Language of document : ECLI:EU:C:2018:819

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 4 de outubro de 2018 (1)

Processo C680/16 P

Dr. August Wolff GmbH & Co. KG Arzneimittel,

Remedia d.o.o.

contra

Comissão Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Diretiva 2001/83/CE — Medicamentos para uso humano — Decisão da Comissão que impõe aos Estados‑Membros a retirada e a modificação das autorizações nacionais de introdução no mercado de medicamentos de aplicação tópica que contenham 0,01% de estradiol — Pressupostos do recurso ao Comité dos Medicamentos para Uso Humano — Imparcialidade objetiva — Direito de ser ouvido — Princípio da proporcionalidade — Princípio da igualdade de tratamento»






Índice


I. Quadro jurídico

II. Antecedentes do litígio

III. Tramitação processual no Tribunal Geral e acórdão recorrido

IV. Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

V. Análise jurídica

A. Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação dos artigos 31.o e 32.o do Código HUM

1. Quanto à primeira parte, relativa a uma interpretação incorreta do artigo 31.o do Código HUM

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

2. Quanto à segunda parte, relativa a uma violação da exigência de neutralidade estabelecida no artigo 32.o, n.o 2, do Código HUM e do princípio da análise cuidadosa e imparcial, nos termos do artigo 41.o, n.o 1, da Carta

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

3. Quanto à terceira parte, relativa a uma violação do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM e do direito de ser ouvido

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

4. Conclusão quanto ao primeiro fundamento de recurso

B. Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação dos artigos 116.o, primeiro parágrafo, e 126.o, primeiro parágrafo, do Código HUM

1. Quanto à primeira parte, relativa a uma violação dos princípios da repartição do ónus da alegação e do ónus da prova decorrente do facto de a existência de risco ter sido baseada na falta de estudos após autorização

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

2. Quanto à segunda parte, relativa à falta de um nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

3. Quanto à terceira parte, relativa a uma apreciação incorreta dos riscos em virtude de não terem sido tomados em conta os dados relativos à farmacovigilância

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

4. Quanto à quarta parte, relativa a uma apresentação incorreta dos dados relativos à farmacovigilância disponíveis e a uma inexatidão do conteúdo das normas orientadoras científicas, constantes do parecer definitivo do CHMP

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

5. Conclusão quanto ao segundo fundamento de recurso

C. Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento

1. Quanto à primeira parte, relativa a uma violação do princípio da proporcionalidade

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

2. Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do princípio da igualdade de tratamento

a) Síntese dos argumentos das partes

b) Apreciação

3. Conclusão quanto ao terceiro fundamento de recurso

VI. Quanto ao recurso interposto no Tribunal Geral

VII. Quanto às despesas

VIII. Conclusão


1.        No recurso que interpuseram, a Dr. August Wolff GmbH & Co. KG Arzneimittel (a seguir «August Wolff» ou «primeira recorrente») e a Remedia d.o.o. (a seguir «Remedia») pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 20 de outubro de 2016, August Wolff e Remedia/Comissão (T‑672/14, não publicado; a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2016:623).

2.        No acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto por aquelas sociedades, com vista à anulação da Decisão de Execução C(2014) 6030 final da Comissão, de 19 de agosto de 2014, relativa às autorizações de introdução no mercado de medicamentos para uso humano de aplicação tópica que contêm concentrações elevadas de estradiol, ao abrigo do artigo 31.o da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (a seguir «decisão de execução»). Essa decisão de execução tinha imposto, com base nas conclusões do parecer definitivo do Comité dos Medicamentos para Uso Humano (a seguir «CHMP»), que a renovação da autorização de introdução no mercado (a seguir «AIM») do medicamento em causa, a saber, o Linoladiol N, fosse sujeita a uma condição relativa a uma limitação da duração de utilização a quatro semanas, com uma correspondente exclusão de utilização repetida.

3.        O presente recurso representa para o Tribunal de Justiça a oportunidade de se pronunciar pela primeira vez sobre o artigo 31.o, n.o 1, da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (2) (a seguir «código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano» ou «Código HUM») e, em especial, sobre as condições que regem o recurso das autoridades nacionais competentes ao CHMP no âmbito desse procedimento. Além disso, o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se, pela primeira vez, sobre o artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM, precisando o alcance do direito de ser ouvido de que o requerente ou o titular da AIM gozam nos termos dessa disposição, bem como sobre a questão de saber se a nomeação, como relator principal do CHMP, no âmbito do procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM, de um membro da autoridade nacional que recorreu ao CHMP é compatível com o princípio da imparcialidade consagrado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

I.      Quadro jurídico

4.        O artigo 31.o do Código HUM dispõe:

«1.      Em casos específicos em que esteja envolvido o interesse da União, os Estados‑Membros, a Comissão, o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado submetem a questão ao Comité [dos Medicamentos para Uso Humano] para aplicação do procedimento previsto nos artigos 32.o, 33.o e 34.o antes de ser tomada qualquer decisão sobre o pedido, a suspensão ou a revogação de uma autorização de introdução no mercado, ou sobre qualquer outra alteração, eventualmente necessária, da referida autorização.

Se o recurso derivar da avaliação dos dados relativos à farmacovigilância de um medicamento autorizado, a questão é submetida ao Comité de Avaliação do Risco de Farmacovigilância e pode ser aplicado o n.o 2 do artigo 107.o‑J. O Comité de Avaliação do Risco de Farmacovigilância emite uma recomendação nos termos do artigo 32.o A recomendação final é transmitida ao Comité dos Medicamentos para Uso Humano ou ao Grupo de Coordenação, conforme os casos, e aplica‑se o procedimento previsto no artigo 107.o‑K […]».

5.        O artigo 32.o do Código HUM prevê:

«1.      Em caso de remissão para o procedimento previsto no presente artigo, o Comité delibera sobre o assunto em questão e emite parecer fundamentado no prazo de 60 dias a contar da data em que o assunto lhe for submetido.

Contudo, nos casos submetidos à apreciação do Comité em conformidade com os artigos 30.o e 31.o, esse prazo pode ser prorrogado pelo Comité por um período suplementar máximo de 90 dias, tendo em conta os pontos de vista dos requerentes ou dos titulares da autorização de introdução no mercado envolvidos.

Em casos urgentes e sob proposta do presidente, o Comité pode fixar um prazo mais curto.

2.      Para analisar a questão, o Comité nomeia como relator um dos seus membros. O Comité pode igualmente designar peritos independentes para o aconselhar sobre assuntos específicos. Ao designar esses peritos, o Comité define as suas tarefas e fixa o prazo para a respetiva execução.

3.      Antes de emitir o seu parecer, o Comité deve dar ao requerente ou ao titular da autorização de introdução no mercado a possibilidade de apresentar explicações orais ou escritas dentro de um prazo a fixar pelo Comité.

O parecer do Comité deve ser acompanhado pelo projeto de resumo das características do medicamento, bem como pelos projetos de rotulagem e de folheto informativo.

Sempre que o considerar oportuno, o Comité pode convidar qualquer outra pessoa a prestar informações relativamente à questão que lhe foi submetida.

O Comité pode suspender o prazo previsto no n.o 1, por forma a permitir que o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado prepare as suas explicações.

4.      A Agência [Europeia de Medicamentos] informa de imediato o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado quando o Comité for do parecer que:

a)      O pedido não satisfaz os critérios de autorização; ou

b)      O resumo das características do medicamento proposto pelo requerente ou pelo titular da autorização de introdução no mercado em conformidade com o artigo 11.o, deve ser alterado; ou

c)      A autorização deve ser concedida sob certas condições, atendendo às condições consideradas essenciais para uma utilização segura e eficaz do medicamento, incluindo a farmacovigilância; ou

d)      A autorização de introdução no mercado deve ser suspensa, alterada ou revogada.

No prazo de 15 dias a contar da receção do parecer, o requerente ou o titular da autorização de introdução no mercado pode notificar à Agência, por escrito, a sua intenção de requerer a revisão do parecer. Nesse caso, deve apresentar à Agência a fundamentação pormenorizada do requerimento de revisão no prazo de 60 dias a contar da receção do parecer.

No prazo de 60 dias a contar da receção da fundamentação, o Comité revê o seu parecer em conformidade com o quarto parágrafo do n.o 1 do artigo 62.o do Regulamento [CE] n.o 726/2004 (3). As razões que fundamentam as conclusões são anexadas ao relatório de avaliação referido no n.o 5 do presente artigo.

5.      No prazo de 15 dias a contar da sua aprovação, a Agência envia aos Estados‑Membros, à Comissão e ao requerente ou ao titular da autorização de introdução no mercado o parecer definitivo do Comité, acompanhado de um relatório descrevendo a avaliação do medicamento e fundamentando as suas conclusões.

Se o parecer for favorável à concessão ou à manutenção da autorização de introdução no mercado do medicamento em questão, serão anexados ao parecer os seguintes documentos:

a)      O projeto de resumo das características do medicamento, nos termos do artigo 11.o;

b)      As eventuais condições a que a autorização esteja sujeita, na aceção da alínea c) do n.o 4;

c)      A exposição pormenorizada de quaisquer condições ou restrições recomendadas em relação à utilização segura e eficaz do medicamento;

d)      A rotulagem e o folheto informativo propostos».

6.        O artigo 33.o do Código HUM dispõe:

«No prazo de 15 dias após a receção do parecer, a Comissão deve elaborar um projeto da decisão a tomar relativamente ao pedido, que tenha em conta o direito comunitário.

Caso se trate de um projeto de decisão que preveja a concessão da autorização de introdução no mercado, devem ser‑lhe apensos os documentos referidos no segundo parágrafo do n.o 5 do artigo 32.o

Caso, a título excecional, o projeto de decisão não corresponda ao parecer da Agência, a Comissão deve fundamentar pormenorizadamente num anexo os motivos de quaisquer divergências.

O projeto de decisão será enviado aos Estados‑Membros e ao requerente ou titular da autorização de introdução no mercado».

7.        O artigo 34.o do Código HUM tem a seguinte redação:

«1.      A Comissão toma uma decisão final nos termos do n.o 3 do artigo 121.o, no prazo de 15 dias a contar da conclusão do procedimento aí estabelecido.

[…]»

8.        O artigo 116.o, primeiro parágrafo, do Código HUM prevê:

«As autoridades competentes suspendem, revogam ou alteram uma autorização de introdução no mercado caso se considere que o medicamento é nocivo, ou que falta o efeito terapêutico, ou que a relação risco‑benefício não é favorável ou que o medicamento não tem a composição quantitativa e qualitativa declarada. Considera‑se que o efeito terapêutico falta se se apurar que o medicamento não permite obter resultados terapêuticos.»

9.        Nos termos do artigo 126.o do Código HUM:

«A autorização de introdução no mercado apenas pode ser recusada, suspensa ou revogada pelas razões enumeradas na presente diretiva.

Qualquer decisão de suspensão de fabrico ou de importação de medicamentos provenientes de países terceiros, de proibição de fornecimento e de retirada do mercado dum medicamento apenas pode ser tomada com fundamento nos motivos enumerados nos artigos 117.o e 118.o».

II.    Antecedentes do litígio

10.      Resulta dos n.os 1 a 12 do acórdão recorrido que a August Wolff é titular das AIM do medicamento Linoladiol N, ou Gel Linoladiol N 0.1 mg/g ou Linoladiol N 0.1 mg/g vaginal cream (a seguir «Linoladiol N») em vários Estados‑Membros, entre os quais a República Federal da Alemanha. A Remedia é titular da AIM do Linoladiol N na Croácia.

11.      O Linoladiol N é um creme destinado ao tratamento de distúrbios atróficos da vagina e da vulva em mulheres em fase de menopausa. Contém, como substância ativa, 100 microgramas por grama da hormona estradiol.

12.      Este medicamento foi autorizado pela primeira vez na Alemanha, em 1978. Em 26 de setembro de 2005, as autoridades alemãs competentes, a saber, o Bundesinstitut für Arzneimittel und Medizinprodukte (Instituto Federal dos Medicamentos e Dispositivos Médicos, Alemanha; a seguir «BfArM») recusaram a renovação da autorização. Nessas condições, antes de mais, a primeira recorrente interpôs recurso dessa decisão para o Verwaltungsgericht Köln (Tribunal Administrativo de Colónia, Alemanha), o qual, por decisão de 27 de outubro de 2009, negou provimento ao mesmo. Em seguida, aquela recorreu para o Oberverwaltungsgericht für das Land Nordrhein‑Westfalen (Tribunal Administrativo Superior para o Land da Renânia do Norte‑Vestefália). Por decisão de 13 de março de 2013, o referido órgão jurisdicional anulou a decisão de 26 de setembro de 2005 e convidou o BfArM a decidir de novo sobre o pedido de renovação da autorização do Linoladiol N, tendo em conta o seu parecer jurídico. Assim, por decisão de 11 de julho de 2013, essas autoridades concederam a renovação da autorização do Linoladiol N para determinados tamanhos de embalagem.

13.      Em 24 de maio de 2012, enquanto o processo judicial acima descrito ainda estava pendente, as autoridades alemãs submeteram a questão relativa ao Linoladiol N ao CHMP da Agência Europeia de Medicamentos, em aplicação do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM.

14.      Adotando o procedimento previsto no artigo 32.o, n.o 2, do Código HUM, o CHMP nomeou como relator Martina Weise, seu membro de nacionalidade alemã, que era funcionária do BfArM.

15.      Em 19 de dezembro de 2013, o CHMP emitiu um parecer provisório, do qual a primeira recorrente requereu a revisão. Em 25 de abril de 2014, o CHMP proferiu o seu parecer definitivo. Em 19 de agosto de 2014, a Comissão Europeia adotou a decisão de execução.

16.      Em conformidade com as medidas propostas no parecer definitivo do CHMP, essa decisão, no seu anexo IV, dispõe que o resumo das características do medicamento e os folhetos informativos de medicamentos como o Linoladiol N devem prever uma duração máxima de tratamento de quatro semanas, sem repetição.

III. Tramitação processual no Tribunal Geral e acórdão recorrido

17.      Em 19 de setembro de 2014, as recorrentes interpuseram recurso de anulação parcial da decisão controvertida.

18.      Por requerimento separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de setembro de 2014, as recorrentes apresentaram um pedido de medidas provisórias, no qual concluíam pedindo que o presidente do Tribunal Geral se dignasse ordenar a suspensão da execução da decisão controvertida. Por Despacho de 15 de dezembro de 2014, o presidente do Tribunal Geral decidiu indeferir esse pedido e reservar para final a decisão quanto às despesas.

19.      O Tribunal Geral, tendo julgado improcedentes os fundamentos invocados pelas recorrentes, negou provimento ao recurso na sua totalidade e condenou as recorrentes nas despesas.

IV.    Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

20.      Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 23 de dezembro de 2016, as recorrentes interpuseram o presente recurso da decisão do Tribunal Geral.

21.      As recorrentes pedem que o Tribunal de Justiça se digne anular o acórdão recorrido e a decisão controvertida. Subsidiariamente, pedem, igualmente, que o mesmo remeta o processo ao Tribunal Geral. Por último, pedem que a Comissão seja condenada nas despesas.

22.      A Comissão pede que o Tribunal de Justiça negue provimento ao recurso e condene as recorrentes nas despesas.

V.      Análise jurídica

23.      Em apoio do recurso, as recorrentes invocam três fundamentos relativos a uma violação dos artigos 31.o e 32.o do Código HUM, a uma violação do artigo 116.o em conjugação com o artigo 126.o do mesmo código e a uma violação de princípios gerais do direito da União, como os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, respetivamente.

A.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação dos artigos 31.o e 32.o do Código HUM

24.      O presente fundamento centra‑se em três partes. Em primeiro lugar, as recorrentes censuram ao Tribunal Geral ter interpretado incorretamente o artigo 31.o do Código HUM, na medida em que, no acórdão recorrido, não teve em conta o facto de esta disposição subordinar o início do procedimento aí previsto à verificação de pressupostos específicos. Em segundo lugar, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral violou o artigo 32.o, n.o 2, do Código HUM, ao ignorar a exigência de neutralidade estabelecida nessa disposição, bem como o princípio da análise cuidadosa e imparcial, nos termos do artigo 41.o, n.o 1, da Carta. Em terceiro lugar, censuram ao Tribunal Geral ter violado o artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM, bem como o direito de ser ouvido.

1.      Quanto à primeira parte, relativa a uma interpretação incorreta do artigo 31.o do Código HUM

a)      Síntese dos argumentos das partes

25.      Esta primeira parte do primeiro fundamento é dirigida contra os n.os 29, 37, 38, 44 a 49, bem como contra os n.os 59, 61, 63, 65 e 67 do acórdão recorrido, na medida em que o Tribunal Geral não teve em conta que o artigo 31.o do Código HUM subordina o desencadeamento do procedimento ad hoc aí previsto a um pressuposto de natureza temporal, bem como à presença do «interesse da União».

26.      Com efeito, as recorrentes consideram que, segundo a interpretação dada pelo Tribunal Geral ao artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, o único pressuposto exigido para que esse procedimento possa ser desencadeado é o de que o medicamento em exame seja autorizado em vários Estados‑Membros. Por conseguinte, uma autoridade nacional competente pode, a todo o momento, exigir o exame de um medicamento pelo CHMP, no quadro do procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM, sem que a adoção de uma decisão sobre a autorização do medicamento em causa a nível nacional impeça que esse procedimento seja iniciado.

27.      Segundo as recorrentes, esta tese contradiz, antes de mais, o teor do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM. Com efeito, o termo «antes», que figura nessa disposição, indica claramente que os Estados‑Membros não podem submeter a questão ao Comité a todo o momento. Pelo contrário, só lha podem submeter antes da adoção de uma decisão nacional.

28.      As recorrentes alegam que, no presente caso, a República Federal da Alemanha deu início ao procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM em 31 de maio de 2012, ou seja, muito depois da data na qual as autoridades alemãs tomaram a decisão sobre a autorização do Linoladiol N (26 de setembro de 2005). Na medida em que o Tribunal Geral considerou que a decisão nacional relevante era a decisão pela qual as autoridades alemãs concederam a renovação da autorização do Linoladiol N, em 11 de julho de 2013, o mesmo não faz corretamente a distinção entre poder decisório da administração e processos judiciais.

29.      Além disso, as recorrentes consideram que, para definir a finalidade do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, o Tribunal Geral não se deveria ter apoiado num guia elaborado pela ora recorrida para examinar a legalidade dos atos adotados pela própria recorrida, com risco de desrespeitar o princípio da separação de poderes.

30.      Acresce que, segundo as recorrentes, a República Federal da Alemanha cometeu um abuso do direito ao dar início ao procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM, com o fim único de evitar ser vencida no âmbito do recurso que as recorrentes interpuseram perante os órgãos jurisdicionais alemães da decisão de 26 de setembro de 2005, data em que as autoridades alemãs se pronunciaram sobre a AIM do Linoladiol N, recusando a sua renovação.

31.      Por último, as recorrentes consideram, por um lado, que, ao conduzir a avaliações divergentes nos diferentes Estados‑Membros, o desencadeamento do procedimento em causa, na sequência da adoção de uma decisão divergente por uma autoridade nacional, é contrário ao objetivo do Código HUM, que consiste em evitar entraves ao comércio de medicamentos.

32.      Por outro lado, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral fez igualmente uma apreciação incorreta do pressuposto segundo o qual o procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM pode ser iniciado «em casos específicos em que esteja envolvido o interesse da União». Com efeito, em presença de um medicamento já autorizado, tal interesse existe quando conhecimentos atuais relativos à sua eficácia e à sua segurança justificam que a questão seja submetida ao CHMP. A este respeito, o facto de os estudos examinados pelo CHMP nesse âmbito datarem de 2004 revela que não existiam quaisquer dados novos que tivessem podido justificar o desencadeamento do procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM.

33.      A Comissão considera que o Tribunal Geral interpretou corretamente o artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM. O Tribunal Geral, após ter entendido que, à luz do teor dessa disposição, não era certo que a adoção, a nível nacional, de um ato sobre a AIM, inclusivamente tratando‑se de um ato que foi impugnado perante os órgãos jurisdicionais nacionais, privasse os órgãos nacionais da possibilidade de recorrer ao CHMP, baseou a sua interpretação no contexto do referido artigo 31.o e dos objetivos prosseguidos pela regulamentação da qual o mesmo faz parte. Segundo a Comissão, o mesmo concluiu, desse modo, corretamente que os referidos objetivos militam a favor de uma interpretação ampla dos pressupostos de desencadeamento do procedimento nos termos do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM e que qualquer Estado‑Membro tem interesse na abertura desse procedimento enquanto pode ainda intervir relativamente a uma AIM.

34.      Além disso, a mesma instituição considera não ser possível censurar ao Tribunal Geral ter‑se apoiado, para definir o objetivo daquela disposição, entre outros elementos, num guia redigido pela Comissão como documento juridicamente não vinculativo.

35.      A respeito do pressuposto relativo à existência de um «interesse da União», a Comissão responde que o mesmo se refere à necessidade de avaliar um medicamento, ou a sua substância ativa, a nível da União, e que esta necessidade se manifesta com toda a evidência nos casos de autorização de uma mesma substância ativa em vários Estados‑Membros, o que se verifica no presente caso. Neste contexto, a questão do caráter novo, ou não, dos dados relevantes não tem qualquer influência sobre a apreciação desse pressuposto.

b)      Apreciação

36.      Importa recordar que o artigo 31.o do Código HUM estabelece que o procedimento aí previsto deve ser iniciado quando esteja envolvido o interesse da União, por um lado, e antes de o Estado‑Membro tomar qualquer decisão sobre o pedido de AIM, por outro.

37.      As recorrentes alegam que, no acórdão recorrido, esses dois pressupostos foram incorretamente apreciados.

38.      Começarei por examinar a alegação apresentada pelas recorrentes a respeito do pressuposto relativo ao «interesse da União».

39.      Nos n.os 59 a 66 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, após observar que esse conceito de «interesse da União» não é definido no Código HUM, sustentou que o mesmo deve ser interpretado de forma a assegurar um equilíbrio entre os objetivos primordiais desse código, a saber, o de proteger a saúde pública na União e o de garantir a livre circulação de medicamentos no mercado da União. Por conseguinte, o mesmo visa a coordenação concertada entre os Estados‑Membros que tenham concedido AIM a medicamentos que contenham a mesma substância ativa, com a finalidade de garantir a proteção da saúde pública na União. Segundo o Tribunal Geral, este conceito desempenha plenamente o seu papel a partir do momento em que tenham sido concedidas AIM do mesmo medicamento em vários Estados‑Membros e sejam suscitadas incertezas relativamente à substância ativa, como no caso em apreço.

40.      Neste contexto, no entender do Tribunal Geral, o facto de o BfArM não ter demonstrado, aquando do recurso ao CHMP, que essas incertezas tinham fundamento em qualquer suspeita de um risco «grave e novo» não tem qualquer consequência, dado que este último conceito não tem aplicação no procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM.

41.      Esta interpretação afigura‑se‑me isenta de qualquer erro de direito.

42.      Com efeito, o conceito de «interesse da União» não é definido em parte alguma do Código HUM. Como o Tribunal Geral fez notar, no n.o 59 do acórdão recorrido, fora do artigo 31.o, o mesmo só é referido no considerando 57 do Código HUM, e na sua função de assegurar a consistência entre os sistemas de farmacovigilância aplicáveis aos medicamentos autorizados. Ora, não me parece que esse elemento possa contribuir para lhe definir os contornos.

43.      Por conseguinte, o teor do conceito de «interesse da União» deve ser o resultado de um equilíbrio dos objetivos do Código HUM concorrentes, a saber, a proteção da saúde pública na União e a livre circulação de medicamentos. Assim, deve deixar a cada Estado‑Membro a possibilidade de suscitar qualquer incerteza relativa à substância ativa de um medicamento que já tenha obtido uma AIM noutros Estados‑Membros, assegurando que a decisão final sobre a suspensão ou a revogação dessas AIM seja tomada a nível da União.

44.      Em meu entender, a leitura do capítulo III das orientações publicadas pela Comissão em «Guia sobre a regulamentação dos medicamentos na União Europeia», volume II: «Informações aos requerentes de [AIM] de medicamentos para uso humano nos Estados‑Membros da Comunidade Europeia» (a seguir «informações aos requerentes» ou «guia») não justifica uma interpretação diferente. Com efeito, nos termos das informações aos requerentes, o conceito de «interesse da União» «refere‑se, em especial, aos interesses de saúde pública relacionados com os medicamentos na União, à luz dos dados relativos à qualidade, à segurança e à eficácia, e à livre circulação dos produtos na União».

45.      Parece‑me, pois, que, enquanto que a decisão final acerca da suspensão ou da revogação das AIM deve ser adotada a nível da União, o nível de proteção da saúde suscetível de justificar que a questão seja submetida ao CHMP é da competência de cada EstadoMembro.

46.      Razão pela qual entendo que a primeira alegação apresentada pelas recorrentes, segundo a qual o Tribunal Geral interpretou incorretamente o conceito de «interesse da União», pelo facto de não ter considerado que a submissão da questão ao CHMP só se justifica quando existam «dados novos» que suscitem dúvidas sobre a eficácia ou a segurança do medicamento em causa, não pode ser acolhida, dado que teria como efeito limitar o poder de apreciação dos Estados‑Membros na escolha do nível adequado de proteção da saúde.

47.      Com efeito, ao contrário do que sustentam as recorrentes, resulta claramente do artigo 31.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Código HUM («Se o recurso derivar da avaliação dos dados relativos à farmacovigilância de um medicamento autorizado […]») que a existência de dados novos relativos à farmacovigilância não é mais do que um dos motivos suscetíveis de fundamentar o recurso ao CHMP (4).

48.      Por conseguinte, considero que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito ao decidir que a Comissão, ao admitir que o BfArM recorresse ao CHMP sem justificação com base em dados novos, não tinha violado o artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM.

49.      Examinarei agora a acusação relativa a uma alegada interpretação incorreta pelo Tribunal Geral do pressuposto segundo o qual a autoridade nacional competente só pode submeter a questão ao CHMP antes de ser tomada uma decisão sobre o pedido relativo à AIM.

50.      Antes de iniciar a minha análise, parece‑me útil fazer uma breve síntese da passagem do acórdão recorrido à qual esta acusação é dirigida, que começa no n.o 28 e termina no n.o 49 do mesmo.

51.      Antes de mais, o Tribunal Geral considerou que, uma vez que o enunciado do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM não fornecia uma resposta segura à questão de saber se a adoção de qualquer decisão relativa a uma AIM impede que seja dado início ao procedimento previsto nesse artigo, era necessário interpretar essa disposição à luz dos objetivos prosseguidos pelo Código HUM.

52.      A esse respeito, o Tribunal Geral observou que o Código HUM pretende, por um lado, eliminar os entraves ao comércio de medicamentos entre Estados‑Membros, evitando as divergências nas avaliações científicas de medicamentos comparáveis, e, por outro, contribuir para a proteção da saúde, assegurando normas elevadas de qualidade e de segurança. Em seguida, recordou que o procedimento a que o artigo 31.o desse código se refere tem a função de coordenar e orientar num sentido comum a intervenção das autoridades competentes. Por isso, segundo o Tribunal Geral, a finalidade desse artigo milita a favor de uma interpretação flexível dos pressupostos do recurso ao CHMP previstos no mesmo.

53.      Segundo o Tribunal Geral, a mesma abordagem ampla é sugerida pelo facto de o procedimento que resulta do artigo 31.o do Código HUM concluir com uma decisão da Comissão que tem efeitos obrigatórios em relação aos Estados‑Membros, ao passo que, antes da adoção da Diretiva 2004/27/CE (5), essa decisão não tinha qualquer valor vinculativo.

54.      No entender do Tribunal Geral, da leitura do capítulo I das informações aos requerentes infere‑se outro elemento em apoio da referida interpretação, da qual resulta que os Estados‑Membros têm o direito de dar início ao procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM enquanto podem ainda intervir relativamente a uma AIM.

55.      Com base nestas considerações, o Tribunal Geral concluiu que, ao adotar a decisão de execução na sequência do procedimento resultante do recurso de uma autoridade nacional ao CHMP, quando esse procedimento tinha sido prosseguido em paralelo com um processo judicial nacional promovido contra a decisão inicial emitida pela referida autoridade relativamente a uma AIM nacional, a Comissão não tinha violado o artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM.

56.      À semelhança das recorrentes, entendo que essa conclusão é incorreta.

57.      Antes de mais, estou convencido de que o enunciado do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM permite resolver a questão com certeza, como as recorrentes, em substância, afirmaram. Com efeito, o termo «antes», constante do enunciado do referido artigo 31.o, refere‑se, sem ambiguidade, à sucessão no tempo das medidas adotadas pelos diferentes atores no procedimento perante o CHMP. Dele decorre um princípio elementar, a saber, o de que o procedimento perante o CHMP deve preceder a adoção da decisão nacional. Isso implica que a «decisão» à qual o artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM faz referência é a decisão tomada pelas autoridades administrativas competentes, e não, também, a das autoridades judiciais (6). Em conclusão, em meu entender, se o legislador da União tivesse querido deixar que, em presença de um interesse da União, as autoridades nacionais competentes recorressem livremente ao CHMP a todo o momento, teria redigido essa disposição de forma diferente.

58.      É, pois, surpreendente para mim que o Tribunal Geral tenha chegado tão rapidamente à conclusão de que o elemento textual do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM não fornece quaisquer esclarecimentos quanto à questão que constitui o objeto da acusação em apreço.

59.      Além disso, a interpretação teleológica dada pelo Tribunal Geral a essa disposição não me parece suscetível de pôr em causa a conclusão restritiva que decorre da leitura do seu texto.

60.      A este respeito, não nego que o Tribunal Geral tenha identificado corretamente a finalidade do procedimento previsto no artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, a saber, a de evitar avaliações divergentes nos diferentes Estados‑Membros e os entraves ao comércio que daí resultam, mediante uma coordenação e uma orientação num sentido comum do exercício das competências nacionais. Contudo, não partilho da dedução feita pelo Tribunal Geral, segundo a qual esse elemento milita a favor de uma interpretação ampla do pressuposto do recurso ao CHMP em causa.

61.      Para explicar a razão do meu desacordo, permito‑me recordar que o procedimento nos termos do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, que figura no capítulo IV do mesmo, dedicado aos procedimentos de reconhecimento mútuos e descentralizados, não é mais do que um dos procedimentos de recurso ao CHMP, juntamente com os artigos 29.o e 30.o do referido código.

62.      No que diz respeito, mais particularmente, ao artigo 30.o do Código HUM, este é aplicável caso os Estados‑Membros em causa tenham tomado decisões divergentes relativamente à AIM, suspensão ou revogação de um dado medicamento. A sua finalidade é, pois, a de pôr termo a um entrave ao comércio de medicamentos, que, no momento da adoção das referidas decisões, já se produziu.

63.      Dado ser razoável supor que não existem sobreposições entre os âmbitos de aplicação de duas disposições diferentes do mesmo código, tendo a pensar que a função exercida pelo artigo 31.o do Código HUM é complementar à do artigo 30.o desse código. Por conseguinte, afigura‑se‑me que este último deve ser entendido no sentido de que visa evitar entraves ao comércio de medicamentos.

64.      Neste contexto, é certo que é possível supor, tendo em conta a realidade económica, que, depois de uma decisão administrativa de recusa da AIM, como a que, no caso em apreço, foi adotada pelo BfArM em 26 de setembro de 2005, já se tivesse produzido um entrave ao comércio. Por conseguinte, o desencadeamento do procedimento previsto no artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM depois de essa decisão ter sido tomada, muito antes de uma autoridade judicial nacional se ter pronunciado sobre um recurso interposto contra essa decisão, colidiria, de forma manifesta, com as finalidades desse procedimento.

65.      Em meu entender, nessas condições, a Comissão não deveria ter, pois, admitido que o BfArM submetesse a questão ao CHMP no caso em apreço.

66.      O segundo argumento sobre o qual o Tribunal Geral fundamenta a rejeição desta parte, a saber, o caráter vinculativo da decisão que a Comissão adota no termo do procedimento em apreço, não se me afigura suscetível de pôr em causa esta conclusão.

67.      À luz destas considerações, a acusação formulada pelas recorrentes deve ser acolhida.

68.      Não sendo a interpretação adotada pelo Tribunal Geral corroborada pela interpretação teleológica, o guia elaborado pela Comissão em nada altera a interpretação do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM que propus adotar, uma vez que esse guia, manifestamente, não vincula o Tribunal de Justiça.

69.      Por último, quanto à acusação segundo a qual a República Federal da Alemanha cometeu um abuso do direito ao dar início ao procedimento previsto no artigo 31.o do Código HUM só para evitar que o BfArM fosse vencido no âmbito do recurso da sua decisão, pendente nos tribunais administrativos alemães, entendo que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro ao declarar que as recorrentes apenas tinham apresentado «algumas críticas e suposições», como o facto de o BfArM ter tentado obter junto do Oberverwaltungsgericht für das Land Nordrhein‑Westfalen (Tribunal Administrativo Superior para o Land da Renânia do Norte‑Vestefália) uma suspensão do processo que corria termos nesse tribunal. A respeito dessa circunstância, o facto de o BfArM, no seu articulado, ter afirmado expressamente que a suspensão do processo tinha sido pedida a fim de aguardar o resultado do procedimento perante o CHMP não me parece, porém, suficiente para determinar o caráter abusivo das diligências empreendidas pelo BfArM. Por conseguinte, considero que esta acusação também deve ser rejeitada.

70.      À luz das considerações precedentes, em meu entender, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser acolhida, na medida em que o Tribunal Geral deveria ter declarado que a Comissão tinha violado o artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, ao admitir, no caso em apreço, o recurso ao CHMP, apesar de este ter tido lugar depois da adoção da decisão inicial das autoridades administrativas alemãs.

2.      Quanto à segunda parte, relativa a uma violação da exigência de neutralidade estabelecida no artigo 32.o, n.o 2, do Código HUM e do princípio da análise cuidadosa e imparcial, nos termos do artigo 41.o, n.o 1, da Carta

a)      Síntese dos argumentos das partes

71.      As recorrentes entendem que o Tribunal Geral, nos n.os 94 a 104 do acórdão recorrido, considerou que a aplicação do princípio da imparcialidade deve ser submetida a condições excessivamente rígidas.

72.      No entender das mesmas, para que haja violação desse princípio, não é necessário que tenha sido efetivamente declarada a parcialidade de um ato, mas basta que as circunstâncias externas deem origem a uma «suspeita» razoável de que os factos não foram examinados de forma neutra e objetiva. Desse modo, a imparcialidade objetiva estaria especialmente comprometida em caso de conflitos de interesses resultantes de ligações institucionais, cujo caso típico seria o de uma sobreposição de funções. Por conseguinte, segundo as recorrentes, a dupla qualidade de M. Weise, de funcionária da autoridade nacional competente, por um lado, e de relator principal no CHMP, por outro, tornaria impossível qualquer decisão objetiva e imparcial. Segundo as recorrentes, quando a suspeita de parcialidade pesa sobre um dos responsáveis pela decisão do CHMP, a imparcialidade objetiva também não estaria garantida pelo facto de o CHMP ter tomado essa decisão colegialmente ou de a referida decisão ter sido adotada por unanimidade.

73.      Quanto à imparcialidade subjetiva, as recorrentes alegam que, ao contrário do que decidiu o Tribunal Geral, o facto de M. Weise, na sua qualidade de relator do CHMP, ter aconselhado a revogação da AIM do Linoladiol N, em conformidade com a decisão anterior do BfArM, a sua entidade patronal, constitui a prova de que M. Weise fez, de forma parcial, uma avaliação muito desfavorável do Linoladiol N. Segundo as recorrentes, a parcialidade dessa avaliação é igualmente demonstrada pelo facto de o CHMP ter adotado, no seu parecer definitivo, uma abordagem mais flexível, no sentido de que defendeu unicamente uma mera alteração da AIM do Linoladiol N.

74.      A Comissão contesta a tese segundo a qual a nomeação do membro alemão do CHMP como relator num procedimento iniciado pela República Federal da Alemanha perante o CHMP gerou a suspeita, atendendo a circunstâncias objetivas, de que os factos não tinham sido examinados de forma neutra e objetiva. A esse respeito, com efeito, o Tribunal Geral já tinha declarado que, na falta de outros elementos, esse facto não é pertinente. Além disso, segundo a Comissão, as recorrentes guardam silêncio quanto ao facto de o Tribunal Geral ter pressuposto corretamente que o artigo 61.o, n.o 6, do Regulamento n.o 726/2004, que proíbe expressamente os Estados‑Membros «de dar aos membros dos comités e aos peritos instruções incompatíveis com as tarefas que lhes incumbem por direito próprio ou com as tarefas e responsabilidades da Agência», é já suscetível de garantir um exame neutro e objetivo. Em todo o caso, a Comissão sublinha que M. Weise não era mais do que um relator entre os quatro encarregados de avaliar o Linoladiol N no decurso do procedimento no CHMP.

b)      Apreciação

75.      A título preliminar, importa dissipar qualquer possível mal‑entendido a respeito do objeto da presente parte do primeiro fundamento, delimitando cuidadosamente os seus contornos.

76.      Em primeiro lugar, esta parte não está, de forma alguma, baseada no facto de o CHMP ter designado como relator principal um membro com a mesma nacionalidade que a autoridade que deu início ao procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM, como a Comissão sustenta na sua resposta.

77.      Em segundo lugar, apesar do seu título, a presente parte não versa sobre a violação do artigo 32.o, n.o 2, do Código HUM. Pelo contrário, as recorrentes reconhecem que esse artigo não impõe qualquer limitação ao poder discricionário de que o CHMP dispõe na nomeação de um dos seus membros como relator (7).

78.      A única disposição cuja violação é alegada é, como resulta de uma simples leitura dos argumentos desenvolvidos pelas recorrentes, o artigo 41.o, n.o 1, da Carta, que consagra o «direito a uma boa administração», na medida em que estabelece a exigência de que as instituições, órgãos e organismos da União tratem os assuntos de todas as pessoas de forma imparcial (8).

79.      Antes de mais, importa delimitar o alcance da exigência de imparcialidade, conforme interpretada na jurisprudência pertinente.

80.      Esta exigência já foi interpretada pelo Tribunal de Justiça no âmbito do exame de uma alegada violação do direito a um processo equitativo, previsto no artigo 6.o da Convenção para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, a 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH») (9). Nesse contexto, o Tribunal de Justiça considerou que a exigência de imparcialidade dos tribunais inclui duas componentes, que são, por um lado, a imparcialidade subjetiva, em virtude da qual nenhum dos membros do tribunal em causa deve manifestar ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal, e, por outro, a imparcialidade objetiva, em conformidade com a qual esse tribunal deve oferecer garantias suficientes para excluir todas as dúvidas legítimas quanto a um eventual juízo antecipado (10).

81.      Em seguida, no seu Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão (C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 154), o Tribunal de Justiça reconheceu que essa interpretação devia ser aplicada, por analogia, à exigência de imparcialidade das instituições, órgãos e organismos da União, conforme resulta do artigo 41.o da Carta.

82.      Por conseguinte, na apreciação da ação administrativa da União, a imparcialidade subjetiva deve ser examinada tendo em conta a convicção pessoal e o comportamento do membro dessa instituição, órgão ou organismo em causa. Dado que se presume até prova em contrário (11), a imparcialidade subjetiva é difícil de contestar.

83.      Ora, as alegações das recorrentes, segundo as quais M. Weise agiu de forma parcial quando propôs, em conformidade com a decisão anterior da sua entidade patronal, a revogação da AIM do Linoladiol N, não me convencem. A esse respeito, em meu entender, o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro ao considerar, no n.o 97 do acórdão recorrido, que essa tomada de posição de M. Weise corresponde ao exercício das funções que são confiadas a um relator do CHMP. Além disso, entendo que foi também justamente que o Tribunal Geral considerou, no n.o 98 do acórdão recorrido, que as recorrentes não demonstraram que a ausência de M. Weise, na segunda audição perante o CHMP, tinha levado à conclusão de que a AIM do Linoladiol N devia ser mantida. Com efeito, ao contrário do que as recorrentes sustentam, não foi fornecido qualquer elemento de prova nesse sentido nos n.os 37 a 42 da petição, nem em qualquer outro número da mesma.

84.      Em todo o caso, as acusações formuladas pelas recorrentes no recurso visam, em especial, a componente objetiva da exigência de imparcialidade decorrente do artigo 41.o da Carta.

85.      A este respeito, recordo que o exame da imparcialidade objetiva exige determinar se, independentemente da conduta pessoal do membro da administração europeia em causa, certos factos suscetíveis de verificação autorizam a que o interessado suspeite da sua imparcialidade, podendo as aparências ter também importância (12). A esse respeito, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem precisou que o elemento determinante consiste em saber se as apreensões do interessado se podem considerar objetivamente justificadas (13).

86.      Na minha opinião, se a imparcialidade objetiva for entendida deste modo, não suscita qualquer dúvida que a mesma seja suscetível de ser comprometida em caso de conflito de interesses decorrente de uma sobreposição de funções, como as recorrentes sustentam no recurso.

87.      No entanto, uma simples sobreposição de funções não basta, por si só, para conferir às apreensões do interessado quanto à existência de um eventual juízo antecipado um caráter objetivamente justificado e legitimar, desse modo, a declaração de uma violação da imparcialidade objetiva.

88.      Isso infere‑se sem dificuldade do Acórdão do Tribunal Geral de 5 de julho de 2016, Comissão/Hristov (T‑26/15 P, EU:T:2016:390). Com efeito, o Tribunal Geral, dando provimento ao recurso, considerou que a conclusão do Tribunal da Função Pública, no seu Acórdão de 13 de novembro de 2014, Hristov/Comissão e EMA (F‑2/12, EU:F:2014:245), segundo a qual a circunstância de um membro do Conselho de Administração da Agência Europeia de Medicamentos (instância de decisão) ter também assento no comité de pré‑seleção da referida agência (instância competente para fazer propostas) tinha podido justificar uma dúvida legítima sobre a imparcialidade desse comité, padecia de um erro de direito, pelo facto de o Tribunal da Função Pública não ter demonstrado que a pertença dos membros em questão ao Conselho de Administração da Agência Europeia de Medicamentos tinha um «significado prático» quanto ao seu papel no comité de pré‑seleção (14).

89.      Em meu entender, a jurisprudência indicou os critérios que permitem determinar em que circunstâncias uma «dupla função» de um membro de um organismo da União possui o referido «significado prático» quanto ao seu papel no mesmo.

90.      Faço aqui referência, em especial, ao Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Espanha/Conselho (C‑521/15, EU:C:2017:982). Nesse processo, o Reino de Espanha censurava à Comissão, entre outras coisas, ter violado a imparcialidade objetiva, ao confiar a instrução de um processo de inquérito destinado a verificar a exatidão dos dados relativos ao défice fornecidos por esse Estado‑Membro a uma equipa composta, em grande medida, por agentes do Eurostat que previamente tinham participado nas visitas em Espanha que conduziram a Comissão a considerar que havia indícios sérios de factos que justificavam a abertura de tal processo (15).

91.      Este fundamento foi julgado improcedente pelo Tribunal de Justiça, com base nas seguintes conclusões. Em primeiro lugar, para além do facto de estarem sujeitos a quadros jurídicos distintos, as visitas em causa, por um lado, e o processo de inquérito, por outro, tinham um objetivo diferente (16). Com efeito, enquanto que as visitas que o Eurostat pode efetuar nos Estados‑Membros têm por objetivo permitir aos serviços da Comissão proceder a uma avaliação da qualidade dos dados notificados pelos Estados‑Membros a respeito das suas dívidas públicas e dos seus défices orçamentais, o processo de inquérito tem por objetivo permitir à Comissão efetuar todas as investigações necessárias a fim de apurar a existência de deturpações de dados, feitas de forma intencional ou por negligência grave, quando considere que existem indícios sérios de factos suscetíveis de constituir uma deturpação de tais dados. Em segundo lugar, atendendo a estes distintos quadros jurídicos e a estes diferentes objetivos, ainda que os dados visados pelas referidas visitas e pelo processo de inquérito pudessem coincidir parcialmente, as apreciações que o Eurostat e a Comissão eram, respetivamente, chamados a efetuar sobre estes dados eram, em contrapartida, necessariamente diferentes (17). Em terceiro lugar, é à Comissão, e, por conseguinte, aos comissários atuando colegialmente, que a regulamentação pertinente (18) confere o poder de decidir dar início ao processo de inquérito, a responsabilidade de conduzir o inquérito e a faculdade de submeter ao Conselho as recomendações e as propostas que se impõem no termo deste, não confiando essa regulamentação, em contrapartida, nenhuma responsabilidade específica aos agentes do Eurostat (19).

92.      Em meu entender, nesta fase, há que aplicar ao caso em apreço os critérios acima expostos. Isso permitirá determinar, pois, se a nomeação de M. Weise como relator principal do CHMP no âmbito do procedimento relativo ao pedido de renovação da AIM do Linoladiol N era suscetível de gerar nas recorrentes apreensões objetivamente justificadas quanto a um eventual juízo antecipado por parte de M. Weise, tendo em conta que a mesma é uma funcionária do BfArM, ou seja, da autoridade nacional que submeteu a questão ao CHMP, que essa autoridade já tinha adotado uma decisão negativa a respeito da referida renovação e que era também parte recorrida num processo que corria termos nos tribunais administrativos nacionais e tinha por objeto a validade dessa decisão de recusa.

93.      Portanto, é necessário determinar (i) se o procedimento que rege o exercício da função do BfArM tem o mesmo objetivo que o que rege o exercício da função do CHMP (20), (ii) se as apreciações que o BfArM e o CHMP são, respetivamente, chamados a efetuar têm a mesma natureza, e (iii) se foi confiada a M. Weise uma «responsabilidade específica» no âmbito do procedimento que se desenrolou no CHMP. Quanto a este último aspeto, entendo que, do restante do acórdão acima examinado, pode inferir‑se que, no caso em apreço, só existiria essa responsabilidade específica se o papel de M. Weise fosse considerado decisivo para o desenrolar ou para o resultado final do processo em causa (21).

94.      Em primeiro lugar, afigura‑se‑me certo dever considerar‑se que o procedimento que rege o exercício da função do BfArM tem o mesmo objetivo que o que rege o exercício da função do CHMP. Com efeito, nos dois casos, o objetivo do procedimento é proporcionar ao organismo envolvido a possibilidade de realizar todas as avaliações médicas ou científicas da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos necessárias para a adoção de uma decisão relativa à concessão de uma AIM.

95.      Em segundo lugar, tendo em conta a identidade do objetivo dos referidos procedimentos, as avaliações da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos fornecidas pelo BfArM, por um lado, e pelo CHMP, por outro, têm necessariamente a mesma natureza (22).

96.      Em terceiro lugar, em meu entender, não pode ser negado que o CHMP confiou a M. Weise uma responsabilidade específica no âmbito do procedimento relativo à renovação da AIM do Linoladiol N. Com efeito, dado que, em conformidade com o artigo 62.o, n.o 1, do Regulamento 726/2004, o papel do relator principal consiste em «coordenar a avaliação» do medicamento em exame, esse papel proporcionou necessariamente a M. Weise a possibilidade de exercer uma considerável influência sobre o desenrolar do referido procedimento (23).

97.      Nestas condições, é evidente que o facto de a mesma, na realização da sua tarefa, estar acompanhada de um segundo relator, a saber, o membro neerlandês do CHMP, não é suscetível de pôr em causa a conclusão de que M. Weise tinha a possibilidade de exercer uma considerável influência sobre o desenrolar do procedimento. Nem, ao contrário do que a Comissão alega na sua resposta, o é o facto de outros dois membros do CHMP, a saber, os membros espanhol e austríaco, se terem juntado aos dois primeiros como relator principal e segundo relator, respetivamente, na fase de revisão. Com efeito, isso não é suscetível de contrariar a influência que M. Weise estava em condições de exercer, dado que a revisão tem um objeto consideravelmente menos amplo do que o da primeira fase do procedimento, uma vez que, de acordo com o artigo 62.o, n.o 1, quarto parágrafo, do Regulamento n.o 726/2004, «só pode ter por objeto os pontos do parecer inicial previamente identificados pelo requerente».

98.      Estando preenchidos os três critérios que resultam da jurisprudência, entendo que a nomeação de M. Weise como relator principal do CHMP no âmbito do procedimento relativo ao pedido de renovação da AIM do Linoladiol N constitui uma violação da componente objetiva da exigência de imparcialidade que decorre do artigo 41.o da Carta, conforme interpretada na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

99.      À luz destas considerações, considero que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao decidir que, no caso em apreço, o artigo 41.o da Carta foi respeitado pelo CHMP. 

100. Em minha opinião, a segunda parte do primeiro fundamento deve, pois, ser acolhida.

3.      Quanto à terceira parte, relativa a uma violação do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM e do direito de ser ouvido

a)      Síntese dos argumentos das partes

101. Segundo as recorrentes, resulta dos n.os 106 a 112 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral ignorou a acusação relativa à violação do direito de ser ouvido, na medida em que não reconheceu que esse direito inclui necessariamente a possibilidade de se pronunciar sobre todos os factos pertinentes para a decisão, como a restrição essencial que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N (proibição de uma utilização repetida desse medicamento).

102. A violação do direito de ser ouvido teve também repercussões na decisão final da Comissão. Com efeito, se a primeira recorrente tivesse tido oportunidade de expressar o seu ponto de vista no decurso do procedimento no CHMP, este teria sido obrigado a examinar as acusações formuladas, em especial, no âmbito do terceiro fundamento (violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento).

103. A Comissão contesta que, no âmbito do procedimento no CHMP, a primeira recorrente não tenha sido ouvida quanto à projetada medida de proibição de uma utilização repetida do Linoladiol N.

104. Além disso, considera que as recorrentes não apresentaram qualquer elemento que demonstrasse o caráter juridicamente incorreto da interpretação adotada pelo Tribunal Geral, no n.o 110 do acórdão recorrido, segundo a qual o direito de ser ouvido, nos termos do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM, apenas obriga o CHMP a dar aos interessados a possibilidade de apresentar explicações dentro de um prazo a fixar pelo Comité. Segundo a Comissão, é indubitável que esse direito foi respeitado.

b)      Apreciação

105. Recordo que o artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM dispõe que «[a]ntes de emitir o seu parecer, o [CHMP] deve dar ao requerente ou ao titular da [AIM] a possibilidade de apresentar explicações orais ou escritas dentro de um prazo a fixar pelo Comité».

106. No acórdão recorrido, a questão de saber se esse artigo foi violado pelo CHMP, no âmbito do procedimento que se desenrolou no mesmo, foi decidida pela negativa. Na sua apreciação, o Tribunal Geral considerou, no n.o 109 do acórdão recorrido, que a primeira recorrente tinha tido, por várias vezes, a possibilidade de apresentar explicações orais (audições de 19 de março, 18 de novembro e 16 de dezembro de 2013) e escritas (questionários recebidos em 20 de novembro de 2012, 22 de fevereiro, 25 de março, 20 de setembro e 18 de novembro de 2013).

107. No que diz respeito às alegadas irregularidades que envolviam a audição de 18 de novembro de 2013, e à impressão das recorrentes, segundo a qual o CHMP pretendia unicamente adaptar o texto informativo sobre o Linoladiol N em função do texto que servia de base à autorização croata, o Tribunal Geral reiterou que o direito de ser ouvido apenas obriga o CHMP a dar aos interessados a possibilidade de apresentar explicações dentro de um prazo a fixar pelo Comité, o que o mesmo teria feito no caso em apreço (n.o 110 do acórdão recorrido). Segundo o Tribunal Geral, o CHMP não era, por isso, obrigado a garantir que se ateria a um determinado texto informativo sem o alterar.

108. Neste contexto, o Tribunal Geral decidiu, nos n.os 111 e 112 do acórdão recorrido, que as críticas das recorrentes quanto aos comportamentos adotados pelo CHMP na audição de 13 de dezembro de 2013 e ao prazo fixado para a resposta ao quinto questionário constituíam meras «irregularidades de facto» e, como tal, não eram suscetíveis dar lugar a uma violação do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM (24).

109. A título preliminar, preciso que não pretendo, de modo algum, pôr em causa a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual o CHMP cumpriu os deveres processuais que lhe incumbem por força da disposição em causa. No entanto, recordo que, como as recorrentes alegam, a parte do fundamento submetida à apreciação do Tribunal Geral visava também o alcance material do direito de ser ouvido conforme previsto no artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM.

110. Isso resulta claramente da leitura dos articulados apresentados pelas recorrentes em primeira instância.

111. Na petição inicial do processo em primeira instância, esta parte incluía, para além das referidas acusações de ordem processual (25), uma terceira acusação, de ordem material, intitulada «A primeira recorrente não foi ouvida acerca da limitação da duração de utilização do Linoladiol N a quatro semanas, com a correspondente exclusão de uma utilização repetida».

112. A autonomia desta acusação em relação às duas primeiras é confirmada na réplica deduzida em primeira instância e, em especial, pela leitura do n.o 41, nos termos do qual «ao contrário da conceção defendida pela recorrida, o objetivo de uma audição não se limita ao facto de dar, formalmente, oportunidade aos interessados para se pronunciarem oralmente sobre as conclusões científicas do CHMP, mas a audição deve permitir igualmente tomar posição acerca das consequências jurídicas que decorrem dessas conclusões […]», em conjugação com o n.o 42, no qual o conteúdo da acusação é exposto de forma pormenorizada: «[…] a Comissão não pode ter em conta argumentos sobre os quais os interessados não tiveram oportunidade de apresentar explicações. Nessa medida, deve concluir‑se que a recorrida admite que o CHMP não advertiu a primeira recorrente da projetada limitação da utilização do medicamento Linoladiol N a uma única utilização ao longo da vida de cada paciente».

113. Em conclusão, a parte do fundamento em apreço, longe de se limitar à decisão do Tribunal Geral de rejeitar a violação dos deveres processuais que incumbem ao CHMP, inclui também a acusação de que o Tribunal Geral não se pronunciou sobre a violação do direito da primeira recorrente a ser ouvida pelo CHMP a respeito da condição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N, a saber, a limitação da duração de utilização a quatro semanas, com a correspondente exclusão de uma utilização repetida.

114. No acórdão recorrido, o Tribunal Geral examinou a acusação em causa?

115. A esse respeito, poderiam legitimamente suscitar‑se algumas dúvidas. Com efeito, à primeira vista, n.os 109 a 112 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não parece preocupar‑se em dar uma resposta explícita à questão de saber se o facto de a primeira recorrente não ter sido ouvida acerca da restrição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N constituía uma violação do direito de ser ouvido.

116. No entanto, recordo que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação do Tribunal Geral também pode ser implícita, desde que permita aos recorrentes conhecerem os fundamentos em que o Tribunal Geral se baseia e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização (26).

117. A esse respeito, cabe verificar se a penúltima frase do n.o 110 do acórdão recorrido, lida no contexto desse número, preenche as referidas condições e se, por conseguinte, é suscetível de satisfazer o dever de fundamentação que incumbe ao Tribunal Geral.

118. No referido n.o 110, o Tribunal Geral, após indicar, no âmbito do exame das alegadas irregularidades que envolviam a audição de 18 de novembro de 2013 (27), que o direito de ser ouvido, na aceção do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM, apenas obriga o CHMP a dar aos interessados a possibilidade de apresentar explicações dentro de um prazo a fixar pelo Comité, considerou que «o CHMP não era, pois, de modo algum, obrigado a garantir que se ateria unicamente a um determinado texto informativo e que este não poderia ser alterado» (28).

119. Esta frase poderia ser entendida, mediante um esforço interpretativo, no sentido de que o CHMP não era obrigado, aquando da adoção do seu parecer, a ater‑se ao texto sobre o qual as recorrentes tinham podido tomar posição, a saber, aquele que serve de base à autorização croata, e gozava, desse modo, do direito de nele incluir a alteração que introduzia a condição relativa à limitação da duração de utilização a quatro semanas, com a correspondente exclusão de uma utilização repetida, sem ter dado previamente às recorrentes a oportunidade de se pronunciarem sobre esse ponto.

120. Por conseguinte, segundo o Tribunal Geral, a inclusão da condição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N, que foi realizada neste caso através da alteração do texto informativo sobre o medicamento, não estaria abrangida pelo direito de ser ouvida de que a primeira recorrente gozava ao abrigo do artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM.

121. É nesta leitura do n.o 110 de acórdão recorrido que se baseia a continuação do meu raciocínio.

122. Contudo, antes de iniciar a análise, não posso deixar de formular uma crítica geral à resposta dada pelo Tribunal Geral à acusação em causa. Com efeito, mesmo supondo que se possa concluir que a referida frase do n.o 110 do acórdão recorrido constitui uma «fundamentação implícita», na aceção da jurisprudência, é lamentável que o Tribunal Geral se tenha desobrigado do seu dever mediante uma fundamentação concisa e críptica a este ponto.

123. Não obstante, tendo concluído que não existiu uma violação do dever de fundamentação, debruçar‑me‑ei agora sobre o mérito e, em especial, sobre a questão de saber se o Tribunal Geral declarou corretamente que o conjunto de explicações que as recorrentes foram convidadas pelo CHMP a apresentar deveria ter sido estendido à sua posição acerca da condição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N.

124. A este respeito, antes de mais, observo que, uma vez que, até ao presente, o artigo 32.o, n.o 3, do Código HUM nunca foi objeto de interpretação pelo Tribunal de Justiça, o alcance material do direito de ser ouvido nos termos da disposição em causa deve ser inferido da jurisprudência que definiu os contornos do direito de audiência enquanto princípio geral do direito da União.

125. Com efeito, o direito de ser ouvido constitui um princípio geral do direito da União consagrado no artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta. Essa disposição define‑o como «[o] direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente».

126. A esse respeito, o Tribunal de Justiça declarou, em muitas ocasiões, que os titulares do direito de ser ouvido devem ter podido dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e das circunstâncias alegados, bem como sobre os elementos de prova utilizados em apoio dessas alegações (29). Este alcance foi mais precisado numa série de acórdãos, nos quais o Tribunal de Justiça concluiu que o direito de ser ouvido se estende a todos os elementos de facto ou de direito que constituem o fundamento do ato decisório, mas não à posição final que a administração entenda adotar (30).

127. Na minha opinião, é com base nessa jurisprudência que deve ser examinada a questão de saber se a conclusão do Tribunal Geral pode ser partilhada.

128. No caso em apreço, trata‑se, pois, de determinar se a condição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N deve ser qualificada como elemento de facto que constituiu o fundamento da decisão de execução adotada pela Comissão na sequência do parecer do CHMP ou se, pelo contrário, constitui um elemento da própria decisão, por resultar de uma apreciação dos elementos de facto.

129. Para esse efeito, antes de mais, afigura‑se‑me essencial determinar se a violação do direito de ser ouvido alegada pelas recorrentes visa a referida condição como tal ou a conclusão científica subjacente a essa condição, segundo a qual a segurança endometrial da utilização de longa duração ou repetida do estrogénio administrado vaginalmente a nível local não pode ser garantida em caso de tratamento prolongado superior a quatro semanas (31). Com efeito, em meu entender, a condição como tal está abrangida na posição final que a Comissão entendeu adotar na sequência da apreciação dos factos (32), ao passo que a conclusão científica que lhe serve de base é um dos elementos de facto que constituem o fundamento dessa posição.

130. Ora, parece‑me resultar claramente do recurso que as recorrentes censuram ao CHMP não ter ouvido a primeira recorrente acerca da condição como tal. Com efeito, sustentam que o direito da primeira recorrente a ser ouvida era extensivo à «questão de saber que medida é necessária, aos olhos da autoridade, para ter em conta os resultados da análise» (33).

131. Essa condição está abrangida, deste modo, na posição final da Comissão e, por conseguinte, não constitui objeto do direito da primeira recorrente a ser ouvida.

132. Nestas condições, em meu entender, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

4.      Conclusão quanto ao primeiro fundamento de recurso

133. Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça acolha as primeira e segunda partes do primeiro fundamento de recurso e que, por conseguinte, o julgue procedente.

B.      Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação dos artigos 116.o, primeiro parágrafo, e 126.o, primeiro parágrafo, do Código HUM

134. No segundo fundamento do presente recurso, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral, nos n.os 121 a 199 do acórdão recorrido, ao examinar as diferentes partes do segundo fundamento invocado em primeira instância, não compreendeu, de forma completa, o objeto das acusações formuladas e afastou‑se do essencial da argumentação das recorrentes.

135. Este fundamento centra‑se em quatro partes. Em primeiro lugar, as recorrentes consideram que o Tribunal Geral violou os princípios da repartição dos ónus da alegação e da prova, na medida em que a sua interpretação resulta numa imposição ao titular da AIM de um dever de fazer prova da segurança do medicamento em causa mesmo depois da obtenção da AIM. Em segundo lugar, censuram ao Tribunal Geral ter cometido um erro ao declarar que o CHMP, no seu parecer, estabeleceu um nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões. Em terceiro lugar, sustentam que o Tribunal Geral não teve em conta que os dados relativos à farmacovigilância desempenham um papel fundamental na apreciação dos riscos que os medicamentos comercializados apresentam. Em quarto lugar, alegam que o Tribunal Geral procedeu a uma apreciação incorreta das críticas formuladas pelas recorrentes, segundo as quais as conclusões científicas do CHMP estavam erradas devido à apresentação incorreta dos dados relativos à farmacovigilância disponíveis quanto à segurança do Linoladiol N e que o mesmo não deu resposta às alegações das recorrentes respeitantes à apresentação errada do conteúdo das normas orientadoras relacionadas com a utilização de estrogénios tópicos.

1.      Quanto à primeira parte, relativa a uma violação dos princípios da repartição do ónus da alegação e do ónus da prova decorrente do facto de a existência de risco ter sido baseada na falta de estudos após autorização

a)      Síntese dos argumentos das partes

136. As recorrentes consideram que o Tribunal Geral, ao declarar que a falta de estudos suscetíveis de dissipar as dúvidas do CHMP quanto à existência de risco associado ao uso do Linoladiol N bastava para justificar uma alteração da AIM do mesmo, violou os princípios da repartição dos ónus da alegação e da prova. Com efeito, criou, de facto, e fez recair sobre o titular da autorização um dever de fazer a prova da segurança do medicamento através de estudos, mesmo após a obtenção da AIM.

137. A esse respeito, segundo as recorrentes, a leitura das disposições pertinentes do regime da farmacovigilância previsto no título IX do Código HUM confirma que o titular de uma AIM não é obrigado a realizar estudos de segurança após autorização. Em consequência disso, a falta de estudos desse tipo também não pode ser oponível ao referido titular.

138. As recorrentes consideram também que as conclusões do Tribunal Geral tampouco encontram fundamento nos desenvolvimentos que, nos n.os 137 a 140 do acórdão recorrido, aquele dedica ao princípio da precaução, uma vez que não teve em conta que a avaliação de riscos não pode ser baseada em considerações puramente hipotéticas. Ora, no entender das recorrentes, as suposições do CHMP, expostas pelo Tribunal Geral no n.o 143 do acórdão recorrido, segundo as quais os riscos conhecidos que resultam da utilização de terapias de substituição hormonal podiam existir igualmente no que diz respeito ao Linoladiol N, deveriam ser qualificadas como considerações hipotéticas desse tipo.

139. Com efeito, segundo as recorrentes, a única exceção ao princípio por força do qual a avaliação de riscos não pode ser baseada em considerações hipotéticas não é aplicável no presente caso. Segundo a jurisprudência, aquela apenas se materializa quando se revela impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do alegado risco em virtude da natureza insuficiente, não conclusiva ou imprecisa dos resultados dos estudos realizados, suscitando, no entanto, sérias dúvidas quanto à inocuidade do medicamento e, portanto, seja provável que exista um prejuízo real para a saúde pública. Contudo, no presente caso, o sistema de farmacovigilância previsto para os medicamentos permite determinar com certeza a existência ou o alcance do risco associado ao uso do Linoladiol N. Além disso, o Tribunal de Justiça, no Acórdão de 9 de setembro de 2003, Monsanto Agricoltura Italia e o. (C‑236/01, EU:C:2003:431), decidiu que medidas de proteção não podem ser fundamentadas numa avaliação puramente hipotética dos riscos, exceto no caso de novos alimentos. No entanto, um medicamento como o Linoladiol N, presente no mercado há 45 anos, não é um novo produto.

140. Segundo a Comissão, o Tribunal Geral respondeu corretamente às únicas duas questões de direito relacionadas com a repartição do ónus da prova. Por um lado, no n.o 135 do acórdão recorrido, considerou que cabe à Comissão provar a deterioração da relação risco‑benefício do Linoladiol N. Por outro lado, nos n.os 137 a 140 e 174 do referido acórdão, considerou que o princípio da precaução justifica a adoção de uma medida restritiva quando se revela impossível demonstrar com certeza a existência ou o alcance do alegado risco. Ora, segundo a Comissão, as recorrentes não contestaram, de modo algum, quanto ao mérito, a apreciação dessas questões de direito. Em contrapartida, as mesmas limitaram‑se a censurar ao Tribunal Geral as observações feitas nos n.os 142 e 143 e 171 a 173 do acórdão recorrido, bem como a conclusão retirada no n.o 179 do mesmo, ou seja, a de que a Comissão satisfez o ónus da prova. Portanto, os seus argumentos apenas visavam a apreciação da prova efetuada pelo Tribunal Geral. Por conseguinte, a presente parte do segundo fundamento é inadmissível na fase de recurso de decisão do Tribunal Geral.

b)      Apreciação

141. A título preliminar, parece‑me útil recordar sucintamente o raciocínio desenvolvido pelo Tribunal Geral nos n.os 135 a 144 do acórdão recorrido.

142. Antes de mais, o Tribunal Geral apontou que, nos casos de revogação, suspensão ou alteração de uma AIM nos termos do artigo 116.o do Código HUM, o ónus da prova da eficácia e da inocuidade de um medicamento recai sobre a autoridade competente, a saber, a Comissão.

143. Quanto ao nível de prova exigido à Comissão, o Tribunal Geral recordou que, face a uma situação de incerteza quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde das pessoas, o princípio da precaução permite que sejam adotadas, com a finalidade de fazer prevalecer sobre os interesses económicos as exigências relacionadas com a saúde pública, medidas de proteção sem ter de esperar que a realidade e a gravidade do risco sejam plenamente demonstradas, quando existam dados novos que suscitem sérias dúvidas quanto à segurança ou à eficácia do medicamento em causa que conduzam a uma apreciação desfavorável da relação risco‑benefício relativa a esse medicamento. Neste contexto, o Tribunal Geral declarou que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a Comissão pode limitar‑se a fornecer «indícios sérios e concludentes que, sem dissiparem a incerteza científica, permitam que se duvide razoavelmente da inocuidade ou da eficácia do medicamento» (34). A este respeito, o Tribunal Geral observou que o CHMP tinha considerado que os riscos conhecidos que resultam da utilização de medicamentos contendo estrogénio sistémico para terapias de substituição hormonal podiam existir igualmente no que diz respeito ao Linoladiol N. Entendendo que se tratava de «indícios sérios e concludentes», o Tribunal Geral declarou que a Comissão tinha, assim, satisfeito o nível de prova que lhe era exigido.

144. Quanto à admissibilidade da presente parte, contestada pela Comissão, limito‑me a indicar que a alegada violação da repartição do ónus da prova constitui uma questão de direito submetida à fiscalização do Tribunal de Justiça em sede de recurso de decisão do Tribunal Geral (35). A presente parte deve ser, pois, julgada admissível.

145. Quanto ao mérito, o argumento das recorrentes, no entanto, não me convence.

146. Como o Tribunal Geral recorda, no n.o 135 do acórdão recorrido, o princípio geral que rege a repartição do ónus da prova no quadro do artigo 116.o do Código HUM prevê que é à Comissão que compete determinar se as condições de revogação, de suspensão e de alteração da AIM estão preenchidas. Em contrapartida, o titular da AIM de um medicamento não é obrigado, durante o período de vigência dessa AIM, a apresentar prova da eficácia ou da inocuidade do medicamento em causa.

147. Em situações de incerteza científica quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde, a jurisprudência aplicada pelo Tribunal Geral estabelece que a Comissão pode adotar uma medida de proteção (revogação, suspensão ou alteração da AIM) sem esperar que esses riscos se verifiquem, aplicando o princípio da precaução, mas unicamente desde que apoie em indícios sérios e concludentes as suas dúvidas razoáveis acerca da inocuidade ou da eficácia do medicamento em causa.

148. No caso em apreço, o Tribunal Geral considerou que as observações do CHMP, segundo as quais os riscos conhecidos que resultam da utilização de terapias de substituição hormonal podiam existir igualmente no que diz respeito ao Linoladiol N, forneciam esses «indícios sérios e concludentes».

149. Não tenho a mínima dúvida de que esta apreciação do Tribunal Geral, que está baseada na jurisprudência do Tribunal de Justiça, não é suscetível de gerar uma inversão do ónus da prova, na medida em que imporia ao titular da AIM o dever de fazer prova da segurança do medicamento através de estudos após autorização, como as recorrentes alegam. Pelo contrário, ainda que o nível de prova que a Comissão deve satisfazer seja menos exigente neste caso, o dever de determinar os factos dos quais depende a procedência da sua posição, segundo a qual é necessária uma medida de proteção devido à deterioração da relação risco‑benefício relativa ao Linoladiol N, recai sempre sobre essa instituição.

150. Aliás, num acórdão recente, o Tribunal Geral já declarou expressamente que «o facto de serem adotadas medidas nos termos do artigo 116.o do Código HUM, em caso de incerteza científica ou de existirem dúvidas razoáveis acerca da eficácia ou da inocuidade de um medicamento, não pode ser equiparado a uma inversão do ónus da prova» (36).

151. Tendo em conta a situação de incerteza científica quanto à existência ou ao alcance de risco para a saúde que pode justificar a adoção de uma medida de proteção, aplicando a Comissão o princípio da precaução, não partilho do argumento das recorrentes segundo o qual o Tribunal Geral cometeu um erro de interpretação da jurisprudência ao não ter em conta que essa situação não poderia ocorrer quando é aplicado o Código HUM, em virtude de este prever o sistema de farmacovigilância.

152. A esse respeito, faço notar que o juiz da União, após ter identificado uma situação de incerteza científica desse tipo, já aplicou o princípio da precaução no domínio do Código HUM, no Acórdão de 11 de dezembro de 2014, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (T‑189/13, não publicado, EU:T:2014:1056, n.o 37 e segs.). Ora, penso que o Tribunal de Justiça deveria partilhar dessa posição do Tribunal Geral, tendo em conta a importância que o princípio da precaução reveste para, no domínio farmacêutico, fazer prevalecer sobre os interesses de natureza económica as exigências relacionadas com a proteção da saúde pública.

153. Por último, no que diz respeito à afirmação das recorrentes segundo a qual só poderia existir uma incerteza científica relativamente a novos produtos e, portanto, não relativamente ao Linoladiol N, que está presente no mercado há várias décadas, entendo que essa conclusão não pode ser retirada do Acórdão de 9 de setembro de 2003, Monsanto Agricoltura Italia e o. (C‑236/01, EU:C:2003:431), por duas razões principais. Em primeiro lugar, esse acórdão foi proferido num domínio diferente do que está em causa no presente processo. Em segundo lugar, embora seja verdade que, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça decidiu que, no caso de novos alimentos, medidas de proteção (restrição provisória ou suspensão da comercialização) podiam ser validamente fundamentadas pela existência de riscos potenciais, parece‑me que esse acórdão em nada exclui que essa fundamentação possa ser igualmente considerada suficiente no caso de alimentos já presentes no mercado. Com efeito, nesse caso, o Tribunal de Justiça foi simplesmente chamado a interpretar determinadas disposições do regulamento relativo a novos alimentos e ingredientes alimentares (37).

154. Tendo em conta as considerações precedentes, em meu entender, a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

2.      Quanto à segunda parte, relativa à falta de um nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP

a)      Síntese dos argumentos das partes

155. Tendo em conta os n.os 149 a 164 e 188 a 197 do acórdão recorrido, as recorrentes afirmam que o Tribunal Geral não se pronunciou quanto ao facto de o CHMP não ter, ainda, exposto as razões pelas quais se tinha afastado das conclusões constantes dos relatórios ou estudos invocados pelas recorrentes. Além disso, as observações do Tribunal Geral são frequentemente contraditórias, incompletas ou incorretas.

156. Em primeiro lugar, as recorrentes alegam que, embora o Tribunal Geral tenha feito referência, no n.o 147 do acórdão recorrido, aos argumentos que as mesmas tinham apresentado quanto à dificuldade de transpor para um tratamento local a avaliação de riscos baseada numa exposição sistémica, bem como ao facto de a frequência de utilização do Linoladiol N ser menor do que a de uma terapia de substituição hormonal sistémica, resulta da leitura das conclusões do CHMP, referidas nos n.os 151 a 158 do mesmo acórdão, que o CHMP, na sua avaliação, não teve em conta esses argumentos.

157. Em segundo lugar, as recorrentes sustentam que a conclusão retirada pelo Tribunal Geral, no n.o 160 do acórdão recorrido, em resposta ao argumento das recorrentes, segundo a qual, tendo em conta os valores de base pós‑menopáusicos, a utilização pelo CHMP de limiares inferiores aos estabelecidos na literatura científica não era suscetível de pôr em causa a coerência e a lógica do parecer científico do CHMP, é incompreensível e contraditória. Com efeito, o aumento acima dos valores de base pós‑menopáusicos representava, para o CHMP, um elemento essencial da apreciação de risco.

158. Em terceiro lugar, segundo as recorrentes, no n.o 161 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não respondeu ao argumento que apresentaram, segundo o qual o CHMP, no seu relatório, não teve suficientemente em conta o facto de o aumento do nível de estradiol no sangue resultante da utilização do Linoladiol N ser apenas transitório e de o nível de estradiol no sangue, após um ciclo de administração do Linoladiol N, não superar os limites dos valores de base pós‑menopáusicos.

159. Em quarto lugar, as recorrentes censuram ao Tribunal Geral não ter examinado, no âmbito da apreciação exposta no n.o 162 do acórdão recorrido, o argumento que invocaram, segundo o qual o facto de a dose de manutenção do Linoladiol N ser comparativamente mais elevada do que a de outras preparações à base de estradiol para terapêutica vaginal tópica não gera um risco acrescido.

160. Em quinto lugar, as recorrentes consideram que o Tribunal Geral devia ter examinado um quadro comparativo, apresentado pelas recorrentes na audiência naquele tribunal, que estendia a comparação, feita pelo CHMP no seu relatório de avaliação final, entre o Linoladiol N e os medicamentos com uma dosagem inferior às terapias de substituição hormonal sistémicas. Segundo as recorrentes, esse quadro punha em evidência que os níveis de estradiol resultantes de várias aplicações de Linoladiol N e da terapia de substituição hormonal sistémica «Estreva» em nada são semelhantes e que, no caso do Linoladiol N, esses valores não são muito superiores em relação a um medicamento com uma dosagem inferior. Por conseguinte, a conclusão do Tribunal Geral, segundo a qual a exposição ao estradiol decorrente do Linoladiol N era mais comparável à que resulta de uma terapia de substituição hormonal sistémica, não tem qualquer fundamento lógico.

161. Por último, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral não respondeu ao argumento que apresentaram, segundo o qual um medicamento de aplicação vaginal comporta um menor risco de tromboembolismo venoso do que uma terapia de substituição hormonal por via oral.

162. A Comissão responde que, com as alegações apresentadas nesta parte, as recorrentes se limitam a afirmar que o parecer definitivo do CHMP não era conclusivo. Nenhuma das acusações faz ressaltar qualquer irregularidade processual ou violação do direito da União. Portanto, esta parte não é admissível.

163. Em especial, a respeito do quadro comparativo que as recorrentes apresentaram na audiência perante o Tribunal Geral, a Comissão sustenta que este último não cometeu qualquer erro ao rejeitar esse elemento de prova, dado que o mesmo foi apresentado pela primeira vez na audiência, sem qualquer justificação, o que constitui uma violação do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Além disso, segundo a Comissão, o quadro em causa não era mais do que um elemento de prova, cuja apreciação compete ao Tribunal Geral. Em todo o caso, mesmo na hipótese de o Tribunal de Justiça não estar de acordo quanto a esse ponto, a Comissão entende que o Tribunal Geral não poderia ter sido levado a concluir que o mesmo teria privado a fundamentação do parecer definitivo do CHMP da sua lógica, uma vez que o CHMP tinha à sua disposição outras comparações que examinou de forma adequada, como demonstram os n.os 155, 156 e 158 do acórdão recorrido. De qualquer forma, segundo a Comissão, o medicamento Estreva, referido no quadro comparativo, não pode ser comparado com o Linoladiol N. Com efeito, aquele é utilizado como terapia de substituição hormonal, ao passo que o Linoladiol N apenas é usado como substituto hormonal local.

b)      Apreciação

164. Antes de mais, deve recordar‑se que, relativamente ao parecer do CHMP, a fiscalização do Tribunal Geral se exerce apenas em relação à regularidade do funcionamento do CHMP, bem como à coerência interna e à fundamentação do seu parecer. A respeito deste último aspeto, resulta da jurisprudência do Tribunal Geral que este só está habilitado a verificar se o parecer tem uma fundamentação que permite apreciar as considerações em que se baseou e se estabelece um nexo compreensível entre os factos médicos ou científicos e as conclusões que comporta (38). Tratando‑se de uma mera aplicação no domínio científico da jurisprudência assente, segundo a qual a fiscalização jurisdicional sobre avaliações complexas da Comissão só pode ser uma fiscalização limitada, dispondo esta última de um amplo poder de apreciação (39), convido o Tribunal de Justiça a confirmar, antes de mais, a correção da jurisprudência do Tribunal Geral.

165. Em meu entender, esta jurisprudência do Tribunal Geral, aplicada no presente caso, implica que a prova que as recorrentes devem produzir não se pode limitar ao facto de o Tribunal Geral não ter indicado que um dos elementos considerados pelo CHMP no âmbito da sua apreciação médica ou científica estava incorreto. São obrigadas a demonstrar igualmente que esse elemento é tão fundamental que um erro a seu respeito é suscetível de eliminar a relação lógica que existe entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP.

166. Será à luz desses princípios que examinarei a admissibilidade, contestada pela Comissão, e, sendo caso disso, o mérito de cada uma das alegações apresentadas pelas recorrentes.

167. No que diz respeito à dificuldade de transpor para um tratamento local, como o Linoladiol N, a avaliação de riscos baseada numa exposição sistémica, considero que esta acusação é suscetível de ser objeto do exame realizado pelo Tribunal de Justiça no âmbito do recurso da decisão do Tribunal Geral.

168. Com efeito, um erro quanto à possibilidade de comparar os resultados das avaliações dos riscos do Linoladiol N e das terapias de substituição hormonal sistémicas é, como as recorrentes parecem defender, suscetível de eliminar o «nexo compreensível» entre a observação científica essencial do CHMP (o nível de estradiol no sangue após a administração do Linoladiol N é similar ao alcançado na terapia de substituição hormonal sistémica) e as conclusões do seu parecer definitivo (a utilização do Linoladiol N comporta os mesmos riscos que a dos produtos destinados à terapia de substituição hormonal sistémica e, portanto, é necessária uma medida de restrição da sua utilização). Por conseguinte, em meu entender, a acusação em causa é admissível.

169. Quanto ao mérito, considero, no entanto, que o Tribunal Geral não cometeu essa violação. Com efeito, afigura‑se‑me que os n.os 151 a 158 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal Geral resume as conclusões do CHMP, referem as razões pelas quais o CHMP tinha considerado que os resultados da avaliação dos riscos das terapias de substituição hormonal podem ser transpostos para um tratamento local, como o Linoladiol N.

170. Resulta dessa síntese que (i) o CHMP tinha apresentado uma comparação do Linoladiol com outros medicamentos para utilização tópica, baseada em dados farmacocinéticos, da qual resultava que o nível de estradiol após a administração do Linoladiol N era consideravelmente mais elevado do que após a administração de outros medicamentos com uma dosagem inferior de estradiol, e (ii) o nível de estradiol após a administração do Linoladiol N era tão elevado como no caso de uma terapia de substituição hormonal, de forma temporária.

171. Foi com base nesses elementos que o Tribunal Geral pôde concluir, no n.o 158 do acórdão recorrido, que, «preservando a distinção entre a terapia tópica e a terapia de substituição hormonal, o CHMP estabeleceu um nexo compreensível entre as constatações médicas e científicas a respeito das características do Linoladiol N e as conclusões do parecer definitivo de 25 de abril de 2014».

172. À luz destas considerações, em meu entender, a primeira acusação deve ser rejeitada.

173. Em segundo lugar, quanto à utilização de limiares relativos aos valores de base de estradiol pós‑menopáusicos inferiores aos estabelecidos na literatura científica (40), o Tribunal Geral, no n.o 160 do acórdão recorrido, decidiu que, embora tivessem apresentado elementos de prova que apoiam esta alegação, as recorrentes «não [tinham demonstrado], de modo juridicamente suficiente, que esse elemento pontual do raciocínio do CHMP deveria conduzir a uma conclusão diametralmente oposta e que isso punha em causa a coerência e a lógica do parecer científico».

174. Em substância, o Tribunal Geral considerou que não tinha sido demonstrado que o elemento em questão era tão fundamental que um erro a seu respeito era suscetível de eliminar a relação lógica que existe entre as constatações medicas ou científicas e as conclusões a que o CHMP chegou.

175. Refiro desde já que a presente acusação não me convence.

176. Não nego que os limiares relativos aos valores de base pós‑menopáusicos se revelam, prima facie, um elemento indispensável para a apreciação da questão de saber se os efeitos sistémicos conduzem, afinal, a uma exposição a riscos similares aos associados às terapias de substituição hormonal se podem verificar após a administração de um produto à base de estradiol. Aliás, isso resulta da passagem das conclusões científicas do CHMP referida no n.o 151 do acórdão recorrido, segundo a qual «são de esperar efeitos sistémicos, na medida em que os níveis de estradiol aumentam acima dos níveis pósmenopáusicos». No entanto, em meu entender, seria legítimo considerar que esta relação de causa e efeito se referia à relação entre os efeitos sistémicos e o aumento dos níveis de estradiol acima dos limiares relativos aos valores de base pós‑menopáusicos que foram utilizados pelo CHMP. Por outras palavras, supondo que, em virtude da utilização dos limiares indicados pelas recorrentes, que são mais elevados do que os que foram utilizados pelo CHMP, o aumento dos níveis de estradiol não implicava a superação desses limiares, em princípio, não poderia ser excluído que se manifestem igualmente efeitos sistémicos.

177. Em meu entender, a observação acima desenvolvida é suscetível de apoiar a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual as recorrentes, na petição, não demonstraram, de forma juridicamente suficiente, por que razão o facto de os valores de base pós‑menopáusicos não estarem corretos era suscetível, por si só, de infirmar as conclusões do CHMP.

178. Por isso, mesmo não ignorando que a rejeição da presente acusação teria, idealmente, exigido um desenvolvimento muito mais aprofundado por parte do Tribunal Geral, considero que um exame da resposta que resulta do n.o 160 do acórdão recorrido deve levar a concluir que o Tribunal Geral não violou o seu dever de fundamentação.

179. Tendo em conta as considerações precedentes, em meu entender, a presente acusação deve ser rejeitada.

180. Em terceiro lugar, no que diz respeito à falta de resposta do Tribunal Geral ao argumento segundo o qual o CHMP não teve suficientemente em conta o facto de o aumento do nível de estradiol no sangue resultante da utilização do Linoladiol N ser apenas transitório, entendo que as recorrentes não conseguem demonstrar que o Tribunal Geral não tomou em consideração esse elemento no âmbito da sua apreciação.

181. Com efeito, no n.o 161 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou que o CHMP tinha indicado, com base em dois estudos científicos (SCO 5109 e SCO 5174), que os níveis de estradiol no caso de administração do Linoladiol N duas vezes por semana correspondiam aos de uma terapia de substituição hormonal e que, ao fim de trinta e seis horas, esses níveis elevados ainda não tinham recuperado o seu valor inicial.

182. Assim, não se me afigura, pois, que o Tribunal Geral não tenha tido em conta que o aumento do nível de estradiol no sangue resultante da utilização do Linoladiol N era transitório e que as concentrações de estradiol podiam recuperar o seu valor inicial após mais de trinta e seis horas.

183. Ora, embora a efetiva tomada em consideração desse elemento pelo Tribunal Geral apenas resulte implicitamente do n.o 161 do acórdão recorrido, isso não constitui, de modo algum, uma falta de fundamentação, como, em substância, as recorrentes sustentam. A esse respeito, basta recordar a jurisprudência, que já referi no n.o 116 das presentes conclusões, segundo a qual o Tribunal Geral não é obrigado a fazer uma exposição que acompanhe, exaustiva e individualmente, todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio; a fundamentação pode, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os argumentos por eles apresentados e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização, o que se me afigura ser claramente o caso no presente processo.

184. Em todo o caso, a presente acusação não é suscetível de demonstrar que o elemento em causa, a saber, a natureza temporária do aumento dos níveis de estradiol no sangue, seria capaz de eliminar o nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP.

185. Nestas condições, em meu entender, a presente acusação deve ser rejeitada.

186. Em quarto lugar, no que diz respeito à alegada omissão, no acórdão recorrido, do exame do argumento das recorrentes segundo o qual o facto de a dose de manutenção do Linoladiol N ser superior à de outras preparações à base de estradiol não gerava um risco acrescido, basta observar que uma avaliação desse tipo está, sem dúvida alguma, abrangida pelo amplo poder de apreciação de que a Comissão dispõe numa matéria como esta, em que é chamada a efetuar avaliações médicas ou científicas complexas e que, por isso, não está sujeita à fiscalização jurisdicional do Tribunal Geral, exceto em caso de erro manifesto, desvio de poder ou se a Comissão ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação, o que não é alegado no presente caso. Por conseguinte, as recorrentes não podem censurar ao Tribunal Geral não se ter pronunciado quanto a esse ponto.

187. Em quinto lugar, quanto à falta de exame do quadro comparativo, começo por apontar, à semelhança da Comissão na sua resposta, que esse quadro foi apresentado pela primeira vez na audiência perante o Tribunal Geral e que a ata da mesma não faz referência a qualquer justificação fornecida pelas recorrentes para esse atraso, o que constitui uma violação do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Se, efetivamente, não tiver sido fornecida qualquer justificação, a falta de exame, no acórdão recorrido, do referido quadro explicar‑se‑á pelo facto de o Tribunal Geral, implicitamente e de forma juridicamente correta, o ter declarado inadmissível.

188. Em todo o caso, partilho da posição adotada pela Comissão a esse respeito na sua resposta, no sentido de que o quadro comparativo em causa, mesmo que tivesse sido considerado admissível e examinado quanto ao mérito, seria inoperante, dado que o mesmo não teria podido levar o Tribunal Geral a concluir que o nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP estava, desse modo, eliminado.

189. Antes de mais, o valor probatório desse quadro é manifestamente reduzido pelo facto de o mesmo oferecer unicamente uma comparação do Linoladiol N com apenas um outro medicamento, a saber, o Estreva.

190. Além disso, a comparação entre o Linoladiol N e o Estreva não se afigura compatível com a lógica subjacente ao raciocínio do CHMP no seu parecer definitivo, conforme resumido pelo Tribunal Geral no n.o 151 a 158 do acórdão recorrido.

191. Com efeito, como Tribunal Geral declara no n.o 158 desse acórdão, o CHMP tinha chegado à conclusão de que o Linoladiol N conduz temporariamente a níveis de estradiol comparáveis aos resultantes da utilização de terapias de substituição hormonal, «preservando a distinção entre a terapia tópica e a terapia de substituição hormonal», ou seja, comparando o Linoladiol N unicamente com outros tratamentos tópicos. Por isso, o Estreva, que é utilizado como terapia de substituição hormonal e, por conseguinte, tem um modo de administração diferente, não pode ser objeto de uma comparação com o Linoladiol N.

192. Por conseguinte, na hipótese de o Tribunal de Justiça vir a declarar admissível a acusação em causa, penso que a mesma deveria ser rejeitada quanto ao mérito.

193. Proponho, pois, que a segunda parte do segundo fundamento seja julgada improcedente na sua totalidade.

3.      Quanto à terceira parte, relativa a uma apreciação incorreta dos riscos em virtude de não terem sido tomados em conta os dados relativos à farmacovigilância

a)      Síntese dos argumentos das partes

194. As recorrentes consideram que o Tribunal Geral, nas observações que desenvolveu nos n.os 170 a 172 do acórdão recorrido e na conclusão que expôs no n.o 176 do mesmo, ignorou que, de acordo com a filosofia do Código HUM, os dados relativos à farmacovigilância desempenham um papel fundamental na apreciação dos riscos reais que os medicamentos comercializados apresentam.

195. Quanto ao n.o 171 do acórdão recorrido, as recorrentes afirmam que é contraditório ver no diminuto número, senão mesmo na inexistência, de descrições relativas à segurança associada ao uso do Linoladiol N, uma prova da existência de um risco, como o fez o Tribunal Geral. Quanto às considerações constantes do n.o 172 do acórdão recorrido, relativas à falta de interesse pelas notificações espontâneas, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral não se pronunciou acerca do argumento apresentado pelas mesmas, segundo o qual não havia qualquer prova científica da existência de uma «subnotificação» relativa aos medicamentos mais antigos. A esse respeito, segundo as recorrentes, o Tribunal Geral não deu resposta ao argumento segundo o qual, uma vez que o Linoladiol N é um medicamento que só é vendido mediante receita passada por um ginecologista, que vigia a sua utilização de longa duração, é pouco crível que nenhum ginecologista tivesse notificado os riscos associados a essa utilização, se estes se tivessem efetivamente verificado. Por último, as recorrentes censuram ao Tribunal Geral não ter dado resposta ao argumento que apresentaram, segundo o qual, mesmo que fosse considerada uma taxa de subnotificação de 90%, em todo o caso, os riscos que supostamente resultam da utilização do Linoladiol N ter‑se‑iam verificado, se realmente existissem.

196. A Comissão responde que os argumentos das recorrentes não visavam contestar uma apreciação jurídica feita pelo Tribunal Geral, mas sim uma avaliação feita pelo CHMP.

197. Em especial, no que diz respeito à falta de resposta ao argumento segundo o qual o Linoladiol N é um medicamento que só é vendido mediante receita e cuja utilização de longa duração é controlada por um ginecologista, a Comissão alega que o mesmo não foi apoiado por um oferecimento de provas e que, em todo o caso, só foi invocado na audiência em primeira instância, sem qualquer justificação para esse atraso, o que constitui uma violação do artigo 85.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

b)      Apreciação

198. Na primeira acusação, as recorrentes afirmam que o Tribunal Geral não reconheceu o papel fundamental desempenhado pelos dados relativos à farmacovigilância na reavaliação da relação risco‑benefício dos medicamentos introduzidos no mercado, na medida em que não concluiu que o CHMP tinha deduzido a prova do risco associado ao uso do Linoladiol N do diminuto número, senão mesmo da inexistência, de descrições relativas a esse risco, o que é intrinsecamente contraditório. Em substância, as recorrentes censuram ao Tribunal Geral que, ao fazê‑lo, não tenha decidido que o erro do CHMP sobre este elemento tinha por efeito eliminar o nexo compreensível entre as constatações científicas e médicas e as conclusões do CHMP.

199. Em meu entender, o Tribunal Geral decidiu justamente que as críticas das recorrentes, reiteradas no presente recurso contra a apreciação feita pelo Tribunal Geral, se baseavam numa leitura incorreta do parecer do CHMP.

200. Com efeito, o CHMP, nas suas conclusões científicas, não considerou que o diminuto número de dados relativos à farmacovigilância disponíveis (onze casos, no total, de entre os quais um único relativo ao Linoladiol N) constituía a prova do risco associado ao uso do Linoladiol N, como as recorrentes sustentam. Pelo contrário, considerou que, na medida em que devia ser presumida uma «considerável subnotificação das reações adversas» relativamente a um produto médico antigo como o Linoladiol N, era impossível retirar conclusões dos dados relativos à farmacovigilância quanto à segurança do mesmo.

201. Como o Tribunal Geral explicou, nos n.os 174 a 176 do acórdão recorrido, face a esta situação de incerteza científica, o CHMP forneceu indícios sérios e concludentes que permitem que se duvide razoavelmente da inocuidade ou da eficácia do Linoladiol N, em conformidade com a jurisprudência em matéria de aplicação do princípio da precaução.

202. Portanto, como o Tribunal Geral justamente indicou, o CHMP não deduziu a prova do risco associado ao uso do Linoladiol N do diminuto número de descrições relativas a esse risco, mas sim das dúvidas que razoavelmente tinha exposto quanto à inocuidade e à eficácia do Linoladiol N.

203. Por isso, atendendo ao facto de o Tribunal Geral ter demonstrado, corretamente, a existência de um nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP quanto à verificação de riscos, considero que a acusação em causa deve ser rejeitada.

204. Quanto à falta de resposta, no n.o 172 de acórdão recorrido, ao argumento segundo o qual não existe qualquer prova científica de uma subnotificação relativamente aos medicamentos mais antigos, basta assinalar que essa avaliação está abrangida pelo amplo poder de apreciação de que a Comissão dispõe nesta matéria, em que é chamada a efetuar avaliações médicas ou científicas complexas e, por esse facto, apenas está sujeita a uma fiscalização marginal do Tribunal Geral (41). Por conseguinte, as recorrentes não podem censurar ao Tribunal Geral não se ter pronunciado sobre esse ponto.

205. À luz das considerações precedentes, na minha opinião, esta acusação deve ser também rejeitada.

206. Quanto à falta de resposta do Tribunal Geral ao argumento segundo o qual o facto de a utilização de longa duração do Linoladiol N ser vigiada por um ginecologista implica que este teria notificado os riscos acima referidos, se os mesmos se tivessem verificado, assinalo, antes de mais, que é sem razão que a Comissão sustenta que este argumento foi invocado pela primeira vez na audiência. Com efeito, resulta claramente dos articulados juntos aos autos do processo no Tribunal Geral que o mesmo já tinha sido apresentado no n.o 150 da petição (42).

207. No entanto, mesmo supondo que esse argumento, que não é apoiado por um oferecimento de provas, se baseia num facto verificado, recordo, uma vez mais, que, segundo a jurisprudência, o Tribunal Geral não é obrigado a fazer uma exposição que acompanhe exaustivamente todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio, desde que essa fundamentação implícita permita aos interessados conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os argumentos por eles apresentados e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização (43), o que, no caso em apreço, exige uma resposta afirmativa. Com efeito, o Tribunal Geral, no n.o 172 do acórdão recorrido, indica claramente que existia uma falta de interesse pelas notificações espontâneas, de modo que o seu diminuto número não permitia concluir pela segurança do Linoladiol N.

208. Em meu entender, as considerações acima referidas também são aplicáveis à última acusação desta parte, relativa a uma alegada falta de resposta do Tribunal Geral ao argumento segundo o qual, mesmo que fosse considerada, hipoteticamente, uma taxa de subnotificação de 90%, os riscos que supostamente resultam da utilização do Linoladiol ter‑se‑iam verificado, se realmente existissem.

209. A terceira parte do segundo fundamento deve, pois, ser julgada improcedente na sua totalidade.

4.      Quanto à quarta parte, relativa a uma apresentação incorreta dos dados relativos à farmacovigilância disponíveis e a uma inexatidão do conteúdo das normas orientadoras científicas, constantes do parecer definitivo do CHMP

a)      Síntese dos argumentos das partes

210. As recorrentes criticam a apresentação superficial, feita nas conclusões científicas do CHMP, dos dados da farmacovigilância relativos ao Linoladiol N. Com efeito, segundo as recorrentes, essas conclusões científicas podem dar a falsa impressão de que a utilização do Linoladiol N deu origem a onze casos de notificação relacionados com os riscos alegados pelo CHMP, quando, como o Tribunal Geral concluiu, se tratava de casos de reação na sequência de tratamentos com estradiol para utilização tópica.

211. Além disso, sustentam que o Tribunal Geral, no n.o 196 do acórdão recorrido, não respondeu ao argumento que apresentaram, segundo o qual a referência inexata feita pelo CHMP ao conteúdo das normas orientadoras científicas era suscetível de induzir a Comissão a pensar, erradamente, que a utilização de medicamentos com doses elevadas de estradiol não era recomendada pelas mesmas.

212. A Comissão considera que, dado que as recorrentes reconheceram expressamente que o Tribunal Geral tinha feito uma apresentação que corresponde à do CHMP, o argumento por elas apresentado é inadmissível.

b)      Apreciação

213. Quanto à acusação relativa à «apresentação superficial» dos dados da farmacovigilância relativos ao Linoladiol N, não tenho a menor dúvida de que esta acusação visa um mero apuramento dos factos efetuado pelo Tribunal Geral, que, como tal, escapa ao âmbito de competência do Tribunal de Justiça em sede de recurso de uma decisão do Tribunal Geral, salvo no caso de a inexatidão material das suas conclusões resultar dos autos que lhe foram submetidos, circunstância que, no entanto, no presente caso, não foi invocada pelas recorrentes (44).

214. Quanto à acusação relativa à referência inexata feita pelo CHMP ao conteúdo das normas orientadoras científicas, em meu entender, não pode ser confirmada a falta de fundamentação censurada pelas recorrentes ao Tribunal Geral. Com efeito, no n.o 197 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que as recorrentes não tinham demonstrado de que modo a referência inexata ao conteúdo das normas orientadoras científicas teria podido afetar a conclusão global deste último relativa à apreciação da relação risco‑benefício apresentada pelo Linoladiol N. Entendo que esta resposta do Tribunal Geral abrange igualmente a referência inexata a essas normas orientadoras que levaria a concluir que a utilização de medicamentos com doses elevadas de estradiol não era recomendada pelas mesmas.

215. Segundo entendo, esta resposta satisfaz as condições estabelecidas na jurisprudência, já referida por diversas vezes nas presentes conclusões, segundo a qual uma fundamentação pode ser implícita, desde que permita aos recorrentes conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os argumentos que apresentaram e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização.

216. Considero, por isso, que a quarta parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

5.      Conclusão quanto ao segundo fundamento de recurso

217. À luz das considerações precedentes, proponho que o segundo fundamento de recurso seja julgado improcedente, na sua totalidade.

C.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento

1.      Quanto à primeira parte, relativa a uma violação do princípio da proporcionalidade

a)      Síntese dos argumentos das partes

218. Segundo as recorrentes, o Tribunal Geral não examinou o argumento que apresentaram, segundo o qual a probabilidade extremamente reduzida de verificação de riscos deve ser tida em conta no âmbito da fiscalização da proporcionalidade. Em especial, consideram que, mesmo admitindo que o princípio da precaução exige a adoção de medidas de restrição da AIM, a escolha das medidas devia ser feita tendo obrigatoriamente em conta o facto de a apreciação dos riscos se basear apenas em hipóteses. Uma apreciação puramente hipotética, como a que está em causa no caso em apreço, só seria suscetível de justificar medidas pouco restritivas, como uma atualização das advertências e contraindicações do texto informativo ou a realização de um estudo sobre o risco de hiperplasia do endométrio, constante das conclusões do CHMP. As recorrentes afirmam que o Tribunal Geral, nos n.os 204 a 206 do acórdão recorrido, ignorou esse elemento.

219. Além disso, alegam que, o Tribunal Geral, ao concluir, no n.o 206 desse acórdão, que a exclusão da aplicação repetida representava a menos gravosa das intervenções possíveis admitidas pelo artigo 116.o, primeiro parágrafo, do Código HUM, não teve em mente que uma exclusão da utilização repetida produziria efeitos equivalentes aos de uma revogação parcial da autorização, dado que a atrofia vaginal é uma patologia que necessita de tratamento de longa duração.

220. Quanto às conclusões do Tribunal Geral que figuram no n.o 207 do acórdão recorrido, relativas à alegada impossibilidade de ordenar estudos suplementares, as recorrentes sustentam que as mesmas estão juridicamente erradas, como resulta, em especial, do artigo 32.o, n.os 4, alínea c), e 5, alínea c), do Código HUM, segundo o qual algumas autorizações podem ser concedidas sob certas condições consideradas essenciais para uma utilização segura e eficaz do medicamento em causa.

221. Segundo as recorrentes, o Tribunal Geral, no n.o 207 do acórdão recorrido, não explicou por que razão a periodicidade de cinco anos prevista para a elaboração dos relatórios sobre a inocuidade dos medicamentos que contêm estradiol não era suscetível de demonstrar a inocuidade do medicamento. Com efeito, a esse respeito, consideram que os relatórios de segurança teriam sido um meio adequado para dissipar as dúvidas decorrentes da falta de dados relativos à segurança do Linoladiol N.

222. Por último, segundo as recorrentes, o Tribunal Geral não examinou a proposta que as mesmas fizeram ao CHMP, de uma terapia em alternância, como medida menos restritiva.

223. A Comissão responde que as acusações das recorrentes dirigidas contra o n.o 207 do acórdão recorrido são inadmissíveis, dado que resultariam numa contestação da apreciação dos meios de prova feita pelo Tribunal Geral. Em todo o caso, são inoperantes, uma vez que visam um fundamento supérfluo desse acórdão.

224. A mesma acrescenta que, ademais, as recorrentes não censuram ao Tribunal Geral ter procedido a uma fiscalização juridicamente errada da proporcionalidade, mas sim ter adotado uma abordagem «formalista» que o teria levado a examinar incorretamente o parecer definitivo do CHMP. Ao fazê‑lo, as recorrentes põem em dúvida, de forma inadmissível, a apreciação da prova feita pelo Tribunal Geral.

b)      Apreciação

225. O princípio da proporcionalidade, que constitui um dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições da União não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário para a realização dos objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa. Assim, quando uma instituição deve escolher entre várias medidas adequadas, deve recorrer à menos restritiva e, quando essas medidas gerarem inconvenientes, deve cuidar que esses inconvenientes não sejam desproporcionados relativamente ao objetivo prosseguido (45).

226. No caso em apreço, o ato em causa é a decisão de execução da Comissão, na medida em que condiciona a renovação da AIM do Linoladiol N à limitação da duração da sua utilização a quatro semanas, com a correspondente exclusão da sua utilização repetida.

227. As recorrentes não põem em causa que a inclusão dessa condição na nova AIM do Linoladiol N seja adequada para a realização do objetivo prosseguido, a saber, a eliminação dos riscos para a saúde associados ao aumento do nível de estradiol no sangue resultante da utilização desse medicamento, mas alegam que esse mesmo objetivo poderia ter sido atingido através de uma medida menos restritiva.

228. Para verificar se o princípio da proporcionalidade foi efetivamente violado no presente caso, importa, em primeiro lugar, fazer uma síntese das passagens principais da fundamentação apresentada pelo Tribunal Geral para, nos n.os 204 a 207 do acórdão recorrido, ter julgado improcedente a parte relativa à proporcionalidade.

229. O Tribunal Geral, após ter reconhecido que o CHMP, atendendo às incertezas que rodeavam as consequências da administração do Linoladiol N, se tinha baseado no princípio da precaução, observou que uma mera alteração da AIM, como a do presente caso, é a menos gravosa das intervenções admitidas pelo artigo 116.o do Código HUM. Com efeito, segundo o Tribunal Geral, as outras intervenções previstas nessa disposição (suspensão ou revogação) teriam afetado de forma muito mais grave a situação jurídica das recorrentes e ultrapassado os limites do que devia ser considerado uma medida necessária à luz do parecer definitivo do CHMP. Em seguida, o Tribunal Geral considerou, a título acessório, que nem a ordem de realização de estudos suplementares, que não está abrangida nas medidas que podem ser adotadas no âmbito do procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM, nem os relatórios de segurança relativos aos medicamentos que contêm estradiol, em virtude da sua periodicidade (cinco anos), constituíam medidas adequadas para excluir os riscos associados ao uso do Linoladiol N.

230. Examinarei agora as acusações dirigidas contra essa fundamentação, formuladas pelas recorrentes no presente recurso.

231. A primeira diz respeito a uma alegada falta de tomada em consideração pelo Tribunal Geral do argumento das recorrentes segundo o qual o facto de a apreciação dos riscos feita pelo CHMP se basear na aplicação do princípio da precaução só seria suscetível de justificar medidas menos restritivas do que a alteração da AIM mediante a inclusão da condição acima referida. Ora, resulta claramente da fundamentação constante dos n.os 204 a 206 do acórdão recorrido que, ao contrário do que as recorrentes sustentam, o Tribunal Geral não deixou de dar resposta a esse ponto. Com efeito, é desse modo que deve ser interpretado o facto de o Tribunal Geral, após ter recordado que o CHMP aplicou o princípio da precaução, ter tido a preocupação de declarar que a alteração da AIM é a medida menos restritiva de entre aquelas que são admitidas pelo artigo 116.o do Código HUM.

232. Por conseguinte, a acusação em causa deve ser rejeitada.

233. A segunda acusação visa precisamente a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual a alteração da AIM é a medida menos restritiva de entre aquelas que são admitidas pelo artigo 116.o do Código HUM e, em substância, censura ao Tribunal Geral a insuficiência dessa conclusão para ter julgado improcedente a parte relativa a uma violação do princípio da proporcionalidade, uma vez que o mesmo também deveria ter considerado, em substância, que a exclusão de uma utilização repetida que essa alteração implicava equivaleria a uma revogação parcial da AIM, tendo em conta que a atrofia vaginal, ao tratamento da qual o Linoladiol N se destina, necessita de tratamento de longa duração.

234. Caso a exclusão da utilização repetida tivesse como efeito privar o Linoladiol N de qualquer utilidade relativamente às necessidades das pacientes, como as recorrentes afirmam, em meu entender, isso teria um impacto sobre o exame da proporcionalidade da condição que acompanhou a renovação da AIM do Linoladiol N.

235. Ora, não é sem surpresa que devo apontar que esta acusação, que indubitavelmente constitui o cerne da presente parte, não foi abordada, de modo algum, pelo Tribunal Geral.

236. Em consequência, considero que o acórdão recorrido está ferido de uma insuficiência de fundamentação. Por conseguinte, esta acusação deve ser acolhida.

237. Para o caso de o Tribunal de Justiça não vir a partilhar desta conclusão, dedicarei os próximos números à análise das outras acusações desta parte do terceiro fundamento de recurso, relativas às medidas menos restritivas que a Comissão poderia ter adotado para atingir o objetivo de eliminar os riscos para a saúde associados ao uso do Linoladiol N.

238. No que diz respeito à alegada impossibilidade de ordenar a realização de estudos suplementares sobre os riscos de hiperplasia do endométrio e à falta de explicações, no n.o 207 de acórdão recorrido, acerca da razão pela qual a periodicidade de cinco anos prevista para a elaboração dos relatórios sobre a inocuidade do estradiol não seria suscetível de demonstrar a inocuidade do Linoladiol N, basta observar, como a Comissão na sua resposta, que, em ambos os casos, se trata de uma acusação dirigida contra um fundamento supérfluo do acórdão recorrido, como o demonstra, logo na introdução do número em causa, a expressão «[em] todo o caso» (46). Não sendo suscetível de implicar a anulação desse acórdão, a mesma é inoperante.

239. Quanto à falta de exame da proposta, feita pelas recorrentes ao CHMP, de uma terapia alternada, como medida menos restritiva, considero que, se admitirmos que o Tribunal Geral, com as observações constantes dos n.o 203 a 206 do acórdão recorrido, já procedeu a uma correta apreciação do respeito do princípio da proporcionalidade, caberia concluir, em conformidade com a jurisprudência já referida por diversas vezes nas presentes conclusões, que o Tribunal Geral cumpriu o seu dever de fundamentação, dado que esta pode ser implícita, desde que permita aos recorrentes conhecerem os fundamentos em que o Tribunal Geral se baseia e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização. Por conseguinte, esta última acusação deve ser rejeitada.

240. Em conclusão, na minha opinião, a primeira parte do terceiro fundamento deve ser acolhida, em virtude de uma insuficiência da fundamentação apresentada pelo Tribunal Geral.

2.      Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do princípio da igualdade de tratamento

a)      Síntese dos argumentos das partes

241. As recorrentes consideram que o Tribunal Geral, na síntese que fez da argumentação daquelas, ignorou a acusação que formularam, segundo a qual o princípio da igualdade de tratamento tinha sido violado, pelo facto de a medida impugnada, de proibição de utilização repetida, colocar o Linoladiol N no mesmo plano que medicamentos que apresentam um risco comprovado de perigo grave para a saúde, ou mesmo, de morte.

242. Além disso, do ponto de vista das recorrentes, existe uma violação do princípio da igualdade de tratamento, na medida em que o Tribunal Geral não incluiu na avaliação de risco dois outros medicamentos para o tratamento da atrofia vaginal que contêm estradiol, a saber, o Estring 2 mg e o Vagifem 25 mg.

243. As recorrentes reiteram igualmente o argumento segundo o qual o nível de estradiol do Linoladiol N deve ser comparado, não apenas com medicamentos com uma dosagem inferior de estradiol para utilização tópica, mas também com as terapias de substituição hormonal. O resultado dessa abordagem, que não foi adotada pelo CHMP, seria o de que, tendo em conta o nível de estradiol no sangue, o Linoladiol N deve ser colocado no mesmo plano que os primeiros, e não no das terapias de substituição hormonal.

244. Por último, as recorrentes alegam igualmente que, como foi indicado pelo próprio Tribunal Geral no n.o 151 do acórdão recorrido, uma vez que o CHMP observou que o facto de alcançar um nível de estradiol no sangue superior aos valores de base pós‑menopáusicos era um critério determinante para concluir que o Linoladiol N apresentava um risco elevado, a conclusão do n.o 213 do acórdão recorrido, segundo a qual as recorrentes não demonstraram, no que diz respeito ao critério determinante, que o Linoladiol N não é comparável aos outros medicamentos para utilização tópica, é incompreensível.

245. A Comissão assinala o seu desacordo quanto ao argumento das recorrentes segundo o qual a rejeição do elemento de prova no n.o 212 do acórdão recorrido (o aumento do nível de estradiol no sangue acima dos valores de base pós‑menopáusicos), que conduziu o Tribunal Geral à conclusão constante do n.o 213 do acórdão recorrido, está em contradição com o n.o 151 desse acórdão. Na opinião daquela instituição, o referido n.o 151 resume simplesmente as observações do parecer definitivo do CHMP, ao passo que o n.o 212 do acórdão recorrido diz respeito às conclusões retiradas no mesmo. Em todo o caso, uma vez que a resposta à questão de saber se, e em que medida, o Linoladiol N era ou não comparável com outros medicamentos que contêm estradiol se encontrava no parecer definitivo do CHMP, o argumento das recorrentes equivale a contestar o apuramento dos factos feito pelo Tribunal Geral e, portanto, é inadmissível.

b)      Apreciação

246. Quanto à alegada violação do princípio da igualdade de tratamento, deve recordar‑se que, nos n.os 211 a 213 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu que os medicamentos de aplicação tópica que tinham servido de comparação nos estudos científicos estavam numa situação que apresentava algumas características diferentes em relação à do Linoladiol N, em virtude do facto de este levar a uma concentração de estradiol no organismo mais elevada do que os outros medicamentos tomados em consideração pelo CHMP. Esta diferença de situação, que as recorrentes não conseguiram refutar, justificava um tratamento diferente.

247. Segundo jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a não ser que tal tratamento seja objetivamente justificado (47).

248. A primeira das acusações das recorrentes diz respeito ao facto de o CHMP, ao impor uma proibição de utilização repetida como condição associada à renovação da AIM do Linoladiol N, ter tratado duas situações diferentes de maneira igual. Com efeito, a situação do Linoladiol N difere da dos medicamentos cuja utilização está sujeita à mesma condição, a saber, os que apresentam um risco especialmente grave para a saúde ou risco de morte. A segunda acusação diz respeito ao facto de o CHMP, ao não ter incluído na comparação com o Linoladiol N outros dois medicamentos com uma dosagem inferior de estradiol para utilização tópica (o Estring 2 mg e o Vagifem 25 mg), ter tratado duas situações comparáveis de maneira diferente. Os dois argumentos foram ignorados em primeira instância pelo Tribunal Geral.

249. Com estas acusações, o Tribunal de Justiça é chamado a responder à questão de saber se, e em que medida, o Linoladiol N é comparável com outros medicamentos que contêm estradiol e que não foram tomados em consideração pelo CHMP no âmbito do procedimento de avaliação do risco. A este respeito, à semelhança da Comissão na sua resposta, entendo que essas determinações, de natureza científica, devem considerar‑se abrangidas pela margem de apreciação de que a Comissão dispõe quando é chamada a efetuar avaliações complexas e, por conseguinte, constituem conclusões de facto, que, regra geral, não podem ser objeto de exame pelo Tribunal de Justiça na fase de recurso de decisão do Tribunal Geral. Por isso, em meu entender, as acusações são ambas inadmissíveis.

250. Na minha opinião, devem ser aplicadas considerações idênticas à acusação das recorrentes segundo a qual, tendo em conta o nível de estradiol no sangue, o Linoladiol N deve ser colocado no mesmo plano que as terapias de substituição hormonal.

251. A última acusação põe em causa a conclusão do n.o 213 do acórdão recorrido, segundo a qual as recorrentes não conseguiram demonstrar que os outros medicamentos de aplicação tópica que tinham sido comparados com o Linoladiol N no âmbito do procedimento de avaliação do risco estavam, no que diz respeito ao elemento que conduziu à adoção da medida de limitação da sua utilização, na mesma situação que este. Com efeito, essa conclusão está em contradição com a circunstância de, como recorda o próprio Tribunal Geral, o CHMP ter considerado que o elemento que conduziu à adoção da medida de limitação da utilização do Linoladiol N ser o aumento do nível de estradiol no sangue acima dos valores de base pósmenopáusicos.

252. A razão dessa contradição não é explicitada pelas recorrentes. Contudo, penso que as mesmas fazem referência a uma das acusações constantes da segunda parte do segundo fundamento, na qual as recorrentes sustentam que o CHMP adotou limiares relativos aos valores de base pós‑menopáusicos inferiores aos estabelecidos na literatura científica. Segundo as recorrentes, sem esse erro, o nível de estradiol no sangue resultante da utilização do Linoladiol N não teria superado esses valores e, portanto, teria estado na mesma situação que os referidos medicamentos para utilização tópica.

253. Em meu entender, esta acusação, embora seja admissível, uma vez que vem contestar a apreciação feita pelo Tribunal Geral quanto ao nexo compreensível entre as constatações médicas ou científicas e as conclusões do CHMP, é improcedente, na medida em que as recorrentes não demonstraram, de forma suficiente, como resulta das considerações que desenvolvi nos n.os 173 a 179 das presentes conclusões, que o valor de base pós‑menopáusico era um elemento tão fundamental que um erro quanto ao mesmo era suscetível de eliminar o referido nexo compreensível. Por conseguinte, a acusação em apreço não pode ser acolhida.

254. À luz das considerações acima expostas, a segunda parte do terceiro fundamento deve ser julgada improcedente.

3.      Conclusão quanto ao terceiro fundamento de recurso

255. Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que a primeira parte do terceiro fundamento de recurso seja acolhida e que a segunda parte do mesmo seja julgada improcedente.

VI.    Quanto ao recurso interposto no Tribunal Geral

256. Por força do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça anular a decisão do Tribunal Geral, o mesmo pode decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento.

257. No presente caso, considero que o Tribunal de Justiça está em condições de decidir quanto à primeira e terceira partes do primeiro fundamento invocado pelas recorrentes perante o Tribunal Geral.

258. No que diz respeito à primeira parte, como resulta das considerações desenvolvidas nos n.os 49 a 65 das presentes conclusões, existiu uma violação do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM, na medida em que a Comissão admitiu o recurso do BfArM ao CHMP, apesar de este ter tido lugar depois da adoção, por aquela autoridade, da decisão administrativa inicial.

259. Nestas condições, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser acolhida.

260. Quanto à terceira parte, como resulta dos n.os 78 a 100 das presentes conclusões, existiu uma violação do princípio da imparcialidade consagrado no artigo 41.o da Carta, decorrente da nomeação de M. Weise como relator principal do CHMP no âmbito do procedimento relativo ao pedido de renovação da AIM do Linoladiol N.

261. Nestas condições, a terceira parte do primeiro fundamento também deve ser acolhida.

262. Por conseguinte, em meu entender, a decisão de execução deve ser anulada.

263. Para todos os efeitos úteis, para o caso de o Tribunal de Justiça vir a considerar que as duas partes acima referidas devem ser julgadas improcedentes, faço notar que o Tribunal Geral apenas examinou parcialmente a primeira parte do terceiro fundamento.

264. Não estando o litígio em condições de ser julgado no que diz respeito a essa parte, considero oportuno remeter o presente processo ao Tribunal Geral, para que o mesmo proceda às apreciações de natureza factual que se mostrem necessárias para a decisão quanto à questão de saber se a alteração da AIM do Linoladiol N, imposta no parecer definitivo do CHMP, na medida em que implicava uma exclusão da utilização repetida desse medicamento, era equivalente a uma revogação parcial do Linoladiol N, de modo que se deva considerar que existiu uma violação do princípio da proporcionalidade.

265. Nestas condições, caberá igualmente reservar para final a decisão quanto às despesas.

VII. Quanto às despesas

266. Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

267. Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de uma decisão do Tribunal Geral, por força do artigo 184.o, n.o 1, desse mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes requerido nesse sentido, cabe condenar a Comissão nas despesas do processo no Tribunal Geral e nas do presente recurso.

VIII. Conclusão

268. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça decida do seguinte modo:

1)      O Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 20 de outubro de 2016, August Wolff e Remedia/Comissão (T‑672/14, não publicado, EU:T:2016:623), é anulado.

2)      A Decisão de Execução C(2014) 6030 final da Comissão, de 19 de agosto de 2014, relativa às autorizações de introdução no mercado de medicamentos para uso humano de aplicação tópica que contêm concentrações elevadas de estradiol, ao abrigo do artigo 31.o da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, é anulada.

3)      A Comissão Europeia é condenada nas despesas dos processos nas duas instâncias.


1      Língua original: francês.


2      JO 2001, L 311, p. 67.


3      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos (JO 2004, L 136, p. 1).


4      O facto, invocado pelas recorrentes, de resultar dos quadros factuais que deram origem aos Acórdãos de 7 de março de 2013, Acino/Comissão (T‑539/10, não publicado, EU:T:2013:110), e de 11 de dezembro de 2014, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (T‑189/13, não publicado, EU:T:2014:1056), proferidos pelo Tribunal Geral no passado, que, em todos os casos, tinha sido com fundamento em dados novos da farmacovigilância que a questão tinha sido submetida ao CHMP nos termos do artigo 31.o, n.o 1, do Código HUM não pode seguramente, por si só, levar à refutação dessa interpretação.


5      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que altera a Diretiva 2001/83/CE, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2004, L 136, p. 34).


6      De resto, faço notar que, no texto do capítulo IV do Código HUM, o termo «decisão» se refere, sem qualquer exceção, à decisão tomada pelas autoridades administrativas nacionais competentes em resposta ao processo apresentado pelo requerente para o efeito.


7      N.o 33 do recurso.


8      O artigo 41.o da Carta tem a seguinte redação: «Todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável». V., também, o Código Europeu de Boa Conduta Administrativa, publicado pelo Provedor de Justiça Europeu, disponível no endereço Internet https://www.ombudsman.europa.eu/fr/resources/code.faces#/page/1, em especial os artigos 8.o («O funcionário deve ser imparcial e independente. O funcionário deve abster‑se de qualquer ação arbitrária que prejudique membros do público, bem como de qualquer tratamento preferencial, quaisquer que sejam os motivos») e 11.o («O funcionário deve atuar de forma imparcial, equitativa e razoável»).


9      Com efeito, antes da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o direito a um processo equitativo tal como decorre, nomeadamente, do artigo 6.o, n.o 1, da CEDH podia ser objeto de interpretação pelo Tribunal de Justiça pela sua natureza de direito fundamental que a União Europeia respeitava enquanto princípio geral, por força do artigo 6.o, n.o 2, TUE. V., nesse sentido, Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 44).


10      V. Acórdãos de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o. (C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 54), e, de 19 de fevereiro de 2009, Gorostiaga Atxalandabaso/Parlamento (C‑308/07 P, EU:C:2009:103, n.o 46), que fazem referência à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem nos acórdãos Fey c. Áustria de 24 de fevereiro de 1993, série A, n.o 255‑A, p. 12, § 28, Findlay c. Reino Unido de 25 de fevereiro de 1997, Coletânea dos acórdãos e decisões 1997‑I, p. 281, § 73, e Forum Maritime SA c. Roménia de 4 de outubro de 2007, nos 63610/00 e 38692/05, ainda não publicado na Coletânea dos acórdãos e decisões.


11      V. a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem referida nas conclusões apresentadas pelo advogado‑geral Y. Bot no processo Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão (C‑385/07 P, EU:C:2009:210, n.o 326).


12      TEDH de 24 de maio de 1989, Hauschildt c. Dinamarca, série A, n.o 154, § 48. V., igualmente, acórdão do TEDH de 18 de outubro de 2000, Morel c. França, § 42. Este critério parece‑me, em geral, mais difícil de preencher em relação à «suspeita razoável de que os factos não são examinados de forma neutra e objetiva» avançada pelas recorrentes.


13      V., nomeadamente, acórdãos do TEDH de 26 de outubro de 2007, Hirschhorn c. Roménia, § 73, e de 26 de outubro de 2010, Cardona Serrat c. Espanha, § 31.


14      N.o 50 do acórdão.


15      Nesse caso, não foi contestado que três dos catorze agentes que participaram nas visitas efetuadas em Espanha pelo Eurostat, antes da adoção da decisão de abertura do inquérito, tinham igualmente feito parte da equipa de quatro pessoas que posteriormente foi mobilizada pela Comissão no âmbito do processo de inquérito.


16      Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Espanha/Conselho (C‑521/15, EU:C:2017:982, n.os 96 a 98).


17      Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Espanha/Conselho (C‑521/15, EU:C:2017:982, n.os 99 a 100).


18      Trata‑se do Regulamento (UE) n.o 1173/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, relativo ao exercício eficaz da supervisão orçamental na área do euro (JO 2011 L 306, p. 1).


19      Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Espanha/Conselho (C‑521/15, EU:C:2017:982, n.os 102 a 103).


20      Em meu entender, pouco importa que a outra entidade na qual o membro em causa tem assento seja outra instituição, órgão ou organismo da União, outro comité do mesmo organismo da União, ou a autoridade nacional competente, como no caso em apreço.


21      Acórdão de 20 de dezembro de 2017 (Espanha/Conselho, C‑521/15, EU:C:2017:982, n.o 104).


22      Em meu entender, desde que os procedimentos em causa tenham o mesmo objeto, o facto de os quadros jurídicos pelo qual são abrangidos serem nacionais, como no caso do BfArM, ou de direito da União, como no caso do CHMP, não invalida esta conclusão.


23      À luz da minha interpretação deste terceiro critério, conforme exposta no n.o 93 das presentes conclusões, considero que, para que possa ser declarada uma violação da imparcialidade objetiva, não é necessário que seja demonstrado que o procedimento no CHMP teria tido um resultado diferente se M. Weise não tivesse sido chamada a participar no mesmo como relator principal. Pelo contrário, basta que, precisamente em virtude da considerável influência sobre o desenrolar do procedimento exercida por M. Weise, esse resultado diferente não possa ser excluído, como, aliás, foi defendido pelas recorrentes.


24      N.os 111 e 112 do acórdão recorrido.


25      Essas acusações ostentavam os seguintes títulos, respetivamente: «A primeira recorrente não foi ouvida acerca da alteração da decisão do CHMP, adotada depois da segunda audição de 18 de novembro de 2013, no sentido de adaptar os textos informativos à versão utilizada na Croácia» e «Prazo excessivamente curto para apresentação de observações acerca da quinta lista de questões e recusa de uma terceira audição da primeira recorrente pelo CHMP».


26      V., em especial, Acórdãos de 22 de outubro de 2014, British Telecommunications/Comissão (C‑620/13 P, não publicado, EU:C:2014:2309, n.o 56); de 10 de dezembro de 2015, Kyocera Mita Europe/Comissão (C‑553/14 P, não publicado, EU:C:2015:805, n.o 78); de 8 de março de 2016, Grécia/Comissão (C‑431/14 P, EU:C:2016:145, n.o 38); e de 28 de junho de 2017, Novartis Europharm/Comissão (C‑629/15 P e C‑630/15 P, EU:C:2017:498, n.o 86).


27      As críticas das recorrentes incidem no facto de o CHMP não as ter ouvido acerca da alteração da sua decisão, adotada depois da audição de 18 de novembro de 2013, no sentido de adaptar os textos informativos à versão utilizada na Croácia. V. nota 25 das presentes conclusões.


28      V. n.o 107 das presentes conclusões.


29      V. Acórdão de 14 de setembro de 2017, LG Electronics e Koninklijke Philips Electronics/Comissão (C‑588/15 P e C‑622/15 P, EU:C:2017:679 e jurisprudência referida).


30      V., em especial, Acórdãos de 26 de outubro de 2017, Global Steel Wire e o./Comissão (C‑454/16 P a C‑456/16 P e C‑458/16 P, não publicado, EU:C:2017:818, n.o 66), e, de 12 de dezembro de 2012, 1. garantovaná/Comissão (T‑392/09, não publicado, EU:T:2012:674, n.o 74).


31      Aliás, não foi contestado que, no decurso do procedimento, as recorrentes puderam efetivamente tomar posição acerca dessa conclusão científica, em especial, nas «Conclusões científicas» e no parecer provisório do CHMP.


32      Considero que o caráter decisório da condição em causa foi implicitamente admitido pelas recorrentes no presente recurso, no qual afirmam que a exclusão da utilização repetida do Linoladiol N prevista nessa condição equivale a uma revogação parcial da própria AIM, que viola o princípio da proporcionalidade. Assim, o impacto que as mesmas reconhecem à referida condição é o impacto típico de uma componente de um ato com alcance normativo ou decisório.


33      N.o 45 do presente recurso.


34      N.o 140 do acórdão recorrido, que faz referência ao Acórdão de 11 de dezembro de 2014, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (T‑189/13, não publicado, EU:T:2014:1056, n.o 37).


35      Acórdão de 16 de junho de 2016, SKW Stahl‑Metallurgie e SKW Stahl‑Metallurgie Holding/Comissão (C‑154/14 P, EU:C:2016:445, n.o 37 e jurisprudência referida).


36      Acórdão de 11 de dezembro de 2014, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (T‑189/13, não publicado, EU:T:2014:1056, n.o 43).


37      Regulamento (CE) n.o 258/97 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de janeiro de 1997, relativo a novos alimentos e ingredientes alimentares (JO 1997, L 43, p. 1).


38      Acórdãos de 26 de novembro de 2002, Artegodan e o./Comissão (T‑74/00, T‑76/00, T‑83/00 a T‑85/00, T‑132/00, T‑137/00 e T‑141/00, EU:T:2002:283, n.o 200); de 7 de março de 2013, Acino/Comissão (T‑539/10, não publicado, EU:T:2013:110, n.o 93); e de 11 de dezembro de 2014, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (T‑189/13, não publicado, EU:T:2014:1056, n.o 52).


39      V., no domínio científico, Acórdão de 21 de janeiro de 1999, Upjohn (C‑120/97, EU:C:1999:14, n.o 34).


40      Como resulta do processo, a importância da identificação dos valores de base pós‑menopáusicos normais decorre do facto de, quando é considerado o nível plasmático de estradiol que pode ser observado após a utilização ou absorção da substância ativa no sangue, ser fundamental compará‑lo com esses valores.


41      V. nota 40 das presentes conclusões.


42      Esse número tem a seguinte redação: «[…] por último, deve igualmente ter‑se em conta o facto de o Linoladiol N ser um medicamento que só é vendido mediante receita e, em especial, que a utilização de longa duração deste medicamento pela paciente é permanentemente vigiada pelo ginecologista que o receitou. Por conseguinte, pode‑se partir do princípio que, durante os 45 anos de presença do Linoladiol N no mercado, os ginecologistas que o receitaram teriam, pelo menos uma vez, feito um relatório dirigido às autoridades competentes sobre os hipotéticos riscos graves resultantes da utilização desse medicamento, se estes se tivessem efetivamente verificado».


43      V. n.os 116 e 183 das presentes conclusões.


44      V. Acórdãos de 3 de dezembro de 2015, PP Nature‑Balance Lizenz/Comissão (C‑82/15 P, não publicado, EU:C:2015:796, n.o 27), e, de 10 de abril de 2014, Acino/Comissão (C‑269/13 P, EU:C:2014:255, n.o 34).


45      Acórdão de 21 de julho de 2011, Etimine (C‑15/10, EU:C:2011:504, n.o 124 e jurisprudência referida).


46      Em todo o caso, não posso deixar de pôr em dúvida a afirmação feita pelo Tribunal Geral, no n.o 207 do acórdão recorrido, segundo a qual a ordem de realização de estudos suplementares não estava abrangida pelo âmbito das medidas que podem ser adotadas no quadro do procedimento nos termos do artigo 31.o do Código HUM. Com efeito, como as recorrentes, no seu recurso, fazem notar, resulta do artigo 32.o, n.o 4, alínea c), do Código HUM que a EMA pode só conceder uma AIM se for sob certas condições que possam ser consideradas «essenciais para uma utilização segura e eficaz do medicamento». Esta formulação afigura‑se‑me tão ampla que pode incluir igualmente uma ordem de realização de estudos suplementares acerca da inocuidade do medicamento em causa. Além disso, esta interpretação é confirmada pela leitura do artigo 21.oA, primeiro parágrafo, alínea b), do Código HUM, que prevê expressamente entre as condições que podem acompanhar uma AIM a «[r]ealização de estudos de segurança após autorização».


47      V., ex multis, Acórdão de 7 de julho de 2009, S.P.C.M. e o. (C‑558/07, EU:C:2009:430, n.o 74 e jurisprudência referida).