Language of document : ECLI:EU:C:2019:755

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GIOVANNI PITRUZZELLA

apresentadas em 18 de setembro de 2019 (1)

Processo C622/18

AR

contra

Cooper International Spirits LLC,

St Dalfour SAS,

Établissements Gabriel Boudier SA

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação, França)]

«Reenvio prejudicial — Aproximação das legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas — Extinção de uma marca por falta de utilização séria — Direito de o titular da marca se opor ao uso, por um terceiro, de um sinal idêntico ou semelhante no período anterior à data da extinção»






1.        O proprietário de uma marca, que nunca a explorou e que tenha sido declarados privados dos seus direitos sobre a marca por falta de utilização sério no termo do prazo de cinco anos após a publicação do registo, pode intentar uma ação de contrafação e pedir uma indemnização pelo dano que tenha sofrido como resultado da utilização por um terceiro, anteriormente à data em que a extinção produziu efeitos, de um sinal semelhante para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes, suscetível de se confundir com sua marca?

2.        Esta é, no essencial, a questão colocada pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação, França) no pedido de decisão prejudicial objeto das presentes conclusões, que diz respeito à interpretação dos artigos 5.o, n.o 1, alínea b), 10.o e 12.o, da Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (2).

3.        Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio entre AR e as sociedades Cooper International Spirits LLC (a seguir «Cooper International»), Établissements Gabriel Boudier SA (a seguir «Établissements Boudier») e St Dalfour SAS (a seguir «Dalfour») a respeito de alegados atos de contrafação da marca registada francesa «SAINT GERMAIN» cometidos anteriormente à caducidade desta última.

I.      Quadro jurídico

A.      Direito da União

4.        O artigo 5.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Diretiva 2008/95 enuncia:

«1.      A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

a)      De qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

b)      De um sinal relativamente ao qual, devido à sua identidade ou semelhança com a marca e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam, exista um risco de confusão, no espírito do público; o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca.»

5.        O artigo 10.o da Diretiva 2008/95, intitulado «Uso da marca», prevê, no seu n.o 1, o que segue:

«1.      Se, num prazo de cinco anos a contar da data do encerramento do processo de registo, a marca não tiver sido objeto de uso sério pelo seu titular, no Estado‑Membro em questão, para os produtos ou serviços para que foi registada, ou se tal uso tiver sido suspenso durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca fica sujeita às sanções previstas na presente diretiva, salvo justo motivo para a falta de uso.»

6.        Sob o título «Causas de extinção», o artigo 12.o da Diretiva 2008/95, dispõe, no seu n.o 1:

«1.      O titular de uma marca pode ver extintos os seus direitos se, durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca não tiver sido objeto de uma utilização séria no Estado‑Membro em causa para os produtos ou serviços para que foi registada e se não existirem motivos justos para a sua não utilização.»

B.      Direito francês

7.        O artigo R. 712‑23 do code de la propriété intellectuelle (Código da Propriedade Intelectual) precisa que «[a] data em que uma marca é considerada registada, nomeadamente para efeitos da aplicação dos artigos L‑712‑4 e L‑712‑5, é: 1.o para as marcas francesas, a do Boletim Oficial da Propriedade Industrial, em que o registo é publicado».

8.        Nos termos do artigo L. 713‑1 do Código da Propriedade Intelectual, «[o] registo da marca confere ao seu titular o direito de propriedade sobre essa marca para os produtos e serviços que tenha designado».

9.        O artigo L. 713‑2 desse código, que proíbe os atos designados, no direito das marcas francês, como atos de «contrafação por reprodução», dispõe:

«São proibidos, salvo autorização do proprietário:

a)      a reprodução, o uso ou a aposição de uma marca, mesmo com o aditamento de termos como: “fórmula, maneira, sistema, imitação, género, método”, bem como o uso de uma marca reproduzida, para produtos ou serviços idênticos aos designados no registo; […]»

10.      O artigo L 713‑3, alínea b), do mesmo código, que visa, por sua vez, os atos que abrangidos pela categoria de «contrafação por imitação», dispõe que «[s]ão proibidos, salvo autorização do proprietário, quando possam causar um risco de confusão no espírito do público: […] [a] imitação de uma marca e o uso de uma marca imitada para produtos ou serviços idênticos ou similares aos designados no registo».

11.      O artigo L 714‑5, primeiro parágrafo, do Código da Propriedade Intelectual dispõe:

«Incorre na extinção dos seus direitos o proprietário da marca que, sem justo motivo, não faz dela uma utilização séria para os produtos e serviços visados no registo, durante um período ininterrupto de cinco anos.»

12.      O último parágrafo deste artigo prevê que «[a] extinção produz efeito na data do termo do prazo de cinco anos previsto no primeiro parágrafo do presente artigo. A extinção tem um efeito absoluto».

II.    Litígio no processo principal, questão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

13.      AR, recorrente no processo principal, era titular da marca semi‑figurativa francesa «SAINT GERMAIN», cujo registo foi pedido em 5 de dezembro de 2005 e publicado em 12 de maio de 2006, para designar, nomeadamente, os produtos «bebidas alcoólicas (à exceção de cervejas), sidras, digestivos, vinhos e bebidas espirituosas, extratos ou essências alcoólicas» (a seguir «produtos em causa no processo principal»).

14.      Ao saber que a Cooper International, estabelecida nos Estados Unidos, distribuía um licor de sabugueiro sob a denominação «St‑Germain», fabricado pela Dalfour e um subcontratado desta última, a Établissements Boudier, AR instaurou, em 8 de junho de 2012, contra estas três sociedades (a seguir, conjuntamente, «demandadas no processo principal»), no tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris, França), uma ação de contrafação de marca por reprodução ou, subsidiariamente, por imitação.

15.      Num processo paralelo, instaurado pela sociedade de direito americano Osez vous? International Spirits, LLC (3), o tribunal de grande instance de Nanterre (Tribunal de Primeira Instância de Nanterre, França) declarou, em sentença de 28 de fevereiro de 2013, a extinção dos direitos de AR sobre a marca francesa «SAINT GERMAIN» relativamente aos produtos em causa no processo principal, a partir de 13 de maio de 2011, a saber, no termo do prazo de cinco anos contados a partir da data de publicação do registo da marca, por considerar que AR não havia demonstrado uma utilização séria dessa marca desde o seu pedido de registo. Esta sentença foi confirmada por Acórdão da cour d’appel de Versailles (Tribunal de Recurso de Versalhes, França), de 11 de fevereiro de 2014, que, não tendo sido objeto de recurso, transitou em julgado.

16.      No tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris), AR manteve os seus pedidos por contrafação relativamente ao período não coberto pela prescrição e anterior à caducidade, ou seja, entre 8 de junho de 2009 e 13 de maio de 2011.

17.      Por sentença de 16 de janeiro de 2015, aquele tribunal, depois de considerar que não tinha havido nenhuma exploração da marca em causa desde o pedido de registo, indeferiu integralmente os pedidos de AR (a seguir «sentença do Tribunal de Primeira Instância de Paris»).

18.      A cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris, França) confirmou essa sentença, por acórdão de 13 de setembro de 2016 (a seguir «acórdão do Tribunal de Recurso de Paris»). Após ter considerado, à luz das dissemelhanças entre os sinais em conflito, que a contrafação alegada por AR só poderia ser apreendida à luz do artigo L. 713‑3 do Código da Propriedade Intelectual, a saber, enquanto ato de contrafação por imitação, a cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) considerou que a apreciação do risco de confusão no espírito do público pressupõe que a marca invocada haja sido objeto de uma exploração que a coloque em contacto com os consumidores. A este respeito, começou por recordar que o tribunal de grande instance de Nanterre (Tribunal de Primeira Instância de Nanterre), corroborado pela cour d’appel de Versailles (Tribunal de Recurso de Versalhes), tinha declarado a extinção parcial dos direitos de AR sobre a marca em causa no processo principal por falta de utilização séria. Em seguida, depois de ter analisado os documentos trazidos à discussão por AR, constatou que este não logrou demonstrar que a sua marca tinha sido efetivamente explorada. Concluiu, por conseguinte, que AR não podia arguir utilmente nem uma violação da função de garantia da origem dessa marca, que não tinha sido posta em contacto com o público (4), nem uma violação do monopólio da exploração conferido pela marca (5).

19.      Em 21 de dezembro de 2016, AR interpôs recurso de cassação contra o acórdão da cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris). Como fundamento do seu recurso, alega uma violação dos artigos L. 713‑3 e L. 714‑5 do Código de Propriedade Intelectual. Acusa a cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) de ter julgado improcedentes as suas ações de contrafação quando, durante o período de cinco anos após o registo da sua marca, tinha o direito de proibir terceiros de fazerem uso, na vida comercial, de um sinal idêntico ou semelhante suscetível de afetar as funções da referida marca, sem ter de demonstrar uma utilização séria da mesma e, consequentemente, sem demonstrar que foi efetivamente explorada. AR alega que, na medida em que é o registo que determina o objeto do direito exclusivo sobre a marca, o risco de confusão, na aceção do artigo L. 713‑3 do Código da Propriedade Intelectual, deve ser apreciado de forma abstrata, por referência ao objeto do registo da marca invocada, eventualmente não explorada, e não em relação a uma situação concreta no mercado, e que, assim, pode existir um risco de confusão, e, por conseguinte, a contrafação ser caracterizada, na presença de uma marca não explorada e, portanto, desconhecida dos consumidores. Além disso, alega que não é necessário que a marca protegida seja efetivamente explorada para se verificar se a mesma cumpre as suas funções, bastando que o sinal controvertido afete as funções «potenciais» da marca, e que a contrafação sempre foi apreciada por referência à utilização do sinal contrafeito, e não à utilização do sinal registado.

20.      Por seu turno, as demandadas no processo principal alegam que a utilização de um sinal só é suscetível de afetar o direito exclusivo do titular da marca se colocar em risco uma das suas funções, que uma marca só exerce a sua função essencial se for efetivamente utilizada pelo seu titular para indicar a origem comercial dos produtos ou serviços designados no seu registo e que, na falta da utilização da sua marca em conformidade com a sua função essencial, o titular não pode reclamar de qualquer violação ou risco de violação desta função. Argumentam que, de facto, uma vez que o titular não usa sua marca para distinguir os seus produtos, não há risco de que o público seja levado a estabelecer a menor relação entre esses produtos e os de um terceiro que faça uso de um sinal semelhante, e que possa equivocar‑se sobra a origem dos produtos em causa. De acordo com estas sociedades, o direito das marcas seria desviado da sua finalidade e deixaria de desempenhar o seu papel como elemento essencial de um sistema de concorrência não distorcida se fosse admissível que uma pessoa que se tivesse limitado a pedir o registo de uma marca sem nunca a explorar se pudesse reservar a possibilidade de exigir uma indemnização por danos a terceiros que utilizassem sinais semelhantes. Isso seria equivalente a reconhecer a esse titular uma vantagem concorrencial totalmente indevida.

21.      O órgão jurisdicional de reenvio deduz que o fundamento de cassação é relativo à violação do artigo L. 713‑3, do Código da Propriedade Intelectual, que AR não critica o acórdão da cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) por ter examinado a contrafação apenas à luz deste artigo, que exige, para haver contrafação, a demonstração da existência de um risco de confusão no espírito do público (6). Remetendo para o Acórdão de 18 de junho de 2009, L’Oréal e o. (C‑487/07, EU:C:2009:378, n.os 58 e 59), esse órgão jurisdicional considera que, a fim de apreciar a contrafação por imitação, basta examinar o prejuízo alegadamente causado à função essencial da marca em razão desse risco de confusão.

22.      O órgão jurisdicional de reenvio recorda que, no Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Länsförsäkringar (C‑654/15, EU:C:2016:998, a seguir «Acórdão Länsförsäkringar»), o Tribunal de Justiça, pronunciando‑se sobre a interpretação do artigo 9.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009 (7), declarou que, durante o período de cinco anos após o registo de uma marca da União Europeia, o seu titular pode, em caso de risco de confusão, proibir terceiros de fazer uso, na vida comercial, de um sinal idêntico ou semelhante à sua marca para todos os produtos e serviços idênticos ou semelhantes àqueles para os quais a marca foi registada, sem ter de demonstrar uma utilização séria dessa marca para esses produtos ou esses serviços. Embora sublinhe que a interpretação adotada nesse acórdão é transponível para o artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95, tendo em conta a semelhança de texto entre as duas disposições, esse órgão jurisdicional salienta que a situação que o Tribunal de Justiça teve de apreciar no referido acórdão, em que o período de cinco anos ainda não tinha decorrido e em que nenhum pedido de extinção por falta de utilização séria, por hipótese, tinha podido ser apresentado, não é a mesma que a que se apresenta no litígio no processo principal. No caso vertente, coloca‑se a questão de saber se quem nunca explorou a sua marca e que foi provado dos seus direitos no termo do prazo de cinco anos pode alegar ter sofrido uma violação da função essencial da sua marca e um dano, devido à utilização feita por um terceiro de um sinal idêntico ou semelhante durante o período de cinco anos que se seguiu ao registo da marca, e pedir uma indemnização.

23.      É neste contexto que, por decisão de 26 de setembro de 2018, a Cour de cassation (Tribunal de Cassação) suspendeu a instância no processo principal e submeteu a seguinte questão prejudicial:

«Devem os artigos 5.o, n.o 1, alínea b), 10.o e 12.o da Diretiva 2008/95/CE […] ser interpretados no sentido de que o titular que nunca explorou a sua marca e cujos direitos de marca se extinguiram no termo do período de cinco anos subsequente à publicação do seu registo pode obter a indemnização do prejuízo por contrafação, alegando que a função essencial da sua marca foi afetada pelo uso, por parte de um terceiro, anteriormente à data em que a extinção produziu efeitos, de um sinal semelhante à referida marca para designar produtos ou serviços idênticos ou similares àqueles para os quais essa marca foi registada?»

24.      No processo objeto das presentes conclusões foram apresentadas observações escritas por AR, pela Cooper International (conjuntamente com a Dalfour), pela Établissement Boudier, pelo Governo francês e pela Comissão Europeia. Estes interessados apresentaram observações orais na audiência perante o Tribunal de Justiça em 12 de junho de 2019.

III. Análise

A.      O regime da extinção e a sua ratio

25.      A legislação harmonizada sobre marcas dos Estados‑Membros, à semelhança do sistema de marcas da União Europeia, funda‑se no reconhecimento de direitos privativos apenas aos titulares de sinais distintivos destinados a ser utilizados no comércio e, por conseguinte, a estar presentes no mercado.

26.      Como o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Leno Merken (C‑149/11, EU:C:2012:816, n.o 32), resulta, com efeito, do considerando 9 da Diretiva 2008/95 (8), que o legislador da União pretendeu submeter a manutenção dos direitos relativos à marca nacional à condição de ser efetivamente utilizada.

27.      Esta condição de utilização, por um lado, visa assegurar que a marca registada exerce a sua função distintiva concretamente, e não apenas potencialmente, e, por outro, prossegue objetivos pró‑concorrenciais.

28.      Uma marca não utilizada é, com efeito, suscetível de impedir a concorrência, «ao limitar o âmbito dos sinais que podem ser registados por outros como marca e ao privar os concorrentes da possibilidade de utilizarem essa marca ou uma marca semelhante aquando da introdução no mercado interno de produtos ou de serviços idênticos ou semelhantes aos que são protegidos pela marca em causa» (9).

29.      Pelas mesmas razões, a não utilização de uma marca (nacional ou da União Europeia) pode também restringir a livre circulação de mercadorias e a livre prestação de serviços (10). A condição de utilização da marca serve também os objetivos de realização do mercado interno.

30.      Tanto as diretivas de harmonização dos direitos das marcas dos Estados‑Membros como os regulamentos que regem a marca da União Europeia que se sucederam têm, portanto, previsto que, embora os direitos sobre a marca (nacional e da União Europeia) sejam adquiridos com a mera formalidade do registo (11), a manutenção desses direitos só é possível se o sinal for objeto de uma «utilização séria» na vida comercial (12).

31.      O artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95 (13), ao prever a perda dos direitos sobre a marca na falta da sua utilização séria para os produtos ou serviços para os quais foi registada, visa assegurar que o direito privativo associado ao registo só possa ser exercido sobre sinais que cumpram efetivamente a sua função distintiva, assim como assegurar que apenas as marcas efetivamente exploradas sejam mantidas nos registos das marcas nacionais.

32.      A extinção prevista no artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95 produz‑se em caso de não utilização da marca durante cinco anos.

33.      O artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95 distingue, a este respeito, o caso em que a marca não foi objeto de utilização séria durante o período de cinco anos subsequente ao seu registo daquele em que tal utilização foi iniciada, mas seguidamente suspensa por um período ininterrupto de cinco anos. O processo objeto das presentes conclusões reporta‑se apenas ao primeiro desses casos, razão pela qual, a seguir, passarei a referir‑me apenas a essa causa de extinção por falta de utilização.

B.      O exercício do direito exclusivo sobre a marca no âmbito da ação de contrafação

34.      A proteção da marca registada é assegurada pelo reconhecimento de um direito exclusivo ao seu titular, que corresponde a um dever de abstenção dos terceiros (não autorizados). Este ius excludendi não é, no entanto, absoluto.

35.      Por um lado, visa a atividade do titular (ou dos terceiros autorizados por ele) na produção e distribuição de produtos ou serviços, e respeita, portanto, à utilização da marca, e não à marca como tal, o que impede de interpretar os direitos conferidos por este título de propriedade intelectual como direitos de propriedade clássicos (14).

36.      Por outro lado, o referido direito apenas pode ser acionado se os elementos constitutivos de uma das hipóteses enunciadas no artigo 5.o da Diretiva 2008/95 estiverem reunidos (15), o que implica que uma utilização ilícita de um sinal idêntico ou semelhante à marca registada, assim como a existência de um prejuízo (caracterizado) aos interesses protegidos do titular dessa marca sejam estabelecidos (16).

37.      A legislação sobre marcas harmonizada a nível da União Europeia estendeu o objeto da ação de contrafação para além do seu cenário típico, que visa a violação da função distintiva da marca (17), em que a lesão dos interesses do titular da marca é acompanhado de um prejuízo para o público sob a forma de um risco de este ser induzido em erro aquando da decisão de compra e de consumo (18).

38.      O critério que delimita o alcance da proteção assegurada pela ação de contrafação é identificado pelo Tribunal de Justiça com referência às funções juridicamente reconhecidas e protegidas dessa marca, a saber, além da função essencial de indicação de origem, a função de comunicação, de investimento, de publicidade e de garantia de qualidade (19).

1.      A contrafação deve ser apreciada de forma abstrata ou concreta?

39.      Uma das questões que se colocam quando se examina as características da ação de contrafação, e que foi amplamente debatida tanto na fase oral do processo como na escrita, no Tribunal de Justiça, diz respeito ao caráter abstrato ou concreto das apreciações que devem ser realizadas a fim de estabelecer a existência de uma contrafação. Essas apreciações levam em conta apenas os elementos resultantes do registo da marca, a saber, o sinal, tal como apresentado para registo, assim como os produtos e os serviços designados no pedido de registo, ou ainda outras circunstâncias alheias às inerentes ao registo?

40.      Em consonância com o caráter não absoluto do direito exclusivo conferido pela marca, no sentido acima esclarecido, o Tribunal de Justiça tende geralmente a favorecer uma apreciação em concreto dos elementos constitutivos da contrafação, que tem em conta, nomeadamente, das modalidades efetivas de utilização do sinal alegadamente contrafeito pelo terceiro não autorizado (20), bem como o conjunto das circunstâncias em torno dessa utilização (21). Tal abordagem permite, por um lado, precisar a linha de demarcação entre a utilização lícita e ilícita da marca alheia,(22) e, por outro, apreciar o dano sofrido pelo titular em relação à função da marca que é afetada (23).

41.      Quando, à semelhança do que acontece no litígio no processo principal, a ação de contrafação diz respeito à situação prevista no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95, que pressupõe que os comportamentos contestados afetem a função distintiva da marca registada, ao criar no espírito do público um risco de confusão (24), a apreciação dos elementos constitutivos da contrafação assume um caráter largamente concreto, tendo em conta o papel central desempenhado, nesta apreciação, pela perceção do público relevante.

42.      Assim, para além dos elementos resultantes do registo, entram em linha de conta, na apreciação da semelhança dos sinais em conflito e dos produtos ou serviços que designam, assim como na apreciação global do risco de confusão, fatores ligados, nomeadamente, à intensidade da exploração comercial da marca anterior registada, assim como às suas modalidades de comercialização. Estes fatores permitem, nomeadamente, ponderar os diferentes elementos da comparação entre sinais e entre produtos ou serviços, e de modelar o grau de proteção que deve ser concedido à referida marca, em função do conhecimento que o público tem sobre o mercado (25).

43.      No entanto, embora os fatores ligados à exploração da marca registada no mercado possam influenciar a apreciação do risco de confusão na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95, alargando o âmbito de proteção dessa marca em relação ao que resultaria de uma apreciação abstrata realizada apenas com base nos elementos resultantes do registo (26), a operação inversa não é, em minha opinião, permitida.

44.      Assim, com exceção das consequências da extinção, as modalidades de exploração comercial da marca registada não podem ser invocadas a fim de restringir a esfera de proteção dessa marca tal como resulta do registo, e, muito menos, de suprimir essa proteção.

45.      É, com efeito, o registo da marca que dá origem ao direito exclusivo referido no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95. A exploração comercial do sinal objeto desse registo não é um elemento constitutivo ou de aperfeiçoamento da aquisição desse direito. Como já referi acima, esta exploração apenas serve para manter os direitos do titular sobre a marca registada, impedindo‑o de incorrer na sua extinção (27).

46.      Não obstante, há que salientar que, embora a utilização da marca não seja uma condição para a aquisição do direito exclusivo reconhecido no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95, é, em contrapartida, exigida para que a marca exerça a função essencial para a qual esse direito é conferido ao seu titular e que consiste em «garantir ao consumidor ou utente final a identidade originária do produto marcado [ou do serviço designado pela marca], permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, tal produto de outros, com diversa proveniência» (28). Ora, por definição, esta função apenas pode ser exercida através da utilização da marca no mercado.

47.      Não partilho, portanto, a afirmação da Comissão segundo a qual é através do registo que a marca começa a exercer a sua função de indicação de origem.

48.      É verdade que, com o registo, a ordem jurídica reconhece ao sinal solicitado a «capacidade» de designar, no comércio, a origem comercial dos produtos ou dos serviços para os quais foi registado e de os distinguir daqueles que têm proveniência diferente. No entanto, trata‑se apenas um juízo de aptidão do sinal para cumprir a função essencial da marca. Para tal função ser efetivamente exercida, o sinal deve ser usado no mercado e entrar em contacto com o público (29).

49.      As considerações anteriores levam‑me a concluir que a análise do risco de confusão que deve ser realizada no quadro da aplicação do artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95 comporta a tomada em conta, no caso da marca anterior, tanto de elementos abstratos, resultantes do registo dessa marca, como de elementos concretos, relativos à utilização que dela foi feita, servindo os primeiros para identificar a proteção mínima que deve ser reconhecida à referida marca e podendo os segundos levar ao alargamento dessa proteção.

2.      Redefinição dos termos da questão prejudicial

50.      Dito isto, a discussão relativa ao caráter abstrato ou concreto da análise do risco de confusão reveste, na minha opinião, uma importância limitada para a resposta a dar à questão colocada pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação).

51.      Com efeito, os comportamentos alegadamente constitutivos dos atos de contrafação que estão em causa no litígio no processo principal foram cometidos num período em que o prazo de cinco anos a contar da publicação do registo da marca de AR ainda não havia terminado e a extinção não se tinha, portanto, produzido.

52.      Ora, como recorda o órgão jurisdicional de reenvio, no Acórdão Länsförsäkringar, o Tribunal de Justiça, pronunciando‑se sobre a interpretação do artigo 15.o, n.o 1, e do artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009, cujo conteúdo é substancialmente idêntico ao dos artigos 10.o e 12.o da Diretiva 2008/95, declarou que, durante o período de cinco anos a contar do registo da marca da União Europeia, o seu titular pode prevalecer‑se do direito exclusivo conferido por essa marca, nos termos do artigo 9.o, n.o 1, desse regulamento (30), em relação a todos os produtos e serviços para os quais ela está registada, sem ter de demonstrar uma utilização séria da mesma.

53.      O Tribunal de Justiça estabeleceu assim claramente o princípio, transponível no quadro do direito harmonizado das marcas, segundo o qual, durante o período de cinco anos seguintes ao registo da marca, e na falta de uma utilização séria desta última pelo seu titular, as condições da existência de um risco de confusão no âmbito de uma ação de contrafação, em particular de uma ação de contrafação por imitação, devem ser apreciadas de forma abstrata, a saber, apenas por referência aos elementos resultantes do registo da marca (31).

54.      O Acórdão Länsförsäkringar invalida, portanto, a premissa de que partem tanto o tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris) na sua sentença como a cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) no seu acórdão, contra o qual AR interpôs o recurso de cassação objeto do processo principal, segundo a qual o exame do risco de confusão no âmbito da ação de contrafação por imitação, na medida em que pressupõe uma violação da função essencial da marca, deve ser sempre realizado de forma concreta (32).

55.      Daqui resulta, como aliás afirma a própria Cour de cassation (Tribunal de Cassação), que a questão submetida a esse tribunal não é saber se, nas circunstâncias do processo principal, o risco de confusão, que constitui a condição da ação de contrafação intentada por AR contra as demandadas no processo principal, deve ser apreciado de forma abstrata ou concreta, mas sim a questão, que se situa a montante, de saber se AR continua a ter legitimidade, mesmo depois de ter sido declarado privado dos seus direitos sobre a marca, para intentar uma ação de contrafação contra as demandadas no processo principal por atos que estes tenham praticado durante o período de cinco anos após o registo da marca.

56.      Se a resposta a esta questão for afirmativa, o risco de confusão, que constitui a condição para que esses atos, anteriores à extinção, sejam qualificados de atos de contrafação, deve, segundo o Acórdão Länsförsäkringar e na falta de qualquer tipo de exploração comercial da marca anterior, ser apreciado de forma abstrata, a saber, apenas com base no registo dessa marca.

C.      Extinção e legitimidade para intentar uma ação de contrafação

57.      Antes de proceder à análise da questão submetida pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação), tal como precisada no n.o 55 das presentes conclusões, deve observar‑se que esta resposta não depende nem da existência de um prejuízo real e efetivo causado à função essencial da marca anterior, nem da demonstração de um dano causado ao titular dessa marca.

58.      Com efeito, por um lado, como indica o órgão jurisdicional de reenvio, embora no Acórdão de 18 de junho de 2009, L’Oréal e o. (C‑487/07, EU:C:2009:378, n.o 59) o Tribunal de Justiça tenha declarado que a proteção conferida no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95 exige «a possibilidade de prejuízo da função essencial da marca» (33), resulta do Acórdão Länsförsäkringar que, durante o período de cinco anos subsequente ao registo da marca, este prejuízo deve ser entendido como referindo‑se ao «potencial distintivo» da marca anterior não utilizada e, assim, é independente do facto de essa marca ainda não ter sido levada ao conhecimento do público.

59.      Por outro lado, como foi corretamente salientado pela Comissão nas suas observações escritas, a questão da legitimidade do titular de uma marca para intentar uma ação de contrafação a fim de obter uma reparação do dano alegadamente sofrido em consequência da utilização de um sinal que se presta a confusão com a sua marca é independente da questão de saber se essa utilização pode concretamente ter causado o dano alegado. Por outras palavras, a existência de um dano não condiciona a legitimidade para intentar uma ação de contrafação, mas constitui uma condição para a procedência do pedido de reparação apresentado no âmbito dessa ação.

60.      A fim de responder à questão submetida pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação), a atenção deve, portanto, ser deslocada dos prejuízos que os alegados atos de contrafação das demandadas no processo principal podem ter causado às funções da marca anterior e aos interesses do seu titular para a situação deste último no momento em que intentou a ação de contrafação.

61.      Ora, resulta da decisão de reenvio que, à data da propositura dessa ação, AR estava privado dos seus direitos sobre a sua marca (34).

62.      Resulta, com efeito, dos documentos dos autos do processo principal, que AR intentou a ação contra as demandadas no processo principal por atos de 8 e 11 de junho de 2012. O prazo de cinco anos após o registo da marca SAINT GERMAIN, previsto no artigo 10.o da Diretiva 2008/95 expirou em 13 de maio de 2011.

63.      Apesar de a extinção apenas ter sido declarada pelo tribunal de grande instance de Nanterre (Tribunal de Primeira Instância de Nanterre) em 28 de fevereiro de 2013, por acórdão que transitou em julgado em 22 de fevereiro de 2014, data em que foi confirmado pela cour d’appel de Versailles (Tribunal de Recurso de Versalhes), os efeitos dessa extinção começaram a produzir‑se a partir do dia em que o dito prazo terminou.

64.      Quando o titular de uma marca intenta uma ação de contrafação, seja «por reprodução» ou «por imitação», exerce o direito exclusivo conferido pela marca registada para se opor à utilização no comércio de um sinal idêntico ou semelhante à sua marca para produtos idênticos ou semelhantes àqueles para os quais esta marca foi registada. É assim mesmo que a ação vise apenas obter uma reparação do dano sofrido em consequência dessa utilização, por exemplo no caso de os comportamentos controvertidos terem, entretanto, cessado.

65.      A extinção tem como efeito privar o titular da marca registada do direito exclusivo que esta lhe confere, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95. A partir da data em que a extinção produz efeito, o exercício deste direito deixa, portanto, a priori, de ser permitido. Noutros termos, a extinção faz cessar o direito de intentar uma ação de contrafação com base nessa disposição (35).

66.      Isto vale igualmente para as ações, tais como a que foi intentada pela requerente no processo principal, que visem obter uma indemnização pelo dano causado ao titular da marca registada por uma tal utilização, num momento em que os seus direitos sobre esta ainda não tinham caducado?

D.      Direito do titular da marca que caducou de obter uma indemnização pelos atos de contrafação cometidos anteriormente à extinção

67.      Embora, após a extinção, o titular de uma marca registada deixe, em princípio, de poder exercer o direito privativo conferido por ela, deve salientar‑se que os atos de contrafação dessa marca cometidos durante o período de cinco anos após o registo não perdem o seu caráter ilícito devido à extinção.

68.      Daqui resulta que, se o direito nacional não fizer retroagir os efeitos da extinção à data do pedido de registo da marca ou à data do seu registo, de modo a considerar‑se que a marca não produziu qualquer efeito jurídico, os atos praticados durante o referido período de cinco anos, antes da data de produção de efeitos da extinção, podem continuar a ser impugnados através de uma ação de contrafação.

69.      Negar esse direito de ação ao titular de uma marca registada cujos direitos caducaram equivaleria a «regularizar ex post» os atos de contrafação cometidos num momento em que a marca objeto de violação — na aceção do n.o 58 das presentes conclusões — ainda estava protegida.

70.      Ora, na minha opinião, tal regularização não pode decorrer, como preconizam em substância as demandadas no processo principal, da simples constatação de que a marca em questão nunca foi objeto de uma exploração comercial.

71.      É verdade que os direitos conferidos pela Diretiva 2008/95 ao titular de uma marca registada visam permitir que esta exerça a sua função essencial de indicação da origem e que desempenhe o papel de elemento essencial do sistema de concorrência não distorcida que o direito da União pretende estabelecer e manter (36). Nesta mesma lógica, como já expus acima, esses direitos apenas podem ser mantidos se a função para a qual foram atribuídos for realmente exercida no mercado.

72.      Poderia, portanto, parecer injustificado, se não abusivo, que uma pessoa que nunca tenha explorado a sua marca enquanto beneficiou do direito exclusivo que esta lhe confere e que, além disso, não tenha exercido esse direito em tempo útil a fim de se opor à violação da sua marca (37), possa, depois de ter sido privada dos seus direitos sobre a marca, instaurar uma ação contra os autores de atos de contrafação a fim de obter a reparação do dano alegadamente sofrido.

73.      No entanto, como já referi, o Tribunal de Justiça declarou, no Acórdão Länsförsäkringar, que as disposições sobre a extinção conferem ao titular um «período de graça» para iniciar uma utilização séria da sua marca, no decurso do qual, mesmo na inexistência de qualquer exploração comercial, se pode opor à violação do seu monopólio de utilização dessa marca por terceiros e obter uma reparação pelos danos que essa violação tenha causado. O facto de, no termo desse prazo, o titular ainda não ter explorado essa marca não afeta, em princípio, o caráter ilícito dos atos de contrafação cometidos quando esse prazo estava ainda pendente (38).

74.      Portanto, a menos que, nos termos do direito nacional do Estado‑Membro em causa, os efeitos da extinção não retroajam à data do pedido de registo ou do registo da marca, o que faria cessar todos os direitos do titular da marca que caducou de pedir uma indemnização por atos cometidos no decurso do referido período de graça, nada impede, na minha opinião, que o titular instaure uma ação de contrafação a fim de ser indemnizado do dano sofrido em consequência de atos que, no momento em que foram cometidos, violaram o seu direito exclusivo sobre a marca.

75.      Sublinho também que, como a Comissão salientou na audiência, não está excluído que, em certos casos, os atos de contrafação cometidos durante o período de cinco anos a seguir ao registo da marca tenham contribuído para desencorajar o seu titular de explorá‑la ou tenham impedido a sua utilização séria, sem, no entanto, chegar a constituir um motivo legítimo de não utilização que impedisse a extinção, na aceção do artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95 (39).

76.      A solução que proponho de seguida ao Tribunal de Justiça não é infirmada pelo obiter dictum contido no n.o 28 do Acórdão Länsförsäkringar, no qual o Tribunal de Justiça declarou que «a partir do momento em que termine o prazo de cinco anos subsequente ao registo da marca da União Europeia, a extensão [do direito exclusivo conferido no artigo 9.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009] pode ser afetada pela declaração, feita na sequência de um pedido reconvencional ou de uma defesa quanto ao mérito apresentados por um terceiro numa ação de contrafação, de que o titular ainda não iniciou até esse momento uma utilização séria da sua marca em relação a uma parte ou em relação a todos os produtos e serviços para que foi registada».

77.      Ora, apesar de, naquela passagem desse acórdão, o Tribunal de Justiça ter pretendido claramente precisar que o exercício do referido direito é limitado ou impedido pela extinção, essa afirmação deve, em minha opinião, tendo em conta o teor de todos os fundamentos desse acórdão, ser entendida no sentido de que se refere a ações de contrafação destinadas a proibir atos cometidos após o termo do prazo de cinco anos seguintes ao registo da marca (40). Não penso, em contrapartida, que se possa ser retirar qualquer argumento a favor da tese segundo a qual o titular provado dos seus direitos sobre a marca por falta de utilização da mesma não pode obter, incluindo através de uma ação de contrafação, a reparação do dano sofrido como resultado de um ato ocorrido anteriormente à data da produção de efeitos da extinção.

78.      Do mesmo modo, sou da opinião que o artigo 17.o da Diretiva 2015/2436 (41), que substituiu a Diretiva 2008/95, nos termos da qual «[o] titular de uma marca só pode proibir a utilização de um sinal na medida em que os seus direitos não sejam suscetíveis de extinção, nos termos do artigo 19.o, na data em que o processo de infração for instaurado», não abrange a possibilidade de demandar, inclusive após a extinção, por meio de uma ação de contrafação, a indemnização do dano sofrido por atos cometidos enquanto a marca ainda produzia os seus efeitos jurídicos.

79.      Por último, a solução que preconizo respeita a margem discricionária deixada aos Estados‑Membros pela Diretiva 2008/95 na definição dos efeitos da extinção e, em particular, na fixação do momento a partir do qual os efeitos desta começam a correr (42). No que respeita ao direito francês, como já sublinhei, estes efeitos apenas correm a partir do termo do prazo de cinco anos seguintes à publicação do registo da marca.

80.      À luz do conjunto das considerações anteriores, sou de opinião que o titular de uma marca registada que nunca a tenha utilizado e que foi privado dos seus direitos sobre ela no termo do prazo de cinco anos previsto no artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95 pode intentar uma ação de contrafação, com fundamento no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), desta diretiva, a fim de obter a indemnização dos danos que tenha sofrido em consequência da utilização, por um terceiro, no decurso do referido prazo de cinco anos e anteriormente à data de produção dos efeitos da caducidade, de um sinal semelhante para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes que se prestem a confusão com a sua marca.

81.      Se o Tribunal de Justiça entender não seguir esta proposta e concluir que o titular que viu declarados extintos os seus direitos sobre a marca por falta de utilização séria da mesma deixa de estar habilitado para intentar uma ação de contrafação, mesmo quando tal ação vise a obtenção de uma indemnização pelos danos sofridos em resultado de atos de contrafação cometidos durante o período de cinco anos subsequentes ao registo da marca, proponho, a título subsidiário, que se reconheça, com base nas considerações expostas nos n.os 66 a 69 das presentes conclusões, que essa indemnização pode ser obtida por meio de ações com um fundamento jurídico diferente daquele que subjaz ao artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95, como uma ação por concorrência desleal ou uma ação de responsabilidade extracontratual (43), quando as condições prescritas pelo direito nacional para o exercício de tais ações estejam reunidas.

82.      Tais ações, que estão abertas a quem não se pode prevalecer de direitos privativos, seriam fundadas nos mesmos factos materiais que os alegados em apoio de uma ação de contrafação de marca, quando constitutivos de uma infração (44).

83.      Pelas razões expostas nos n.os 39 a 49 das presentes conclusões, mesmo nesse contexto, o risco de confusão entre os sinais em conflito, necessário para se poder constatar a existência de uma contrafação e, portanto, de um comportamento infrator, deve ser apreciado apenas por referência aos elementos resultantes do registo da marca (45).

IV.    Conclusão

84.      Com base no conjunto das considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda como segue à questão prejudicial submetida pelo Tribunal de Cassação:

O artigo 5.o, n.o 1, alínea b), o artigo 10.o e artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, devem ser interpretados no sentido de que o titular de uma marca registada que nunca a tenha utilizado e que foi declarado privado dos seus direitos sobre ela no termo do prazo de cinco anos previsto pelo artigo 12.o, n.o 1, da referida diretiva pode intentar uma ação de contrafação, com fundamento no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da referida diretiva, a fim de obter a indemnização dos danos que tenha sofrido em consequência da utilização, por um terceiro, no decurso do referido prazo de cinco anos e anteriormente à data de produção dos efeitos da extinção, de um sinal semelhante para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes que se prestem a confusão com a sua marca. No âmbito de uma ação dessa natureza, o risco de confusão entre os sinais em conflito, necessário para se poder constatar a existência de uma contrafação, deve ser apreciado apenas por referência aos elementos resultantes do registo da marca.


1      Língua original: francês.


2      JO 2008, L 299, p. 25. A Diretiva 2008/95 foi substituída, a partir de 15 de janeiro de 2019, pela Diretiva (UE) 2015/2436, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2015, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 2015, L 336, p. 1), que procedeu à sua reformulação.


3      Resulta dos atos relativos a este processo que a sociedade Osez vous? International Spirits, LLC é titular da marca da União Europeia «SAINT GERMAIN», cujo registo foi pedido em 17 de abril de 2007 para designar os vinhos e outras bebidas alcoólicas, à exceção de cervejas.


4      Segundo as apreciações da cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris), os documentos produzidos por AR limitavam‑se a estabelecer a realidade dos preparativos para o lançamento de um creme de conhaque com a marca em causa no processo principal, assim como a participação da sociedade de que AR é titular em feiras profissionais em 2007.


5      A cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) também excluiu uma violação da função de investimento da marca, invocada pela AR por referência ao Acórdão de 22 de setembro de 2011, Interflora e Interflora British Unit (C‑323/09, EU:C:2011:604).


6      Como indiquei no n.o 14 das presentes conclusões, perante o tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris), AR alegou igualmente uma violação do artigo L 713‑2, que proíbe a «contrafação por reprodução» da marca.


7      Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da U[nião] E[uropeia] (JO 2009, L 78, p. 1). Este regulamento foi substituído, a partir de 1 de outubro de 2017, pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1).


8      V., no mesmo sentido, considerando 10 do Regulamento n.o 207/2009 e, no que diz respeito aos textos atualmente em vigor, considerando 31 da Diretiva 2015/2436 e considerando 24 do Regulamento 2017/1001.


9      Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Leno Merken (C‑149/11, EU:C:2012:816, n.o 32) (relativamente à marca da União Europeia); no mesmo sentido, v. Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston nesse processo (EU:C:2012:422, n.os 30 e 32). V. também Acórdão Länsförsäkringar (n.o 25). As mesmas considerações se aplicam à marca nacional.


10      V. Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Leno Merken (C‑149/11, EU:C:2012:816, n.o 32), ainda a respeito da marca da União Europeia.


11      V. artigo 5.o da Diretiva 2008/95 e artigo 9.o do Regulamento n.o 2017/1001.


12      V., no que respeita aos atos atualmente em vigor, artigo 19.o, n.o 1, da Diretiva 2015/2436 e 58.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento 2017/1001.


13      O artigo 12.o, n.o 2, da Diretiva 2008/95 prevê outras causas de extinção dos direitos sobre a marca que não são relevantes para o processo objeto das presentes conclusões.


14      V., neste sentido, as Conclusões do advogado‑geral M. Poiares Maduro nos processos apensos Google France e Google (C‑236/08 a C‑238/08, EU:C:2009:569, n.o 103). A marca pode, evidentemente, ser também considerada como um bem em si mesmo, suscetível de ser objeto de cessão ou de licença, no entanto, para os propósitos das presentes conclusões, este aspeto do direito sobre a marca não é levado em consideração.


15      V., nesse sentido, Acórdão de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club (C‑206/01, EU:C:2002:651), em que, remetendo para o décimo considerando da Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), que precedeu a Diretiva 2008/95, após ter afirmado o caráter absoluto da proteção da marca em caso de dupla identidade de sinais e produtos e serviços (n.o 50), o Tribunal de Justiça precisou, nos n.os 51 e 52, que o exercício do direito exclusivo previsto no artigo 5.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 89/104 [idêntico ao artigo 5.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2008/95] deve ser reservada aos casos em que a utilização do sinal por um terceiro afete ou seja suscetível de afetar funções da marca e, em particular, a sua função essencial de garantia de origem e que a natureza exclusiva desse direito apenas pode ser justificada nos limites do âmbito de aplicação dessa disposição. Em termos mais gerais, tal como salientado pelo advogado‑geral M. Poiares Maduro nas suas Conclusões nos processos apensos Google France e Google (C‑236/08 a C‑238/08, EU:C:2009:569, n.os 101 a 112), a proteção da marca está sujeita a certas restrições e limitações que são necessárias, nomeadamente, para manter a liberdade de comércio e a livre concorrência, bem como a liberdade de expressão. Por este motivo, o titular da marca registada não poderá opor‑se a uma utilização comercial e não comercial considerada legítima do sinal protegido.


16      V. Acórdãos de 14 de maio de 2002, Hölterhoff (C‑2/00, EU:C:2002:287, n.o 16), e de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club (C‑206/01, EU:C:2002:651, n.o 54).


17      Trata‑se do caso referido no artigo 5.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95, a saber, a utilização por um terceiro não autorizado de um sinal idêntico ou semelhante à marca registada para produtos ou serviços semelhantes, à qual se juntaram as hipóteses referidas no artigo 5.o, n.o 1, alínea a), da mesma diretiva (dupla identidade de sinais e de produtos ou serviços) e no artigo 5.o, n.o 2 da mesma diretiva (proteção de marcas notórias).


18      V., neste sentido, Conclusões do advogado‑geral J. Kokott no processo Leidseplein Beheer e de Vries (C‑65/12, EU:C:2013:196, n.o 28).


19      V. Acórdão de 18 de junho de 2009, L’Oréal e o. (C‑487/07, EU:C:2009:378, n.o 58).


20      Na medida em que tal permite verificar se a utilização é suscetível de ser proibida pelo titular da marca registada, v., neste sentido, Acórdão de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club (C‑206/01, EU:C:2002:651, nomeadamente, n.os 51 a 54).


21      V., por exemplo, Acórdão de 25 de janeiro de 2007, Adam Opel (C‑48/05, EU:C:2007:55, n.os 23 e 24).


22      V., nomeadamente, Acórdão de 12 de junho de 2008, O2 Holdings e O2 (UK) (C‑533/06, EU:C:2008:339, n.o 67).


23      V. Acórdãos de14 de maio de 2002, Hölterhoff (C‑2/00, EU:C:2002:287, n.o 16), e de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club (C‑206/01, EU:C:2002:651, n.o 54).


24      Recordo que o risco de confusão é definido pelo Tribunal de Justiça como «o risco de que o público possa crer que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou, eventualmente, de empresas ligadas economicamente», v. Acórdão de 29 de setembro de 1998, Canon (C‑39/97, EU:C:1998:442, n.o 29). Segundo jurisprudência constante, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, de acordo com a perceção que o público relevante tem dos sinais e dos produtos ou serviços em causa, e tendo em conta todos os fatores relevantes no caso, em particular, a interdependência da semelhança dos sinais e dos produtos ou serviços designados (v., nomeadamente, Acórdãos de 11 de novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, EU:C:1997:528, n.os 22 a 24, e de 29 de setembro de 1998, Canon, C‑39/97, EU:C:1998:442, n.os 16 a 18).


25      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral desde o Acórdão «farol» em matéria de risco de confusão (Acórdão de 29 de setembro de 1998, Canon, C‑39/97, EU:C:1998:442, nomeadamente n.o 18, sobre a proteção alargada das marcas dotadas de caráter distintivo elevado adquirido pelo uso, e n.o 24, sobre a importância do caráter distintivo da marca anterior, inclusive o adquirido pelo uso, na ponderação dos elementos que entram em linha de conta na apreciação global do risco de confusão).


26      Um exemplo particularmente notável das possibilidades de expansão da proteção da marca conferida pelo registo é constituído pelo caso das marcas em série, cuja proteção apenas é reconhecida quando as marcas pertencentes à série estão presentes no mercado [v. Acórdão de 23 de fevereiro de 2006, Il Ponte Finanziaria/IHMI ‑ Marine Enterprise Projects (BAINBRIDGE) (T‑194/03, EU:T:2006:65, n.o 126)].


27      Nesse sentido, no que se refere ao artigo 15.o, n.o 1, e ao artigo 51.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 207/2009, v. Acórdão Länsförsäkringar (n.o 25).


28      Segundo a definição dada pelo Tribunal de Justiça a partir do Acórdão de 23 de maio de 1978, Hoffmann‑La Roche (102/77, EU:C:1978:108, n.o 7); em último lugar, v. Acórdão de 12 de junho de 2019, Hansson (C‑705/17, EU:C:2019:481, n.o 31).


29      Esta é também a razão pela qual a Diretiva 2008/95 prevê a sanção da extinção dos direitos sobre a marca em caso de não utilização da mesma pelo seu titular. Sublinho também que o direito das marcas da União Europeia não reconhece a categoria das «marcas defensivas», reconhecida na ordem jurídica de certos Estados‑Membros, como a República Italiana, que visa os sinais destinados a não ser utilizados no comércio em razão da sua função puramente defensiva de outro sinal objeto de exploração comercial: no sentido da incompatibilidade das marcas defensivas com o sistema da marca da União Europeia, v. Acórdão de 23 de fevereiro de 2006, Il Ponte Finanziaria/IHMI ‑ Marine Enterprise Projects (BAINBRIDGE) (T‑194/03, EU:T:2006:65, n.os 42 a 46). O registo de marcas com a intenção de não fazer uma utilização efetiva na vida negocial, poderia, em rigor, constituir mesmo uma hipótese de registo de má‑fé, na aceção do artigo 3.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva 2008/95.


30      A redação deste artigo é praticamente idêntica à do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/95.


31      Isto não implica, evidentemente, que quando uma marca tenha sido utilizada, essa utilização seja levada em consideração no âmbito dessa apreciação.


32      Recordo que, tanto a sentença do tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris) como o acórdão da cour d’appel de Paris (Tribunal de Recurso de Paris) são anteriores ao Acórdão Länsförsäkringar.


33      V., neste sentido, igualmente, Acórdãos de 9 de janeiro de 2003, Davidoff (C‑292/00, EU:C:2003:9, n.o 28), e de 12 de junho de 2008, O2 Holdings e O2 (UK) (C‑533/06, EU:C:2008:339, n.o 57).


34      A este respeito, saliento que resulta dos documentos dos autos do processo principal que, no tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris), AR alegou o contrário. A sua tese foi, no entanto, rejeitada, acertadamente, por esse tribunal.


35      É importante salientar que a extinção não faz cessar todos os direitos sobre o sinal objeto do registo, mas somente aqueles que são conferidos pelo registo. Assim, a hipótese de a extinção se produzir sem a marca nunca ter sido utilizada deve ser distinguida daquela em que a marca foi objeto de uma exploração comercial, que, subsequentemente, foi interrompida por um período consecutivo de cinco anos. Nesta segunda hipótese, não é de excluir que os consumidores guardem em mente a memória da marca, mesmo após o termo desse período, particularmente quando a marca tem sido objeto de exploração intensiva. Em tais circunstâncias, o titular pode intentar uma ação de contrafação, mesmo após a extinção, exercendo, já não os direitos resultantes do seu registo, agora extintos, mas daqueles que são reconhecidos, se for caso disso, em consequência da utilização que ele fez do sinal objeto do registo.


36      V., sobre a função da marca nesse sistema, Acórdão de 25 de julho de 2018, Mitsubishi Shoji Kaisha e Mitsubishi Caterpillar Forklift Europe (C‑129/17, EU:C:2018:594, n.o 30).


37      Recordo que os atos de contrafação em causa no litígio no processo principal foram cometidos entre 8 de junho de 2009 e 13 de maio de 2011 e que decorreram três anos entre o início da contrafação e a apresentação da petição introdutória da instância por AR (8 e 11 de junho de 2012, respetivamente).


38      O mesmo não sucederia se se fosse demonstrado que o titular havia procedido ao registo sem a intenção de usar o sinal para os fins para os quais o direito exclusivo lhe foi reconhecido, pelo que se poderia considerar que o registo tinha sido feito de má‑fé, na aceção do artigo 3.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva 2008/95, e que a marca seria por esse motivo anulada.


39      A este respeito, observo que, entre os prejuízos invocados por AR, a título subsidiário, no tribunal de grande instance de Paris (Tribunal de Primeira Instância de Paris) figuram as «consequências económicas negativas» dos atos de contrafação imputados às demandadas no processo principal, nomeadamente a «perda de oportunidade de integrar o mercado» e a «impossibilidade de explorar a marca SAINT GERMAIN».


40      Os efeitos da extinção são descritos como segue, no artigo 55.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009: «Considera‑se que a marca [da União Europeia] deixou de produzir os efeitos previstos no presente regulamento a contar da data do pedido de extinção ou do pedido reconvencional, na medida em que o titular tenha sido declarado total ou parcialmente privado dos seus direitos. A pedido de uma das partes, pode ser fixada na decisão qualquer data anterior em que se tenha verificado uma das causas da extinção».


41      Esta diretiva não é aplicável ratione temporis aos factos do litígio no processo principal, mas foi, no entanto, mencionada nas observações escritas apresentadas no Tribunal de Justiça e durante os debates na audiência, em particular, pelas demandadas no processo principal.


42      V., em particular, considerando 6 da Diretiva 2008/95, nos termos do qual «[o]s Estados‑Membros deverão continuar […] a ter toda a liberdade para fixar as disposições processuais relativas […] à caducidade […] das marcas adquiridas por registo. […] Os Estados‑Membros deverão manter a faculdade de determinar os efeitos da caducidade […] das marcas». Recordo que esta margem de manobra deixada aos Estados‑Membros já não existe na Diretiva 2015/2436, cujo artigo 47.o, n.o 1, prevê que «[c]onsidera‑se que a marca registada deixou de produzir os efeitos previstos na presente diretiva a contar da data do pedido de extinção, na medida em que os direitos do titular tenham sido extintos. A pedido de uma das partes, pode ser fixada na decisão do pedido de extinção qualquer data anterior em que se tenha verificado um dos motivos da extinção».


43      Tais ações seriam fundadas nos mesmos factos que os alegados em apoio de uma ação de contrafação de marca.


44      Saliento que a reparação dos danos invocados por AR a título subsidiário, mencionados na nota 39 das presentes conclusões, assim como aquele, invocado também a título subsidiário, constituído pela «perda de investimentos feitos […] para o lançamento d[a]marca» pode ser pedida no âmbito de uma ação por concorrência desleal ou de uma ação de responsabilidade extracontratual.


45      Mesmo esta solução preservaria a margem de manobra deixada aos Estados‑Membros pela Diretiva 2008/95. Com efeito, apenas na medida em que o direito nacional não faça retroagir os efeitos da caducidade à data do pedido da marca ou do seu registo, é permitido ao titular da marca que caducou intentar uma ação, por fundamentos alheios ao seu direito exclusivo sobre a marca, a fim de obter uma indemnização pelos danos sofridos por atos praticados num momento em que o seu direito exclusivo sobre a marca ainda era válido.