O Tribunal de Justiça da União Europeia inclui o Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral e tribunais especializados. O Tribunal de Justiça da União Europeia garante o respeito do direito na interpretação e aplicação dos Tratados.

Os Estados‑Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.»

 Carta

4        O título VI da Carta, com a epígrafe «Justiça», inclui o artigo 47.o, com a epígrafe «Direito à ação e a um tribunal imparcial», que dispõe:

«Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal nos termos previstos no presente artigo.

Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. […]

[…]»

5        Nos termos do artigo 51.o da Carta:

«1.       As disposições da presente Carta têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União, na observância do princípio da subsidiariedade, bem como os Estados‑Membros, apenas quando apliquem o direito da União. Assim sendo, devem respeitar os direitos, observar os princípios e promover a sua aplicação, de acordo com as respetivas competências e observando os limites das competências conferidas à União pelos Tratados.

2.      A presente Carta não torna o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a competências que não sejam as da União, não cria quaisquer novas atribuições ou competências para a União, nem modifica as atribuições e competências definidas pelos Tratados.»

 Direito polaco

 Constituição

6        O artigo 183.o, n.o 3, da Constituição prevê que o primeiro presidente do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) é nomeado por um período de seis anos.

7        Nos termos do artigo 186.o, n.o 1, da Constituição:

«O Krajowa Rada Sądownictwa [Conselho Nacional da Magistratura] é o guardião da independência dos tribunais e dos juízes.»

8        O artigo 187.o da Constituição dispõe:

«1.      O Conselho Nacional da Magistratura é composto:

1)      pelo primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], pelo ministro da Justiça, pelo presidente do [Naczelny Sąd Administracyjny (Supremo Tribunal Administrativo)] e por uma pessoa designada pelo presidente da República,

2)      por quinze membros eleitos de entre os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], dos tribunais de direito comum, dos tribunais administrativos e dos tribunais militares,

3)      por quatro membros eleitos [pelo Sejm (Parlamento)] de entre os deputados e por dois membros eleitos pelo Senado de entre os senadores.

[…]

3.      O mandato dos membros eleitos do Conselho Nacional da Magistratura é de quatro anos.

4.      O regime, o domínio de atividade, o modo de trabalho do Conselho Nacional da Magistratura e o modo de eleição dos seus membros são definidos por lei.»

 Lei sobre o Supremo Tribunal

9        O artigo 30.o da ustawa o Sądzie Najwyższym (Lei sobre o Supremo Tribunal), de 23 de novembro de 2002 (Dz. U. de 2002, posição 240), fixava a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em 70 anos. Por força desta disposição, os juízes desse tribunal tinham igualmente a possibilidade, até seis meses antes de atingirem a idade de 70 anos, de enviar ao primeiro presidente do referido tribunal uma declaração indicando que pretendiam continuar a exercer as suas funções e de apresentar um atestado comprovativo da sua capacidade para o efeito tendo em conta o seu estado de saúde, caso em que podiam exercer de pleno direito as suas funções até aos 72 anos.

10      Em 20 de dezembro de 2017, o presidente da República promulgou a ustawa o Sądzie Najwyższym (Lei sobre o Supremo Tribunal), de 8 de dezembro de 2017 (Dz. U. de 2018, posição 5, a seguir «nova Lei sobre o Supremo Tribunal»), que entrou em vigor em 3 de abril de 2018. Esta lei foi alterada por diversas vezes, nomeadamente, pela ustawa o zmianie ustawy — Prawo o ustroju sądów powszechnych, ustawy o Sądzie Najwyższym oraz niektórych innych ustaw (Lei que altera a Lei de Organização dos Tribunais Comuns, a Lei sobre o Supremo Tribunal e algumas outras leis), de 10 de maio de 2018 (Dz. U. de 2018, posição1045, a seguir «Lei de alteração de 10 de maio de 2018»).

11      Nos termos do artigo 37.o da nova Lei sobre o Supremo Tribunal:

«1.      Os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] são aposentados no dia do seu 65.o aniversário, salvo se, com uma antecedência máxima de doze meses e mínima de seis meses antes de completarem [65 anos de idade], declararem que pretendem continuar a exercer as suas funções e apresentarem um atestado, que obedeça aos mesmos requisitos que são aplicáveis aos candidatos à magistratura judicial, que certifique que o seu estado de saúde lhes permite continuar a exercer as funções, e desde que o presidente da República da Polónia conceda autorização para a prorrogação das suas funções no [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].

1‑A.      Antes de conceder essa autorização, o presidente da República da Polónia solicita ao Conselho Nacional da Magistratura que emita um parecer. O Conselho Nacional da Magistratura transmite o seu parecer ao presidente da República da Polónia no prazo de 30 dias a contar do dia em que este o convide a fazê‑lo. Se o Conselho Nacional da Magistratura não comunicar o seu parecer no prazo previsto na segunda frase, presume‑se que emitiu um parecer favorável.

1‑B.      Para emitir o parecer referido no n.o 1‑A, o Conselho Nacional da Magistratura toma em consideração o interesse do sistema judiciário ou um interesse social importante, em especial a afetação racional dos membros do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] ou as necessidades resultantes do volume de trabalho de certas Secções do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)].

2.      A declaração e o atestado referidos no n.o 1 são enviados ao primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], que os transmite imediatamente, juntamente com o seu próprio parecer, ao presidente da República da Polónia. O primeiro presidente do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] comunica a sua declaração e o seu atestado, aos quais anexa o parecer do Pleno do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)], ao presidente da República da Polónia.

3.      O presidente da República da Polónia pode autorizar um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] a continuar a exercer as suas funções no prazo de três meses a contar do dia em que o parecer do Conselho Nacional da Magistratura referido no n.o 1‑A lhe foi notificado ou do termo do prazo no qual este parecer deve ser comunicado. Se a autorização não for concedida dentro do prazo previsto na primeira frase, considera‑se que o juiz é aposentado no dia em que completa o seu 65.o aniversário. Se um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] completar a idade referida no n.o 1 antes de terminar o procedimento de prorrogação do seu mandato, permanecerá em funções até ao encerramento do referido processo.

4.      A autorização referida no n.o 1 é concedida por um período de três anos, renovável uma vez. As disposições do n.o 3 aplicam‑se mutatis mutandis. […]»

12      O artigo 39.o desta lei dispõe:

«O presidente da República da Polónia declara a data em que o juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] se aposenta voluntária ou compulsivamente.»

13      O artigo 111.o da referida lei prevê:

«1.      Os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] que tenham completado 65 anos de idade na data de entrada em vigor da presente lei ou que completem essa idade no prazo de três meses a contar dessa data de entrada em vigor serão aposentados a partir do dia seguinte ao termo desse período de três meses, salvo se apresentarem, no prazo de um mês a contar da entrada em vigor da presente lei, a declaração e o atestado referidos no artigo 37.o, n.o 1, e se o presidente da República da Polónia os autorizar a continuar a exercer as suas funções de juiz no [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)]. As disposições do artigo 37.o, n.os 2 a 4, aplicam‑se mutatis mutandis.

1‑A.      Os juízes do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] que completem 65 anos de idade depois de terminado o prazo de três meses e antes de terminado o prazo de doze meses a contar da data de entrada em vigor da presente lei são aposentados doze meses após essa entrada em vigor, exceto se, no decurso desse prazo, apresentarem a declaração e o atestado referidos no artigo 37.o, n.o 1, e se o presidente da República da Polónia os autorizar a continuar a exercer as suas funções de juiz no [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)]. As disposições do artigo 37.o, n.os 1‑A a 4, aplicam‑se mutatis mutandis

14      A Lei de alteração de 10 de maio de 2018 contém, além das disposições que alteram a nova Lei sobre o Supremo Tribunal, certas disposições autónomas que regulam o procedimento de prorrogação da função judicial ativa dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que tenham atingido a idade de aposentação até 3 de julho de 2018. O artigo 5.o desta lei de alteração tem a seguinte redação:

«O presidente da República da Polónia transmite imediatamente ao Conselho Nacional da Magistratura, para emissão de parecer, as declarações referidas no artigo 37.o, n.o 1, e no artigo 111.o, n.o 1, da [nova Lei sobre o Supremo Tribunal] que ainda não tenham sido examinadas na data de entrada em vigor da presente lei. O Conselho Nacional da Magistratura emite o seu parecer no prazo de 30 dias a contar do dia em que o presidente da República da Polónia o convidou a fazê‑lo. O presidente da República da Polónia pode autorizar um juiz do [Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal)] a continuar a exercer as suas funções no prazo de 60 dias a contar do dia em que o parecer do Conselho Nacional da Magistratura lhe foi notificado ou do termo do prazo no qual este parecer deve ser comunicado. As disposições do artigo 37.o, n.os 2 a 4, da [nova Lei sobre o Supremo Tribunal], conforme alterada pela presente lei, aplicam‑se mutatis mutandis

 Procedimento précontencioso

15      Por considerar que, com a adoção da nova Lei sobre o Supremo Tribunal e das leis subsequentes de alteração da mesma, a República da Polónia não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força das disposições conjugadas do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e do artigo 47.o da Carta, a Comissão, em 2 de julho de 2018, enviou a este Estado‑Membro uma notificação para cumprir. Este respondeu por carta de 2 de agosto de 2018, na qual contestava ter violado o direito da União.

16      Em 14 de agosto de 2018, a Comissão emitiu um parecer fundamentado no qual reiterava que a legislação nacional referida no número anterior viola as referidas disposições do direito da União. Consequentemente, essa instituição convidava a República da Polónia a tomar as medidas necessárias para dar cumprimento ao referido parecer fundamentado no prazo de um mês a contar da sua receção. Este Estado‑Membro respondeu por carta de 14 de setembro de 2018, na qual concluía pela inexistência das infrações alegadas.

17      Nestas condições, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

 Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

18      Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de outubro de 2018, a Comissão apresentou um pedido de medidas provisórias ao abrigo do artigo 279.o TFUE e do artigo 160.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, requerendo que fosse ordenado à República da Polónia que, até à prolação do acórdão do Tribunal de Justiça sobre o mérito:

–        suspendesse a aplicação das disposições do artigo 37.o, n.os 1 a 4, e do artigo 111.o, n.os 1 e 1‑A, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, do artigo 5.o da Lei de alteração de 10 de maio de 2018, bem como de todas as medidas adotadas em aplicação destas disposições;

–        tomasse todas as medidas necessárias para garantir que os juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) abrangidos pelas referidas disposições pudessem continuar a exercer as suas funções no lugar que ocupavam em 3 de abril de 2018, data de entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, continuando a gozar do mesmo estatuto e dos mesmos direitos e condições laborais de que beneficiaram até 3 de abril de 2018;

–        se abstivesse de tomar qualquer medida com vista a nomear juízes para o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em substituição dos juízes abrangidos pelas mesmas disposições, bem como de tomar qualquer medida com vista a nomear o novo primeiro presidente desse tribunal ou designar a pessoa responsável por assumir a direção do referido tribunal em substituição do seu primeiro presidente até à nomeação do novo primeiro presidente; e

–        comunicasse à Comissão, o mais tardar um mês após a notificação do despacho do Tribunal de Justiça que decrete as medidas provisórias requeridas, e, em seguida, regularmente todos os meses, todas as medidas adotadas para dar total cumprimento a esse despacho.

19      A Comissão pediu também, ao abrigo do artigo 160.o, n.o 7, do Regulamento de Processo, que as medidas provisórias mencionadas no número anterior fossem decretadas antes de a demandada apresentar as suas observações, devido ao risco imediato de prejuízo grave e irreparável à luz do princípio da tutela jurisdicional efetiva no âmbito da aplicação do direito da União.

20      Por Despacho de 19 de outubro de 2018, Comissão/Polónia (C‑619/18 R, não publicado, EU:C:2018:852), a vice‑presidente do Tribunal de Justiça deferiu provisoriamente este último pedido até à prolação do despacho que poria termo ao processo de medidas provisórias.

21      Em 23 de outubro de 2018, a vice‑presidente do Tribunal de Justiça, em aplicação do artigo 161.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, submeteu esse pedido a decisão do Tribunal de Justiça que, atendendo à sua importância, o remeteu à Grande Secção, em conformidade com o artigo 60.o, n.o 1, deste regulamento.

22      Por Despacho de 17 de dezembro de 2018, Comissão/Polónia (C‑619/18 R, EU:C:2018:1021), o Tribunal de Justiça deferiu o pedido de medidas provisórias da Comissão até à prolação do acórdão que porá termo ao presente processo.

23      Por outro lado, por Despacho de 15 de novembro de 2018, Comissão/Polónia (C‑619/18 R, EU:C:2018:910), o presidente do Tribunal de Justiça, a pedido da Comissão, submeteu o presente processo à tramitação acelerada prevista no artigo 23.o‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e no artigo 133.o do Regulamento de Processo.

24      Por Despacho de 9 de janeiro de 2019, o presidente do Tribunal de Justiça admitiu a intervenção da Hungria no litígio em apoio dos pedidos da República da Polónia.

 Quanto à ação

25      Na sua ação, a Comissão formula duas alegações relativas à violação de obrigações que decorrem, para os Estados‑Membros, das disposições conjugadas do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e do artigo 47.o da Carta.

26      Com a sua primeira alegação, a Comissão acusa a República da Polónia de ter infringido essas obrigações, na medida em que a nova Lei sobre o Supremo Tribunal, em violação do princípio da independência dos juízes, em especial do princípio da inamovibilidade destes, previu a aplicação de uma medida que consiste em reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) aos juízes em exercício que foram nomeados para esse tribunal antes de 3 de abril de 2018, data de entrada em vigor desta lei. Com a sua segunda alegação, a Comissão acusa este Estado‑Membro de ter infringido as referidas obrigações ao conferir ao presidente da República, através da referida lei, e em violação do princípio da independência dos juízes, o poder discricionário de prorrogar, por duas vezes, cada uma por um período de três anos, a função judicial ativa dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), para além da nova idade de aposentação fixada.

 Quanto à manutenção do objeto do litígio

27      Na audiência, a República da Polónia alegou que todas as disposições nacionais que a Comissão contesta na sua ação foram revogadas e que todos os seus efeitos foram anulados pela ustawa o zmianie ustawy o Sądzie Najwyższym (Lei que altera a nova Lei sobre o Supremo Tribunal), de 21 de novembro de 2018 (Dz. U. de 2018, posição 2507), promulgada pelo presidente da República em 17 de dezembro de 2018, e que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2019.

28      Segundo o referido Estado‑Membro, por força desta lei, os juízes em exercício do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que já tinham sido afetados pela redução da idade de aposentação efetuada pela nova Lei sobre o Supremo Tribunal foram, com efeito, mantidos ou reintegrados nesse tribunal, nas condições em vigor antes da adoção desta última lei, considerando‑se, de resto, que o exercício das suas funções prosseguiu sem interrupção. As disposições que permitiam ao presidente da República autorizar a prorrogação do exercício das funções de juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) uma vez atingida a idade normal de aposentação foram, também elas, revogadas. Nestas condições, segundo a República da Polónia, o presente processo de declaração de incumprimento deixou de ter objeto.

29      Por seu turno, a Comissão indicou, na audiência, que mantinha a sua ação.

30      A este respeito, importa recordar que, como resulta de jurisprudência constante, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro em causa tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, não podendo as alterações posteriormente ocorridas ser tomadas em conta pelo Tribunal de Justiça (v., designadamente, Acórdão de 6 de novembro de 2012, Comissão/Hungria, C‑286/12, EU:C:2012:687, n.o 41 e jurisprudência referida).

31      No caso em apreço, é pacífico que, na data em que terminou o prazo fixado pela Comissão no parecer fundamentado, as disposições da nova Lei sobre o Supremo Tribunal que a Comissão contesta na presente ação continuavam em vigor. Daqui se conclui que o Tribunal de Justiça deve decidir sobre a referida ação, não obstante a entrada em vigor da Lei que altera a nova Lei sobre o Supremo Tribunal, de 21 de novembro de 2018, ter tido como consequência fazer desaparecer retroativamente todos os efeitos das disposições nacionais contestadas pela Comissão, na medida em que tal acontecimento não pode, com efeito, ser tomado em conta, uma vez que ocorreu posteriormente ao termo do prazo fixado no parecer fundamentado (v., neste sentido, Acórdão de 6 de novembro de 2012, Comissão/Hungria, C‑286/12, EU:C:2012:687, n.o 45).

 Quanto ao alcance da ação

32      Na audiência, a Comissão precisou que, com a sua ação, pede, em substância, que seja declarada a violação do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, lido à luz do artigo 47.o da Carta. Segundo a Comissão, o conceito de tutela jurisdicional efetiva a que se refere o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE deve, com efeito, ser interpretado tendo em conta o conteúdo do artigo 47.o da Carta e, nomeadamente, as garantias inerentes ao direito à ação consagrado nesta última disposição, pelo que a primeira destas disposições implica que deve ser garantida a preservação da independência de uma instância como o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), à qual é, nomeadamente, confiada a missão de interpretar e aplicar o direito da União.

33      Por conseguinte, para decidir sobre a presente ação, há que examinar se a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

 Quanto à aplicabilidade e ao alcance do artigo 19.o,n.o 1, segundo parágrafo, TUE

 Argumentos das partes

34      Invocando, em especial, os Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário) (C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586), a Comissão alega que, para dar cumprimento à obrigação que lhes é imposta pelo artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE de prever um sistema de vias de recurso que assegure uma fiscalização jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União, os Estados‑Membros são obrigados, designadamente, a garantir que as instâncias nacionais suscetíveis de se pronunciarem sobre questões relativas à aplicação ou à interpretação desse direito satisfazem a exigência de independência dos juízes, uma vez que esta última faz parte do conteúdo essencial do direito fundamental a um processo equitativo conforme garantido, nomeadamente, pelo artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta.

35      Na medida em que o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) constitui uma instância desse tipo, as disposições nacionais que regulam a composição, a estrutura organizativa e o modo de funcionamento desse tribunal devem assegurar que este satisfaz essa exigência de independência.

36      Com efeito, a referida exigência diz respeito não só ao modo como um processo específico é conduzido mas também ao modo de organização da justiça. Uma medida nacional que afete, genericamente, a independência dos órgãos jurisdicionais nacionais tem como consequência que deixa de ser garantido um recurso jurisdicional efetivo, nomeadamente quando esses órgãos jurisdicionais aplicam ou interpretam o direito da União.

37      A República da Polónia, apoiada, a este respeito, pela Hungria, alega que regras nacionais como as que a Comissão contesta na presente ação não podem ser objeto de fiscalização à luz do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e do artigo 47.o da Carta.

38      Com efeito, por um lado, estas disposições do direito da União não contêm nenhuma derrogação ao princípio da atribuição que rege as competências da União e que decorre do artigo 4.o, n.o 1, do artigo 5.o, n.os 1 e 2, e do artigo 13.o, n.o 2, TUE. Ora, é pacífico que a organização da justiça nacional constitui uma competência exclusivamente reservada aos Estados‑Membros, pelo que a União não se pode arrogar competências nesta matéria.

39      Por outro lado, o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e o artigo 47.o da Carta, à semelhança dos princípios gerais do direito da União como o princípio da independência dos juízes, só são aplicáveis em situações reguladas pelo direito da União.

40      Ora, as regras nacionais postas em causa pela Comissão no presente processo não têm qualquer relação com o direito da União e distinguem‑se, a este respeito, da regulamentação nacional a propósito da qual foi proferido o Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), regulamentação essa que, por sua vez, estava ligada à concessão de assistência financeira da União a um Estado‑Membro no contexto do combate aos défices orçamentais excessivos e, consequentemente, foi adotada em aplicação do direito da União.

41      Segundo a República da Polónia, o artigo 47.o da Carta também não é aplicável no caso em apreço, tendo em conta que não se verifica uma situação de aplicação do direito da União, na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da mesma. Além disso, decorre do artigo 6.o, n.o 1, TUE, bem como do artigo 51.o, n.o 2, da Carta e do Protocolo n.o 30 relativo à aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia à Polónia e ao Reino Unido (JO 2010, C 83, p. 313) que a Carta não torna o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a competências que não sejam as desta última.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

42      Importa recordar que, como resulta do artigo 49.o TUE, que prevê a possibilidade de qualquer Estado europeu pedir para se tornar membro da União, esta agrupa Estados que aderiram livre e voluntariamente aos valores comuns referidos no artigo 2.o TUE, respeitam esses valores e estão empenhados em promovê‑los, pelo que o direito da União assenta na premissa fundamental de que cada Estado‑Membro partilha com todos os outros Estados‑Membros, e reconhece que estes partilham com ele, esses valores (v., neste sentido, Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e.a., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 63 e jurisprudência referida).

43      Esta premissa implica e justifica a existência da confiança mútua entre os Estados‑Membros, designadamente os seus órgãos jurisdicionais, no reconhecimento destes valores em que se funda a União, entre os quais o do Estado de direito, e, portanto, no respeito do direito da União que põe esses valores em prática [v., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 30, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 35].

44      Importa igualmente recordar que, para garantir a preservação das características específicas e da autonomia da ordem jurídica da União, os Tratados instituíram um sistema jurisdicional destinado a assegurar a coerência e a unidade na interpretação do direito da União (Acórdão de 6 de março de 2018, Achmea, C‑284/16, EU:C:2018:158, n.o 35 e jurisprudência referida).

45      Em especial, a pedra angular do sistema jurisdicional assim concebido é constituída pelo processo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.o TFUE, que, ao instituir um diálogo de juiz a juiz, precisamente entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros, tem por objetivo assegurar essa coerência e essa unidade de interpretação do direito da União, permitindo assim assegurar o seu pleno efeito e a sua autonomia, bem como, em última instância, o caráter específico do direito instituído pelos Tratados (v., neste sentido, Acórdão de 6 de março de 2018, Achmea, C‑284/16, EU:C:2018:158, n.o 37).

46      Por último, como resulta de jurisprudência constante, a União é uma união de direito na qual os particulares têm o direito de contestar judicialmente a legalidade de qualquer decisão ou de qualquer ato nacional relativo à aplicação, a seu respeito, de um ato da União [Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 31 e jurisprudência referida, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 49].

47      Neste contexto, o artigo 19.o TUE, que concretiza o valor do Estado de direito afirmado no artigo 2.o TUE, confia aos órgãos jurisdicionais nacionais e ao Tribunal de Justiça a missão de garantir a plena aplicação do direito da União em todos os Estados‑Membros, bem como a tutela jurisdicional que esse direito confere aos particulares [v., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 32, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 50 e jurisprudência referida].

48      A este respeito, como prevê o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, os Estados‑Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar aos particulares o respeito do seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União. Assim, compete aos Estados‑Membros prever um sistema de vias de recurso e de processos que permita assegurar uma fiscalização jurisdicional efetiva nos referidos domínios (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 34 e jurisprudência referida).

49      O princípio da tutela jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União, a que se refere o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, constitui, com efeito, um princípio geral do direito da União que decorre das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, que foi consagrado pelos artigos 6.o e 13.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, e que é atualmente afirmado no artigo 47.o da Carta (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 35 e jurisprudência referida).

50      Quanto ao âmbito de aplicação material do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, há que recordar, por outro lado, que esta disposição visa os «domínios abrangidos pelo direito da União», independentemente da situação em que os Estados‑Membros apliquem esse direito, na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 29).

51      Contrariamente ao que sustentaram a República da Polónia e a Hungria a este respeito, a circunstância de as medidas nacionais de redução salarial em causa no processo em que foi proferido o Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), terem sido adotadas em razão de imperativos de eliminação do défice orçamental excessivo do Estado‑Membro em causa e no contexto de um programa de assistência financeira da União a esse Estado‑Membro não desempenhou, como resulta dos n.os 29 a 40 desse acórdão, nenhum papel na interpretação que levou o Tribunal de Justiça a concluir pela aplicabilidade do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE no processo em causa. Com efeito, esta conclusão assenta na circunstância de que a instância nacional em causa nesse processo, a saber, o Tribunal de Contas (Portugal), podia, sob reserva de verificação confiada ao órgão jurisdicional de reenvio no referido processo, pronunciar‑se, na qualidade de órgão jurisdicional, sobre questões relativas à aplicação ou à interpretação do direito da União e, assim, relacionadas com os domínios abrangidos por este direito (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 40).

52      Por outro lado, embora, como recordam a República da Polónia e a Hungria, a organização judicial nos Estados‑Membros seja da competência destes últimos, a verdade é que, no exercício desta competência, os Estados‑Membros estão obrigados a respeitar as obrigações que para eles decorrem do direito da União (v., por analogia, Acórdãos de 13 de novembro de 2018, Raugevicius, C‑247/17, EU:C:2018:898, n.o 45, e de 26 de fevereiro de 2019, Rimšēvičs e BCE/Letónia, C‑202/18 e C‑238/18, EU:C:2019:139, n.o 57), em especial, do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 40). Além disso, ao exigir que os Estados‑Membros respeitem estas obrigações, a União não pretende de modo algum exercer ela própria a referida competência nem, portanto, e contrariamente ao que alega a República da Polónia, arrogar‑se a mesma.

53      Por último, quanto ao Protocolo n.o 30, importa salientar que este não diz respeito ao artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e recordar que, de resto, tal protocolo também não põe em causa a aplicabilidade da Carta na Polónia e não tem por objeto dispensar a República da Polónia da obrigação de respeitar as disposições da Carta (v., neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2011, N. S. e o., C‑411/10 e C‑493/10, EU:C:2011:865, n.os 119 e 120).

54      Decorre do que precede que o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE obriga todos os Estados‑Membros a estabelecerem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva, na aceção designadamente do artigo 47.o da Carta, nos domínios abrangidos pelo direito da União (Acórdão de 14 de junho de 2017, Online Games e o., C‑685/15, EU:C:2017:452, n.o 54 e jurisprudência referida).

55      Mais especificamente, qualquer Estado‑Membro deve, por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, assegurar que as instâncias que, enquanto «órgão jurisdicional» na aceção definida pelo direito da União, fazem parte do seu sistema de vias de recurso nos domínios abrangidos pelo direito da União satisfazem as exigências de uma tutela jurisdicional efetiva [Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 37, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 52].

56      No caso em apreço, é pacífico que o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) pode ser chamado a pronunciar‑se sobre questões relacionadas com a aplicação ou a interpretação do direito da União e que, enquanto «órgão jurisdicional», faz parte do sistema polaco de vias de recurso nos «domínios abrangidos pelo direito da União», na aceção do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, pelo que esse órgão jurisdicional deve satisfazer as exigências de uma tutela jurisdicional efetiva (Despacho de 17 de dezembro de 2018, Comissão/Polónia, C‑619/18 R, EU:C:2018:1021, n.o 43).

57      Para garantir que uma instância como o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) possa oferecer essa tutela, é fundamental que seja preservada a independência desta instância, como confirma o artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta, que menciona o acesso a um tribunal «independente» entre as exigências associadas ao direito fundamental à ação [v., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 41, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 53].

58      Esta exigência de independência dos órgãos jurisdicionais, que é inerente à missão de julgar, faz parte do conteúdo essencial do direito a uma tutela jurisdicional efetiva e do direito fundamental a um processo equitativo, que reveste importância essencial enquanto garante da proteção do conjunto dos direitos que o direito da União confere aos particulares e da preservação dos valores comuns aos Estados‑Membros, enunciados no artigo 2.o TUE, designadamente do valor do Estado de direito [v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.os 48 e 63].

59      Tendo em conta o que precede, as regras nacionais postas em causa pela Comissão na sua ação podem ser objeto de fiscalização à luz do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, pelo que há que examinar se as violações desta disposição alegadas por essa instituição se verificam.

 Quanto à primeira alegação

 Argumentos das partes

60      Com a sua primeira alegação, a Comissão acusa a República da Polónia de ter infringido o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, pelo facto de a nova Lei sobre o Supremo Tribunal prever a aplicação da medida que consiste em reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) aos juízes em exercício que foram nomeados para esse tribunal antes de 3 de abril de 2018, data de entrada em vigor desta lei. Ao fazê‑lo, este Estado‑Membro violou o princípio da independência dos juízes, em especial o princípio da inamovibilidade destes.

61      A este respeito, a Comissão salienta que, em consequência do artigo 37.o, n.o 1, e do artigo 111.o, n.os 1 e 1‑A, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, os juízes desta instância que tenham atingido a idade de 65 anos antes da data de entrada em vigor desta lei, a saber, 3 de abril de 2018, ou até 3 de julho de 2018, são aposentados, em princípio, em 4 de julho de 2018, e aqueles cujo 65.o aniversário ocorre entre 4 de julho de 2018 e 3 de abril de 2019 devem, em princípio, aposentar‑se em 3 de abril de 2019. Quanto aos juízes que tenham atingido a idade de 65 anos depois de 3 de abril de 2019, devem, em princípio, aposentar‑se quando completam 65 anos.

62      Por outro lado, a Comissão sublinha que essas disposições nacionais afetaram, de forma imediata, 27 dos 72 juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que estavam em funções na data de entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, entre os quais a primeira presidente desse tribunal. Quanto a esta última, a referida instituição salienta ainda que, em conformidade com o artigo 183.o, n.o 3, da Constituição, a interessada foi nomeada para um mandato de seis anos, que devia, em concreto, expirar em 30 de abril de 2020.

63      Ora, a Comissão considera que, ao proceder a uma tal redução da idade da aposentação dos juízes em exercício no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), ao mesmo tempo que, por outro lado, nos artigos 112.o e 112.o‑A da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, habilitava o presidente da República a decidir livremente, até 3 de abril de 2019, aumentar o número de lugares nesse tribunal, a República da Polónia abriu a via para uma recomposição profunda e imediata do referido tribunal, infringindo o princípio da inamovibilidade dos juízes enquanto garantia inerente à independência destes e, portanto, o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

64      A Comissão considera que, embora uma redução da idade de aposentação dos juízes não possa ser totalmente excluída, são, em todo o caso, necessárias medidas adequadas, como um período transitório ou uma abordagem faseada, que permitam prevenir a utilização dessa redução para efeitos dissimulados de alteração da composição das instâncias judiciárias, a fim de, nomeadamente, evitar qualquer impressão de que uma diminuição da duração da função judicial dos juízes afetados seria, na realidade, justificada pelas atividades levadas a cabo por esses juízes durante o exercício ativo dessa função e não afetar a sua certeza de poder continuar a ocupar o seu lugar.

65      Segundo a República da Polónia, o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE não exige que, em caso de redução da idade de aposentação, seja obrigatoriamente previsto um período transitório para os juízes em exercício, a fim de garantir a sua independência. Com efeito, uma vez que se aplica, de maneira geral e automática, a todos os juízes abrangidos, essa idade de aposentação não é de natureza a gerar pressões suscetíveis de influenciar os interessados no âmbito do exercício das suas funções jurisdicionais.

66      Na ordem jurídica polaca, as garantias de independência da justiça estão principalmente ligadas à proteção do caráter permanente da função judicial, incluindo a garantia de inamovibilidade, à imunidade, a uma remuneração decente, ao sigilo das deliberações, à incompatibilidade entre as funções jurisdicionais e outras funções públicas, à obrigação de neutralidade política e à proibição de exercer uma atividade económica. Só é autorizada uma destituição dos juízes em caso de infrações disciplinares muito graves ou de condenação penal transitada em julgado. Ora, a aposentação de um juiz não constitui uma destituição, uma vez que o interessado mantém o título de juiz e conserva, nessa qualidade, o benefício da imunidade e o direito a uma remuneração decente, ao mesmo tempo que continua a estar sujeito a diversas regras deontológicas.

67      Por outro lado, ainda segundo a República da Polónia, decorre dos Acórdãos de 21 de julho de 2011, Fuchs e Köhler (C‑159/10 e C‑160/10, EU:C:2011:508), e de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), que os Estados‑Membros conservam a faculdade de adaptar as condições de trabalho aplicáveis aos juízes e, portanto, a idade da respetiva aposentação, nomeadamente a fim de, como no caso em apreço, alinhar essa idade de aposentação com a prevista no regime geral de aposentação, otimizando simultaneamente a estrutura de idade dos quadros do órgão jurisdicional em causa.

68      Por último, se se devesse considerar que a idade de aposentação de um juiz deve continuar a ser determinada em função do direito em vigor na data em que o interessado começou a exercer as suas funções, haveria que ter em conta, no caso em apreço, o facto de que a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) foi alterada em 2002 e reposta em 70 anos, depois de ter sido fixada em 65 anos entre 1990 e 2002. Ora, 17 dos 27 juízes em exercício nesse tribunal que foram afetados pela redução da idade de aposentação resultante da nova Lei sobre o Supremo Tribunal foram nomeados entre 1990 e 2002, pelo que, no que lhes diz respeito, não houve qualquer diminuição da duração inicial de exercício das suas funções.

69      Considerar a data da nomeação como juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) como critério para determinar a respetiva idade de aposentação criaria, além disso, um risco de discriminação entre os juízes desse tribunal, uma vez que alguns deles, nomeadamente os que venham a ser nomeados após a entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, deverão aposentar‑se mais cedo do que outros que, por sua vez, foram nomeados antes da referida entrada em vigor, numa época em que a idade de aposentação era de 70 anos.

70      Segundo a Hungria, a Comissão não demonstrou que a redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) e a aposentação de alguns juízes desse tribunal em resultado dessa medida seriam suscetíveis de afetar a capacidade do referido tribunal para garantir uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

71      A exigência de independência dos órgãos jurisdicionais, que, por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e como resulta dos n.os 42 a 59 do presente acórdão, os Estados‑Membros devem assegurar no que se refere aos órgãos jurisdicionais nacionais que, à semelhança do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), são chamados a pronunciar‑se sobre questões relacionadas com a interpretação e a aplicação do direito da União, comporta dois aspetos.

72      O primeiro aspeto, de ordem externa, requer que a instância em causa exerça as suas funções com total autonomia, sem estar submetida a nenhum vínculo hierárquico ou de subordinação em relação a nenhuma entidade e sem receber ordens ou instruções de nenhuma proveniência, estando assim protegida contra intervenções ou pressões externas suscetíveis de afetar a independência de julgamento dos seus membros e influenciar as suas decisões (Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses, C‑64/16, EU:C:2018:117, n.o 44 e jurisprudência referida).

73      O segundo aspeto, de ordem interna, está ligado, por seu turno, ao conceito de imparcialidade e visa o igual distanciamento em relação às partes no litígio e aos respetivos interesses, tendo em conta o objeto deste. Este aspeto exige o respeito da objetividade e a inexistência de qualquer interesse na resolução do litígio que não seja a estrita aplicação da regra de direito [Acórdão de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 65 e jurisprudência referida].

74      Estas garantias de independência e de imparcialidade postulam a existência de regras, designadamente no que respeita à composição da instância, à nomeação, à duração das funções, bem como às causas de abstenção, de impugnação da nomeação e de destituição dos seus membros, que permitam afastar qualquer dúvida legítima, no espírito dos litigantes, quanto à impermeabilidade da referida instância em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto [Acórdãos de 19 de setembro de 2006, Wilson, C‑506/04, EU:C:2006:587, n.o 53 e jurisprudência referida, e de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 66 e jurisprudência referida].

75      Em especial, esta indispensável liberdade dos juízes em relação a quaisquer intervenções ou pressões externas exige, como recordou reiteradamente o Tribunal de Justiça, determinadas garantias adequadas a proteger a pessoa daqueles que têm por missão julgar, como a inamovibilidade [v., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 64 e jurisprudência referida].

76      O princípio da inamovibilidade exige, designadamente, que os juízes possam permanecer em funções enquanto não atingirem a idade obrigatória de aposentação ou até ao termo do seu mandato quando este tiver uma duração determinada. Embora não tenha caráter absoluto, o referido princípio só pode sofrer exceções quando motivos legítimos e imperiosos o justifiquem, no respeito do princípio da proporcionalidade. Assim, é comummente aceite que os juízes possam ser destituídos se não estivem aptos a continuar a exercer as suas funções em razão de uma incapacidade ou de falta grave, desde que sejam respeitados os procedimentos adequados.

77      A este propósito, decorre, mais precisamente, da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a exigência de independência impõe que as regras que regem o regime disciplinar e, por conseguinte, uma eventual destituição daqueles que têm a missão de julgar apresentem as garantias necessárias para evitar qualquer risco de utilização desse regime enquanto sistema de controlo político do conteúdo das decisões judiciais. Assim, a adoção de regras que definam, designadamente, tanto os comportamentos constitutivos de infrações disciplinares como as sanções concretamente aplicáveis, que prevejam a intervenção de uma instância independente em conformidade com um processo que garanta plenamente os direitos consagrados nos artigos 47.o e 48.o da Carta, designadamente os direitos de defesa, e que consagrem a possibilidade de impugnar judicialmente as decisões dos órgãos disciplinares constitui um conjunto de garantias essenciais para efeitos da preservação da independência do poder judicial [Acórdão de 25 de julho de 2018, Minister for Justice and Equality (Falhas do sistema judiciário), C‑216/18 PPU, EU:C:2018:586, n.o 67].

78      No caso em apreço, há que declarar que a reforma contestada, que prevê a aplicação da medida que consiste em reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) aos juízes já em exercício nesse tribunal, tem como consequência uma cessação antecipada do exercício das funções jurisdicionais destes últimos e é, assim, suscetível de gerar preocupações legítimas quanto ao respeito do princípio da inamovibilidade dos juízes.

79      Nestas condições, e tendo em conta a importância essencial do referido princípio, recordada nos n.os 75 a 77 do presente acórdão, tal aplicação só pode ser admitida se for justificada por um objetivo legítimo e proporcionada à luz do mesmo e desde que não seja suscetível de suscitar dúvidas legítimas, no espírito dos litigantes, quanto à impermeabilidade do órgão jurisdicional em causa em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto.

80      No caso em apreço, a República da Polónia sustenta que a redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) para 65 anos decorreu da vontade de harmonizar esta idade com a idade geral de aposentação aplicável a todos os trabalhadores na Polónia e otimizar, deste modo, a estrutura de idade dos quadros desse tribunal.

81      A este respeito, importa referir, em primeiro lugar, que o Tribunal de Justiça reconheceu efetivamente a legitimidade que podem revestir objetivos em matéria de emprego como os que visam, por um lado, uniformizar, no âmbito do funcionalismo público, os limites de idades de cessação obrigatória de atividade e, por outro, favorecer o estabelecimento de uma estrutura de idades mais equilibrada que facilite o acesso dos jovens designadamente às profissões de juiz (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de julho de 2011, Fuchs e Köhler, C‑159/10 e C‑160/10, EU:C:2011:508, n.o 50, e de 6 de novembro de 2012, Comissão/Hungria, C‑286/12, EU:C:2012:687, n.os 61 e 62).

82      Todavia, antes de mais, há que salientar, como sublinha a Comissão e também já salientou a Comissão do Conselho da Europa para a Democracia através do Direito (dita «Comissão de Veneza»), nos n.os 33 e 47 do seu Parecer n.o 904/2017 [CDL‑AD (2017)031], que a exposição de motivos do projeto de nova Lei sobre o Supremo Tribunal comporta elementos suscetíveis de gerar dúvidas sérias quanto ao facto de a reforma da idade de aposentação dos juízes em exercício do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) ter sido guiada por esses objetivos, e não por uma vontade de proceder ao afastamento de um certo grupo de juízes desse tribunal.

83      Em seguida, importa recordar que a redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em exercício quando da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal de Justiça foi, no caso em apreço, acompanhada pela instituição de um novo mecanismo que permite ao presidente da República decidir, de forma discricionária, prorrogar o exercício das funções de juiz assim encurtado, por dois períodos consecutivos de três anos.

84      Ora, por um lado, a introdução de tal possibilidade de prorrogação do exercício das funções de juiz por seis anos, concomitantemente com a redução de cinco anos da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em exercício quando da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, é suscetível de criar dúvidas quanto ao facto de a reforma empreendida visar realmente harmonizar a idade de aposentação desses juízes com a aplicável a todos os trabalhadores e otimizar a estrutura de idade dos quadros desse tribunal.

85      Por outro lado, a combinação destas duas medidas é igualmente suscetível de reforçar a impressão de que, na realidade, se poderá ter pretendido afastar uma parte predeterminada dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), conservando o presidente da República, com efeito, o poder discricionário de manter em funções uma parte dos interessados, não obstante a aplicação da medida de redução da idade de aposentação a todos os juízes desse tribunal que estavam em exercício quando da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal.

86      Por último, há que reconhecer que a medida de redução, em cinco anos, da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em exercício quando da entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal e o efeito de encurtamento do exercício das suas funções daí resultante afetaram, de forma imediata, cerca de um terço dos membros em exercício nesse tribunal, entre os quais, nomeadamente, a sua primeira presidente, cujo mandato de seis anos garantido pela Constituição ficou, por esse facto, igualmente encurtado. Como alega a Comissão, esta constatação demonstra o impacto potencialmente considerável da reforma em causa na composição e na continuidade funcional do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal). Ora, como salientou o advogado‑geral no n.o 76 das suas conclusões, tal reorganização substancial da composição de um tribunal supremo, por efeito de uma reforma que se lhe aplica especificamente, pode, por seu turno, suscitar dúvidas quanto à verdadeira natureza dessa reforma e quanto às finalidades efetivamente prosseguidas pela mesma.

87      As dúvidas que envolvem assim as verdadeiras finalidades da reforma contestada e que decorrem do conjunto das considerações expostas nos n.os 82 a 86 do presente acórdão não podem ser afastadas pelos argumentos invocados pela República da Polónia segundo os quais, por um lado, alguns dos juízes em exercício do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) afetados por esta reforma foram nomeados para esse lugar numa época em que a idade de aposentação dos juízes desse tribunal era de 65 anos e, por outro, esses juízes, quando se aposentam, mantêm o título de juiz, continuam a beneficiar de imunidade e de emolumentos e permanecem sujeitos a certas regras deontológicas.

88      Com efeito, estas circunstâncias, admitindo que estão demonstradas, não são suscetíveis de pôr em causa o facto de que a aposentação dos juízes afetados implica a cessação imediata e antecipada do exercício das suas funções jurisdicionais, relativamente ao que estava previsto antes da adoção da reforma contestada.

89      Em segundo lugar, como a República da Polónia confirmou na audiência, a idade geral de aposentação dos trabalhadores com a qual este Estado‑Membro indica ter pretendido alinhar a idade da aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) não implica a aposentação automática desses trabalhadores, mas apenas o direito, e não a obrigação, de estes últimos cessarem a sua atividade profissional e beneficiarem, nesse caso, de uma pensão de aposentação.

90      Nestas condições, a República da Polónia não demonstrou que a medida contestada constitui um meio adequado para reduzir a diversidade dos limites de idade de cessação obrigatória de atividade para o conjunto das profissões em causa. Em especial, este Estado‑Membro não apresentou nenhuma razão objetiva pela qual, para efeitos do alinhamento da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) com a idade geral de aposentação aplicável a todos os trabalhadores na Polónia, era necessário prever uma aposentação automática dos referidos juízes, sem prejuízo da possibilidade de continuação do exercício das suas funções decidida de forma discricionária pelo presidente da República, quando, para o resto dos trabalhadores, a aposentação na idade prevista pela lei a este respeito é facultativa.

91      Em terceiro lugar, importa sublinhar que, relativamente ao objetivo de uniformização da idade de aposentação, o Tribunal de Justiça já declarou que disposições nacionais que procedam a uma diminuição imediata e considerável do limite de idade para a cessação obrigatória da atividade dos juízes, sem prever medidas transitórias suscetíveis de proteger a confiança legítima das pessoas afetadas em exercício quando da entrada em vigor dessas disposições, não respeitam o princípio da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdão de 6 de novembro de 2012, Comissão/Hungria, C‑286/12, EU:C:2012:687, n.os 68 e 80).

92      Quanto ao Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117), ao qual também se referiu a República da Polónia para justificar a legitimidade da medida nacional contestada pela Comissão no âmbito da sua primeira alegação, recorde‑se que esse acórdão dizia respeito a uma medida de redução do montante da remuneração dos juízes. No referido acórdão, após ter salientado que essa medida de redução salarial estava, simultaneamente, limitada quanto ao seu montante, era temporária e não tinha sido especificamente adotada em relação aos membros do Tribunal de Contas (Portugal), mas que, pelo contrário, se assemelhava a uma medida de aplicação geral, o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 19.o TUE deve ser interpretado no sentido de que o princípio da independência dos juízes não se opõe à aplicação de tal medida.

93      Ora, considerados sob o ângulo da proteção da independência dos juízes, os efeitos dessa redução salarial limitada e temporária não são de modo algum comparáveis com os de uma medida que consiste numa redução da idade de aposentação de juízes em exercício, que, por seu turno, tem como consequência pôr termo à carreira judicial dos interessados, de forma antecipada e definitiva.

94      Em quarto lugar, a aplicação imediata da reforma contestada aos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) em exercício à data de entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal também não pode ser justificada pela preocupação, expressa pela República da Polónia, de evitar uma eventual discriminação, em termos de duração do exercício das funções de juiz, entre estes juízes e os que serão nomeados para esse tribunal após essa data.

95      Com efeito, como alega a Comissão, estas duas categorias de juízes não estão numa situação análoga, uma vez que só os primeiros ficam com a carreira encurtada quando estão em funções no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), enquanto os segundos, por seu turno, são nomeados para esse tribunal na vigência da nova legislação que prevê a idade legal de aposentação aos 65 anos. Além disso, na medida em que a República da Polónia sugere igualmente, na sua argumentação, que não seria reconhecida aos juízes já em exercício no Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal), diversamente dos seus colegas nomeados após a entrada em vigor da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, a possibilidade de beneficiar da nova idade de aposentação introduzida por esta lei, importa observar que, como salientou a Comissão, poderia ter sido prevista a possibilidade de os interessados renunciarem, voluntariamente, ao exercício das suas funções, quando atingissem essa nova idade legal de aposentação, sem, portanto, os obrigar a fazê‑lo.

96      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que declarar que a aplicação da medida de redução da idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) aos juízes em exercício nesse tribunal não é justificada por um objetivo legítimo. Por conseguinte, a referida aplicação infringe o princípio da inamovibilidade dos juízes que é inerente à sua independência.

97      Daqui resulta que a primeira alegação da Comissão, relativa à violação do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, deve ser julgada procedente.

 Quanto à segunda alegação

 Argumentos das partes

98      Com a sua segunda alegação, a Comissão acusa a República da Polónia de ter violado o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, ao conferir ao presidente da República, nos termos da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, o poder discricionário de prorrogar, por duas vezes, cada uma por um período de três anos, a função judicial ativa dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) para além da nova idade de aposentação fixada por esta lei.

99      Segundo a Comissão, na falta tanto de critérios vinculativos que enquadrem a decisão de conceder ou não tais prorrogações do exercício das funções de juiz como da obrigação de fundamentar essas decisões e da possibilidade de fiscalização jurisdicional das mesmas, o presidente da República fica em condições de exercer uma influência sobre os juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal). Com efeito, a perspetiva de ter de se dirigir ao presidente da República para pedir tais prorrogações e, em seguida, uma vez apresentados esses pedidos, a situação de aguardar a decisão deste último são suscetíveis de gerar, no juiz em causa, uma pressão suscetível de o conduzir a submeter‑se a eventuais desejos do presidente da República no que diz respeito aos processos de que conhece, incluindo quando é chamado a interpretar e a aplicar disposições do direito da União.

100    A obrigação que incumbe ao presidente da República de pedir o parecer do Conselho Nacional da Magistratura, prevista no artigo 37.o, n.os 1‑A e 1‑B, e no artigo 111.o‑A da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, bem como no artigo 5.o da Lei de alteração de 10 de maio de 2018, não afeta a conclusão anterior. Com efeito, os critérios fixados a este conselho para dar o seu parecer são demasiado gerais e este parecer não vincula o presidente da República. Além disso, tendo em conta a recente reforma da ustawa o Krajowej Radzie Sądownictwa (Lei relativa ao Conselho Nacional da Magistratura), de 12 de maio de 2011 (Dz. U. de 2011, posição 714), efetuada pela ustawa o zmianie ustawy o Krajowej Radzie Secdownictwa oraz niektórych innych ustaw (Lei que altera a Lei sobre o Conselho Nacional da Magistratura e algumas outras leis), de 8 de dezembro de 2017 (Dz. U. de 2018, posição 3), os quinze membros deste conselho que, dos vinte e sete membros que o compõem, devem ser eleitos de entre os juízes já não seriam eleitos pelos seus pares como anteriormente, mas pelo Parlamento, de modo que se pode duvidar da sua independência.

101    Por último, a Comissão alega que, no que respeita aos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que atinjam os 65 anos depois de 3 de julho de 2018, não foi fixado um prazo no qual o presidente da República deve pedir o parecer do Conselho Nacional da Magistratura, o que tem como potencial efeito aumentar o período efetivo em que a manutenção do juiz em causa no seu cargo fica à discricionariedade do presidente da República.

102    Estes diferentes fatores são suscetíveis de conduzir a uma situação em que deixará de se considerar que o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) oferece a garantia de que atua, em quaisquer circunstâncias, de forma imparcial e independente.

103    A República da Polónia alega que a possibilidade, conferida ao presidente da República, de decidir sobre a eventual prorrogação do exercício das funções dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) que tenham atingido a idade de aposentação constitui uma competência derivada da prerrogativa, confiada a esse mesmo presidente pela Constituição, de nomear os juízes. Ora, esta prerrogativa, que tem precisamente como finalidade proteger o poder judicial de ingerências tanto do poder legislativo como do poder executivo, deve ser exercida pessoalmente pelo presidente da República no respeito unicamente das normas e dos princípios constitucionais, e é jurisprudência constante que as decisões deste de recusa de nomeação de um candidato para um lugar de juiz constituem atos que não se inserem no domínio da atividade administrativa e que não podem ser objeto de recurso jurisdicional.

104    Todavia, segundo a República da Polónia, os pareceres transmitidos ao presidente da República pelo Conselho Nacional da Magistratura têm em conta, como resulta do artigo 37.o, n.o 1‑B, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, o interesse do sistema judicial ou um interesse social importante, em especial a utilização racional dos membros do pessoal do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) ou as necessidades resultantes do volume de trabalho de algumas das Secções deste último. Além disso, embora tais pareceres não possam revestir caráter vinculativo para o presidente da República sem infringir as prerrogativas constitucionais deste último mencionadas no número anterior, é evidente que, na prática, o mesmo tem em conta esses pareceres. É também claro que, mesmo que esta lei não preveja qualquer prazo para esse efeito, o presidente da República solicita o parecer do Conselho Nacional da Magistratura a partir do momento em que está na posse do pedido de prorrogação do exercício de funções formulado por um juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal).

105    No que respeita à composição do Conselho Nacional da Magistratura, a República da Polónia indica que não partilha dos receios da Comissão. Além disso, alega que esses receios não são pertinentes para efeitos da apreciação do presente processo, uma vez que a Comissão acusa, em substância, este Estado‑Membro de ter deixado a decisão de autorizar ou não a eventual continuação no exercício das funções de juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) para além da idade legal de aposentação à discricionariedade do presidente da República, sem que exista uma possibilidade de recurso jurisdicional contra essa decisão, e que, por sua vez, o parecer do Conselho Nacional da Magistratura não é, em todo o caso, vinculativo para o presidente da República.

106    Por último, a República da Polónia considera que os juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) não podem, na prática, deixar‑se influenciar pelo presidente da República com o único objetivo de prorrogarem o exercício das suas funções em vez de se aposentarem beneficiando de uma pensão elevada, tanto mais que o segredo da deliberação impede este último de dispor de informações sobre o sentido do voto emitido por cada juiz. De resto, o prazo em que o presidente da República é chamado a pronunciar‑se sobre o pedido formulado por um juiz com vista à continuação do exercício das suas funções, ou seja, cerca de quatro meses, é bastante breve.

107    Acresce que existem modelos semelhantes de prorrogação do exercício de funções judiciais para além da idade normal de aposentação noutros Estados‑Membros além da República da Polónia e a recondução de um juiz do Tribunal de Justiça da União Europeia depende, também ela, da apreciação discricionária do governo do Estado‑Membro de origem do interessado.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

108    Como recordado nos n.os 72 a 74 do presente acórdão, as garantias de independência e de imparcialidade dos órgãos jurisdicionais exigem que a instância em causa exerça as suas funções com total autonomia, estando protegida contra as intervenções ou as pressões externas suscetíveis de prejudicar a independência de julgamento dos seus membros e de influenciar as suas decisões, no respeito da objetividade e sem que exista qualquer interesse na solução do litígio. As regras destinadas a garantir esta independência e esta imparcialidade devem permitir afastar qualquer dúvida legítima, no espírito dos litigantes, quanto à impermeabilidade dessa instância em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto.

109    No caso em apreço, é de salientar, antes de mais, que a regra nacional objeto da segunda alegação da Comissão é relativa não ao processo de nomeação de candidatos ao exercício de funções judiciais, mas à possibilidade de os juízes em exercício, que beneficiam, por conseguinte, das garantias inerentes ao exercício dessas funções, prosseguirem o exercício das mesmas para além da idade normal de aposentação, e que esta regra diz, assim, respeito às condições de evolução e de cessação da carreira desses juízes.

110    Por outro lado, embora caiba exclusivamente aos Estados‑Membros decidir se autorizam ou não essa prorrogação do exercício de funções judiciais para além da idade normal de aposentação, não deixa de ser verdade que, quando optam por esse mecanismo, estão obrigados a zelar por que as condições e as modalidades a que está sujeita essa prorrogação não sejam suscetíveis de pôr em causa o princípio da independência dos juízes.

111    A este respeito, é certo que a circunstância de um órgão como o presidente da República estar investido do poder de decidir conceder ou não essa eventual prorrogação não é suficiente, por si só, para concluir pela existência de uma violação do referido princípio. Todavia, há que garantir que as condições materiais e as modalidades processuais que presidem à adoção dessas decisões sejam tais que não possam criar, no espírito dos litigantes, dúvidas legítimas quanto à impermeabilidade dos juízes em causa em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses em confronto.

112    Para esse efeito, importa, nomeadamente, que as referidas condições e modalidades sejam concebidas de maneira a que esses juízes se encontrem ao abrigo de eventuais tentações de ceder a intervenções ou a pressões externas que possam pôr em perigo a sua independência (v., neste sentido, Acórdão de 31 de janeiro de 2013, D. e A., C‑175/11, EU:C:2013:45, n.o 103). Assim, tais modalidades devem, em especial, permitir excluir não só qualquer influência direta, sob a forma de instruções, mas também as formas de influência mais indireta suscetíveis de orientar as decisões dos juízes em causa (v., por analogia, Acórdãos de 16 de outubro de 2012, Comissão/Áustria, C‑614/10, EU:C:2012:631, n.o 43, e de 8 de abril de 2014, Comissão/Hungria, C‑288/12, EU:C:2014:237, n.o 51).

113    Ora, no caso em apreço, as condições e as modalidades processuais a que a nova Lei sobre o Supremo Tribunal subordina a eventual prorrogação do exercício das funções de juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) para além da idade normal de aposentação não satisfazem tais exigências.

114    A este respeito, saliente‑se, em primeiro lugar, que, por força da nova Lei sobre o Supremo Tribunal, essa prorrogação está atualmente sujeita a uma decisão do presidente da República que reveste caráter discricionário, na medida em que a sua adoção não está, enquanto tal, enquadrada por nenhum critério objetivo e verificável e não tem de ser fundamentada. Além disso, tal decisão não pode ser objeto de recurso jurisdicional.

115    Em segundo lugar, quanto ao facto de a nova Lei sobre o Supremo Tribunal prever que o Conselho Nacional da Magistratura é chamado a emitir um parecer dirigido ao presidente da República antes de este adotar a sua decisão, é verdade que a intervenção dessa instância, no contexto de um processo de prorrogação do exercício das funções de um juiz para além da idade normal da sua aposentação, pode, em princípio, ser suscetível de contribuir para conferir objetividade a esse processo.

116    Todavia, tal só se verifica se estiverem preenchidas certas condições, nomeadamente se a referida instância for, ela própria, independente dos poderes legislativo e executivo e da autoridade para a qual deve emitir um parecer, e se esse parecer for emitido com base em critérios simultaneamente objetivos e pertinentes e estiver devidamente fundamentado, de maneira que seja adequado para esclarecer objetivamente essa autoridade na sua tomada de decisão.

117    A este respeito, basta constatar que, como a República da Polónia confirmou na audiência, o Conselho Nacional da Magistratura, quando foi chamado a emitir tais pareceres dirigidos ao presidente da República, limitou‑se, regra geral e na falta de uma regra que o obrigue a fundamentar esses pareceres, a emitir pareceres, favoráveis ou desfavoráveis, umas vezes sem qualquer fundamentação, outras acompanhados de uma fundamentação puramente formal fazendo uma simples remissão genérica para os termos em que estão formulados os critérios fixados no artigo 37.o, n.o 1‑B, da nova Lei sobre o Supremo Tribunal. Nestas condições, e sem que seja sequer necessário determinar se critérios como os que esta disposição menciona revestem um caráter suficientemente transparente, objetivo e verificável, não se pode deixar de concluir que tais pareceres não são suscetíveis de contribuir para esclarecer de forma objetiva o presidente da República no exercício do poder de que está investido para autorizar ou recusar a continuação do exercício das funções de juiz do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) depois de o interessado ter atingido a idade normal de aposentação.

118    Em face do exposto, há que declarar que o poder discricionário de que está investido o presidente da República para autorizar, por duas vezes, cada uma por três anos, entre a idade de 65 anos e a idade de 71 anos, a continuação do exercício das funções de juiz de um tribunal nacional supremo como o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) é suscetível de gerar dúvidas legítimas, nomeadamente no espírito dos litigantes, quanto à impermeabilidade dos juízes em causa em relação a elementos externos e à sua neutralidade relativamente aos interesses suscetíveis de estar em confronto perante esses juízes.

119    Por último, o argumento da República da Polónia relativo a uma alegada semelhança entre as disposições nacionais postas em causa e os procedimentos aplicáveis noutros Estados‑Membros ou por ocasião da eventual renovação do mandato de juiz do Tribunal de Justiça da União Europeia não pode ser acolhido.

120    Com efeito, mesmo admitindo que um processo previsto noutro Estado‑Membro contenha, na perspetiva do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, vícios análogos aos identificados a propósito das disposições nacionais em causa no presente processo, o que não foi demonstrado, a verdade é que um Estado‑Membro não se pode basear na eventual violação do direito da União por outro Estado‑Membro para justificar o seu próprio incumprimento (v., neste sentido, Acórdão de 6 de junho de 1996, Comissão/Itália, C‑101/94, EU:C:1996:221, n.o 27 e jurisprudência referida).

121    Por outro lado, importa recordar que, diferentemente dos magistrados nacionais que são nomeados até atingirem a idade legal de aposentação, a nomeação de juízes para o Tribunal de Justiça ocorre, como prevê o artigo 253.o TFUE, por um período determinado de seis anos. Por outro lado, uma nova nomeação para esse lugar de um juiz cessante requer, por força deste artigo, e à semelhança da sua nomeação inicial, o comum acordo dos governos dos Estados‑Membros, após parecer do comité previsto no artigo 255.o TFUE.

122    As condições assim fixadas pelos Tratados não podem alterar o alcance das obrigações que impendem sobre os Estados‑Membros por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

123    Por conseguinte, a segunda alegação da Comissão, relativa à violação do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, e, por conseguinte, a ação na sua totalidade devem ser julgadas procedentes.

124    Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que declarar que, por um lado, ao prever a aplicação da medida que consiste em reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal) aos juízes em exercício que foram nomeados para esse tribunal antes de 3 de abril de 2018 e, por outro, ao conceder ao presidente da República o poder discricionário de prorrogar a função judicial ativa dos juízes do referido tribunal para além da nova idade de aposentação fixada, a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

 Quanto às despesas

125    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República da Polónia e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

126    Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a Hungria suporta as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1)      Por um lado, ao prever a aplicação da medida que consiste em reduzir a idade de aposentação dos juízes do Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal, Polónia) aos juízes em exercício que foram nomeados para esse tribunal antes de 3 de abril de 2018 e, por outro, ao conceder ao presidente da República o poder discricionário de prorrogar a função judicial ativa dos juízes do referido tribunal para além da nova idade de aposentação fixada, a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE.

2)      A República da Polónia é condenada nas despesas.

3)      A Hungria suporta as suas próprias despesas.

Assinaturas


*      Língua do processo: polaco.