Language of document : ECLI:EU:T:2012:242

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

22 de maio de 2012 (*)

«Acesso aos documentos — Regulamento (CE) n.° 1049/2001— Dossier administrativo de um processo em matéria de cartéis — Recusa de acesso — Exceção baseada na proteção dos objetivos do inquérito — Exceção baseada na proteção dos interesses comerciais de terceiros — Exceção baseada na proteção do processo de decisão — Dever que impende sobre a instituição em causa de proceder a um exame individual e concreto do conteúdo dos documentos referidos no pedido de acesso»

No processo T‑344/08,

EnBW Energie Baden‑Württemberg AG, com sede em Karlsruhe (Alemanha), representada por A. Bach e A. Hahn, advogados,

recorrente,

apoiada por:

Reino da Suécia, representado por K. Petkovska, S. Johannesson e A. Falk, na qualidade de agentes,

interveniente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por P. Costa de Oliveira, A. Antoniadis e o. Weber, e em seguida por A. Bouquet, P. Costa de Oliveira e Antoniadis, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Siemens AG, com sede em Berlim (Alemanha) e Munique (Alemanha), representada por I. Brinker, C. Steinle e M. Holm‑Hadulla, advogados,

e por

ABB Ltd, com sede em Zurique (Suíça), representada inicialmente por J. Lawrence, solicitor, e E. Whiteford, barrister, e em seguida por J. Lawrence e D. Howe, solicitor,

intervenientes,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão SG.E3/MV/psi D (2008) 4931 da Comissão, de 16 de junho de 2008, relativa a um pedido de acesso aos documentos do processo administrativo COMP/F/38.899 — comutadores com isolamento a gás,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: I. Pelikánová (relator), presidente, K. Jürimäe e M. van der Woude, juízes,

secretário: K. Andová, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 29 de novembro de 2011,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A recorrente, EnBW Energie Baden‑Württemberg AG, é uma empresa que opera no setor da distribuição de energia. Julga‑se afetada pela exploração de um cartel entre produtores de comutadores com isolamento a gás (a seguir «CIG»), sancionado pela Decisão C (2006) 6762 final da Comissão, de 24 de janeiro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (processo COMP/F/38.899 — comutadores com isolamento a gás) (a seguir «decisão CIG»).

2        Na decisão CIG, a Comissão das Comunidades Europeias constatou que várias empresas tinham infringido o artigo 81.°, n.° 1, CE e o artigo 53.° do Acordo EEE por terem participado num cartel no mercado europeu dos CIG. Em consequência, a Comissão aplicou às empresas que participaram nesse cartel coimas num montante total de 750 milhões de euros.

3        Em 9 de novembro de 2007, a recorrente requereu à Comissão, com base no artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), o acesso a todos os documentos do procedimento COMP/ F/38.899.

4        Na sequência de reuniões realizadas com a Comissão, a recorrente declarou desistir desse pedido, bem como de um pedido confirmativo de 10 de dezembro de 2007, e apresentou, em 13 de dezembro de 2007, um novo pedido de acesso aos documentos do processo em causa. Por telecópia de 11 de janeiro de 2008, a recorrente precisou o pedido, no sentido de dele excluir três categorias de documentos, concretamente, os documentos referentes exclusivamente à estrutura das empresas implicadas, os documentos com interesse apenas para a identificação do destinatário da decisão CIG e os documentos integralmente redigidos em japonês.

5        Em 30 de janeiro de 2008, a Comissão indeferiu o pedido inicial da recorrente, com a alteração de 11 de janeiro de 2008.

6        Em 20 de fevereiro de 2008, a recorrente apresentou um pedido confirmativo, nos termos do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1409/2001.

7        Em 16 de junho de 2008, a Comissão indeferiu o pedido confirmativo (a seguir «decisão impugnada»).

8        No n.° 2 da decisão impugnada, a Comissão classificou os documentos constantes do processo COMP/F/38.899 nas cinco categorias seguintes:

1)      Documentos fornecidos no âmbito de um pedido de imunidade ou de clemência, concretamente declarações das empresas em causa e documentos apresentados por elas no âmbito do pedido de imunidade ou clemência;

2)      Pedidos de informação e respostas das partes a esses pedidos;

3)      Documentos obtidos no decurso das inspeções, ou seja documentos apreendidos em fiscalizações in loco nas instalações das empresas em causa;

4)      Comunicação das acusações e respostas das partes;

5)      Documentos internos:

a)      Documentos relativos aos factos, ou seja, em primeiro lugar, notas sobre as conclusões a tirar das provas recolhidas, em segundo lugar, correspondência com outras autoridades da concorrência e, em terceiro lugar, consultas a outros serviços da Comissão que intervieram no processo;

b)      Documentos processuais, ou seja, mandados de inspeção, autos de fiscalização, relatórios de inspeção, extratos dos documentos obtidos no decurso das inspeções, documentos relativos à notificação de alguns documentos e notas lançadas no processo.

9        No n.° 3 da decisão impugnada, a Comissão expôs que todas estas categorias se incluem na exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 e que os documentos da categoria 5, alínea a), estão igualmente abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001.

10      No n.° 4 da decisão impugnada, a Comissão explicou que os documentos das categorias 1 a 4 estão abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

11      No n.° 5 da decisão impugnada, a Comissão indicou que não vislumbrava qualquer indício da existência de um interesse público superior, no sentido do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, que justificasse o acesso aos documentos requeridos.

12      Finalmente, no n.° 6 da decisão impugnada, a Comissão fundamentou a sua recusa de acesso parcial ao dossier com o facto de todos os documentos estarem abrangidos pelas exceções enunciadas no Regulamento n.° 1049/2001.

 Tramitação e pedidos das partes

13      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de agosto de 2008, a recorrente interpôs o presente recurso.

14      Por requerimento separado apresentado no mesmo dia, requereu a aplicação do regime de tramitação acelerada, em conformidade com o disposto no artigo 76.°‑A do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Em 11 de setembro de 2008, a Comissão apresentou as suas observações sobre esse pedido. Por decisão de 1 de outubro de 2008, o Tribunal Geral (Segunda Secção) indeferiu o requerimento de tramitação acelerada.

15      Em 8 de dezembro de 2008, o Reino da Suécia apresentou um pedido de intervenção em apoio da recorrente. Em 9 e 12 de dezembro de 2008, respetivamente, a Siemens AG e a ABB Ltd apresentaram pedidos de intervenção em apoio da Comissão.

16      Por despachos de 13 de março de 2009, o presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral admitiu os pedidos de intervenção.

17      Em 27 de maio de 2009, o Reino da Suécia e a Siemens apresentaram as suas alegações de intervenção. Em 28 de maio de 2009, a ABB apresentou as suas alegações de intervenção.

18      Em 29 e 30 de setembro de 2009, respetivamente, a recorrente e a Comissão apresentaram as suas alegações de intervenção.

19      Em 18 de novembro de 2009, em aplicação de uma medida de organização do processo ordenada pelo Tribunal Geral, a Comissão juntou uma relação do dossier do processo COMP/F/38.899, indicando a que categoria das mencionadas no n.° 8, supra, pertencia cada documento, mas ocultando as informações sobre o conteúdo dos documentos.

20      Por despacho de 26 de abril de 2010, ouvidas as partes, o presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral suspendeu a instância no presente processo até ser proferida decisão no processo T‑399/07, Basell Polyolefine/Comissão. Tendo essa decisão sido tomada num despacho de cancelamento dos autos, de 25 de janeiro de 2011, a instância no presente processo foi reiniciada nessa data.

21      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, o juiz‑relator foi afeto à Quarta Secção, à qual o presente processo foi, consequentemente, atribuído.

22      Em aplicação das medidas de organização do processo ordenadas pelo Tribunal Geral, a recorrente juntou uma cópia do pedido confirmativo de 20 de fevereiro de 2008 e a Comissão respondeu a questões escritas.

23      A recorrente, apoiada pelo Reino da Suécia, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        Anular a decisão impugnada;

¾        A título subsidiário, anular a decisão impugnada na medida em que a Comissão lhe recusou igualmente o acesso parcial aos documentos dos autos;

¾        Condenar a Comissão nas despesas.

24      A Comissão, apoiada pela Siemens e pela ABB conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        Negar provimento ao recurso;

¾        Condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

25      Em apoio do seu recurso, a recorrente alega três fundamentos: o primeiro baseado na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro e terceiro travessões, e do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001; o segundo, baseado na violação do artigo 4.°, n.° 2, última parte, do mesmo regulamento e, o terceiro baseado na violação artigo 4.°, n.° 6, do mesmo regulamento. Alega ainda um quarto fundamento, baseado, em substância, num erro manifesto de apreciação do âmbito do pedido de acesso.

A —  Quanto à admissibilidade do fundamento baseado na omissão de exame individual e concreto dos documentos

26      O Reino da Suécia alegou ainda um fundamento não expressamente alegado pela recorrente, no qual censura a Comissão por não ter procedido a um exame concreto e individual dos documentos constantes do dossier. A Comissão considera que esse fundamento é inadmissível, pois vai para além do objeto do recurso, tal como definido pela recorrente.

27      Nos termos do artigo 40.°, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.° do mesmo estatuto, as alegações do pedido de intervenção devem limitar‑se a sustentar os pedidos de uma das partes. Além disso e nos termos do artigo 116.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, o interveniente aceita o processo no estado em que se encontra no momento da sua intervenção. Segundo a jurisprudência, estas disposições não impedem o interveniente de apresentar argumentos diferentes dos da parte que apoia, desde que não alterem o quadro do litígio e que a intervenção tenha sempre por objetivo apoiar os pedidos apresentados pela parte (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 23 de fevereiro de 1961, De Gezamenlijke Steenkolenmijnen in Limburg/Alta Autoridade, 30/59, Recueil, p. 1, 37, e de 8 de janeiro de 2002, France/Monsanto e Comissão, C‑248/99 P, Colet., p. I‑1, n.° 56; e acórdão do Tribunal Geral de 3 de abril de 2003, Royal Philips Electronics/Comissão, T‑119/02, Colet., p. II‑1433, n.os 203 e 212).

28      Neste caso, há que recordar que a obrigação que incumbe a uma instituição de proceder a uma apreciação individual e concreta do conteúdo dos documentos a que se refere o pedido de acesso nos termos do Regulamento n.° 1049/2001 constitui uma solução de princípio que se aplica a todas as exceções mencionadas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, seja qual o for domínio a que pertençam os documentos solicitados, embora essa solução de princípio não signifique que tal exame seja obrigatório em todas as circunstâncias (acórdão do Tribunal Geral de 13 de abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão, T‑2/03, Colet., p. II‑1121, a seguir designado por «acórdão VKI», n.os 74 e 75).

29      Por conseguinte, a análise do fundamento baseado na violação desta obrigação constitui um ponto prévio à apreciação dos fundamentos baseados na violação das disposições do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001. Daqui decorre que o Tribunal Geral deve, em qualquer caso, verificar, no quadro da apreciação dos fundamentos baseados na violação daquelas disposições, se a Comissão fez um exame individual e concreto dos documentos requeridos, ou demonstrou que os documentos recusados estavam todos manifestamente abrangidos por uma exceção.

30      Aliás, há que salientar que, embora o fundamento de falta de um exame concreto e individual tenha sido alegado pelo Reino da Suécia na primeira parte do seu articulado de intervenção sem ligação direta com os fundamentos alegados pela recorrente, o mesmo foi depois reiterado no quadro da exposição dedicada ao fundamento baseado na violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

31      Donde resulta que o fundamento baseado na falta de exame individual e concreto dos documentos não divulgados, suscitado pelo Reino da Suécia, é admissível.

B —  Quanto ao mérito

1.     Quanto ao quarto fundamento, baseado em erro manifesto de apreciação do âmbito do pedido de acesso

32      Resulta do n.° 2, in fine, da decisão impugnada que a Comissão considerou que os documentos da categoria 5, alínea b) (v. n.° 8, supra), não estavam abrangidos pelo pedido de acesso apresentado pela recorrente «pois esses documentos tinham uma natureza puramente procedimental e/ou só se referiam a factos conhecidos». Em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral na audiência, a Comissão, num primeiro momento, indicou que essa consideração se baseava em que, no pedido confirmativo, a recorrente não formulara objeções quanto à definição restritiva do âmbito do pedido de acesso, tal como exposta na resposta ao pedido de acesso inicial, não tendo sequer mencionado os documentos internos. Em seguida, referiu‑se a uma anotação lançada no dossier, de 21 de janeiro de 2008, relativa a uma conversa telefónica entre um funcionário da Direção‑Geral (DG) «Concorrência» e os assessores da recorrente ocorrida em 9 de janeiro de 2008. Desta anotação decorreria que os assessores da recorrente indicaram que o pedido de acesso apenas tinha por objeto os documentos ligados à infração imputada aos participantes no cartel dos CIG e não, por exemplo, os documentos internos. Foi a combinação destes dois elementos que levou a Comissão a formar a convicção de que os documentos da categoria 5, b) não estavam incluídos no pedido de acesso aos documentos.

33      No seu requerimento de recurso, a recorrente opôs‑se a tal exclusão, alegando que não declarara em parte alguma que excluía esses documentos do seu pedido e que, pelo contrário, identificara expressamente no seu fax de 11 de janeiro de 2008 os documentos excluídos do seu pedido.

34      A este respeito, há que constatar, em primeiro lugar, que, no seu pedido inicial de 9 de novembro de 2007, a recorrente pediu o acesso a todos os documentos do dossier relativo ao cartel dos CIG, sem mais especificações ou restrições. Seguidamente, num fax de 11 de janeiro de 2008, a recorrente restringiu o seu pedido, excluindo alguns grupos de documentos, que enumerou expressamente, i.e., todos os documentos exclusivamente relacionados com a estrutura das empresas envolvidas, os documentos com interesse apenas para a identificação dos destinatários da decisão CIG e os documentos integralmente redigidos em japonês. Esta restrição expressa e por escrito feita após a conversa telefónica de 9 de janeiro de 2008 não corrobora as afirmações da Comissão sobre uma pretensa restrição comunicada pela recorrente durante tal conversa.

35      Em segundo lugar, o pedido confirmativo de 20 de fevereiro de 2008 tem exatamente o mesmo alcance que o pedido inicial, com as restrições do fax de 11 de janeiro de 2008, pois visava o acesso «a todos os documentos na posse da Comissão relativos ao processo […] COMP/F/38.899», com exceção das três categorias de documentos excluídos no referido fax de 11 de janeiro de 2008. Assim, e desde que tomou conhecimento do pedido confirmativo, a Comissão devia ter colocado em causa o seu entendimento restritivo do âmbito do pedido de acesso.

36      Em terceiro lugar, as razões invocadas pela Comissão para justificar materialmente o seu entendimento restritivo, ou seja, o facto de alegadamente os documentos da categoria 5 b) terem uma natureza puramente procedimental e só se referirem a factos já conhecidos, não são pertinentes no contexto do Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, o interesse pessoal que o recorrente pode ter em aceder aos documentos é um critério totalmente alheio ao Regulamento n.° 1049/2001, de forma que não cabe à Comissão fazer juízos ou suposições a este respeito, nem daí retirar conclusões quanto ao tratamento a dar ao pedido.

37      Há assim que constatar que a recorrente tem razão em sustentar que o entendimento restritivo da Comissão do âmbito do seu pedido de acesso está viciado por um erro manifesto de apreciação, havendo, por conseguinte, que anular a decisão impugnada, na parte em que recusou o acesso da recorrente aos documentos da categoria 5 b).

2.     Quanto ao primeiro fundamento, baseado na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro e terceiro travessões, e do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

38      Este fundamento tem três partes. A primeira parte baseia‑se na violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. A segunda parte baseia‑se na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. A terceira parte baseia‑se na violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo do Regulamento n.° 1049/2001.

39      Deve recordar‑se que o Regulamento n.° 1049/2001, aprovado com base no artigo 255.°, n.° 2, CE, visa, como indicam quer o seu quarto considerando quer o seu artigo 1.°, permitir o acesso público, o mais amplo possível, aos documentos das instituições. Resulta igualmente do referido regulamento, designadamente do seu décimo primeiro considerando e do seu artigo 4.°, que prevê um regime de exceções a este respeito, que este direito de acesso está sujeito a certas restrições, baseadas em razões de interesse público ou privado.

40      É verdade que, para justificar a recusa de acesso a um documento, não basta, em princípio, que esse documento seja relativo a uma atividade mencionada no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. A instituição em causa deve igualmente fornecer explicações quanto à questão de saber de que modo o acesso ao referido documento poderia prejudicar concreta e efetivamente o interesse protegido por uma exceção prevista nesse artigo (v. acórdãos de 1 de julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, Colet., p. I‑4723, n.° 49; de 29 de junho de 2010, Comissão/Technische Glaswerke Ilmenau, C‑139/07 P, Colet., p. I‑5885, a seguir «acórdão TGI», n.° 53, e de 21 de setembro de 2010, Suécia e o./API e Comissão, C‑514/07 P, C‑528/07 P e C‑532/07 P, Colet., p. I‑8533, n.° 72).

41      Segundo jurisprudência constante, por estabelecerem derrogações ao princípio do acesso o mais amplo possível do público aos documentos, as exceções do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (acórdãos do Tribunal de Justiça de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, Colet., p. I‑1233, n.° 63; de 18 de dezembro de 2007, Suécia/Comissão, C‑64/05 P, Colet., p. I‑11389, n.° 66, e Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 40, n.° 36).

42      As três partes do primeiro fundamento alegado pela recorrente devem ser analisadas à luz destes princípios.

43      A este respeito, uma vez que, como resulta do n.° 29, supra, a alegação de não terem sido individual e concretamente analisados os documentos é uma questão transversal às três partes do primeiro fundamento, há que analisar primeiro esta alegação, antes de se analisar se a Comissão fez uma aplicação correta das diferentes exceções invocadas na decisão impugnada para recusar o acesso aos documentos requeridos. Há portanto que analisar, em primeiro lugar, se estavam reunidas as condições para que a Comissão pudesse prescindir daquele exame individual e concreto.

a)     Sobre a existência, no caso em apreço, das condições que permitiriam à Comissão subtrair‑se à obrigação de proceder a uma análise concreta e individual do conteúdo dos documentos requeridos.

44      A título liminar, há que salientar que a jurisprudência aceitou exceções à obrigação de proceder ao exame individual e concreto dos documentos solicitados em diferentes tipos de casos.

45      Em primeiro lugar, trata‑se daqueles casos em que, perante as circunstâncias do caso concreto, é manifesto que o acesso deve ser recusado ou concedido. O Tribunal Geral considerou que poderia ser esse precisamente o caso se determinados documentos estivessem abrangidos na totalidade por uma exceção ao direito de acesso, ou, pelo contrário, fossem manifestamente acessíveis na sua totalidade, ou porque já tivessem sido objeto de uma apreciação individual e concreta pela Comissão em condições similares (acórdão VKI, n.° 28, supra, n.° 75). Este tipo de casos em que a decisão é manifesta foi também aceite pelo Tribunal de Justiça, que considerou que as instituições, para explicarem por que razão o acesso aos documentos solicitados poderia afetar o interesse protegido por uma exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, podem basear‑se em presunções genéricas que se aplicam a certas categorias de documentos, podendo aplicar‑se considerações de ordem geral idênticas a pedidos de divulgação de documentos da mesma natureza (acórdãos Reino da Suécia e Turco/Conselho, já referido no n.° 40, n.os 54 e 55, e Suécia e o./API e Comissão, já referido no n.° 40, n.° 74). Neste contexto, aliás, os termos «categoria de documentos» e «documentos da mesma natureza» devem ser entendidos num sentido amplo e sem ter em conta o seu conteúdo, como resulta do acórdão TGI, já referido no n.° 40, supra, em que estes termos foram utilizados por forma a englobar a totalidade dos documentos constantes de um dossier relativo a um processo pendente na Comissão em matéria de auxílios de Estado, e do acórdão Suécia e o./API e Comissão, referido no n.° 40, supra, em que se concluiu que os documentos faziam parte de uma mesma categoria pelo simples facto de terem sido redigidos pela Comissão, na qualidade de parte em vários recursos pendentes à data em que foi tomada a decisão de recusa de acesso.

46      Em segundo lugar, apenas pode ser aplicada uma única e mesma justificação a documentos pertencentes à mesma categoria, o que é nomeadamente o caso se contiverem o mesmo tipo de informações. Cabe depois ao Tribunal verificar se a exceção invocada cobre manifesta e integralmente os documentos que cabem nessa categoria. Em contraposição com os casos referidos no número anterior, o critério comum dos documentos aqui em causa tem a ver com o seu conteúdo, pois é reportando‑se às informações contidas nos documentos solicitados que a instituição requerida deve justificar a sua recusa de acesso, ao abrigo das diferentes exceções ao direito de acesso enunciadas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001.

47      Em terceiro lugar, só a título excecional e unicamente quando a carga administrativa provocada pelo exame concreto e individual dos documentos se revele particularmente pesada, excedendo assim os limites do que pode ser razoavelmente exigido, se poderá admitir uma derrogação à obrigação de exame individual e concreto (acórdão VKI, já referido no n.° 28, supra, n.° 112 e jurisprudência citada).

48      No caso em apreço, no n.° 1 da decisão impugnada, intitulada «Observações preliminares», a Comissão invocou expressamente duas destas categorias, a primeira, mencionada no n.° 45, supra, segundo a qual é evidente que o acesso deve ser recusado porque alguns documentos estão manifestamente abrangidos na sua totalidade por uma exceção, e a segunda, mencionada no n.° 46, supra, segundo a qual a instituição pode indicar as razões da negação de acesso remetendo para categorias de documentos que contêm o mesmo tipo de informações.

49      Há que salientar, em primeiro lugar, o caráter geral e abstrato desta remissão para as exceções invocadas, fora do contexto da apreciação do pedido propriamente dito. A Comissão não indica a que documentos estas exceções se aplicam, de forma que é forçoso concluir que as aplica a todos os documentos solicitados. A Comissão confirmou esta interpretação quando afirmou, na contestação, que «todas as categorias de documentos enumeradas na decisão [impugnada] são abrangidas na integralidade pelas exceções previstas […] no artigo 4.°, n.° 2, primeiro e terceiro travessões, e no n.° 3 [do artigo 4.°] do [Regulamento n.° 1049/2001]».

50      Além disso, a Comissão alegou na contestação que a recorrente «não precisou suficientemente o seu pedido, embora os serviços da Comissão tenham chamado a sua atenção para o volume do dossier e para o trabalho que o seu pedido implicava». Se esta observação for entendida como uma invocação da exceção baseada no excesso de trabalho, definida no n.° 47, supra, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação de uma decisão deve constar do corpo da decisão, pelo que explicações posteriores não podem, salvo circunstâncias excecionais, ser tomadas em consideração (acórdãos do Tribunal Geral de 2 de julho de 1992, Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, T‑61/89, Colet., p. II‑1931, n.° 131; de 14 de maio de 1998, Buchmann/Comissão, T‑295/94, Colet., p. II‑813, n.° 171, e de 15 de setembro de 1998, European Night Services e o./Comissão, T‑374/94, T‑375/94, T‑384/94 e T‑388/94, Colet., p. II‑3141, n.° 95).

51      Ora, na carta de 30 de janeiro de 2008, que recusou o pedido inicial, a ausência de um exame individual e concreto dos documentos foi justificada não pelo volume de trabalho que tal exame ocasionaria, mas exclusivamente pelo facto de todos os documentos solicitados estarem manifestamente abrangidos na sua totalidade pelas exceções invocadas pela Comissão. A decisão impugnada não dá qualquer esclarecimento a este respeito. Só na contestação a Comissão indicou, pela primeira vez, que a limitação do pedido aceite pela recorrente era insuficiente, tendo em conta o volume de trabalho a que um exame individual e concreto daria origem. Assim, este argumento não foi o motivo que fundamentou a decisão impugnada.

52      Nestas condições, o referido argumento deve ser afastado, por inoperante.

53      Num primeiro momento, há que analisar se a Comissão demonstrou, em termos juridicamente bastantes, a existência das circunstâncias excecionais que invocou na decisão impugnada como fundamento para se dispensar de analisar individual e concretamente os documentos solicitados. Num segundo momento deve também analisar‑se, por dever de fundamentação exaustiva, a exceção baseada no volume de trabalho invocada pela Comissão na contestação.

 Sobre a primeira exceção invocada na decisão impugnada, baseada no facto de ser manifesto, por efeito de uma presunção genérica, que o acesso aos documentos solicitados deve ser recusado

54      Como se recordou no n.° 41, supra, as exceções ao direito de acesso previstas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, por derrogarem o princípio do acesso o mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas literalmente.

55      Contudo, foi igualmente considerado que a instituição pode basear‑se, nesta matéria, em presunções genéricas aplicáveis a certas categorias de documentos, podendo aplicar‑se considerações gerais similares a pedidos de acesso relativos a documentos da mesma natureza (acórdãos Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 40, supra, n.° 50; TGI, referido no n.° 40, supra, n.° 54, e Suécia e o./API e Comissão, referido no n.° 40, supra, n.° 74). Nesse caso, há que verificar se as considerações de ordem geral que permitem concluir que a Comissão tinha o direito de se basear na presunção de que a divulgação dos documentos em causa afetaria os interesses protegidos pelo artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, sem ter de efetuar uma apreciação concreta de cada um dos documentos (v., neste sentido, acórdão Suécia e o./API e Comissão, já referido no n.° 40, supra, n.° 76).

56      Ora, neste caso, e ao contrário do que a Comissão afirmou na audiência, essa presunção não poderia fundamentar‑se num raciocínio análogo ao seguido pelo Tribunal de Justiça no acórdão TGI. Neste acórdão, cujo objeto era um pedido de acesso ao dossier de um processo de auxílios de Estado, o Tribunal de Justiça decidiu que podia resultar do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° CE] (JO L 83, p. 1) bem como da jurisprudência relativa ao direito de consulta dos documentos constantes de um dossier administrativo da Comissão, uma presunção geral de que todos os documentos solicitados estavam abrangidos por uma exceção, pelo facto de o referido regulamento só prever o direito de acesso aos documentos por parte do Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio. Com efeito, se todos os interessados pudessem aceder aos documentos do dossier com base no Regulamento n.° 1049/2001, o regime de controlo dos auxílios de Estado seria posto em causa (acórdão TGI, n.os 55 a 58).

57      A este respeito, note‑se que no caso do acórdão TGI, contrariamente ao que acontece no caso vertente, a Comissão, à data em que negou o acesso ao dossier, não tinha ainda tomado a decisão final de encerramento do respetivo processo. Por outro lado, o raciocínio do Tribunal de Justiça no acórdão TGI baseia‑se precisamente no argumento de que as disposições sobre o acesso aos documentos específicos do processo em causa não devem ser postas em xeque pela aplicação do Regulamento n.° 1049/2001. Ora, o regime de acesso ao dossier específico de determinado procedimento, seja em matéria de auxílios de Estado ou de concorrência, só é aplicável durante o processo em causa. Por conseguinte, há que considerar que o raciocínio seguido pelo Tribunal de Justiça no acórdão TGI não pode ser transposto para uma situação em que a instituição já tomou a decisão final de encerramento do processo, como é o caso em apreço.

58      Por outro lado, no caso sub judicio, por analogia com o caso do acórdão TGI, a presunção geral de que os documentos de um processo em matéria de concorrência não devem ser divulgados deveria resultar do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003; L 1, p. 1), conforme alterado, e da jurisprudência relativa ao direito de consultar os documentos constantes do dossier administrativo da Comissão.

59      É certo que, tal como o Regulamento n.° 659/1999 em matéria de auxílios, o Regulamento n.° 1/2003 não dá às pessoas que não sejam parte no procedimento o direito de aceder aos documentos constantes do dossier administrativo da Comissão no quadro do processo em matéria de concorrência. Contudo, o artigo 27.° do Regulamento n.° 1/2003 prevê o direito de acesso ao dossier por parte das empresas que são objeto do procedimento no contexto mais genérico de garantia dos direitos de defesa. O acesso ao dossier concedido neste quadro não é extensível aos documentos internos da instituição, ou a matérias de sigilo comercial de outras empresas ou a outras informações confidenciais (acórdãos do Tribunal Geral de 20 de abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colet., p. II‑931, n.° 1015, e de 26 de abril de 2007, Bolloré e o./Comissão, T‑109/02, T‑118/02, T‑122/02, T‑125/02, T‑126/02, T‑128/02, T‑129/02, T‑132/02 e T‑136/02, Colet., p. II‑947, n.° 45).

60      As disposições do Regulamento n.° 1/2003 foram precisadas pelo Regulamento (CE) n.° 773/2004 da Comissão, de 7 de abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO L 123, p. 18), que prevê igualmente o direito de acesso a favor de denunciantes cuja denúncia tenha sido indeferida. A este respeito, o artigo 8.°, n.° 2, e o artigo 15.°, n.° 4, do Regulamento n.° 773/2004 estabelecem que os documentos obtidos por um denunciante ou por uma empresa interessada só podem ser utilizados para efeitos de processos judiciais ou administrativos em aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE.

61      Disto resulta que embora as empresas envolvidas num processo em matéria de concorrência e os autores das denúncias a que a Comissão não tenha dado seguimento dispõem do direito de consultar determinados documentos do dossier administrativo da Comissão, mas este direito está sujeito a algumas restrições que carecem de apreciação casuística. Assim, seguindo o raciocínio do Tribunal de Justiça no acórdão TGI, de acordo com o qual, para efeitos de interpretação da exceção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, é necessário ter em conta as restrições de acesso ao dossier que existem no âmbito de processos especiais, como é o caso dos processos em matéria de auxílios de Estado e em matéria de concorrência, esta consideração não permite presumir que se todos os documentos constantes dos dossiers da Comissão nessa matéria não estiverem automaticamente cobertos por uma das exceções previstas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 pode ficar afetada a capacidade da Comissão de reprimir os cartéis.

62      Assim, a Comissão não pode presumir, sem proceder a uma análise concreta de cada documento, que todos os documentos solicitados estavam manifestamente abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

63      Por conseguinte, a Comissão não podia dispensar‑se de proceder a um exame individual e concreto dos documentos solicitados baseando‑se na primeira categoria de exceções.

 Quanto à segunda exceção invocada na decisão impugnada, baseada no exame dos documentos por categorias

64      A título liminar, há que esclarecer que, como salientado no n.° 46, supra, só pode ser aplicada uma justificação a documentos da mesma categoria, especialmente se contiverem o mesmo tipo de informações. Todavia, cabe ao Tribunal Geral verificar se a exceção invocada abrange manifesta e integralmente os documentos incluídos nessa categoria.

65      No caso em apreço, tal como resulta da passagem da decisão impugnada citada no n.° 48, supra, a Comissão baseia‑se no n.° 73 do acórdão VKI, referido no n.° 28, supra, para justificar a fundamentação por grupos de documentos. Contudo, o Tribunal Geral salientou, nesse número, que considerava que o exame documento a documento seria necessário, em qualquer caso, para se proceder ao exame — obrigatório segundo o artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 — de um eventual acesso parcial aos documentos solicitados (acórdão VKI, n.° 73). Assim, só no caso de uma exceção ao direito de acesso cobrir manifesta e integralmente os documentos de determinada categoria é que a instituição pode dispensar o exame individual dos mesmos.

66      Aliás, há que salientar ainda que as categorias de documentos constituídas pela instituição em causa devem ser definidas em função das informações contidas nos documentos, definição essa que não corresponde necessariamente aos tipos de documentos. Pode acontecer, por exemplo, que a resposta de uma empresa a uma acusação contenha informações cujo acesso deva ser negado ao abrigo de uma das exceções previstas no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1409/2001, ao passo que a resposta de outra empresa, embora enquadrável no mesmo tipo de documentos, contenha informações que não careçam da mesma proteção. É portanto no caso de os documentos pertencentes a uma mesma categoria terem o mesmo tipo de informações que a recusa de acesso a toda uma categoria de documentos pode ser baseada numa única justificação. Com efeito, nessa hipótese, a justificação por categorias de documentos facilita ou simplifica a tarefa da Comissão ao examinar o pedido e ao justificar a sua decisão.

67      Daqui resulta que o facto de um exame por categorias poder ser útil para o tratamento do pedido de acesso é uma condição da legalidade desse tipo de exame. A definição de categorias de documentos deve ser feita em função de critérios que permitam à Comissão aplicar um raciocínio comum à totalidade dos documentos incluídos na mesma categoria. No caso em apreço, os documentos pertencentes à mesma categoria devem portanto ter características comuns relevantes para efeitos da decisão a tomar sobre a sua eventual divulgação. O raciocínio aplicado a uma categoria deverá necessariamente ser diferente do raciocínio aplicado às outras categorias. Com efeito, sendo possível aplicar o mesmo raciocínio a duas categorias diferentes, na realidade, estaríamos perante a mesma categoria. Neste caso, a divisão em categorias seria artificial e inútil.

68      Ora, no caso em apreço, por um lado, a classificação dos documentos solicitados em categorias, tal como realizada pela Comissão (v. n.° 8, supra), em larga medida, não desempenhou nenhuma função útil para efeitos da tomada da decisão impugnada. Concretamente, tal como exposto nos n.os 70 a 85, infra, no que se refere às exceções baseadas da proteção dos objetivos das atividades de investigação e à proteção dos interesses comerciais, tal classificação não facilitava nem simplificava a tarefa da Comissão de análise do pedido e de justificação da sua decisão, uma vez que a organização em categorias foi efetuada por tipos de documentos, independentemente das informações neles contidas.

69      Por outro lado, tal como exposto nos n.os 86 a 91, infra, no que se refere à exceção baseada na proteção do processo decisório da Comissão, os documentos para os quais a Comissão a invocou não estavam manifesta e integralmente abrangidos por ela, contrariamente à exigência formulada nos n.os 64 e 65, supra.

–       Quanto à análise da exceção baseada na proteção dos objetivos das atividades de investigação, realizada no n.° 3 da decisão impugnada

70      O n.° 3 da decisão impugnada está dividido em duas partes. O n.° 3.1, com o título «Inquérito em curso», diz respeito à justificação da recusa de acesso ao abrigo da proteção dos objetivos da investigação em curso. No n.° 3.2, com a epígrafe «Proteção, para além do presente inquérito, dos documentos do inquérito», a Comissão expõe, em primeiro lugar, que as pessoas singulares e coletivas que, voluntariamente ou obrigadas, comuniquem informações no quadro da aplicação do Regulamento n.° 1/2003 têm o legítimo direito de esperar que a Comissão não divulgue esses documentos e que os mesmos apenas sejam utilizados para os efeitos do processo de concorrência, incluindo no quadro do controlo operado pelos tribunais da União. A Comissão remete igualmente para as disposições do Regulamento n.° 1/2003 que excluem a divulgação de informações, abrangidas por sigilo profissional, que a Comissão tenha obtido por aplicação do referido regulamento. No caso de a Comissão defraudar a confiança das empresas, divulgando documentos que lhes foram solicitados, a vontade de cooperação das empresas diminuiria, a tal ponto que a Comissão deixaria de poder cumprir corretamente a sua missão de aplicação do direito da concorrência. Por fim, a Comissão indica expressamente que « [a] fundamentação que precede aplica‑se aos cinco tipos de documentos [no n.° 2 da decisão impugnada]».

71      Resulta igualmente da análise dos diversos números da decisão impugnada consagrados às diferentes categorias de documentos que o raciocínio da Comissão é largamente idêntico para as categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a).

72      Com efeito, a Comissão baseou‑se fundamentalmente, para cada uma das suas categorias, na consideração de que a divulgação dos documentos tornaria públicas as informações dadas pelos requerentes de clemência e pelos destinatários de pedidos de informações, o que facilitaria a apresentação de pedidos de indemnização contra as empresas que cooperaram ou responderam a pedidos de informações e, por via de consequência, dissuadiria os requerentes de clemência e os futuros destinatários de pedidos de informações de cooperarem com a Comissão. Esse enfraquecimento do seu programa de clemência e dos seus inquéritos impediria a Comissão de desempenhar com eficácia a sua missão de garantir a observância do direito da concorrência da União.

73      Mais precisamente, no que se refere à categoria 1, a Comissão salientou o facto de os advogados seguirem muito rigorosamente a sua prática em matéria de clemência, de forma que as suas práticas num processo podem ter repercussões em processos futuros. No que se refere à categoria 2, a Comissão salienta que os destinatários de pedidos de informações ao abrigo do artigo 18.° do Regulamento n.° 1/2003 poderiam ser levados a reduzir as suas respostas ao mínimo indispensável ou recorrer a táticas dilatórias, obrigando‑a assim a suspender as suas decisões formais para obter informações. No que se refere à categoria 4, a Comissão salientou a confiança legítima das empresas que com ela cooperam em que as informações que fornecem só sejam divulgadas nos limites previstos no Regulamento n.° 1/2003. No que se refere à categoria 5, alínea a), a Comissão limitou‑se a indicar, de maneira muito geral, que a divulgação destes documentos, «como já explicara para as categorias de documentos [1 a 4]», poria em causa os objetivos do inquérito, sem apresentar uma justificação autónoma relativa ao conteúdo específico dos documentos da referida categoria.

74      Perante as justificações dadas pela Comissão para recusar o acesso aos documentos das categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a), não existe uma diferença real entre o conteúdo dos documentos destas categorias, de forma que a classificação em categorias não desempenha qualquer função útil no quadro da decisão impugnada.

75      É certo que a Comissão afirmou na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, que, embora a recusa de acesso se tenha baseado apenas nalguns princípios jurídicos essenciais, as explicações apresentadas na decisão impugnada demonstram que teve em consideração as particularidades dos documentos das várias categorias. Todavia, há que concluir que as razões invocadas para as categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a), resumidas no n.° 73, supra, são largamente generalizáveis e passíveis de se aplicarem igualmente a todas as categorias de documentos.

76      A divisão em categorias operada pela Comissão era portanto, no que se refere às categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a), artificial, pois não corresponde a diferenças reais de conteúdo dos documentos das diferentes categorias. Donde resulta que as condições indicadas no n.° 64, supra, para que a Comissão fique dispensada de efetuar um exame individual e concreto de cada documento não estavam reunidas, de forma que a Comissão estava obrigada a analisar individualmente os documentos incluídos nessas categorias.

77      Em contrapartida, no que se refere à categoria 3, relativa aos documentos apreendidos nas inspeções realizadas nas instalações das empresas, a Comissão invoca, de forma especificada, a confiança legítima das empresas em que os documentos por ela obtidos no exercício das suas competências não sejam tornados públicos e sejam utilizados exclusivamente para os efeitos do processo em matéria de concorrência. Há que recordar, a este respeito, que os documentos da categoria 3 se distinguem dos documentos das outras categorias pela maneira como foram obtidos pela Comissão, ou seja, pelo facto de terem sido recolhidos, nos termos do artigo 20.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1/2003, contra a vontade das empresas em causa nas inspeções efetuadas inopinadamente pela Comissão, ao passo que todos os demais documentos que não são provenientes da própria Comissão ou foram fornecidos voluntariamente pelas empresas, ou, quando estas estavam obrigadas a fornecer informações, puderam ser fornecidos após demorada reflexão e, eventualmente, recorrendo ao parecer de consultores jurídicos. Tendo em conta este elemento de coação na entrega dos documentos da categoria 3, a confiança que as empresas em causa poderiam eventualmente depositar no facto de os documentos apreendidos irem ser exclusivamente utilizados no quadro do inquérito desenvolvido pela Comissão nos termos do artigo 81.° CE, era diferente, por natureza, da invocada pela Comissão no que se refere aos documentos da categoria 4, que podia alegadamente ser baseada no facto de os documentos fornecidos voluntariamente não irem ser divulgados, e isto mesmo que esta confiança estivesse ligada, nos dois casos, às disposições do artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003. A justificação avançada pela Comissão quanto aos documentos da categoria 3 baseia‑se portanto em critérios específicos a tomar em conta para decidir sobre a eventual recusa do acesso aos documentos em causa.

78      Do que precede há que concluir que a categoria 3 era a única categoria de documentos das definidas pela Comissão que, do ponto de vista da justificação desenvolvida na decisão impugnada, tinha utilidade no quadro da análise do pedido de acesso. Esta conclusão não permite no entanto antecipar o exame da correção dos fundamentos invocados pela Comissão para recusar o acesso aos documentos da referida categoria.

79      Por conseguinte, a Comissão não podia dispensar‑se, no n.° 3 da decisão impugnada, dedicado à exceção baseada na proteção dos objetivos do inquérito, de analisar individual e concretamente os documentos das categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a).

–       Quanto à análise da exceção baseada na proteção dos interesses comerciais, analisada no n.° 4 da decisão impugnada

80      Há que salientar, primeiramente, que, embora no n.° 4 da decisão impugnada, dedicado à exceção baseada na proteção dos interesses comerciais, a Comissão constate que o acesso aos documentos das categorias 1 a 4 deve ser negado com fundamento no artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, não menciona os documentos da categoria 5. Deve portanto considerar‑se que a Comissão não invocou essa exceção para estes documentos.

81      Por outro lado, o raciocínio da Comissão no n.° 4 da decisão impugnada não foi formulado em função das categorias de documentos tal como definidas no n.° 2 da decisão. Com efeito, distingue dois grupos de documentos, o primeiro constituído pelos «documentos oriundos das empresas envolvidas», o segundo constituído pelos «documentos da Comissão».

82      Ora, tal como a distinção em categorias operada para efeitos de aplicação da exceção baseada na proteção dos objetivos do inquérito (v. n.os 70 a 76, supra), esta distinção é artificial, pois o raciocínio utilizado para justificar a recusa de acesso é na realidade o mesmo para os dois grupos de documentos.

83      Assim, após ter explicado que os documentos oriundos das empresas envolvidas «contêm informações comerciais sensíveis de natureza diversa» e «dados detalhados sobre a atividade comercial e sobre o comportamento no mercado» das empresas em causa, informações essas que estas empresas têm um legítimo interesse em proteger de terceiros à procura de as obter, a Comissão prossegue afirmando que «a fundamentação atrás exposta relativamente aos documentos oriundos das empresas em causa é válida igualmente para os seus próprios documentos».

84      Sob a capa de uma análise por categorias de documentos, o raciocínio da Comissão é portanto geral e aplica‑se a todos os documentos das categorias 1 a 4, em violação da sua obrigação, decorrente da jurisprudência citada no n.° 40, supra, de fornecer explicações sobre a questão de saber como é que o acesso a cada um dos documentos em causa poderia, concreta e efetivamente, afetar a proteção dos interesses comerciais.

85      Por consequência, a Comissão não podia dispensar‑se, no n.° 4 da decisão impugnada, dedicada à exceção baseada na proteção de interesses comerciais, de proceder ao exame individual e concreto dos documentos solicitados abrangidos nas categorias 1 a 4.

–       Quanto à análise da exceção baseada na proteção do processo decisório da Comissão, realizada no n.° 3 da decisão impugnada

86      Como mencionado no n.° 9, supra, a Comissão invocou a exceção referida no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, baseada na proteção do seu processo decisório, apenas relativamente aos documentos da categoria 5, alínea a).

87      Nos termos do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo do Regulamento n.° 1049/2001, «o acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação».

88      Em primeiro lugar, decorre implicitamente do n.° 3.2.5 da decisão impugnada e expressamente da resposta da Comissão de 9 de novembro de 2011 às questões escritas do Tribunal Geral que a Comissão considera que todos os documentos da categoria 5 a) contêm pareceres destinados a utilização interna, no sentido desta disposição.

89      Em segundo lugar, tal como salientado nos n.os 64 e 65, supra, só no caso de uma exceção ao direito de acesso abranger manifesta e integralmente os documentos de uma categoria é que a instituição pode dispensar‑se de proceder a um exame individual desses documentos.

90      Ora, no caso em apreço, nada permite supor que todos os documentos da categoria 5, a), são manifesta e integralmente abrangidos pela referida exceção. Pelo contrário, dada a natureza dos documentos incluídos nas três sub‑categorias da categoria 5 a), tal como definidas pela Comissão no n.° 2 da decisão impugnada e como precisadas na resposta de 9 de novembro de 2011 às questões escritas do Tribunal Geral, tudo leva a crer que um grande número desses documentos incluem passagens que não constituem pareceres no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1409/2001. Isto aplica‑se, designadamente, aos cabeçalhos desses documentos, às suas partes introdutórias e às cartas de acompanhamento que servem para os comunicar aos diferentes destinatários.

91      Por conseguinte, há que constatar que a Comissão não podia eximir‑se, na passagem do n.° 3 da decisão impugnada, consagrada à exceção baseada na proteção do seu processo decisório, a analisar individual e concretamente os documentos da categoria 5, a), isto mesmo sem ter de se analisar, nesta fase da apreciação, se a Comissão fez prova bastante de que todos os documentos incluídos na categoria 5 a) continham pareceres, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

92      Daqui decorre que, para se poder dispensar de proceder a um exame individual e concreto dos documentos solicitados, a Comissão apenas podia proceder a um exame por categoria relativamente aos documentos da categoria 3.

 Quanto à exceção invocada na contestação baseada no aumento injustificado e excecional do volume de trabalho

93      Como constatado nos n.os 50 a 52, supra, esta exceção não serve para justificar a falta de um exame individual e concreto dos documentos solicitados porque não foi invocada na decisão impugnada. Contudo, por preocupação de exaustividade, é oportuno examinar também este argumento.

94      A Comissão alegou, no n.° 103 da sua contestação, que chamara a atenção da recorrente sobre o volume do dossier e o volume de trabalho que o seu pedido implicava, mas nem por isso a recorrente precisou suficientemente o seu pedido. Ao mesmo tempo, a Comissão invocou a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual, em circunstâncias excecionais, o volume de trabalho que o exame individual e concreto de um grande número de documentos implica pode justificar a procura de um «acordo equitativo» com o requerente, a fim de conciliar os interesses do requerente e os de uma boa administração (acórdão do Tribunal Geral de 19 de julho de 1999, Hautala/Conselho, T‑14/98, Colet., p. II‑2489, n.° 86, e acórdão VKI, já citado no n.° 28, supra, n.os 101 a 103).

95      Ora, no caso em apreço, a Comissão não pode invocar esta jurisprudência para justificar a falta, na decisão impugnada, de um exame individual e concreto dos documentos requeridos.

96      Em primeiro lugar, e contrariamente ao que afirma a Comissão, resulta dos autos que a recorrente respondeu favoravelmente à proposta de restringir o seu pedido de acesso. Com efeito, a recorrente juntou, em anexo ao seu requerimento, um fax de 11 de janeiro de 2008, na sequência de uma conversa telefónica com a Comissão no dia anterior. Nesse fax, a recorrente limita o seu pedido de acesso «a fim de limitar o mais possível o volume de trabalho da Direção‑Geral da Concorrência», renunciando a três categorias de documentos: todos os documentos referentes à estrutura das empresas implicadas, todos os documentos referentes exclusivamente à identificação do destinatário da decisão CIG e todos os documentos integralmente redigidos em japonês.

97      Neste contexto, há que rejeitar o argumento da Comissão baseado na troca de emails de janeiro de 2008 e que demonstrariam, segundo a Comissão, que, apesar dos seus reiterados pedidos apresentados por email de 22 de janeiro de 2008, a recorrente não precisou o seu pedido de acesso. Com efeito, a troca de emails em causa foi iniciada por um email de 18 de janeiro de 2008, em que a recorrente exprime o seu descontentamento relativamente ao facto de a Comissão não ter respondido ao seu pedido inicial de 13 de dezembro de 2007 no prazo de quinze dias úteis previsto no Regulamento n.° 1049/2001. Resulta da resposta da Comissão de 22 de janeiro de 2008 (10 h 24 m), bem como da resposta da recorrente do mesmo dia (11 h 51 m), que a Comissão não tinha ainda, nesta altura, tido em consideração o fax da recorrente de 11 de janeiro de 2008, em que a recorrente limitou o seu pedido inicial, ao passo que a recorrente dispunha de um relatório de transmissão correto deste fax. A correspondência terminou com outro email da Comissão de 22 de janeiro de 2008 (16 h 57 m), em que esta tomava conhecimento da vontade de cooperação da recorrente e também da receção da limitação do pedido de acesso.

98      Assim, se a Comissão recordou à recorrente, no decurso desta troca de emails, o seu compromisso de limitar o pedido, esta observação era devida ao facto de a Comissão não ter tido em consideração um fax anterior em que tal limitação tinha sido efetuada, como ela própria reconheceu no email que encerrou esta série de emails. Nestas circunstâncias a Comissão não pode invocar que a recorrente não respondeu ao seu convite de 22 de janeiro de 2008 no sentido de precisar o seu pedido.

99      Por outro lado, a carta da Comissão de 30 de janeiro de 2008, que rejeitou o pedido inicial, tem em conta, no seu n.° 1, a limitação do pedido de acesso, e não indica que essa limitação fosse insuficiente face ao volume de trabalho envolvido.

100    Em segundo lugar, a Comissão não avançou qualquer argumento capaz de demonstrar que a envergadura do volume de trabalho gerado por um exame individual e concreto dos documentos requeridos era de tal forma excecional que justificasse a recusa desse tipo de exame. O Tribunal Geral declarou a este respeito que, na medida em que o direito de acesso aos documentos na posse das instituições constitui uma solução de princípio, é à instituição que invoca uma exceção relacionada com o caráter pouco razoável da tarefa exigida pelo pedido que incumbe o ónus da prova da sua amplitude (acórdão VKI, já referido no n.° 28, supra, n.° 113).

101    Quanto ao volume de trabalho exigido para tratar um pedido, esta consideração não é, em princípio, pertinente para adaptar o âmbito do direito de acesso, a partir do momento em que o Regulamento n.° 1049/2001 previu expressamente a possibilidade de que um pedido de acesso pudesse abranger um grande número de documentos, pois os seus artigos 7.°, n.° 3, e 8.°, n.° 2, previram que os prazos de tratamento dos pedidos iniciais e dos pedidos confirmativos podiam ser prorrogados a título excecional, por exemplo quando o pedido incida sobre um documento muito longo ou sobre um grande número de documentos (acórdão VKI, já referido no n.° 28, supra, n.os 108 e 110).

102    Por outro lado, o volume de trabalho necessário para proceder ao exame de um pedido depende não apenas do número e volume dos documentos solicitados, mas igualmente da sua natureza. Por conseguinte, a necessidade de se proceder a um exame individual e concreto de muitos documentos não significa, por si só, que o argumento do volume de trabalho seja relevante, pois tal volume depende igualmente da profundidade desse exame (acórdão VKI, n.° 28, supra, n.° 111).

103    Por conseguinte, apenas a título excecional e unicamente quando a carga administrativa provocada pelo exame individual e concreto de documentos for particularmente pesada, excedendo assim os limites do que pode ser razoavelmente exigido, é que se poderá admitir uma derrogação a esta obrigação de exame (v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral, de 7 de fevereiro de 2002, Kuijer/Conselho, T‑211/00, Colet., p. II‑485, n.° 57, e acórdão VKI já referido no n.° 28, supra, n.° 112).

104    Ora, no caso em apreço, a Comissão não demonstrou, nem sequer alegou, que antes do processo no Tribunal Geral essas circunstâncias já estivessem reunidas. É verdade que a Comissão mencionou, na parte introdutória da decisão impugnada, uma carta de 10 de abril de 2008, em que informava a recorrente de que, tendo em conta o volume do dossier, que tinha mais de 1900 documentos, não tinha condições de tratar o pedido de acesso no prazo previsto no Regulamento n.° 1949/2001, pelo que exerceu a faculdade prevista no artigo 8.°, n.° 2, deste regulamento e prorrogou o prazo de resposta ao pedido confirmativo de acesso. Contudo, a Comissão não invocou nesta fase que não lhe seria possível, devido ao volume de trabalho gerado, proceder a um exame concreto e individualizado dos documentos. Daqui há que concluir, a contrario, que a própria Comissão não considerava ela própria esse volume de trabalho como não razoável.

105    Em terceiro lugar, há que recordar que quando a instituição provou o caráter não razoável da carga administrativa suportada para fazer um exame individual e concreto dos documentos requeridos, tem a obrigação de chegar a um acordo com o requerente para tomar conhecimento ou para precisar o seu interesse na obtenção dos documentos em causa, e, por outro lado, tem de formular concretamente as opções que se lhe apresentam para tomar uma medida menos limitativa do que um exame individual e concreto dos documentos. Uma vez que o princípio é o do acesso aos documentos, a instituição fica obrigada a privilegiar a opção que, não constituindo em si mesma uma tarefa que exceda os limites do que pode ser razoavelmente exigido, continue a ser a mais favorável ao direito de acesso do requerente (acórdão VKI, já referido no n.° 28, supra, n.° 114).

106    Decorre daqui que a instituição só pode dispensar completamente um exame concreto e individual após ter realmente estudado todas as demais opções possíveis e explicado de forma circunstanciada, na sua decisão, as razões pelas quais estas diversas opções implicam também um volume de trabalho além do razoável (acórdão VKI, já referido no n.° 28, supra, n.° 115).

107    No caso em apreço, não resulta dos fundamentos da decisão impugnada que a Comissão tenha apreciado, de forma concreta, precisa e circunstanciada, por um lado, as demais opções a encarar para limitar o seu volume de trabalho e, por outro, as razões que lhe poderiam evitar proceder a um qualquer exame e não adotar, eventualmente, uma medida menos restritiva para o direito de acesso do recorrente. Em especial, não resulta da decisão impugnada que a Comissão tenha concretamente estudado a opção que consistia em identificar e depois examinar, individual e concretamente, alguns documentos que seriam os adequados para satisfazer imediatamente e, até, parcialmente, num primeiro momento, os interesses da recorrente.

108    Por conseguinte, a Comissão não cumpriu as condições formuladas na jurisprudência VKI/Comissão para poder dispensar‑se de examinar individual e concretamente os documentos solicitados alegando o volume de trabalho gerado por esse exame.

109    Resulta de quanto precede que a Comissão podia proceder a um exame por categorias no que se refere unicamente à exceção baseada na proteção dos objetivos das atividades de inquérito, relativamente apenas aos documentos da categoria 3, ou seja, os documentos obtidos em inspeções (v. n.° 77, supra). A este respeito, a Comissão podia dispensar‑se de um exame individual e concreto dos documentos solicitados. Esta conclusão não prejudica a questão de saber se a Comissão podia legitimamente basear a recusa de acesso a estes documentos na referida exceção, questão que é analisada nos n.os 113 e seguintes, infra.

110    Em contrapartida, no caso de todos os outros documentos solicitados e no caso de todas as demais exceções invocadas, a Comissão devia ter procedido a um exame individual e concreto. Na medida em que a Comissão não procedeu a tal exame, a decisão impugnada é ilegal, por violação do dever de proceder a um exame individual e concreto dos documentos que são objeto do pedido de acesso:

¾        Na parte em que esse pedido diz respeito à aplicação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, quanto aos documentos das categorias 1, 2, 4 e 5, alínea a);

¾        Na parte em que o pedido diz respeito à aplicação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1409/2001, quanto aos documentos das categorias 1 a 4;

¾        Na parte em que o pedido diz respeito à aplicação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, quanto aos documentos da categoria 5, a).

111    Assim, há que anular a decisão impugnada na medida em que recusou o acesso aos documentos das categorias 1, 2, 4 e 5, a).

112    No que se refere aos outros documentos de categorias diferentes da categoria 3, o exame das exceções ao direito de acesso invocadas na decisão impugnada é feito a título meramente complementar.

b)     Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001

113    A recorrente, apoiada pelo Reino da Suécia, sustenta que o acesso aos documentos por si requerido não terá como consequência nem pôr em causa os inquéritos em curso nem os inquéritos futuros. No que se refere ao inquérito no processo COMP/F/38.899, a recorrente considera que o mesmo foi encerrado pela decisão CIG. Uma eventual reabertura do inquérito após a anulação da decisão pelo Tribunal Geral constituiria a abertura de um novo processo. No que toca aos inquéritos futuros, a recorrente considera que o raciocínio da Comissão implica a criação de um novo motivo de derrogação que não tem qualquer fundamento no teor literal do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001 e que suprime o efeito útil do direito de acesso.

114    A Comissão, apoiada pela ABB e pela Siemens, sustenta que a necessidade de proteger os objetivos do processo COMP/F/38.899 subsiste até que a decisão CIG seja definitiva. Além disso, segundo afirma, o campo de aplicação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 estende‑se, de uma forma geral, à proteção da sua missão de aplicação do direito da concorrência e, em especial, à proteção do seu programa de clemência. Ora, a divulgação dos documentos comunicados pelas empresas no quadro de um pedido de clemência seria suscetível de dissuadir, no futuro, a cooperação voluntária com a Comissão.

115    No caso em apreço, a Comissão recusou comunicar à recorrente documentos referentes a procedimentos de exame de auxílios de Estado concedidos à recorrente, invocando para tal a exceção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, relativa à proteção dos objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria. As partes não contestam que os documentos solicitados resultam de «atividades de inquérito» no sentido daquela disposição. Contudo, a recorrente alega que, uma vez terminado o inquérito, essa exceção deixa de se aplicar.

116    Em primeiro lugar, importa recordar que, como resulta da sua formulação, a exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 não se destina a proteger as atividades de inquérito enquanto tais, mas sim o objetivo dessas atividades, o qual consiste, no caso de um processo em matéria de concorrência, em verificar se foi cometida uma infração ao artigo 81.° CE e em punir os responsáveis. É por esta razão que os documentos do dossier referentes aos atos de inquérito podem continuar protegidos pela exceção enquanto esse objetivo não tiver sido atingido, mesmo que o inquérito ou a inspeção específicos que deram origem ao documento cuja consulta é pedida tenham terminado (acórdão do Tribunal Geral de 12 de setembro de 2007, API/Comissão, T‑36/04, Colet., p. II‑3201, n.° 133; v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, Colet., p. II‑2023, n.° 110, e, no tocante à aplicação do código de conduta de 1993, acórdão do Tribunal Geral de 13 de setembro de 2000, Denkavit Nederland/Comissão, T‑20/99, Colet., p. II‑3011, n.° 48).

117    Ora, no caso em apreço, à data em que foi tomada a decisão impugnada, a Comissão tinha tomado há quase 17 meses a decisão CIG, que constatou as infrações imputadas pela Comissão às empresas em questão e que pôs assim termo ao processo COMP/F/38.899. Não se pode, portanto, contestar que, nessa data, não estava em curso nenhuma atividade de inquérito destinada a provar a existência das infrações em causa que pudesse ter sido posta em perigo pela divulgação dos documentos requeridos.

118    É verdade que, à data em que foi tomada a decisão impugnada, estavam pendentes no Tribunal Geral recursos interpostos da decisão CIG, pelo que, na hipótese de uma anulação desta decisão por este Tribunal, o processo era suscetível de ser reaberto. Esta situação não se alterou com a prolação dos acórdãos em causa, pois estão atualmente pendentes no Tribunal de Justiça vários recursos interpostos desses acórdãos.

119    Todavia, deve considerar‑se que as atividades de inquérito num processo concreto foram concluídas com a decisão final, independentemente de uma eventual anulação ulterior pelos tribunais, pois foi nesse momento que a própria instituição em causa deu o processo por concluído.

120    Além disso, admitir que os diversos documentos relacionados com atividades de inquérito estão abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 enquanto não forem decididas todos as possíveis consequências dos processos judiciais, mesmo no caso de ter sido interposto no Tribunal Geral um recurso que pode eventualmente conduzir à reabertura do processo na Comissão, equivaleria a sujeitar o acesso aos referidos documentos a factos aleatórios, a saber, o resultado do referido recurso e as consequências que dele poderia retirar a Comissão. Em todo o caso, tratar‑se‑ia de eventos futuros e incertos, dependentes das decisões das sociedades destinatárias da decisão que pune um cartel e das de diversas autoridades em questão.

121    Tal solução colidiria com o objetivo que consiste em garantir o acesso mais amplo possível do público aos documentos das instituições, com a finalidade de dar aos cidadãos a possibilidade de controlar de forma mais efetiva a legalidade do exercício do poder público (acórdão API/Comissão, n.° 116, supra, n.° 140; v., neste sentido, acórdão Franchet e Byk/Comissão, n.° 116, supra, n.° 112).

122    Donde se conclui que a divulgação do índice não era suscetível de prejudicar a proteção dos objetivos das atividades de inquérito no tocante ao processo na Comissão relativo ao cartel sobre os CIG.

123    Em segundo lugar, esta apreciação não pode ser colocada em causa pelo argumento da Comissão segundo o qual o conceito de «objetivos das atividades de inquérito» tem um alcance mais geral, de modo a englobar toda a política da Comissão em matéria de repressão e de prevenção dos cartéis.

124    Segundo a Comissão, em substância, a noção de «inquéritos» não poderia ser limitada, no domínio do inquérito, ao processo que precede uma decisão de proibição, mas deve ser considerada como parte integrante da missão regular e constante da Comissão que consiste em aplicar o direito da concorrência da União. Assim, o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 poderia aplicar‑se após a conclusão de um processo determinado. Dado que no processo de repressão dos cartéis a Comissão é tributária da cooperação das empresas em causa, a mesma considera que, a não existir confidencialidade dos documentos que aquelas lhe comunicam, as referidas empresas seriam menos estimuladas a requerer clemência e cingir‑se‑iam ao mínimo para a comunicação de qualquer outra infração, designadamente no quadro dos pedidos de informações e de inspeções. A proteção da confidencialidade é portanto uma condição da perseguição efetiva das infrações ao direito da concorrência, sendo assim um elemento essencial da política de concorrência da Comissão.

125    Contudo, a aceitação da interpretação proposta pela Comissão redundaria em permitir‑lhe subtrair à aplicação do Regulamento n.° 1049/2001, sem limite temporal, a totalidade da sua atividade em matéria de concorrência, com a simples referência a uma possível futura afetação do seu programa de clemência. Há que ter em conta a este respeito o facto de que as consequências temidas pela Comissão para o seu programa de clemência dependem de vários fatores aleatórios, nomeadamente, do uso que as partes lesadas pelo cartel farão dos documentos obtidos, do grau de sucesso das eventuais ações indemnizatórias por elas propostas, dos montantes que venham a conseguir obter nos tribunais nacionais e ainda das reações futuras das empresas que participam nos cartéis.

126    Há que concluir que uma interpretação assim tão ampla do conceito de atividades de inquérito é inconciliável com o princípio segundo o qual, devido ao objetivo do Regulamento n.° 1049/2001, que visa, em conformidade com o seu quarto considerando, «permitir o mais amplo efeito possível do direito de acesso do público aos documentos», as exceções visadas no artigo 4.° deste Regulamento devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v. jurisprudência referida no n.° 41, supra).

127    Importa realçar, a este respeito, que nada há no Regulamento n.° 1049/2001 que permita pressupor que a política da concorrência devesse beneficiar, no quadro da aplicação deste regulamento, de um tratamento diferente relativamente a outras políticas da União. Não existe, pois, qualquer razão para interpretar o conceito de «objetivos das atividades de inquérito» de um modo diferente no quadro da política da concorrência e nas outras políticas da União.

128    Importa, além disso, recordar que os programas de clemência e de cooperação cuja eficácia a Comissão procura proteger não constituem os únicos meios de garantir o respeito das regras da concorrência da União. Efetivamente, as ações de indemnização por perdas e danos junto dos órgãos jurisdicionais nacionais são suscetíveis de contribuir substancialmente para a manutenção de uma concorrência efetiva na União (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan, C‑453/99, Colet., p. I‑6297, n.° 27).

129    Resulta de quanto precede que a Comissão cometeu um erro de direito ao considerar, na decisão impugnada, que a exceção ao direito de acesso aos documentos prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável ao caso concreto. A Comissão não podia recusar o acesso aos documentos da categoria 3 com base nessa exceção.

130    Por conseguinte, há que julgar procedente a primeira parte do primeiro fundamento da recorrente, no que se refere aos documentos das categorias 1, 2, 3, 4 e 5, alínea a).

c)     Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001

131    Em primeiro lugar, a recorrente, apoiada pelo Reino da Suécia, alega, em substância, que, devido à sua antiguidade, os dados que figuram nos documentos que fazem parte do dossier requerido deixaram de ser uma ameaça para os interesses comerciais das empresas em causa. Em segundo lugar, a recorrente considera que o interesse dos membros do cartel em que os documentos do dossier permaneçam secretos não é objetivamente digno de proteção. Em terceiro lugar, os membros do cartel não podem invocar a confiança legítima na não divulgação dos documentos em causa.

132    A Comissão, apoiada pela ABB e pela Siemens, alega, em substância, que a noção de «proteção dos interesses comerciais» deve ter uma interpretação ampla. Segundo a Comissão, foi já analisado o caráter confidencial no quadro do acesso ao dossier das partes envolvidas no inquérito em matéria de concorrência, de forma que seria desnecessária uma nova apreciação concreta e exaustiva. Além disso, o caráter sensível dos dados comerciais não poderia ser apreciado apenas em função da sua antiguidade. Aliás, o Regulamento n.° 1/2003, que enuncia taxativamente as sanções de direito público que podem ser aplicadas a uma empresa que participe num cartel, não prevê a abolição de direitos no que se refere à proteção dos interesses comerciais dessas empresas.

133    Em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, as instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a proteção de interesses comerciais das pessoas singulares ou coletivas, exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação do documento em causa.

134     Há que salientar que embora a jurisprudência não tenha definido o conceito de «interesses comerciais» o Tribunal Geral esclareceu que não se pode considerar que toda e qualquer informação relativa a uma sociedade e às suas relações de negócios está coberta pela proteção que deve ser garantida aos interesses comerciais em conformidade com o artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, sob pena de se pôr em causa a aplicação do princípio geral que consiste em conferir ao público o acesso mais amplo possível aos documentos na posse das instituições (acórdão do Tribunal Geral de 30 de janeiro de 2008, Terezakis/Comissão, T‑380/04, não publicado na Coletânea, n.° 93).

135    Há portanto que examinar se a Comissão cometeu um erro ao considerar que os documentos das categorias 1 a 4 se incluem na noção de «interesses comerciais», na aceção do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

136    A recorrente não contesta, de uma forma geral, que os documentos solicitados possam conter informações sobre as relações comerciais das sociedades que participaram no cartel dos CIG, sobre os preços dos seus produtos, sobre a estrutura de custos, as suas quotas de mercado ou sobre elementos semelhantes.

137    Contudo, no que se refere ao primeiro argumento da recorrente, relativo à antiguidade das informações, há que salientar que, nos termos do n.° 23 da Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos 81.° e 82.° do Tratado CE, artigos 53.°, 54.° e 57.° do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.° 139/2004 do Conselho (JO 2005, C 325, p. 7, a seguir «comunicação relativa às regras de acesso ao processo»), a própria Comissão considerou que «[a]s informações que perderam importância comercial, por exemplo devido ao tempo que decorreu, não podem continuar a ser consideradas confidenciais» e que «[r]egra geral, a Comissão presume que as informações sobre o volume de negócios, sobre vendas e quotas de mercado das partes e outras informações semelhantes que datem de há mais de cinco anos deixaram de ser confidenciais».

138    Esta comunicação da Comissão não vincula o Tribunal Geral na interpretação do Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, o seu n.° 2 precisa que o direito de acesso acima apresentado é diferente do direito geral de acesso aos documentos ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 1049/2001, que está sujeito a condições e derrogações diferentes. Além disso, o n.° 23 da mesma comunicação refere‑se à noção de «confidencialidade» e não à de «interesses comerciais» referida no artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. Por consequência, a noção de «interesses comerciais» só pode ser entendida à luz deste regulamento. Contudo, o referido n.° 23 pode fornecer um indício sobre o conteúdo a atribuir a esta noção, segundo a Comissão.

139    Com efeito, uma vez que a Comissão, para interpretar a noção de «confidencialidade», recorreu à noção de «importância comercial», que é semelhante à de «interesses comerciais», pode inferir‑se que, no entendimento da Comissão, o grau de confidencialidade de um documento ou de uma informação depende da importância das consequências negativas que a sociedade em causa poderia recear em caso de divulgação desse documento ou dessa informação. Assim, o n.° 23 da comunicação relativa às regras de acesso ao processo nos processos de concorrência fornece um indício sobre a ponderação dos interesses a que se deve proceder, segundo a própria Comissão, em situações em que as informações relativas a atividades comerciais de uma sociedade podem ser divulgadas a outros operadores económicos cujos interesses podem ser contrários aos da sociedade em causa, como é precisamente aqui o caso. A este respeito, as consequências negativas que a divulgação de uma informação comercialmente sensível pode desencadear são tanto menos importantes quanto mais antiga for a informação (v., neste sentido, os despachos do Tribunal Geral de 15 de novembro de 1990, Rhône‑Poulenc e o./Comissão, T‑1/89 a T‑4/89 e T‑6/89 a T‑15/89, Colet., p. II‑637, n.° 23, e de 19 de junho de 1996, NMH Stahlwerke e o../Comissão, T‑134/94, T‑136/94 a T‑138/94, T‑141/94, T‑145/94, T‑147/94, T‑148/94, T‑151/94, T‑156/94 e T‑157/94, Colet., p. II‑537, n.os 24 e 32).

140    Ora, à data da decisão impugnada, 16 de junho de 2008, a maior parte das informações comercialmente sensíveis contidas nos documentos solicitados tinham muito mais de cinco anos. Com efeito, como sublinha a recorrente, tendo o cartel dos CIG estado ativo de 15 de abril de 1988 até 11 de maio de 2004, apenas as informações relativas aos anos de 2003 e 2004 não tinham ainda ultrapassado uma antiguidade de cinco anos quando a decisão impugnada foi tomada.

141    A Comissão alega que a jurisprudência do Tribunal Geral citada no n.° 139, supra, dizia respeito à noção de «confidencialidade dos negócios» e não à de «interesses comerciais», que é bastante mais ampla, e que o limite de cinco anos referido no n.° 23 da comunicação sobre regras de acesso aos processos de concorrência não é uma regra vinculativa, mas, quando muito, uma «regra empírica». Aliás, cita exemplos de jurisprudência em que os dados foram considerados dignos de proteção para além desse período.

142    A este respeito, há que salientar que, como alega acertadamente a Comissão, não poderia aplicar‑se uma regra estrita segundo a qual toda e qualquer informação relativa a factos com uma determinada antiguidade deveria ser considerada como se não afetasse já os interesses comerciais da sociedade a que se refere. Contudo, como indicado no n.° 139, supra, o facto de as informações em questão terem adquirido uma certa antiguidade aumenta a probabilidade de os interesses comerciais das sociedades envolvidas não serem afetados de forma que justifique a aplicação de uma exceção ao princípio de transparência consagrado no Regulamento n.° 1049/2001. Por consequência, e tendo em conta o facto de que, no caso concreto, as informações relativas às atividades comerciais das sociedades em causa cobriam um período de dezasseis anos (de 1988 a 2004), há que considerar que a Comissão tinha, em qualquer caso, a obrigação de proceder a um exame individual e concreto dos documentos solicitados, perante a exceção baseada na proteção dos interesses comerciais e não podia limitar‑se a apreciações gerais sobre a totalidade dos documentos das categorias 1 a 4. Por não ter procedido a esse exame não fez prova bastante que a divulgação dos documentos solicitados teria afetado os interesses comerciais de pessoas coletivas determinadas.

143    Neste contexto, há que rejeitar o argumento da Comissão de que, tendo em conta o facto de no quadro da publicação da versão confidencial da decisão CIG, e no quadro da concessão de acesso ao processo durante o inquérito, as informações confidenciais contidas no dossier COMP/F/38.899 teriam já sido objeto de um exame destinado a verificar se eram dignas de proteção, não sendo necessário proceder a novo exame concreto e exaustivo dos diversos documentos.

144    Com efeito, em primeiro lugar, este argumento confunde diferentes disposições que regulam a confidencialidade de informações protegidas e que, no entanto, implicam a aplicação de diferentes critérios de apreciação da necessidade de proteção e de ponderação dos interesses pró e contra a concessão de acesso. A própria Comissão reconheceu esta circunstância no n.° 2 da Comunicação sobre o acesso ao processo nos processos de concorrência, citado no n.° 138, supra.

145    A título exemplificativo, o acesso a determinados documentos do dossier de que gozam as empresas a que a Comissão dirigiu uma acusação, nos termos do artigo 27.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, decorre do exercício dos seus direitos de defesa e, como salientado no n.° 60, supra, os documentos obtidos a este título só podem ser utilizados em processos judiciais ou administrativos cujo objeto seja a aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE. Assim, os direitos de defesa, enquanto direitos específicos decorrentes dos direitos fundamentais das empresas em causa, dão lugar, mas apenas para fins específicos, ao acesso a documentos específicos dos quais só estão excluídos os documentos internos da instituição, os segredos negociais de outras empresas e as outras informações confidenciais. Pelo contrário, o direito de acesso do público nos termos do Regulamento n.° 1049/2001, enquanto direito de ordem geral, dá potencialmente lugar, sem restrições quanto à utilização dos documentos obtidos, ao acesso a todos os documentos na posse das instituições, sendo esse acesso suscetível de ser recusado por uma série de razões enunciadas no artigo 4.° do referido regulamento. Tendo em conta estas diferenças, o facto de a Comissão já ter apreciado a medida em que podia dar acesso às informações constantes do dossier COMP/F/38.899, no contexto do acesso ao dossier a título de direito de defesa, ou em que medida essas informações deviam ser publicadas, no quadro da versão não confidencial da decisão CIG, não a dispensava de um novo exame destas questões à luz das condições específicas ligadas ao direito de acesso nos termos do Regulamento n.° 1049/2001.

146    Em segundo lugar, resulta das considerações expostas nos n.os 139 a 142, supra, que o mero decurso do tempo pode reduzir progressivamente a necessidade de proteção, a título dos interesses comerciais, das informações constantes do dossier COMP/F/38.899. Assim, o simples facto de terem passado mais de dois anos entre a concessão de acesso ao dossier nos termos do artigo 27.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003, em abril de 2006, e a data da decisão impugnada, 16 de junho de 2008, era suficiente para que a Comissão fosse obrigada a realizar um novo exame das exigências de confidencialidade decorrentes da proteção dos interesses comerciais das empresas em causa.

147    Finalmente, há que constatar que os interesses das empresas que participaram no cartel — nomeadamente das intervenientes ABB e Siemens — na não divulgação dos documentos, não podem ser qualificados de interesses comerciais, no sentido próprio do termo. Com efeito, tendo em conta a antiguidade da maior parte das informações constantes do dossier em causa, o interesse que as sociedades em causa poderiam ter na não divulgação dos documentos solicitados não parece consistir na preocupação de preservar a sua situação concorrencial no mercado dos CIG em que operam, mas antes na vontade de evitar que venham a ser alvo de pedidos de indemnização apresentados nos tribunais nacionais.

148    Ora, apesar de o facto de uma sociedade poder ser alvo de um pedido de indemnização poder ter indubitavelmente custos elevados, quanto mais não seja em termos de honorários de advogados, mesmo no caso de as ações virem ulteriormente a ser julgadas improcedentes, é também verdade que o interesse que uma sociedade que participou num cartel tem em evitar tais ações não pode ser qualificado de interesse comercial e, em todo o caso, não constitui um interesse digno de proteção, designadamente perante o direito que assiste a qualquer pessoa de pedir reparação do prejuízo que lhe tenha causado um comportamento suscetível de restringir ou falsear o jogo da concorrência (acórdãos do Tribunal de Justiça Courage e Crehan, já referido no n.° 128, supra, n.os 24 e 26, e de 13 de julho de 2006, Manfredi e o., C‑295/04 a C‑298/04, Colet., p. I‑6619, n.os 59 e 61).

149    Resulta das considerações precedentes que a Comissão não demonstrou de forma juridicamente bastante que o acesso aos documentos solicitados criaria o risco de prejudicar concreta e efetivamente os interesses comerciais das empresas que participaram no cartel.

150    Por conseguinte, há que acolher a segunda parte do primeiro fundamento da recorrente.

d)     Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001

151    A recorrente alega que a Comissão cometeu um erro de direito, porquanto, ao excluir globalmente do direito de acesso os documentos da categoria 5, alínea a), em aplicação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, recusou o acesso a documentos que não incluíam pareceres para uso interno, no sentido desta disposição. Além disso, a Comissão não explicou em que é que a consulta desses documentos pela recorrente poderia prejudicar gravemente o processo decisório, como exigido pela referida disposição. Com efeito, depois de tomada a decisão CIG, já não é concebível que a divulgação de documentos internos possa favorecer tentativas de influenciar os resultados do inquérito.

152    Em primeiro lugar, é de sublinhar que o artigo 4.°, n.° 3, distingue claramente entre processos já encerrados e processos pendentes. Assim, por um lado, nos termos do primeiro parágrafo desta disposição, enquadra‑se no âmbito de aplicação da exceção que visa a proteção do processo decisório qualquer documento elaborado por uma instituição para o seu uso interno ou por ela recebido, relacionado com a matéria sobre a qual a instituição não tenha ainda decidido. Por outro lado, o segundo parágrafo da mesma disposição prevê que, após ter sido tomada a decisão, a exceção em causa abrange unicamente os documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa.

153    Por conseguinte, é apenas em relação a uma parte dos documentos para uso interno, ou seja, os que contêm pareceres para uso interno, no quadro de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, que o segundo parágrafo do referido n.° 3 permite a recusa, mesmo após a decisão, quando a sua divulgação possa prejudicar gravemente o processo decisório dessa instituição.

154    Daqui resulta que o legislador da União considerou que, uma vez tomada a decisão, as exigências de proteção do processo decisório apresentam menor relevância, pelo que a divulgação de qualquer documento além dos mencionados no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, nunca poderá prejudicar o referido processo e a recusa da divulgação desse documento não pode ser autorizada, mesmo que a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente esse processo se tivesse ocorrido antes de a decisão ter sido tomada (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de julho de 2011, Suécia/MyTravel, C‑506/08 P, Colet., p. I‑6237, n.os 78 a 80).

155    No caso em apreço, cabe sublinhar que a Comissão baseou a sua recusa unicamente no segundo parágrafo do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001 e não no primeiro parágrafo da mesma disposição.

156    Em segundo lugar, e no que se refere à questão de saber se a Comissão demonstrou, em termos bastantes, que todos os documentos da categoria 5, alínea a), continham pareceres para utilização interna no quadro de deliberações e consultas prévias, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo do Regulamento n.° 1049/2001, a Comissão sustentou, em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, que essa noção inclui, em primeiro lugar, todos os documentos que contenham ou impliquem uma apreciação ou juízo dos seus funcionários ou dos seus serviços; em segundo lugar, todos os documentos que servem para preparar a sua decisão; e, em terceiro lugar, todos os documentos que servem para garantir a participação de outros serviços no processo. Segundo a Comissão, todos os documentos abrangidos nestas três categorias, que identificou na sua resposta de 9 de novembro de 2011 pelos seus números de página no dossier COMP/F/38.899, correspondem a esta definição.

157    A Comissão baseou‑se, a este respeito, na qualificação feita pelos tribunais da União, de alguns documentos solicitados à Comissão no âmbito de outros processos. Assim, segundo a Comissão, resulta da leitura do acórdão Suécia/MyTravel e Comissão, identificado no n.° 154, supra, e do acórdão do Tribunal Geral de 9 de setembro de 2008, MyTravel/Comissão (T‑403/05, Colet., p. II‑2027), que os tribunais da União qualificaram uma nota dirigida pela DG «Concorrência» ao comité consultivo, uma nota feita no dossier bem como um relatório sobre as consequências de um acórdão e os documentos relativos à preparação desse relatório, como documentos internos que continham pareceres internos, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001. Da mesma forma, o Tribunal Geral teria considerado, no seu acórdão de 9 de junho de 2010, Éditions Jacob/Comissão (T‑237/05, Colet., p. II‑22245), que uma nota da DG «Concorrência» ao serviço jurídico da Comissão, em que era pedido um parecer sobre a aplicação de uma disposição legal, e uma nota que resumia a situação do processo elaborada para o membro da Comissão responsável pela concorrência, continham pareceres deste tipo.

158    Ora há que constatar a este respeito que a Comissão, ao basear‑se em apreciações dos tribunais da União sobre determinados documentos concretos, tenta, através de generalizações e de analogias, assimilar a noção de «pareceres para uso interno como parte de deliberações e de consultas preliminares», na aceção do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo do Regulamento n.° 1049/2001, à de «documento elaborado por uma instituição para uso interno», na aceção do primeiro parágrafo da mesma disposição. Em definitivo, a aceitação dessa definição ampla da noção de «pareceres para uso interno como parte de deliberações e de consultas preliminares» suprimiria parcialmente o efeito útil dos dois parágrafos do n.° 3 desse artigo, cuja função repousa no princípio, salientado pela jurisprudência citada no n.° 154, supra, segundo o qual, após a decisão ter sido tomada pela instituição em causa, a recusa de acesso só é possível para uma parte dos documentos de uso interno.

159    A Comissão não demonstrou portanto, em termos juridicamente bastantes, que todos os documentos da categoria 5, alínea a), continham pareceres, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

160    Além disso, embora as justificações invocadas pela Comissão no processo do Tribunal Geral, reproduzidas no n.° 156, supra, sejam, pelo menos, suscetíveis de tornar plausível a hipótese de muitos documentos da categoria 5, alínea a) conterem pareceres, é forçoso constatar que essas justificações — designadamente a versão confidencial da lista de documentos do dossier COMP/F/38.899 e a identificação, pelos respetivos números de página, dos documentos das três sub‑categorias da categoria 5, alínea a) — não foram invocadas pela Comissão na decisão impugnada e não podem portanto ser consideradas como um dos motivos que a levou a tomá‑la. Por conseguinte, para os efeitos de resolução do presente litígio, há que concluir que a Comissão não demonstrou a qualidade de parecer, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, de todos os documentos da categoria 5, alínea a).

161    Por conseguinte, a decisão impugnada enferma de erro de direito, na medida em que a Comissão considerou que todos documentos da categoria 5, alínea a), continham pareceres, no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

162    Em terceiro lugar, e no que se refere à argumentação que a Comissão usou na decisão impugnada para justificar a recusa de acesso com base no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, a aplicação desta exceção pressupõe que seja demonstrado que o acesso aos documentos solicitados podia prejudicar de uma forma concreta e efetiva a proteção do processo decisório da Comissão e que esse risco de prejuízo era razoavelmente previsível e não puramente hipotético (v. acórdão do Tribunal Geral de 18 de dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado na Coletânea, n.° 74, e jurisprudência citada).

163    Acresce que, para estar abrangido pela exceção do artigo 4.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, a afetação do processo decisório deve ser grave. É assim, nomeadamente, quando a divulgação dos documentos visados tiver um impacto substancial no referido processo. Ora, a apreciação da gravidade depende de todas as circunstâncias em causa, nomeadamente dos efeitos negativos sobre o processo decisório (acórdão Muñiz/Comissão, já referido no n.° 162, supra, n.° 75).

164    No caso em apreço, a Comissão salienta na decisão impugnada que o processo decisório da Comissão exige a manutenção de uma atmosfera de confiança e de discussão aberta, para que os serviços da Comissão possam exprimir livremente o seu ponto de vista, em particular sobre os problemas sensíveis como os processos contra cartéis. Segundo a Comissão, essa seria uma condição essencial para a instituição estar em condições de levar a cabo a sua missão. A publicação de pontos de vista internos e provisórios sobre um inquérito em matéria de cartéis afeta essa capacidade e poderia reduzir a margem de manobra existente no que se refere a um reexame desses pontos de vista.

165    A Comissão acrescenta que deverá continuar o inquérito neste processo se a decisão CIG vier a ser anulada na sequência dos recursos interpostos pelos participantes no cartel. A divulgação de documentos internos poderia favorecer as tentativas de influenciar os resultados do inquérito e, portanto, deterioraria gravemente o processo decisório da Comissão.

166    Há que constatar que essas justificações são invocadas de maneira geral e abstrata, sem serem sustentadas por argumentações circunstanciadas à luz do conteúdo dos documentos em causa. Essas considerações são, assim, suscetíveis de ser invocadas a propósito de qualquer documento da mesma natureza. Por conseguinte, não podem ser suficientes para justificar a recusa de acesso aos documentos solicitados no caso vertente, sob pena de violarem o princípio da interpretação estrita das exceções previstas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, em especial a prevista no seu artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do referido regulamento. Há que sublinhar a este respeito que a Comissão não deu nenhuma indicação de como terceiros poderiam tentar «influenciar os resultados do inquérito», no caso de ele ser reiniciado.

167    Aliás, no que se refere ao argumento de que, na hipótese de a decisão CIG ser anulada, a Comissão deverá tomar uma nova decisão, há que constatar que a Comissão tenta aproximar, ou mesmo equiparar, a presente situação, que se caracteriza — como indicado nos n.os 117 a 119, supra — pelo facto de ter sido já tomada uma decisão, a uma situação em que ainda não foi tomada nenhuma decisão. Ora, nos termos da jurisprudência indicada nos n.os 152 a 154, supra, que insiste nas condições nitidamente mais estritas que se aplicam à possibilidade de recusar o acesso aos documentos após a decisão, há que evitar qualquer confusão entre os pressupostos factuais de aplicação dos dois parágrafos do n.° 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001.

168    Daqui decorre que, no que se refere aos documentos da categoria 5, alínea a) que contêm pareceres no sentido do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, a Comissão concluiu erradamente que a sua divulgação afetaria gravemente o seu processo decisório.

169    Por conseguinte, a decisão impugnada está viciada por erro de direito, ao basear‑se na exceção prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

170    Assim, há que acolher a terceira parte do primeiro fundamento de recurso.

171    Tendo em conta quanto precede, em primeiro lugar, em conformidade com as constatações do n.° 37, supra, há que julgar procedente o fundamento baseado em erro manifesto de apreciação quanto ao âmbito do pedido de acesso aos documentos da categoria 5, alínea b), e, por conseguinte, anular a decisão impugnada, na medida em que a mesma recusou o acesso a esses documentos.

172    Em segundo lugar, em conformidade com as constatações dos n.os 110 e 111, supra, há que julgar procedente o fundamento baseado na falta de exame individual e concreto dos documentos solicitados, apenas com a exceção dos documentos da categoria 3, e unicamente quanto à exceção baseada no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

173    Em terceiro lugar, em conformidade com as constatações dos n.os 129 e 130, supra, há que julgar procedente a primeira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão do Regulamento n.° 1049/2001, no que se refere aos documentos das categorias 1, 2, 3, 4 e 5, alínea a), na medida em que a Comissão concluiu erradamente que a exceção baseada na proteção dos objetivos do inquérito era aplicável ao caso em apreço.

174    Em quarto lugar, em conformidade com as constatações dos n.os 149 e 150, supra, há que julgar procedente a segunda parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, na medida em que a Comissão considerou erradamente que a divulgação dos documentos das categorias 1 a 4 afetaria os interesses comerciais das empresas que participaram no cartel dos CIG.

175    Em quinto lugar, em conformidade com as constatações dos n.os 161 e 168 a 170, supra, há que julgar procedente a terceira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo do Regulamento n.° 1049/2001, na medida em que a Comissão considerou erradamente que os documentos da categoria 5, alínea a), continham pareceres, no sentido dessa disposição, e na medida em que considerou erradamente que a divulgação desses documentos afetaria gravemente o seu processo decisório.

176    Daqui decorre que a decisão impugnada deve ser integralmente anulada não sendo necessário examinar o segundo e terceiro fundamentos de recurso alegados pela recorrente.

 Quanto às despesas

177    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos da recorrente.

178    O Reino da Suécia, a ABB e a Siemens suportarão as suas próprias despesas, em conformidade com o disposto no artigo 87.°, n.° 4, primeiro e terceiro parágrafos, do Regulamento de Processo.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

Declara e decide:

1)      A decisão SG.E3/MV/psi D (2008) 4931 da Comissão, de 16 de junho de 2008, relativa a um pedido de acesso aos documentos do processo administrativo COMP/F/38.899 — comutadores com isolamento a gás, é anulada.

2)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas bem como as da EnBW Energie Baden‑Württemberg AG.

3)      O Reino da Suécia, a ABB Ltd e a Siemens AG suportarão as suas próprias despesas.

Pelikánová

Jürimäe

Van der Woude

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de maio de 2012.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio

Tramitação e pedidos das partes

Questão de direito

A — Quanto à admissibilidade do fundamento baseado na omissão de exame individual e concreto dos documentos

B — Quanto ao mérito

1. Quanto ao quarto fundamento, baseado em erro manifesto de apreciação do âmbito do pedido de acesso

2. Quanto ao primeiro fundamento, baseado na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro e terceiro travessões, e do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

a) Sobre a existência, no caso em apreço, das condições que permitiriam à Comissão subtrair‑se à obrigação de proceder a uma análise concreta e individual do conteúdo dos documentos requeridos.

Sobre a primeira exceção invocada na decisão impugnada, baseada no facto de ser manifesto, por efeito de uma presunção genérica, que o acesso aos documentos solicitados deve ser recusado

Quanto à segunda exceção invocada na decisão impugnada, baseada no exame dos documentos por categorias

— Quanto à análise da exceção baseada na proteção dos objetivos das atividades de investigação, realizada no n.° 3 da decisão impugnada

— Quanto à análise da exceção baseada na proteção dos interesses comerciais, analisada no n.° 4 da decisão impugnada

— Quanto à análise da exceção baseada na proteção do processo decisório da Comissão, realizada no n.° 3 da decisão impugnada

Quanto à exceção invocada na contestação baseada no aumento injustificado e excecional do volume de trabalho

b) Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001

c) Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 2, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001

d) Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, baseada na violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001

Quanto às despesas


** Língua do processo: alemão.