Language of document : ECLI:EU:C:2008:767

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

22 de Dezembro de 2008

Processo C‑443/07 P

Isabel Clara Centeno Mediavilla e o.

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Estatuto dos Funcionários – Excepção de ilegalidade do artigo 12.°, n.° 3, do anexo XIII, que rege a classificação dos funcionários recrutados após 1 de Maio de 2004 – Consulta do Comité do Estatuto – Ausência de violação dos direitos adquiridos e do princípio da igualdade de tratamento»

Objecto: Recurso interposto do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias, de 11 de Julho de 2007, Centeno Mediavilla e o./Comissão (T‑58/05, Colect., p. II‑2523), destinado à sua anulação.

Decisão: É negado provimento ao recurso.

Sumário

1.        Funcionários – Estatuto – Regulamento que altera o Estatuto – Procedimento de elaboração – Consulta do Comité do Estatuto

(Artigo 283.° CE; Estatuto dos Funcionários, artigo 10.°, segundo parágrafo; anexo XIII, artigo 12.°, n.° 3)

2.        Funcionários – Recrutamento – Nomeação em grau – Introdução de uma nova estrutura das carreiras pelo Regulamento n.° 723/2004 – Disposições transitórias de classificação em grau

(Estatuto dos Funcionários, artigos 3.° e 31.°; anexo XIII, artigo 12.°, n.° 3; Regulamento do Conselho n.° 723/2004)

3.        Funcionários – Recrutamento – Nomeação em grau – Introdução de uma nova estrutura das carreiras pelo Regulamento n.° 723/2004 – Disposições transitórias de classificação em grau

(Estatuto dos Funcionários, anexo XIII, artigo 12.°, n.° 3; Regulamento do Conselho n.° 723/2004)

4.        Funcionários – Recrutamento – Nomeação em grau – Introdução de uma nova estrutura das carreiras pelo Regulamento n.° 723/2004 – Disposições transitórias de classificação em grau

(Estatuto dos Funcionários, anexo XIII, artigo 12.°, n.° 3; Regulamento do Conselho n.° 723/2004)

1.        Os termos do artigo 10.° do Estatuto, que prevê a instituição de um Comité do Estatuto que deve ser consultado sobre qualquer proposta de revisão do Estatuto e que pode formular sugestões no quadro de tal revisão, são manifestamente incompatíveis com uma interpretação restritiva. A Comissão está obrigada a consultar novamente este Comité antes da aprovação, pelo Conselho, das disposições regulamentares em causa, sempre que as alterações feitas à proposta do Estatuto afectem substancialmente a economia da proposta, não existindo esta obrigação para as alterações pontuais e de efeito limitado. O carácter substancial de uma alteração deve ser apreciado do ponto de vista do objecto e da localização das disposições alteradas no conjunto das disposições e não na perspectiva das consequências individuais que delas possam advir para os funcionários em questão.

A este propósito, a substituição do grau A 7 pelo grau A *6 resultante da reforma das carreiras introduzida pelo legislador comunitário em 1 de Maio de 2004, inicialmente prevista na disposição que passou a artigo 12.°, n.° 3, do anexo XIII do Estatuto, não é substancial, uma vez que constitui um elemento complementar dessa reforma que se insere na economia geral e na perspectiva global da reestruturação evolutiva das carreiras. Não se afastando substancialmente do texto submetido ao Comité do Estatuto, o qual pôde, pois, dar o seu parecer sobre a possibilidade de se prever uma diferença dos graus de recrutamento dos funcionários aprovados nos concursos realizados antes da entrada em vigor da reforma, entre os que foram recrutados antes dessa data e os que foram recrutados após essa data, esta alteração não obrigava a uma nova consulta do referido comité.

2.        Os candidatos aprovados num concurso e inscritos numa lista de candidatos aprovados não gozam, nessa qualidade, de qualquer direito adquirido a serem nomeados, mas unicamente da expectativa de o serem, estando a sua classificação em grau subordinada à sua nomeação, a qual se inscreve nos poderes da Autoridade Investida do Poder de Nomeação. Daqui se conclui que os candidatos aprovados em concursos e inscritos em listas de candidatos aprovados anteriormente a 1 de Maio de 2004, data da entrada em vigor do Regulamento n.° 734/2004, que altera o Estatuto dos Funcionários e o Regime aplicável aos outros agentes, mas nomeados funcionários estagiários após essa data, não podem invocar qualquer direito adquirido para reivindicar, em vez da aplicação dos novos critérios de classificação previstos por esse regulamento, o respeito da classificação em grau indicada no anúncio de concurso, na medida em que a situação constitutiva do seu direito ao respeito de certas condições de recrutamento não estava ainda concretizada antes da entrada em vigor do referido regulamento. Estas considerações são igualmente válidas para aqueles que foram recrutados como funcionários estagiários antes de 1 de Maio de 2004 mas nomeados funcionários após esta data.

Se os candidatos aprovados num concurso retiram em princípio do artigo 31.°, n.° 1, do Estatuto o direito a que lhes seja atribuído o grau do grupo de funções indicado no anúncio de concurso caso sejam nomeados, esta disposição só pode ser aplicada não tendo havido alterações no direito aplicável, pois não pode impor à Autoridade Investida do Poder de Nomeação a obrigação de tomar uma decisão não conforme com o Estatuto tal como alterado pelo legislador comunitário e que, portanto, seria ilegal. O artigo 12.°, n.° 3, do anexo XIII do Estatuto, enquanto disposição transitória de carácter especial, pode inserir uma derrogação à norma de carácter geral prevista no artigo 31.° do Estatuto, aplicável a uma categoria determinada de funcionários.

3.        O legislador, ao adoptar o artigo 12.°, n.° 3, do anexo XIII do Estatuto, do qual resulta uma diferença de tratamento entre os funcionários aprovados num mesmo concurso, quando recrutados antes ou depois de 1 de Maio de 2004, data da entrada em vigor da reforma operada pelo Regulamento n.° 723/2004, que altera o Estatuto dos Funcionários e o Regime aplicável aos outros agentes, não violou o princípio da igualdade de tratamento, uma vez que o tratamento diferenciado afecta funcionários que não se inserem numa mesma e única categoria. Com efeito, os funcionários recrutados após 1 de Maio de 2004 não se encontram na mesma situação jurídica que os funcionários recrutados antes desta data, porquanto, diversamente dos funcionários já recrutados, no momento da entrada em vigor da reforma, apenas tinham a expectativa de serem nomeados. Esta diferença de tratamento assenta, além disso, num elemento objectivo e independente da vontade do legislador comunitário, a saber, a data do recrutamento decidida pela Autoridade Investida do Poder de Nomeação. De resto, ao ponderar os interesses das diferentes categorias de funcionários no quadro da introdução gradual do novo regime estatutário, o legislador comunitário pôde validamente decidir que o recrutamento dos funcionários aprovados em concursos antes de 1 de Maio de 2004, mas recrutados após essa data, seria efectuado segundo os termos do novo regime, concedendo‑lhes simultaneamente um tratamento mais favorável do que o aplicado aos funcionários aprovados em concursos realizados após 1 de Maio de 2004 e seguidamente recrutados.

Os critérios de classificação indicados no artigo 12.°, n.° 3, do anexo XIII do Estatuto também não contêm qualquer discriminação baseada na idade, porque são manifestamente independentes de qualquer ponderação da idade dos aprovados nos concursos em causa e, para mais, prevêem, no que respeita à categoria A, uma distinção entre o grau de base A*5 (antigo grau A 8) e o grau superior A*6 (antigo grau A 7/A 6).

4.        Os candidatos aprovados em concursos e inscritos em listas de candidatos aprovados anteriormente a 1 de Maio de 2004, data da entrada em vigor do Regulamento n.° 723/2004, que altera o Estatuto dos Funcionários e o Regime aplicável aos outros agentes, mas nomeados funcionários estagiários após essa data, não podem invocar as indicações recebidas da administração antes da sua nomeação a respeito da sua classificação de acordo com os critérios enunciados nos anúncios de concurso, acompanhadas, no entanto, de advertências sobre a possibilidade de lhes ser proposto um recrutamento com base nas novas disposições estatutárias, para contestar a legalidade das referidas disposições, em que se basearam, afinal, as decisões de nomeação. Com efeito, mesmo considerando tais indicações provenientes da administração garantias precisas aptas a criar na esfera dos destinatários uma confiança legítima, os interessados não podem invocar o princípio da protecção da confiança legítima para se oporem à legalidade de uma nova disposição regulamentar, sobretudo num domínio em que o legislador dispõe de um amplo poder de apreciação. Os actos da administração não podem limitar a margem de manobra do legislador e também não podem constituir um parâmetro de legalidade com o qual este se deva conformar.