Language of document : ECLI:EU:T:2013:245

DESPACHO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

15 de maio de 2013 (*)

«Processo de medidas provisórias ― Valores‑limite para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio presentes nos brinquedos ― Recusa da Comissão de aprovar integralmente as disposições nacionais notificadas pelas autoridades alemãs que mantêm os valores‑limite para essas substâncias ― Pedido de medidas provisórias ― Admissibilidade ― Urgência ― Fumus boni juris ― Ponderação dos interesses»

No processo T‑198/12 R,

República Federal da Alemanha, representada por T. Henze e A. Wiedmann, na qualidade de agentes,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por M. Patakia e G. Wilms, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido destinado a obter, a título provisório, a aprovação da manutenção das disposições nacionais notificadas pelas autoridades alemãs que estabelecem valores‑limite para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio presentes nos brinquedos até decisão do Tribunal quanto ao mérito,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

profere o presente

Despacho

 Objeto do processo

1        O presente pedido de medidas provisórias tem por objeto a Decisão C (2012) 1348 final da Comissão, de 1 de março de 2012, relativa às disposições nacionais notificadas pela República Federal da Alemanha que mantêm os valores‑limite para o chumbo, o bário, o arsénio, o antimónio, o mercúrio, as nitrosaminas e as substâncias nitrosáveis presentes nos brinquedos, para além da data de entrada em vigor da Diretiva 2009/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho de 2009, relativa à segurança dos brinquedos (JO L 170, p. 1) (a seguir «decisão impugnada»).

2        Com a decisão impugnada, a Comissão Europeia deferiu, para as nitrosaminas e as substâncias nitrosáveis, o pedido que o Governo alemão lhe tinha dirigido em aplicação do artigo 114.°, n.° 4, TFUE com o objetivo de obter a aprovação da manutenção das disposições nacionais relativas aos limites para os metais pesados acima mencionados. No que respeita aos valores‑limite para o chumbo, o bário, o arsénio, o antimónio e o mercúrio ― que correspondem aos valores antes fixados pela Diretiva 88/378/CEE do Conselho, de 3 de maio de 1988, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à segurança dos brinquedos (JO L 187, p. 1) (a seguir «antiga diretiva brinquedos» ―, a Comissão, em substância, indeferiu o pedido do Governo alemão e decidiu que, no futuro, seriam aplicáveis os valores‑limite fixados pela Diretiva 2009/48 (a seguir «nova diretiva brinquedos»).

 Quadro jurídico

 Direito primário

3        O artigo 114.°, n.os 1 a 7, TFUE dispõe o seguinte:

«1.      Salvo disposição em contrário dos Tratados, aplicam‑se as disposições seguintes à realização dos objetivos enunciados no artigo 26.° O Parlamento Europeu e o Conselho[…] adotam as medidas relativas à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros, que tenham por objeto o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno.

[…]

3.      A Comissão, nas suas propostas previstas no n.° 1 em matéria de saúde, de segurança, de proteção do ambiente e de defesa dos consumidores, basear‑se‑á num nível de proteção elevado, tendo nomeadamente em conta qualquer nova evolução baseada em dados científicos. No âmbito das respetivas competências, o Parlamento Europeu e o Conselho procurarão igualmente alcançar esse objetivo.

4.      Se, após a adoção de uma medida de harmonização […], um Estado‑Membro considerar necessário manter disposições nacionais justificadas por exigências importantes a que se refere o artigo 36.° […], notificará a Comissão dessas medidas, bem como das razões que motivam a sua manutenção.

[…]

6.      No prazo de seis meses a contar da data [da notificação referida no n.° 4], a Comissão aprovará ou rejeitará as disposições nacionais em causa, depois de ter verificado que não constituem um meio de discriminação arbitrária ou uma restrição dissimulada ao comércio entre os Estados‑Membros, nem um obstáculo ao funcionamento do mercado interno.

Na ausência de decisão da Comissão dentro do citado prazo, considera‑se que as disposições nacionais a que se [refere o n.° 4] foram aprovadas.

Se a complexidade da questão o justificar, e não existindo perigo para a saúde humana, a Comissão pode notificar o respetivo Estado‑Membro de que o prazo previsto no presente número pode ser prorrogado por um novo período de seis meses, no máximo.

7.      Se, em aplicação do n.° 6, um Estado‑Membro for autorizado a manter ou adotar disposições nacionais derrogatórias de uma medida de harmonização, a Comissão ponderará imediatamente se deve propor uma adaptação dessa medida.»

 Direito derivado

 Antiga diretiva brinquedos

4        Nos termos do artigo 2.° da antiga diretiva brinquedos, os brinquedos só podem ser colocados no mercado se não puserem em perigo a segurança ou a saúde dos utilizadores ou de terceiros, quando forem utilizados para o fim a que se destinam ou quando deles for feita uma utilização previsível, atendendo ao comportamento habitual das crianças. O brinquedo, no estado em que é colocado no mercado e durante o período da sua utilização previsível e normal, deve satisfazer as condições de segurança e de saúde fixadas na diretiva.

5        O anexo II (intitulado «Requisitos de segurança essenciais para os brinquedos»), parte II (intitulada «Riscos específicos»), ponto 3 (intitulado «Propriedades químicas»), da antiga diretiva brinquedos fixa como objetivo valores‑limite de biodisponibilidade máxima admissível por dia, nomeadamente para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio. Os valores‑limite de biodisponibilidade definem a quantidade máxima admissível de uma substância química que pode, através da utilização dos brinquedos, ser absorvida e ficar disponível para processos biológicos no corpo humano. Esses valores‑limite de biodisponibilidade não fazem distinção em função da consistência do material do brinquedo. O anexo II, parte II, ponto 3, n.° 2, primeiro período, da referida diretiva fixa, em particular, os valores‑limite seguintes, que expressam a biodisponibilidade máxima diária admissível em µg: 0,2 para o antimónio; 0,1 para o arsénio; 25,0 para o bário; 0,7 para o chumbo e 0,5 para o mercúrio. Quanto às nitrosaminas e às substâncias nitrosáveis, a antiga diretiva brinquedos não fixa nenhum valor‑limite.

6        Foi nesta base que, por força de um mandato da Comissão, o Comité Europeu de Normalização elaborou a norma harmonizada europeia EN 71‑3 «Segurança dos brinquedos» (a seguir «EN 71‑3»), que deduz dos valores‑limite de biodisponibilidade «valores‑limite de migração» para matérias de brinquedos e descreve um processo que permite determinar os mesmos. Os valores‑limite de migração indicam a quantidade máxima admissível de uma substância química que pode migrar, isto é, passar de um produto para o exterior, por exemplo, penetrar na pele ou no suco gástrico. Se os valores da EN 71‑3 forem respeitados, os valores‑limite de biodisponibilidade da antiga diretiva brinquedos presumem‑se também respeitados. A EN 71‑3 fixa, nomeadamente, os valores‑limite de migração seguintes: 60 mg/kg para o antimónio; 25 mg/kg para o arsénio; 1 000 mg/kg para o bário; 90 mg/kg para o chumbo e 60 mg/kg para o mercúrio.

 Nova diretiva brinquedos

7        Em 2003, a Comissão resolveu rever a antiga diretiva brinquedos. Após numerosas consultas a especialistas sobre vários projetos, apresentou, no início de 2008, uma Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à segurança dos brinquedos, a qual foi aceite pelo Conselho em 11 de maio de 2009, apesar da oposição do Governo alemão, e adotada em 18 de junho de 2009, vindo a ser a nova diretiva brinquedos. O anexo II (intitulado «Requisitos específicos de segurança»), parte III (intitulada «Propriedades químicas»), ponto 13, desta diretiva fixa diretamente os valores‑limite de migração e estabelece uma clara separação em função de três consistências do material do brinquedo, a saber, «seco, quebradiço, em pó ou maleável», «líquido ou viscoso» ou «raspado».

8        O anexo II, parte III, ponto 13, da nova diretiva brinquedos fixa, assim, os valores‑limite de migração seguintes:

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9        O artigo 54.° da nova diretiva brinquedos impõe aos Estados‑Membros a obrigação de pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para a sua transposição para a ordem nacional até 20 de janeiro de 2011 e para aplicar essas disposições a partir de 20 de julho de 2011. O artigo 55.° prevê, no entanto, uma exceção dado que o anexo II, parte II, ponto 3, da antiga diretiva brinquedos só é revogado com efeitos a partir de 20 de julho de 2013. Os valores‑limite de biodisponibilidade fixados pela antiga diretiva brinquedos e os valores‑limite de migração que são deduzidos dos mesmos para os materiais que servem no fabrico de brinquedos mantêm‑se em vigor até 20 de julho de 2013, nomeadamente no que respeita ao antimónio, ao arsénio, ao bário, ao chumbo e ao mercúrio.

10      Segundo o Governo alemão, o artigo 55.° da nova diretiva brinquedos é uma lex specialis que derroga o artigo 54.°, pelo que o anexo II, parte III, ponto 13, da referida diretiva, disposição em causa no presente processo, só deve ser transposto em 20 de julho de 2013. A Comissão considera, pelo contrário, que o prazo de transposição previsto no artigo 54.° da nova diretiva brinquedos se aplica igualmente aos metais pesados dos quais trata o presente litígio. É unicamente no interesse da economia que o artigo 55.° prevê um prazo transitório que expira em 20 de julho de 2013, prazo durante o qual os brinquedos cujas propriedades químicas estão em conformidade com as exigências da antiga diretiva brinquedos podem continuar a ser fabricados e comercializados. Esta disposição tem apenas por objetivo permitir um prazo de transposição mais longo aos Estados‑Membros.

 Direito nacional alemão

11      A antiga diretiva brinquedos foi transposta para o direito nacional alemão por meio de regulamento em 1989. O regulamento de transposição refere as exigências de segurança impostas pelo anexo II da antiga diretiva brinquedos, que enunciava os valores‑limite de biodisponibilidade aplicáveis, nomeadamente, aos cinco metais pesados que são o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio.

12      Em 2011, o direito nacional alemão foi adaptado à nova situação jurídica resultante da publicação da nova diretiva brinquedos. Nenhuma alteração foi, no entanto, introduzida no que respeita aos valores‑limite dos cinco metais pesados acima mencionados, dado que o anexo II, parte III, ponto 3, da antiga diretiva brinquedos se mantinha em vigor. Foi por esta razão que, por notificação para cumprir de 22 de novembro de 2012, a Comissão deu início, contra a República Federal da Alemanha e em conformidade com o artigo 258.° TFUE, a um processo por incumprimento pela não transposição parcial da nova diretiva brinquedos. Por ofício de 21 de março de 2013, o Governo alemão respondeu à notificação, defendendo‑se do incumprimento, com o fundamento de que o anexo II, parte III, da nova diretiva brinquedos só produz efeitos a partir de 20 de julho de 2013.

 Matéria de facto e tramitação processual

13      Por ofício de 18 de janeiro de 2011, o Governo alemão pediu à Comissão, ao abrigo do artigo 114.°, n.° 4, TFUE, lido em conjugação com o artigo 36.° TFUE, que aprovasse a manutenção, para além da data de 20 de julho de 2013, das suas disposições nacionais relativas aos valores‑limite para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio, em conformidade com o anexo II, parte II, ponto 3, da antiga diretiva brinquedos, e para as nitrosaminas e as substâncias nitrosáveis, com o fundamento de que essas disposições asseguravam um nível de proteção da saúde das crianças superior ao que tinha sido instituído pela nova diretiva brinquedos. Referiu‑se, nomeadamente, aos valores‑limite de migração fixados por esta para os brinquedos que podiam ser raspados. Segundo o Governo alemão, para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio, uma comparação com os valores‑limite da EN 71‑3 indica que os valores‑limite de migração aplicáveis no futuro são mais elevados, como resulta do quadro seguinte:

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14      O Governo alemão alega que, ainda que a comparação se limite aos valores aplicáveis à categoria «material do brinquedo raspado», basta esta comparação para demonstrar, sem que seja necessário ter em conta as outras duas categorias, que a aplicação das disposições da nova diretiva brinquedos conduz a um claro aumento da migração admissível de metais pesados. A referida diretiva não precisa claramente em que proporção os valores‑limite de migração de cada uma das três categorias se situa em relação aos outros. Há, pois, que partir do princípio de que a quantidade indicada pode migrar cada dia a partir de cada categoria. Os valores‑limite de migração devem, portanto, ser apreciados cumulativamente e adicionados, para definir a exposição total no caso de a criança se encontrar em contacto com brinquedos abrangidos pelas três categorias durante um mesmo dia.

15      Com a decisão impugnada, notificada em 2 de março de 2012, a Comissão deferiu o pedido do Governo alemão sem restrições para as nitrosaminas e as substâncias nitrosáveis. Para o bário e o chumbo, deferiu o pedido «até à data de entrada em vigor das regras de direito da União relativas aos novos valores‑limite […], mas não para além de 21 de julho de 2013». Em contrapartida, para o antimónio, o arsénio e o mercúrio a Comissão indeferiu o pedido.

16      Por petição inicial apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de maio de 2012, o Governo alemão interpôs recurso de anulação da decisão impugnada, na medida em que a Comissão indeferiu o seu pedido de manutenção das disposições nacionais relativas aos valores‑limite para o antimónio, o arsénio e o mercúrio, e só aprovou essa manutenção para o bário e o chumbo até 21 de julho de 2013.

17      Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 13 de fevereiro de 2013, o Governo alemão apresentou o presente pedido de medidas provisórias, no qual pede, no essencial, que o presidente do Tribunal Geral se digne:

¾        aprovar, a título provisório, as disposições nacionais notificadas, mantendo os valores‑limite para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio, até que o Tribunal decida sobre o recurso principal;

¾        a título subsidiário, ordenar à Comissão que aprove, a título provisório, as referidas disposições nacionais, até que o Tribunal tenha decidido sobre o recurso principal.

18      Nas suas observações sobre o pedido de medidas provisórias, apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de fevereiro de 2013, a Comissão pede que o presidente do Tribunal Geral se digne:

¾        declarar o pedido inadmissível ou, subsidiariamente, negar‑lhe provimento;

¾        quando da decisão sobre as despesas no processo principal, condenar a República Federal da Alemanha a pagar o acréscimo de despesas ocasionado pelo processo de medidas provisórias.

19      O Governo alemão respondeu às observações da Comissão por réplica de 14 de março de 2013. A Comissão emitiu posição definitiva sobre a mesma em tréplica de 27 de março de 2013.

 Questão de direito

20      Resulta de uma leitura conjugada dos artigos 278.° TFUE e 279.° TFUE, por um lado, e do artigo 256.°, n.° 1, TFUE, por outro, que o juiz das medidas provisórias pode, se considerar que as circunstâncias o exigem, ordenar a suspensão da execução do ato impugnado ou ordenar as medidas provisórias necessárias.

21      O artigo 104.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral prevê que um pedido de medidas provisórias deve especificar o objeto do litígio, as razões da urgência, bem como os fundamentos de facto e de direito que, à primeira vista, justificam a concessão da medida provisória requerida. Assim, o juiz das medidas provisórias pode ordenar a suspensão da execução e as restantes medidas provisórias se se demonstrar que, à primeira vista, a sua concessão é justificada de facto e de direito (fumus boni juris) e que as mesmas são urgentes no sentido de que é necessário, para evitar um prejuízo grave e irreparável dos interesses do requerente, que sejam decretadas e produzam os seus efeitos antes da decisão no processo principal. O juiz das medidas provisórias procede, igualmente, se necessário, à ponderação dos interesses em presença (v. despacho do presidente do Tribunal Geral de 13 de abril de 2011, Westfälische Drahtindustrie e o./Comissão, T‑393/10 R, Colet., p. II‑1697, n.° 12 e jurisprudência referida).

22      No âmbito desta análise de conjunto, o juiz das medidas provisórias dispõe de um amplo poder de apreciação e é livre de determinar, tendo presentes as especificidades do caso concreto, o modo como essas diferentes condições se devem considerar verificadas, bem como a ordem dessa análise, uma vez que nenhuma norma do direito da União lhe impõe um esquema de análise preestabelecido para apreciar a necessidade de decidir provisoriamente (v. despacho Westfälische Drahtindustrie e o./Comissão, já referido, n.° 13 e jurisprudência referida).

23      O juiz das medidas provisórias considera que dispõe de todos os elementos necessários para conhecer do presente pedido de medidas provisórias, sem que seja necessário ouvir, previamente, as partes nas suas alegações orais.

 Quanto à admissibilidade do pedido de medidas provisórias

24      A Comissão considera que o pedido de medidas provisórias é inadmissível, porque a República Federal da Alemanha não tem interesse em agir. Se o pedido no processo principal, que visa obter a anulação de uma decisão negativa, fosse acolhido, a Comissão seria obrigada a adotar uma nova decisão a respeito da concessão de uma derrogação, por força do artigo 114.°, n.° 4, TFUE, tendo em conta o acórdão de anulação e exercendo o vasto poder de apreciação que lhe é concedido nestas circunstâncias. Com o seu pedido de medidas provisórias, a República Federal da Alemanha procura, na realidade, obter a suspensão da execução de uma decisão negativa. Ora, uma pretensão assim é, em princípio, inadmissível no quadro de um processo de medidas provisórias (v. despacho do presidente do Tribunal Geral de 17 de dezembro de 2009, Vereniging Milieudefensie e Stichting Stop Luchtverontreiniging Utrecht/Comissão, T‑396/09 R, não publicado na Coletânea, a seguir «despacho Milieudefensie», n.° 34 e jurisprudência referida). Segundo a Comissão, a República Federal da Alemanha tentou contornar esta regra de admissibilidade limitando o objeto dos pedidos de medidas provisórias e, para atingir esse fim, apresentou, no pedido de medidas provisórias, pedidos que ultrapassam os pedidos apresentados no processo principal, o que ameaça o equilíbrio institucional.

25      No que respeita ao pedido principal, que visa que o juiz das medidas provisórias proceda, ele próprio, à aprovação provisória da manutenção das disposições nacionais controvertidas, a Comissão observa que, no âmbito da fiscalização de legalidade, o juiz da União não pode comportar‑se como autoridade administrativa nem proceder a apreciações complexas de questões técnicas em lugar dessa autoridade. Quanto ao pedido subsidiário, caso fosse considerado procedente no quadro do processo de medidas provisórias, essa procedência equivaleria a obrigar a Comissão a tirar determinadas consequências do acórdão de anulação. O direito da União não conhece este tipo de ação de injunção, que equivale a ordenar uma medida que excede as competências dos juízes do mérito (despacho Milieudefensie, n.° 42). Por outro lado, a admissibilidade de um pedido de medidas provisórias está subordinada à existência de um vínculo estreito entre a medida provisória requerida e os pedidos do recurso principal. O juiz das medidas provisórias não pode assumir competências que o juiz do mérito não possui (despacho Milieudefensie, n.os 39 e seguintes). Ora, no entender da Comissão, é precisamente isso que a recorrente procura obter.

26      O Governo alemão considera, em contrapartida, que existe obviamente um vínculo de conexão entre o pedido das medidas provisórias e o pedido do processo principal. As disposições que regem a ação de medidas provisórias são uma expressão do direito a obter justiça que está consagrado no artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (JO 2010, C 83, p. 389) (a seguir «Carta»). Essas disposições garantem ao recorrente o direito de obter uma proteção jurisdicional provisória na medida em que a mesma é necessária para assegurar a plena eficácia da decisão que será proferida quanto ao mérito. Quando, como no caso em apreço, o recurso principal tem por objeto, na realidade, um pedido de injunção, mas o requerente está limitado a interpor um recurso de anulação, deve ser concedida proteção jurisdicional provisória quer em virtude do artigo 278.° TFUE quer em virtude do artigo 279.° TFUE.

27      A este respeito, há que recordar que a finalidade do processo de medidas provisórias é garantir a plena eficácia da futura decisão de mérito [v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 27 de setembro de 2004, Comissão/Akzo e Akcros, C‑7/04 P(R), Colet., p. I‑8739, n.° 36]. Por conseguinte, este processo tem caráter puramente acessório relativamente ao processo principal com o qual se prende (despacho do presidente do Tribunal Geral de 12 de fevereiro de 1996, Lehrfreund/Conselho e Comissão, T‑228/95 R, Colet., p. II‑111, n.° 61), pelo que a decisão tomada pelo juiz das medidas provisórias deve revestir caráter provisório, no sentido de que não pode antecipar o sentido da futura decisão de mérito, nem privá‑la de efeito útil (despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 17 de maio de 1991, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90 R, Colet., p. I‑2557, n.° 24, e do presidente do Tribunal Geral de 12 de dezembro de 1995, Connolly/Comissão, T‑203/95 R, Colet., p. II‑2919, n.° 16). Mais ainda, a medida conservatória pedida deve apresentar um vínculo suficientemente estreito com o objeto do recurso principal e não pode situar‑se fora do âmbito de decisão de mérito suscetível de ser tomada pelo Tribunal (despachos do presidente do Tribunal Geral de 29 de março de 2001, Goldstein/Comissão, T‑18/01 R, Colet., p. II‑1147, n.° 14, e de 2 de julho de 2004, Sumitomo Chemical/Comissão, T‑78/04 R, Colet., p. II‑2049, n.° 43).

28      Como a Comissão acertadamente salientou, um pedido de medidas provisórias que só visa obter a suspensão da execução de uma decisão negativa é, em princípio, inadmissível, dado que a suspensão solicitada não é suscetível, em si, de modificar a situação jurídica do requerente. Contudo, o que o Governo alemão apresentou não foi exatamente um pedido de suspensão da execução na aceção do artigo 278.° TFUE. O Governo alemão pede, pelo contrário, a adoção de uma medida provisória na aceção do artigo 279.° TFUE. Ora, nem o artigo 279.° TFUE nem o artigo 104.° do Regulamento de Processo, nem, por maioria da razão, o artigo 47.° da Carta, permitem declarar um pedido deste tipo inadmissível apenas com o fundamento de que o recurso em que se insere tem como objetivo a anulação de uma decisão negativa [v., a este respeito, também, despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça de 7 de março de 2013, EDF/Comissão, C‑551/12 P(R), não publicado na Coletânea, n.° 41].

29      É por esta razão que a jurisprudência contém numerosos exemplos de medidas provisórias que foram adotadas no âmbito de recursos de anulação de decisões negativas. Nestas circunstâncias, o juiz das medidas provisórias considerou, com efeito, necessário conceder a proteção jurídica provisória solicitada até à conclusão do processo principal (v., designadamente, dispositivo dos despachos do presidente do Tribunal Geral de 28 de abril de 2009, United Phosphorus/Comissão, T‑95/09 R, não publicado na Coletânea; de 16 de novembro de 2012, Evonik Degussa/Comissão, T‑341/12 R, não publicado na Coletânea; Akzo Nobel e o./Comissão, T‑345/12 R; e de 11 de março de 2013, Pilkington Group/Comissão, T‑462/12 R).

30      Há que constatar que as características do caso em apreço militam particularmente a favor da admissibilidade da medida provisória requerida pelo Governo alemão.

31      Com efeito, o artigo 55.° da nova diretiva brinquedos prevê que o anexo II, parte II, ponto 3, da antiga diretiva brinquedos ― que contém os valores‑limite de antimónio, arsénio, bário, chumbo e mercúrio que o Governo alemão deseja manter como figuram no direito nacional ― só é revogado com efeitos a partir de 20 de julho de 2013. Isto significa que os valores‑limite controvertidos se mantêm em vigor até esta data. Na medida em que a Comissão, na decisão impugnada, indeferiu o pedido de manutenção para o antimónio, o arsénio e o mercúrio e só deferiu esse pedido para o bário e para o chumbo até 21 de julho de 2013, a proibição de manutenção que daqui resulta só passa a ter efeito em 21 de julho de 2013. Por conseguinte, o Governo alemão pode, se necessário, continuar a aplicar os valores‑limite precedentes em causa até 20 de julho de 2013, com ou sem autorização da Comissão, sem prejuízo da sua eventual obrigação de transpor, antes dessa data, o anexo II, parte III, ponto 13, da nova diretiva brinquedos para o direito nacional (v. n.° 12 supra).

32      Nestas condições, o Governo alemão devia interpor um recurso de anulação da decisão impugnada no prazo fixado pelo artigo 263.°, n.° 6, TFUE, isto é, até meados de maio de 2012, dado que a proteção jurisdicional provisória prevista no artigo 278.° TFUE lhe é recusada até 20 de julho de 2013 porque, até essa data, a situação jurídica que esse governo pretende que seja aplicada ― na aceção da aplicabilidade contínua dos precedentes valores‑limite ― já está assegurada pelo artigo 55.° da nova diretiva brinquedos. O Governo alemão só pode, logicamente, pedir a manutenção desses valores‑limite para além de 20 de julho de 2013 pela via de uma medida provisória decretada em conformidade com o artigo 279.° TFUE. A Comissão não pode, portanto, acusá‑lo de procurar contornar ilicitamente o processo previsto pelo artigo 278.° TFUE.

33      Na medida em que a Comissão considera que a medida provisória requerida ameaça o equilíbrio institucional e ultrapassa o quadro das competências do juiz do mérito, há que recordar que, em matéria de medidas provisórias, o juiz das medidas provisórias dispõe de competências cujo impacto face às instituições da União em causa ultrapassa os efeitos decorrentes de um acórdão de anulação (v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 5 de agosto de 1983, CMC/Comissão, 118/83 R, Recueil, p. 2583, n.° 53, e dispositivo do despacho do presidente do Tribunal Geral de 19 de fevereiro de 1993, Langnese‑Iglo e Schöller/Comissão, T‑7/93 R e T‑9/93 R, Colet., p. II‑131), na condição de essas medidas provisórias só se aplicarem durante o decorrer do processo principal, não prejudicando a decisão de mérito e não entravando o efeito útil da mesma.

34      Como o Governo alemão acertadamente observou, a pronúncia da medida provisória que é pedida não prejudica a decisão de mérito. A manutenção das disposições nacionais notificadas só será aprovada por um lapso de tempo limitado, isto é, até à adoção da decisão de mérito. Esta aprovação puramente provisória não implica nenhuma apreciação quanto à justeza da decisão impugnada, apreciação que será objeto da decisão de mérito. De resto, o pedido de medidas provisórias, com a qual o Governo alemão procura, em substância, poder aplicar os valores‑limite anteriores em data posterior a 20 de julho de 2013, apresenta um vínculo suficientemente estreito com o recurso de anulação da decisão impugnada, na medida em que esta lhe proíbe de facto que mantenha esses valores‑limite em vigor para além dessa data.

35      Quanto ao efeito útil da decisão a ser tomada quanto ao mérito, é evidente que a pronúncia da medida provisória requerida não tem efeito de acórdão de indeferimento do recurso de anulação interposto pelo Governo alemão, visto que, em conformidade com o artigo 107.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, a eficácia da medida cessa automaticamente quando for proferido o acórdão. Se o Tribunal Geral anular a decisão impugnada, a Comissão será obrigada, por força do artigo 266.° TFUE, a tomar as medidas que essa anulação implica, respeitando os fundamentos do acórdão. Admitindo que a Comissão volta a indeferir o pedido de manutenção apresentado pelo Governo alemão, baseando‑se, por exemplo, em fundamentos novos, a medida cuja eficácia cessou por força do artigo 107.°, n.° 3, do Regulamento de Processo não constitui obstáculo a esta consequência do acórdão. Em contrapartida, se, para se conformar com os fundamentos do acórdão, a Comissão deferir o pedido de manutenção, a medida provisória requerida será particularmente adequada a garantir, desde já, o pleno efeito de um futuro acórdão de anulação que será objeto dessa execução.

36      Nestas condições, a Comissão não pode pretender utilmente que a medida provisória requerida ultrapassa o que o Tribunal Geral pode vir a atribuir num futuro acórdão de anulação. A este respeito, basta constatar, para efeitos da presente análise da admissibilidade do pedido de medidas provisórias, que o Governo alemão indicou de maneira pertinente (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de janeiro de 1986, Cofaz e o./Comissão, 169/84, Colet., p. 391, n.° 28) que os valores‑limite nacionais notificados à Comissão com vista à sua manutenção garantem um nível de proteção da saúde das crianças mais elevado do que o que resulta da execução dos valores‑limite da nova diretiva brinquedos, que recusar‑lhe a medida provisória pretendida para o período compreendido entre 21 de julho de 2013 e a pronúncia do acórdão no processo principal faria pesar sobre a saúde das crianças a ameaça de um prejuízo grave e irreparável e que o interesse para o qual a proteção é reclamada, concretamente a saúde pública, reveste uma importância crucial.

37      Esta declaração conclusiva do Governo alemão permite que o juiz das medidas provisórias, para efeitos da análise da admissibilidade do pedido que lhe é apresentado, decida com certeza suficiente que, para cumprir as obrigações que resultam de um acórdão de anulação, a Comissão deferiria o pedido de manutenção controvertido. A medida provisória requerida está, assim, no limite das medidas que a Comissão seria, com toda a probabilidade, obrigada a adotar em execução de uma decisão desse teor.

38      A este respeito, há que distinguir o caso em apreço do que estava em causa no processo que deu origem ao despacho Milieudefensie, que tinha por objeto uma autorização de derrogação em que a Comissão tinha isentado um Estado‑Membro do respeito de certos valores‑limite em matéria de qualidade de ar. A Comissão tinha indeferido, por ser inadmissível, o pedido que lhe tinha sido dirigido por uma organização de proteção do ambiente de efetuar uma «nova análise interna» dessa autorização. Foi dessa decisão de indeferimento, e não da própria autorização de derrogação, que a organização recorrente interpôs recurso de anulação. Além disso, essa organização apresentou um pedido de medidas provisórias que tinha por objeto, nomeadamente, obrigar a Comissão a ordenar ao Estado‑Membro em causa que respeitasse os valores‑limite sem demora. Nos n.os 37 a 41 do despacho Milieudefensie, o pedido de medidas provisórias foi declarado inadmissível com o fundamento de que decretar a medida provisória requerida equivaleria, de facto, a obrigar a Comissão a retirar a derrogação, enquanto um acórdão que anulasse a decisão de indeferimento obrigaria unicamente a Comissão a agir e a efetuar, sem prejuízo do resultado, a nova análise inicialmente recusada, tanto mais que o debate entre as partes, longe de visar esse resultado, apenas tinha por objeto questões de admissibilidade. Assim, a revogação dessa derrogação não seria, de maneira nenhuma, a consequência necessária desse acórdão, pelo que a medida provisória requerida ultrapassava largamente as medidas que a Comissão seria obrigada a adotar para se conformar com uma eventual decisão de anulação ao abrigo do artigo 266.° TFUE (v., a propósito de uma configuração similar relativa ao direito da União em matéria de auxílios de Estado, despacho CIRFS e o./Comissão, já referido, n.os 20 a 23).

39      Resulta do exposto que o pedido de medidas provisórias deve ser declarado admissível, mas unicamente no que respeita ao pedido apresentado a título subsidiário. Com efeito, resulta das disposições conjugadas do artigo 114.°, n.os 4 e 6, TFUE que a Comissão é a única competente para autorizar os pedidos de manutenção que lhe são apresentados pelos Estados‑Membros, enquanto o juiz das medidas provisórias, em princípio, só tem capacidade para obrigar a instituição em causa a tomar determinadas medidas ou a abster‑se de o fazer.

 Quanto ao fumus boni juris

40      Resulta da jurisprudência que o requisito relativo ao fumus boni juris está preenchido quando, pelo menos, um dos fundamentos invocados pelo recorrente para alicerçar o recurso principal surge, à primeira vista, como pertinente e, em todo o caso, não desprovido de fundamento. Basta para tal que esse fundamento revele a existência de questões jurídicas complexas e delicadas, que, à primeira vista, não podem ser afastadas por falta de pertinência, mas necessitam de um exame aprofundado, o qual está reservado ao órgão jurisdicional competente para decidir sobre o mérito, ou que resulte dos argumentos articulados das partes que existe, no quadro do processo principal, uma controvérsia jurídica importante cuja solução não é imediatamente óbvia (v., neste sentido, despacho Westfälische Drahtindustrie e o./Comissão, já referido, n.° 54, e despacho do presidente do Tribunal Geral de 19 de setembro de 2012, Grécia/Comissão, T‑52/12 R, n.° 13 e jurisprudência referida).

 Quanto à autorização temporária dos valores‑limite do chumbo e do bário

41      Segundo o Governo alemão, a decisão impugnada viola o artigo 114.° TFUE na medida em que a Comissão fez acompanhar a sua aprovação das disposições nacionais notificadas relativas aos valores‑limite para o chumbo e o bário de um prazo que expira, o mais tardar, em 21 de julho de 2013. O artigo 114.°, n.° 6, primeiro parágrafo, TFUE não prevê essa restrição cronológica, pelo que a Comissão só tinha escolha entre a aprovação e o indeferimento. O prazo no qual a mesma deve adotar a sua decisão é expressamente limitado a seis meses. A redação desta disposição não lhe permite impor uma restrição temporal, nem a fortiori uma restrição abrupta como a que impôs no caso em apreço, que deixa aos seus serviços a oportunidade de examinar depois as eventuais adaptações da medida de harmonização.

42      O Governo alemão diz ainda que a sistemática do artigo 114.°, n.° 6, primeiro parágrafo, TFUE aponta, também ela, no sentido contrário à possibilidade de a Comissão fazer acompanhar uma decisão adotada nesta base com uma limitação temporal. Em primeiro lugar, o segundo parágrafo deste n.° 6 cria uma presunção de aprovação quando a Comissão não decide no prazo de seis meses previsto no parágrafo precedente. Em segundo lugar, em conformidade com o terceiro parágrafo do referido n.° 6, a Comissão só pode prolongar os seis meses do prazo inicial a título excecional. Em terceiro lugar, o artigo 114.°, n.° 7, TFUE impõe à Comissão que, quando aprova as disposições nacionais notificadas, examine imediatamente se é oportuno propor uma adaptação da medida de harmonização. Esta regra tem por objeto assegurar que a lentidão de um processo de manutenção das disposições nacionais não prejudique o Estado‑Membro requerente. A Comissão é, portanto, expressamente obrigada a examinar a oportunidade e o alcance de uma eventual adaptação imediatamente após ter concedido a sua aprovação.

43      A Comissão responde que a argumentação do Governo alemão viola o sistema instituído pelo artigo 114.° TFUE. Com efeito, a autorização de disposições nacionais mais estritas constitui precisamente uma derrogação às medidas de harmonização. Em lugar de se prevalecer de uma exceção, a autorização faz acompanhar a aprovação com uma restrição no tempo apenas para criar uma situação compatível com a medida de harmonização, ao mesmo tempo que aprova, por um período limitado, um nível de proteção superior. O limite no tempo permite encerrar rapidamente o procedimento e evitar um eventual segundo procedimento com base no artigo 114.°, n.° 4, TFUE. A Comissão preferiu esta solução porque a República Federal da Alemanha tinha manifestado desde muito cedo a sua desaprovação relativamente à abordagem escolhida pela Comissão, apesar do facto de esta ter já iniciado diligências com vista a uma adaptação dos valores‑limite aos conhecimentos científicos mais recentes. Pareceu, portanto, lógico limitar a autorização no tempo, pois era a única maneira de garantir que as regras uniformes se aplicam em qualquer momento às substâncias em causa presentes nos brinquedos comercializados no mercado interno.

44      A Comissão alega que bloquear todas as medidas destinadas a introduzir disposições mais estritas à escala da União até ao encerramento do processo previsto no artigo 114.°, n.° 6, TFUE seria contrário ao objetivo de proteção que prossegue a nova diretiva brinquedos e à importância que o direito da União atribui à proteção da saúde. Tal resultado seria evidentemente absurdo. Pelo contrário, limitar as suas autorizações no tempo permite à Comissão a possibilidade de encontrar, se necessário, soluções mais flexíveis que entravem o menos possível o funcionamento do mercado interno e a aplicação uniforme do direito da União. Permite‑lhe, ao mesmo tempo, ter em conta as preocupações legítimas dos Estados‑Membros.

45      A este respeito, o juiz das medidas provisórias conclui, em primeiro lugar, que, no n.° 54 da decisão impugnada, a Comissão reconheceu expressamente que os limites de migração fixados pela nova diretiva brinquedos para o chumbo não oferecem um nível de proteção apropriado para as crianças, o que a fez iniciar um procedimento de revisão dos valores‑limite em questão. Por essa razão, a Comissão considerou, no n.° 55 da decisão impugnada, que as disposições nacionais notificadas relativas ao chumbo se justificavam por importantes imperativos de proteção da saúde humana. O mesmo é válido no que respeita ao bário: no n.° 48 da decisão impugnada, a Comissão também reconhece expressamente que os valores preconizados pelo Governo alemão garantem verdadeiramente um nível mais elevado de proteção da saúde das crianças. Por esta razão, no n.° 51 da decisão impugnada, a Comissão declarou que as disposições nacionais notificadas relativas ao bário se justificavam por importantes imperativos de proteção da saúde humana.

46      Cumpre finalmente acrescentar que, no n.° 94 da decisão impugnada, a Comissão observou que as medidas nacionais notificadas pela República Federal da Alemanha para o chumbo e o bário não eram um meio de discriminação arbitrária, nem um entrave disfarçado às trocas entre os Estados‑Membros, nem um obstáculo desproporcionado ao funcionamento do mercado interno. A Comissão conclui daqui que tinha motivos para admitir que essas medidas pudessem ser autorizadas «sob reserva de um limite no tempo».

47      Afigura‑se assim que a Comissão confirmou que todos os requisitos de aplicação do artigo 114.°, n.os 4 e 6, TFUE estavam reunidos no que respeita ao chumbo e ao bário. Além disso, reconheceu que estava de acordo com a República Federal da Alemanha quanto ao facto de a aprovação dever ser concedida quando as condições fixadas no artigo 144.°, n.os 4 e 6, TFUE estão preenchidas. Porém, indicou que, entre essas condições, figurava igualmente a do caráter necessário das disposições nacionais, o que era o caso em apreço até à adoção dos valores‑limite resultantes da nova diretiva brinquedos. Para lá deste limite temporal, as disposições nacionais cessarão de ser necessárias. Esta situação milita a favor da limitação no tempo de que fez acompanhar a sua aprovação.

48      Quanto à revisão dos valores‑limite fixados pela nova diretiva brinquedos, a Comissão precisou, nas suas observações sobre o pedido de medidas provisórias, que tinha notificado a Organização Mundial do Comércio, em 3 de janeiro de 2013, de um projeto de regulamento que altera a referida diretiva e adapta os valores‑limite aplicáveis ao bário. Uma vez notificado este projeto, tem de respeitar um prazo de 60 dias, isto até, até 4 de março de 2013, antes de poder adotá‑lo. Expirado o prazo e depois de ter em conta eventuais observações, pode submeter o projeto em questão ao comité de regulamentação, o que «previu fazer» em março de 2013, após a fase escrita do processo. «Caso o comité de regulamentação aprove o projeto por maioria qualificada», um prazo de três meses começará a correr, durante o qual o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia poderão apresentar objeções. «Se não as apresentarem», a Comissão pode adotar o projeto. Os novos limites de migração para o bário podem, portanto, entrar em vigor em julho de 2013.

49      Como esta exposição permite compreender facilmente, a entrada em vigor dos novos valores de migração para o bário considerados pela Comissão depende de vários elementos imponderáveis. Ao fazer acompanhar a sua aprovação de um prazo obrigatório «[que não ultrapassa] 21 de julho de 2013», como foi feito no artigo 1.° da decisão impugnada, a Comissão, à primeira vista, cria o risco para a República Federal da Alemanha de dever renunciar às suas regras nacionais antes da entrada em vigor de eventuais novos valores de migração, apesar de essas regras garantirem incontestavelmente um nível de proteção mais elevado que aquele que os valores atuais da nova diretiva brinquedos oferecem e de a manutenção da referidas regras se justificar por importantes imperativos de proteção da saúde. Por conseguinte, a argumentação do Governo alemão ― segundo a qual a imposição desse prazo não corresponde a uma «manutenção» na aceção do artigo 114.°, n.° 4, TFUE e equivale a contornar o sistema de prazos e de presunção de aprovação instituído pelo artigo 114.°, n.os 4 a 7, TFUE ― parece prima facie não ser desprovido de fundamento.

50      Isto é válido a fortiori para a adaptação dos valores‑limite aplicáveis ao chumbo considerados pela Comissão. Com efeito, a própria Comissão parte do princípio de que os novos valores só podem ser adotados a partir de janeiro de 2014, isto é, em qualquer caso, após a expiração do prazo obrigatório de que fez acompanhar a sua aprovação, o qual termina em 21 de julho de 2013.

51      Impõe‑se concluir que os argumentos que o Governo alemão apresentou a propósito da aprovação limitada no tempo dos valores‑limite aplicáveis ao chumbo e ao bário apresentam um caráter sério e suscitam questões que, à primeira vista, necessitam de uma análise aprofundada, que é da competência do juiz do mérito. A este respeito, o pedido de medidas provisórias apresenta, portanto, um fumus boni juris.

52      Há que observar desde já que a Comissão, na hipótese de o pedido de medidas provisórios ser deferido quanto a este ponto, pode em qualquer momento introduzir um pedido ao abrigo do artigo 108.° do Regulamento de Processo, se considerar que as circunstâncias se alteraram de forma a justificar uma modificação ou uma revogação da medida provisória, o que será o caso, por exemplo, se ocorrer entretanto uma adaptação dos valores‑limite aplicáveis ao chumbo ou ao bário, ou a ambos os elementos.

 Quanto ao indeferimento do pedido de aprovação dos valores‑limite aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio

53      Segundo o Governo alemão, a decisão impugnada infringe o artigo 114.°, n.os 4 e 6, TFUE, na medida em que a Comissão violou o critério de apreciação pertinente, quando, para justificar a sua recusa em manter as disposições nacionais aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio, o acusou de ter omitido a prova de que os limites de migração previstos pela nova diretiva brinquedos não ofereciam um nível adequado de proteção ou que teriam provavelmente efeitos nefastos na saúde. Com efeito, como resulta do acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de março de 2003, Dinamarca/Comissão (C‑3/00, Colet., p. I‑2643, n.os 63 e 64), um Estado‑Membro pode, para justificar a manutenção das suas disposições nacionais, invocar o facto de que avalia o risco para a saúde pública de forma diferente do que o legislador da União fez na medida de harmonização em causa. O Estado‑Membro requerente deve unicamente demonstrar, nessa ocasião, que as suas regras nacionais asseguram um nível de proteção da saúde pública mais elevado que a medida de harmonização do direito da União e não ultrapassam o necessário para atingir esse objetivo.

54      Ao invés do que afirma a Comissão, o Governo alemão cumpriu todas as suas obrigações em matéria de prova. Os valores‑limite nacionais, que são idênticos aos do anexo II, parte II, ponto 3, da antiga diretiva brinquedos, e os valores‑limite previstos no anexo II, parte III, ponto 13, da nova diretiva brinquedos só podem ser comparados após conversão, porque os primeiros são expressos em termos de biodisponibilidade, enquanto os segundos são expressos em termos de valores‑limite de migração. O Governo alemão efetuou a conversão em valores‑limite de migração com base na norma EN 71‑3 (v. n.° 6 supra), após o que comparou os valores‑limite de biodisponibilidade depois de esgotados os valores‑limite de migração máximos autorizados pela nova diretiva brinquedos para as três categorias de consistência dos brinquedos com os da antiga diretiva brinquedos, independentemente da consistência do brinquedo. Após essa conversão, os valores‑limite de migração previstos pelas disposições nacionais notificadas não se revelaram inferiores aos que são previstos pela nova diretiva brinquedos. Para os elementos em questão, esta última autoriza, portanto, uma migração superior à que é permitida pelas referidas disposições nacionais, o que ocasionaria uma exposição mais forte das crianças às substâncias nocivas. Isto demonstra que essas mesmas disposições nacionais garantem um nível de proteção mais elevado do que o que resulta da aplicação da nova diretiva brinquedos, como se confirma no quadro seguinte:

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55      Para o Governo alemão, isto demonstra que, para cada elemento e para cada consistência, os valores‑limite de biodisponibilidade previstos pela antiga diretiva brinquedos são inferiores aos previstos pela nova diretiva brinquedos. Por conseguinte, resulta já de uma análise distinta de consistência que as disposições nacionais notificadas asseguram um nível mais elevado de proteção da saúde das crianças que as prescrições da nova diretiva brinquedos. Ora, essa conclusão é ainda reforçada se se efetuar, para cada elemento, uma análise global adicionando os valores‑limite de biodisponibilidade previstos pela nova diretiva brinquedos, após conversão, para as três consistências de material do brinquedo.

56      Em contrapartida, a Comissão considera que as disposições nacionais notificadas, e os valores‑limite previstos pela antiga diretiva brinquedos nos quais essas disposições se baseavam, não protegem a saúde de maneira mais eficaz do que as disposições da nova diretiva brinquedos e que, pelo contrário, na maioria dos casos, as normas alemãs asseguram uma proteção claramente mais fraca contra o antimónio, o arsénio e o mercúrio, como demonstra o quadro seguinte, no qual os valores‑limite de migração previstos pela nova diretiva brinquedos são comparados com as medidas notificadas pelo Governo alemão, remetendo os valores para a quantidade máxima aceitável em miligrama de cada elemento que pode ser libertada (que pode «migrar») a partir de um kg de material de brinquedo:

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57      Segundo a Comissão, resulta claramente deste quadro que, para os materiais líquidos e secos, os valores notificados pelo Governo alemão são claramente superiores aos da nova diretiva brinquedos. Os valores‑limite notificados só são inferiores para os materiais raspados, os quais estão, no entanto, regra geral, mais dificilmente disponíveis, precisamente porque devem, primeiro, ser raspados.

58      A Comissão contesta a comparação que o Governo alemão fez no quadro que lhe apresentou (v. n.° 54 supra). Com efeito, a segunda coluna indica a biodisponibilidade procurada como objetivo pelas disposições nacionais alemãs, e pela antiga diretiva brinquedos, enquanto as três colunas mais à direita mostram a biodisponibilidade alcançada na prática graças à nova diretiva brinquedos, isto é, tendo em conta a quantidade de material do brinquedo absorvida. Para que a comparação fosse correta, seria necessário, também para a antiga diretiva brinquedos, calcular a biodisponibilidade suscetível de ser atingida na prática, para as três consistências do material do brinquedo. Para alcançar este objetivo, há que multiplicar o valor‑limite de migração por um elemento dado, isto é, a quantidade máxima deste elemento que se aceita que seja libertado por quilograma de material do brinquedo, pela quantidade de material do brinquedo engolida pela criança que brinca: 100 mg para o material seco (e outro), 400 mg para a argila de moldar e as digitintas ou o material líquido (e outro) e 8 mg para o material raspado. O quadro seguinte ilustra esse resultado:

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59      Esta comparação mostra que, para o antimónio, o arsénio e o mercúrio, a nova diretiva brinquedos é, exceto para o material raspado, globalmente mais severa que a regulamentação que a República Federal da Alemanha deseja ser autorizada a manter. As disposições notificadas não servem, portanto, para a proteção da saúde, pelo que o elemento decisivo exigido pelo artigo 114.°, n.° 4, TFUE, a saber, o caráter adequado da medida, está em falta no processo principal.

60      A este respeito, o juiz das medidas provisórias deve concluir que a controvérsia que opõe o Governo alemão e a Comissão a propósito dos valores‑limite «corretos» para o antimónio, o arsénio e o mercúrio presentes nos brinquedos suscita questões de elevada tecnicicidade. Isto é válido, em particular, para a conversão dos valores‑limite de migração e de biodisponibilidade.

61      Quanto a esta conversão, o Governo alemão contesta a pertinência dos «valores‑limite de biodisponibilidade suscetíveis de serem alcançados na prática» que a Comissão obteve multiplicando os valores‑limite de migração que correspondem à norma EN 71‑3 pelas estimativas de quantidades absorvidas, isto é, 100 mg, 400 mg e 8 mg. À primeira vista, esta objeção não é desprovida de fundamento, na medida em que o Governo alemão observa que os valores‑limite de migração da norma EN 71‑3 foram elaborados com base na hipótese segundo a qual a quantidade diária de material de brinquedo absorvido é apenas de 8 mg e que a antiga diretiva brinquedos, bem como as disposições nacionais baseadas na mesma, por um lado, já impõe os valores‑limite de biodisponibilidade aplicáveis e, por outro, define a biodisponibilidade máxima diária devido à utilização dos brinquedos proibindo que esta seja ultrapassada. Na medida em que o Governo alemão também refere que os «valores‑limite de biodisponibilidade suscetíveis de serem atingidos na prática» fixados pela Comissão não são corretos, porque os valores assim calculados são bem mais elevados do que os permitidos, em absoluto, pela antiga diretiva brinquedos, pelo que a premissa na qual a Comissão baseou a sua conversão é incompatível com as próprias disposições da referida diretiva, à primeira vista esta tese também não parece desprovida de pertinência.

62      Por outro lado, a própria Comissão reconhece que, mesmo segundo o seu próprio método de conversão, os valores‑limite nacionais notificados são, para o material raspado, inferiores aos fixados pela nova diretiva brinquedos, estando o material raspado mais dificilmente acessível à criança, porque deve primeiro ser raspado. Questionada a este propósito, a Comissão referiu, a título de exemplo de material raspado, os revestimentos de superfície (pinturas, vernizes), os materiais plásticos e outros materiais, como o couro, o cartão, a madeira e têxteis como os peluches, mas também o vidro ou o aço. Precisou que era a própria criança que, ao brincar, mordia o brinquedo, raspava‑o com os dentes, chupava‑o ou lambia‑o e podia, assim, engolir matéria raspada. Ora, essas explicações não permitem determinar, à primeira vista, o porquê de brinquedos raspados ― isto é, brinquedos intensamente usados como podemos encontrar amiúde nos jardins de infância, nas creches e em famílias numerosas ― estarem mais dificilmente disponíveis do que outras consistências de material nem por que razão o risco sanitário que deles resulta deve ser considerado negligenciável. Em todo o caso, a Comissão não apresentou nenhum valor que ilustre o grau de raridade desses brinquedos. Portanto, não pode afirmar‑se que, no que respeita ao material raspado do brinquedo, as disposições nacionais notificadas não são suscetíveis de assegurar a proteção da saúde, na aceção do artigo 114.°, n.° 4, TFUE.

63      Embora a Comissão alegue que as disposições de que o Governo alemão pede a aprovação são baseadas em métodos que datam de há cerca de 30 anos, é suficiente observar que, na nova diretiva brinquedos, o próprio legislador permite expressamente que os valores‑limite baseados nesses métodos se mantenham em vigor até 20 de julho de 2013. Os valores‑limite nacionais que, na decisão impugnada, a Comissão autorizou a termo para o bário e o chumbo também assentam nesses métodos. Portanto, a Comissão não tem fundamento, prima facie, para pretender que o regime de valores‑limite instituído pela antiga diretiva brinquedos é totalmente obsoleto, cientificamente ultrapassado e, por consequência, manifestamente inadequado.

64      Também não pode ser acolhido o argumento da Comissão baseado no facto de nenhum outro Estado‑Membro ter suscitado a mais pequena reserva a respeito dos novos valores‑limite. Com efeito, é perfeitamente aceitável que um Estado‑Membro, em particular no setor da saúde, avalie o risco que certas substâncias podem acarretar para a população de forma diferente da do legislador da União na elaboração de uma medida de harmonização, o que autoriza esse Estado a manter as suas disposições nacionais em vigor na medida em que possa demonstrar que as mesmas protegem a saúde pública (nacional) melhor do que a medida de harmonização em causa e não ultrapassam o que é necessário para alcançar esse objetivo (v., neste sentido, acórdão Dinamarca/Comissão, já referido, n.os 63 e 64).

65      Portanto, há que concluir que os argumentos que o Governo alemão apresentou a propósito da recusa de aprovação dos valores‑limite aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio suscitam questões complexas que, à primeira vista, não podem ser afastadas como desprovidas de pertinência, mas necessitam de uma análise aprofundada, que deverá ser levada a cabo no quadro do processo principal, eventualmente após a consulta de um especialista, nos termos do artigo 65.°, alínea d), do Regulamento de Processo.

66      Por último, há que sublinhar que, na decisão impugnada, a Comissão não examinou a existência de uma eventual discriminação arbitrária, de uma eventual restrição disfarçada do comércio entre Estados‑Membros ou de um eventual entrave ao funcionamento do mercado interno. No entanto, como o Governo alemão acertadamente salientou, a própria Comissão admitiu, nessa decisão, que as disposições nacionais alemãs relativas ao chumbo, ao bário, às nitrosaminas e às substâncias nitrosáveis se aplicavam indistintamente a todos os produtos e não implicavam nenhuma discriminação arbitrária, nem restrição ao comércio entre Estados‑Membros, nem entrave ao funcionamento do mercado interno. Não há nenhuma razão para que o mesmo não ocorra no que respeita ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio, dado que as disposições nacionais notificadas são idênticas a este respeito.

67      Portanto, a condição relativa ao fumus boni juris também está preenchida no que se refere à recusa de aprovação dos valores‑limite aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio.

 Quanto à urgência

68      Há que recordar que a finalidade do processo de medidas provisórias é garantir a plena eficácia da futura decisão de mérito, a fim de evitar uma lacuna na proteção jurídica garantida pelo juiz da União (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 3 de maio de 1996, Alemanha/Comissão, C‑399/95 R, Colet., p. I‑2441, n.° 46). Para alcançar esse objetivo, o caráter urgente de um pedido de medidas provisórias deve ser apreciado em relação com a necessidade existente de decidir provisoriamente a fim de evitar que um prejuízo grave e irreparável seja provocado à parte que solicita a medida provisória [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 18 de novembro de 1999, Pfizer Animal Health/Conselho, C‑329/99 P(R), Colet., p. I‑8343, n.° 94]. É a parte que alega a ameaça desse prejuízo que deve provar que a sua ocorrência é previsível com grau de probabilidade suficiente (v., neste sentido, despachos do Tribunal de Justiça de 29 de junho de 1993, Alemanha/Conselho, C‑280/93 R, Colet., p. I‑3667, n.° 34, e do presidente do Tribunal de Justiça de 17 de julho de 2001, Comissão/NALOO, C‑180/01 P‑R, Colet., p. I‑5737, n.° 53).

69      No caso em apreço, a República Federal da Alemanha alega que, na falta das medidas provisórias requeridas, se arrisca a sofrer um prejuízo grave e irreparável no período compreendido entre 20 de julho de 2013 e a decisão do Tribunal Geral quanto ao mérito. O interesse jurídico ameaçado é a saúde das crianças, que correm o risco de entrar em contacto com brinquedos que não foram produzidos respeitando os valores‑limite previstos pelas disposições nacionais notificadas, as quais disponibilizam um nível de proteção mais elevado do que o que é assegurado pela nova diretiva brinquedos. O prejuízo é grave porque a saúde é, em si, um valor particularmente importante e as crianças, que são os consumidores mais sensíveis, não podem decidir por si próprias quais os perigos a que se expõem. Uma vez produzido, o dano é irreversível porque, dada a sua natureza, os danos causados à saúde não podem ser eliminados retroativamente.

70      A Comissão responde, em substância, que, mesmo que os valores‑limite da antiga diretiva brinquedos conduzissem a um nível de proteção mais elevado, isso não significaria que as disposições da nova diretiva brinquedos ocasionem danos graves e irreparáveis a contar de 20 de julho de 2013. Por outro lado, na falta de fumus boni juris, a República Federal da Alemanha não pode invocar urgência.

71      A este respeito, há que concluir que o presente processo diz respeito à proteção da saúde das crianças que correm o risco de entrar em contacto com brinquedos que contêm metais pesados. Relativamente à fixação dos valores‑limite para a presença dos mesmos nos brinquedos, o artigo 114.°, n.° 4, TFUE prevê a possibilidade de manutenção das disposições nacionais justificadas por imperativos sérios, enumerados no artigo 36.° TFUE, isto é, por exigências relacionadas, entre outras, com a proteção da saúde das pessoas. Ao abrigo do artigo 191.°, n.os 1 e 2, TFUE, que visa, também ele, a proteção da saúde humana, a política a levar a cabo nesse domínio baseia‑se, nomeadamente, no princípio da precaução.

72      O princípio da precaução, que constitui um princípio geral do direito da União, permite às instituições desta que tomem medidas de proteção, quando subsistem incertezas quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde das pessoas, sem terem de esperar que a realidade e a gravidade dos riscos sejam plenamente demonstradas (v. despacho do juiz das medidas provisórias do Tribunal Geral de 28 de setembro de 2007, França/Comissão, T‑257/07 R, Colet., p. I‑4153, n.os 60, 61 e jurisprudência referida). As referidas instituições são mesmo obrigadas a tomar as medidas apropriadas com o objetivo de prevenir certos riscos potenciais para a saúde pública resultantes de um produto determinado, podendo limitar‑se a fornecer indícios sérios e concludentes, que, sem afastar a incerteza científica, permitam duvidar razoavelmente da inocuidade desse produto (acórdão do Tribunal Geral de 7 de março de 2013, Acino/Comissão, T‑539/10, n.os 63 e 66).

73      Ora, o juiz das medidas provisórias deve, também ele, ter em conta essas considerações baseadas no princípio da precaução e relativas à existência e à gravidade de riscos potenciais para a saúde quando é chamado a decidir a questão de saber se o ato jurídico em causa é, com grau de probabilidade suficiente, suscetível de causar danos graves e irreparáveis para a saúde. Em particular, não pode afastar esses danos como sendo puramente hipotéticos com a mera justificação de existirem incertezas científicas quanto aos eventuais riscos para a saúde.

74      No caso em apreço, com vista a examinar a urgência, há, em primeiro lugar, que ter em conta o facto de o Governo alemão ter provado a existência de fumus boni juris.

75      Em seguida, no que respeita aos valores‑limite aplicáveis ao bário e ao chumbo, a própria Comissão reconheceu, na decisão impugnada, que as disposições nacionais notificadas se justificavam por imperativos sérios de proteção da saúde; autorizou, portanto, a sua manutenção. Daqui resulta que o Governo alemão, que tinha o direito de apreciar a existência de um risco para a saúde pública, em princípio, de forma diferente da do legislador da União no âmbito da nova diretiva brinquedos (v., neste sentido, acórdão Dinamarca/Comissão, já referido, n.os 63 e 64), demonstrou com força jurídica bastante, que as suas disposições nacionais asseguram, à primeira vista, uma melhor proteção da saúde pública que as prescrições da nova diretiva brinquedos e que as mesmas não ultrapassam o que é necessário para alcançar esse objetivo.

76      Dado que as disposições nacionais asseguram, prima facie, para o bário e o chumbo, um nível de proteção mais elevado que o assegurado pela nova diretiva brinquedos, é possível concluir que as crianças a proteger seriam expostas a riscos suscetíveis de afetar a sua saúde de maneira grave e irreparável se esse nível de proteção lhes fosse recusado. A Comissão, na medida em que alega que a nova diretiva brinquedos já assegura um nível de proteção elevado, de forma que o prejuízo causado pela diferença entre os dois níveis não é grave nem irreparável, coloca em questão a natureza e o âmbito do nível de proteção nacional, ainda que ela própria tenha atestado que as disposições nacionais em causa se justificavam por «imperativos sérios de proteção da saúde». Em todo o caso, esta argumentação, contraditória em si, intervém pouco a propósito atendendo à «renacionalização» da política de saúde, cujo princípio é reconhecido no artigo 114.°, n.° 4, TFUE.

77      De resto, tendo em conta o princípio da precaução, afigura‑se imperativo que se qualifiquem de graves e irreparáveis os danos para a saúde que o contacto com metais pesados, como o bário e o chumbo, seria suscetível de causar, a fortiori quando o grupo de risco que se pretende proteger é o das crianças que manipulam os brinquedos. A argumentação apresentada pelo Governo alemão para provar a urgência (v. n.° 69 supra) deve, pois, ser acolhida.

78      O mesmo é válido igualmente para os valores‑limite aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio, ainda que a Comissão não tenha reconhecido que as disposições nacionais que lhes dizem respeito se justificam por imperativos sérios de proteção da saúde. Com efeito, nada permite excluir que, após análise aprofundada, o juiz do mérito responda às questões complexas que o Governo alemão suscitou a este respeito (v. n.° 65 supra) no sentido de que também as disposições nacionais em causa aplicáveis ao antimónio, ao arsénio e ao mercúrio asseguram um nível de proteção superior ao que a nova diretiva brinquedos instituiu, pelo que as crianças a proteger seriam expostas a riscos de danos graves e irreparáveis para a sua saúde caso esse nível de proteção lhes fosse recusado. Embora não seja certo que o juiz do mérito decida efetivamente nesse sentido, essa incerteza não permite ao juiz das medidas provisórias, tendo em conta o princípio da precaução, negar a existência de um risco de danos graves e irreparáveis para a saúde, tanto mais que o Governo alemão apresentou argumentos sérios e convincentes, que lançam a dúvida sobre o nível de proteção assegurado pela nova diretiva brinquedos (v. n.° 61 supra) e que a própria Comissão admitiu, no que respeita ao material raspado do brinquedo, que os valores‑limite nacionais notificados eram inferiores aos que impõe a referida diretiva.

79      Resulta do exposto que o Governo alemão demonstrou, com força jurídica bastante, a urgência que existia em decretar a medida provisória requerida.

 Quanto à ponderação dos interesses

80      Segundo jurisprudência assente, a ponderação dos vários interesses em presença consiste no dever de o juiz das medidas provisórias determinar se o interesse da parte que as requer em obter que sejam decretadas prevalece ou não sobre o interesse que reveste a aplicação imediata do ato controvertido, examinando, mais especificamente, se a eventual anulação deste ato pelo juiz do mérito permitirá a inversão da situação que será provocada pela sua execução imediata e, inversamente, se a suspensão do referido ato será suscetível de constituir um obstáculo à sua plena eficácia, caso seja negado provimento ao recurso no processo (v., neste sentido, despachos do presidente do Tribunal Geral de 18 de março de 2011, Westfälisch‑Lippischer Sparkassen‑ und Giroverband/Comissão, T‑457/09 R, não publicado na Coletânea, n.° 69, e de 16 de novembro de 2012, Akzo Nobel e o./Comissão, T‑345/12 R, n.° 24 e jurisprudência referida).

81      No caso em apreço, tendo o Governo alemão demonstrado tanto a urgência do seu pedido de medidas provisórias quanto a existência de um fumus boni juris, há que reconhecer‑lhe um interesse legítimo em obter a medida provisória que requer.

82      Em seguida, o referido governo observa, acertadamente, que o decretar de uma medida provisória seguido da improcedência do recurso principal atentaria, por certo, contra o interesse ligado à aproximação das legislações no mercado interno, na aceção das disposições conjugadas do artigo 114.°, n.° 1, TFUE e do artigo 26.° TFUE, mas que o inconveniente que daí resultaria para o mercado interno deve ser considerado como relativamente menor. Com efeito, os valores‑limite previstos pelas disposições nacionais notificadas, idênticos aos da antiga diretiva brinquedos, já são conhecidos e estabelecidos desde há decénios no setor do brinquedo, pelo que podem ser aplicados e respeitados sem dificuldade. Em todo o caso e sobretudo, este inconveniente para o mercado interno não é irreversível, mas apenas temporário, pelo facto de, após a decisão do mérito, os brinquedos poderem de novo ser importados e distribuídos. Em contrapartida, se o pedido de medidas provisórias for indeferido, mas o juiz do mérito viesse a dar provimento ao recurso, a saúde das crianças teria, entretanto, ficado exposta a um dano grave e irreversível.

83      É por esta razão que o interesse da Comissão em ver indeferido o pedido de medidas provisórias deve ceder perante o interesse do Governo alemão em que seja autorizada a manutenção das disposições nacionais notificadas, tanto mais que a medida provisória requerida mais não fará do que manter uma situação jurídica que existe desde 1988, manutenção essa que é concedida apenas por um período restrito. Com efeito, a fase escrita do processo T‑198/12 está encerrada desde 14 de dezembro de 2012, pelo que pode esperar‑se que o Tribunal Geral decida sobre o processo principal nos próximos meses.

84      Estando cumpridos todos os requisitos para que seja decretada a medida provisória requerida a título subsidiário, há que deferir o pedido correspondente.

Pelos fundamentos expostos,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

decide:

1)      A Comissão Europeia autorizará a manutenção das disposições nacionais notificadas pela República Federal da Alemanha relativas aos valores‑limite para o antimónio, o arsénio, o bário, o chumbo e o mercúrio presentes nos brinquedos até que o Tribunal Geral tenha decidido o processo principal.

2)      O pedido de medidas provisórias é indeferido quanto ao restante.

3)      Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Feito no Luxemburgo, em 15 de maio de 2013.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Jaeger


** Língua do processo: alemão.