Language of document : ECLI:EU:F:2016:162

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA
DA UNIÃO EUROPEIA

(Juiz Singular)

20 de julho de 2016

(Processo F‑113/15)

Charlotte Adriaen

contra

Comissão Europeia

«Função pública — Funcionários — Artigo 45.° do Estatuto — Exercício de promoção de 2014 — Disposições Gerais de Execução do artigo 45.° do Estatuto — Lista dos funcionários propostos para promoção pelos diretores gerais e chefes de serviço — Omissão do nome do recorrente — Possibilidade de contestar a lista dos funcionários propostos para promoção perante o comité paritário de promoção — Análise comparativa dos méritos dos funcionários promovíveis — Pareceres adotados por uma instância paritária — Dever de fundamentação»

Objeto:      Recurso interposto nos termos do artigo 270.° TFUE, aplicável ao Tratado CEEA por força do seu artigo 106.°‑A, pelo qual Charlotte Adriaen e outros doze recorrentes cujos nomes figuram em anexo pedem a anulação das decisões da autoridade investida do poder de nomeação da Comissão Europeia, comunicadas ao pessoal dessa instituição em 14 de novembro de 2014, de não os promover ao grau superior no âmbito do exercício de promoção de 2014.

Decisão:      É negado provimento ao recurso. Charlotte Adriaen e os outros doze recorrentes cujos nomes figuram em anexo suportam as suas próprias despesas e são condenados a suportar as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

Sumário

1.      Recursos de funcionários — Interesse em agir — Necessidade de prejuízo pessoal

(Estatuto dos Funcionários, artigo 91.°)

2.      Funcionários — Promoção — Análise comparativa dos méritos — Modalidades — Poder de apreciação da administração — Limites — Respeito pelo princípio da igualdade de tratamento — Necessidade de um processo que permita neutralizar a subjetividade das apreciações de avaliadores diferentes

(Estatuto dos Funcionários, artigo 45.°)

3.      Funcionários — Promoção — Análise comparativa dos méritos — Análise prévia dos processos em cada direção‑geral — Admissibilidade — Análises posteriores que incumbem ao Comité de Promoção e, posteriormente, à autoridade investida do poder de nomeação — Alcance

(Estatuto dos Funcionários, artigo 45.°)

4.      Funcionários — Promoção — Reclamação de um candidato não promovido — Decisão de indeferimento — Dever de fundamentação — Alcance

(Estatuto dos Funcionários, artigos 25.°, segundo parágrafo, 45.° e 90.°)

5.      Funcionários — Promoção — Análise comparativa dos méritos — Modalidades — Sistema instituído pela Comissão — Elaboração pelas instâncias consultivas dos seus pareceres — Dever de fundamentação — Inexistência

(Estatuto dos Funcionários, artigo 45.°)

1.      Um recurso de anulação só é admissível na medida em que o recorrente tenha interesse em que o ato impugnado seja anulado. Este interesse pressupõe que a anulação desse ato seja suscetível, em si mesma, de ter consequências jurídicas para o interessado ou, de acordo com outra fórmula, que o recurso seja suscetível, através do seu resultado, de proporcionar um benefício à parte que o interpôs.

Assim, um funcionário ou agente não tem legitimidade para agir no interesse da lei ou das instituições e só pode invocar, em apoio de um recurso, prejuízos pessoais.

(cf. n.os 25, 26)

Ver:

Tribunal de Justiça: despacho de 8 de março de 2007, Strack/Comissão, C‑237/06 P, EU:C:2007:156, n.° 64

Tribunal da Função Pública: acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Labiri/CESE, F‑124/10, EU:F:2013:21, n.° 56; despachos de 22 de abril de 2015, ED/ENISA, F‑105/14, EU:F:2015:33, n.° 20 e jurisprudência referida, e de 16 de dezembro de 2015, Bärwinkel/Conselho, F‑118/14, EU:F:2015:154, n.os 41 e 58

2.      A autoridade investida do poder de nomeação dispõe, para efeitos da análise comparativa dos méritos dos funcionários promovíveis, prevista no artigo 45.°, n.° 1, do Estatuto, de um amplo poder de apreciação. No entanto, o amplo poder de apreciação assim reconhecido à autoridade investida do poder de nomeação é limitado pela necessidade de proceder à análise comparativa dos processos com diligência e imparcialidade, no interesse do serviço e em conformidade com o princípio da igualdade de tratamento. Na prática, tal análise deve ser levada a cabo numa base igualitária e a partir de fontes de informação e de dados comparáveis.

A este respeito, existe uma grande heterogeneidade nas avaliações dos funcionários dos diferentes serviços de uma instituição e essa heterogeneidade é fonte de dificuldades quando a autoridade investida do poder de nomeação efetua a análise comparativa dos méritos do conjunto dos funcionários em causa, com respeito pelo princípio da igualdade de tratamento.

Assim, a obrigação de realizar uma comparação dos méritos a partir de uma base igualitária e de fontes de informação e dados comparáveis, inerente ao artigo 45.° do Estatuto, requer um procedimento ou um método suscetível de neutralizar a subjetividade resultante das apreciações feitas por diferentes avaliadores nos relatórios elaborados nos termos do artigo 43.° do Estatuto e que devam ser tidos em consideração nos termos do artigo 45.°, n.° 1, do Estatuto.

No entanto, a autoridade investida do poder de nomeação dispõe do poder de proceder à análise comparativa dos méritos de acordo com o procedimento ou o método que considerar mais adequado. Com efeito, a instituição em causa não tem a obrigação de adotar um sistema particular de avaliação e de promoção, devido à ampla margem de apreciação de que dispõe para atingir os objetivos do artigo 45.° do Estatuto, de acordo com as suas próprias necessidades de organização e de gestão do seu pessoal.

(cf. n.os 42‑45)

Ver:

Tribunal de Justiça: acórdãos de 1 de julho de 1976, de Wind/Comissão, 62/75, EU:C:1976:103, n.° 17, e de 21 de abril de 1983, Ragusa/Comissão, 282/81, EU:C:1983:105, n.os 9 e 13

Tribunal de Primeira Instância: acórdãos de 15 de setembro de 2005, Casini/Comissão, T‑132/03, EU:T:2005:324, n.° 53 e jurisprudência referida; de 19 de outubro de 2006, Buendía Sierra/Comissão, T‑311/04, EU:T:2006:329, n.° 169, e de 14 de fevereiro de 2007, Simões Dos Santos/IHMI, T‑435/04, EU:T:2007:50, n.° 132

Tribunal Geral da União Europeia: acórdão de 15 de janeiro de 2014, Stols/Conselho, T‑95/12 P, EU:T:2014:3, n.os 29 e 32

Tribunal da Função Pública: acórdãos de 14 de julho de 2011, Praskevicius/Parlamento, F‑81/10, EU:F:2011:120, n.° 53; de 18 de março de 2015, Ribeiro Sinde Monteiro/SEAE, F‑51/14, EU:F:2015:11, n.° 41, objeto de recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑278/15 P; de 3 de junho de 2015, Gross/SEAE, F‑78/14, EU:F:2015:52, n.° 44, objeto de recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑472/15 P; de 22 de setembro de 2015, Silvan/Comissão, F‑83/14, EU:F:2015:106, n.° 24, objeto de recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑698/15 P; de 15 de dezembro de 2015, Bonazzi/Comissão, F‑88/15, EU:F:2015:150, n.os 50 e 62, e de 2 de março de 2016, Loescher/Conseil, F‑84/15, EU:F:2016:29, n.° 56

3.      As decisões de promoção e a análise comparativa dos méritos prevista no artigo 45.° do Estatuto são da exclusiva responsabilidade da autoridade investida do poder de nomeação.

A este respeito, em primeiro lugar, embora o artigo 45.°, n.° 1, do Estatuto imponha à autoridade investida do poder de nomeação a obrigação de proceder, antes de qualquer decisão de promoção, à análise comparativa dos méritos dos funcionários promovíveis, a mesma pode, no entanto, ser assistida pelos serviços administrativos nos diversos escalões da via hierárquica, em conformidade com os princípios inerentes ao funcionamento de qualquer estrutura administrativa hierarquizada. Assim, a autoridade investida do poder de nomeação pode prever a realização, em cada direção‑geral, de uma análise prévia dos processos dos funcionários promovíveis, mesmo que tal análise não tenha por efeito substituir‑se à análise comparativa que deve ser efetuada em seguida, quando esteja prevista, por um comité de promoção, e depois, em todo o caso, à que incumbe à autoridade investida do poder de nomeação no termo do exercício de promoção e com vista à adoção das decisões de promoção ou de não promoção, só estando expressamente prevista pelo Estatuto esta última análise comparativa.

No contexto do processo de promoção previsto nas disposições gerais de execução adotadas pela Comissão Europeia, por certo não se pode admitir que a autoridade investida do poder de nomeação se baste com a análise dos méritos dos funcionários mais bem classificados nas listas elaboradas pelas direções‑gerais e pelos diferentes serviços. No entanto, no âmbito da identificação, descentralizada ao nível das direções‑gerais da instituições, dos funcionários promovíveis cuja promoção deve ser proposta, nesta fase, à autoridade investida do poder de nomeação, o exercício, pelos funcionários que não foram propostos para a promoção nessa fase pelos seus diretores‑gerais e respetivos chefes de serviço, do seu direito, previsto nas disposições gerais de execução, de recorrer para o comité paritário de promoção destas decisões de não os proporem para promoção permite a esses funcionários beneficiar perante esse órgão paritário de uma análise comparativa dos seus méritos efetuada não só ao nível das suas direções‑gerais respetivas, mas também da instituição.

Em segundo lugar, durante a fase preparatória das suas decisões em matéria de promoção, a autoridade investida do poder de nomeação pode fazer intervir uma instância paritária consultiva como o comité paritário de promoção e pode também prever que este seja assistido por outro órgão, também paritário, cujos projetos de parecer fundamento pode tomar em consideração. Ora, ao interpor recurso, os funcionários promovíveis cuja promoção não foi proposta pelos seus diretores‑gerais e chefes de serviço têm, no âmbito do processo de recurso, a oportunidade de chamar a atenção da autoridade investida do poder de nomeação para o seu caso, forçando‑a, com base nas suas contestações, nos referidos projetos de parecer fundamentado e, sendo caso disso, nas recomendações do comité paritário de promoção, a proceder a uma análise circunstanciada das suas situações respetivas no âmbito da análise comparativa dos méritos de todos os funcionários promovíveis a que essa autoridade procede, em última análise, no termo do processo de promoção com vista à adoção das decisões em matéria de promoção.

(cf. n.os 48‑51)

Ver:

Tribunal de Justiça: acórdão de 4 de fevereiro de 1987, Bouteiller/Comissão, 324/85, EU:C:1987:59, n.° 11

Tribunal de Primeira Instância: acórdão de 30 de novembro de 1993, Tsirimokos/Parlamento,T‑76/92, EU:T:1993:106, n.° 17

Tribunal da Função Pública: acórdãos de 22 de setembro de 2015, Silvan/Comissão, F‑83/14, EU:F:2015:106, n.os 48 e 50 e jurisprudência referida, objeto de recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, processo T‑698/15 P, e de 15 de dezembro de 2015, Bonazzi/Comissão, F‑88/15, EU:F:2015:150, n.os 83 e 89 e jurisprudência referida

4.      Embora a autoridade investida do poder de nomeação não esteja obrigada a fundamentar as decisões que adota em matéria de promoção, está em contrapartida obrigada a fornecer a fundamentação dessa decisão, de forma individualizada, na decisão em que decida a reclamação.

Neste quadro, a suficiência da fundamentação é apreciada à luz do contexto factual e jurídico em que se inscreve a adoção do ato impugnado. Uma vez que as promoções se fazem por escolha da autoridade investida do poder de nomeação, nos termos do artigo 45.° do Estatuto, basta que a fundamentação da decisão de indeferimento da reclamação diga respeito à aplicação que foi feita das condições legais e estatutárias de promoção à situação individual do funcionário.

Além disso, no que diz respeito à fundamentação de uma decisão adotada no âmbito de um processo que afeta um grande número de funcionários, não se pode exigir que a autoridade investida do poder de nomeação fundamente a sua decisão na decisão que indefere a reclamação para além dos prejuízos invocados na referida reclamação, explicando nomeadamente por que razões cada um dos funcionários promovidos tinha méritos superiores aos do autor da reclamação. Com efeito, a fundamentação do indeferimento da reclamação só deve versar sobre a reunião dos requisitos legais a que o Estatuto subordina a regularidade do processo, de modo que a autoridade investida do poder de nomeação não esteja obrigada a revelar ao funcionário não promovido a apreciação comparativa que fez sobre o mesmo e sobre os outros funcionários promovíveis, nem a expor detalhadamente a forma como considerou atribuir a promoção aos funcionários promovidos.

(cf. n.os 61‑63)

Ver:

Tribunal da Função Pública: acórdão de 15 de dezembro de 2015, Bonazzi/Comissão, F‑88/15, EU:F:2015:150, n.os 96 a 98 e jurisprudência referida

5.      No âmbito do sistema de promoção implementado pela Comissão, o grupo paritário intermédio, órgão consultivo, bem como o comité paritário de promoção não estão necessariamente obrigados a justificar detalhadamente as suas posições.

(cf. n.° 65)

Ver:

Tribunal de Primeira Instância: acórdão de 19 de outubro de 2006, Buendía Sierra/Comissão,T‑311/04, EU:T:2006:329, n.° 143

Tribunal da Função Pública: acórdão de 11 de maio de 2010, Nanopoulos/Comissão, F‑30/08, EU:F:2010:43, n.° 108 e jurisprudência referida