Language of document : ECLI:EU:C:2015:86

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

12 de fevereiro de 2015 (*)

«Reenvio prejudicial ― Artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE ― Diretiva 96/71/CE ― Artigos 3.°, 5.° e 6.° ― Trabalhadores de uma sociedade com sede num Estado‑Membro A, destacados para trabalhar num Estado‑Membro B ― Salário mínimo previsto pelas convenções coletivas do Estado‑Membro B ― Legitimidade de uma organização sindical com sede no Estado‑Membro B ― Regulamentação do Estado‑Membro A que proíbe a transferência para um terceiro de créditos relativos às remunerações»

No processo C‑396/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Satakunnan käräjäoikeus (Finlândia), por decisão de 12 de julho de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de julho de 2013, no processo

Sähköalojen ammattiliitto ry

contra

Elektrobudowa Spółka Akcyjna,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: S. Rodin, presidente da Sexta Secção, exercendo funções de presidente da Primeira Secção, A. Borg Barthet, E. Levits (relator), M. Berger e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: N. Wahl,

secretário: I. Illessy, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 11 de junho de 2014,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação do Sähköalojen ammattiliitto ry, por J. Kailiala, asianajaja, e J. Hellsten,

¾        em representação da Elektrobudowa Spółka Akcyjna, por V.‑M. Lanne, asianajaja, e W. Popiołek, adwokat,

¾        em representação do Governo finlandês, por J. Heliskoski, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo belga, por M. Jacobs e L. Van den Broeck, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo dinamarquês, por M. Wolff e C. Thorning, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo alemão, por T. Henze e B. Beutler, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo austríaco, por G. Hesse, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, M. Arciszewski, J. Fałdyga e D. Lutostańska, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo sueco, por A. Falk e C. Hagerman, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo norueguês, por P. Wennerås, na qualidade de agente,

¾        em representação da Comissão Europeia, por E. Paasivirta e J. Enegren, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 18 de setembro de 2014,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, dos artigos 12.° e 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), do Protocolo (n.° 30) relativo à aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia à Polónia e ao Reino Unido, anexado ao Tratado FUE, dos artigos 3.°, 5.°, segundo parágrafo, e 6.° da Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO 1997, L 18, p. 1, e retificações no JO 2007, L 301, p. 28, e no L 310, p. 22), e do artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I) (JO L 177, p. 6, e retificação no JO 2009, L 309, p. 87).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Sähköalojen ammattiliitto ry (a seguir «Sähköalojen ammattiliitto»), sindicato finlandês do setor da eletricidade, à Elektrobudowa Spółka Akcyjna (a seguir «ESA»), sociedade com sede na Polónia, relativamente a créditos salariais resultantes de relações laborais.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        A Diretiva 96/71 prevê no seu artigo 1.°, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação»:

«1.      A presente diretiva é aplicável às empresas estabelecidas num Estado‑Membro que, no âmbito de uma prestação transnacional de serviços e nos termos do n.° 3, destaquem trabalhadores para o território de um Estado‑Membro.

[...]

3.      A presente diretiva é aplicável sempre que as empresas mencionadas no n.° 1 tomem uma das seguintes medidas transnacionais:

[...]

b)      Destacar um trabalhador para um estabelecimento ou uma empresa do grupo situados num Estado‑Membro, desde que durante o período de destacamento exista uma relação de trabalho entre a empresa destacadora e o trabalhador;

[…]»

4        Nos termos do artigo 3.° desta diretiva, sob a epígrafe «Condições de trabalho e emprego»:

«1.      Os Estados‑Membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, as empresas referidas no n.° 1 do artigo 1.° garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias adiante referidas que, no território do Estado‑Membro onde o trabalho for executado, sejam fixadas:

¾        por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas

e/ou

¾        por convenções coletivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral na aceção do n.° 8, na medida em que digam respeito às atividades referidas no anexo:

[...]

b)      Duração mínima das férias anuais remuneradas;

c)      Remunerações salariais mínimas, incluindo as bonificações relativas a horas extraordinárias […]

[...]

Para efeitos da presente diretiva, a noção de ‘remunerações salariais mínimas’ referida na alínea c) do n.° 1 é definida pela legislação e/ou pela prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado.

[...]

7.      O disposto nos n.os 1 a 6 não obsta à aplicação de condições de emprego e trabalho mais favoráveis aos trabalhadores.

Considera‑se que fazem parte do salário mínimo os subsídios e abonos inerentes ao destacamento que não tenham sido pagos a título de reembolso das despesas efetivamente efetuadas por força do destacamento, como as despesas de viagem, de alojamento ou de alimentação.

8.      Entende‑se por ‘convenções coletivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral’, aquelas que devem ser cumpridas por todas as empresas pertencentes ao setor ou à profissão em causa e abrangidas pelo seu âmbito de aplicação territorial.

[...]»

5        O artigo 5.° da referida diretiva, sob a epígrafe «Medidas», enuncia:

«Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas em caso de não cumprimento da presente diretiva.

Os Estados‑Membros assegurarão especialmente que os trabalhadores e/ou os seus representantes disponham de processos adequados para garantir o cumprimento das obrigações previstas na presente diretiva.»

6        O artigo 6.° da referida diretiva, sob a epígrafe «Competência judicial», tem a seguinte redação:

«A fim de fazer valer o direito às condições de trabalho e emprego garantidas pelo artigo 3.°, pode ser instaurada uma ação num tribunal do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador esteja ou tenha estado destacado, sem prejuízo, se necessário, da faculdade de, nos termos das convenções internacionais existentes em matéria de competência judicial, instaurar uma ação num tribunal de outro Estado.»

7        O anexo da Diretiva 96/71 estabelece a lista das atividades a que se refere o n.° 1, segundo travessão, do artigo 3.°, da mesma. Abrangem todas as atividades no domínio da construção que visem a realização, reparação, manutenção, alteração ou eliminação de construções, conforme especificadas no referido anexo.

 Direito finlandês

8        O artigo 7.° do capítulo 2 da Lei relativa aos contratos de trabalho [Työsopimuslaki (55/2001)] dispõe:

«A entidade patronal respeitará, pelo menos, as disposições de uma convenção coletiva nacional considerada representativa no setor em causa (convenção coletiva de aplicação geral) sobre as condições de trabalho e de emprego da relação de trabalho aplicáveis às funções que o trabalhador executa ou às funções que mais se assemelham àquelas.

Uma cláusula de um contrato de trabalho contrária à estipulação correspondente que conste da convenção coletiva de aplicação geral é inválida e dá lugar à aplicação, em sua substituição, da disposição contida na convenção coletiva de aplicação geral.

[…]»

9        O artigo 2.°, quarto parágrafo, da Lei relativa aos trabalhadores destacados [Laki lähetetyistä työntekijöistä (1146/1999)] prevê:

«Um trabalhador destacado deve receber o salário mínimo, ou seja, uma remuneração determinada com base numa convenção coletiva na aceção do artigo 7.° do capítulo 2 da Lei relativa aos contratos de trabalho finlandesa […]»

10      As convenções coletivas de trabalho pertinentes, na aceção do artigo 7.° do capítulo 2 da Lei relativa aos contratos de trabalho, são as do setor da eletricidade e do setor das instalações elétricas, no setor da tecnologia da instalação elétrica na construção civil, e respeitam às atividades referidas no anexo da Diretiva 96/71. Estas convenções coletivas são de aplicação geral, na aceção do artigo 3.°, n.° 8, da Diretiva 96/71. Contêm disposições que preveem a divisão dos trabalhadores por categorias salariais, a atribuição de um subsídio de férias, o pagamento de ajudas de custo diárias, uma compensação pelo tempo de deslocação e disposições relativas aos custos de alojamento.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11      A ESA, sociedade com sede na Polónia, exerce a sua atividade no domínio da eletricidade. Dispõe de uma sucursal na Finlândia.

12      Para executar trabalhos de eletrificação no estaleiro da central nuclear de Olkiluoto, no município de Eurajoki (Finlândia), a ESA celebrou, na Polónia e segundo o direito polaco, contratos de trabalho com 186 trabalhadores. Estes foram destacados para a sucursal finlandesa dessa sociedade. Foram afetados ao estaleiro de Olkiluoto e alojados em apartamentos situados em Eurajoki, a cerca de 15 quilómetros desse estaleiro. As partes no processo principal estão em desacordo no que respeita ao tempo dedicado às deslocações diárias que efetuam os referidos trabalhadores para ir do seu local de alojamento para o referido estaleiro e voltar.

13      Alegando que a ESA não lhes concedeu a remuneração mínima que lhes era devida nos termos das convenções coletivas finlandesas do setor da eletrificação e do setor da tecnologia da instalação elétrica na construção civil, aplicáveis por força do direito da União, os trabalhadores em causa cederam individualmente os seus créditos ao Sähköalojen ammattiliitto para que ele assegurasse a sua cobrança.

14      No órgão jurisdicional de reenvio, o Sähköalojen ammattiliitto defende que as referidas convenções coletivas preveem um cálculo da remuneração mínima dos trabalhadores baseado em critérios mais favoráveis aos trabalhadores do que os aplicados pela ESA. Estes critérios referem‑se nomeadamente à maneira de classificar os trabalhadores em categorias salariais, de considerar uma remuneração horária ou à tarefa, de conceder aos trabalhadores um subsídio de férias, ajudas de custo diárias, uma compensação pelo tempo de deslocação e o pagamento do seu alojamento.

15      Assim, com duas ações interpostas, respetivamente, em 8 de agosto de 2011 e 3 de janeiro de 2012, o Sähköalojen ammattiliitto pediu a condenação da ESA a pagar‑lhe um montante total de 6 648 383,15 euros, acrescido de juros, correspondente aos créditos que lhe foram cedidos.

16      A ESA concluiu pedindo que as ações fossem julgadas improcedentes. Afirma, nomeadamente, que o Sähköalojen ammattiliitto não dispõe de legitimidade para agir em nome dos trabalhadores destacados, uma vez que o direito polaco proíbe a cessão de créditos resultante de uma relação laboral.

17      A pedido do Sähköalojen ammattiliitto, o órgão jurisdicional de reenvio ordenou o arresto de ativos da ESA num montante que permitisse que o crédito desse sindicato ficasse garantido até ao valor de 2 900 000 euros. Uma vez tornada definitiva a decisão que ordena esta medida cautelar, a ESA enviou à autoridade competente uma caução bancária desse montante, válida até 30 de setembro de 2015.

18      Tendo dúvidas quanto à interpretação do direito da União e, nomeadamente, do artigo 3.° da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, o Satakunnan käräjäoikeus (tribunal de primeira instância de Satakunta) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Pode um sindicato que age no interesse dos trabalhadores invocar diretamente o artigo 47.° da [Carta] como fonte imediata de direito face a um prestador de serviços de outro Estado‑Membro quando a disposição considerada contrária ao artigo 47.° ([a saber,] o artigo 84.° do Código do Trabalho polaco) é uma disposição exclusivamente nacional?

2)      No âmbito de um processo judicial relativo a créditos devidos, na aceção da Diretiva [96/71], no Estado de emprego, resulta do direito da União, em particular do princípio da proteção jurisdicional efetiva decorrente do artigo 47.° da [Carta], bem como do artigo 5.°, segundo parágrafo e do artigo 6.° da referida diretiva, interpretado em conjugação com a liberdade de associação no domínio sindical garantida no artigo 12.° da [Carta] (liberdade sindical), que o órgão jurisdicional nacional não deve aplicar uma disposição do Código do Trabalho do Estado de origem dos trabalhadores, que se opõe à cessão de créditos salariais a um sindicato do Estado de emprego para efeitos de cobrança, quando a disposição correspondente do Estado de emprego autoriza a cessão de créditos salariais devidos para efeitos de cobrança e, por conseguinte, da posição de recorrente, ao sindicato a que pertencem todos os trabalhadores que cederam o seu crédito para efeitos de cobrança?

3)      Devem as disposições do Protocolo (n.° 30) ao Tratado de Lisboa ser interpretadas no sentido de que também devem ser tidas em conta por um órgão jurisdicional nacional que não se situe na Polónia ou no Reino Unido, se o litígio em causa apresentar uma relação estreita com a Polónia e, em particular, se o direito aplicável aos contratos de trabalhos for o direito polaco? Por outras palavras: [este protocolo] impede um tribunal finlandês de declarar que as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas, uma prática administrativa ou medidas administrativas adotadas pela Polónia violam os direitos fundamentais, as liberdades e os princípios proclamados na [Carta]?

4)      Deve o artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento [n.° 593/2008] ser interpretado, tendo em consideração o artigo 47.° da [Carta], no sentido de que se opõe à aplicação de uma legislação nacional de um Estado‑Membro, nos termos da qual é proibido ceder créditos e direitos decorrentes da relação de trabalho?

5)      Deve o artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento [n.° 593/2008] ser interpretado no sentido de que a lei aplicável à cessão de créditos decorrentes do contrato de trabalho é a lei que, nos termos do Regulamento [n.° 593/2008], é aplicável ao contrato de trabalho controvertido, sem que tenha importância a questão de saber se também as disposições de um outro ordenamento jurídico podem ter influência sobre o conteúdo de um direito individual?

6)      Deve o artigo 3.° da Diretiva 96/71 ser interpretado, à luz dos artigos 56.° [TFUE] e 57.° TFUE, no sentido de que o conceito de remunerações salariais mínimas abrange a remuneração horária de base em função da categoria salarial, a remuneração garantida por tarefa, o subsídio de férias, as ajudas de custo diárias fixas e uma compensação pelo tempo gasto na deslocação diária para o trabalho (compensação pelo tempo de deslocação), de acordo com as definições destas condições de trabalho na convenção coletiva declarada de aplicação geral, constantes do anexo da diretiva?

6.[a]      Devem os artigos 56.° [TFUE] [e 57.°] TFUE e/ou o artigo 3.° da Diretiva [96/71] ser interpretados no sentido de impedirem os Estados‑Membros, na qualidade do denominado Estado de acolhimento, de sujeitarem na sua legislação nacional (convenção coletiva de aplicação geral) os prestadores de serviços de outros Estados‑Membros à obrigação de pagar uma compensação pelo tempo de deslocação e ajudas de custo diárias aos trabalhadores destacados para o seu território, se se considerar que, nos termos da legislação nacional invocada, o trabalhador destacado é tratado como um trabalhador que exerce as suas funções no âmbito de uma viagem de serviço durante o período integral do destacamento, pelo que tem direito à compensação pelo tempo de deslocação e às ajudas de custo diárias?

6.[b] Devem os artigos 56.° [TFUE] e 57.° TFUE e/ou o artigo 3.° da Diretiva [96/71] ser interpretados no sentido de impedirem o órgão jurisdicional nacional de proibir o reconhecimento de uma eventual divisão por categorias salariais criada e aplicada no seu Estado de origem por uma empresa de outro Estado‑Membro?

6.[c]      Devem os artigos 56.° [TFUE] e 57.° TFUE e/ou o artigo 3.° da Diretiva [96/71] ser interpretados no sentido de permitirem a uma entidade patronal de outro Estado‑Membro definir a classificação dos trabalhadores em categoriais salariais, de forma válida e vinculativa para o órgão jurisdicional do Estado de emprego, quando uma convenção coletiva de aplicação geral do Estado de emprego prevê uma classificação em categoriais salariais diferente quanto ao resultado, ou poderá o Estado de acolhimento, para o qual foram destacados os trabalhadores do prestador de serviços originário de outro Estado‑Membro, impor ao prestador de serviços quais as disposições que este deve respeitar no âmbito da classificação dos trabalhadores nas categorias salariais?

6.[d]      No âmbito da interpretação do artigo 3.° da Diretiva [96/71] à luz dos artigos 56.° [TFUE] e 57.° TFUE, deve considerar‑se que o alojamento, cujas despesas devem ser suportadas pela entidade patronal nos termos da convenção coletiva referida na questão 6[.a], e os vales de refeição, que o prestador de serviços originário de outro Estado‑Membro atribui nos termos do contrato de trabalho, constituem uma compensação pelas despesas originadas pelo destacamento, ou são, pelo contrário, abrangidos pelo conceito de remunerações salariais mínimas na aceção do artigo 3.°, n.° 1?

6.[e]      Deve o artigo 3.° da Diretiva [96/71], em conjugação com os artigos 56.° [TFUE] e 57.° TFUE, ser interpretado no sentido de que uma convenção coletiva de aplicação geral do Estado de emprego deve ser considerada justificada por imperativos de ordem pública ao interpretar a questão relativa à remuneração paga à tarefa, à compensação pelo tempo de deslocação e às ajudas de custo diárias?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira a quinta questões

19      Com as suas primeira a quinta questões, que há que analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, em substância, sobre a questão de saber se, em circunstâncias como as do processo principal, a Diretiva 96/71, lida à luz do artigo 47.° da Carta, se opõe a que uma regulamentação do Estado‑Membro da sede da empresa que destacou trabalhadores para o território de outro Estado‑Membro, nos termos da qual a cessão de créditos resultantes de relações laborais é proibida, possa obstar a que um sindicato, como o Sähköalojen ammattiliitto, intente uma ação, num órgão jurisdicional do segundo Estado‑Membro, onde o trabalho é executado, para cobrar créditos salariais desses trabalhadores destacados que lhe foram cedidos.

20      A este respeito, há que observar que resulta não apenas das informações fornecidas ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional de reenvio, como das respostas dadas às questões colocadas na audiência no Tribunal de Justiça, que a legitimidade, perante o órgão jurisdicional de reenvio, do Sähköalojen ammattiliitto é regulada pelo direito processual finlandês, aplicável segundo o princípio da lex fori. É, além disso, pacífico que, segundo o referido direito finlandês, o recorrente dispõe de legitimidade para agir em nome dos trabalhadores destacados.

21      Assim, a regulamentação que consta do Código do Trabalho polaco, invocado pela ESA, é irrelevante para a legitimidade do Sähköalojen ammattiliitto, no órgão jurisdicional de reenvio, e não obsta ao seu direito de este último intentar uma ação no Satakunnan käräjäoikeus.

22      Por outro lado, importa salientar que o objeto do litígio no processo principal respeita à determinação do alcance do conceito de «remunerações salariais mínimas», na aceção da Diretiva 96/71, a que podem aspirar os trabalhadores polacos destacados na Finlândia.

23      Ora, resulta inequivocamente do artigo 3.°, n.°1, segundo parágrafo, da referida diretiva que as questões em matéria de remunerações salariais mínimas na aceção da mesma são reguladas, seja qual for a lei aplicável à relação laboral, pela regulamentação do Estado‑Membro em cujo território os trabalhadores estão destacados para executar o seu trabalho, a saber, no caso em apreço, a República da Finlândia.

24      Além disso, resulta nomeadamente da redação da segunda questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio que a cessão dos créditos salariais de que o Satakunnan käräjäoikeus beneficiou para efeitos de cobrança a favor dos trabalhadores destacados é conforme ao direito finlandês e que, por outro lado, a empresa polaca que contratou esses trabalhadores dispõe, na Finlândia, de uma sucursal para a qual foram destacados.

25      Nestas condições, contrariamente ao que afirma a ESA no órgão jurisdicional de reenvio, não existe no caso em apreço nenhum motivo para pôr em causa a ação que o Sähköalojen ammattiliitto intentou no Satakunnan käräjäoikeus.

26      Importa portanto responder à primeira a quinta questões que, em circunstâncias como as do processo principal, a Diretiva 96/71, lida à luz do artigo 47.° da Carta, se opõe a que uma regulamentação do Estado‑Membro da sede da empresa que destacou trabalhadores para o território de outro Estado‑Membro, nos termos da qual a cessão de créditos resultantes de relações laborais é proibida, possa obstar a que um sindicato, como o Sähköalojen ammattiliitto, intente uma ação num órgão jurisdicional do segundo Estado‑Membro, onde o trabalho é executado, para cobrar, em benefício dos trabalhadores destacados, créditos salariais relativos ao salário mínimo, na aceção da Diretiva 96/71, e que lhe foram cedidos, sendo essa cessão conforme ao direito em vigor nesse último Estado‑Membro.

 Quanto à sexta questão

27      Com a sexta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.° da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que sejam excluídos do salário mínimo elementos de remuneração, como os que estão em causa no processo principal, que resultam do conceito de remuneração horária de base ou de remuneração garantida por tarefa em função da categoria salarial, da concessão de um subsídio de férias, de ajudas de custo diárias fixas, de uma compensação pelo tempo de deslocação diário e de um subsídio para as despesas de alojamento, e que são definidos por uma convenção coletiva incluída no anexo dessa diretiva, de aplicação geral no Estado‑Membro de destacamento dos trabalhadores em causa ou, no que respeita à concessão de vales de refeição, que são previstos pela relação de trabalho entre os trabalhadores destacados e o seu empregador no Estado‑Membro de origem.

28      Importa recordar, neste contexto que, como resulta do considerando 6 da Diretiva 96/71, o legislador da União Europeia adotou‑a com o intuito de prever, no interesse dos empregadores e do seu pessoal, as condições de trabalho e de emprego aplicáveis à relação de trabalho quando uma empresa estabelecida num dado Estado‑Membro destaca temporariamente trabalhadores para o território de outro Estado‑Membro, no âmbito de uma prestação de serviços (acórdãos Laval un Partneri, C‑341/05, EU:C:2007:809, n.° 58, e Isbir, C‑522/12, EU:C:2013:711, n.° 33).

29      Assim, a fim de garantir o respeito de um núcleo de regras imperativas de proteção mínima, o artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 96/71 prevê que os Estados‑Membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, no âmbito de uma prestação de serviços transnacional, as empresas garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias indicadas nesta disposição (acórdão Laval un Partneri, EU:C:2007:809, n.° 73).

30      Neste contexto, importa salientar que o artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 96/71 tem um duplo objetivo. Por um lado, visa garantir uma concorrência leal entre as empresas nacionais e as empresas que realizam uma prestação de serviços transnacional, na medida em que impõe a estas últimas que reconheçam aos seus trabalhadores, no que diz respeito a uma lista limitada de matérias, as condições de trabalho e de emprego fixadas no Estado‑Membro de acolhimento. Por outro lado, esta disposição visa garantir aos trabalhadores destacados a aplicação das regras de proteção mínima do Estado‑Membro de acolhimento quanto às condições de trabalho e de emprego relativas a essas matérias, enquanto exercem uma atividade laboral, a título temporário, no território do referido Estado‑Membro (acórdão Laval un Partneri, EU:C:2007:809, n.os 74 e 76).

31      Todavia, importa salientar que a referida diretiva não harmonizou o conteúdo material dessas regras imperativas de proteção mínima, embora forneça certas informações a seu respeito.

32      Assim, importa salientar, por um lado, que o artigo 3.°, n.° 1, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71 remete expressamente, para efeitos de aplicação desta, para a legislação ou a prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado para a determinação das remunerações salariais mínimas referidas no artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, dessa diretiva (acórdão Isbir, EU:C:2013:711, n.° 36).

33      Por outro lado, o artigo 3.°, n.° 7, segundo parágrafo, da referida diretiva precisa, no que respeita aos subsídios e abonos inerentes ao destacamento, em que medida se considera que esses elementos de remuneração fazem parte do salário mínimo no contexto das condições de trabalho e de emprego fixadas no artigo 3.° da mesma diretiva.

34      Assim, sob reserva das indicações que constam do artigo 3.°, n.° 7, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71, a determinação de quais os elementos constitutivos do conceito de salário mínimo, para a aplicação desta diretiva, deve ser feita pelo direito do Estado‑Membro do destacamento, na condição apenas de essa determinação, como resulta da legislação ou das convenções coletivas nacionais pertinentes ou da interpretação que delas fazem os órgãos jurisdicionais nacionais, não ter por efeito criar entraves à livre prestação de serviços entre os Estados‑Membros (acórdão Isbir, EU:C:2013:711, n.° 37).

35      Neste contexto, há que salientar que o Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de qualificar certos elementos de remuneração como não fazendo parte do salário mínimo.

36      Assim, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os acréscimos e complementos, que a legislação ou a prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado não define como elementos que fazem parte do salário mínimo, e que alteram a relação entre a prestação do trabalhador, por um lado, e a contrapartida que este recebe, por outro, não podem ser considerados tais elementos por força do disposto na Diretiva 96/71 (acórdãos Comissão/Alemanha, C‑341/02, EU:C:2005:220, n.° 39, e Isbir, EU:C:2013:711, n.° 38).

37      É à luz das considerações expostas que há que examinar os diferentes elementos de remuneração referidos pelos órgãos jurisdicionais de reenvio, a fim de determinar se fazem parte do salário mínimo, na aceção do artigo 3.° da Diretiva 96/71.

 A remuneração garantida horária e/ou por tarefa em função da categoria salarial dos trabalhadores

38      A fim de poder resolver o litígio nele pendente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se o artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a um cálculo do salário mínimo à hora e/ou à tarefa baseado na categoria salarial dos trabalhadores, conforme previsto pelas convenções coletivas pertinentes do Estado‑Membro de acolhimento.

39      A este respeito, há que salientar que resulta de forma explícita da redação do artigo 3.°, n.° 1, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71 que as remunerações salariais mínimas são definidas pela legislação e/ou pela prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado. Esta redação implica que o modo de cálculo da referida remuneração e os critérios adotados no que lhe diz respeito também sejam da competência do Estado‑Membro de acolhimento.

40      Resulta do exposto que, em primeiro lugar, as regras em vigor no Estado‑Membro de acolhimento podem determinar se o cálculo do salário mínimo deve ser efetuado à hora ou à tarefa. Todavia, para serem oponíveis ao empregador que destaca os seus trabalhadores para esse Estado‑Membro, estas regras devem ser vinculativas e obedecer aos requisitos de transparência, o que implica, nomeadamente, que sejam acessíveis e claras.

41      Assim, em aplicação desses critérios, o salário mínimo calculado por referência às convenções coletivas pertinentes não pode depender da livre escolha do empregador que destaca os assalariados com a única finalidade de propor um custo do trabalho inferior ao dos trabalhadores locais.

42      No processo principal, incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar o caráter vinculativo e transparente das regras de cálculo do salário mínimo aplicadas ao abrigo das convenções coletivas pertinentes.

43      Resulta do exposto que, em segundo lugar, as regras de classificação dos trabalhadores em categorias salariais, aplicadas no Estado‑Membro de acolhimento com base em diferentes critérios, tais como, nomeadamente, a qualificação, a formação, a experiência dos trabalhadores e/ou a natureza do trabalho por eles efetuado, substituem as regras aplicáveis aos trabalhadores destacados no Estado‑Membro de origem. Só no âmbito de uma comparação entre as condições de emprego e trabalho, referidas no artigo 3.°, n.° 7, primeiro parágrafo, da Diretiva 96/71, aplicadas no Estado‑Membro de origem e as condições em vigor no Estado‑Membro de acolhimento é que a classificação efetuada pelo Estado‑Membro de origem deve ser tida em consideração quando for mais favorável para o trabalhador.

44      Todavia, para serem oponíveis ao empregador que destaca trabalhadores, as regras de classificação destes últimos em categoriais salariais, aplicadas no Estado‑Membro de acolhimento, devem também ser vinculativas e observar os requisitos de transparência, o que significa nomeadamente que devem ser acessíveis e claras. Incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar se estes requisitos estão preenchidos no processo principal.

45      Tendo em conta as considerações expostas, há que concluir que o artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a um cálculo do salário mínimo à hora e/ou à tarefa baseado na categoria salarial dos trabalhadores, conforme previsto pelas convenções coletivas pertinentes do Estado‑Membro de acolhimento, desde que esse cálculo e essa classificação sejam efetuados segundo regras vinculativas e transparentes, o que incumbe ao órgão jurisdicional verificar.

 Ajudas de custo diárias

46      Quanto à questão de saber se as ajudas de custo diárias, como as que estão em causa no processo principal, fazem parte do salário mínimo, na aceção do artigo 3.° da Diretiva 96/71, importa salientar que resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que as convenções coletivas de trabalho pertinentes na Finlândia preveem a concessão de ajudas de custo diárias aos trabalhadores destacados. De acordo com estas convenções, as referidas ajudas assumem a forma de pagamento diário de uma soma fixa cujo montante, durante o período em causa, estava compreendido entre 34 euros e 36 euros.

47      Afigura‑se, à luz do que consta dos autos, que essas ajudas não foram pagas a título de reembolso das despesas efetivamente efetuadas por força do destacamento, na aceção do artigo 3.°, n.° 7, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71.

48      Com efeito, as referidas ajudas destinam‑se a assegurar a proteção social dos trabalhadores em causa, compensando os inconvenientes resultantes do destacamento, que consistem no afastamento dos interessados do seu ambiente habitual.

49      De onde resulta que tais ajudas devem ser qualificadas de «subsídios e abonos inerentes ao destacamento», na aceção do artigo 3.°, n.° 7, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71.

50      Ora, em conformidade com a referida disposição, este subsídio ou abono faz parte do salário mínimo.

51      Nestas condições, as referidas ajudas de custo diárias controvertidas devem ser pagas a trabalhadores destacados, como os que estão em causa no processo principal, na mesma medida em que os trabalhadores locais delas beneficiem aquando de um destacamento no território finlandês.

52      Perante o exposto, há que concluir que as ajudas de custo diárias, como as que estão em causa no processo principal, devem ser consideradas parte do salário mínimo, em condições idênticas àquelas a que está sujeita a inclusão dessas ajudas no salário mínimo pago aos trabalhadores locais aquando de um destacamento dos mesmos no interior do Estado‑Membro em causa.

 Compensação pelo tempo de deslocação diária

53      Importa salientar a título liminar que, na medida em que tem por objeto a compensação pelo tempo de deslocação diária, a questão submetida não respeita à compensação dos custos das deslocações efetuadas pelos trabalhadores em causa para chegarem ao seu local de trabalho e voltarem, mas unicamente ao ponto de saber se o artigo 3.° da Diretiva 96/71 deve ser interpretado no sentido de que uma compensação do tempo de deslocação diária deve ser considerada um elemento do salário mínimo desses trabalhadores.

54      Segundo as disposições pertinentes das convenções coletivas finlandesas, será paga uma compensação aos trabalhadores pelo tempo de deslocação se a deslocação de ida e volta diária por eles efetuada exceder uma hora.

55      Há que precisar, a este respeito, que, para efeitos desse cálculo, importa determinar o tempo efetivamente gasto, nas circunstâncias próprias do caso, pelos trabalhadores destacados em causa para efetuarem o trajeto entre o local em que estão alojados, na Finlândia, e o seu local de trabalho, no estaleiro situado nesse Estado‑Membro. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio decidir, perante os factos em causa no processo principal, se o requisito do tempo gasto, previsto pela regulamentação aplicável na Finlândia para o pagamento da compensação pelo tempo de deslocação, está preenchido pelos referidos trabalhadores.

56      Nesta perspetiva, há que considerar que, uma vez que essa compensação pelo tempo de deslocação não é paga a título de reembolso das despesas efetivamente efetuadas pelo trabalhador por força do destacamento, deve, nos termos do artigo 3.°, n.° 7, segundo parágrafo, da Diretiva 96/71, ser considerada um subsídio e abono inerente ao destacamento e, assim, parte do salário mínimo.

57      Importa portanto considerar, quanto a esta questão, que uma compensação pelo tempo de deslocação, como a que está em causa no processo principal, que é paga aos trabalhadores desde que a deslocação diária que efetuam para chegar ao seu local de trabalho e voltar seja superior a uma hora, deve ser considerada parte do salário mínimo dos trabalhadores destacados na medida em que esse requisito esteja preenchido, o que incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar.

Pagamento do alojamento

58      Quanto à questão de saber se o artigo 3.° da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que o pagamento do alojamento dos trabalhadores em causa deve ser considerado um elemento do seu salário mínimo, há que observar que, segundo a redação do artigo 3.°, n.° 7, desta diretiva, não é o caso.

59      Com efeito, embora essa redação apenas exclua o reembolso das despesas de alojamento efetivamente efetuadas por força do destacamento, e a ESA, segundo as informações de que dispõe o Tribunal de Justiça, tenha pago essas despesas dos trabalhadores em causa sem que estes tenham tido necessidade de as avançar e de pedir o reembolso, a modalidade do pagamento escolhido pela ESA é irrelevante para a qualificação jurídica dessas despesas.

60      De resto, como o advogado‑geral salientou no n.° 111 das suas conclusões, o próprio objetivo do artigo 3.°, n.° 7, da Diretiva 96/71 não permite tomar em consideração, no cálculo do salário mínimo dos trabalhadores destacados, despesas ligadas ao alojamento destes últimos.

 Vales de refeição

61      Quanto à interpretação do artigo 3.° da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, no que respeita ao conceito de salário mínimo relativamente à tomada em consideração de vales de refeição entregues aos trabalhadores em causa pela ESA, importa salientar que a entrega desses vales não assenta em disposições legislativas, regulamentares ou administrativas do Estado‑Membro de acolhimento, nem em convenções coletivas pertinentes invocadas pelo Sähköalojen ammattiliitto, tendo a sua origem na relação de trabalho estabelecida, na Polónia, entre os trabalhadores destacados e a ESA, sua empregadora.

62      Além disso, como acontece com o pagamento dos subsídios concedidos para compensar despesas de alojamento, estes subsídios são pagos a título de compensação do custo de vida efetivamente suportado pelo trabalhador por força do seu destacamento.

63      Logo, resulta claramente da própria redação do artigo 3.°, n.os 1 e 7, da Diretiva 96/71 que os referidos subsídios não devem ser considerados parte do salário mínimo, na aceção do artigo 3.° dessa diretiva.

 Subsídio de férias

64      Quanto à concessão de um subsídio de férias, há que recordar, a título liminar, que, nos termos do artigo 31.°, n.° 2, da Carta, todos os trabalhadores têm direito a um período anual de férias pagas.

65      Este direito, precisado no artigo 7.° da Diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de novembro de 2003, relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho (JO L 299, p. 9), que esta diretiva não permite derrogar, permite a todos os trabalhadores beneficiarem de um período de férias anuais pagas de, pelo menos, quatro semanas. O direito a férias anuais pagas, que, segundo jurisprudência constante, deve ser considerado um princípio do direito social da União que reveste particular importância, é portanto concedido a cada trabalhador, seja qual for o seu local de afetação na União (v., neste sentido, acórdãos Schultz‑Hoff e o., C‑350/06 e C‑520/06, EU:C:2009:18, n.° 54, e Lock, C‑539/12, EU:C:2014:351, n.° 14).

66      Além disso, resulta claramente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a expressão «férias anuais remuneradas», constante do artigo 31.° da Carta e do artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 2003/88, significa que, no período das férias anuais na aceção dessa diretiva, a remuneração deve ser mantida e que, por outras palavras, o trabalhador deve receber a remuneração normal em relação a esse período de descanso (v. acórdãos Robinson‑Steele e o., C‑131/04 e C‑257/04, EU:C:2006:177, n.° 50, e Lock, EU:C:2014:351, n.° 16).

67      Com efeito, segundo esta jurisprudência, a Diretiva 2003/88 regula o direito a férias anuais e à obtenção da respetiva remuneração como duas vertentes de um único direito. O objetivo da exigência de remunerar essas férias é o de colocar o trabalhador, durante as referidas férias, numa situação comparável à dos períodos de trabalho, no que diz respeito à retribuição (v. acórdão Lock, EU:C:2014:351, n.° 17 e jurisprudência aí referida).

68      Assim, como salientou o advogado‑geral no n.° 89 das suas conclusões, o subsídio de férias está intrinsecamente ligado à remuneração que o trabalhador recebe em contrapartida do serviço que presta.

69      De onde resulta que o artigo 3.° da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que o subsídio de férias mínimo, que deve ser concedido ao trabalhador, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, segundo travessão, alínea b), dessa diretiva, pelo período mínimo das férias anuais pagas, corresponde ao salário mínimo a que esse trabalhador tem direito durante o período de referência.

70      Resulta das considerações expostas que importa responder à sexta questão que o artigo 3.°, n.os 1 e 7, da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que:

¾        não se opõe a um cálculo do salário mínimo à hora e/ou à tarefa baseado na categoria salarial dos trabalhadores, conforme previsto pelas convenções coletivas pertinentes do Estado‑Membro de acolhimento, desde que esse cálculo e essa classificação sejam efetuados segundo regras vinculativas e transparentes, o que incumbe ao órgão jurisdicional verificar;

¾        as ajudas de custo diárias, como as que estão em causa no processo principal, devem ser consideradas parte do salário mínimo, em condições idênticas àquelas a que está sujeita a inclusão dessas ajudas no salário mínimo pago aos trabalhadores locais aquando de um destacamento dos mesmos no interior do Estado‑Membro em causa;

¾        uma compensação pelo tempo de deslocação, paga aos trabalhadores desde que a deslocação diária que efetuam para chegar ao local de trabalho e voltar seja superior a uma hora, deve ser considerada parte do salário mínimo dos trabalhadores destacados na medida em que esse requisito esteja preenchido, o que incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar;

¾        o pagamento do alojamento desses trabalhadores não deve ser considerado um elemento do seu salário mínimo;

¾        os subsídios sob a forma de vales de refeição entregues aos referidos trabalhadores não devem ser considerados parte do seu salário mínimo; e

¾        o subsídio de férias que deve ser concedido aos trabalhadores destacados pelo período mínimo das férias anuais pagas corresponde ao salário mínimo a que têm direito durante o período de referência.

 Quanto às despesas

71      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

1)      Em circunstâncias como as do processo principal, a Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços, lida à luz do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, opõe‑se a que uma regulamentação do Estado‑Membro da sede da empresa que destacou trabalhadores para o território de outro Estado‑Membro, nos termos da qual a cessão de créditos resultantes de relações laborais é proibida, possa obstar a que um sindicato, como o Sähköalojen ammattiliitto ry, intente uma ação num órgão jurisdicional do segundo Estado‑Membro, onde o trabalho é executado, para cobrar, em benefício dos trabalhadores destacados, créditos salariais relativos ao salário mínimo, na aceção da Diretiva 96/71, e que lhe foram cedidos, sendo essa cessão conforme ao direito em vigor nesse último Estado‑Membro.

2)      O artigo 3.°, n.os 1 e 7, da Diretiva 96/71, lido à luz dos artigos 56.° TFUE e 57.° TFUE, deve ser interpretado no sentido de que:

¾        não se opõe a um cálculo do salário mínimo à hora e/ou à tarefa baseado na categoria salarial dos trabalhadores, conforme previsto pelas convenções coletivas pertinentes do Estado‑Membro de acolhimento, desde que esse cálculo e essa classificação sejam efetuados segundo regras vinculativas e transparentes, o que incumbe ao órgão jurisdicional verificar;

¾        as ajudas de custo diárias, como as que estão em causa no processo principal, devem ser consideradas parte do salário mínimo, em condições idênticas àquelas a que está sujeita a inclusão dessas ajudas no salário mínimo pago aos trabalhadores locais aquando de um destacamento dos mesmos no interior do Estado‑Membro em causa;

¾        uma compensação pelo tempo de deslocação, paga aos trabalhadores desde que a deslocação diária que efetuam para chegar ao local de trabalho e voltar seja superior a uma hora, deve ser considerada parte do salário mínimo dos trabalhadores destacados na medida em que esse requisito esteja preenchido, o que incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar;

¾        o pagamento do alojamento desses trabalhadores não deve ser considerado um elemento do seu salário mínimo;

¾        os subsídios sob a forma de vales de refeição entregues aos referidos trabalhadores não devem ser considerados parte do seu salário mínimo; e

¾        o subsídio de férias que deve ser concedido aos trabalhadores destacados pelo período mínimo das férias anuais pagas corresponde ao salário mínimo a que têm direito durante o período de referência.

Assinatura


* Língua do processo: finlandês.