Language of document : ECLI:EU:T:2010:373

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

9 de Setembro de 2010 (*)

«Política externa e de segurança comum – Medidas restritivas tomadas contra certas pessoas e entidades no âmbito do combate ao terrorismo – Congelamento de fundos – Posição Comum 2001/931/PESC e Regulamento (CE) n.° 2580/2001 – Recurso de anulação – Adaptação do pedido – Fiscalização jurisdicional – Pressupostos de aplicação de uma medida da União que decreta o congelamento de fundos»

No processo T‑348/07,

Stichting Al‑Aqsa, com sede em Heerlen (Países Baixos), representada por J. Pauw, G. Pulles, A. M. van Eik e M. Uiterwaal, advogados,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por E. Finnegan e G.‑J. Van Hegelsom e B. Driessen, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Reino dos Países Baixos, representado por C. Wissels, M. de Mol e Y. de Vries, na qualidade de agentes,

e por

Comissão Europeia, representada por P. van Nuffel e S. Boelaert, na qualidade de agentes,

intervenientes,

que tem por objecto inicial, em substância, um pedido de anulação da Decisão 2007/445/CE do Conselho, de 28 de Junho de 2007, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 2580/2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo, dirigidas contra determinadas pessoas e entidades e que revoga as Decisões 2006/379/CE e 2006/1008/CE (JO L 169, p. 58), na medida em que diz respeito à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção),

composto por: N. J. Forwood (relator), presidente, S. Papasavvas e E. Moavero Milanesi, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Novembro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico e antecedentes do litígio

1        Para uma exposição do quadro jurídico e dos antecedentes do presente litígio, remete‑se para o acórdão do Tribunal de 11 de Julho de 2007, Al‑Aqsa/Conselho (T‑327/03, não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão Al‑Aqsa»), especialmente para os n.os 16 a 21, nos quais são descritos os procedimentos administrativos e jurisdicionais de que foi objecto a recorrente, Stichting Al‑Aqsa, nos Países Baixos, que deram lugar ao Sanctieregeling terrorisme 2003 (decreto de sanções em matéria de terrorismo, a seguir «Sanctieregeling»), adoptado pelos ministros neerlandeses dos Negócios Estrangeiros e das Finanças em 3 de Abril de 2003, à nota oficial do director do Algemene Inlichtingen‑ en Veiligheidsdienst (serviço geral de informações e de segurança, a seguir «AIVD») à atenção do director‑geral dos assuntos políticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros neerlandês de 9 de Abril de 2003 (a seguir «nota do AIVD»), à sentença interlocutória do Rechtbank te ‘s‑Gravenhage, sector civiel recht, voorzieningenrechter [tribunal de comarca de Haia (Países Baixos), secção direito civil, juiz das medidas provisórias, a seguir «juiz das medidas provisórias»] de 13 de Maio de 2003 (a seguir «sentença interlocutória de medidas provisórias») e à sentença definitiva do mesmo juiz de 3 de Junho de 2003 (a seguir «sentença de medidas provisórias»).

2         No acórdão Al‑Aqsa, o Tribunal anulou a Decisão 2006/379/CE do Conselho, de 29 de Maio de 2006, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 2580/2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades, e que revoga a Decisão 2005/930/CE (JO L 144, p. 21), na medida em que dizia respeito à recorrente, essencialmente com o fundamento de que tal decisão não estava adequadamente fundamentada.

3        Por carta de 23 de Abril de 2007, o Conselho da União Europeia indicou à recorrente que considerava que os motivos invocados para o incluir na lista anexa ao Regulamento (CE) n.° 2580/2001 do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades (JO L 344, p. 72, rectificação no JO 2007, L 164, p. 36, a seguir «lista controvertida» permaneciam válidos e que, consequentemente, tencionava mantê‑lo nessa lista. A esta carta juntava‑se uma exposição dos motivos invocados pelo Conselho. Indicava‑se igualmente à recorrente que podia apresentar observações ao Conselho sobre a intenção deste de o manter na lista e sobre os motivos que invocava a este respeito, bem como todos os documentos em apoio, no prazo de um mês.

4        Na exposição de motivos junta à referida carta, o Conselho assinalou o seguinte:

«A [recorrente] foi constituída em 1993 nos Países Baixos como fundação de direito neerlandês. Angariou fundos para certas organizações pertencentes ao movimento palestiniano Hamas, que figura na lista dos grupos implicados em actos de terrorismo na acepção do artigo 1.°, n.° 2, da Posição Comum 2001/931/PESC [do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo (JO L 344, p. 93)]. Várias dessas organizações disponibilizam fundos com vista à prática de actos de terrorismo ou a facilitar a sua prática. Esses actos estão abrangidos pelo artigo 1.°, n.° 3, [alínea] k), da Posição Comum 2001/931 e são cometidos com os objectivos mencionados no artigo 1.°, n.° 3, [alíneas] i) e iii), da referida Posição Comum.

Consequentemente, a [recorrente] cai sob a alçada do artigo 2.°, n.° 3, [alínea] ii), do Regulamento [...] n.° 2580/2001.

O Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Ministro das Finanças [neerlandeses] decidiram, por decreto ministerial DJZ/BR/219‑03, de 3 de Abril de 2003 (denominado Sanctieregeling Terrorisme), publicado no Staatscourant (Jornal Oficial) neerlandês em 7 de Abril de 2003, congelar todos os activos pertencentes à [recorrente]. Esta decisão foi ratificada pela sentença LJN AF9389 de 3 de Junho de 2003 do presidente da secção de direito civil do tribunal de comarca de Haia. Nesta sentença conclui‑se que a [recorrente] deve ser considerada uma organização que apoia o Hamas e que permite a este último praticar ou facilitar actividades terroristas.

Em consequência, foi adoptada uma decisão em relação à [recorrente] por uma autoridade competente, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931.

O Conselho está convencido de que os motivos que justificaram a inclusão da [recorrente] na [lista controvertida] permanecem válidos.»

5        É ponto assente que o decreto ministerial e a sentença evocadas na referida exposição de motivos são a Sanctieregeling e a sentença de providência cautelares.

6        Por carta de 25 de Maio de 2007, a recorrente apresentou ao Conselho as suas observações de resposta. Criticava tanto os motivos substantivos invocados pelo Conselho para justificar a sua manutenção na lista controvertida como o procedimento seguido pelo mesmo.

7        Em 28 de Junho de 2007, ou seja, após a audiência de alegações no processo que deu origem ao acórdão Al‑Aqsa, que decorreu em 16 de Janeiro de 2007, mas antes da prolação deste, o Conselho adoptou a Decisão 2007/445/CE, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 2580/2001 e que revoga as Decisões 2006/379/CE e 2006/1008/CE (JO L 169, p. 58, a seguir «decisão impugnada»). Nesta decisão, o Conselho manteve o nome da recorrente na lista controvertida.

8        Nos termos do quarto considerando da decisão impugnada:

«O Conselho procedeu a uma completa revisão da lista de pessoas, grupos e entidades a que o Regulamento (CE) n.° 2580/2001 se aplica, tal como requerido pelo n.° 3 do artigo 2.° do referido regulamento. A este respeito, teve em consideração as observações e documentos que lhe foram apresentados por certas pessoas, grupos e entidades em causa.»

9        Nos termos do quinto considerando da decisão impugnada:

«Na sequência dessa revisão, o Conselho concluiu que as pessoas, grupos e entidades constantes da lista em anexo da presente decisão estiveram envolvidas em actos terroristas na acepção dos n.os 2 e 3 do artigo 1.° da Posição Comum [2001/931], foram objecto de uma decisão tomada por uma autoridade competente na acepção do n.° 4 do artigo 1.° da referida posição comum, e deverão continuar a estar sujeitas às medidas restritivas específicas previstas no Regulamento (CE) n.° 2580/2001.»

10      A decisão impugnada foi notificada à recorrente numa carta do Conselho de 29 de Junho de 2007. A exposição de motivos junta a essa carta (a seguir «exposição de motivos») é idêntica à que tinha sido junta à carta do Conselho de 23 de Abril de 2007 (v. n.° 3 supra).

 Tramitação processual e novos desenvolvimentos no decurso da instância

11      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal em 12 de Setembro de 2007, a recorrente interpôs o presente recurso, que tinha como objecto inicial, em substância, um pedido de anulação parcial da decisão impugnada.

12      Em 20 de Dezembro de 2007, o Conselho adoptou a Decisão 2007/868/CE, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a decisão impugnada (JO L 340, p. 100). Esta decisão mantém o nome da recorrente na lista controvertida.

13      Por despacho de 21 de Fevereiro de 2008, ouvidas as partes, o presidente da Sétima Secção do Tribunal admitiu a intervenção do Reino dos Países Baixos e da Comissão das Comunidades Europeias e do Reino em apoio dos pedidos do Conselho.

14      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal em 12 de Junho de 2008, a recorrente pediu para adaptar o seu pedido de modo a que o seu recurso tivesse igualmente por objecto a anulação da Decisão 2007/868, na medida em que esta lhe diz respeito. Nas suas observações sobre este pedido, apresentadas na Secretaria do Tribunal em 10 e 17 de Julho de 2008, o Conselho indicou que não se opunha a essa adaptação.

15      Em 15 de Julho de 2008, o Conselho adoptou a Decisão 2008/583/CE que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2007/868 (JO L 188, p. 21). Esta decisão mantém o nome da recorrente na lista controvertida.

16      Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal em 10 de Setembro de 2008, a recorrente pediu para adaptar o seu pedido de modo a que o seu recurso tivesse igualmente por objecto a anulação da Decisão 2008/583, na medida em que esta lhe diz respeito. Nas suas observações sobre este pedido, apresentadas na Secretaria do Tribunal em 10 de Outubro de 2008, o Conselho indicou que não se opunha a essa adaptação. Nas suas observações, respectivamente apresentadas na Secretaria em 6 e 14 de Outubro de 2008, o Reino dos Países Baixos e a Comissão não levantaram objecções.

17      Em 26 de Janeiro de 2009, o Conselho adoptou a Decisão 2009/62/CE, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2008/583 (JO L 23, p. 25). Esta decisão mantém o nome da recorrente na lista controvertida.

18      Em 15 de Junho de 2009, o Conselho adoptou o Regulamento n.° 501/2009, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2009/62 (JO L 151, p. 14). Este regulamento mantém o nome da recorrente na lista controvertida.

19      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Sétima Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do seu Regulamento de Processo, apresentou por escrito duas questões às partes.

20      Em primeiro lugar, o Tribunal declarou que o pedido de adaptação dos pedidos de anulação tendo por objecto a Decisão 2007/868 tinha sido apresentado depois de terminado o prazo de dois meses a contar da publicação ou da notificação dessa decisão, previsto no artigo 230.°, quinto parágrafo, CE, pelo que, na data da apresentação desse pedido, tinha prescrito o direito de a recorrente apresentar, mediante petição, um recurso de anulação contra o referido acto. Embora não tenha sido suscitada nenhuma objecção a este respeito pelos recorridos ou pelos intervenientes, o Tribunal, após recordar que, segundo jurisprudência constante, a questão de saber se um recurso foi interposto fora de prazo constitui um fundamento de inadmissibilidade de ordem pública e pode, ou deve, ser suscitada oficiosamente pelo juiz comunitário, convidou as partes a pronunciarem‑se por escrito sobre a questão de saber se o referido prazo de dois meses se aplica igualmente quando o recurso de anulação de um acto comunitário é apresentado não por meio de petição mas num requerimento de adaptação do pedido de anulação de um acto anterior revogado e substituído pelo acto em questão, adaptação admitida em princípio pelo juiz comunitário em nome da boa administração da justiça e de uma exigência de economia processual.

21      Em segundo lugar, o Tribunal convidou as partes principais a tomarem expressamente posição por escrito sobre certas observações feitas pelo Reino dos Países Baixos nas suas alegações de intervenção, quanto à faculdade que a recorrente teve, por um lado, de interpor recurso da sentença de medidas provisórias e, por outro, de interpor um recurso perante o juiz do mérito.

22      As partes responderam por escrito a estas questões dentro dos prazos que lhes foram fixados.

23      Na sua resposta escrita às questões do Tribunal, apresentada na Secretaria em 28 de Outubro de 2009, a recorrente pediu para adaptar o seu pedido de modo a que o seu recurso tivesse igualmente por objecto a anulação das Decisões 2008/583 (identificada, devido a um erro de escrita, como «Decisão2008/538») e 2009/62, bem como do Regulamento n.° 501/2009, na medida em que estes actos lhe dizem respeito. O Tribunal convidou as outras partes a apresentarem oralmente observações sobre este pedido na audiência.

24      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas do Tribunal na audiência de 25 de Novembro de 2009. No decurso das alegações orais, a recorrente precisou quais os actos cuja anulação requer, na medida em que lhe dizem respeito. O recorrido e os intervenientes declaram que não se opunham, em princípio, à adaptação do pedido, requerida pela recorrente na sua resposta escrita às questões do Tribunal, circunstância que este fez consignar na acta da audiência.

25      Em 22 de Dezembro de 2009, o Conselho adoptou o Regulamento de execução (UE) n.° 1285/2009, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga o Regulamento (CE) n.° 501/2009 (JO L 346, p. 39). Este regulamento mantém o nome da recorrente na lista controvertida.

 Pedidos das partes

26      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada, as Decisões 2007/868, 2008/583 e 2009/62, bem como o Regulamento n.° 501/2009, na medida em que estes actos lhe dizem respeito;

–        declarar que Regulamento n.° 2580/2001 não lhe é aplicável;

–        condenar o Conselho nas despesas.

27      Nas suas observações sobre as alegações de intervenção do Reino dos Países Baixos, a recorrente propõe‑se, caso o Tribunal o deseje, fornecer provas sobre a natureza e o carácter dos procedimentos cautelares em direito neerlandês, bem como sobre as competências do juiz das medidas provisórias, consistentes na audição de peritos e/ou na apresentação de manuais de direito.

28      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–      negar provimento ao recurso na totalidade;

–        condenar a recorrente nas despesas.

29      O Reino dos Países Baixos e a Comissão apoiam os pedidos do Conselho.

 Questão de direito

1.     Quanto às consequências processuais da revogação da decisão impugnada e da sua substituição por outros actos no decurso da instância

30      Como resulta do exposto, posteriormente à apresentação da petição, a decisão impugnada foi revogada e substituída, inicialmente pela Decisão 2007/868, pela Decisão 2008/343, depois pela Decisão 2008/583, pela Decisão 2009/62, pelo Regulamento n.° 501/2009 e, por último, pelo Regulamento n.° 501/2009. A recorrente pediu sucessivamente autorização para adaptar os seus pedidos iniciais para que o seu recurso abrangesse a anulação dessas três decisões e do Regulamento n.° 501/2009, na medida em que esses actos lhe dizem respeito. Em contrapartida, até à data da prolação do presente acórdão, não pediu para adaptar os seus pedidos de modo a que o seu recurso abrangesse igualmente a anulação do Regulamento de execução n.° 1285/2009. Por outro lado, manteve os seus pedidos de anulação dos actos anteriores revogados e substituídos.

31      Há que deferir estes pedidos e considerar que a recorrente tem o direito de pedir a anulação da decisão impugnada, das Decisões 2007/868, 2008/583 e 2009/62, bem como do Regulamento n.° 501/2009, na medida em que esses actos lhe dizem respeito, sem que haja necessidade de distinguir, no caso vertente, consoante os referidos pedidos tenham sido ou não apresentados no prazo de dois meses a contar da publicação ou da notificação do acto a que se referem, previsto no artigo 230.°, quinto parágrafo, CE.

32      A este respeito, o Tribunal considera que o referido prazo é, em princípio, aplicável tanto quando o recurso de anulação de um acto é interposto mediante petição como quando é apresentado, no âmbito de uma instância pendente e em conformidade com a jurisprudência iniciada pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Março de 1982, Alpha Steel/Comissão (14/81, Recueil, p. 749, n.° 8), mediante um pedido de adaptação do pedido de anulação de um acto anterior revogado e substituído pelo acto em questão.

33      Com efeito, esta solução justifica‑se pela circunstância de as regras relativas aos prazos de recurso serem de ordem pública e deverem ser aplicadas pelo juiz de modo a garantir a segurança jurídica e a igualdade dos litigantes perante a lei (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Janeiro de 2007, PKK e KNK/Conselho, C‑229/05 P, Colect., p. I‑439, n.° 101), evitando qualquer discriminação ou tratamento arbitrário na administração da justiça (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Janeiro de 1987, Misset/Conselho, 152/85, Colect., p. 223, n.° 11).

34      Todavia, em derrogação a este princípio, o Tribunal considera, à semelhança do Conselho e da Comissão, que o referido prazo não é aplicável, no âmbito de uma instância pendente, quando, por um lado, o acto em questão e o acto por este revogado e substituído têm, em relação ao interessado, o mesmo objecto, se baseiam, no essencial, nos mesmos motivos e têm conteúdos substancialmente idênticos, apenas diferindo, portanto, no que respeita aos respectivos âmbitos de aplicação ratione temporis, e, por outro, o pedido de adaptação do pedido não se baseie em nenhum fundamento, facto ou elemento de prova novo para além da própria adopção do acto em questão que revoga e substitui o acto anterior. É precisamente o que acontece no caso vertente, como todas as partes reconheceram nas suas observações escritas e orais em resposta às questões do Tribunal.

35      Em tal situação, com efeito, dado que o objecto e o quadro do litígio, conforme delimitados pelo recurso inicial, não sofrem outra modificação que não seja a relativa à sua dimensão temporal, a segurança jurídica não é minimamente afectada pela a circunstância de o pedido de adaptação do pedido ter sido apresentado após expirar o prazo de dois meses em questão.

36      Esta excepção está igualmente justificada tendo em conta as obrigações que decorrem de um acórdão de anulação para a instituição autora do acto anulado em aplicação das medidas cuja adopção lhe é imposta pelo artigo 233.° CE para dar execução ao acórdão.

37      Importa recordar que, para dar cumprimento a esse acórdão, a instituição é obrigada a respeitar não apenas o dispositivo do acórdão mas igualmente os fundamentos que constituem o seu sustentáculo necessário, no sentido de que estes são indispensáveis para determinar o sentido exacto do que foi decidido no dispositivo. Com efeito, são esses fundamentos que, por um lado, identificam exactamente a disposição considerada ilegal e, por outro, revelam as razões exactas da ilegalidade declarada no dispositivo, que devem ser tomadas em consideração pela instituição ao substituir o acto anulado (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1988, Asteris e o./Comissão, 97/86, 99/86, 193/86 e 215/86, Colect., p. 2181, n.° 27).

38      Mas, embora a declaração da ilegalidade nos fundamentos do acórdão de anulação obrigue, em primeiro lugar, a instituição autora do acto a eliminar essa ilegalidade no acto destinado a substituir o acto anulado, essa declaração pode igualmente, na medida em que vise uma disposição de conteúdo determinado numa dada matéria, implicar outras consequências para essa instituição (acórdão Asteris e o./Comissão, referido, n.° 28).

39      Tratando‑se, como no caso vertente, da anulação de uma decisão de congelamento de fundos que, nos termos do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931, deve ser regularmente revista, a instituição autora da mesma fica obrigada, em primeiro lugar, a velar por que eventuais decisões de congelamento de fundos subsequentes que sejam adoptadas após a anulação, para regular períodos posteriores a este acórdão, não estejam feridas dos mesmos vícios ou ilegalidades (acórdão do Tribunal Geral de 23 de Outubro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho, T‑256/07, Colect., p. II‑3019, a seguir «acórdão PMOI I», n.° 62; v., por analogia, acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, n.° 29).

40      Importa ainda admitir que, devido ao efeito retroactivo inerente aos acórdãos de anulação, a declaração de ilegalidade produz efeitos a partir da data da entrada em vigor do acto anulado (acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, n.° 30).

41      No presente caso, isso poderia implicar que, em caso de anulação da decisão impugnada, o Conselho tivesse igualmente a obrigação de eliminar de todas as medidas sucessivas de congelamento dos fundos que revogaram e substituíram a decisão impugnada, até à prolação do acórdão de anulação, os vícios ou ilegalidades que afectaram esta última decisão (v., neste sentido e por analogia, acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, n.° 30, e acórdão PMOI I, n.° 64).

42      Em circunstâncias como as do presente processo, descritas no n.° 34, supra, qualquer declaração de ilegalidade do congelamento dos fundos da recorrente, efectuado pela decisão impugnada, poderia portanto impor‑se não apenas no que respeita ao período em que tal decisão esteve em vigor, mas também aos períodos de validade de todas as medidas subsequentes de congelamento dos fundos impugnadas no decurso da instância (v., neste sentido e por analogia, acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, n.° 31).

43      Ao recusar dar cumprimento à obrigação definida no n.° 41 supra, o Conselho viola as obrigações que lhe são impostas pelo artigo 233.° CE e que o procedimento do artigo 232.° CE permite sancionar (v., neste sentido e por analogia, acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, n.° 32).

44      Nestas condições, e no espírito da jurisprudência referida nos n.os 45 a 48 do acórdão PMOI I, seria contrário a uma boa administração da justiça e a uma exigência de economia processual obrigar a recorrente, sob pena de inadmissibilidade, a apresentar o seu pedido de adaptação do seu pedido, no decurso da instância, no prazo de dois meses previsto no artigo 230.°, quinto parágrafo, CE.

45      Finalmente, cabe recordar que, segundo jurisprudência assente em matéria de recursos contra medidas sucessivas de congelamento de fundos adoptadas nos termos do Regulamento n.° 2580/2001, a recorrente mantém interesse em obter a anulação de todos os actos impugnados no quadro do presente recurso, embora estes tenham sido revogados e substituídos por outros à data da prolação do acórdão (v., neste sentido, acórdão PMOI I, n.° 48, e jurisprudência referida).

2.     Quanto aos pedidos de anulação

46      Dado que são idênticas as exposições de motivos respectivamente invocadas pelo Conselho para justificar a decisão impugnada, as Decisões 2007/868, 2008/583 e 2009/62, bem como o Regulamento n.° 501/2009, os fundamentos invocados em apoio do pedido de anulação destes actos são‑no igualmente. Assim, a seguir, no presente acórdão, qualquer referência à decisão impugnada deve entender‑se igualmente feita às Decisões 2007/868, 2008/583 e 2009/62, bem como ao Regulamento n.° 501/2009.

47      A este respeito, a recorrente invoca, em substância, cinco fundamentos. O primeiro, que se subdivide em quatro partes, é relativo à violação do artigo 1.°, n.os 1, 2 e 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001. O segundo é relativo à violação do princípio da proporcionalidade. O terceiro, à violação do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931, do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 e de uma formalidade essencial. O quarto é relativo à violação do direito fundamental ao gozo pacífico da sua propriedade. O quinto, finalmente, à violação do dever de fundamentação previsto no artigo 253.° CE.

48      Deve começar por se examinar o primeiro fundamento, passando seguidamente ao exame do terceiro.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 1.°, n.os 1, 2 e 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001

49      Este fundamento está dividido em quatro partes, baseadas, respectivamente, no facto de a recorrente não ser uma pessoa, grupo ou entidade na acepção das disposições cuja violação é alegada, de nenhuma autoridade competente ter tomado uma decisão a seu respeito, na acepção das mesmas disposições, de não ter ficado provado que a recorrente tinha a intenção de facilitar a prática de actos de terrorismo e, finalmente, de já não se poder considerar que a recorrente facilitou a prática de tais actos.

 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

50      A recorrente considera que não corresponde à definição de «pessoas, grupos e entidades envolvidas em actos terroristas», na acepção do artigo 1.°, n.° 2, da Posição Comum 2001/931. Por conseguinte, decorre do artigo 1.°, n.° 1, da referida Posição Comum que nem esta nem, consequentemente, o Regulamento n.° 2580/2001, que lhe dá execução, lhe são aplicáveis.

51      Na verdade, por um lado, uma vez que não é uma pessoa singular, a recorrente considera não ser abrangida pelo artigo 1.°, n.° 2, primeiro travessão, da Posição Comum 2001/931, a qual, em sua opinião, apenas abrange pessoas singulares, excluindo portanto as pessoas colectivas. Invoca, neste sentido, a dupla a circunstância de o segundo travessão desta disposição distinguir os grupos, entidades e pessoas, e de a lista controvertida apenas citar pessoas singulares na rubrica «Pessoas», ao passo que várias outras pessoas colectivas são citadas na rubrica «Grupos e entidades».

52      Por outro lado, a recorrente não é manifestamente abrangida pelo artigo 1.°, n.° 2, segundo travessão, da referida Posição Comum, uma vez que, nos próprios termos da exposição de motivos, apenas lhe é imputado o facto de ter angariado fundos para certas organizações que pertencem ao Hamas, as quais, por sua vez, disponibilizaram esses fundos para permitir ou facilitar a prática de actos terroristas.

53      A recorrente precisa, na réplica, que esta parte do fundamento é relativa à incompetência do Conselho para incluir as pessoas colectivas no âmbito de aplicação do artigo 2.°, n.° 3, ii), do Regulamento n.° 2580/2001. Ao fazê‑lo, o Conselho ultrapassou segundo a recorrente, o domínio de aplicação da Posição Comum 2001/931.

54      O Conselho, apoiado pelo Reino dos Países Baixos e pela Comissão, contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

55      O artigo 1.°, n.° 2, da Posição Comum 2001/931 dispõe:

«Para efeitos da presente posição comum, entende‑se por ‘pessoas, grupos e entidades envolvidas em actos terroristas’:

–        pessoas que pratiquem ou tentem praticar actos terroristas, neles participem ou os facilitem;

–        grupos e entidades directa ou indirectamente possuídas ou controladas por essas pessoas; e pessoas, grupos e entidades que actuem em nome ou sob a orientação dessas pessoas, grupos e entidades, incluindo fundos obtidos a partir de bens directa ou indirectamente possuídos ou controlados por essas pessoas e por pessoas, grupos e entidades a elas associadas, ou provenientes desses bens.»

56      A tese da recorrente, segundo a qual o termo «pessoas», no primeiro travessão desta disposição, apenas abrange as pessoas singulares, não pode ser acolhida.

57      Com efeito, na sua acepção jurídica usual, à qual há que se referir na falta de uma indicação expressa em contrário do legislador, o termo «pessoa» designa um ser que goza de personalidade jurídica, e, por conseguinte, tanto uma pessoa singular como uma pessoa colectiva.

58      As «pessoas» visadas pelo artigo 1.°, n.° 2, primeiro travessão, da Posição Comum 2001/931 podem assim designar tanto pessoas singulares como pessoas colectivas, ao passo que os «grupos e entidades» visados pelo artigo 1.°, n.° 2, segundo travessão, da Posição Comum 2001/931 podem designar todos os outros tipos de organizações sociais que, embora sem personalidade jurídica, têm uma certa forma de existência mais ou menos estruturada.

59      Como assinala acertadamente o Conselho, esta interpretação é confirmada pelo artigo 1.°, n.° 5, da Posição Comum 2001/931, nos termos do qual «[o] Conselho deve garantir que os nomes das pessoas singulares ou colectivas, grupos ou entidades enunciados no anexo incluam elementos suficientes que permitam a identificação efectiva de indivíduos, pessoas colectivas, entidades ou organismos».

60      Assim, enquanto pessoa colectiva, a recorrente é efectivamente abrangida, contrariamente ao que defende, pelo âmbito de aplicação do artigo 1.°, n.° 2, primeiro travessão, da Posição Comum 2001/931 e, consequentemente, igualmente pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 2580/2001.

61      A circunstância, alegada pela recorrente, segundo a qual a lista anexa à Posição Comum 2001/931 e a lista controvertida apenas mencionam pessoas singulares na rubrica «Pessoas», ao passo que várias pessoas colectivas, entre as quais ela própria, são mencionadas na rubrica «Grupos e entidades», é desprovida de pertinência a este respeito. Estas listas, elaboradas unicamente com vista a dar execução, nos casos individuais que enumeram, à Posição Comum 2001/931 e ao Regulamento n.° 2580/2001, não têm efectivamente incidência na definição das «pessoas, grupos e entidades» contida nos referidos actos. O mesmo acontece, consequentemente, no que respeita aos eventuais erros de classificação entre «pessoas» e «grupos e entidades» que pudessem conter.

62      Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

63      A recorrente sustenta que, contrariamente ao que é afirmado na exposição de motivos, nenhuma autoridade competente tomou uma decisão a seu respeito, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931. Por conseguinte, considera não ser abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 2580/2001.

64      Com efeito, nem a Sanctieregeling nem a sentença de medidas provisórias pertencem a uma das quatro categorias de decisões a que esta disposição se aplica, ou seja, a instauração de um inquérito ou de um processo por acto terrorista, por tentativa de prática desse acto, por participação ou facilitação de tal acto, ou uma condenação por esses factos. Em especial, através da sua sentença, o juiz das medidas provisórias limitou‑se a indeferir provisoriamente as pretensões da recorrente, sem tomar uma decisão a seu respeito na acepção da referida disposição.

65      A título subsidiário, a recorrente defende que nem os ministros autores da Sanctieregeling nem o juiz das medidas provisórias, presidente da secção cível do tribunal de Haia, podem ser considerados autoridades competentes na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931.

66      Com efeito, por um lado, estas autoridades não têm competência em matéria de instauração de inquéritos ou de processos relativos a actividades terroristas, dado que, nos Países Baixos, estes são da competência exclusiva do officier van justitie (procurador da Rainha).

67      Por outro, estas autoridades não têm competência para decretarem condenações por actividades terroristas, uma vez que estas são da competência exclusiva do strafrechter (juiz penal).

68      Ainda mais subsidiariamente, a recorrente alega que, contrariamente ao que é afirmado na exposição de motivos, o juiz das medidas provisórias não «ratificou» a Sanctieregeling. Limitou‑se, segundo a recorrente, no quadro de um procedimento provisório, a indeferir o pedido da recorrente para que o Governo neerlandês fosse proibido de congelar os seus activos. De resto, considera que um decreto ministerial tem, por definição, força de lei e não pode nunca ser «ratificado» por um acto de uma autoridade judicial.

69      Na réplica, a recorrente salienta ainda que se o juiz das medidas provisórias é efectivamente, como afirma o Conselho, uma autoridade «judicial» competente, então os ministros não podem ser uma autoridade «equivalente» na matéria, uma vez que tais autoridades se excluem mutuamente, como resulta dos próprios termos do artigo 1.°, n.° 4, segundo parágrafo, da Posição Comum 2001/931. A tese do Conselho é portanto, na opinião da recorrente, contraditória e incompreensível.

70      Nas suas observações em resposta às alegações de intervenção do Reino dos Países Baixos, a recorrente acrescenta que nem a natureza das medidas provisórias em direito neerlandês nem o facto de não terem carácter penal são pertinentes para examinar o presente fundamento. Em sua opinião, são igualmente destituídas de pertinência as observações deste interveniente relativas à possibilidade de interpor recurso de uma sentença de medidas provisórias e ao facto de não ter desencadeado um processo em que fosse discutido o mérito da causa.

71      A título subsidiário, na medida em que o Tribunal pretenda obter provas no que respeita ao carácter, ao conteúdo e aos aspectos processuais do procedimento cautelar em direito neerlandês, a recorrente propõe‑se fornecer essas provas recorrendo à audição de peritos e/ou à apresentação de manuais de direito.

72      A recorrente sustenta ainda que, contrariamente ao que afirma o Reino dos Países Baixos, a enumeração das decisões referidas no artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 é limitativa. Esta interpretação é, em sua opinião, confirmada tanto pela letra desta disposição, especialmente na sua versão alemã, como pela lógica. Na disposição em causa, com efeito, o termo «decisão», de conteúdo indefinido e ilimitado, apenas adquire sentido graças à enumeração que se lhe segue. De qualquer modo, a enumeração em questão é importante e demonstra que deve tratar‑se de decisões de um tipo específico, equivalente ou muito semelhante quer à abertura de um inquérito quer a instauração de um processo ou ainda a uma condenação. No presente caso, a sentença de medidas provisórias não satisfaz manifestamente estas condições.

73      O Conselho, apoiado pelo Reino dos Países Baixos e pela Comissão, contesta os argumentos da recorrente.

74      O Conselho sublinha, em especial, que a decisão impugnada se baseia unicamente na sentença de medidas provisórias, a qual constitui, em sua opinião, uma decisão de uma autoridade competente, judicial neste caso, tomada em relação à recorrente, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931. O Conselho considera que isto resulta claramente da exposição de motivos, acrescentando, porém, que poderia ter igualmente considerado a Sanctieregeling como uma decisão de uma autoridade competente, na acepção desta mesma disposição.

75      Também o Reino dos Países Baixos sustenta que a sentença de medidas provisórias constitui a decisão da autoridade nacional competente que serviu de base à decisão do Conselho de inscrever a recorrente na lista controvertida.

–       Apreciação do Tribunal

76      Nos acórdãos de 12 de Dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho (T‑228/02, Colect., p. II‑4665, a seguir «acórdão OMPI»), PMOI I, de 4 de Dezembro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho (T‑284/08, a seguir «acórdão PMOI II»), e de 30 de Setembro de 2009, Sison/Conselho (T‑341/07, ainda não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão Sison II») o Tribunal precisou, e seguidamente confirmou, quais são: a) as condições de aplicação do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001; b) o ónus da prova que nesse contexto incumbe ao Conselho, e c) o alcance da fiscalização jurisdicional na matéria.

77      Como o Tribunal observou nos n.os 115 e 116 do acórdão OMPI, no n.° 130 do acórdão PMOI I, no n.° 50 do acórdão PMOI II e no n.° 92 do acórdão Sison II, os elementos de facto e de direitos que podem condicionar a aplicação de uma medida de congelamento de fundos a uma pessoa, a um grupo ou a uma entidade são determinados pelo artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001. Nos termos desta disposição, o Conselho, deliberando por unanimidade, elabora, revê e altera a lista das pessoas, grupos e entidades às quais o referido Regulamento se aplica, em conformidade com as disposições do artigo 1.°, n.os 4 a 6, da Posição Comum 2001/931. Assim, a lista em questão deve ser elaborada, de acordo com as disposições do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931, com base em informações precisas ou em elementos do processo que demonstrem que foi tomada uma decisão por uma autoridade competente relativa a pessoas, grupos e entidades visados, quer se trate da abertura de um inquérito ou de um processo por acto terrorista, tentativa, participação ou facilitação de tal acto, com base em provas e indícios sérios e credíveis, ou de uma condenação por esses factos. Entende‑se por «autoridade competente» a autoridade judiciária ou, sempre que esta não seja competente na matéria, a competente autoridade equivalente nessa matéria. Além do mais, os nomes das pessoas e entidades constantes da lista devem ser regularmente revistos, pelo menos uma vez por semestre, a fim de assegurar que a sua presença na lista continua a justificar‑se, de acordo com as disposições do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931.

78      No n.° 117 do acórdão OMPI, no n.° 131 do acórdão PMOI I, no n.° 51 do acórdão PMOI II e no n.° 93 do acórdão Sison II, o Tribunal deduziu destas disposições que o processo susceptível de levar à adopção de uma medida de congelamento de fundos ao abrigo da regulamentação pertinente decorre a dois níveis, um nacional e o outro comunitário. Num primeiro momento, uma autoridade nacional competente, em princípio judiciária, deve tomar em relação ao interessado uma decisão que corresponda à definição do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931. Se se tratar de uma decisão de abertura de inquéritos ou de processos, deve basear‑se em provas ou indícios sérios e credíveis. Num segundo momento, o Conselho, deliberando por unanimidade, deve decidir incluir o interessado na lista controvertida, com base em informações precisas ou elementos dos autos que demonstrem que essa decisão foi tomada. Seguidamente, o Conselho deve certificar‑se regularmente, pelo menos uma vez por semestre, de que a manutenção do interessado na lista controvertida continua a justificar‑se. A este respeito, a verificação da existência de uma decisão de uma autoridade nacional que corresponda à referida definição constitui uma condição prévia essencial à adopção, pelo Conselho, de uma decisão inicial de congelamento de fundos, ao passo que a verificação do seguimento dado a esta decisão a nível nacional se afigura indispensável no contexto da adopção de uma decisão subsequente de congelamento de fundos.

79      No n.° 123 do acórdão OMPI, no n.° 132 do acórdão PMOI I, no n.° 52 do acórdão PMOI II e no n.° 94 do acórdão Sison II, o Tribunal recordou, por outro lado, que, por força do artigo 10.° CE, as relações entre os Estados‑Membros e as instituições comunitárias são regidas por deveres recíprocos de cooperação leal (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Outubro de 2003, Irlanda/Comissão, C‑339/00, Colect., p. I‑11757, n.os 71 e 72, e jurisprudência referida). Este princípio é de aplicação geral e impõe‑se, designadamente, no âmbito da cooperação policial e judiciária em matéria penal [comummente designada «Justiça e Assuntos Internos» (JAI)] regulada pelo título VI do Tratado UE, que, de resto, é inteiramente baseada na cooperação entre os Estados‑Membros e as instituições (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Junho de 2005, Pupino, C‑105/03, Colect., p. I‑5285, n.° 42).

80      No n.° 124 do acórdão OMPI, no n.° 133 do acórdão PMOI I, no n.° 53 do acórdão PMOI II e no n.° 95 do acórdão Sison II, o Tribunal entendeu que, num caso de aplicação do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, disposições que instituem uma forma de cooperação específica entre o Conselho e os Estados‑Membros, no âmbito do combate ao terrorismo, o referido princípio impõe ao Conselho o dever de, na medida do possível, confiar na apreciação da autoridade nacional competente, pelo menos se se tratar de uma autoridade judiciária, designadamente no que respeita à existência das «provas ou dos indícios sérios [e credíveis]» nos quais assenta a decisão dessa autoridade.

81      Como já foi decidido no n.° 134 do acórdão PMOI I, no n.° 54 do acórdão PMOI II e no n.° 96 do acórdão Sison II, decorre do exposto que, embora o ónus da prova do facto de que o congelamento dos fundos de uma pessoa, de um grupo ou de uma entidade se justifica ou continua a justificar‑se, à luz da regulamentação pertinente, incumba ao Conselho, este ónus tem um objecto relativamente restrito, ao nível do procedimento comunitário de congelamento de fundos. No caso de uma decisão inicial de congelamento de fundos, este ónus abrange essencialmente a existência de informações precisas ou de elementos dos autos que demonstrem que uma autoridade nacional tomou, em relação ao interessado, uma decisão que corresponde à definição dada no artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931. Por outro lado, no caso de uma decisão subsequente de congelamento de fundos, após exame, o ónus da prova abrange essencialmente a questão de saber se o congelamento de fundos continua a justificar‑se atendendo a todas as circunstâncias pertinentes do caso concreto e, muito particularmente, ao seguimento dado à referida decisão da autoridade nacional competente.

82      Quanto à fiscalização exercida pelo Tribunal, este reconheceu, no n.° 159 do acórdão OMPI, no n.° 137 do acórdão PMOI I, no n.° 55 do acórdão PMOI II e no n.° 97 do acórdão Sison II, que o Conselho dispõe de um amplo poder de apreciação quanto aos elementos a considerar com vista à aplicação de sanções económicas e financeiras com base nos artigos 60.° CE, 301.° CE e 308.° CE, em conformidade com uma posição comum aprovada no âmbito da política externa e de segurança comum. Em particular, este poder de apreciação diz respeito às considerações de oportunidade em que essas decisões assentam.

83      No entanto, embora o Tribunal reconheça ao Conselho uma margem de apreciação na matéria, isso não implica que deva abster‑se de fiscalizar a interpretação, por esta instituição, dos dados pertinentes (v. acórdão PMOI I, n.° 138, acórdão PMOI II, n.° 55 e acórdão Sison II, n.° 98). Com efeito, o juiz comunitário deve, designadamente, verificar não só a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar a situação e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram. Porém, no âmbito desta fiscalização, não lhe compete substituir a apreciação do Conselho pela sua própria apreciação (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C‑525/04 P, Colect., p. I‑9947, n.° 57, e jurisprudência referida).

84      No caso vertente, importa antes de mais verificar, em conformidade com esta jurisprudência, se a decisão impugnada foi tomada com base em informações precisas ou em elementos dos autos que demonstrem que foi tomada em relação ao recorrente uma decisão que corresponde à definição do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931.

85      A este respeito, as exposições de motivos juntas, designadamente, às cartas do Conselho de 23 de Abril e de 29 de Junho de 2007 dirigidas à recorrente referem‑se, no seu n.° 3, a duas decisões relativamente às quais se poderia alegar a priori que foram tomadas por autoridades competentes na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931, a saber, a Sanctieregeling e sentença de medidas provisórias.

86      É certo que, no n.° 24 da sua resposta, o Conselho afirmou que tinha baseado a decisão impugnada unicamente na sentença de medidas provisórias, sustentando, no n.° 22 do mesmo articulado, que poderia igualmente tê‑la baseado na Sanctieregeling. Esta afirmação, que o Reino dos Países Baixos subscreveu, parece além disso ser confirmada, como o Conselho igualmente salientou, pela circunstância de as exposições de motivos notificadas à recorrente apenas mencionarem, na conclusão enunciada no seu n.° 4, «uma decisão tomada [em relação à recorrente] por uma autoridade competente na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931», no singular.

87      Dito isto, e contrariamente ao que acontecia com as decisões judiciais e com a Sanctieregeling em causa no processo que deu origem ao acórdão Sison II, não é possível, no caso vertente, tomar em consideração a sentença de medidas provisórias de forma isolada e sem ter simultaneamente em conta a Sanctieregeling, dado que esta está precisamente na origem do recurso ao juiz das medidas provisórias e que o pedido de suspensão da sua execução constituía o próprio objecto do litígio submetido à apreciação desse juiz (v., igualmente, acórdão Al‑Aqsa, n.° 18). É manifestamente neste sentido que há que entender a referência expressa e pormenorizada à Sanctieregeling, igualmente contida nas exposições de motivos.

88      Assim, no que respeita, em primeiro lugar, à Sanctieregeling, é verdade que esta constitui uma decisão de uma autoridade administrativa, e não judicial. Esta a circunstância não é, porém, determinante em si mesma. Como salienta acertadamente o Conselho, com efeito, a própria redacção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 prevê expressamente que uma autoridade não judicial pode igualmente ser qualificada de autoridade competente na acepção desta disposição.

89      Esta interpretação é de resto confirmada pela jurisprudência do Tribunal. Em especial, no processo que deu origem ao acórdão PMOI I (v. respectivo n.° 6), o Conselho tinha‑se baseado num despacho do Secretary of State for the Home Department (ministro do Interior do Reino Unido) que proibia a recorrente no referido processo, enquanto organização envolvida no terrorismo, ao abrigo do Terrorism Act 2000 (lei sobre o terrorismo de 2000). No n.° 144 do acórdão PMOI I, o Tribunal considerou que o referido despacho se afigurava efectivamente constituir, à luz da legislação nacional pertinente, uma decisão de uma autoridade nacional competente correspondente à definição do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931.

90      No caso vertente, é ponto assente (v., igualmente, acórdão Al‑Aqsa, n.° 16) que a Sanctieregeling foi adoptada em 3 de Abril de 2003 pelo ministro dos Negócios Estrangeiros neerlandês, de comum acordo com o ministro das Finanças, em conformidade com a Sanctiewet 1977 (lei sobre as sanções de 1977), conforme alterada em 16 de Maio de 2002, que confere a estas autoridades competência para congelar os fundos de pessoas e de entidades, no âmbito da execução da Resolução 1373 (2001) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 28 de Setembro de 2001, que adopta estratégias para combater por todos os meios o terrorismo, nomeadamente o seu financiamento. Trata‑se portanto de uma decisão muito semelhante, tanto do ponto de vista substancial como formal, à decisão em causa no processo PMOI I.

91      Por outro lado, não é alegado que uma decisão como a Sanctieregeling seja da competência das autoridades judiciais, a não ser no que respeita à fiscalização jurisdicional da sua legalidade.

92      Em segundo lugar, há que referir que a sentença de medidas provisórias constitui, em qualquer caso, uma decisão de uma autoridade judicial, proferida no termo de um procedimento no âmbito do qual estava precisamente em causa a legalidade aparente da Sanctieregeling, cuja suspensão da execução em conformidade com o direito neerlandês a recorrente pretendia obter.

93      Nestas circunstâncias, o argumento da recorrente segundo o qual o juiz das medidas provisórias se limitou a indeferir o seu pedido de suspensão da execução da Sanctieregeling, sem tomar uma «decisão» a seu respeito, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931, deve ser rejeitada, dado que resulta de uma leitura excessivamente formalista da sentença de medidas provisórias.

94      O mesmo se diga em relação ao argumento da recorrente segundo o qual o juiz das medidas provisórias, em bom rigor, não «ratificou» a Sanctieregeling.

95      Dito isto, é verdade que, tal como a Sanctieregeling, a sentença de medidas provisórias não constitui, em bom rigor, uma decisão de «abertura de inquéritos ou de processos relativos a um acto terrorista» e que também não contém uma «condenação» da recorrente, no estrito sentido penal do termo.

96      O Tribunal considera, porém, que, tendo em conta o seu conteúdo, o seu alcance e o seu contexto, a sentença de medidas provisórias, vista em conjunto com a Sanctieregeling, constitui efectivamente uma «decisão» tomada por uma autoridade competente, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001.

97      A este respeito, deve recordar‑se que, para interpretar o alcance de uma disposição de direito comunitário, há que ter simultaneamente em conta os seus termos, o seu contexto e os objectivos que prossegue (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Dezembro de 2005, Jyske Finans, C‑280/04, Colect., p. I‑10683, n.° 34, e jurisprudência referida).

98      Ora, há que reconhecer que as disposições em causa no presente caso não exigem que a «decisão» nacional se inscreva no quadro de um procedimento penal em sentido estrito, embora essa seja a situação mais frequente. Isto é confirmado pelo artigo 1.°, n.° 4, segundo parágrafo, da Posição Comum 2001/931, que, ao prever expressamente a possibilidade de as autoridades judiciais não serem «competentes na matéria abrangida» pelo número em questão, implica que tais decisões poderiam pertencer a um domínio diferente do direito penal em sentido estrito. Do mesmo modo, o artigo 1.°, n.° 4, primeiro parágrafo, segundo período, da Posição Comum 2001/931 prevê que podem ser incluídas na lista as pessoas, grupos e entidades identificados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas como estando ligadas ao terrorismo e contra os quais tenha ordenado sanções. Ora, as sanções decididas pelo Conselho de Segurança não têm necessariamente natureza penal (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, Colect., p. I‑6351, n.° 358, e acórdão do Tribunal de 11 de Julho de 2007, Sison/Conselho, T‑47/03, não publicado na Colectânea, a seguir «acórdão Sison I», n.° 101).

99      Nestas condições, deve ser afastado por não ser pertinente o argumento da recorrente segundo o qual os inquéritos e os processos penais, por um lado, e as condenações penais, por outro, são, respectivamente, da competência exclusiva do officier van justitie e do strafrechter.

100    Tendo em conta os objectivos prosseguidos pelas disposições em causa no presente processo, no âmbito da execução da Resolução 1373 (2001) do Conselho de Segurança, o procedimento nacional em questão deve no entanto ter por objecto o combate ao terrorismo em sentido amplo.

101    No acórdão Sison II (n.° 111), o Tribunal considerou que, tendo em conta tanto os termos, o contexto e os objectivos das disposições em causa no caso concreto (v., em particular, o primeiro considerando da exposição de motivos da Posição Comum 2001/931), como o papel preponderante desempenhado pelas autoridades nacionais no processo de congelamento de fundos previsto no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, uma decisão de «abertura de inquéritos ou de processos» deve, para poder ser validamente invocada pelo Conselho, inscrever‑se no âmbito de um processo nacional destinado directa e principalmente à imposição de uma medida preventiva ou repressiva contra o interessado, a título do combate ao terrorismo e devido ao seu envolvimento neste. Não satisfaz esta exigência a decisão de uma autoridade judiciária nacional que só a título acessório e incidental se pronuncie sobre o possível envolvimento do interessado numa actividade como esta, no âmbito de um litígio relativo, por exemplo, a direitos e obrigações de carácter civil.

102    Ora, contrariamente às decisões judiciais em causa no processo que deu origem ao acórdão Sison II, a sentença de medidas provisórias invocada no presente caso pelo Conselho inscreve‑se de maneira suficientemente directa no âmbito de um processo nacional que tem por principal objectivo a adopção de uma medida de sanção económica contra a interessada, ou seja, o congelamento dos seus fundos efectuado através da própria Sanctieregeling, devido ao seu envolvimento numa actividade terrorista (v. n.° 90 supra).

103    A este respeito, a recorrente afirma com razão que nem a natureza do procedimento cautelar em direito neerlandês nem o facto de não ter carácter penal são pertinentes para essa apreciação. Assim, não se afigura necessário dar seguimento à proposta de oferecimento de provas feita pela recorrente sobre estas questões (v. n.os 27 e 71 supra).

104    A sentença de medidas provisórias, considerada juntamente com a Sanctieregeling, afigura‑se assim, à luz da legislação nacional pertinente, como uma decisão de uma autoridade nacional competente que corresponde à definição do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931.

105    Podia portanto considerar‑se que tal decisão, na época em que foi tomada, juntamente com a Sanctieregeling, satisfazia as exigências do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e podia, em consequência, em princípio, justificar enquanto tal a adopção de uma medida de congelamento dos fundos da recorrente em aplicação do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001.

106    A questão de saber se esta decisão podia ainda servir validamente de fundamento à decisão impugnada, na data da sua adopção, tendo em conta todas as circunstâncias pertinentes do caso vertente, particularmente o seguimento que lhe foi dado em direito nacional, será analisada quando se proceder ao exame do terceiro fundamento, o que se fará em seguida.

107    Com esta ressalva, a segunda parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à terceira parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

108    A recorrente sustenta que nem a exposição de motivos, nem a sentença de medidas provisórias, nem a Sanctieregeling, nem mesmo a nota do AIVD revelam a mais pequena intenção, falta ou conhecimento da sua parte no que respeita ao apoio a actividades terroristas. Ora, a prova destes elementos, que, na opinião da recorrente, incumbe ao Conselho, é determinante para a aplicação da Posição Comum 2001/931 e do Regulamento n.° 2580/2001, em especial do artigo 2.°, n.° 3, ii), deste, que visa as pessoas colectivas que «facilitem» a realização de actos terroristas.

109    O juiz das medidas provisórias, em particular, limitou‑se, na opinião da recorrente, a concluir que os fundos angariados pela recorrente tinham aproveitado a organizações ligadas ao Hamas e que estas tinham, por sua vez, colocado esses fundos à disposição deste movimento a fim de lhe permitir praticar ou facilitar actos terroristas (v., designadamente, n.° 3.2 da sentença de medidas provisórias). Assim, a afirmação contida na exposição de motivos, segundo a qual o juiz das medidas provisórias conclui que a recorrente devia ser considerada uma organização que apoia o Hamas e que permite a este último cometer ou facilitar actos terroristas, é inexacta. Pelo contrário, os termos utilizados pelo juiz das medidas provisórias indicam que não ficou minimamente provado que a recorrente soubesse ou devesse saber que os fundos que punha à disposição de outras organizações seriam utilizados para fins terroristas. A recorrente contesta ter tido tal conhecimento.

110    Na réplica, a recorrente acrescenta que a prova da sua boa‑fé resulta igualmente do facto de ter autorizado o juiz das medidas provisórias a tomar conhecimento do processo confidencial do AIVD.

111    Quanto às apreciações contidas por nota do AIVD, a recorrente precisa, em resposta às alegações de intervenção do Reino dos Países Baixos, que a circunstância de o juiz das medidas provisórias ter amplamente citado tal nota, nas suas duas sentenças, de modo nenhum significa que tenha aprovado todos os seus termos. Isto é válido, em especial, no que respeita ao pretenso papel activo desempenhado pela recorrente e pelos seus directores na angariação de fundos em proveito do Hamas.

112    Quanto ao argumento do Reino dos Países Baixos segundo o qual o termo «conhecimento» implica não apenas «saber», mas também ser «presumir‑se que devia saber», a recorrente salienta que não é comprovado pelos termos utilizados pelo legislador no artigo 1.°, n.° 3, alínea k), da Posição Comum 2001/931, quando facilmente poderia ter recorrido a outra formulação se essa tivesse sido a sua intenção.

113    De qualquer forma, nem sequer resulta da sentença de medidas provisórias que a recorrente «devesse saber» que os fundos que entregava eram utilizados para fins terroristas.

114    A este respeito, a recorrente acrescenta que, contrariamente ao que afirma o Reino dos Países Baixos, não resulta minimamente da sentença de medidas provisórias (em especial o seu n.° 3.4) que o juiz das medidas provisórias estivesse convencido de que a recorrente tivesse ou devesse ter tido conhecimento da utilização final dos seus fundos para fins terroristas.

115    A recorrente conclui que o Conselho cometeu um erro manifesto de apreciação ao supor que ela, recorrente, sabia que certas organizações às quais eram efectuados donativos estavam ligadas ao Hamas e que essas organizações, por sua vez, utilizavam esses fundos para cometer atentados terroristas.

116    Seja como for, a recorrente sublinha que a organização do Hamas só em 12 de Setembro de 2003 foi incluída enquanto tal na lista controvertida [pela Posição Comum 2003/651/PESC do Conselho, de 12 de Setembro de 2003, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo e que revoga a Posição Comum 2003/482/PESC (JO L 229, p. 42)] ou seja, posteriormente à sentença de medidas provisórias e mesmo após a medida comunitária inicial de congelamento dos fundos da recorrente. Antes dessa data, só o braço terrorista do Hamas, identificado nos actos pertinentes do Conselho como «Hamas‑Izz al‑Din al‑Qassem» [v., designadamente, Posição Comum 2003/482/PESC do Conselho, de 27 de Junho de 2003, que actualiza a Posição Comum 2001/931 e revoga a Posição Comum 2003/402/PESC (JO L 160, p. 100)], foi incluído nessa lista. A recorrente conclui que, até 12 de Setembro de 2003, um cidadão europeu médio, e portanto também ela própria, tinha o direito de considerar que os donativos entregues ao braço humanitário do Hamas não seriam utilizados para fins de terrorismo.

117    O Conselho, apoiado pelo Reino dos Países Baixos e pela Comissão, sustenta que, em conformidade com as disposições pertinentes aplicáveis, existe a prova, no presente caso, de que a recorrente tinha conhecimento de que a sua participação nas actividades do Hamas contribuiria para as actividades criminosas desse grupo.

118    O Reino dos Países Baixos acrescenta que, por «conhecimento», na acepção destas mesmas disposições, há que entender não apenas o facto de «saber», mas igualmente o facto de «dever saber» ou «presumir‑se que devia saber».

–       Apreciação do Tribunal

119    Como acertadamente salienta o Conselho, o próprio Regulamento n.° 2580/2001 não prevê expressamente que incumbe a esta instituição a obrigação de provar que o interessado tinha a «intenção» de praticar um acto de terrorismo, nele participar ou facilitar a sua realização. Todavia, a prova deste elemento intencional é exigida pela Posição Comum 2001/931, cujo artigo 1.°, n.° 3, alínea k), invocado contra a recorrente na exposição de motivos, dispõe que a participação nas actividades de um grupo terrorista deve implicar o «conhecimento de que essa participação contribui para as actividades criminosas desse grupo». Essa prova é, consequentemente, igualmente exigida pelo artigo 1.°, n.° 4, do Regulamento n.° 2580/2001, tendo em conta a redacção desta disposição.

120    Assim, importa verificar se essa prova foi devidamente feita no caso em apreço.

121    Resulta da exposição de motivos da Sanctieregeling que esta foi adoptada, na expectativa da adopção de uma decisão comunitária contra a recorrente com fundamento no Regulamento n.° 2580/2001, com base em indícios de transferências de fundos por ela efectuadas com destino a organizações que apoiam o terrorismo no Médio Oriente (v., igualmente, acórdão Al‑Aqsa, n.° 17).

122    A recorrente interpôs recurso contra o Reino dos Países Baixos para o juiz das medidas provisórias a fim de obter, designadamente, a suspensão da execução das medidas previstas pela Sanctieregeling.

123    Através da sentença interlocutória de medidas provisórias, o juiz das medidas provisórias declarou, nomeadamente, o seguinte:

«1. Factos

Tendo em conta as peças que constam dos autos e a audiência que decorreu em 6 de Maio de 2003, o [juiz das medidas provisórias] baseia‑se nos elementos de facto seguintes.

[...]

1.9.      Em 3 de Abril de 2003, o ministro dos Negócios Estrangeiros adoptou [a Sanctieregeling] [...]

1.10. A exposição de motivos da [Sanctieregeling] menciona que existem indícios que mostram que a [recorrente] transfere fundos para organizações que apoiam o terrorismo no Médio Oriente.

1.11. Por carta de 9 de Abril de 2003, o chefe do [AIVD] comunicou os seguintes factos ao director‑geral dos assuntos políticos do ministério dos Negócios Estrangeiros:

‘[...] A fim de confirmar comunicações feitas anteriormente, informo do seguinte. No quadro da execução da sua missão legal, o AIVD foi informado por fontes fidedignas, mas vulneráveis, dos seguintes factos.

A organização Al‑Aqsa, estabelecida nos Países Baixos, fundada em 24 de Agosto de 1983 [...], e cuja sede social se situa em Heerlen, angariou dinheiro nos Países Baixos em proveito de organizações ligadas ao Hamas no Médio Oriente. Várias dessas organizações disponibilizam dinheiro para levar a cabo ou facilitar actividades terroristas.

O AIVD concluiu que não é possível continuar a distinguir entre as actividades sociais e terroristas do Hamas. O Hamas, ao qual as organizações citadas que angariam fundos estão ligadas, deve ser considerado um ente organizacional que facilita tanto as actividades humanitárias como terroristas, sendo tais actividades complementares.

A fundação Al‑Aqsa mantém ou manteve contactos com organizações que angariam fundos em proveito do Hamas. A fundação Al‑Aqsa está ou esteve ligada à Al‑Aqsa na Alemanha (proibida em meados de 2002), à Al‑Aqsa na Dinamarca (activos congelados no final de 2002), à Al‑Aqsa na Bélgica, bem como com organizações que angariam fundos em proveito do Hamas no Reino Unido, em Itália, na Suíça, na Suécia e em França.

Existe uma acção colectiva internacional de angariação de fundos por parte das organizações que angariam fundos, incluindo a Al‑Aqsa Países Baixos, em proveito do Hamas, sob a denominação Union of the Good (em árabe Ittilaf Al‑Khair). O chefe da Union of the Good, que reside no Catar, autorizou no passado atentados suicidas por motivos religiosos. Até à proibição (da Al‑Aqsa) na Alemanha, o presidente da Al‑Aqsa Alemanha era igualmente presidente da Al‑Aqsa nos Países Baixos. Após a proibição da organização na Alemanha, um membro da direcção da Al‑Aqsa Bélgica que era igualmente membro da direcção neerlandesa, tornou‑se presidente da Al‑Aqsa nos Países Baixos [...]’

Esta comunicação oficial, completada por informações subjacentes, constitui o fundamento da [Sanctieregeling].

1.12. A pedido da [recorrente], decorreu em 17 de Abril de 2003 uma discussão informativa entre a direcção e os consultores da [recorrente] e os representantes do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Nesse encontro, a direcção da [recorrente] forneceu informações complementares sobre as actividades desta. Tais informações não levaram porém o [Reino dos Países Baixos] a retirar ou a adaptar as medidas tomadas contra a [recorrente]. Os pedidos posteriores formulados pela [recorrente] a este respeito não foram tomados em consideração pelo [Reino dos Países Baixos].

2.      O pedido, a sua fundamentação e a defesa

A [recorrente] pede, em substância:

[...]

Para este efeito, a [recorrente] invoca os seguintes elementos.

As acusações contra a [recorrente] não são sustentadas por factos suficientemente estabelecidos. A comunicação oficial do AIVD não constitui um fundamento suficiente para estas acusações. Além disso, [o Reino dos Países Baixos] comunicou anteriormente que não havia que tomar medidas contra a [recorrente]. A [recorrente] não mantém nenhuma ligação ao Hamas ou a organizações ligadas ao Hamas. Os fundos que angariou são unicamente utilizados para actividades sociais, facto que é controlado de forma bastante rigorosa pelas autoridades correspondentes. Antes de adoptar [a Sanctieregeling], [o Reino dos Países Baixos] não permitiu à [recorrente] apresentar o seu ponto de vista. A [recorrente] actuou com toda a franqueza em relação ao [Reino dos Países Baixos] e permitiu a este fiscalizar todas as suas actividades. [O Reino dos Países Baixos], erradamente, não deu seguimento a esta proposta da [recorrente]. [O Reino dos Países Baixos] actua portanto de maneira ilícita em relação à [recorrente]. A maneira de agir [do Reino dos Países Baixos] atenta irreparavelmente contra os interesses da [recorrente]. Com efeito, a [recorrente] já não pode respeitar as suas obrigações de pagamento (renda, gás, água, electricidade, salários) e foi obrigada a pôr termo a projectos em curso.

Mesmo que se considerasse que a maneira de agir [do Reino dos Países Baixos] foi lícita, a sua actuação é apesar de tudo ilícita pelo facto de [o Reino dos Países Baixos] não ter tomado medidas para pôr termo à situação inumana em que a [recorrente] se encontra actualmente.

Ao dar uma certa publicidade nos órgãos de informação às acusações contra a [recorrente], [o Reino dos Países Baixos] prejudicou a reputação e a honra desta. A [recorrente] sofreu, assim, um prejuízo que [o Reino dos Países Baixos] é obrigado a indemnizar.

[...]

3.      Apreciação do litígio

3.1.      Tendo em conta os documentos apresentados e os debates na audiência, deve sublinhar‑se que a [recorrente] pretende, em especial, proibir [o Reino dos Países Baixos] de prosseguir a execução da [Sanctieregeling]. Importa apreciar se [o Reino dos Países Baixos] actuou ilegalmente em relação à [recorrente] ao adoptar e aplicar [a Sanctieregeling].

[...]

3.4.      Segundo jurisprudência constante do Hoge Raad [der Nederlanden (Tribunal Supremo, Países Baixos)], o juiz pode qualificar de ilícitas a adopção e a aplicação de disposições geralmente vinculativas (leis em sentido material) com o fundamento de que está em causa uma arbitrariedade no sentido de que o órgão em questão não pôde razoavelmente adoptar a disposição em causa tendo em conta os interesses de que esse órgão tinha conhecimento ou deveria ter conhecimento no momento da adopção da decisão de execução. O juiz deve fazer prova, no âmbito desta fiscalização, da necessária reserva, segundo o Hoge Raad.

3.5.      O interesse [do Reino dos Países Baixos], no quadro da [Sanctieregeling], reside no combate às actividades terroristas em geral e na supressão da contribuição financeira a essas actividades em particular. A [recorrente], ao invés, tem interesse em poder prosseguir sem entraves as suas actividades.

3.6.      [A Sanctieregeling] baseia‑se na comunicação oficial do AIVD já referida. O conteúdo dessa comunicação visa principalmente o facto de os fundos angariados nos Países Baixos pela [recorrente] aproveitarem a organizações ligadas ao movimento islamista (palestiniano) do Hamas e de várias dessas organizações (ligadas ao Hamas) disponibilizarem fundos com vista a permitir que sejam cometidos atentados ou a facilitar as actividades terroristas do Hamas.

3.7.      A [recorrente] alegou de forma enérgica que não colocava dinheiro à disposição do Hamas ou de outras organizações ligadas a este movimento. Os fundos que angaria (em 2002, 1 300 000 euros) são, segundo a [recorrente], entregues a instituições estabelecidas em Israel, nos territórios ocupados por Israel e noutros países (designadamente no Canadá e na Austrália), e que apenas desenvolvem objectivos sociais e organizam unicamente actividades sociais. A utilização dos fundos angariados faz‑se seguidamente no respeito pelas leis aplicáveis nesses países/territórios ocupados e sob o controlo das autoridades desses países/territórios.

3.8.      A comunicação oficial do AIVD contém apenas declarações genéricas. Tais declarações não são sustentadas por nenhum dado factual. Consequentemente, nem o juiz das medidas provisórias nem a [recorrente] estão em condições de apreciar se as conclusões formuladas na referida comunicação são sustentadas pelos dados do inquérito; por outras palavras, a veracidade desta comunicação oficial não pode ser determinada. E isto é tanto mais problemático quanto a [recorrente] contestou o conteúdo desta comunicação, na medida do possível, de forma circunstanciada.

3.9.      Embora possa ser reconhecida uma certa lógica à comunicação oficial, o [juiz das medidas provisórias] considera que, quando o funcionamento prático de um sujeito de direito é obstruído numa medida importante com base numa comunicação oficial, [o Reino dos Países Baixos] não pode limitar‑se a fazer referência a essa comunicação no caso de não a ter fundamentado e de a [recorrente] ter contestado o respectivo conteúdo de maneira circunstanciada. Deve igualmente rejeitar‑se a argumentação [do Reino dos Países Baixos], de que a simples referência à comunicação oficial é suficiente no quadro da fiscalização da regulamentação pelo juiz das medidas provisórias e tendo em conta o carácter confidencial das fontes que sustentam esta comunicação.

3.10. A título subsidiário, [o Reino dos Países Baixos] propôs que se reconhecesse unicamente ao [juiz das medidas provisórias] a faculdade de consultar os dados em causa. A [recorrente] não contestou a alegação [do Reino dos Países Baixos] segundo a qual este tem interesse em manter confidenciais os dados do AIVD nos quais se baseia a comunicação oficial. A [recorrente] manifestou o seu acordo quanto ao facto de que só o juiz das medidas provisórias deve ter conhecimento dos dados confidenciais em causa.

3.11. A consulta a título confidencial pelo [juiz das medidas provisórias] das peças pertinentes parece ser contrária a um dos princípios fundamentais do direito judiciário, a saber, o princípio do contraditório. Com efeito, a fundamentação do despacho (definitivo) não fará referência aos dados cuja consulta confidencial foi obtida pelo [juiz das medidas provisórias], de forma que a referida fundamentação não poderá ser directamente fiscalizada. É no entanto aceitável que, por considerações de ordem pública, seja feita uma excepção ao princípio já referido. É o que acontece no caso vertente. Assim, é igualmente importante que as partes tenham aceite que possa ser introduzida uma excepção a este princípio e que o presente procedimento apresente semelhanças com o direito administrativo, no quadro do qual o conhecimento confidencial pelo juiz não é inabitual (v. artigo 8.29 do Código de Direito Administrativo).

3.12. Em consequência, [o Reino dos Países Baixos] será obrigado a permitir ao juiz das medidas provisórias, assistido pelo respectivo escrivão, tomar conhecimento, a título confidencial, do processo subjacente à comunicação oficial do AIVD. O juiz das medidas provisórias considera que esta consulta a título confidencial deverá ser efectuada rapidamente [...]

4. A decisão

O juiz das medidas provisórias insta [o Reino dos Países Baixos] a informá‑lo, no prazo de uma semana a contar do [dia a seguir ao da adopção do presente despacho], sobre a forma como pode tomar conhecimento a título confidencial, acompanhado do seu escrivão, dos elementos do processo que estão na base da comunicação oficial do AIVD.

[...]»

124    O Governo neerlandês aceitou esta sentença interlocutória e, em 21 de Maio de 2003, o juiz das medidas provisórias tomou conhecimento do processo do AIVD nas instalações deste.

125    Através da sentença de medidas provisórias, o juiz das medidas provisórias verificou e declarou, designadamente, o seguinte:

«[...]

2.      Os factos, o pedido, a fundamentação e a defesa

No que se refere a estes elementos, remetemos para a [sentença interlocutória de medidas provisórias].

3.      Apreciação do lítigio

3.1.      Tendo em conta as considerações formuladas na [sentença interlocutória de medidas provisórias], será dada resposta, em primeiro lugar, à questão de saber se [o Reino dos Países Baixos] actuou ilegalmente em relação à [recorrente] ao adoptar e dar execução [à Sanctieregeling] e se importa portanto intimá‑lo a deixar de dar execução [à Sanctieregeling].

3.2.      Com fundamento na sua instrução, o juiz das medidas provisórias conclui que as verificações do AIVD são suficientemente circunstanciadas para justificar a conclusão (do AIVD) segundo a qual os fundos angariados pela [recorrente] nos Países Baixos aproveitaram a organizações ligadas ao movimento islamista (palestiniano) do Hamas e podem igualmente justificar a conclusão de que várias dessas organizações (ligadas ao Hamas) disponibilizam fundos com vista a permitir que sejam cometidos atentados ou a facilitar as actividades terroristas do Hamas.

3.3.      Não foi levado ao conhecimento do juiz das medidas provisórias nenhum facto que permitisse concluir que o AIVD executou erradamente a missão que lhe é confiada pela lei sobre os serviços de informações e de segurança.

3.4.      A [recorrente] alegou ainda que, mesmo que se considerasse que o [Reino dos Países Baixos] não actuou de forma ilícita a seu respeito ao adoptar e ao dar execução [à Sanctieregeling], o carácter ilegal dos actos [do Reino dos Países Baixos] reside, de qualquer forma, no facto de este ter dado execução [à Sanctieregeling] sem prever uma adaptação susceptível de pôr termo à situação na qual a [recorrente] se encontra actualmente. Há que rejeitar esta argumentação. Está demonstrado que a [recorrente] sofreu, e continua a sofrer, um prejuízo na sequência do comportamento [do Reino dos Países Baixos]. No entanto, só os comportamentos da própria [recorrente] deram origem a esse prejuízo e, se for caso, causarão ainda prejuízos ulteriormente. O prejuízo já sofrido e o prejuízo futuro são integralmente imputáveis à [recorrente].

3.5.      A [recorrente] indicou igualmente que [o Reino dos Países Baixos] (na pessoa do ministro dos Assuntos Internos) tinha anteriormente, ou seja, em Outubro de 2002, indicado, em resposta a perguntas feitas por membros da segunda secção, que considerava inútil tomar medidas contra a [recorrente]. [O Reino dos Países Baixos] indicou, porém, de forma suficientemente plausível – o que resulta igualmente das respostas às citadas perguntas feitas pela segunda secção – que o inquérito do AIVD se encontrava nesse momento numa fase tal que a adopção de medidas em relação à [recorrente] já não se justificava, mas que, após um aprofundamento do inquérito, a adopção de tais medidas deixou de ser excluída.

3.6.      Atendendo às considerações que precedem, há que responder negativamente à questão formulada no ponto 3.1. Em consequência, há que rejeitar os pedidos da [recorrente] no sentido de que o [Reino dos Países Baixos] seja proibido de congelar todos os activos que lhe pertencem, de impedir todas as operações financeiras por ela efectuadas e em seu benefício e de proibir terceiros de colocar directa ou indirectamente meios financeiros à sua disposição.

[...]

A decisão

O juiz das medidas provisórias indefere os pedidos.

[...]»

126    Tendo em conta a sentença interlocutória de medidas provisórias e a sentença de medidas provisórias, não é necessário decidir se, como sustenta o Reino dos Países Baixos, a fiscalização jurisdicional da apreciação pelo Conselho do elemento «conhecimento» exigido pelo artigo 1.°, n.° 3, alínea k), da Posição Comum 2001/931 deve limitar‑se à fiscalização da existência de um erro manifesto.

127    Com efeito, foi sem cometer o mais pequeno erro de apreciação que o Conselho considerou, atendendo às duas sentenças em questão, que a recorrente tinha conhecimento, na acepção da referida disposição, que a sua actividade de angariação e de disponibilização de fundos contribuiria para as actividades criminosas de um grupo terrorista, o Hamas ou, mais exactamente, na época, o seu braço armado, o Hamas‑Izz al‑Din al‑Qassem.

128    Contrariamente ao que sustenta a recorrente, com base numa leitura excessivamente formalista e literal destas duas sentenças, as constatações de facto e as apreciações feitas pelo juiz das medidas provisórias, a partir da nota do AIVD e dos elementos do processo que a sustentam, revelam que este estava manifestamente convicto de que a recorrente tinha tido conhecimento da utilização final dos seus fundos para fins terroristas. Os exemplos de tais constatações e apreciações, invocados pelo Reino dos Países Baixos por referência ao n.° 1.11 da sentença interlocutória de medidas provisórias, revelam‑no implícita mas inequivocamente.

129    De resto, não foi tanto sobre este elemento de conhecimento ou de intencionalidade que, no essencial, nas pretensas relações entre a recorrente e o Hamas, incidiram os debates perante o juiz das medidas provisórias. Como foi sublinhado por este, a recorrente sustentava com efeito «de forma enérgica», nessa fase do processo, que «que não colocava dinheiro à disposição do Hamas ou de outras organizações ligadas a este movimento» e mesmo que «não mantinha nenhuma ligação com o Hamas ou com organizações ligadas ao Hamas». Estas alegações foram claramente refutadas pelo juiz das medidas provisórias, após ter tomado conhecimento do processo que sustentava a nota do AIVD. Nestas condições, não era necessário que este juiz indicasse expressamente, no n.° 3.2 da sentença de medidas provisórias, a medida em que a recorrente tinha «conhecimento» da situação.

130    De qualquer forma, ao considerar que o prejuízo já sofrido pela recorrente, devido à adopção da Sanctieregeling, e o prejuízo ainda não verificado, lhe eram «integralmente imputáveis», o juiz das medidas provisórias concluiu necessariamente que este elemento de «conhecimento» era indispensável para demonstrar a responsabilidade da recorrente no âmbito da ponderação dos interesses que lhe incumbia efectuar (v., designadamente, n.° 3.5 da sentença interlocutória de medidas provisórias).

131    Por outro lado, a argumentação desenvolvida pela recorrente, nas suas observações sobre as alegações de intervenção do Reino dos Países Baixos, relativa a uma pretensa distinção que deveria ser feita, pelo menos no que respeita ao período anterior a 12 de Setembro de 2003, entre os braços humanitário e terrorista do Hamas, é destituída de pertinência atendendo à conclusão do juiz das medidas provisórias segundo a qual, por um lado, os fundos angariados pela recorrente nos Países Baixos tinham aproveitado a organizações ligadas ao Hamas e, por outro, várias dessas organizações disponibilizavam fundos a fim de permitir que fossem cometidos atentados ou a facilitar as actividades terroristas do Hamas.

132    De resto, esta argumentação, nos termos da qual a recorrente pôde legitimamente considerar, na época, que os donativos entregues ao braço humanitário do Hamas não seriam utilizados para fins terroristas, é incompatível com a argumentação que defendeu perante o juiz das medidas provisórias, no quadro da qual negou qualquer ligação ao Hamas ou a organizações ligadas ao Hamas.

133    Tendo em conta o que precede, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à quarta parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

134    A recorrente alega que a Posição Comum 2001/931 e o Regulamento n.° 2580/2001 têm por objecto e por finalidade o combate ao financiamento actual e futuro do terrorismo, e não ao seu financiamento passado. Assim, em sua opinião, se a existência de um risco actual ou futuro de que uma entidade financie o terrorismo não puder ser demonstrada, tais diplomas não lhe são aplicáveis.

135    Ora, nem a exposição de motivos nem a sentença de medidas provisórias revelam a existência da mais pequena ameaça actual ou futura por parte da recorrente, que permita concluir que ainda possa ser considerada, em 2007, como uma entidade que facilita actividades terroristas. Na sequência do prazo decorrido desde 3 de Junho de 2003, as disposições da sentença de medidas provisórias já não podem, segundo a recorrente, ser utilizadas para fundar tal conclusão.

136    Em especial, não resulta da exposição de motivos que as organizações às quais a recorrente entregou fundos antes de 3 de Junho de 2003, mesmo admitindo que tenham efectivamente facilitado actividades terroristas na época, o façam ainda hoje. Pode mesmo acontecer que tais organizações já não existam. O próprio Conselho não está em condições de verificar estes elementos, uma vez que a identidade das organizações em questão não foi revelada e que o Conselho não teve acesso ao processo do AIVD no qual se baseia a sentença de medidas provisórias.

137    Além disso, nada permite pensar que, se a medida de congelamento dos seus activos fosse levantada, a recorrente apoiaria de novo as mesmas organizações. A este respeito, a recorrente declara expressamente que, se o Conselho lhe fornecer uma lista das organizações que são consideradas como organizações que financiam o terrorismo, deixará de lhes dar o mais pequeno apoio financeiro.

138    Na réplica, a recorrente acrescenta que, contrariamente ao que sustenta o Conselho na sua resposta, o Tribunal está perfeitamente em condições de fiscalizar, no caso vertente, a procedência da decisão impugnada tendo em conta o presente fundamento. Referindo‑se aos critérios de apreciação invocados a este respeito pelo Conselho, sublinha que não tinha, nem ainda hoje tem, antecedentes no domínio da violência terrorista, que o Conselho não pode razoavelmente avançar nenhuma hipótese séria quanto às suas intenções futuras, unicamente com base nos documentos de que dispõe, e que tanto a Sanctieregeling, revogada em 2003, como a sentença de medidas provisórias perderam muito da sua pertinência.

139    Nas suas observações sobre as alegações de intervenção do Reino dos Países Baixos, a recorrente sustenta ainda que a apreciação do Conselho foi manifestamente errada. Sublinha que o próprio Conselho não tem conhecimento da identidade das organizações que ela, recorrente, apoiava e que, por maioria de razão, o Conselho não conhece, entre essas organizações, quais as que posteriormente apoiaram o terrorismo. O Conselho nem sequer sabe se essas organizações ainda existem. Tendo em conta esta circunstância, é impossível ao Conselho afirmar, baseando‑se em documentos do seu conhecimento, que ainda se pode supor que a recorrente facilita actos terroristas. Consequentemente, segundo a recorrente, o Conselho exerceu a sua margem de apreciação de maneira manifestamente errada.

140    O Conselho, apoiado pelo Reino dos Países Baixos e pela Comissão, contesta a argumentação da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

141    A argumentação desenvolvida pela recorrente no quadro da quarta parte do primeiro fundamento corresponde, em substância, à desenvolvida pela recorrente no quadro do terceiro fundamento do recurso no processo que deu origem ao acórdão PMOI I.

142    Pronunciando‑se sobre esse terceiro fundamento, o Tribunal declarou nomeadamente, no acórdão PMOI I, que: a) nada nas disposições em causa do Regulamento n.° 2580/2001 e da Posição Comum 2001/931 proíbe a imposição de medidas restritivas a pessoas ou entidades que tenham cometido no passado actos terroristas, não obstante a inexistência de elementos que provem que estas cometem actualmente tais actos ou neles participam, se as circunstâncias o justificarem (n.° 107); b) a realização do objectivo prosseguido por estes actos, ou seja, combater as ameaças à paz e à segurança internacionais que os actos de terrorismo representam, que é de uma importância fundamental para a comunidade internacional, estaria comprometida se as medidas de congelamento de fundos previstas por estes actos só pudessem ser aplicadas a pessoas, grupos e entidades que cometam actualmente actos de terrorismo ou que o tenham feito num passado muito recente (n.° 109); c) estas medidas, que visam essencialmente prevenir a perpetração destes actos ou a sua repetição, baseiam‑se mais na avaliação de uma ameaça actual ou futura do que na apreciação de um comportamento passado (n.° 110), e d) o amplo poder de apreciação de que dispõe o Conselho, quanto aos elementos de prova a ter em consideração com vista à adopção ou à manutenção de uma medida de congelamento de fundos, estende‑se à avaliação da ameaça que pode continuar a representar uma organização que cometeu no passado actos de terrorismo, não obstante a suspensão das suas actividades terroristas durante um tempo mais ou menos longo ou a aparente cessação das mesmas (n.° 112).

143    No acórdão Sison II (n.° 66), o Tribunal acrescentou que, nestas condições, e à luz da jurisprudência relativa ao dever de fundamentação das decisões subsequentes de congelamento de fundos (v., a este respeito, acórdão PMOI I, n.° 82), não se pode exigir ao Conselho que indique de forma mais específica de que modo o congelamento dos fundos do recorrente contribui, concretamente, para o combate ao terrorismo ou que ofereça provas para demonstrar que o interessado poderia utilizar os seus fundos para cometer ou facilitar actos terroristas no futuro.

144    No caso vertente, decorre desta jurisprudência que a circunstância de o Conselho se ter referido exclusivamente a acontecimentos anteriores a 3 de Junho de 2003, tal como apurados pelo juiz das medidas provisórias, não basta, por si só, para revelar uma violação do artigo 1.°, n.os 1, 2 e 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 (v., neste sentido, acórdão PMOI I, n.° 113).

145    O mesmo se diga em relação à «declaração expressa» da recorrente segundo a qual, se a medida de congelamento dos seus activos fosse levantada, deixaria de dar o mais pequeno apoio financeiro às organizações que lhe fossem indicadas pelo Conselho como organizações que financiam o terrorismo.

146    A questão de saber se o Conselho excedeu os limites do seu poder de apreciação, tendo em conta o conjunto das outras circunstâncias pertinentes (designadamente o tempo decorrido desde a decisão inicial de congelamento dos fundos, o que aconteceu entretanto às organizações às quais a recorrente tinha entregue fundos, os antecedentes desta em matéria de terrorismo, as suas intenções futuras, a revogação da Sanctieregeling e a pertinência actual da sentença de medidas provisórias), pertence ao domínio da fiscalização jurisdicional do respeito das obrigações que incumbem ao Conselho por força do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931. Dado que a violação dessas obrigações é especificamente alegada no quadro do terceiro fundamento, é por ocasião do exame desse fundamento que, se for caso disso, há que apreciar tal violação (v., neste sentido e por analogia, acórdão PMOI I, n.° 114).

147    Com esta ressalva, a quarta parte do primeiro fundamento deve assim ser julgada improcedente e, com ela, igualmente com a ressalva formulada no n.° 106 supra, o primeiro fundamento na totalidade.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931, do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 e de uma formalidade essencial

 Argumentos das partes

148    Segundo a recorrente, que se refere ao artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931, ao artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 e aos princípios enunciados pelo Tribunal no acórdão OMPI, o Conselho não procedeu a uma revisão da oportunidade da manutenção da sua inclusão na lista controvertida. Assim, segundo a recorrente, o Conselho violou uma formalidade essencial.

149    A este respeito, a recorrente sublinha que a exposição de motivos não indica minimamente que o Conselho tenha efectivamente procedido a tal reexame quanto ao facto de os motivos que justificaram a decisão de congelamento de fundos inicial se manterem, e menos ainda o modo como o fez. Tudo levaria a crer que o Conselho baseou a decisão impugnada unicamente na sentença de medidas provisórias e na Sanctieregeling. Ora, estes actos não constituem um fundamento jurídico concludente e independente, susceptível de justificar uma decisão subsequente de manutenção do congelamento dos fundos. Segundo a recorrente, invocar as duas mesmas decisões nacionais relativamente a cada decisão subsequente de congelamento dos seus fundos não constitui um reexame sério e actual da sua situação, no sentido exigido pelo Tribunal no acórdão OMPI.

150    A recorrente observa igualmente que já não tem nenhum meio de obter de um juiz neerlandês a fiscalização da exactidão ou da inexactidão factual das acusações feitas pela AIVD em 2003, e menos ainda do estatuto actual das organizações às quais entregou fundos.

151    Na audiência, a recorrente, fazendo referência, designadamente, ao n.° 116 do acórdão Sison II, alegou ainda que a Sanctieregeling e a sentença de medidas provisórias ainda não deram lugar, até hoje, nos Países Baixos à instauração de inquéritos ou de processos contra si, sendo de assinalar que a Sanctieregeling foi revogada imediatamente após a adopção da primeira medida comunitária de congelamento dos seus fundos. Conclui, por um lado, que não foi dado seguimento à decisão nacional com base na qual o Conselho decidiu inicialmente congelar os seus fundos e, por outro, que o Conselho não tem adequadamente em conta esta a circunstância ao manter indefinidamente esta medida.

152    O Conselho rejeita as alegações da recorrente e afirma que procedeu a uma revisão de fundo pormenorizada antes de decidir mantê‑la na lista controvertida, a fim de se certificar de que essa manutenção continuava a justificar‑se.

153    Recordando que a questão de saber se medidas restritivas contra uma organização terrorista devem ser mantidas é uma questão de natureza política, que só ao legislador incumbe decidir, o Conselho considera que, no essencial, teve em conta o conjunto das considerações pertinentes.

154    Também no plano processual o Conselho considera ter cuidadosamente diligenciado no sentido de respeitar as obrigações enunciadas nos acórdãos OMPI e Sison I (n.os 141 e 184), relativas aos direitos de defesa e o direito de ser ouvido. Assim, do seu ponto de vista, efectuou esse reexame tendo perfeitamente conhecimento das observações da recorrente.

155    A este respeito, o Conselho sublinha, remetendo para o quinto considerando da decisão impugnada e para a sua carta de 29 de Junho de 2007, através da qual a decisão impugnada foi notificada à recorrente, que examinou cuidadosamente as observações submetidas por esta em 25 de Maio de 2007 antes de decidir mantê‑la na lista controvertida.

156    Dito isto, o Conselho considera que, embora lhe incumba, em conformidade com os acórdãos OMPI e Sison I, dar aos interessados a oportunidade de apresentarem as suas observações e tomar estas em consideração, não é obrigado, em contrapartida, a responder a essas observações. O facto de a exposição de motivos não ter sido alterada relativamente à comunicada em 23 de Abril de 2007 mostra simplesmente que nenhum dos argumentos avançados pela recorrente nas suas observações convenceu o Conselho e que não havia nenhum elemento novo a acrescentar.

157    Nas suas observações em resposta às questões escritas do Tribunal, o Conselho, o Reino dos Países Baixos e a Comissão alegaram por outro lado que, em conformidade com os princípios enunciados pelo Tribunal no acórdão Sison II, o Conselho tinha o direito de tomar em conta o facto de a decisão da autoridade nacional competente na qual tinha baseado a sua própria decisão de submeter a recorrente a medidas restritivas não ter sido contestada por esta.

158    Na audiência, o Reino dos Países Baixos sublinhou que a revogação da Sanctieregeling, após a adopção da medida comunitária inicial de congelamento dos fundos da recorrente, não implicava uma nova tomada de posição por parte das autoridades nacionais em relação a esta última, mas resultava da preocupação do Governo neerlandês de evitar uma duplicação entre uma medida nacional e uma medida comunitária de congelamento de fundos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

159    Como foi indicado nos n.os 106 e 146 supra, é igualmente no quadro do presente fundamento que há que examinar, por um lado, a questão de saber se a sentença de medidas provisórias ainda podia validamente servir de fundamento à decisão impugnada, na data da adopção desta, tendo em conta todas as circunstâncias pertinentes do caso vertente, particularmente as medidas posteriores à Sanctieregeling em direito nacional, e, por outro, a questão de saber se, ao basear‑se exclusivamente na referida sentença, o Conselho excedeu os limites do seu poder de apreciação. É igualmente neste contexto que se coloca a questão de saber se a recorrente dispunha e dispõe ainda de vias de recurso em direito nacional contra a sentença de medidas provisórias e o problema das consequências que devem ser extraídas do facto de a recorrente não ter exercido essas vias de recurso.

160    Antes de examinar estas questões, importa recordar os princípios subjacentes à jurisprudência do Tribunal relativa ao contencioso das medidas de congelamento de fundos adoptadas com vista a combater o terrorismo, designadamente os acórdãos OMPI, PMOI I e PMOI II e Sison I e Sison II (v., a este respeito, n.os 78 a 83 supra).

161    Estas princípios consagram, por um lado, o amplo poder de apreciação que há que reconhecer ao Conselho, quanto aos elementos a tomar em consideração com vista à adopção ou à manutenção de uma medida de congelamento dos fundos por força do Regulamento n.° 2580/2001. Esse poder de apreciação abrange, em especial, as considerações de oportunidade em que tais decisões se baseiam (v. n.os 82 e 83 supra e jurisprudência referida) e compreende a avaliação da ameaça que pode continuar a representar uma organização que cometeu no passado actos de terrorismo, não obstante a suspensão das suas actividades terroristas durante um período mais ou menos longo, ou até mesmo a aparente cessação de tais actividades (v. n.° 142 supra, e jurisprudência referida).

162    Estes princípios consagram, por outro lado, a preponderância que há que reconhecer, no exercício desse poder de apreciação, aos elementos do processo nacional no quadro do qual foi tomada a decisão da autoridade competente referida no artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 que serve de fundamento à decisão comunitária de congelamento dos fundos.

163    O Tribunal salientou assim em várias ocasiões que, num caso de aplicação do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, disposições que instituem uma forma de cooperação específico entre o Conselho e os Estados‑Membros, no âmbito do combate comum ao terrorismo, o princípio da cooperação leal implicava, para o Conselho, a obrigação de se basear tanto quanto possível na apreciação da autoridade nacional competente, pelo menos se se tratar de uma autoridade judicial, designadamente no que respeita à existência das «provas ou dos indícios sérios e credíveis» nos quais assenta a decisão dessa autoridade (v. n.° 80 supra, e jurisprudência referida).

164    No entanto, o Tribunal sublinhou igualmente que, quando pretende adoptar ou manter, após reexame, uma medida de congelamento de fundos ao abrigo do Regulamento n.° 2580/2001, com base numa decisão nacional de «abertura de inquéritos ou de processos» por um acto terrorista, o Conselho não pode deixar de ter em conta os desenvolvimentos posteriores desses inquéritos ou desses processos (v. acórdão Sison II, n.° 116, e jurisprudência referida.

165    Assim, resulta do acórdão PMOI I (n.° 146) que, quando a decisão da autoridade administrativa nacional competente em que se baseou a decisão comunitária de congelamento de fundos pode constituir ou constitui objecto de recurso judicial de direito interno, quer directamente contra ela quer indirectamente contra qualquer decisão subsequente da mesma autoridade nacional que recuse retirá‑la ou revogá‑la, é razoável que o Conselho considere preponderante, para efeitos da sua própria apreciação, a circunstância de tal decisão se manter em vigor. O Tribunal considerou assim, nesse acórdão (n.° 147), quanto à ponderação entre os elementos de acusação e os elementos de defesa, que o Conselho actua de forma razoável e prudente quando, numa situação em que a decisão da autoridade administrativa nacional competente em que se baseia a decisão comunitária de congelamento de fundos pode constituir ou constitui objecto de recurso judicial de direito interno, esta instituição recusa em princípio tomar posição sobre a procedência dos argumentos de fundo apresentados pelo interessado para fundamentar este recurso, antes de conhecer o resultado do mesmo. Com efeito, no caso contrário, a apreciação efectuada pelo Conselho, na qualidade de instituição política ou administrativa, correria o risco de entrar em conflito, sobre aspectos factuais ou de direito, com a apreciação levada a cabo pelo tribunal nacional competente.

166    Do mesmo modo, no acórdão de 2 de Setembro de 2009, El Morabit/Conselho (T‑37/07 e T‑323/07, não publicado na Colectânea, n.os 51 e 52), o Tribunal considerou que o Conselho agiu em conformidade com o artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931 e com o Regulamento n.° 2580/2001 ao basear a sua decisão de congelamento dos fundos numa condenação penal proferida por um órgão jurisdicional nacional de primeira instância, sem aguardar o desfecho do recurso interposto pelo interessado contra essa condenação.

167    No acórdão El Morabit/Conselho, já referido (n.° 53), o Tribunal acrescentou porém, em conformidade com a jurisprudência citada, que, embora a simples interposição de um recurso de uma condenação em primeira instância não afecte o direito do Conselho, com base no Regulamento n.° 2580/2001 e no artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931, de inscrever uma pessoa ou uma entidade condenada na lista controvertida, o Conselho tem a obrigação de verificar, após a conclusão da instância de recurso, a existência de motivos que justifiquem a manutenção do congelamento dos fundos do interessado. Naquele caso, o Tribunal salientou (n.° 54) que o Conselho tinha extraído consequências directas da absolvição do interessado em sede de recurso, ao eliminar o seu nome da lista controvertida. Segundo o Tribunal, o Conselho tinha adoptado uma interpretação racional dos seus poderes ao conformar‑se à evolução da decisão da ordem judicial neerlandesa.

168    No acórdão Sison II (n.° 116), o Tribunal equacionou igualmente a eventualidade de um inquérito de polícia ou de segurança ser encerrado sem dar origem a qualquer processo judicial, por não ter sido possível obter provas suficientes, ou de a instrução judicial dar lugar a um despacho de não pronúncia pelas mesmas razões ou ainda de o início de um processo dar lugar ao arquivamento do processo ou a uma absolvição no processo penal. O Tribunal sublinhou que seria inadmissível que o Conselho não tivesse em conta esses elementos, que fazem parte do conjunto dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar a situação (v. n.° 83 supra ). Decidir de outro modo corresponderia a conferir ao Conselho e aos Estados‑Membros o poder excessivo de congelar indefinidamente os fundos de uma pessoa, fora do âmbito de qualquer fiscalização jurisdicional e qualquer que fosse o resultado dos processos judiciais eventualmente instaurados.

169    As mesmas considerações devem valer quando uma medida administrativa nacional de congelamento dos fundos ou a proibição de uma organização, com fundamento no facto de se tratar de uma organização terrorista, ser retirada pelo seu autor ou anulada por decisão judicial, como aconteceu no processo que deu origem ao acórdão PMOI I.

170    Ora, no caso vertente, é ponto assente que a Sanctieregeling foi revogada em 3 de Agosto de 2003, ou seja, quase imediatamente após a entrada em vigor, em 28 de Junho de 2003, da medida comunitária inicial de congelamento dos fundos da recorrente.

171    É certo, a este respeito, que a decisão impugnada pretende basear‑se não na própria Sanctieregeling, mas unicamente na sentença de medidas provisórias (v. n.° 86 supra). Todavia, pelas razões expostas no n.° 87 supra, não é possível, no caso vertente, tomar em consideração a sentença de medidas provisórias isoladamente e sem ter simultaneamente em conta a Sanctieregeling.

172    Assim, há que reconhecer que, desde a revogação da Sanctieregeling na ordem jurídica neerlandesa, a sentença de medidas provisórias, que, como acabou de se recordar, forma com esta um conjunto indissociável, já não pode validamente servir de fundamento para uma medida comunitária de congelamento dos fundos da recorrente.

173    Nessa sentença, de facto, o juiz das medidas provisórias tinha simplesmente recusado suspender, a título cautelar, os efeitos da Sanctieregeling. Ora, esta, ao ser revogada, deixou definitivamente de produzir efeitos jurídicos. Em consequência, o mesmo deve necessariamente acontecer, no que respeita aos efeitos jurídicos da sentença de medidas provisórias, tanto mais apenas continha uma apreciação provisória, sem prejuízo do que fosse decidido no termo do processo quanto ao mérito.

174    A este respeito, o Tribunal considera ainda que a sentença de medidas provisórias não pode, unicamente com vista a dar execução ao Regulamento n.° 2580/2001, ter efeitos dissociáveis dos efeitos da Sanctieregeling, efeitos esses que, no caso vertente, perdurariam apesar da revogação desta última em direito neerlandês. De resto, não seria compatível com a economia geral deste regulamento, que se caracteriza pela preponderância que devem ter os elementos do processo nacional na apreciação do Conselho, que a Sanctieregeling, que já não produz efeitos na ordem jurídica neerlandesa, continuasse a produzi‑los indirecta e indefinidamente, através da sentença de medidas provisórias, na ordem jurídica comunitária.

175    E isto é tanto mais certo quanto a sentença de medidas provisórias, proferida sobre recurso da recorrente, constitui um acontecimento contingente em relação à Sanctieregeling. Com efeito, resulta da sua exposição de motivos que esta tinha sido adoptada «na expectativa da adopção de uma decisão comunitária» e que devia ser revogada «assim que tal decisão entrasse em vigor» (v., igualmente, acórdão Al‑Aqsa, n.° 17). Segundo as explicações dadas pelo Reino dos Países Baixos na audiência, esta revogação resultava unicamente da preocupação do Governo neerlandês de evitar uma duplicação entre uma medida nacional e uma medida comunitária de congelamento de fundos da recorrente. Daqui resulta que a Sanctieregeling teria em qualquer caso sido revogada imediatamente após a adopção da medida comunitária inicial de congelamento dos fundos da recorrente, quer esta última tivesse ou não desencadeado uma providência cautelar ou um processo para conhecimento do mérito.

176    Também este mecanismo ignora a economia geral do Regulamento n.° 2580/2001, que condiciona a adopção de uma medida comunitária de congelamento dos fundos à abertura e à prossecução activa de um processo nacional destinado directa e principalmente à aplicação de uma medida de tipo preventivo ou repressivo contra o interessado, com fundamento no combate ao terrorismo e no envolvimento deste em actividades terroristas (v. acórdão Sison II, n.° 111), ou à adopção e à implementação de uma decisão de condenação do interessado por tais factos.

177    Ora, na situação em causa no processo nacional, a decisão de congelamento dos fundos, tomada inicialmente a nível nacional, foi justificada por se estar «na expectativa da adopção de uma decisão comunitária», e a medida comunitária foi por sua vez justificada pela adopção da decisão nacional, a qual foi imediatamente revogada. Tal mecanismo não pode escapar ao vício da circularidade.

178    Longe de poder continuar a basear‑se na sentença de medidas provisórias, o Conselho deveria ter extraído a consequência lógica da revogação da medida nacional de congelamento dos fundos, declarando que já não existia «substrato» em direito nacional que justificasse do ponto de vista jurídico a manutenção da medida comunitária equivalente, e isso quaisquer que fossem os eventuais recursos jurisdicionais contra a medida nacional revogada.

179    Nestas condições, a dupla a circunstância de o juiz das medidas provisórias ter negado provimento ao recurso interposto pela recorrente contra a Sanctieregeling e de a interessada não ter recorrido da sentença de medidas provisórias nem interposto um recurso da decisão de mérito afigura‑se destituído de pertinência para efeitos da apreciação da legalidade da decisão impugnada.

180    Nas circunstâncias do caso vertente, que se caracterizam antes de mais pela revogação da Sanctieregeling, há que reconhecer ao invés que o Conselho ultrapassa os limites do seu poder de apreciação ao manter indefinidamente a recorrente na lista controvertida, por ocasião do reexame periódico da sua situação ao abrigo do artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/931 e do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, unicamente com o fundamento de que a decisão do juiz das medidas provisórias não é posta em causa, na ordem judiciária neerlandesa, pela instância jurisdicional de recurso de medidas provisórias ou pela instância jurisdicional de mérito, quando a decisão administrativa cuja suspensão dos efeitos a recorrente tinha pedido a esse juiz que decretasse tinha entretanto sido revogada pelo seu autor.

181    E isto tanto mais que, como a recorrente sustentou na audiência, sem ser desmentida pelas outras partes, desde a revogação da Sanctieregeling e com exclusão da execução da decisão impugnada em direito nacional, as autoridades neerlandesas competentes, administrativos ou judiciais, não exerceram mais nenhuma acção destinada a impor uma sanção penal ou económica à recorrente, com base no combate ao terrorismo e com fundamento no seu envolvimento em actividades terroristas.

182    Daqui resulta que há o terceiro fundamento é procedente.

183    Nestas circunstâncias, há que anular a decisão impugnada, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos e argumento da recorrente.

184    Nestas condições, não há que conhecer do pedido requerendo que o Regulamento n.° 2580/2001 seja declarado ilegal, com fundamento no artigo 241.° CE (v., neste sentido, acórdão Al‑Aqsa, n.os 66 e 67; v., igualmente, acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Maio de 2008, Comissão/Conselho, C‑91/05, Colect., p. I‑3651, n.° 111).

 Quanto às despesas

185    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, ou perante circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Nas circunstâncias do caso vertente, em que o Conselho foi vencido no que respeita ao pedido de anulação, que constituía o objecto essencial do litígio, há que condená‑lo a suportar, além das suas próprias despesas, a totalidade das despesas da recorrente, em conformidade com o pedido desta última.

186    Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Sétima Secção)

decide:

1)      A Decisão 2007/445/CE do Conselho, de 28 de Junho de 2007, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 2580/2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades e que revoga as Decisões 2006/379/CE e 2006/1008/CE, a Decisão 2007/868/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 2007, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2007/445, a Decisão 2008/583/CE do Conselho, de 15 de Julho de 2008, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2007/868, a Decisão 2009/62/CE do Conselho, de 26 de Janeiro de 2009, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2008/583, e o Regulamento (CE) n.° 501/2009 do Conselho, de 15 de Junho de 2009, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001, e que revoga a Decisão 2009/62, são anulados, na medida em que estes actos dizem respeito à Stichtinq Al‑Aqsa.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      O Conselho da União Europeia é condenado a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efectuadas pela Stichting Al‑Aqsa.

4)      O Reino dos Países Baixos e a Comissão Europeia suportarão as suas próprias despesas.

Forwood

Papasavvas

Moavero Milanesi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 9 de Setembro de 2010.

Assinaturas


* Língua do processo: neerlandês.