Language of document :

Recurso interposto em 3 de dezembro de 2015 – Hungria / Conselho da União Europeia

(Processo C-647/15)

Língua do processo: húngaro

Partes

Recorrente: Hungria (representante: M. Z. Fehér, agente)

Recorrido: Conselho da União Europeia

Pedidos da recorrente

No seu recurso, a Hungria pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular a Decisão (UE) 2015/1601 do Conselho, de 22 de setembro de 2015, que estabelece medidas provisórias no domínio da proteção internacional a favor da Itália e da Grécia 1 (a seguir « decisão impugnada»);

a título subsidiário, no caso de não julgar procedente o primeiro pedido, anular a decisão impugnada na parte que se refere a Hungria;

condenar Conselho da União Europeia nas despesas.

Fundamentos e principais argumentos

O Governo húngaro considera que o artigo 78.º, n.º 3, TFUE não fornece ao Conselho uma base jurídica adequada para adotar a decisão impugnada. O artigo 78.º, n.º 3, TFUE não habilita o Conselho a adotar um ato legislativo, nem, portanto, a adotar as medidas estabelecidas na decisão impugnada, concretamente as que determinam uma exceção de caráter vinculativo relativamente a um ato legislativo, no caso em apreço, o Regulamento (UE) n.º 604/2013 2 . No que se refere ao seu conteúdo, a decisão impugnada constitui um ato legislativo – uma vez que estabelece uma exceção relativamente ao Regulamento n.º 604/2013 – pelo que a sua adoção não se pode basear no artigo 78.º, n.º 3, TFUE, que apenas habilita o Conselho a adotar atos mediante um processo não legislativo, isto é, atos não legislativos. Admitindo que, apesar do alegado, seja possível adotar, com base no artigo 78.º, n.º 3, TFUE, um ato jurídico que implique uma exceção relativamente a um ato legislativo, o Governo húngaro considera que a referida exceção não pode ir até ao ponto de afetar a substancia do ato legislativo e de esvaziar as disposições essenciais, como faz a decisão impugnada.

Não é compatível com o conceito de «medidas provisórias» que figura no artigo 78.º, n.º 3, TFUE, uma medida estabelecida para um período de 24 meses – e, em determinados casos, para 36 meses – cujos efeitos, para além do mais, ultrapassam o referido período. A decisão impugnada excede a faculdade reconhecida ao Conselho pelo artigo 78.º, n.º 3, TFUE, uma vez que, para determinar o seu período de vigência, não foi tomado em conta o período necessário para adotar um ato legislativo baseado no artigo 78.º, n.º 2, TFUE.

Ao adotar a decisão impugnada, o Conselho violou o artigo 293.º, n.º 1, TFUE, na medida em que se afastou da proposta da Comissão sem ter alcançado a unanimidade.

A decisão impugnada contém uma exceção relativamente a um ato legislativo e pelo seu conteúdo constitui um ato legislativo, o que, para a sua adoção – ainda admitindo que esta fosse possível com base no artigo 78.º, n.º 3, TFUE – deveria ter-se respeitado o direito dos Parlamentos nacionais a emitirem um parecer sobre os atos legislativos, reconhecido nos Protocolos n.os 1 e 2 anexos ao tratado da União Europeia e ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

Depois da consulta efetuada ao Parlamento Europeu, o Conselho alterou substancialmente o texto do projeto, mas não o submeteu a nova consulta do Parlamento Europeu.

Quando da aprovação pelo Conselho não estavam disponíveis as versões linguísticas do projeto de decisão nas línguas oficiais da União.

A decisão impugnada é também ilegal dado que a sua adoção viola o artigo 68.º TFUE e as conclusões adotadas pelo Conselho Europeu na sua reunião dos dias 25 e 26 de junho de 2015.

A decisão impugnada viola os princípios da segurança jurídica e da clareza normativa, dado que não esclarece em vários aspetos como é que se devem aplicar as suas disposições nem como deve ser feita a sua articulação com as disposições do Regulamento n.º 604/2013. Entre esses aspetos imprecisos inclui-se a questão relativa à aplicação das normas processuais e de garantia sobre a adoção da decisão de recolocação, e o facto de a decisão impugnada não definir claramente os critérios de seleção para a recolocação nem regular adequadamente o estatuto dos requerentes no Estado-Membro de recolocação. A decisão impugnada viola a Convenção de Genebra relativa ao Estatuto dos Refugiados 3 , uma vez que priva os requerentes do direito de permanecer no território do Estado-Membro em que apresentaram o pedido e permite a sua recolocação noutro Estado-Membro sem que seja necessariamente demonstrada a existência de uma relação material entre o requerente e o Estado-Membro de recolocação.

A decisão impugnada viola os princípios da necessidade e da proporcionalidade. Por um lado, tendo em conta que, face à proposta inicial da Comissão, a Hungria foi excluída do grupo dos Estados-Membros beneficiários, a decisão impugnada não justifica porque prevê a recolocação de 120 000 requerentes de proteção internacional. Dado que na decisão impugnada já não se prevê nenhuma recolocação procedente da Hungria, a fixação dos 120 000 requerentes propostos inicialmente tem caráter aleatório, afastando-se da situação que figurava na proposta da Comissão e à qual se pretendia efetivamente fazer frente. Não é aceitável, especialmente tratando-se de uma medida provisória adotada ao abrigo do artigo 78.º, n.º 3, TFUE que, relativamente a quase metade dos requerentes abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, a decisão de recolocação definitiva dependa de circunstâncias futuras.

A título subsidiário, o Governo húngaro alega que a decisão impugnada viola o princípio da proporcionalidade no que se refere à Hungria, uma vez que, apesar de notoriamente se tratar de um Estado-Membro em cujo território entrou um grande número de migrantes em situação irregular e onde foram apresentados muitos pedidos de proteção internacional, são-lhe impostas quotas obrigatórias enquanto Estado de acolhimento. A decisão impugnada não cumpre, no que se refere à Hungria, o disposto no artigo 78.º, n.º 3, TFUE, dado que não é compatível com o requisito previsto no referido artigo – segundo o qual as medidas podem ser adotadas em benefício dos Estados-Membros afetados por uma afluência repentina de nacionais de países terceiros – uma medida que só estabelece obrigações a cargo desses Estados-Membros.

____________

1 JO L 248, p.80.

2 Regulamento (EU) n.º 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO L 180, p. 31).

3 Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados, completada pelo Protocolo de Nova Iorque de 31 de janeiro de 1967.