Language of document : ECLI:EU:C:2011:781

DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

25 de Novembro de 2011 (*)

«Artigo 104.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo – Medicamentos para uso humano – Certificado complementar de protecção – Regulamento (CE) n.° 469/2009 – Artigos 3.° e 4.° – Condições de obtenção do certificado – Conceito de ‘produto protegido por uma patente de base em vigor’ – Critérios – Existência de critérios adicionais ou diferentes para um medicamento que compreende mais de um princípio activo»

No processo C‑6/11,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Patents Court) (Reino Unido), por decisão de 8 de Dezembro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 5 de Janeiro de 2011, no processo

Daiichi Sankyo Company

contra

Comptroller General of Patents, Designs and Trade Marks,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, A. Prechal, L. Bay Larsen, C. Toader (relatora) e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: V. Trstenjak,

secretário: A. Calot Escobar,

propondo‑se o Tribunal decidir por meio de despacho fundamentado, em conformidade com o disposto no artigo 104.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do seu Regulamento de Processo,

ouvida a advogada‑geral,

profere o presente

Despacho

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 3.° do Regulamento (CE) n.° 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos (JO L 152, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre a Daiichi Sankyo Company (a seguir «Daiichi Sankyo») e o Comptroller General of Patents, Designs and Trade Marks (a seguir «Patent Office»), por este ter indeferido o seu pedido de certificado complementar de protecção (a seguir «CCP»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Os considerandos 1 e 4 a 10 do Regulamento n.° 469/2009 são do seguinte teor:

«(1)      O Regulamento (CEE) n.° 1768/92 do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativo à criação de um certificado complementar de protecção para os medicamentos [JO L 182, p. 1], foi por diversas vezes alterado de modo substancial […]. Por razões de clareza e racionalidade, deverá proceder‑se à codificação do referido regulamento.

[…]

(4)      Actualmente, o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de introdução no mercado [a seguir ‘AIM’] do referido medicamento reduz a protecção efectiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efectuados na investigação.

(5)      Destas circunstâncias resulta uma protecção insuficiente que penaliza a investigação farmacêutica.

(6)      Existe o risco de deslocalização dos centros de investigação situados nos Estados‑Membros para países que oferecem uma melhor protecção.

(7)      É conveniente prever uma solução uniforme a nível comunitário, evitando assim uma evolução divergente das legislações nacionais que origine novas disparidades susceptíveis de entravar a livre circulação dos medicamentos na Comunidade e de, por isso, afectar directamente o funcionamento do mercado interno.

(8)      É pois necessário prever um [CCP] para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada [AIM] e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado‑Membro. Consequentemente, o regulamento é o instrumento mais adequado.

(9)      A duração da protecção conferida pelo certificado deverá ser determinada de forma a permitir uma protecção efectiva suficiente. Para este efeito, o titular de uma patente e de um certificado deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira [AIM] da Comunidade do medicamento em causa.

(10)      No entanto, todos os interesses em causa num sector tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, deverão ser tomados em consideração. Para este efeito, o certificado não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos. Além disso, a protecção que o certificado confere deverá ser estritamente limitada ao produto abrangido pela autorização da sua introdução no mercado como medicamento.»

4        O artigo 1.° do referido regulamento, intitulado «Definições», é do seguinte teor:

«Para efeitos do presente regulamento entende‑se por:

a)      ‘Medicamento’: qualquer substância ou associação de substâncias com propriedades curativas ou preventivas em relação a doenças humanas […];

b)      ‘Produto’: o princípio activo ou associação de princípios activos contidos num medicamento;

c)      ‘Patente de base’: a patente que protege um produto como tal, um processo de obtenção de um produto ou uma aplicação de um produto e que tenha sido designado pelo seu titular para efeitos do processo de obtenção de um certificado;

d)      ‘Certificado’: o certificado complementar de protecção;

[…]»

5        Sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», o artigo 2.° do mesmo regulamento prevê:

«Os produtos protegidos por uma patente no território de um Estado‑Membro e sujeitos, enquanto medicamentos, antes da sua introdução no mercado, a um processo de autorização administrativa por força da Directiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano [JO L 311, p. 67], ou da Directiva 2001/82/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários [JO L 311, p. 1], podem ser objecto de um certificado, nas condições e segundo as regras previstas no presente regulamento.»

6        O artigo 3.° do Regulamento n.° 469/2009, intitulado «Condições de obtenção do certificado», dispõe:

«O certificado é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.° e à data de tal pedido:

a)      O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;

b)      O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma [AIM] válida […], nos termos do disposto na Directiva 2001/83/CE ou na Directiva 2001/82/CE, conforme o caso;

c)      O produto não tiver sido já objecto de um certificado;

d)      A autorização referida na alínea b) for a primeira [AIM] do produto […], como medicamento.»

7        O artigo 4.° do mesmo regulamento, intitulado «Objecto da protecção», prevê:

«Dentro dos limites da protecção assegurada pela patente de base, a protecção conferida pelo certificado abrange apenas o produto coberto pela [AIM] do medicamento correspondente para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes do termo da validade do certificado.»

8        O artigo 5.° do Regulamento n.° 469/2009, relativo aos «[e]feitos do certificado», prevê que, «[s]em prejuízo do disposto no artigo 4.°, o certificado confere os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base e está sujeito às mesmas limitações e obrigações».

 A convenção sobre a patente europeia

9        Sob a epígrafe «Âmbito da protecção», o artigo 69.° da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias, assinada em 5 de Outubro de 1973, na sua versão modificada aplicável à data dos factos no processo principal (a seguir «convenção sobre a patente europeia»), dispõe:

«(1)      O âmbito da protecção conferida pela patente europeia ou pelo pedido de patente europeia é determinado pelas reivindicações. Não obstante, a descrição e os desenhos servem para interpretar as reivindicações.

(2)      Durante o período até à concessão da patente europeia, o âmbito da protecção conferida pelo pedido de patente europeia é determinado pelas reivindicações contidas no pedido tal como publicado. Contudo, a patente europeia, tal como concedida ou modificada no decurso do procedimento de oposição, de limitação ou de revogação, determina retroactivamente a protecção conferida pelo pedido, desde que esta protecção não seja alargada.»

10      O protocolo interpretativo do artigo 69.° da convenção sobre a patente europeia, que faz parte integrante desta, em conformidade com o seu artigo 164.°, parágrafo 1, enuncia, no seu artigo 1.°:

«O artigo 69.° não deve ser interpretado como significando que a extensão da protecção conferida por uma patente europeia é determinada no sentido estrito e literal do texto das reivindicações e que a descrição e os desenhos servem unicamente para dissipar as ambiguidades que poderiam ocorrer nas reivindicações. Nem deve ser considerado como significando que as reivindicações servem unicamente como orientação e que a protecção se estende também ao que, da consideração da descrição e desenhos por um especialista na matéria, o titular da patente entendeu proteger. Pelo contrário, o artigo 69.° deve ser interpretado como definindo uma posição, entre estes extremos, que assegura simultaneamente uma protecção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.»

 Direito nacional

11      A section 60 da Lei do Reino Unido sobre Patentes de 1977 (UK Patents Act 1977), relativa à «[d]efinição de contrafacção», é do seguinte teor:

«(1)      Em conformidade com as disposições da presente secção, só viola a patente de uma invenção quem, na vigência da patente, praticar no Reino Unido um dos seguintes actos relativamente à invenção, sem o consentimento do titular da patente:

(a)      quando a invenção é um produto, fabricar, dispuser, ou disponibilizar, usar ou importar o produto, ou o mantiver para disponibilização ou para outro fim;

[…]»

12      A section 125 do UK Patents Act 1977, relativa ao «[â]mbito da invenção», prevê:

«(1)      Para os fins da presente lei, a invenção […] para a qual uma patente foi concedida, salvo se o contexto exigir outra coisa, é a especificada numa reivindicação da especificação da […] patente […] tal como interpretada com base na descrição e em eventuais desenhos contidos nessa especificação, e o âmbito da protecção conferida pela patente […] é determinado de maneira correspondente.

[…]

(3)      O protocolo interpretativo do artigo 69.° da convenção sobre a patente europeia (este artigo contém uma disposição correspondente ao parágrafo 1, supra) aplica‑se, enquanto estiver em vigor, para efeitos do referido parágrafo 1, do mesmo modo que se aplica para efeitos deste artigo.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13      A Daiichi Sankyo é titular da patente europeia EP 0503785, designada «Derivados de 1‑bifenilimidazol, sua preparação e sua utilização terapêutica». O órgão jurisdicional de reenvio indica que o princípio activo olmesartan medoxomilo é expressamente mencionado no texto da quarta reivindicação dessa patente. Esse princípio activo é um antagonista dos receptores da angiotensina II e é utilizado como medicamento no tratamento e na profilaxia da hipertensão.

14      O princípio activo hidroclorotiazida é um diurético que pode igualmente ser utilizado como agente anti‑hipertensor.

15      Em 13 de Novembro de 2003, o Patent Office concedeu à Daiichi Sankyo um CCP (SPC/GB03/24), que expira em 17 de Fevereiro de 2017, para o qual o «produto», na acepção do Regulamento n.° 469/2009, é o princípio activo olmesartan medoxomilo. Em apoio do seu pedido de CCP, a Daiichi Sankyo tinha apresentado a AIM, em vigor no Reino Unido, do medicamento Olmetec contendo o olmesartan como princípio activo único, autorização concedida pelas autoridades nacionais em 22 de Maio de 2003, e, como primeira AIM desse medicamento na União Europeia, a autorização de um medicamento correspondente, concedida pelas autoridades alemãs em 13 de Agosto de 2002.

16      Em 14 de Fevereiro de 2006, a Daiichi Sankyo obteve no Reino Unido uma AIM para o Olmetec Plus, um medicamento que consiste numa associação de dois princípios activos que são o olmesartan medoxomilo e o hidroclorotiazida. Esse medicamento permite que os pacientes beneficiem de uma administração única desses princípios activos em biterapia. O órgão jurisdicional de reenvio sublinha a este respeito que a Daiichi Sankyo investiu tempo e recursos consideráveis na realização de ensaios clínicos e estudos a fim de garantir a AIM para a terapia de combinação.

17      Invocando a sua patente, com base na qual tinha sido concedido o CCP em relação com o Olmetec, bem como a AIM do Olmetec Plus e uma AIM para um medicamento correspondente concedida pelas autoridades alemãs em 12 de Maio de 2005, a Daiichi Sankyo apresentou ao Patent Office um pedido de CCP para a associação dos princípios activos olmesartan medoxomilo e hidroclorotiazida (SPC/GB06/019), CCP que, se tivesse sido concedido, expiraria em 17 de Fevereiro de 2017, isto é, na mesma data que o CCP concedido em 13 de Novembro de 2003.

18      Por decisão de 5 de Fevereiro de 2010, o Patent Office indeferiu o pedido de concessão de CCP objecto do pedido SPC/GB06/019, com a fundamentação de que o produto visado, a saber, a associação dos princípios activos olmesartan medoxomilo e hidroclorotiazida, não era, à luz do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 469/2009, protegido pela patente de base de que a Daiichi Sankyo era titular, dado que essa patente só descrevia o princípio olmesartan medoxomilo e não esse último princípio activo em associação com um ou outros princípios activos.

19      O órgão jurisdicional de reenvio assinala que CCP análogos ao que foi recusado pelo Patent Office foram todavia concedidos em vários Estados‑Membros, designadamente pelas autoridades competentes do Reino da Bélgica, da República Italiana, do Grão‑Ducado do Luxemburgo e da República da Finlândia, bem como pelas do Reino da Noruega. Pelo contrário, em França, um pedido semelhante foi indeferido pelo director do Institut national de la propriété industrielle. Por acórdão de 6 de Novembro de 2009, a cour d’appel de Paris (França) confirmou esse indeferimento, considerando, designadamente, «que a associação de Olmesartan medoxomilo e de hidroclorotiazida não estava protegida pela patente de base, não sendo aí reivindicada», e, «em último lugar, que o olmesartan medoxomilo, o único coberto pela patente, tinha já sido objecto de uma AIM n.° NL 28292, de 6 de Agosto de 2003, e de um CCP n.° 03C0037, concedido em 11 de Fevereiro de 2005 com base na mesma patente». O órgão jurisdicional de reenvio indica que a Daiichi Sankyo recorreu deste acórdão para a Cour de cassation (França) e pediu a suspensão da instância até ser obtida a resposta do Tribunal de Justiça no presente processo.

20      Nestas condições, a High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division (Patents Court), decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)      O Regulamento n.° 469/2009 […] reconhece, entre outros objectivos identificados nos considerandos, a necessidade de os Estados‑Membros da União concederem um CCP aos titulares de patentes nacionais ou europeias nos mesmos termos, como indicado nos considerandos 7 e 8 [deste regulamento]. Na falta de harmonização do direito das patentes na UE, o que se deve entender no artigo 3.°, alínea a), do [mesmo] regulamento [...] por ‘produto […] protegido por uma patente de base em vigor’ e quais são os critérios para o determinar?

2)      Num caso como o presente, que tem por objecto um medicamento composto por mais do que um princípio activo, há outros critérios ou critérios diferentes para determinar se ‘o produto (está) protegido por uma patente de base’, na acepção do artigo 3.°, alínea a), do [R]egulamento [n.° 469/2009] e, na afirmativa, quais são esses critérios?

3)      Para que uma combinação de princípios activos constante de uma [AIM] de um medicamento no mercado possa ser objecto de um CCP, e tendo em conta a letra do artigo 4.° do [R]egulamento, o requisito de que o produto esteja ‘protegido por uma patente de base’, na acepção dos artigos 1.° e 3.° do regulamento, está preenchido se o produto violar a patente de base nos termos do direito nacional?

4)      Para que uma combinação de princípios activos constante de uma [AIM] de um medicamento no mercado possa ser objecto de um CCP, e tendo em conta a letra do artigo 4.° do [R]egulamento [n.° 469/2009], o preenchimento do requisito de que o produto seja ‘protegido por uma patente de base’, na acepção dos artigos 1.° e 3.° do regulamento, depende de a patente de base conter uma (ou mais) reivindicações que refiram expressamente uma combinação de (1) uma categoria de compostos que inclui um dos princípios activos no referido produto e (2) uma categoria de outros princípios activos que podem não estar especificados mas que inclui o outro princípio activo no referido produto; ou é suficiente que a patente de base contenha uma (ou mais) reivindicações que (1) reivindicam uma categoria de compostos que inclui um ou mais princípios activos no referido produto e (2) usa linguagem específica que, nos termos do direito nacional, alarga o âmbito de protecção para incluir a presença de outros princípios activos não especificados, incluindo o outro princípio activo no referido produto?»

 Quanto às questões prejudiciais

21      Nos termos do artigo 104.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do seu Regulamento de Processo, quando uma questão prejudicial for idêntica a uma questão que o Tribunal de Justiça já tenha decidido, ou quando a resposta a essa questão possa ser claramente deduzida da jurisprudência, o Tribunal pode, depois de ouvir o advogado‑geral, a qualquer momento, decidir por meio de despacho fundamentado. O Tribunal de Justiça entende que é o que acontece no presente processo.

22      Com efeito, as questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio no presente processo são, no essencial, análogas às colocadas pela Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) no processo em que foi proferido o acórdão de 24 de Novembro de 2011, Medeva (C‑322/10, Colect., p. I‑0000).

23      Por conseguinte, as respostas e explicações fornecidas pelo Tribunal de Justiça no referido acórdão são igualmente válidas quanto às questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio no presente processo.

24      Com as suas questões, que importa abordar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades competentes em matéria de propriedade industrial de um Estado‑Membro concedam um CCP quando, entre os princípios activos mencionados no pedido, se encontram princípios activos que não figuram no texto das reivindicações da patente de base invocada em apoio desse pedido.

25      Quanto à questão de saber se as regras nacionais relativas à contrafacção podem ser aplicadas para apreciar se um produto está «protegido por uma patente de base em vigor» na acepção do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 469/2009, importa recordar que, no estado actual do direito da União, as disposições relativas às patentes não foram ainda objecto de harmonização no âmbito da União Europeia, nem de aproximação de legislações (v. acórdão de 16 de Setembro de 1999, Farmitalia, C‑392/97, Colect., p. I‑5553, n.° 26, e acórdão Medeva, já referido, n.° 22).

26      Por conseguinte, na falta de harmonização do direito das patentes a nível da União, o alcance da protecção conferida pela patente só pode ser determinado à luz das normas que regulam esta última, as quais não estão abrangidas pelo direito da União (v. acórdãos, já referidos, Farmitalia, n.° 27, e Medeva, n.° 23).

27      A este respeito, recorde‑se que o Regulamento n.° 469/2009 institui uma solução uniforme a nível da União, na medida em que cria um CCP susceptível de ser obtido pelo titular de uma patente nacional ou europeia, segundo as mesmas condições em todos os Estados‑Membros. Destina‑se, assim, a evitar uma evolução heterogénea das legislações nacionais, que origine novas disparidades susceptíveis de entravar a livre circulação dos medicamentos na União e, por isso, de afectar directamente o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno (v. acórdãos de 13 de Julho de 1995, Espanha/Conselho, C‑350/92, Colect., p. I‑1985, n.os 34 e 35; de 11 de Dezembro de 2003, Hässle, C‑127/00, Colect., p. I‑14781, n.° 37; de 3 de Setembro de 2009, AHP Manufacturing, C‑482/07, Colect., p. I‑7295, n.° 35; e acórdão Medeva, já referido, n.° 24).

28      Importa sublinhar ainda que, em conformidade com o artigo 5.° do Regulamento n.° 469/2009, qualquer CCP confere os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base e está sujeito às mesmas limitações e obrigações. Daqui decorre que o artigo 3.°, alínea a), do mesmo regulamento se opõe à concessão de um CCP para princípios activos que não figuram no texto das reivindicações dessa patente de base (acórdão Medeva, já referido, n.° 25).

29      Nestas condições, há que lembrar, como assinala, a justo título, o Governo checo, que, nos termos do artigo 5.° do Regulamento n.° 469/2009, um CCP concedido em ligação com um produto confere, ao expirar a patente, os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base relativamente a este produto, nos limites da protecção conferida pela patente de base, tal como enunciados no artigo 4.° desse regulamento. Assim, embora, durante o período de validade da patente, o titular desta se pudesse opor, invocando a sua patente, a qualquer utilização ou a certas utilizações do seu produto sob a forma de um medicamento que consista nesse produto ou que o contenha, o CCP concedido para esse mesmo produto conferirá a esse titular os mesmos direitos para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes de o certificado expirar (v. acórdão Medeva, já referido, n.° 39).

30      Face ao exposto, há que responder às questões colocadas que o artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades competentes em matéria de propriedade industrial de um Estado‑Membro concedam um CCP para princípios activos que não estão mencionados no texto das reivindicações da patente de base invocada em apoio desse pedido.

 Quanto às despesas

31      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

O artigo 3.°, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades competentes em matéria de propriedade industrial de um Estado‑Membro concedam um certificado complementar de protecção para princípios activos que não estão mencionados no texto das reivindicações da patente de base invocada em apoio desse pedido.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.