Language of document : ECLI:EU:C:2017:802

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

25 de outubro de 2017 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Regulamento (CE) n.o 1907/2006 (REACH) — Artigo 57.o — Substâncias que suscitam uma elevada preocupação — Identificação — Artigo 2.o, n.o 8, alínea b) — Isenção — Artigo 3.o, ponto 15 — Conceito de “substância intermédia” — Acrilamida»

No processo C‑650/15 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 4 de dezembro de 2015,

Polyelectrolyte Producers Group GEIE (PPG), com sede em Bruxelas (Bélgica),

SNF SAS, com sede em Andrézieux Bouthéon (França),

representadas por E. Mullier e R. Cana, avocats, e por D. Abrahams, barrister,

recorrentes,

sendo as outras partes no processo:

Agência Europeia dos Produtos Químicos(ECHA), representada por M. Heikkilä e W. Broere, na qualidade de agentes, assistidos por J. Stuyck e S. Raes, advocaten,

recorrida em primeira instância,

Reino dos Países Baixos, representado por M. Bulterman e B. Koopman, na qualidade de agentes,

Comissão Europeia, representada por K. Talabér‑Ritz, E. Manhaeve, K. Mifsud‑Bonnici e D. Kukovec, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, C. G. Fernlund (relator), J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev e E. Regan, juízes,

advogado‑geral: E  Sharpston,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 11 de janeiro de 2017,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 6 de julho de 2017,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso, a Polyelectrolyte Producers Group GEIE (PPG) e a SNF SAS pedem a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 25 de setembro de 2015, PPG e SNF/ECHA (T‑268/10 RENV, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2015:698), pelo qual este negou provimento ao recurso de anulação da decisão da Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA), de 22 de dezembro de 2009, que identificou a acrilamida (CE n.o 201‑173‑7) como substância que satisfaz os critérios previstos no artigo 57.o do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH), que cria a Agência Europeia dos Produtos Químicos, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.o 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE da Comissão (JO 2006, L 396, p. 1; retificação no JO 2007, L 136, p. 3), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 552/2009 da Comissão, de 22 de junho de 2009 (JO 2009, L 164, p. 7) (a seguir «Regulamento REACH»), em conformidade com o artigo 59.o do referido regulamento (a seguir «decisão controvertida»).

 Quadro jurídico

2        O considerando 41 do Regulamento REACH tem a seguinte redação:

«Por uma questão de exequibilidade e dada a natureza específica das substâncias intermédias, deverão estabelecer‑se requisitos específicos para o seu registo. Os polímeros deverão ficar isentos de registo e avaliação até que se possam selecionar aqueles que carecem de registo devido aos riscos que representam para a saúde humana ou para o ambiente, de forma viável e económica e com base em critérios científicos tecnicamente sólidos e válidos.»

3        O artigo 2.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Aplicação», prevê:

«1.      O presente regulamento não se aplica:

[…]

c)      Aos produtos intermédios não isolados;

[…]

8.      Os produtos intermédios isolados nas instalações e os produtos intermédios isolados e transportados estão isentos das disposições:

[…]

b)      Do título VII.

9.      As disposições dos títulos II e VI não se aplicam aos polímeros.»

4        O artigo 3.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Definições», dispõe:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

15.      Substância intermédia: uma substância que é fabricada e consumida ou utilizada para processamento químico, tendo em vista a sua transformação noutra substância (a seguir denominada “síntese”):

a)      Substância intermédia não isolada: uma substância intermédia que, durante a síntese, não é intencionalmente retirada (exceto para amostragem) do equipamento em que a síntese se realiza. Esse equipamento inclui o reator, o seu equipamento auxiliar e qualquer equipamento através do qual a ou as substâncias passem durante um processo de fluxo contínuo ou descontínuo, assim como as tubagens para transferência entre recipientes para realizar a fase seguinte da reação, mas exclui os tanques ou outros recipientes em que a ou as substâncias são armazenadas após o fabrico;

b)      Substância intermédia isolada nas instalações: uma substância intermédia que não satisfaz os critérios de substância intermédia não isolada, quando o fabrico da substância intermédia e a síntese de outra ou outras substâncias a partir desse produto se realize nas mesmas instalações, administradas por uma ou mais entidades jurídicas;

c)      Substância intermédia isolada transportada: uma substância intermédia que não satisfaz os critérios de substância intermédia não isolada, e que é transportada entre instalações ou fornecida a outras instalações;

16.      Instalações: um local único onde, caso exista mais que um fabricante de uma ou mais substâncias, são partilhados certos equipamentos e infraestruturas;

[…]»

5        O artigo 17.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Registo de substâncias intermédias isoladas nas instalações», tem a seguinte redação:

«1.      Qualquer fabricante de uma substância intermédia isolada nas instalações em quantidades iguais ou superiores a uma tonelada por ano apresenta à Agência um registo respeitante a essa substância.

2.      O registo de uma substância intermédia isolada nas instalações deve incluir todas as seguintes informações, na medida em que o fabricante possa apresentá‑las sem a realização de ensaios adicionais:

a)      Identidade do fabricante, conforme especificado no ponto 1 do Anexo VI;

b)      Identidade da substância intermédia, conforme especificado nos pontos 2.1 a 2.3.4 do Anexo VI;

c)      Classificação da substância intermédia, conforme especificado no ponto 4 do Anexo VI;

d)      Quaisquer informações existentes disponíveis sobre as propriedades físico‑químicas da substância intermédia e os seus efeitos na saúde humana ou no ambiente. Sempre que esteja disponível um relatório de estudo completo, é apresentado um resumo do estudo;

e)      Breve descrição genérica da utilização, conforme especificado no ponto 3.5 do Anexo VI;

f)      Descrição pormenorizada das medidas de gestão dos riscos aplicadas.

[…]

3.      O n.o 2 só se aplica a uma substância intermédia isolada nas instalações se o fabricante confirmar que a substância em causa é exclusivamente fabricada e utilizada em condições estritamente controladas que garantem que está rigorosamente confinada, através de meios técnicos, durante a totalidade do seu ciclo de vida. Devem ser utilizadas tecnologias de procedimento e de controlo para minimizar as emissões e a exposição daí resultante.

Se estas condições não estiverem satisfeitas, o registo deve incluir as informações especificadas no artigo 10.o»

6        O artigo 18.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Registo de substâncias intermédias isoladas transportadas», prevê:

«1.      Qualquer fabricante ou importador de uma substância intermédia isolada transportada em quantidades iguais ou superiores a uma tonelada por ano apresenta à Agência um registo respeitante a essa substância.

2.      O registo de uma substância intermédia isolada transportada deve incluir todas as seguintes informações:

a)      Identidade do fabricante ou importador, conforme especificado no ponto 1 do Anexo VI;

b)      Identidade da substância intermédia, conforme especificado nos pontos 2.1 a 2.3.4 do Anexo VI;

c)      Classificação da substância intermédia, conforme especificado no ponto 4 do Anexo VI;

d)      Quaisquer informações existentes disponíveis sobre as propriedades físico‑químicas da substância intermédia e os seus efeitos na saúde humana ou no ambiente. Sempre que esteja disponível um relatório de estudo completo, é apresentado um resumo do estudo;

e)      Breve descrição genérica da utilização, conforme especificado no ponto 3.5 do Anexo VI;

f)      Informações sobre as medidas de gestão dos riscos aplicadas e recomendadas ao utilizador de acordo com o n.o 4.

[…]

3.      O registo de uma substância intermédia isolada transportada em quantidades superiores a 1000 toneladas por ano por fabricante ou importador deve incluir as informações especificadas no Anexo VII, além das informações previstas no n.o 2.

Para a produção destas informações é aplicável o disposto no artigo 13.o

4.      Os n.os 2 e 3 só se aplicam a uma substância intermédia isolada transportada se o fabricante ou importador confirmar ele próprio, ou declarar que o utilizador lhe confirmou, que a síntese de uma ou várias outras substâncias a partir dessa substância é realizada noutras instalações nas seguintes condições estritamente controladas:

a)      A substância está rigorosamente confinada, através de meios técnicos, durante a totalidade do seu ciclo de vida, incluindo as operações de fabrico, purificação, limpeza e manutenção do equipamento, amostragem, análise, carga e descarga de equipamentos ou de recipientes, eliminação de resíduos ou purificação e armazenagem;

b)      São utilizadas tecnologias de procedimento e de controlo para minimizar as emissões e a exposição daí resultante;

c)      A substância é manuseada unicamente por pessoal devidamente qualificado e autorizado;

d)      No caso de trabalhos de limpeza e manutenção, executam‑se procedimentos especiais, como purga e lavagem, antes da abertura ou entrada no sistema;

e)      Em caso de acidente e de produção de resíduos, utilizam‑se tecnologias de procedimentos e/ou de controlo para minimizar as emissões e a exposição daí resultante durante as operações de purificação ou limpeza e manutenção;

f)      Os procedimentos para o manuseamento de substâncias estão bem documentados e rigorosamente supervisionados pelo operador da instalação.

Se as condições mencionadas no primeiro parágrafo não estiverem satisfeitas, o registo deve incluir as informações especificadas no artigo 10.o

[…]»

7        O título VII do Regulamento REACH, intitulado «Autorização», abrange, designadamente, os artigos 56.o a 64.o

8        O artigo 56.o deste regulamento, sob a epígrafe «Regras gerais», prevê, no n.o 1:

«Um fabricante, importador ou utilizador a jusante não deve colocar no mercado uma substância destinada a uma utilização nem a deve utilizar ele próprio se essa substância estiver incluída no Anexo XIV, a menos que:

a)      A utilização da substância — estreme, contida numa mistura ou incorporada num artigo — para a qual a substância é colocada no mercado ou é por ele utilizada tenha sido autorizada em conformidade com os artigos 60.o a 64.o; ou

b)      A utilização da substância — estreme, contida numa mistura ou incorporada num artigo — para a qual a substância é colocada no mercado ou é por ele utilizada tenha sido isenta da própria obrigação de autorização no Anexo XIV em conformidade com o n.o 2 do artigo 58.o; ou

[…]»

9        O artigo 57.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Substâncias a incluir no Anexo XIV», tem a seguinte redação:

«As seguintes substâncias podem ser incluídas no Anexo XIV nos termos do artigo 58.o:

a)      Substâncias que satisfaçam os critérios de classificação como cancerígenas da categoria 1 ou 2, de acordo com a Diretiva 67/548/CEE;

b)      Substâncias que satisfaçam os critérios de classificação como mutagénicas da categoria 1 ou 2, de acordo com a Diretiva 67/548/CEE;

c)      Substâncias que satisfaçam os critérios de classificação como tóxicas para a reprodução da categoria 1 ou 2, de acordo com a Diretiva 67/548/CEE;

d)      Substâncias que sejam persistentes, bioacumuláveis e tóxicas de acordo com os critérios estabelecidos no Anexo XIII do presente regulamento;

e)      Substâncias que sejam muito persistentes e muito bioacumuláveis de acordo com os critérios estabelecidos no Anexo XIII do presente regulamento;

f)      Substâncias, como as que apresentam propriedades perturbadoras do sistema endócrino ou que tenham propriedades persistentes, bioacumuláveis e tóxicas ou propriedades muito persistentes e muito bioacumuláveis, que não preenchem os critérios das alíneas d) ou e), em relação às quais existam provas científicas de que são suscetíveis de provocar efeitos graves na saúde humana ou no ambiente que originam um nível de preocupação equivalente ao das outras substâncias mencionadas nas alíneas a) a e), identificadas caso a caso, nos termos do artigo 59.o»

10      O artigo 59.o do Regulamento REACH, sob a epígrafe «Identificação das substâncias a que se refere o artigo 57.o», dispõe:

«1.      Para efeitos de identificação das substâncias que satisfazem os critérios referidos no artigo 57.o e de estabelecimento de uma lista de substâncias candidatas para eventual inclusão no Anexo XIV, aplica‑se o procedimento previsto nos n.os 2 a 10 do presente artigo. […]

[…]

3.      Qualquer Estado‑Membro pode elaborar um dossiê de acordo com o Anexo XV relativamente às substâncias que, na sua opinião, satisfazem os critérios estabelecidos no artigo 57.o e enviá‑lo à Agência. […]

[…]

7.      Caso sejam apresentadas ou recebidas observações, a Agência remete o dossiê para o Comité dos Estados‑Membros, no prazo de quinze dias a contar do final do período de sessenta dias indicado no n.o 5.

8.      Se, no prazo de trinta dias após o envio para o Comité dos Estados‑Membros, este chegar a um acordo unânime sobre a identificação, a Agência inclui essa substância na lista a que se refere o n.o 1. A Agência pode incluir essa substância nas recomendações que formular ao abrigo do n.o 3 do artigo 58.o

9.      Se o Comité dos Estados‑Membros não chegar a acordo por unanimidade, a Comissão elabora um projeto de proposta sobre a identificação da substância no prazo de três meses a contar da receção do parecer do Comité dos Estados‑Membros. A decisão final sobre a identificação da substância é aprovada nos termos do n.o 3 do artigo 133.o

10.      A Agência publica e atualiza a lista referida no n.o 1 no seu sítio logo que for tomada uma decisão sobre a inclusão de uma substância.»

11      Os artigos 60.o a 64.o do Regulamento REACH são relativos ao procedimento de autorização.

12      O Regulamento (UE) n.o 366/2011 da Comissão, de 14 de abril de 2011, que altera o Regulamento n.o 1907/2006, no que respeita ao Anexo XVII (acrilamida) (JO 2011, L 101, p. 12), dispõe que é aditada a entrada 60 a este quadro:

«60. Acrilamida N.° CAS 79‑06‑1

Não pode ser colocada no mercado nem utilizada como substância ou como componente de misturas em concentrações iguais ou superiores a 0,1% em peso, para utilizações em caldas de injeção após 5 de novembro de 2012.»


 Antecedentes do litígio

13      Resulta dos n.os 1 a 10 do acórdão recorrido que, pela decisão controvertida, a ECHA incluiu a acrilamida na lista das substâncias identificadas para inclusão no Anexo XIV do Regulamento REACH, devido à sua classificação como substância cancerígena de categoria 2 e mutagénica de categoria 2.

 Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

14      Em 10 de junho de 2010, a PPG e a SNF interpuseram recurso de anulação da decisão controvertida.

15      Por despacho de 21 de setembro de 2011, PPG e SNF/ECHA (T‑268/10, EU:T:2011:508), o Tribunal Geral julgou inadmissível o recurso interposto pela PPG e pela SNF.

16      Por acórdão de 26 de setembro de 2013, PPG e SNF/ECHA (C‑625/11 P, EU:C:2013:594), o Tribunal de Justiça anulou o despacho de 21 de setembro de 2011, PPG e SNF/ECHA (T‑268/10, EU:T:2011:508), remeteu o processo ao Tribunal Geral e reservou para final a decisão quanto às despesas.

17      O Reino dos Países Baixos e a Comissão apresentaram as suas observações em 16 de setembro de 2014 e 17 de setembro de 2014, respetivamente.

18      Pelo acórdão recorrido, o Tribunal Geral, após ter julgado improcedente uma exceção de inadmissibilidade invocada pela ECHA, negou provimento ao recurso interposto pela PPG e pela SNF e condenou‑as nas despesas.

 Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

19      A PPG e a SNF concluem pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        anular a decisão controvertida ou, a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral; e

–        condenar a ECHA nas despesas.

20      A ECHA conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne dar provimento ao recurso e condenar a PPG e a SNF nas despesas.

21      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne negar provimento ao recurso.

 Quanto ao recurso

 Quanto ao primeiro fundamento

 Argumentos das partes

22      A PPG e a SNF alegam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do conceito de «substância intermédia» definida no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH. Nos n.os 54 a 58 e 66 a 68 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral acrescentou um requisito não previsto pela referida disposição. Esse requisito adicional restringe o conceito de substância intermédia às substâncias cuja transformação química tem por «objetivo principal» o fabrico de outra substância. Este requisito adicional tem por consequência excluir da categoria das substâncias intermédias qualquer substância sintetizada com o objetivo de exercer uma função específica, correspondente à utilização final dessa substância.

23      A interpretação acolhida pelo Tribunal Geral levou à recusa da qualificação de substância intermédia para a acrilamida utilizada para fins de estanquidade. A justificação dessa recusa prende‑se com o facto de, em tal situação, a acrilamida «não [ser] utilizada para fabricar» a poliacrilamida, mas de se tratar de uma «utilização final» desse monómero.

24      Essa interpretação levou, além disso, o Tribunal Geral, nos n.os 56 a 58 do acórdão recorrido, a recusar a qualificação de substância intermédia para a acrilamida utilizada para produzir poliacrilamida quando esta última é depois utilizada no fabrico de géis de eletroforese, com o fundamento de que o objetivo final dessa transformação não era o fabrico de poliacrilamida mas a separação analítica de moléculas por eletroforese.

25      Desse modo, o Tribunal Geral criou uma confusão entre, por um lado, a utilização da acrilamida para efeitos da produção de poliacrilamida e, por outro, a utilização para a qual a poliacrilamida está destinada, ou seja, as aplicações de estanquidade e de eletroforese. O Tribunal Geral equiparou o «objetivo principal» da transformação da substância inicial à «utilização principal» da substância sintetizada.

26      Ao recusar qualificar um monómero de substância intermédia, o Tribunal Geral, implicitamente, considerou que esta substância não deixa de existir no final da polimerização, contrariamente ao que o Tribunal de Justiça decidiu no n.o 34 do acórdão de 7 de julho de 2009, S.P.C.M. e o. (C‑558/07, EU:C:2009:430).

27      A PPG e a SNF alegam que a interpretação acolhida pelo Tribunal Geral é contrária ao objetivo do Regulamento REACH e ao documento da ECHA intitulado «Orientações sobre substâncias intermédias» (documento ECHA‑2010‑G‑17‑PT). Por razões, designadamente práticas, expostas no considerando 41 deste regulamento, as substâncias intermédias estão sujeitas a um regime específico caracterizado, por um lado, por condições de registo particulares fixadas nos artigos 17.o e 18.o do referido regulamento e, por outro, por uma isenção do título VII do mesmo regulamento.

28      A razão de ser desse regime derrogatório prende‑se com o facto de a exposição a essas substâncias ser limitada, o que, paralelamente, implica também um nível de risco menos significativo do que para as outras substâncias.

29      A ECHA e a Comissão contestam a argumentação da PPG e da SNF.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

30      A fim de determinar se o primeiro fundamento, relativo a um erro de direito na interpretação do conceito de «substância intermédia» definida no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH, é procedente, importa recordar que, nesse regulamento, o termo «substância intermédia» é utilizado como substantivo para identificar certas substâncias que, em razão da sua utilização, beneficiam de um regime derrogatório, caracterizado por uma atenuação de determinadas obrigações previstas pelo referido regulamento.

31      Em conformidade com a definição constante do artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH, o termo «substância intermédia» é aplicável a uma substância que é fabricada e consumida ou utilizada para processamento químico, tendo em vista a sua transformação noutra substância através de um processo químico denominado «síntese».

32      Além disso, o artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH divide as substâncias intermédias em três categorias. A primeira, de «substância intermédia não isolada», é relativa à substância intermédia que não é intencionalmente retirada do equipamento em que a síntese se realiza. O Regulamento REACH não é aplicável a esta primeira categoria, por força do seu artigo 2.o, n.o 1, alínea c). A segunda categoria, dita «substância intermédia isolada nas instalações», é aplicável a uma substância intermédia cujo fabrico e síntese se realizam nas mesmas instalações. A terceira categoria, dita «substância intermédia isolada transportada», respeita a uma substância intermédia transportada entre instalações. Estas duas últimas categorias de substâncias intermédias estão isentas do título VII deste regulamento, por força do seu artigo 2.o, n.o 8, alínea b).

33      Resulta destes elementos que o artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH exige que estejam preenchidas três condições, para que a utilização de uma substância possa ser considerada de intermédia. Conforme salientou a advogada‑geral no n.o 56 das suas conclusões, a primeira dessas condições prende‑se com a finalidade do fabrico e da utilização de uma substância como substância intermédia, que consiste em transformar uma substância em outra. A segunda condição prende‑se com o recurso técnico utilizado para efetuar essa transformação, a saber, um processo químico denominado «síntese». A terceira condição restringe o alcance do conceito de «substância intermédia» às utilizações de uma substância que permanecem confinadas a um ambiente controlado, que tanto pode ser o dispositivo em cujo interior tem lugar a síntese como a instalação em cujo interior tem lugar o fabrico e a síntese ou para a qual essa substância é transportada, sendo o próprio conceito de «instalações» definido no artigo 3.o, ponto 16, do Regulamento REACH como um «local único» onde estão implantadas infraestruturas e equipamentos.

34      No caso em apreço, no que respeita às duas primeiras condições recordadas no número anterior, o Tribunal Geral decidiu, no n.o 66 do acórdão recorrido, que «resulta da definição de substância intermédia, prevista no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento [REACH], que essa qualificação como substância intermédia depende do objetivo pretendido pelo seu fabrico e utilização. [S]egundo essa definição, uma substância intermédia é uma substância fabricada e consumida ou utilizada para processamento químico tendo em vista a sua transformação por síntese». Através desta apreciação, que foi reiterada, em substância, nos n.os 67 e 68 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral interpretou corretamente o conceito de «substância intermédia» e, contrariamente ao que alegam a PPG e a SNF, não cometeu um erro de direito.

35      Por outro lado, as alegações dirigidas contra os n.os 50 a 58 do acórdão recorrido, relativos à apreciação do Tribunal Geral sobre a admissibilidade do recurso em primeira instância, questionam, em substância, as razões por que este recusou considerar que a acrilamida é exclusivamente utilizada enquanto «substância intermédia». A este propósito, depois de ter declarado, no n.o 51 do acórdão recorrido, que 99,9% da acrilamida é utilizada enquanto substância intermédia, o Tribunal Geral considerou, quanto ao resto, que a utilização desta substância em produtos de vedação e para a preparação de géis de eletroforese à base de poliacrilamida não podia ser qualificada de intermédia.

36      No que respeita aos produtos de vedação, o Tribunal Geral considerou no essencial que, embora a utilização da acrilamida implique a transformação química desta substância em poliacrilamida, o objetivo principal desse processo não era produzir poliacrilamida mas realizar uma função de estanquidade, descrita no n.o 52 do acórdão recorrido, que consiste, nomeadamente, em colmatar as infiltrações de água, reparar o betão e tratar as ascensões capilares de água.

37      Assim, o Tribunal Geral decidiu, no n.o 54 do acórdão recorrido, que, «segundo a definição do artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento [REACH], uma substância intermédia é uma substância fabricada e consumida ou utilizada para processamento químico, tendo em vista a sua síntese. No caso vertente, é exato que o agente de estanquidade à base de acrilamida é utilizado no fabrico de uma outra substância ou é ele próprio transformado nessa outra substância, a saber, um polímero. Todavia, como afirma a ECHA, a acrilamida não é utilizada tendo em vista a sua própria síntese, na aceção da definição prevista no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento [REACH]. A acrilamida não é utilizada para fabricar outra substância, consistindo o objetivo principal do processo químico em realizar uma função de estanquidade, que se produz quando o agente de estanquidade à base de acrilamida se polimeriza. Ao polimerizar‑se, solidifica num gel rígido que é impermeável à água quando utilizado nas operações de estanquidade. A utilização da acrilamida como agente de estanquidade não é, portanto, uma utilização intermédia, mas uma utilização final da substância».

38      Importa, todavia, salientar que, uma vez que a finalidade prosseguida no fabrico e na utilização de uma substância é transformá‑la noutra, a primeira das três condições decorrentes do artigo 3.o, ponto 15, do referido regulamento para qualificar uma substância de «substância intermédia» está preenchida. O artigo 3.o, ponto 15, do mesmo regulamento não contém nenhum critério adicional que permita estabelecer uma diferenciação em função da natureza principal ou acessória dessa finalidade ou averiguar se o processo químico pelo qual uma substância é transformada noutra se confunde com a utilização final a que essa substância se destina.

39      Assim sendo, ao recusar que a acrilamida, no âmbito do processo de transformação em poliacrilamida destinada a funções de estanquidade, seja qualificada de «substância intermédia», o Tribunal Geral, tendo acrescentado uma condição que não está prevista no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH, fez uma interpretação errada desta disposição.

40      No entanto, esse erro de direito não tem repercussões na validade do acórdão recorrido, na medida em que afeta fundamentos subsidiários. Com efeito, as razões expostas nos n.os 50 a 58 do acórdão recorrido que são objeto do primeiro fundamento do recurso, relativas à admissibilidade do recurso em primeira instância, são corolário da conclusão, não contestada, no n.o 43 do acórdão recorrido, segundo a qual a decisão controvertida é suscetível de produzir efeitos diretos na situação jurídica dos fornecedores dessa substância. Esses efeitos diretos decorrem da obrigação de informação prevista no artigo 31.o, n.o 9, alínea a), do referido regulamento, dado que a identificação de uma substância em conformidade com o procedimento previsto no artigo 59.o do Regulamento REACH constitui uma nova informação suscetível de obrigar os referidos fornecedores a atualizar a ficha de dados de segurança mencionada no referido artigo 31.o Daqui decorre que o primeiro fundamento do recurso, na medida em que tem por objeto os n.os 50 a 58 do acórdão recorrido, é inoperante.

41      Resulta das considerações precedentes que o primeiro fundamento deve ser rejeitado por ser, em parte, improcedente e, em parte, inoperante.

 Quanto ao segundo fundamento

 Argumentos das partes

42      Com o segundo fundamento do recurso, que tem por objeto os n.os 64 a 71 e 77 do acórdão recorrido, a PPG e a SNF acusam o Tribunal Geral de não se ter pronunciado sobre a sua alegação relativa à violação do artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH e, portanto, de não ter respeitado o seu dever de fundamentação. Alegam que o acórdão recorrido não expôs as razões pelas quais a isenção estabelecida em termos claros por esta disposição não é aplicável ao artigo 59.o do referido regulamento.

43      A ECHA e a Comissão consideram que a fundamentação do acórdão recorrido é suficiente.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

44      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o dever de fundamentação que incumbe ao Tribunal Geral exige‑lhe que mostre de forma clara e inequívoca o raciocínio que seguiu, de maneira a permitir aos interessados conhecer as justificações da decisão adotada e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização jurisdicional (v., designadamente, acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 372, e despacho de 1 de junho de 2017, Universidad Internacional de la Rioja/EUIPO, C‑50/17 P, não publicado, EU:C:2017:415, n.o 12).

45      No presente caso, após ter exposto, no n.o 63 do acórdão recorrido, a argumentação da PPG e da SNF relativa à violação do artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH, o Tribunal Geral, nos n.os 64 a 71, expôs as razões que o levaram a decidir que essa argumentação não era procedente.

46      A fundamentação do acórdão recorrido mostra, pois, de forma clara e inequívoca o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral para julgar improcedente o primeiro fundamento do recurso que era chamado a decidir.

47      Por conseguinte, o segundo fundamento do recurso deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento

 Argumentos das partes

48      Com este terceiro fundamento, que tem por objeto os n.os 64 a 71 e 77 do acórdão recorrido, a PPG e a SNF sustentam que a interpretação do Regulamento REACH adotada pelo Tribunal Geral para recusar considerar que as substâncias intermédias estão isentas do procedimento de identificação previsto no artigo 59.o deste regulamento é manifestamente contrária à redação clara do seu artigo 2.o, n.o 8, alínea b). Esta disposição tem por objeto a totalidade do título VII do mesmo regulamento, sem exceção. Se o legislador da União tivesse pretendido excluir o procedimento de identificação do âmbito da isenção reservada às substâncias intermédias, tê‑lo‑ia feito através de uma disposição explícita. Dado que não existe qualquer ambiguidade na redação desta disposição, não é necessário recorrer a outros métodos de interpretação para além do método literal.

49      A PPG e a SNF alegam que, ao considerar, no n.o 65 do acórdão recorrido, que, por força do artigo 59.o do Regulamento REACH, qualquer substância intermédia que possa ser qualificada de «substância» pode ser objeto do procedimento de identificação previsto nesta disposição, dado que o referido artigo 59.o faz parte do título VII desse regulamento, o Tribunal Geral violou o referido artigo. O facto de uma substância apresentar propriedades intrínsecas que suscitam uma elevada preocupação, previstas no artigo 57.o do referido regulamento, não autoriza a ECHA a violar o mesmo regulamento.

50      Segundo a PPG e a SNF, a interpretação do artigo 59.o do Regulamento REACH acolhida pelo Tribunal Geral no n.o 66 do acórdão recorrido é errada. É possível incluir uma substância na lista das substâncias candidatas, especificando que tal inclusão não prejudica a utilização dessa substância como substância intermédia. Dado que as substâncias intermédias não se destinam a ser incluídas no Anexo XIV do referido regulamento, não há razão para inscrevê‑las numa lista elaborada para efeitos dessa inclusão.

51      A constatação do Tribunal Geral, no n.o 69 do acórdão recorrido, segundo a qual o artigo 57.o do Regulamento REACH se refere às propriedades intrínsecas das substâncias não é pertinente para efeitos da aplicação do artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do referido regulamento.

52      A ECHA e a Comissão contestam a argumentação da PPG e da SNF.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

53      Para responder ao terceiro fundamento do recurso, há que recordar o contexto em que é aplicável a isenção prevista no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH.

54      Resulta do artigo 1.o, n.o 1, do referido regulamento que este tem por objetivo assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana e do ambiente, incluindo a promoção do desenvolvimento de métodos alternativos de avaliação dos riscos das substâncias, e garantir a livre circulação das substâncias no mercado interno, reforçando simultaneamente a competitividade e a inovação. Para este fim, o referido regulamento instaura um sistema integrado de controlo das substâncias químicas, incluindo o seu registo, a sua avaliação, a sua autorização e eventuais restrições à sua utilização (v., designadamente, acórdão de 15 de março de 2017, Polynt/ECHA, C‑323/15 P, EU:C:2017:207, n.o 20).

55      Conforme foi sublinhado, designadamente, nos considerandos 69 e 70 do Regulamento REACH, este reserva especial atenção às denominadas «substâncias que suscitam elevada preocupação». Essas substâncias estão, com efeito, sujeitas ao regime de autorização previsto no título VII deste regulamento. Resulta do artigo 55.o do referido regulamento que este regime de autorização tem por objetivo «assegurar o bom funcionamento do mercado interno, garantindo simultaneamente que os riscos associados às substâncias que suscitam uma elevada preocupação sejam adequadamente controlados e que essas substâncias sejam progressivamente substituídas por substâncias ou tecnologias alternativas sempre que estas sejam económica e tecnicamente viáveis» (v., designadamente, acórdão de 15 de março de 2017, Polynt/ECHA, C‑323/15 P, EU:C:2017:207, n.o 21).

56      A primeira etapa desse regime de autorização é o procedimento de identificação das substâncias que suscitam elevada preocupação, com base nos critérios enunciados no artigo 57.o do Regulamento REACH. A segunda etapa é a inscrição destas substâncias na lista das substâncias sujeitas à autorização, que constitui o Anexo XIV do referido regulamento, e a terceira e última etapa diz respeito ao procedimento que conduz, sendo caso disso, à utilização de uma substância que suscita elevada preocupação (v., designadamente, acórdão de 15 de março de 2017, Polynt/ECHA, C‑323/15 P, EU:C:2017:207, n.o 22).

57      Para assegurar a coerência entre o regime de autorização previsto no título VII do referido regulamento e as outras disposições legislativas ou regulamentares da União destinadas a proteger a saúde humana e o ambiente dos riscos derivados da utilização de substâncias químicas, o artigo 58.o, n.o 2, do mesmo regulamento permite isentar algumas utilizações ou categorias de utilizações da obrigação de autorização, «desde que o risco seja corretamente controlado, com base na legislação comunitária específica existente que imponha requisitos mínimos relacionados com a proteção da saúde humana ou do ambiente para a utilização da substância». Este mecanismo de isenção implica uma ligação indissociável entre uma substância e as suas utilizações ou categorias de utilizações (acórdão de 13 de julho de 2017, VECCO e o./Comissão, C‑651/15 P, EU:C:2017:543, n.os 30 e 37).

58      Além dessa isenção específica prevista no artigo 58.o, n.o 2, do Regulamento REACH, o artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do mesmo regulamento estabelece uma isenção geral, nos termos da qual «[o]s produtos intermédios isolados nas instalações e os produtos intermédios isolados e transportados estão isentos das disposições do título VII» do referido regulamento.

59      Interpretada literalmente, como fazem a PPG e a SNF, esta última disposição levaria a considerar que qualquer substância utilizada como substância intermédia isolada nas instalações ou como substância intermédia isolada transportada está, por esse motivo, automaticamente isenta do conjunto das disposições do título VII do Regulamento REACH. Desse modo, não é aplicável a tal substância o procedimento de identificação previsto no artigo 59.o do referido regulamento, mesmo nos casos em que, devido às suas propriedades intrínsecas, essa substância estivesse abrangida pelo âmbito do artigo 57.o do referido regulamento e, consequentemente, devesse ser considerada como suscitando uma elevada preocupação. O procedimento de autorização regulado pelos capítulos 2 e 3 do título VII do mesmo regulamento também não seria, então, aplicável a essa substância.

60      Tal interpretação literal é manifestamente contrária ao objetivo do Regulamento REACH, relativo à proteção da saúde e do ambiente, recordado nos n.os 54 e 55 do presente acórdão. Além disso, é incompatível com a economia deste regulamento.

61      Como recordou a advogada‑geral nos n.os 85 a 87 das suas conclusões, resulta da leitura conjugada do artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento REACH, que define o conceito de «substância intermédia», e das disposições do título VII do mesmo regulamento que a isenção prevista no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do mesmo regulamento deve ser entendida como sendo aplicável unicamente às utilizações de uma substância que possa ser qualificada de substância intermédia isolada nas instalações ou de substância intermédia isolada transportada. Esta exceção não é, pois, aplicável às disposições do título VII que regulam as substâncias em função de critérios distintos das suas utilizações ou categorias de utilizações.

62      Daqui resulta que a isenção prevista no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH abrange unicamente o procedimento de autorização estabelecido nos capítulos 2 e 3 do título VII deste regulamento. Com efeito, esse procedimento tem precisamente por objetivo delimitar, para uma determinada substância que suscite uma elevada preocupação, as utilizações e categorias de utilizações que podem ser autorizadas, sem prejuízo, designadamente, da isenção geral prevista no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do referido regulamento.

63      Em contrapartida, essa isenção não é aplicável às disposições do título VII do Regulamento REACH que regulam as substâncias em função das suas propriedades intrínsecas. O artigo 2.o, n.o 8, alínea b), deste regulamento não se opõe, portanto, a que uma substância possa ser identificada como suscitando uma elevada preocupação com base nos critérios previstos no artigo 57.o do referido regulamento, mesmo no caso de esta ser utilizada unicamente como substância intermédia isolada nas instalações ou como substância intermédia isolada transportada.

64      Conforme salientou a advogada‑geral no n.o 83 das suas conclusões, resulta dos trabalhos preparatórios do Regulamento REACH que a razão de ser de tal relação entre o procedimento de autorização e a isenção de que beneficiam as substâncias utilizadas como substância intermédia isolada nas instalações ou como substância intermédia isolada transportada se prende com o facto de, pela sua natureza, essas utilizações não suscitarem inquietação e, por essa razão, poderem ficar isentas do procedimento de autorização.

65      Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao julgar, no n.o 66 do acórdão recorrido, que «resulta da definição de substância intermédia, prevista no artigo 3.o, ponto 15, do Regulamento [REACH], que essa qualificação como substância intermédia depende do objetivo pretendido pelo seu fabrico e utilização. Como já foi recordado […], segundo essa definição, uma substância intermédia é uma substância fabricada e consumida ou utilizada para processamento químico tendo em vista a sua transformação por síntese. Na medida em que qualquer substância pode, em princípio, ser fabricada tendo em vista uma transformação química e ser consumida ou utilizada no âmbito dessa transformação por síntese e, assim, ter o estatuto de intermédia, o facto de uma substância possuir, no caso vertente, o estatuto de intermédia não a pode isentar do procedimento de identificação previsto no artigo 59.o [do referido regulamento]».

66      Atendendo a que este fundamento jurídico é suficiente para justificar legalmente a improcedência do primeiro fundamento em primeira instância, o terceiro fundamento do recurso deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro manifesto de apreciação

 Argumentos das partes

67      A PPG e a SNF acusam o Tribunal Geral de, nos n.os 69 a 79 do acórdão recorrido, ter rejeitado a argumentação em que sustentavam que a ECHA tinha cometido um erro manifesto de apreciação ao não tomar em consideração os dados constantes do dossiê elaborado nos termos do Anexo XV do Regulamento REACH. Com efeito, o Tribunal Geral considerou que os dados referidos no Anexo XV deste regulamento não eram relevantes para fins de identificação de uma substância no âmbito do procedimento previsto pelo artigo 59.o do referido regulamento.

68      A PPG e a SNF alegam que essa apreciação não é correta. Com efeito, a elaboração desse dossiê constitui a primeira etapa do procedimento de autorização de uma substância e deve conter todas as informações relevantes para determinar se a substância em questão deve ser incluída na lista das substâncias candidatas e no Anexo XIV do Regulamento REACH. Além das propriedades intrínsecas da substância, em conformidade com o referido Anexo XV deste regulamento, deveriam constar do referido dossiê as utilizações, as exposições, as substâncias alternativas e os riscos.

69      No caso em apreço, resulta dos elementos à disposição da ECHA que a acrilamida é unicamente utilizada como substância intermédia. Segundo a PPG e a SNF, a ECHA tinha a obrigação de examinar esses elementos com cuidado e imparcialidade (acórdão de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14). Ora, os referidos elementos demonstravam que estavam preenchidas as condições de aplicação da isenção estabelecida no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH.

70      A ECHA e a Comissão refutam esta argumentação.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

71      Conforme declarado no n.o 63 do presente acórdão, o artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do Regulamento REACH não se opõe a que uma substância possa ser identificada como suscitando uma elevada preocupação com base nos critérios previstos no artigo 57.o do referido regulamento, mesmo no caso de esta ser utilizada unicamente como substância intermédia isolada nas instalações ou como substância intermédia isolada transportada.

72      Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao decidir, no n.o 69 do acórdão recorrido, que, «mesmo admitindo que [o dossiê elaborado pelo Reino dos Países Baixos nos termos do Anexo XV deste regulamento] só menciona exemplos de utilização dessa substância como intermédia, tal facto não é pertinente para identificar a acrilamida como substância que suscita uma elevada preocupação ao preencher os critérios do artigo 57.o do [referido regulamento], dado que essas informações não dizem respeito às propriedades intrínsecas da acrilamida».

73      Pela mesma razão, não incorrem em erro de direito os motivos análogos expostos nos n.os 70 e 77 do acórdão recorrido.

74      Em consequência, o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quinto e sexto fundamentos

 Argumentos das partes

75      Com o quinto fundamento, a PPG e a SNF criticam o n.o 93 do acórdão recorrido pelo qual o Tribunal Geral rejeitou a sua argumentação relativa a uma violação do princípio da proporcionalidade. Consideram que existia uma alternativa menos restritiva à decisão controvertida, que consistia em prever, ao inscrever a acrilamida na lista das substâncias candidatas, que essa identificação e essa inclusão não se repercutiam na utilização desta substância como substância intermédia.

76      Com o sexto fundamento, a PPG e a SNF alegam que o n.o 93 do acórdão recorrido está afetado por falta de fundamentação.

77      A ECHA e a Comissão refutam esses argumentos.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

78      Conforme declarado no n.o 62 do presente acórdão, o procedimento de autorização previsto nos capítulos 2 e 3 do título VII do Regulamento REACH tem por objetivo delimitar, para uma substância que suscite uma elevada preocupação, as utilizações e categorias de utilizações que podem ser autorizadas, sem prejuízo, designadamente, da isenção geral prevista no artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do referido regulamento.

79      Nessas condições, a inscrição de uma substância na lista das substâncias identificadas para inclusão no Anexo XIV do referido regulamento, seguida de uma menção que especifique que essa inscrição não se repercute nas utilizações isentas ao abrigo do artigo 2.o, n.o 8, alínea b), do mesmo regulamento, apenas reitera o que já resulta do Regulamento REACH. Como salientou a advogada‑geral no n.o 116 das suas conclusões, tal medida não teria qualquer relevância para efeitos da aplicação do princípio da proporcionalidade.

80      Daqui resulta que, ao refutar a argumentação da PPG e da SNF, no n.o 93 do acórdão recorrido, com o fundamento de que «o legislador aprovou regras especiais relativas às substâncias intermédias no artigo 2.o, n.o 1, alínea c), e n.o 8, alínea b), [do Regulamento REACH]», o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito e cumpriu o seu dever de fundamentação.

81      Por conseguinte, o quinto e o sexto fundamento devem ser julgados improcedentes.

82      Decorre das considerações precedentes que há que negar provimento ao recurso na totalidade.

 Quanto às despesas

83      Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas. Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do mesmo regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

84      O artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste regulamento, prevê que os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas.

85      Tendo a ECHA pedido a condenação da PPG e da SNF nas despesas e tendo estas sido vencidas, há que as condenar nas despesas.

86      O Reino dos Países Baixos e a Comissão, intervenientes em primeira instância, suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Polyelectrolyte Producers Group GEIE (PPG) e a SNF SAS são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA).

3)      O Reino dos Países Baixos e a Comissão Europeia suportam as suas próprias despesas.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.