Language of document : ECLI:EU:T:2018:761

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

8 de novembro de 2018 (*)

«Diretiva 2010/30/EU — Indicação do consumo, por meio de rotulagem e de outras indicações uniformes relativas aos produtos, em energia e outros recursos, dos produtos ligados à energia — Regulamento delegado da Comissão que complementa a diretiva — Rotulagem energética dos aspiradores — Elemento essencial de um ato de habilitação»

No processo T‑544/13 RENV,

Dyson Ltd, com sede em Malmesbury (Reino Unido), representada por F. Carlin, barrister, E. Batchelor e M. Healy, solicitors, assistidos por A. Patsa, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por L. Flynn, K. Herrmann e K. Talabér‑Ritz, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido nos termos do artigo 263.o TFUE e destinado a obter a anulação do Regulamento Delegado (UE) n.o 665/2013 da Comissão, de 3 de maio de 2013, que complementa a Diretiva 2010/30/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no respeitante à rotulagem energética dos aspiradores (JO 2013, L 192, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: D. Gratsias, presidente, I. Labucka (relator) e I. Ulloa Rubio, juízes,

secretário: N. Schall, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 13 de março de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O presente recurso tem por objeto um pedido, apresentado pela recorrente, Dyson Ltd, sociedade de direito inglês que emprega 4 400 pessoas mundialmente e que concebe, fabrica e comercializa, em mais de sessenta países, aspiradores domésticos cujos coletores de pó funcionam com recipientes sem saco, destinado a obter a anulação do Regulamento Delegado (UE) n.o 665/2013 da Comissão, de 3 de maio de 2013, que complementa a Diretiva 2010/30/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no respeitante à rotulagem energética dos aspiradores (JO 2013, L 192, p. 1; a seguir «regulamento impugnado»).

 Quadro jurídico

2        O regulamento impugnado foi adotado pela Comissão Europeia para complementar a Diretiva 2010/30/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de maio de 2010, relativa à indicação do consumo de energia e de outros recursos por parte dos produtos relacionados com a energia, por meio de rotulagem e outras indicações uniformes relativas aos produtos (JO 2010, L 153, p. 1), no respeitante à rotulagem energética dos aspiradores.

 Diretiva 2010/30

3        Nos termos do seu artigo 1.o, n.os 1 e 2, a Diretiva 2010/30 «estabelece um quadro para a harmonização das medidas nacionais relativas à informação do utilizador final, nomeadamente através de rotulagem e de indicações uniformes relativas ao produto, sobre o consumo de energia e, se pertinente, de outros recursos essenciais durante a utilização, bem como de informações suplementares relativas a produtos relacionados com a energia, dando assim aos utilizadores finais a possibilidade de escolherem produtos mais eficientes», e é aplicável «aos produtos relacionados com a energia que têm um impacto significativo direto ou indireto no consumo de energia e, se for o caso, de outros recursos essenciais, durante a sua utilização».

4        Segundo o artigo 5.o, alínea a), da Diretiva 2010/30, os Estados‑Membros devem assegurar que «os fornecedores que coloquem no mercado ou coloquem em serviço produtos abrangidos por um ato delegado forneçam um rótulo e uma ficha nos termos da […] diretiva e do ato delegado».

5        O artigo 10.o da Diretiva 2010/30, sob a epígrafe «Atos delegados», dispõe:

«1.      A Comissão define os pormenores relativos ao rótulo e à ficha mediante atos delegados nos termos dos artigos 11.o, 12.o e 13.o para cada tipo de produto de acordo com o presente artigo.

Caso um produto cumpra os critérios enunciados no n.o 2, deve ser abrangido por um ato delegado nos termos do n.o 4.

As disposições contidas em atos delegados relativos às informações fornecidas no rótulo e na ficha sobre o consumo de energia e de outros recursos essenciais durante a utilização devem permitir aos utilizadores finais tomarem decisões de compra baseadas numa melhor informação e às autoridades de vigilância do mercado verificarem se os produtos correspondem às informações fornecidas.

Caso um ato delegado estabeleça disposições relativas à eficiência energética e ao consumo de recursos essenciais de um produto, o formato e o conteúdo do rótulo devem dar destaque à eficiência energética do produto.

2.      Os critérios referidos no n.o 1 são os seguintes:

a)      Tendo em conta os mais recentes números disponíveis e considerando as quantidades colocadas no mercado da União, os produtos devem ter um potencial significativo de poupança de energia e, se for o caso, de outros recursos essenciais;

b)      Os produtos disponíveis no mercado com funcionalidades equivalentes devem apresentar grande variedade de níveis de desempenho relevantes;

c)      A Comissão deve ter em conta a legislação da União e as medidas de autorregulação pertinentes, tais como acordos voluntários, que se espere atinjam os objetivos políticos mais rapidamente ou com menores custos do que os requisitos obrigatórios.

3.      Ao preparar um projeto de ato delegado, a Comissão deve:

a)      Ter em conta os parâmetros ambientais estabelecidos no Anexo I, Parte 1, da Diretiva 2009/125/CE que sejam considerados significativos no correspondente ato delegado aprovado nos termos da referida diretiva e que sejam relevantes para o utilizador final durante a utilização;

b)      Avaliar o impacto do ato sobre o ambiente, os utilizadores finais e os fabricantes, incluindo pequenas e médias empresas (PME), em termos de competitividade, nomeadamente nos mercados fora da União, inovação, acesso ao mercado e custos/benefícios;

c)      Efetuar uma consulta adequada das partes interessadas;

d)      Fixar a data ou as datas de aplicação e qualquer medida ou período faseado ou transitório, tendo em conta em especial os possíveis impactos sobre as PME ou sobre grupos específicos de produtos fabricados principalmente por PME.

4.      Os atos delegados devem especificar, nomeadamente:

a)      A definição exata do tipo de produtos abrangidos;

b)      As normas e os métodos de medição a utilizar para obtenção das informações a que se refere o n.o 1 do artigo 1.o;

c)      As especificações relativas à documentação técnica exigida por força do artigo 5.o;

d)      O formato e o conteúdo do rótulo previsto no artigo 4.o, que deve, sempre que possível, apresentar características gráficas uniformes entre grupos de produtos e, em todos os casos, ser claramente visível e legível. O formato do rótulo deve ter por base a classificação que utiliza as letras de A a G; os escalões de classificação devem corresponder a poupanças significativas de energia e de custos na perspetiva do utilizador final.

Se for necessário em virtude do progresso tecnológico, podem ser acrescentadas três classes adicionais à classificação. Serão elas A+, A++ e A+++ para a classe mais eficiente. Em princípio o número total de classes deve limitar‑se a sete, a não ser que haja elementos para mais classes.

A escala de cores não deve ter mais de sete cores diferentes, que vão do verde‑escuro ao vermelho. Só o código de cor da classe mais elevada será sempre verde‑escuro. Se houver mais de sete classes, a única cor que pode ser duplicada é o vermelho.

A classificação deve ser revista em particular quando uma proporção significativa de produtos no mercado interno atingir as duas classes de eficiência energética mais elevadas e quando se possam conseguir poupanças adicionais através de uma maior diferenciação dos produtos.

Se necessário, são determinados caso a caso no ato delegado aplicável critérios detalhados para uma possível reclassificação dos produtos;

e)      […]

f)      O conteúdo e, se for caso disso, o formato e outras especificações da ficha ou das informações suplementares previstas no artigo 4.o e na alínea c) do artigo 5.o As informações constantes do rótulo devem constar igualmente da ficha;

g)      O conteúdo específico do rótulo para fins de publicidade, incluindo, se for caso disso, a classe energética e outros níveis de desempenho relevantes do produto em questão, de uma forma legível e visível;

h)      A duração da classificação energética, de acordo com a alínea d), se for o caso;

i)      O nível de exatidão das declarações constantes dos rótulos e fichas;

j)      A data da avaliação e da possível revisão do ato delegado, tendo em conta a rapidez do progresso tecnológico.»

6        O artigo 11.o da Diretiva 2010/30, sob a epígrafe «Exercício da delegação», especifica o seguinte:

«1.      O poder de adotar atos delegados referido no artigo 10.o é conferido à Comissão por um período de cinco anos a contar de 19 de junho de 2010. A Comissão apresenta um relatório sobre os poderes delegados o mais tardar seis meses antes do final do período de cinco anos. A delegação de poderes é renovada automaticamente por períodos de igual duração, salvo se o Parlamento Europeu ou o Conselho a revogarem nos termos do artigo 12.o

2.      Assim que aprovar um ato delegado, a Comissão notifica‑o simultaneamente ao Parlamento Europeu e ao Conselho.

[…]»

 Regulamento impugnado

7        Para complementar a Diretiva 2010/30 no respeitante à rotulagem energética dos aspiradores, a Comissão adotou o regulamento impugnado em 3 de maio de 2013.

8        Nos termos do seu artigo 1.o, n.o 1, o regulamento impugnado «estabelece requisitos para a rotulagem e o fornecimento de informações suplementares sobre os aspiradores alimentados pela rede elétrica, incluindo os aspiradores híbridos».

9        O artigo 3.o do regulamento impugnado, sob a epígrafe «Responsabilidades dos fornecedores e calendário», dispõe:

«1.      Os fornecedores devem garantir que, a partir de 1 de setembro de 2014:

a)      Cada aspirador seja fornecido com um rótulo impresso no formato e com as informações previstos no anexo II;

b)      Seja disponibilizada uma ficha de produto, como previsto no Anexo III;

c)      A documentação técnica, descrita no anexo IV, seja disponibilizada, a pedido, às autoridades dos Estados‑Membros e à Comissão;

d)      Qualquer anúncio publicitário relativo a um modelo específico de aspirador, caso forneça informações sobre a energia ou o preço, indique também a classe de eficiência energética;

e)      Qualquer material técnico promocional relativo a um modelo específico de aspirador que descreva os seus parâmetros técnicos específicos indique a sua classe de eficiência energética.

2.      O formato do rótulo previsto no anexo II deve ser aplicado de acordo com o seguinte calendário:

a)      Para os aspiradores colocados no mercado a partir de 1 de setembro de 2014, os rótulos devem ser conformes com o rótulo 1 do anexo II;

b)      Para os aspiradores colocados no mercado a partir de 1 de setembro de 2017, os rótulos devem ser conformes com o rótulo 2 do anexo II.»

10      O artigo 5.o do regulamento impugnado, sob a epígrafe «Métodos de medição», especifica que as «informações a fornecer em conformidade com os artigos 3.o e 4.o devem ser obtidas por métodos de medição e de cálculo fiáveis, exatos e reprodutíveis, que tomem em consideração os métodos de medição e cálculo reconhecidos como os mais avançados, como indicado no anexo VI».

11      O artigo 7.o do regulamento impugnado, sob a epígrafe «Revisão», dispõe:

«A Comissão deve rever o presente regulamento à luz do progresso tecnológico o mais tardar cinco anos após a sua entrada em vigor. A revisão deve avaliar, nomeadamente, as tolerâncias de verificação previstas no Anexo VII, a eventual inclusão dos aspiradores de dimensão normal alimentados por bateria no âmbito de aplicação e a viabilidade do recurso a métodos de medição do consumo anual de energia, da taxa de remoção de pó e da taxa de reemissão de pó baseados em medições efetuadas com o recipiente parcialmente cheio em vez de vazio.»

12      O ponto 1 do anexo VI do regulamento impugnado estabelece:

«Os métodos de medição e de cálculo para cumprimento e verificação do cumprimento dos requisitos do presente regulamento devem ser fiáveis, exatos e reprodutíveis e ter em conta os métodos de medição e de cálculo geralmente reconhecidos como os mais avançados, incluindo normas harmonizadas cujos números de referência tenham sido publicados para o efeito no Jornal Oficial da União Europeia. Devem ainda respeitar as definições técnicas, as condições, as equações e os parâmetros estabelecidos neste anexo.»

13      O regulamento impugnado foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 13 de julho de 2013.

 Tramitação processual no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça

14      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de outubro de 2013, a recorrente pediu ao Tribunal a anulação do regulamento impugnado.

15      A recorrente invocou três fundamentos de recurso, sendo o primeiro relativo à falta de competência da Comissão, o segundo, à falta de fundamentação do regulamento impugnado, e o terceiro, à violação do princípio da igualdade de tratamento.

16      Em 18 de novembro de 2013, a Comissão apresentou na Secretaria do Tribunal Geral a sua contestação na qual pediu ao Tribunal Geral que negasse provimento ao recurso e condenasse a recorrente nas despesas.

17      Por Acórdão de 11 de novembro de 2015, Dyson/Comissão (T‑544/13, a seguir «acórdão inicial», EU:T:2015:836), o Tribunal Geral negou provimento ao recurso e condenou a recorrente nas despesas.

18      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 25 de janeiro de 2016, a recorrente interpôs recurso do acórdão inicial.

19      Por Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão (C‑44/16 P, a seguir «acórdão proferido em sede de recurso», EU:C:2017:357), o Tribunal de Justiça anulou o acórdão inicial na medida em que tinha julgado improcedentes a primeira parte do primeiro fundamento e o terceiro fundamento invocados em primeira instância e remeteu o processo ao Tribunal Geral para que decida sobre a primeira parte do primeiro fundamento e sobre o terceiro fundamento invocados em primeira instância, reservando para final a decisão quanto às despesas.

 Tramitação processual e pedidos das partes após a remessa do processo

20      Na sequência do acórdão proferido em sede de recurso e em conformidade com o artigo 215.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o processo foi distribuído à Quinta Secção do Tribunal Geral.

21      Em conformidade com o artigo 217.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a recorrente e a Comissão apresentaram, nos prazos atribuídos, observações escritas sobre as conclusões a retirar do acórdão proferido em sede de recurso para a resolução do litígio.

22      Em conformidade com o artigo 217.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, a recorrente requereu que lhe fosse permitido apresentar um articulado complementar das observações escritas da Comissão.

23      Por decisão do presidente da Quinta Secção do Tribunal Geral de 9 de agosto de 2017, o pedido da recorrente foi indeferido.

24      Nos termos do disposto no artigo 67.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a recorrente requereu ao Tribunal Geral que o processo fosse julgado com prioridade.

25      Por decisão do presidente da Quinta Secção de 9 de agosto de 2017, o Tribunal Geral decidiu julgar o presente processo com prioridade.

26      Nos termos do artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a recorrente e a Comissão apresentaram, em 29 e 30 de agosto de 2017 respetivamente, um pedido para serem ouvidas em audiência de alegações.

27      Por carta de 21 de fevereiro de 2018, a recorrente pediu para utilizar meios técnicos na audiência a fim de acompanhar as suas alegações orais com uma apresentação PowerPoint.

28      Por decisão do presidente da Quinta Secção de 26 de fevereiro de 2018, o Tribunal Geral autorizou a recorrente a utilizar os meios técnicos solicitados.

29      Sem se opor formalmente à utilização de meios técnicos na audiência, a Comissão requereu ao Tribunal Geral que ordenasse à recorrente que identificasse claramente na sua apresentação PowerPoint os aspetos do processo a que se referia, sob pena de inadmissibilidade.

30      Além disso, a Comissão pediu ao Tribunal Geral que ordenasse à recorrente que facultasse uma cópia da apresentação PowerPoint dois dias úteis antes da audiência de alegações.

31      Por medida de organização do processo de 7 de março de 2018, o Tribunal Geral (Quinta Secção) pediu à recorrente que apresentasse uma versão impressa da apresentação PowerPoint antes da audiência.

32      Em 12 de março de 2018, a recorrente remeteu à Secretaria do Tribunal Geral uma versão impressa da apresentação PowerPoint.

33      Em 13 de março de 2018, foram ouvidas as alegações das partes.

34      Na audiência, a Comissão argumentou que os diagramas relativos ao terceiro fundamento do recurso que figuravam na apresentação PowerPoint não correspondiam aos elementos dos autos do processo T‑544/13 e do presente processo e pediu ao Tribunal Geral que os declarasse inadmissíveis.

35      A recorrente concluiu pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o regulamento impugnado;

–        condenar a Comissão na totalidade das despesas.

36      A Comissão concluiu pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao âmbito do recurso de anulação

37      Em apoio do seu recurso em primeira instância, a recorrente invoca três fundamentos. O primeiro é relativo à falta de competência da Comissão, o segundo, à falta de fundamentação do regulamento impugnado e, o terceiro, à violação do princípio da igualdade de tratamento.

38      Ora, pelo acórdão proferido em sede de recurso, o Tribunal de Justiça, por um lado, anulou o acórdão inicial na medida em que o Tribunal Geral julgou improcedentes a primeira parte do primeiro fundamento e o terceiro fundamento invocados em primeira instância e, por outro, remeteu o processo ao Tribunal Geral para que decida de novo sobre a primeira parte do primeiro fundamento e sobre o terceiro fundamento invocados em primeira instância (acórdão proferido em sede de recurso, n.os 1 e 2 do dispositivo).

39      No que respeita ao primeiro fundamento do recurso, o alcance da anulação do acórdão inicial é limitado à sua primeira parte.

40      Segundo o Tribunal de Justiça, o recurso interposto pela recorrente não se destinava a contestar o raciocínio do Tribunal Geral que levou a julgar improcedente a segunda parte desse fundamento (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 48).

41      Por conseguinte, importa unicamente examinar no presente processo a legalidade do regulamento impugnado à luz da primeira parte do primeiro fundamento e do terceiro fundamento.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à falta de competência da Comissão

 Quanto à admissibilidade do primeiro fundamento

42      Pelo acórdão proferido em sede de recurso, o Tribunal de Justiça entendeu que o Tribunal Geral tinha cometido um erro de direito ao não se pronunciar sobre um dos fundamentos da petição (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 54).

43      Esse erro de direito resulta, segundo o Tribunal de Justiça, da requalificação, pelo Tribunal Geral, do primeiro fundamento do recurso, na medida em que a recorrente, segundo o Tribunal Geral, não invocava a falta de competência da Comissão enquanto tal, no respeitante à adoção do regulamento delegado, mas contestava, essencialmente, o exercício dessa competência. Assim, o Tribunal Geral considerou que o primeiro fundamento do recurso era, em substância, relativo a um erro manifesto de apreciação (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 51).

44      No entanto, segundo a Comissão, resulta incontestavelmente da petição que o primeiro fundamento de anulação é relativo ao facto de a Comissão não ser competente para adotar o regulamento impugnado (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 50).

45      Mais especificamente, segundo o Tribunal de Justiça, a recorrente censurava, em substância, a Comissão por não ter respeitado, na adoção do regulamento impugnado, um elemento essencial do ato de habilitação ao fixar como método de cálculo do desempenho energético dos aspiradores um método baseado em testes com recipientes vazios, quando o artigo 10.o da Diretiva 2010/30 exigia que o referido método refletisse as condições normais de utilização (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 50).

46      O Tribunal de Justiça acrescenta que a margem de discricionariedade conferida pelo ato de habilitação é uma questão de direito distinta da questão do respeito dos limites do mandato conferido pelo ato de habilitação (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 52).

47      Por conseguinte, em conformidade com o acórdão proferido em sede de recurso, há que considerar que o primeiro fundamento do recurso é relativo à inobservância, pela Comissão, de um elemento essencial do ato de habilitação constante da Diretiva 2010/30 e não a um erro manifesto de apreciação da Comissão na adoção do regulamento impugnado.

 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento do recurso, relativa à inobservância, pela Comissão, de um elemento essencial do ato de habilitação constante da Diretiva 2010/30

48      Com a primeira parte do primeiro fundamento do recurso, a recorrente alega que o regulamento impugnado induz os consumidores em erro quanto à eficiência energética dos aspiradores, porque o desempenho de limpeza é medido mediante testes com um recipiente vazio e, consequentemente, não «durante a utilização», pelo que o regulamento impugnado infringe o conteúdo, os objetivos e a estrutura geral da Diretiva 2010/30 no que se refere à eficiência energética dos aspiradores.

49      Para concluir no sentido da incompetência da Comissão, a recorrente observa, antes de mais, que o objetivo da Diretiva 2010/30 é a promoção da eficiência energética através da disponibilização aos consumidores finais de informações exatas relativas ao consumo de energia e de outros recursos essenciais «durante a utilização».

50      A finalidade da Diretiva 2010/30 consiste, pois, por um lado, em permitir aos utilizadores finais que escolham produtos com maior rendimento e, por outro, em incentivar os fabricantes de aspiradores a tomar medidas destinadas a reduzir o consumo de energia.

51      Em seguida, a recorrente sustenta que o regulamento impugnado não corresponde ao conteúdo, nem aos objetivos, nem à estrutura geral da Diretiva 2010/30.

52      Segundo a recorrente, o regulamento impugnado não permite que se preste uma informação exata aos consumidores sobre a eficiência energética uma vez que, por um lado, os testes para mostrar o desempenho energético dos aspiradores previstos pelo regulamento impugnado produzem resultados errados, uma vez que são efetuados com um recipiente vazio e não com um recipiente cheio, e, por outro, os testes realizados com um recipiente vazio não podem mostrar com precisão o desempenho energético dos aspiradores, uma vez que não são efetuados em condições normais de utilização.

53      Por outro lado, o regulamento impugnado não incita os fabricantes a optar pela melhor opção de conceção, uma vez que os mesmos não são incentivados a investir para colmatar a perda de aspiração e, por essa mesma razão, a reduzir o aumento do consumo energético resultante de um recipiente cheio.

54      Por último, a recorrente alega que o regulamento impugnado poderia causar um aumento do consumo energético, quando o objetivo da Diretiva 2010/30 é a redução do referido consumo.

55      Nas suas observações sobre o acórdão proferido em sede de recurso, a recorrente interpreta este último acórdão no sentido de que o Tribunal Geral deve verificar se a Comissão pode demonstrar que, na adoção do regulamento impugnado, não podia ser utilizado nenhum método cientificamente válido para determinar o desempenho energético de um aspirador com um recipiente carregado sem a Comissão cometer um «exceder os limites da sua competência».

56      A recorrente acrescenta que a Comissão reconhece que um teste efetuado com um recipiente carregado é suficientemente fiável, preciso e reprodutível, que o referido método foi submetido a ensaios «multilaboratoriais» que atestam o seu caráter reprodutível, que a validade científica dos testes realizados com um recipiente cheio foi reconhecida pelas autoridades nacionais e pelos órgãos jurisdicionais, e que a Comissão deveria ter perseverado na elaboração de um método de cálculo baseado em testes realizados com um recipiente carregado.

57      Nas suas observações sobre o acórdão proferido em sede de recurso, a Comissão interpreta‑o no sentido de que o Tribunal Geral está obrigado a apreciar se o método previsto no regulamento impugnado era tão próximo quanto possível das condições de uso efetivas na data de adoção do referido regulamento.

58      A Comissão alega que atuou dentro dos limites da sua competência no que respeita a um elemento essencial da Diretiva 2010/30, concretamente a adoção de um método de ensaio tão próximo quanto possível das condições de uso efetivas.

59      Tal resulta do mandato conferido ao Comité Europeu de Normalização Eletrotécnica (Cenelec), da convenção de subvenção celebrada com o referido Comité e de estudos posteriores, na medida em que, sem ter imposto a montante nenhum método específico, todos os estudos efetuados pelo Cenelec permitem concluir que só um teste com um recipiente vazio pode apresentar resultados cientificamente comparáveis entre vários laboratórios.

60      Segundo a Comissão, esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de admitir um teste com um recipiente cheio para o estudo da durabilidade do motor prescrito pelo Regulamento (UE) no 666/2013 da Comissão, de 8 de julho de 2013, que dá execução à Diretiva 2009/125/CE do Parlamento Europeu e do Conselho no que respeita aos requisitos de conceção ecológica para os aspiradores (JO 2013, L 192, p. 24).

61      Assim, no âmbito do primeiro fundamento, na medida em que é relativo à falta de competência da Comissão, a recorrente alega, numa primeira parte, que a Comissão infringiu a competência delegada que lhe advinha do artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2010/30.

62      Importa, do mesmo modo, primeiro, verificar se o regulamento impugnado desrespeitou elementos essenciais da Diretiva 2010/30, à luz do seu conteúdo, e, segundo, em caso afirmativo, verificar a incidência de tal facto.

63      Em primeiro lugar, há que observar que, no acórdão proferido em sede de recurso, o Tribunal de Justiça considerou precisamente que a informação do consumidor sobre a eficiência energética dos aparelhos durante a sua utilização, tal como resultava do artigo 1.o e do artigo 10.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/30, constituía um objetivo essencial da referida diretiva e refletia uma opção política da responsabilidade própria do legislador da União Europeia (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 64).

64      Com efeito, decorre, por um lado, dos considerandos 5 e 8 da Diretiva 2010/30 que «[a] existência de uma informação rigorosa, adequada e comparável sobre o consumo específico de energia» dos produtos «desempenha um papel fundamental no funcionamento das forças do mercado» e, por conseguinte, na capacidade de orientar o consumo para aparelhos «que consumam […] menos energia […] durante a sua utilização» (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 64).

65      Por outro lado, o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2010/30 prevê que esta se destina a harmonizar as medidas nacionais relativas à informação do utilizador final sobre o consumo de energia «durante a utilização», a fim de que possam escolher produtos «mais eficientes» (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 64).

66      De resto, como resulta do acórdão proferido em sede de recurso, entender a expressão «durante a utilização», que consta do artigo 10.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/30, no sentido de que visa as condições reais de utilização constitui não uma interpretação «excessivamente extensiva» do artigo 10.o desta diretiva, mas o próprio sentido dessa precisão (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 66).

67      Essa afirmação não pode ser posta em causa, segundo o acórdão proferido em sede de recurso, pelo facto de o regulamento impugnado apenas se destinar a completar, e não a alterar, a diretiva (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 65).

68      Por conseguinte, segundo o Tribunal de Justiça, tendo em conta o que precede, a Comissão tinha a obrigação, a fim de não ignorar um elemento essencial da Diretiva 2010/30, de fixar, no âmbito do regulamento impugnado, um método de cálculo que permitisse medir o desempenho energético dos aspiradores em condições tão próximas quanto possível das condições reais de utilização, exigindo que o recipiente do aspirador esteja cheio até um certo nível, tendo em conta, todavia, as exigências ligadas à validade científica dos resultados obtidos e à exatidão das informações dadas aos consumidores, tais como são designadamente referidas no considerando 5 e no artigo 5.o, alínea b), desta diretiva (acórdão proferido em sede de recurso, n.o 68).

69      A este respeito, resulta do n.o 68 do acórdão proferido em sede de recurso que, para que o método adotado pela Comissão seja conforme aos elementos essenciais da Diretiva 2010/30, devem estar preenchidos dois requisitos cumulativos.

70      Por um lado, para medir o desempenho energético dos aspiradores em condições tão próximas quanto possível das condições reais de utilização, o recipiente do aspirador deve estar cheio até um certo nível.

71      Por outro lado, o método fixado deve cumprir determinadas exigências ligadas à validade científica dos resultados obtidos e à exatidão das informações dadas aos consumidores.

72      Ora, no caso em apreço, resulta tanto do artigo 7.o do regulamento impugnado como do conjunto dos elementos dos autos do presente processo que a Comissão fixou um método de cálculo do desempenho energético dos aspiradores baseado num recipiente vazio.

73      Por conseguinte, há que observar que o primeiro requisito previsto pelo ato de habilitação tal como interpretado pelo acórdão proferido em sede de recurso não está preenchido.

74      Essa constatação basta para concluir que a Comissão não respeitou um elemento essencial do ato de habilitação.

75      Com efeito, na medida em que o método fixado pela Comissão não preenche o primeiro requisito, não é necessária a pronúncia sobre a questão de saber de esse método preenche o segundo requisito previsto pelo ato de habilitação constante da Diretiva 2010/30.

76      De resto, se nenhum método de cálculo praticado com o recipiente cheio até um certo nível cumpria as exigências ligadas à validade científica dos resultados obtidos e à exatidão das informações dadas aos consumidores, a Comissão continuava a ter a possibilidade de exercer o seu direito de iniciativa legislativa, em conformidade com o artigo 289.o, n.o 1, TFUE, para propor ao legislador da União uma alteração do ato de habilitação.

77      Consequentemente, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada procedente.

78      Em segundo lugar, de acordo com a jurisprudência, o mero facto de considerar que um fundamento invocado pelo recorrente para sustentar o seu recurso de anulação é procedente não permite ao Tribunal Geral anular automaticamente o ato impugnado na sua totalidade. Com efeito, não se pode proferir uma anulação total quando se revele de forma evidente que o referido fundamento, que visa unicamente um aspeto específico do ato impugnado, só é suscetível de fundamentar uma anulação parcial (Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Département du Loiret, C‑295/07 P, EU:C:2008:707, n.o 104 e jurisprudência aí referida).

79      Ora, segundo jurisprudência constante, a anulação parcial de um ato da União só é possível se os elementos cuja anulação é pedida forem destacáveis da parte restante do ato. Essa exigência não está satisfeita quando a anulação parcial de um ato tenha por efeito modificar a substância deste (Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Département du Loiret, C‑295/07 P, EU:C:2008:707, n.os 105 e 106 e jurisprudência aí referida).

80      No caso em apreço, cumpre assinalar que o regulamento impugnado não pode ser objeto de anulação parcial, a saber, unicamente na medida em que, com a sua adoção, a Comissão estabeleceu um método de cálculo baseado num recipiente vazio.

81      Com efeito, este último elemento não pode ser destacado do resto do ato, uma vez que se presume que todas as informações que devem ser objeto da rotulagem energética dos aspiradores são obtidas com base nesse método de cálculo.

82      Por conseguinte, o regulamento impugnado deve ser anulado na sua totalidade, sem que seja necessário conhecer do terceiro fundamento do recurso nem dos pedidos de inadmissibilidade dos diagramas apresentados na audiência de alegações, que estão relacionados com o terceiro fundamento do recurso.

 Quanto às despesas

83      Em conformidade com o artigo 219.o do Regulamento de Processo, nas decisões do Tribunal Geral proferidas após anulação e remessa, este Tribunal decide das despesas relativas, por um lado, aos processos que nele correram e, por outro, ao processo de recurso para o Tribunal de Justiça.

84      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela recorrente, incluindo as relativas ao processo de recurso perante o Tribunal de Justiça, em conformidade com o pedido desta última.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      O Regulamento Delegado (UE) n.o 665/2013 da Comissão, de 3 de maio de 2013, que complementa a Diretiva 2010/30/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no respeitante à rotulagem energética dos aspiradores, é anulado.

2)      A Comissão Europeia é condenada nas despesas, incluindo as relativas ao processo perante o Tribunal de Justiça.

Gratsias

Labucka

Ulloa Rubio

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de novembro de 2018.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.