Language of document : ECLI:EU:C:2003:274

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

JEAN MISCHO

apresentadas em 13 de Maio de 2003 (1)

Processos apensos C-317/01 e C-369/01

Eran Abatay e o.

contra

Bundesanstalt für Arbeit (C-317/01)

e

Nadi Sahin, Internationale Transporte,

contra

Bundesanstalt für Arbeit (C-369/01)

[pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Bundessozialgericht (Alemanha)]

«Associação CEE-Turquia - Interpretação dos artigos 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional e 13.° da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação - Eliminação das restrições à livre circulação de trabalhadores, à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços - Cláusulas de standstill - Alcance - Nova legislação que exige uma autorização de trabalho no sector dos transportes rodoviários internacionais»

Índice

     I - Enquadramento jurídico

I - 3

         A - Associação CEE-Turquia

I - 3

         B - A legislação nacional

I - 5

     II - Matéria de facto e os litígios no processo principal

I - 6

         A - Processo C-317/01

I - 6

         B - Processo C-369/01

I - 7

     III - Apreciação das questões prejudiciais

I - 8

         A - A primeira questão prejudicial no processo C-317/01

I - 8

             1.    Entendimento do órgão jurisdicional de reenvio e argumentos apresentados no Tribunal de Justiça

I - 9

             2.    Apreciação

I - 12

         B - A segunda questão colocada no processo C-317/01 e a terceira questão colocada no processo C-369/01

I - 14

             1.    Posições do órgão jurisdicional de reenvio e das partes que apresentaram observações

I - 15

             2.    Apreciação

I - 17

         C - A vertente b) da terceira questão prejudicial colocada no processo C-317/01 e a da primeira questão prejudicial colocada no processo C-369/01

I - 20

             1.    Posição dos órgãos jurisdicionais de reenvio e argumentos apresentados no Tribunal de Justiça

I - 21

             2.    Apreciação

I - 23

                 a)    O artigo 41.°, n.° 1, é aplicável em matéria de transportes? Estamos perante medidas que se inserem nesse sector?

I - 23

                 b)    Quanto à existência de uma nova restrição à livre prestação de serviços

I - 28

                     i)    Os transportes são efectuados em nome e sob a responsabilidade de uma empresa turca

I - 28

                     -    A empresa turca efectua os transportes com os seus próprios camiões e os seus próprios motoristas

I - 28

                     -    A empresa turca efectua os transportes com os seus próprios motoristas mas com camiões que são propriedade de uma empresa alemã e que estão matriculados na Alemanha

I - 29

                     ii)    Os transportes são efectuados em nome e sob a responsabilidade de uma empresa alemã

I - 31

                     -    Os motoristas turcos são directamente contratados pela empresa alemã

I - 31

                     -    Os motoristas turcos são contratados e remunerados por uma empresa turca

I - 34

         D - A terceira questão alínea a) submetida no processo C-317/01 e a primeira questão alínea a) submetida no processo C-369/01

I - 38

         E - Segunda questão submetida no processo C-369/01

I - 40

     IV - Conclusão

I - 41

1.
    A sétima e a décima primeira secções do Bundessozialgericht submeteram ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais relativas à interpretação do artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional ao Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia de 1963, assinado em 23 de Novembro de 1970 (2), e do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação, adoptada pelo Conselho de Associação instituído pelo acordo acima referido (3).

I - Enquadramento jurídico

A - Associação CEE-Turquia

2.
    O Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia (a seguir «acordo») foi assinado em 12 de Setembro de 1963 em Ancara pela República da Turquia, por um lado, e os Estados-Membros da CEE e a Comunidade, por outro, e concluído, aprovado e confirmado em nome da Comunidade pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de Dezembro de 1963, relativa à conclusão do acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia (4).

3.
    Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, o acordo tem por objecto promover o reforço contínuo e equilibrado das relações comerciais e económicas entre as partes contratantes incluindo no âmbito da mão-de-obra, pela realização progressiva da livre circulação de trabalhadores (artigo 12.°), bem como pela eliminação das restrições à liberdade de estabelecimento (artigo 13.°) e à livre prestação de serviços (artigo 14.°).

4.
    O artigo 6.° do acordo prevê a criação de um Conselho de Associação que age nos limites das atribuições que lhe são conferidas pelo acordo.

5.
    O artigo 12.° do acordo prevê:

«As partes contratantes acordam em inspirar-se nos artigos 48.°, 49.° e 50.° do Tratado que institui a Comunidade na realização progressiva entre si da livre circulação de trabalhadores.»

6.
    O artigo 14.° do acordo estabelece:

«As partes contratantes acordam inspirar-se nos artigos 55.°, 56.° e 58.° a 65.° inclusive do Tratado que institui a Comunidade para eliminar entre si as restrições à livre prestação de serviços.»

7.
    Nos termos do artigo 22.°, n.° 1, do acordo:

«1.    Para a realização dos objectivos fixados pelo acordo e nos casos por ele previstos, o Conselho de Associação dispõe de poder de decisão. Cada uma das Partes deve tomar as medidas necessárias à execução das [decisões] tomadas. [...]»

8.
    O Protocolo Adicional, já referido, contém um título II, que tem por epígrafe «Circulação de pessoas e de serviços» cujo capítulo I visa «Os trabalhadores» e o capítulo II é consagrado ao «Direito de estabelecimento, serviços e transportes». Estabelece, no artigo 36.°, que se insere no capítulo I, os prazos da realização gradual da livre circulação de trabalhadores entre os Estados-Membros da Comunidade e a República da Turquia, em conformidade com os princípios enunciados no artigo 12.° do acordo e estipula, no segundo parágrafo da referida disposição, que o Conselho de Associação decidirá as modalidades necessárias para tal efeito.

9.
    Nos termos do artigo 41.° do Protocolo Adicional, que figura no título II, capítulo II, deste:

«1.    As partes contratantes abster-se-ão de introduzir, nas suas relações mútuas, novas restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços.

2.    O Conselho de Associação fixará, em conformidade com os princípios enunciados nos artigos 13.° e 14.° do Acordo de Associação, o calendário e as modalidades segundo os quais as partes contratantes suprimirão progressivamente, nas suas mútuas relações, as restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços.

O Conselho de Associação fixará este calendário e estas modalidades para as diferentes categorias de actividades, tendo em conta disposições análogas já adoptadas pela Comunidade nestes domínios, bem como a situação especial da Turquia no plano económico e social. Será dada prioridade às actividades que contribuam de modo especial para o desenvolvimento da produção e das trocas comerciais.»

10.
    Em 19 de Setembro de 1980, o Conselho de Associação adoptou a Decisão n.° 1/80.

11.
    O artigo 6.° da Decisão n.° 1/80 institui, a favor dos trabalhadores turcos, um sistema de acesso progressivo ao emprego que lhes permite, após um ano de emprego regular, a renovação da sua autorização de trabalho para a mesma entidade patronal, após três anos, sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados-Membros da Comunidade, a exercer uma actividade dentro da mesma profissão, respondendo a outra proposta de emprego e, após quatro anos, aceder livremente a qualquer actividade assalariada da sua escolha. O n.° 3 prevê que as modalidades de aplicação do artigo são fixadas pelas legislações nacionais.

12.
    O artigo 8.°, n.° 1, prevê que «quando, na Comunidade, uma oferta de emprego não possa ser satisfeita por recurso à mão-de-obra disponível no mercado do trabalho dos Estados-Membros e que, no âmbito das suas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas, os Estados-Membros decidem autorizar, para preencher esse lugar, o recurso a trabalhadores não nacionais de um Estado-Membro da Comunidade, esforçar-se-ão por dar prioridade aos trabalhadores turcos».

13.
    O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 que se insere no capítulo II, que tem por epígrafe «Disposições sociais», secção 1, com a epígrafe «Questões relativas ao emprego e à livre circulação de trabalhadores» está assim redigido:

«Os Estados-Membros da Comunidade e a Turquia não podem introduzir quaisquer novas limitações às condições de acesso ao mercado de trabalho relativamente aos trabalhadores e aos membros da sua família que se encontrem no seu território em situação regular no que se refere à residência e ao emprego.»

B - A legislação nacional

14.
    Nos termos do § 9 do Verordnung über die Arbeitserlaubnis für nichtdeutsche Arbeitnehmer (regulamento sobre autorizações de trabalho para trabalhadores não alemães, a seguir «AEVO»), de 2 de Março de 1971 (BGBl. I, p. 152), na versão em vigor em 1 de Janeiro de 1973,

«Não necessitam de autorização de trabalho [...]

2.    os trabalhadores que efectuam transporte internacional de passageiros e de mercadorias [...] no caso de empresas com sede no território de aplicação deste regulamento.»

15.
    O décimo regulamento que altera o AEVO, adoptado e que entrou em vigor em 1 de Setembro de 1993 (BGBl. I, p. 1527), deu nova redacção ao § 9, n.° 2, limitando a dispensa de autorização de trabalho para os trabalhadores que efectuam o transporte internacional de passageiros e de mercadorias «no caso de entidades patronais com sede no estrangeiro».

16.
    Em 30 de Setembro de 1996 (BGBl. I, p. 1491), foi dada nova redacção ao § 9, n.° 2, do AEVO, cujo texto na versão aplicável a partir de 10 de Outubro de 1996 é o seguinte:

«2.    os trabalhadores que efectuam o transporte internacional de passageiros e de mercadorias por conta de entidades patronais com sede no estrangeiro, na medida em que

a)    o veículo está registado no Estado de estabelecimento da entidade patronal;

[...]»

17.
    O § 9, n.° 3, do Verordnung über die Arbeitsgenehmigung für ausländische Arbeitnehmer (regulamento sobre autorizações de trabalho para trabalhadores estrangeiros, a seguir «ArGV»), de 17 de Setembro de 1998 (BGBl. I, p. 2899), que substituiu o AEVO, retomou sem alteração o conteúdo do § 9, n.° 2, do AEVO.

II - Matéria de facto e os litígios no processo principal

A - Processo C-317/01

18.
    E. Abatay, A. Balikci, I. Birer e R. Günes (a seguir «E. Abatay e o.») são nacionais turcos que residem na Turquia e trabalham como motoristas rodoviários, efectuando principalmente transportes internacionais de mercadorias. São trabalhadores da sociedade Baqir Dis Tic. Ve Paz. Ltd St, com sede em Mersin (Turquia, a seguir «Baqir Ltd»), filial da sociedade Baqir GmbH, com sede em Stuttgart (Alemanha). A Baqir Ltd e a Baqir GmbH importam para a Alemanha frutos e produtos hortícolas provenientes na sua maioria das suas próprias culturas. As mercadorias são transportadas da Turquia para a Alemanha em camiões registados na Alemanha no nome de Baqir GmbH e conduzidos designadamente por E. Abatay e o.

19.
    Após a entrada em vigor da nova regulamentação, o Bundesanstalt für Arbeit (Serviço Federal de Emprego) tinha ainda emitido, a título transitório, uma autorização de trabalho dos motoristas válida até 30 de Setembro de 1996; contudo, depois dessa data, recusou-se a emitir novas autorizações.

20.
    E. Abatay e o. recorreram para o Sozialgericht Nürnberg que declarou que os recorrentes no processo principal não têm necessidade de autorização de trabalho. Esta decisão foi confirmada em sede de recurso pelo Bayerisches Landessozialgericht. Estes dois órgãos jurisdicionais entenderam, no essencial, que a restrição imposta pela nova regulamentação alemã, que exige a E. Abatay e o. que sejam titulares de uma autorização, era contrária à cláusula de standstill do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80.

21.
    O Bundesanstalt für Arbeit interpôs para o Bundessozialgericht um recurso de «Revista» que contesta a interpretação dada pelo órgão jurisdicional de 2.a instância ao artigo 13.° da Decisão n.° 1/80.

22.
    A décima primeira secção do Bundessozialgericht a quem foi submetido este pedido questiona, no seu despacho de reenvio, se a dispensa de autorização de trabalho que os ora recorridos pretendem não poderá resultar do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 ou do artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional. Com efeito, as alterações do AEVO, que entraram em vigor em 1 de Setembro de 1993 e em 10 de Outubro de 1996, podem ser consideradas novas restrições ao acesso ao emprego na acepção do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 ou novas restrições à livre prestação de serviços na acepção do artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional.

23.
    A esse propósito, não há dúvida que essas disposições são directamente aplicáveis nos Estados-Membros, mas o seu alcance suscita vários problemas.

24.
    Reproduziremos mais adiante as questões prejudiciais que a décima primeira secção nos submeteu a este propósito, bem como o essencial dos comentários que sobre o mesmo assunto desenvolveu.

B - Processo C-369/01

25.
    Nadi Sahin, antigo cidadão turco que após 1991 adquiriu a nacionalidade alemã, explora a empresa de transportes «Sahin Internationale Transporte» em Göppingen (Alemanha). É igualmente proprietário de uma filial desta última, a Anadolu Dis Ticaret AS (a seguir «Anadolu AS»), com sede em Istambul (Turquia). A empresa de Göppingen é proprietária de vários camiões, que utiliza nos transportes internacionais Alemanha/Turquia/Irão/Iraque; todos esses camiões estão matriculados na Alemanha. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio existe entre a firma alemã de N. Sahin e a filial turca «contrato de agência» nos termos do qual a Anadolu AS utiliza os camiões de N. Sahin no transporte internacional de mercadorias.

26.
    O documento intitulado «contrato de agência» («Agenturvertrag») que se acha nos autos enviados pelo órgão jurisdicional de reenvio limita-se, no entanto, a especificar que a filial turca está autorizada a «carregar e descarregar os nossos veículos bem como os das empresas de transporte utilizadas por nós, e proceder às formalidades aduaneiras e outras formalidades administrativas com as mesmas relacionadas» («ist berechtigt, unsere Fahrzeuge sowie die Fahrzeuge der von uns eingesetzten Transportunternehmer zu ent- und beladen, die damit im Zusammenhang stehenden zollamtlichen und behördlichen Tätigkeiten vorzunehmen»).

27.
    O órgão jurisdicional de reenvio observa igualmente que, já antes de 1 de Setembro de 1993, N. Sahin tinha admitido cerca de 17 trabalhadores como motoristas dos camiões matriculados na Alemanha. Esses trabalhadores são nacionais turcos que vivem na Turquia e que celebraram os seus contratos de trabalho antes dessa data com a Anadolu AS. Para cada trajecto na Alemanha era emitido um visto alemão passado pelo consulado geral competente. A sétima secção acrescenta, entretanto, que não foram até ao momento efectuadas as verificações necessárias para determinar a entidade patronal dos motoristas.

28.
    Por requerimento de 29 de Maio de 1996, N. Sahin requereu ao tribunal que declarasse que os trabalhadores em questão ficavam dispensados de autorização de trabalho para a sua actividade. Obteve do Sozialgericht Ulm um despacho de medidas provisórias, proferido em 9 de Dezembro de 1996, declarando que o Bundesanstalt für Arbeit estava obrigado a conceder as autorizações de trabalho aos motoristas aguardando uma decisão final no processo quanto ao mérito.

29.
    Contudo, na decisão de mérito proferida em 10 de Fevereiro de 1998, o Sozialgericht Ulm concluiu que os 17 motoristas em questão estavam dispensados da autorização de trabalho.

30.
    Ao recurso interposto pelo Bundesanstalt für Arbeit foi negado provimento por acórdão de 27 de Julho de 2000, do Landessozialgericht Baden-Württemberg, que se baseou, no essencial, no artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional para considerar que a situação jurídica aplicável a 1 de Janeiro de 1973 continua a ser relevante.

31.
    O Bundesanstalt für Arbeit interpôs recurso de revista deste acórdão, alegando, designadamente, violação do § 9, n.° 2, do AEVO.

32.
    N. Sahin pede que seja negado provimento a esse recurso uma vez que, quer o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional, quer o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 contêm uma cláusula de standstill que proíbe a criação de novas restrições em matéria de autorização de trabalho dos trabalhadores turcos.

33.
    A sétima secção do Bundessozialgericht questiona o alcance do artigo 41.° do Protocolo Adicional, as relações entre este e o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 bem como o alcance desta última disposição. É no sentido de resolver estes problemas que este órgão jurisdicional submeteu várias questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça.

III - Apreciação das questões prejudiciais

34.
    Reconhecendo que o modo como as questões prejudiciais foram agrupadas e reformuladas pela Comissão é judiciosa, preferimos, pela nossa parte, ater-nos ao texto destas.

A - A primeira questão prejudicial no processo C-317/01

35.
    Esta questão está redigida nos termos seguintes:

«1)    O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 [...] deve ser interpretado no sentido de que proíbe que um Estado-Membro da União adopte disposições nacionais que, comparadas com as normas em vigor em 1 de Dezembro de 1980, introduzam de modo geral novas restrições ao acesso dos trabalhadores turcos ao emprego, ou a proibição prevista no artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 de introdução de novas restrições refere-se apenas à data da primeira estadia e do primeiro emprego regulares do trabalhador?»

1.    Entendimento do órgão jurisdicional de reenvio e argumentos apresentados no Tribunal de Justiça

36.
    O órgão jurisdicional de reenvio observa que a redacção do artigo 13.° milita a favor da interpretação segundo a qual a proibição, prevista no artigo 13.°, de introduzir novas restrições se refere unicamente à data em que a residência e o emprego do trabalhador no território do Estado em causa são pela primeira vez regularizados, não à data em que a disposição era pela primeira vez aplicável. Esta interpretação do artigo 13.° não se impõe, no entanto, absolutamente.

37.
    E. Abatay e o. entendem a primeira questão no processo C-317/01 no sentido que o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 proíbe, em termos abstractos, a adopção de qualquer disposição que sujeite a uma nova restrição o acesso ao emprego ou se esta disposição pretende fixar como critério da situação de partida, para cada caso concreto, a data da primeira residência e do primeiro emprego regular do trabalhador.

38.
    Argumentam que o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 proíbe a introdução de novas disposições nacionais relativas ao acesso ao emprego que sejam mais restritivas do que as aplicáveis quando da entrada em vigor desse artigo. Com efeito, entendem que a condição enunciada nesta disposição, ao exigir que os nacionais turcos se encontrem no território do Estado-Membro de acolhimento em situação regular quanto à sua residência e ao seu emprego, teria como único sentido impedir as pessoas que residem ou trabalhem ilegalmente num Estado-Membro de invocarem os direitos previstos nesse artigo.

39.
    Por outro lado, E. Abatay e o. contestam a relevância para a solução do litígio da questão de saber se os recorrentes no processo principal, ora recorridos, tinham já residência regular no Estado-Membro em causa ou se ocupavam aí regularmente um emprego à data da entrada em vigor da nova regulamentação nacional. Ora, o emprego e a residência no Estado-Membro são regulares desde que cumpram as prescrições legais e regulamentares desse Estado (5). Portanto, o emprego dos recorrentes no processo principal era regular antes da alteração do AEVO com efeitos a 10 de Outubro de 1996 e cabia no âmbito de protecção do artigo 13.° Por conseguinte não há que responder à primeira questão.

40.
    E. Abatay e o. invocam, além disso, a título subsidiário, o artigo 6.° da Decisão n.° 1/80 que confere ao trabalhador turco pertencente ao mercado regular de trabalho de um Estado-Membro, o benefício, nesse Estado-Membro, após quatro anos de trabalho regular, de livre acesso a qualquer actividade assalariada da sua escolha.

41.
    No entender de N. Sahin, proprietário de uma empresa de transportes internacionais, ora recorrido e recorrente na causa principal no processo C-369/01, o princípio de standstill impõe-se logo desde a entrada em vigor, em 20 de Dezembro de 1976, da Decisão n.° 2/76 que precedeu a Decisão n.° 1/80 e que, relativamente aos trabalhadores, continha no seu artigo 7.° uma decisão comparável ao artigo 13.° desta última decisão. A interpretação desses artigos (defendida pelo Bundesanstalt für Arbeit bem como pelos Estados-Membros), de acordo com a qual a proibição de introduzir novas restrições no acesso ao emprego se refere à data da primeira residência e do primeiro emprego regulares dos trabalhadores em causa, é paradoxal, uma vez que uma pessoa que está já no mercado de trabalho de um Estado-Membro já não tem necessidade de beneficiar de uma regra que proíbe que seja tornado mais restritivo o acesso ao emprego.

42.
    Para N. Sahin, a interpretação que propõe encontra-se confirmada pela redacção do artigo 13.° Os membros da família favorecidos por este artigo não têm, manifestamente, ainda trabalho, senão estariam já numa situação de vantagem enquanto trabalhadores. Esta regulamentação favorece portanto também as pessoas à procura de emprego ainda não contratadas. Uma pessoa que exerce uma actividade não tem necessidade de ter acesso ao mercado de trabalho uma vez que já o obteve. A disposição em causa pretende favorecer o acesso ao mercado de trabalho, de modo que, relativamente à aplicação da cláusula, pouco importa o momento do primeiro emprego ocupado de modo regular. O elemento decisivo também não é a data da primeira residência em situação regular, limitando-se a disposição em questão a consagrar uma evidência, a saber, que uma residência ilegal não dá, em caso algum, acesso a direitos em matéria de emprego (6).

43.
    O Governo alemão considera que a proibição de introduzir novas restrições, inscrita no artigo 13.° da Decisão n.° 1/80, opera a partir da data da primeira residência e do primeiro emprego regular dos trabalhadores em causa no Estado-Membro de acolhimento. Entende que esta análise é corroborada pela comparação com o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional. Enquanto esta disposição reveste alcance geral o teor do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 tem um alcance mais limitado, visando unicamente os trabalhadores e os membros da sua família com residência regular.

44.
    Para o Governo alemão, esta conclusão estaria igualmente em consonância com o objectivo do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80. Esta não pretende regulamentar duravelmente a livre circulação de trabalhadores entre a Turquia e os Estados-Membros, mas unicamente assegurar a consolidação progressiva da situação dos trabalhadores turcos que regularmente acederam ao mercado de trabalho num Estado-Membro. Cada trabalhador deve poder estar seguro de que não serão lesados os seus direitos existentes no momento da sua entrada no território. Este objectivo de consolidação da Decisão n.° 1/80 não afecta, no entanto, o poder das autoridades nacionais de controlar a entrada de nacionais turcos no território do Estado-Membro em causa e o seu primeiro trabalho nesse Estado. A mesma lógica está subjacente ao artigo 6.° da Decisão n.° 1/80.

45.
    O Governo francês subscreve largamente o ponto de vista do Governo alemão. Para o Governo francês, o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 não visa regulamentar duravelmente a livre circulação de trabalhadores entre a Turquia e os Estados-Membros, mas pretende simplesmente assegurar a consolidação progressiva da situação dos trabalhadores turcos que regularmente acederam ao mercado de trabalho num Estado-Membro. Este objectivo de consolidação da Decisão n.° 1/80 não afecta, no entanto, o poder das autoridades nacionais de controlar a entrada dos nacionais turcos no território do Estado-Membro em causa e o primeiro emprego nesse Estado. A mesma lógica está subjacente ao artigo 6.° da Decisão n.° 1/80.

46.
    O Governo neerlandês sustenta que o próprio texto do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 indica que a proibição que estabelece se refere unicamente aos trabalhadores «regulares» já em actividade. A obrigação de standstill apenas diz respeito, efectivamente, aos trabalhadores já admitidos no mercado de trabalho. Ao invés, este artigo não regulamenta as condições de primeira admissão desses trabalhadores. Os Estados-Membros mantêm o poder de adoptar novas restrições no que se refere à primeira admissão ao mercado de trabalho, mas não podem introduzir essas mesmas restrições afectando os trabalhadores já admitidos no mercado.

47.
    Tal resulta também de uma leitura sistemática do artigo 13.° com outras disposições da mesma decisão. Assim, os artigos 6.°, 7.°, 8.°, 9.°, 10.° e 11.° da Decisão n.° 1/80 incluem sempre referências ao «mercado regular de trabalho» ou ao «trabalho regular», mas não existe qualquer referência à admissão ao próprio mercado de trabalho.

48.
    Esta interpretação é, além disso, confirmada pela jurisprudência constante (v., designadamente, acórdãos Tetik (7), n.° 21, e Savas (8), n.° 58), segundo a qual os Estados-Membros mantêm competência para regulamentar o primeiro acesso ao mercado de trabalho. Existe contradição entre esta conclusão e a proibição feita aos Estados-Membros, a partir da entrada em vigor da Decisão n.° 1/80, de introduzir novas restrições relativas ao primeiro acesso ao mercado de trabalho.

49.
    A Comissão lembra que «a Decisão n.° 1/80 não confere [...] direito à livre circulação dos trabalhadores turcos. No estado actual do direito que regula a Associação CEE-Turquia, a fixação das condições de acesso ao território de um Estado-Membro da União Europeia continua a caber exclusivamente na esfera desse Estado. Os trabalhadores apenas beneficiam dos direitos conferidos pela Decisão n.° 1/80 uma vez admitidos no mercado de trabalho de um Estado-Membro».

2.    Apreciação

50.
    É certamente justa a observação da Comissão, bem como são as correspondentes tomadas de posição dos governos dos Estados-Membros.

51.
    No acórdão Savas, já referido, o Tribunal de Justiça declarou, aliás, o seguinte:

«58    [...] as disposições relativas à associação CEE-Turquia não colidem com a competência dos Estados-Membros de regulamentar tanto a entrada no seu território de nacionais turcos como as condições do seu primeiro emprego, limitando-se a regular a situação dos trabalhadores turcos já regularmente integrados (9) no mercado de trabalho dos Estados-Membros (v., designadamente, acórdão de 23 de Janeiro de 1997, Tetik, C-171/95, Colect., p. I-329, n.° 21).

59    Seguidamente, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente decidido que, contrariamente aos cidadãos dos Estados-Membros, os trabalhadores turcos não têm o direito de circular livremente no interior da Comunidade, apenas beneficiando de certos direitos no Estado-Membro de acolhimento em cujo território entraram legalmente e exerceram um emprego regular durante um período determinado (v., designadamente, acórdão Tetik, já referido, n.° 29).»

52.
    O acórdão Savas refere-se, em termos globais, «às disposições relativas à associação CEE-Turquia».

53.
    Não pode portanto interpretar-se o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 em sentido diferente, por exemplo, aceitando apenas a primeira parte do artigo («Os Estados-Membros da Comunidade e a Turquia não podem introduzir quaisquer novas limitações às condições de acesso ao mercado de trabalho relativamente aos trabalhadores e aos membros da sua família») deixando de lado a segunda parte («que se encontrem no seu território em situação regular no que se refere à residência e ao emprego»).

54.
    Também não é admissível sustentar, como fazem os recorrentes no processo principal, ora recorridos, que nenhuma nova restrição pode ser introduzida após 1 de Dezembro de 1980 no que se refere aos trabalhadores turcos que não se encontrem no território de um Estado-Membro nessa data, mas que essas restrições apenas são permitidas relativamente aos trabalhadores turcos que aí se encontrem em situação irregular.

55.
    Propomos, por conseguinte, que se considere que, mesmo após 1 de Dezembro de 1980, os Estados-Membros podem ainda introduzir novas restrições no que se refere à entrada no seu território de trabalhadores turcos que aí pretendam obter um trabalho assalariado.

56.
    Contudo, por força do artigo 13.°, essas restrições não podem afectar os trabalhadores que já adquiriram legalmente um trabalho e um direito de residência no Estado-Membro em questão em qualquer momento anterior à introdução dessas novas restrições.

57.
    Estes continuam a beneficiar na íntegra dos direitos previstos no artigo 6.° (ou, para os membros da sua família, artigo 7.°) (10).

58.
    O acórdão Kurz (11) lembrou o que se deve entender por trabalhador e por «integração no mercado regular de emprego».

59.
    A expressão «condições de acesso ao emprego» que figura no artigo 13.° só pode, com efeito, referir-se aos direitos nascidos por força do artigo 6.°

60.
    Recordemos que se trata de um direito do trabalhador, após um ano de trabalho regular, de obter a renovação da sua autorização de trabalho na mesma entidade patronal, se este último dispõe ainda de trabalho, do direito de optar, após três anos, na mesma profissão, por outra entidade patronal e o de aceder, após quatro anos de trabalho regular, a qualquer actividade assalariada da sua escolha.

61.
    Como foi observado pelos Governos alemão, francês e neerlandês, o artigo 13.° tem unicamente por objectivo a consolidação (de acordo com o disposto nos artigos 6.° e 7.°) da situação dos trabalhadores turcos que tiveram acesso regular ao mercado de trabalho.

62.
    Poder-se-á objectar talvez que, nessas condições, o artigo 13.° é supérfluo, uma vez que, por força do princípio pacta sunt servanda já se proíbe aos Estados-Membros atingir direitos adquiridos pelos trabalhadores ao abrigo dos artigos 6.° e 7.° (12).

63.
    Pensamos, no entanto, que esta disposição tem efeito útil no sentido de que confirma o direito dos trabalhadores em situação regular de não serem atingidos por novas restrições que, aliás, os Estados-Membros têm sempre a possibilidade de introduzir.

64.
    Ao procurar dar um efeito útil mais amplo ao artigo 13.° contrariar-se-á a sua redacção e a interpretação que o Tribunal de Justiça deu no acórdão Savas «das disposições relativas à associação CEE-Turquia».

65.
    Propomos, por isso, que se responda à primeira questão colocada no processo C-317/01 do seguinte modo:

«O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 [...] deve ser interpretado no sentido de que, quando um Estado-Membro introduz, em qualquer momento, após 1 de Dezembro de 1980, novas restrições no acesso ao emprego dos trabalhadores turcos, estas não se podem aplicar aos trabalhadores turcos que, no momento em que essas restrições entram em vigor, se encontram já no seu território em situação regular no que se refere à residência e ao emprego.»

B - A segunda questão colocada no processo C-317/01 e a terceira questão colocada no processo C-369/01

66.
    O texto destas questões, que chama a nossa atenção para a situação específica dos motoristas turcos de transportes internacionais é mais ou menos idêntico. Impõem uma apreciação comum e uma resposta comum. A redacção respectiva é a seguinte:

Processo C-317/01:

«O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 [...] aplica-se igualmente a trabalhadores assalariados na Turquia que, como camionistas que efectuam transportes internacionais de mercadorias, atravessam regularmente um Estado-Membro da União sem pertencerem ao mercado regular de trabalho desse Estado-Membro?»

Processo C-369/01:

«O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 [...] aplica-se igualmente a trabalhadores turcos ao serviço de uma entidade patronal com sede na Turquia que, como motoristas do transporte internacional de mercadorias, atravessam regularmente um Estado-Membro da Comunidade sem pertencerem ao mercado (regular) de trabalho desse Estado-Membro?»

1.    Posições do órgão jurisdicional de reenvio e das partes que apresentaram observações

67.
    Relativamente a estas questões parece-nos indicado citar o modo como o problema foi colocado pela décima primeira secção do Bundessozialgericht (órgão jurisdicional de reenvio no processo Abatay e o.), exposição para a qual remete a sétima secção.

68.
    A décima primeira secção refere o seguinte:

«[...] É duvidoso que o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 seja igualmente aplicável a trabalhadores como os recorrentes, que estão empregados na Turquia e apenas atravessam um Estado-Membro (a Alemanha), enquanto pessoal rodoviário que efectua transportes internacionais de mercadorias, sem pertencer ao respectivo mercado de trabalho regular (segunda questão).

Para saber se um trabalhador pertence a um mercado regular de trabalho, há que determinar se a relação de trabalho pode ser localizada no território do Estado-Membro ao qual está vinculada de modo suficientemente estreito, para o que é necessário ter em consideração em especial o local de contratação do nacional turco, o território no qual ou a partir do qual a actividade é exercida e as disposições nacionais do direito do trabalho e da segurança social (acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de Junho de 1995, Bozkurt, C-434/93, Colect., p. I-1475, p. 1507 e segs.; de 30 de Setembro de 1997, Günaydin, C-36/96, Colect., p. I-5143; de 30 de Setembro de 1997, Ertanir, C-98/96, Colect., p. I-5179, SozR 3-6935 Allg n.° 3). Nos termos destes critérios, trabalhadores como os recorrentes, que trabalham como motoristas na Turquia, não pertencem em qualquer caso ao mercado regular de trabalho alemão (13) dado que - pode presumir-se no presente processo - são pagos na Turquia e estão sujeitos à legislação turca do trabalho e da segurança social.

A localização sistemática do artigo 13.°, na secção 1 do capítulo II da Decisão n.° 1/80 (‘Questões relativas ao emprego e à livre circulação dos trabalhadores’), bem como de outras disposições desta secção (em especial os artigos 6.°, 7.°, 10.° e 11.°), apontam para a interpretação segundo a qual o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 apenas visa os trabalhadores que pertencem ao mercado regular de trabalho de um Estado-Membro [...]. O facto de o trabalho de camionistas estrangeiros, que apenas em medida restrita tem a ver com o território alemão, não estar sujeito ao disposto na secção 1 do capítulo II da Decisão n.° 1/80 e, assim, também não ao artigo 13.°, pode resultar designadamente da circunstância de as disposições da referida secção terem por objecto a integração progressiva dos trabalhadores turcos e dos membros da sua família no mercado de trabalho; o direito a iniciar um novo trabalho e, consequentemente, o de residir no território do Estado em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1990, Sevince, já referido; de 16 de Dezembro de 1992, Kus, C-237/91, Colect., p. I-6781) são tanto mais importantes quanto um emprego regular tenha sido exercido prévia e continuamente durante mais tempo. Há dúvidas quanto à possibilidade de transpor adequadamente estes direitos para os camionistas que entram sempre no território de um Estado por um período limitado para o abandonarem em seguida. Assim, o facto de ter um emprego permanente numa entidade patronal estrangeira - necessário segundo o direito alemão para beneficiar da dispensa de autorização de trabalho - mostra claramente que camionistas como os recorrentes em nada procuram uma integração progressiva que se consolide no mercado de trabalho alemão razão, aliás, pela qual os recorrentes não podem invocar o artigo 6.° da Decisão n.° 1/80 (livre acesso ao emprego após ter trabalhado no mercado regular de trabalho).

A limitação do âmbito de aplicação do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 aos trabalhadores que pertencem ao mercado regular de trabalho não se impõe, porém, de modo absoluto, como mostra o ponto de vista adoptado pelo Landessozialgericht. Esta Secção não subscreve, porém, a sua argumentação no sentido de que a protecção pretendida pelo artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 deve igualmente alargar-se a trabalhadores turcos empregados nos transportes internacionais, pelo facto de, em casos como o presente, o mercado de trabalho nacional só estar em causa de modo marginal e de uma interpretação restritiva da cláusula de standstill não ser, por isso, adequada. Isto teria por efeito limitar as possibilidades dos Estados-Membros e da Turquia de lutar eficazmente contra os abusos que prejudicam os respectivos mercados de trabalho e económico, sem que isso seja necessário. Além disso, há dúvidas de que em casos como o presente o mercado de trabalho alemão seja apenas marginalmente afectado, quando - como afirmou o recorrido perante o órgão jurisdicional que conheceu do mérito da causa - o emprego de motoristas de países com baixos salários para conduzirem veículos matriculados na Alemanha pode ter por consequência que não sejam admitidos motoristas desempregados residentes na Alemanha.»

69.
    Por seu turno E. Abatay e o. alegam que o emprego e a residência num Estado-Membro são regulares desde que cumpram as prescrições legais e regulamentares desse Estado (14). Neste sentido o emprego dos recorrentes era regular antes da alteração da regulamentação alemã.

70.
    A particularidade de o centro de gravidade de actividade dos recorrentes não se situar no território de um Estado-Membro não os pode prejudicar. Nos termos do artigo 13.°, seria, pelo contrário, nas suas modalidades concretas que um emprego seria protegido, independentemente de saber se este é ou não internacional.

71.
    Os recorrentes contestam igualmente o argumento de acordo com o qual apenas as actividades sujeitas ao direito de trabalho e ao direito social de um Estado-Membro (isto é as que se relacionam com o mercado de trabalho «regular» de um Estado-Membro) seriam protegidas.

72.
    Por seu turno, o Governo alemão entende que o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 não se aplica a motoristas que são assalariados na Turquia e que efectuam, a partir deste país, transportes internacionais de mercadorias, uma vez que não pertencem ao «mercado regular de trabalho» do Estado-Membro em causa.

73.
    A favor desta análise milita a colocação sistemática do artigo 13.° na secção 1 do capítulo II «Questões relativas ao emprego e à livre circulação de trabalhadores», a relação de concorrência com outras disposições desta secção, em especial, os artigos 6.°, 7.°, 10.° e 11.°, bem como o objectivo de integração gradual dos trabalhadores turcos e dos membros da sua família no mercado de trabalho.

74.
    Não existe, no caso presente, nenhum dos pontos de conexão enunciados no já referido acórdão Bozkurt.

75.
    Para a Comissão, a cláusula de standstill do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 não se opõe à adopção de uma regulamentação nacional que suprime a dispensa da autorização de trabalho de que beneficiavam anteriormente os motoristas que trabalhavam para uma entidade patronal estabelecida na Turquia e que realizavam transportes internacionais de mercadorias com camiões matriculados no Estado-Membro em causa. Com efeito, tais trabalhadores não apresentavam uma conexão suficientemente estreita com o território desse Estado-Membro.

2.    Apreciação

76.
    Resulta do texto das duas questões, bem como dos comentários dos órgãos jurisdicionais de reenvio que estes já chegaram à conclusão que os trabalhadores turcos em questão não pertencem ao mercado regular de trabalho alemão, uma vez que não se verificam os critérios de conexão definidos no acórdão Bozkurt (15).

77.
    As duas questões em análise traduzem-se pois em questionar se as pessoas cuja relação de trabalho não possui um vínculo de conexão estreito com o Estado-Membro podem, não obstante, invocar o artigo 13.°

78.
    Uma resposta afirmativa a esta questão supõe, antes de mais, que o conceito de «trabalhador [...] que se encontra [...] em situação regular no que se refere à residência e ao emprego» que consta do artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 tem um sentido diferente da de «trabalhador integrado no mercado regular de trabalho de um Estado-Membro» que consta do artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, dessa decisão, ou da de «emprego regular» que consta em cada um dos travessões desse mesmo número.

79.
    Ora, não nos parece possível dar um sentido diferente a estes conceitos quase idênticos consoante se encontrem num ou noutro artigo da mesma secção da decisão.

80.
    Por outro lado importa observar que no acórdão Bozkurt o Tribunal de Justiça utilizou diferentemente, relativamente ao artigo 6.° os conceitos de «existência de um emprego regular» (n.° 25), «regularidade do emprego» (n.° 26), «carácter regular de um emprego» (n.os 27 e 29), «nacionais turcos já regularmente integrados no mercado de trabalho» (n.° 30), «existência de um emprego regular» (n.° 31).

81.
    Considerou, portanto, manifestamente que as expressões utilizadas no artigo 6.° e no artigo 13.° eram sinónimas.

82.
    O acórdão Bozkurt merece ainda ser citado por outra razão. No n.° 31 deste acórdão o Tribunal de Justiça declarou com efeito que, no caso de um trabalhador turco que, para o exercício da sua actividade profissional, não era obrigado, em aplicação da legislação nacional considerada, a estar na posse de uma autorização de trabalho nem de uma autorização de residência emitida pelas autoridades do país de acolhimento, a existência de um emprego regular «pode considerar-se provada». Resulta do contexto que o Tribunal de Justiça pretendeu dizer «por outros meios».

83.
    Mas, quanto aos elementos de prova com o auxílio dos quais pode ser demonstrada a existência de um emprego regular, apenas encontrámos neste acórdão os três critérios já citados, a saber, o local de contratação, o território a partir do qual a actividade assalariada é exercida e a legislação aplicável em matéria de direito do trabalho e da segurança social.

84.
    Ora, os órgãos jurisdicionais de reenvio informam-nos precisamente que, «[n]os termos destes critérios, trabalhadores como os recorrentes, que trabalham como motoristas na Turquia, não pertencem em qualquer caso ao mercado de trabalho regular alemão dado que - pode presumir-se no presente processo - são pagos na Turquia e estão sujeitos à legislação turca do trabalho e da segurança social».

85.
    Decorre, portanto, do n.° 31 do acórdão Bozkurt que, na hipótese em que a legislação de um Estado-Membro não exige a posse de uma autorização de trabalho, não resulta que os trabalhadores se encontrem automaticamente, como sustentam os recorrentes no processo principal, ora recorridos, numa situação regular quanto ao emprego na acepção do artigo 13.°

86.
    Alguns poderiam, entretanto, ser tentados a afastar completamente os argumentos literais expostos acima, bem como a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao vínculo de conexão suficientemente estreito para procurar uma solução ad hoc para o problema dos motoristas turcos em questão baseando-se nos seguintes elementos:

-    os motoristas exerceram a sua actividade de acordo com a regulamentação alemã até ao momento em que foi instituída nova regulamentação mais restritiva;

-    tinha-lhes sido atribuído, durante um determinado período, uma autorização de trabalho e o Estado-Membro considerava-os como integrando o seu mercado de trabalho;

-    conduzem camiões matriculados na Alemanha;

-    encontram-se de qualquer forma, numa situação especial porque «apenas em medida restrita têm a ver com o território alemão» e «em nada procuram uma integração progressiva que se consolide no mercado de trabalho alemão» (de acordo com as expressões utilizadas pelos órgãos jurisdicionais de reenvio).

87.
    Entendemos, no entanto, que tal abordagem não pode ser admitida.

88.
    Deve ser afastado, imediatamente, o facto de os motoristas em questão conduzirem camiões matriculados na Alemanha.

89.
    No processo Bozkurt, já referido, tratava-se igualmente de um motorista turco que conduzia um camião matriculado nos Países Baixos, mas tal não impediu o Tribunal de Justiça de fixar outros critérios (16). No acórdão Lopes da Veiga (17), o Tribunal de Justiça referiu, é certo, o facto de esta pessoa, de nacionalidade portuguesa, exercer a sua actividade num navio registado nos Países Baixos, mas assinalou ao órgão jurisdicional nacional cinco outras «circunstâncias» a ter em consideração para apreciar se a relação laboral do requerente tinha um vínculo de conexão suficientemente estreito com o território neerlandês para justificar a concessão de uma autorização de residência, a saber, o facto de o requerente trabalhar ao serviço de uma sociedade armadora de direito neerlandês estabelecida nos Países Baixos; o ter sido contratado nos Países Baixos, a relação laboral que o vinculava ao seu empregador estar sujeita à lei neerlandesa, o interessado estar segurado ao abrigo do regime da segurança social nos Países Baixos e aí estar também sujeito ao imposto sobre o rendimento.

90.
    O facto de, no decurso do período anterior, os motoristas turcos se encontrarem em conformidade com a legislação alemã, em nosso entender, não pode também justificar uma solução ad hoc.

91.
    Com efeito, os motoristas turcos beneficiam de um regime especial que a República Federal da Alemanha concedia a todos os motoristas de transportes internacionais e não unicamente aos motoristas de nacionalidade turca.

92.
    Quanto à autorização de trabalho, a mesma apenas lhes foi concedida a título transitório, para permitir à empresa a adaptação à nova regulamentação.

93.
    Por todas estas razões, propomos ao Tribunal de Justiça que responda, do seguinte modo, à segunda questão colocada no processo C-317/01 e à terceira questão colocada no processo C-369/01:

«O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 não se aplica aos trabalhadores turcos que estão ao serviço de uma entidade patronal com sede na Turquia e que, enquanto motoristas que efectuam transportes internacionais de mercadorias, atravessam regularmente um Estado-Membro da Comunidade sem pertencerem ao mercado regular de emprego desse Estado-Membro.»

C - A vertente b) da terceira questão prejudicial colocada no processo C-317/01 e a da primeira questão prejudicial colocada no processo C-369/01

94.
    O texto destas questões é sensivelmente idêntico. Estas impõem uma apreciação e uma resposta comuns. A sua respectiva redacção é a seguinte:

Processo 317/01

«O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional [...] deve ser interpretado no sentido de que

[...]

b)    se está perante uma nova restrição à livre prestação de serviços também no caso de um Estado-Membro da União limitar, após a entrada em vigor do Protocolo Adicional, o acesso de trabalhadores turcos ao mercado de trabalho, tornando assim mais difícil a participação das empresas turcas que empregam esses trabalhadores na livre prestação de serviços?»

Processo C-369/01

«O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional [...] deve ser interpretado no sentido de que:

[...]

b)    se está perante uma restrição à livre prestação de serviços também no caso de um Estado-Membro da Comunidade derrogar uma isenção de autorização de trabalho, até então aplicável aos motoristas turcos no transporte internacional de mercadorias ao serviço de uma entidade patronal (turca) com domicílio na Turquia?»

1.    Posição dos órgãos jurisdicionais de reenvio e argumentos apresentados no Tribunal de Justiça

95.
    A décima primeira secção do Bundessozialgericht entende que não é claro que se esteja perante uma restrição à livre prestação de serviços na acepção do artigo 41.°, n.° 1, mesmo no caso de a introdução de uma medida como a referida tornar indirectamente mais difícil a participação das empresas que empregam esses trabalhadores na livre circulação de serviços.

96.
    A sétima secção do Bundessozialgericht questiona se, em termos gerais, as medidas do tipo das referidas no caso em apreço devem ser consideradas «restrições» na acepção do referido artigo 41.° Este órgão jurisdicional acrescenta que pode, no caso vertente, ser igualmente importante saber se a invocabilidade do artigo 41.° pelos trabalhadores pressupõe tratar-se de trabalhadores que trabalham unicamente para uma entidade patronal turca ou se uma outra entidade patronal (alemã) pode ser associada - de qualquer forma - à relação laboral. Em seu entender, uma medida não pode, liminarmente, ser considerada nova restrição se só afecta, negativamente, na qualidade de entidade patronal, um nacional alemão estabelecido na Alemanha; ora, o litígio visa saber se N. Sahin, que é nacional alemão desde 1991, tem possibilidades no futuro de recorrer a motoristas turcos dispensados da autorização de trabalho.

97.
    Os motoristas turcos, recorrentes no processo principal C-317/01 entendem que a exigência de autorização de trabalho para uma actividade que não a exigia no passado cria obstáculos à livre prestação de serviços das empresas de transporte turcos no território de um Estado-Membro.

98.
    Por seu turno N. Sahin considera que a livre prestação de serviços inclui a possibilidade, para a empresa, de utilizar o pessoal para exercer as suas actividade e que um maior rigor na regulamentação aplicável, como no caso vertente, seria susceptível de impedir o fornecimento da prestação de serviços, com violação do artigo 41.°, n.° 1, do protocolo. Para N. Sahin, numa óptica internacional, a actividade de uma empresa não consiste unicamente na intervenção do prestador de serviços mas igualmente na execução de uma actividade pelos seus trabalhadores.

99.
    N. Sahin procede a uma análise das características especiais do mercado no sector do tráfego internacional de mercadorias, designadamente para o Médio Oriente. Observa que os transportes internacionais de mercadorias de longa distância se apresentam, inevitavelmente, como uma actividade num mercado repartido entre empresas que estão sujeitas a regimes jurídicos diferentes e que, por esse facto, propõem aos seus colaboradores remunerações e prestações sociais diferentes em funções das condições de direito e de facto dos Estados em que estão inseridos. As empresas de países terceiros podem prever custos menores em matéria salarial, mas encontram sobretudo, no mercado de trabalho que lhes é acessível, mais pessoal que, tendo em conta as dificuldades económicas nacionais, está disposto a aceitar separar-se da família durante várias semanas e que dispõe de conhecimentos linguísticos necessários para as viagens até à Turquia ou mesmo em países como o Irão, a Jordânia ou o Egipto.

100.
    Por seu turno, o Governo alemão entende que o artigo 41.°, n.° 1, do protocolo não constitui obstáculo a uma alteração da regulamentação como a que está em causa no processo principal, revestindo as disposições da Associação CEE-Turquia em matéria de livre prestação de serviços um alcance mais limitado que as regras aplicáveis a esse respeito no quadro da União Europeia.

101.
    O Governo francês considera que as disposições relativas à livre prestação de serviços do artigo 41.°, n.° 1, não se aplicam a uma situação na qual uma empresa de transportes turca, filial de uma sociedade com sede na Alemanha, utiliza para efectuar os serviços de transporte entre a Turquia e a Alemanha veículos matriculados na Alemanha em nome da sociedade-mãe. Com efeito, como a empresa turca utilizou veículos matriculados na Alemanha, as autoridades deste Estado-Membro estariam no direito de considerar que os transportes internacionais em causa eram na realidade efectuados pela empresa-mãe alemã e que, por conseguinte, os motoristas turcos deveriam ser titulares de uma autorização de trabalho na Alemanha e que as disposições do artigo 41.°, n.° 1, do protocolo não se aplicariam a tal situação. De resto, conclui o Governo francês, qualquer outra interpretação permitiria às sociedades de transporte alemãs contornar a legislação alemã do direito de trabalho colocando veículos à disposição das suas filiais estabelecidas na Turquia para efectuar os transportes com destino à Alemanha.

102.
    O Governo neerlandês entende que o artigo 41.° do Protocolo Adicional não constitui o quadro de referência adequado para o caso vertente que se refere a serviços de transporte. No Tratado CE, esses serviços estão expressamente excluídos da livre prestação de serviços e tem um regime próprio. Também o Tribunal de Justiça tem reconhecido que as disposições sobre os serviços não são aplicáveis aos serviços de transporte (18). O artigo 42.° do Protocolo Adicional segundo o qual «[o] Conselho de Associação estenderá à Turquia [...] as disposições do Tratado aplicáveis aos transportes [...]», confirma a não aplicação aos transportes do regime geral relativo às prestações de serviços.

103.
    Mesmo admitindo que o artigo 41.° seja aplicável aos presentes processos, o Governo neerlandês entende que o artigo 41.°, n.° 1, deve ser interpretado de modo a não tornar ilusórias as competências dos Estados-Membros em matéria de livre circulação de trabalhadores. Com efeito, os Estados-Membros continuam a ter competência para regulamentar o acesso de cidadãos turcos quer ao seu território quer ao seu mercado de trabalho, tendo em vista a protecção da estabilidade dos seus mercados de emprego. Esta competência tornar-se-á ilusória se as medidas que os Estados-Membros podem adoptar no âmbito da circulação de trabalhadores forem proibidas no âmbito da livre prestação de serviços.

104.
    Ao invés, para a Comissão a cláusula de standstill enunciada no artigo 41.° do protocolo opõe-se à adopção de uma regulamentação nacional que suprime a dispensa de uma autorização de trabalho de que beneficiavam anteriormente os motoristas turcos que efectuavam transportes internacionais de mercadorias em camiões matriculados no Estado-Membro em causa. Com efeito, a obrigação de requerer uma autorização de trabalho para cada motorista - e, por maioria de razão, a recusa dessa autorização - constitui obstáculo à livre prestação de serviços.

105.
    A Comissão contesta também que estejam em causa, no presente caso serviços de transporte.

2.    Apreciação

106.
    Numa primeira parte examinaremos a tese do Governo neerlandês e, numa segunda, os outros argumentos debatidos no decurso da tramitação do processo no Tribunal de Justiça.

a)    O artigo 41.°, n.° 1, é aplicável em matéria de transportes? Estamos perante medidas que se inserem nesse sector?

107.
    Como acabámos de ver, o Governo neerlandês entende que o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional não é o quadro de referência adequado para o caso vertente, uma vez que a regulamentação em causa se insere no âmbito dos transportes. Ora, no Tratado CE, essas actividades estão expressamente excluídas da livre circulação de serviços. O artigo 61.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 51.°, n.° 1, CE) declara, com efeito, o seguinte:

«A livre prestação de serviços em matéria de transportes é regulada pelas disposições constantes do título relativo aos transportes.»

108.
    Já, nas relações entre Estados-Membros, não é portanto possível aplicar pura e simplesmente as disposições do Tratado em matéria de livre prestação de serviços no âmbito dos transportes.

109.
    No quadro das relações com a Turquia, os textos relevantes são os artigos 14.° e 15.° do Acordo de Associação e o artigo 42.° do Protocolo Adicional.

110.
    Nos termos do artigo 14.°, «as partes contratantes acordam em inspirar-se nos artigos 55.°, 56.° e 58.° a 65.° inclusive do Tratado que institui a Comunidade para eliminar entre si as restrições à livre prestação de serviços».

111.
    O artigo 61.° do Tratado figura portanto, nas disposições em que as partes contratantes se devem inspirar. Não é, por conseguinte, permitido proceder a um raciocínio por analogia que não tenha igualmente em conta este artigo.

112.
    Por seu turno, o artigo 15.° do Acordo de Associação, prevê o seguinte:

«As condições e regras de extensão à Turquia das disposições do Tratado que institui a Comunidade e dos actos adoptados em aplicação destas disposições no que diz respeito aos transportes serão estabelecidas tendo em conta a situação geográfica da Turquia.»

113.
    Por último, o artigo 42.°, n.° 1, do Protocolo Adicional está assim redigido:

«O Conselho de Associação estenderá à Turquia, de acordo com as modalidades que adopte, tendo em conta, nomeadamente, a situação geográfica da Turquia, as disposições do Tratado que institui a Comunidade aplicáveis aos transportes. Pode, nas mesmas condições, estender à Turquia os actos adoptados pela Comunidade em aplicação de tais disposições para os transportes ferroviários, rodoviários e por via navegável.»

114.
    Não temos conhecimento de nenhum acto do Conselho de Associação ter sido adoptado com base nessas disposições.

115.
    Perante esta situação alguns objectarão talvez que, embora a eliminação das restrições à livre prestação de serviços no âmbito dos transportes se deva fazer no quadro do alargamento da política comum dos transportes à Turquia, a cláusula de standstill aplica-se, contudo, a este sector.

116.
    No entanto não é esse o caso. Tal resulta claramente do acórdão do Tribunal de Justiça Corsica Ferries France (19), para o qual o Governo neerlandês chamou a nossa atenção.

117.
    Nesse processo tratava-se de uma taxa a cargo do armador cobrada a todos os passageiros embarcados, desembarcados ou transbordados em portos corsos. Os navios que assegurassem ligações entre a Córsega e os portos da França continental, só estavam sujeitos ao pagamento de taxas pelos passageiros à partida de um porto corso, enquanto os navios, que efectuassem trajectos entre a Córsega e portos situados noutro Estado estavam sujeitos à taxa à chegada e à partida do porto corso.

118.
    Nos n.os 14 e 15 do acórdão, o Tribunal de Justiça declarou o seguinte:

«14    [...] durante os anos de 1981 e 1982, período em causa no processo principal, a livre prestação de serviços no sector dos transportes marítimos ainda não estava realizada e consequentemente os Estados-Membros podiam aplicar disposições do tipo das que estão em causa no processo principal.

15    Esta conclusão não é afectada pelo facto de esta regulamentação ter sido reintroduzida no code des ports maritimes francês em 1981, após ter sido suprimida em 1969. Com efeito, o artigo 62.° do Tratado que proíbe aos Estados-Membros a introdução de novas restrições à liberdade efectivamente atingida, no que diz respeito à prestação de serviços, à data de entrada em vigor do Tratado, não é aplicável (20), tendo em conta o n.° 1 do artigo 61.° do mesmo Tratado».

119.
    É possível concluir, igualmente, que a cláusula de standstill do artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional não é de aplicar ao sector dos transportes.

120.
    Resta saber se a medida controvertida se insere neste sector.

121.
    A Comissão objecta que a legislação alemã controvertida nada tem a ver com os transportes uma vez que se trataria, na realidade, ou de uma colocação à disposição de motoristas, ou de uma locação de camiões. A ligação com o sector dos transportes não será mais directa do que seria a simples aquisição de um camião.

122.
    Entendemos, no entanto, que esta tese colide com sérias objecções.

123.
    Importa concluir, em primeiro lugar, que se, no caso do processo Corsica Ferries France, que acabamos de citar, o Tribunal de Justiça pôde concluir que uma taxa que não era cobrada aos passageiros que desembarcavam na Córsega provenientes da França Continental, sendo cobrada em todos os outros desembarques e embarques, se insere na política de transporte, também assim deve ser a fortiori no caso de uma disposição relativa ao «pessoal que trabalha no transporte internacional de passageiros e de mercadorias».

124.
    Não pode haver dúvidas de que a dispensa de autorização de trabalho prevista no regulamento alemão de 1971 derrogando o regime normalmente aplicável aos nacionais de países terceiros se justificava pelas especificidades dos transportes internacionais e, designadamente, pelo facto de o «pessoal rodoviário» não alemão se limitar a curtas permanências na Alemanha e não procurar a integração no mercado de trabalho local (21).

125.
    Por outras palavras, as pessoas em causa só beneficiam deste regime específico por estarem directamente inseridas numa actividade de transporte.

126.
    Em segundo lugar, o elemento que desencadeou o problema dos recorrentes no processo principal, ora recorridos, é o facto de, a partir de 1996, a dispensa de autorização de trabalho já não ser concedida nos casos em que o camião utilizado não estivesse matriculado no Estado de estabelecimento da entidade patronal mas na Alemanha. Ora, uma regulamentação que é aplicável atendendo ao local de matrícula dos camiões é, em nosso entender, abrangida no âmbito dos transportes.

127.
    Em terceiro lugar, importa tomar em consideração as implicações do Regulamento (CE) n.° 484/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 1 de Março de 2002, que altera os Regulamentos (CEE) n.° 881/92 e n.° 3118/93 do Conselho, com vista à introdução de um certificado de motorista (22).

128.
    O Regulamento (CEE) n.° 881/92 do Conselho, de 26 de Março de 1992, relativo ao acesso ao mercado dos transportes rodoviários de mercadorias na Comunidade efectuados a partir do ou com destino ao território de um Estado-Membro ou que atravessem o território de um ou vários Estados-Membros (23).

129.
    Este regulamento, bem como o Regulamento n.° 484/2002 baseiam-se no mesmo artigo 75.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 71.° CE) inserido no título relativo aos transportes (título IV, actual título V).

130.
    Na versão resultante do Regulamento n.° 484/2002, o Regulamento n.° 881/92 prevê, em resumo, no artigo 3.°, n.° 1, que os transportes internacionais são efectuados a coberto de uma licença comunitária, em conjunção com um certificado de motorista, quando o motorista for nacional de um país terceiro.

131.
    O artigo 3.°, n.° 3, do Regulamento n.° 881/92, que foi inserido pelo Regulamento n.° 484/2002, estabelece:

«3.    O certificado de motorista é emitido por um Estado-Membro [...] para qualquer transportador que:

-    seja titular de uma licença comunitária,

-    no referido Estado-Membro, empregue legalmente motoristas nacionais de um país terceiro, ou recorra a motoristas legalmente postos à sua disposição em conformidade com as condições de emprego e formação profissional dos motoristas fixadas nesse mesmo Estado-Membro (24):

    -    em disposições legislativas, regulamentares ou administrativas, ou

    -    em convenções colectivas, de acordo com as regras aplicáveis nesse Estado-Membro.»

132.
    Este regulamento não cria unicamente um certificado (que só é obrigatório a partir de 19 de Março de 2003), mas consagra igualmente o princípio de que os motoristas nacionais de países terceiros colocados à disposição de um transportador de um Estado-Membro devem ser utilizados de acordo com a lei, isto é, no respeito das condições de emprego fixadas por esse mesmo Estado-Membro para os motoristas que tenham a sua nacionalidade ou residam no seu território. Voltaremos mais à frente a este ponto.

133.
    Queremos sublinhar o facto de esta regulamentação ter sido adoptada com base no artigo 71.° CE. Daí decorre que uma regulamentação como a em questão no caso em apreço cabe igualmente no âmbito dos transportes.

134.
    Propomos portanto, a título principal, ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional não se aplica a uma regulamentação nacional que se insere no sector do transporte, do tipo da que está em causa nos processos principais.

135.
    É apenas a título subsidiário que apreciaremos os outros argumentos objecto da discussão e que partem da hipótese inversa.

b)    Quanto à existência de uma nova restrição à livre prestação de serviços

136.
    Importa recordar, antes de mais, em que consiste o princípio da livre prestação de serviços. De acordo com a redacção do artigo 50.° CE (ex-artigo 60.° do Tratado CE), «o prestador de serviços pode, para a execução da prestação, exercer, a título temporário, a sua actividade no Estado onde a prestação é realizada, nas mesmas condições que esse Estado impõe aos seus próprios nacionais».

137.
    Considerado conjuntamente com a cláusula de standstill, este princípio significa, em primeiro lugar, que a República da Turquia não deve poder opor novos obstáculos às actividades temporárias que as empresas alemãs de transporte pretendem efectuar na Turquia. No entanto um problema deste tipo não foi suscitado nos presentes processos.

138.
    Por seu turno, a República Federal da Alemanha não deve criar novos obstáculos às actividades que as empresas turcas de transporte rodoviário pretendem exercer na Alemanha.

139.
    Não está, no entanto, demonstrado se, nos litígios no processo principal, as prestações de transportes internacionais são efectuadas em nome e sob a responsabilidade das empresas turcas, filiais das sociedades alemãs ou sob a responsabilidade das próprias empresas alemãs. Devemos, por conseguinte, apreciar estas duas hipóteses.

i)    Os transportes são efectuados em nome e sob a responsabilidade de uma empresa turca

140.
    Nesse caso podemos distinguir duas hipóteses.

-    A empresa turca efectua os transportes com os seus próprios camiões e os seus próprios motoristas

141.
    Trata-se do caso típico de uma prestação de serviços de transporte transfronteiriço.

142.
    Ora, a República Federal da Alemanha não coloca qualquer obstáculo uma vez que confere dispensa à autorização de trabalho ao «pessoal em viagem que trabalha no transporte internacional [...] para entidades patronais com sede no estrangeiro desde que o veículo esteja matriculado no Estado da sede da entidade patronal» (25).

143.
    Importa no entanto notar que uma empresa turca que efectua transportes com os seus próprio camiões pode ter que enfrentar uma limitação do número de trajectos que pode efectuar anualmente. Os tratados bilaterais prevêem, com efeito, a maior parte das vezes, contingentes anuais. Tais limitações também existiram entre os Estados-Membros até à entrada em vigor do Regulamento n.° 881/92.

144.
    Em contrapartida, desde então, os proprietários dos camiões matriculados num Estado-Membro obtêm licenças que lhes permitem efectuar um número ilimitado de trajectos por ano. Tal pode explicar o atractivo que representa a utilização de tais camiões pelas empresas turcas.

-    A empresa turca efectua os transportes com os seus próprios motoristas mas com camiões que são propriedade de uma empresa alemã e que estão matriculados na Alemanha

145.
    Esta hipótese corresponde a uma das duas situações que, de acordo com a Comissão, se podem apresentar no caso em apreço, a saber, o de uma locação de camiões pela empresa alemã à empresa turca.

146.
    Neste caso, de acordo com a legislação alemã controvertida, os motoristas nacionais de países terceiros já não têm direito a uma dispensa de autorização de trabalho na Alemanha, porque o camião não está matriculado no Estado da sede da entidade patronal.

147.
    Na audiência o Governo alemão sublinhou que, bem antes da entrada em vigor do Protocolo Adicional, já as empresas estabelecidas em países terceiros não tinham autorização de efectuar transportes no território alemão se os seus camiões não fossem matriculados no país da sede. A República Federal da Alemanha não teria portanto, introduzido qualquer restrição nova quanto ao conteúdo dos direitos das empresas turcas, mas, mediante a técnica de autorização de trabalho conseguiu, passar a fazer respeitar melhor uma regra antiga frequentemente violada no passado.

148.
    Para o caso do Tribunal de Justiça não compartilhar a conclusão que propomos a título principal, compete, sendo o caso, aos órgãos jurisdicionais de reenvio verificar essa questão de facto que é, evidentemente, determinante.

149.
    No mesmo contexto cabe sublinhar que uma empresa de transportes alemã que coloca o seu camião à disposição de uma empresa turca com a correspondente licença viola o direito comunitário.

150.
    No recente acórdão Bourrasse e Perchicot (26), o Tribunal de Justiça, com efeito, confirmou que, mesmo no interior da Comunidade, a livre circulação de um camião alugado por uma empresa de um Estado-Membro a uma empresa estabelecida noutro Estado-Membro apenas é admitida em determinadas condições. E assim deve ser a fortiori quando a locação é feita por uma empresa de transportes estabelecida num Estado não membro.

151.
    Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou o seguinte:

«34    No que respeita às autorizações de transporte, importa recordar que, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1.°, n.° 1, e 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 881/92, é necessário uma licença comunitária para efectuar transportes rodoviários internacionais de mercadorias por conta de outrem no território da Comunidade e que, nos termos do artigo 5.°, n.os 1 e 2 do mesmo regulamento, essa licença é emitida pelas autoridades do Estado-Membro onde está estabelecida a empresa de transporte, que entregam ao titular da licença o original desta e o número de cópias autenticadas correspondente ao dos veículos de que o titular dispõe, incluindo os que detenha ao abrigo de um contrato de locação. Por conseguinte, não é ao locador mas ao locatário que cabe obter, junto das autoridades do Estado-Membro em que está estabelecido, a licença comunitária para veículos tomados de aluguer.

35    Além disso, nos termos do artigo 5.°, n.° 4, do Regulamento n.° 881/92, a licença comunitária é emitida em nome do transportador e este não a pode transferir para terceiros. Daqui decorre que, quando os veículos, originariamente utilizados por um transportador rodoviário titular de uma licença comunitária, são em seguida dados de aluguer a outro transportador rodoviário, o locador não pode fazer com que o locatário beneficie da sua própria licença comunitária.»

152.
    Na sequência dos fundamentos deste acórdão o Tribunal declara que, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Directiva 84/647/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1984, relativa à utilização de veículos de aluguer sem condutor no transporte rodoviário de mercadorias (27), na versão resultante da Directiva 90/398/CEE do Conselho, de 24 de Julho de 1990 (28), «os Estados-Membros devem aceitar a utilização no seu território dos veículos tomados de aluguer pelas empresas estabelecidas no território de outro Estado-Membro desde que, designadamente, os veículos estejam matriculados ou tenham sido postos em circulação em conformidade com a legislação do Estado-Membro em que o transportador locatário está estabelecido» (n.° 40 do acórdão).

153.
    O Governo francês recordou-nos, aliás, que os acordos celebrados pela Comunidade com países terceiros como a Hungria (29) prevêem igualmente que uma sociedade de transportes estabelecida na Hungria, que realiza prestações de serviços de transporte entre a Hungria e a Comunidade deve necessariamente utilizar veículos matriculados na Hungria.

154.
    Portanto verifica-se que se a relação jurídica nos litígios no processo principal era a de uma locação de camiões por uma empresa alemã a uma empresa turca - o que cabe aos órgãos jurisdicionais de reenvio apreciar - a utilização desses camiões por uma empresa turca no território alemão constitui uma prática ilegal.

155.
    Ora, o princípio da livre prestação de serviços não pode ser invocado em benefício de actividades ilegais e o facto de ser exigida uma autorização de trabalho alemã aos trabalhadores turcos que conduzem tais camiões não pode, por conseguinte, ser qualificada de restrição à livre prestação de serviços. O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional não é pura e simplesmente aplicável.

ii)    Os transportes são efectuados em nome e sob a responsabilidade de uma empresa alemã

156.
    Nesse caso, há que distinguir, no que se refere ao estatuto dos motoristas, duas hipóteses.

-    Os motoristas turcos são directamente contratados pela empresa alemã

157.
    Como resulta da segunda questão colocada no processo C-317/01 e da terceira questão colocada no processo C-369/01, os órgãos jurisdicionais de reenvio consideram que os trabalhadores turcos não pertencem ao mercado regular de trabalho alemão.

158.
    Nas suas explicações, a sétima secção do Bundessozialgericht declara, no entanto, que de momento «não está dada por assente a matéria de facto necessária para determinar quem é a entidade patronal dos motoristas». Seguidamente questiona se é importante «tratar-se unicamente de trabalhadores de uma entidade patronal turca ou se pode estar envolvida outra entidade patronal (alemã) - seja de que forma for - na relação laboral».

159.
    A este propósito, podemos lembrar que, de acordo com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a característica essencial da relação de trabalho é a circunstância de uma pessoa realizar durante um certo tempo, em favor de outrem e sob a sua direcção, prestações em contrapartida das quais recebe uma remuneração (30).

160.
    No caso em apreço, podemos admitir que os motoristas recebem, na realidade, o essencial das suas instruções das empresas alemãs, mas não foi dado a entender que seriam, também, remunerados por estas.

161.
    É portanto pouco verosímil que possam ser considerados assalariados das empresas alemãs. Todavia, como subsistem dúvidas, cabe-nos apreciar a hipótese de acordo com a qual os motoristas de nacionalidade turca seriam, na realidade, assalariados da empresa alemã.

162.
    Trata-se portanto de saber se o facto de as autoridades alemãs pedirem uma autorização de trabalho para os motoristas de nacionalidade turca constitui uma restrição à livre prestação de serviços em detrimento da empresa de transporte alemã se esta for a entidade patronal desses motoristas.

163.
    Somos de opinião que se deve responder negativamente a esta questão.

164.
    A esse respeito, cabe concluir que, na medida em que a exigência de uma autorização de trabalho, determinada pelas autoridades alemãs, atinge as empresas de transporte alemãs, a mesma pode, quando muito, na óptica da livre prestação de serviços, constituir um obstáculo à exportação de serviços por parte das referidas empresas.

165.
    Um obstáculo à exportação de serviços estava em causa no processo Corsica Ferries France, já referido. Antes de abordar a questão, tratada acima, da aplicação das disposições em matéria de livre prestação de serviços no âmbito do transporte, o Tribunal de Justiça declarou que «[...] a regulamentação francesa em causa no processo principal é susceptível de constituir uma restrição à livre prestação de serviços no interior da Comunidade, nos termos do primeiro parágrafo do artigo 59.° do Tratado CEE, na medida em que introduz uma discriminação entre o prestador de serviços que efectua transportes entre um porto situado no território nacional e um porto situado noutro Estado-Membro da Comunidade e o que efectua transportes entre dois portos situados no território nacional» (31).

166.
    No caso em apreço, a regulamentação alemã não opera, no entanto, uma discriminação. Quer a empresa alemã efectue transportes no interior da Alemanha, para outro Estado-Membro ou para a Turquia, a exigência de uma autorização de trabalho afecta estes transportes do mesmo modo.

167.
    Essa medida, decidida por um Estado-Membro, que atinge indistintamente a prestação, pelos seus nacionais, de serviços no interior de um Estado-Membro, por um lado, e a exportação por esses mesmos nacionais desses mesmos serviços para outro Estado-Membro ou, no caso vertente, para a Turquia, por outro, não constitui um obstáculo à livre prestação de serviços.

168.
    Com efeito, somos de opinião, que cabe aplicar por analogia a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à livre circulação de mercadorias.

169.
    A propósito do artigo 30.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 28.° CE), que se refere às restrições à importação, o Tribunal de Justiça declarou no n.° 5 do acórdão Dassonville (32) que «[q]ualquer regulamentação comercial dos Estados-Membros, susceptível de prejudicar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário, deve ser considerada uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas». Esta mesma definição ampla do conceito de entrave é válida para a livre prestação de serviços, tratando-se de importação de serviços, como resulta, designadamente, do n.° 29 do acórdão De Coster (33) segundo o qual «[...] o artigo 59.° do Tratado exige não só a eliminação de toda e qualquer discriminação contra o prestador de serviços estabelecido num outro Estado-Membro em razão da sua nacionalidade, mas também a supressão de toda e qualquer restrição, ainda que indistintamente aplicada a prestadores nacionais e de outros Estados-Membros, quando seja susceptível de impedir ou entravar mais as actividades do prestador estabelecido noutro Estado-Membro, onde preste legalmente serviços análogos (v. acórdãos de 25 de Julho de 1991, Säger, C-76/90, Colect., p. I-4221, n.° 12; de 9 de Agosto de 1994, Vander Elst, C-43/93, Colect., p. I-3803, n.° 14)».

170.
    Em contrapartida, a propósito do artigo 34.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 29.° CE), que se refere às restrições à exportação, o Tribunal de Justiça declarou no acórdão Groenveld (34) que «[...] esta disposição visa as medidas nacionais que tenham por objecto ou por efeito restringir em especial as correntes de exportação, estabelecendo assim uma desigualdade de tratamento entre o comércio interno de um Estado-Membro e o seu comércio externo, de forma a garantir uma vantagem especial à produção nacional ou ao mercado interno do Estado em causa, em detrimento da produção ou do comércio de outros Estados-Membros [...]» (35).

171.
    No mesmo sentido, uma regulamentação nacional só pode, em nosso entender, ser considerada um entrave à livre prestação de serviços se afectar a importação de serviços de modo diferente do que afecta a prestação dos mesmos serviços no interior do Estado-Membro.

172.
    Com efeito, outra interpretação teria como resultado que a mais pequena obrigação exigida por um Estado-Membro aos seus próprios nacionais, activos no mercado de serviços, constituiria um entrave à livre prestação de serviços, dado que cada um desses nacionais é um exportador potencial dos mesmos. Ora, essa tese não deixaria qualquer lugar a situações circunscritas ao interior de um Estado-Membro quando é jurisprudência constante que «[...] as disposições do Tratado relativas à livre prestação de serviços não podem aplicar-se às actividades em que todos os elementos se circunscrevem ao território de um único Estado-Membro [...]» (36).

173.
    Do que vem exposto resulta que o facto de as autoridades alemãs exigirem uma autorização de trabalho aos motoristas de nacionalidade turca não pode constituir um entrave às prestações de serviço transfronteiriças efectuadas pelas empresas de transporte alemãs de que os ditos motoristas seriam assalariados. O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional, não se aplica, portanto, na hipótese que acabámos de apreciar.

-    Os motoristas turcos são contratados e remunerados por uma empresa turca

174.
    Uma vez que partimos sempre da hipótese de uma operação de transporte que, em si mesma, se realiza sob responsabilidade da empresa alemã, estamos agora face a outro tipo de prestações de serviços que podemos qualificar de colocação dos motoristas à disposição. Trata-se da segunda hipótese que, de acordo com a Comissão, se pode apresentar no caso principal.

175.
    A empresa turca actuaria de algum modo como uma agência de trabalho temporário. Dizemos bem «de algum modo», porque se verificou, na audiência, que não existiam, no caso, nem contratos de colocação de motoristas à disposição, nem contratos de locação de camiões. Na opinião dos recorrentes no processo principal, a situação objectiva pode simplesmente ser analisada numa ou noutra óptica.

176.
    Trata-se portanto de saber se a supressão da dispensa de autorização de trabalho, conjugada com a recusa sistemática dessa autorização, cria uma restrição nova à livre prestação de serviços que consiste na colocação à disposição, por uma empresa turca a uma sociedade de transportes alemã, dos motoristas de nacionalidade turca.

177.
    A este propósito, o Governo alemão adiantou na audiência que, até 1972, existia na Alemanha uma proibição geral de colocação de trabalhadores à disposição (Leiharbeit) de uma empresa. Esta proibição foi posteriormente levantada em determinadas condições, no que concerne aos trabalhadores alemães e aos trabalhadores dos outros Estados-Membros. Foi mantida relativamente aos trabalhadores de países terceiros, incluindo os trabalhadores turcos.

178.
    Por conseguinte, entende o Governo alemão, uma vez que a colocação à disposição, por uma empresa turca para uma empresa alemã, dos trabalhadores turcos não era possível antes da entrada em vigor do Protocolo Adicional, não foi introduzida nenhuma restrição nova com a supressão da dispensa de autorização de trabalho e a recusa sistemática desta. Com efeito, mesmo quando uma autorização de trabalho não era exigida, a colocação dos trabalhadores turcos à disposição não era legal.

179.
    Se assim era, efectivamente, e caberá, ao órgão jurisdicional de reenvio verificá-lo, a questão de saber se a exigência de uma autorização de trabalho constitui uma restrição não chega sequer a colocar-se. Não vemos, com efeito, em que sentido a exigência de uma autorização de trabalho pode constituir uma restrição se a actividade em causa sempre foi proibida e assim se mantém.

180.
    A título subsidiário, a admitir que a colocação à disposição seja, apesar de tudo, admitida como princípio, coloca-se ainda a questão de saber se, concretamente, se trata de uma prestação de serviços que corresponde à definição dada no artigo 50.° CE.

181.
    É necessário, com efeito, questionar se a colocação à disposição de motoristas foi verdadeiramente efectuada «a título temporário» (de acordo com a expressão usada no artigo 50.° CE). Cabe, assim, aos órgãos jurisdicionais de reenvio proceder às análises de facto que se impõem.

182.
    Poderão remeter a esse propósito para o acórdão Gebhard (37), em que o Tribunal de Justiça declarou que «o carácter temporário das actividades em causa deve ser apreciado não apenas em função da duração da prestação, mas também em função da sua frequência, periodicidade ou continuidade».

183.
    A jurisprudência do Tribunal de Justiça permite também aos Estados-Membros oporem-se a pseudo-prestações de serviços. Assim, «[...] não se pode negar a um Estado-Membro o direito de tomar as medidas destinadas a impedir que a liberdade garantida pelo artigo 59.° seja utilizada por um prestador cuja actividade seja inteira ou principalmente dirigida para o seu território com vista a subtrair-se às regras que lhe seriam aplicáveis no caso de estar estabelecido no território do tal Estado [...]» (38).

184.
    Na mesma ordem de ideias, importa, igualmente, recordar o acórdão Rush Portuguesa (39), que declara:

«Deve esclarecer-se que, na medida em que o conceito de prestação de serviços tal como é definido no artigo 60.° do Tratado abrange actividades de natureza muito diferente, não se impõem as mesmas conclusões em todos os casos. Em particular, deve reconhecer-se, como foi alegado pelo Governo francês, que uma empresa de fornecimento de mão-de-obra, embora prestadora de serviços na acepção do Tratado, exerce actividades que têm precisamente por objecto fazer entrar trabalhadores no mercado de emprego do Estado-Membro de acolhimento. Nesse caso o artigo 216.° do acto de adesão opor-se-ia ao fornecimento de trabalhadores provenientes de Portugal por uma empresa prestadora de serviços.»

185.
    No caso em análise, a empresa turca não visa, é certo, fazer aceder os trabalhadores ao mercado de emprego alemão no sentido de uma integração nesse mercado, mas trata-se de uma situação bem próxima uma vez que se trata de conduzir camiões alemães seguindo as instruções de uma empresa alemã. Ora, como sublinhou o Governo neerlandês, o artigo 41.°, n.° 1, deve ser interpretado de modo a não eludir as competências que os Estados-Membros mantiveram para regulamentar o acesso dos nacionais turcos, quer ao seu território quer ao seu mercado de trabalho.

186.
    Por último, não podemos deixar de referir, neste contexto, a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual «[...] o direito comunitário não se opõe a que os Estados-Membros tornem a sua legislação ou as suas convenções colectivas de trabalho celebradas pelos parceiros sociais extensivas a toda e qualquer pessoa que efectue um trabalho assalariado, ainda que de carácter temporário, no seu território, seja qual for o país de estabelecimento do empregador; o direito comunitário também não proíbe aos Estados-Membros que imponham o respeito destas normas pelos meios adequados (acórdão de 3 de Fevereiro de 1982, Seco e Desquenne, 62/81 e 63/81, Recueil, p. 223)» (40).

187.
    A Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (41) prevê, por seu turno, que, no caso de destacamento de trabalhadores entre Estados-Membros, e independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, a esses trabalhadores são aplicáveis as condições de trabalho e de emprego, incluindo o salário mínimo que, no Estado-Membro no território do qual o trabalho é executado, são fixadas

-    por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas e/ou

-    pelas convenções colectivas.

O artigo 1.°, n.° 4 desta directiva estipula, por outro lado, que «[a]s empresas estabelecidas num Estado que não seja um Estado-Membro não podem beneficiar de um tratamento mais favorável do que as empresas estabelecidas num Estado-Membro».

188.
    Mesmo se estas regras se tornaram obrigatórias só a partir de 16 de Dezembro de 1999, nada impede um Estado-Membro de as aplicar voluntariamente, antes desta data. Com efeito, de acordo com a redacção da parte do acórdão Rush Portuguesa, citado acima, retomado palavra por palavra no décimo segundo considerando desta directiva, «o direito comunitário não impede que os Estados-Membros tornem o âmbito de aplicação da sua legislação extensivo».

189.
    Por último, importa lembrar mais uma vez o Regulamento n.° 484/2002, que consagra expressamente os mesmos princípios no âmbito dos transportes rodoviários.

190.
    Consequentemente, na medida em que a exigência de uma autorização de trabalho constitui um meio de verificar o cumprimento da legislação nacional em matéria de direito do trabalho e direito social, cumprimento que os Estados-Membros têm competência para impor, por força da jurisprudência e da legislação já referida, essa exigência parece-me igualmente justificada por uma razão imperiosa de interesse geral.

191.
    Lembramos, entretanto, que as reflexões anteriores foram desenvolvidas a título subsidiário. Propomos, portanto, responder à vertente b) da terceira questão submetida no processo C-317/01 e à primeira questão no processo C-369/01 que o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional no âmbito do transporte como o que está em causa nos processos principais.

D - A terceira questão alínea a) submetida no processo C-317/01 e a primeira questão alínea a) submetida no processo C-369/01

192.
    Estas questões, idênticas, requerem a mesma resposta. O teor é o seguinte:

«O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional [...] deve ser interpretado no sentido de que

a)    um trabalhador turco tem o direito de invocar uma restrição à livre prestação de serviços contrária ao protocolo

[...]?»

193.
    Os motoristas turcos entendem que podem invocar o artigo 41.°, n.° 1, do protocolo, uma vez que a medida constitui um obstáculo à livre prestação de serviços das empresas transportadoras turcas no território de um Estado-Membro e atinge, nessa medida, igualmente a posição jurídica dos trabalhadores das referidas empresas.

194.
    Para o Governo alemão e para a Comissão, o artigo 41.°, n.° 1, do protocolo não pode ser invocado pelos trabalhadores. No entender da Comissão, apenas a entidade patronal estabelecida na Turquia tem legitimidade para invocar num órgão jurisdicional nacional uma violação dessa disposição do Acordo de Associação CEE-Turquia. Tal direito não pertence nem aos trabalhadores turcos cuja entidade patronal está estabelecida na Turquia nem a uma empresa estabelecida num Estado-Membro em causa e ligada à entidade patronal turca por um contrato de serviços.

195.
    O Governo neerlandês entende, por seu turno, que resulta por analogia do acórdão Clean Car Autoservice (42) que uma disposição de efeito directo, como o artigo 41.° do protocolo, pode ser invocada não apenas pelos beneficiários directos dos direitos que confere (no caso, tratando-se de livre prestação de serviços, as entidades patronais), mas igualmente por outras pessoas e, em especial, pelos trabalhadores ao serviço das referidas entidades patronais.

196.
    O Governo francês tem dúvidas de que as considerações feitas pelo Tribunal de Justiça no acórdão Clean Car Autoservice (43) sejam transponíveis para o caso vertente e que um trabalhador, assalariado na Turquia, tenha legitimidade para invocar a cláusula de standstill em matéria de livre prestação de serviços que consta do Protocolo Adicional do acordo. Com efeito, por um lado, o direito comunitário não regulamenta as condições de contratação de trabalhadores na Turquia pelas entidades patronais desse país. Por outro, a contratação dos trabalhadores em questão pelas entidades patronais turcas não está necessariamente ligada à faculdade de estes últimos efectuarem prestações de serviços para a Comunidade. Considerando que o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional apenas visa a liberdade de estabelecimento e a livre prestação de serviços, e não o acesso ao emprego, o Governo francês entende que essa disposição diz respeito, em primeiro lugar, às empresas e não aos trabalhadores destas.

197.
    Já acima referimos que, em nosso entender, o artigo 41.°, n.° 1, não é aplicável em circunstâncias como as dos litígios no processo principal.

198.
    É, assim, unicamente a título subsidiário que examinaremos esta questão.

199.
    Resulta do acórdão Savas (44) que «o artigo 41.°, n.° 1, tem efeito directo nos Estados-Membros». Se fosse de aplicar em circunstâncias como as do litígio no processo principal, poderia portanto ser invocado por empresas turcas que colocam os motoristas à disposição de empresas alemãs.

200.
    Consideramos que poderia, além disso, igualmente ser invocado por esses motoristas.

201.
    No acórdão Clean Car Autoservice (45), o Tribunal de Justiça, com efeito, declarou que uma entidade patronal que pretende contratar um gerente domiciliado à época noutro Estado-Membro, podia invocar a regra da igualdade de tratamento em matéria de livre circulação de trabalhadores, consagrada no artigo 48.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 39.° CE) tal como o próprio gerente.

202.
    O Tribunal declarou, a esse propósito, que:

«20    [...] para ser útil e eficaz, o direito que os trabalhadores têm de ser contratados e empregados sem discriminação deve necessariamente ter como complemento o direito das entidades patronais de os contratarem, no respeito das regras em matéria de livre circulação dos trabalhadores.

21    Com efeito, estas regras poderiam facilmente ser votadas ao fracasso se bastasse aos Estados-Membros, para escaparem às proibições estabelecidas nas mesmas, imporem às entidades patronais, para efeitos de contratação de um trabalhador, as condições que este deve satisfazer e que, se lhe fossem directamente impostas, constituiriam restrições ao exercício do direito de livre circulação que o trabalhador pode invocar nos termos do artigo 48.° do Tratado».

203.
    Entendemos que um raciocínio análogo, que podemos qualificar de «imagem reflectida» do mesmo raciocínio, pode ser seguido quando um prestador de serviços está impossibilitado de efectuar uma actividade transfronteiriça devido aos obstáculos que são colocados ao exercício da actividade dos trabalhadores que emprega.

204.
    Parafraseando o acórdão Clean Car Autoservice, já referido, podemos com efeito dizer que, para ser útil e eficaz, o direito das empresas de fornecer serviços sem discriminação deve necessariamente ter como complemento o direito dos trabalhadores de executarem a missão que lhes é confiada no quadro de uma prestação de serviços. Com efeito, as disposições relativas à prestação de serviços poderiam facilmente ser votadas ao fracasso se bastasse aos Estados-Membros, para escaparem às proibições estabelecidas nas mesmas, imporem aos trabalhadores, para poderem exercer a sua actividade assalariada, condições que, se fossem directamente impostas às entidades patronais que os empregam, constituiriam restrições ao exercício do direito de livre prestação de serviços a que podem pretender.

205.
    No caso em apreço não nos encontramos, no entanto, numa situação intracomunitária. A livre prestação de serviços não é realizada entre a Comunidade e a Turquia. Por conseguinte, os trabalhadores turcos só podem invocar o direito que a sua entidade patronal tem de não lhe ser oposta uma nova restrição à prestação de serviços transfronteiras que ela pretenda efectuar.

206.
    Assim, propomos que se responda à questão submetida que o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional, admitindo que se pudesse aplicar em circunstâncias como as dos litígios no processo principal, deve ser interpretado no sentido de que um trabalhador turco tem o direito de invocar uma nova restrição criada a uma prestação de serviços que a sua entidade patronal pretende realizar.

E - Segunda questão submetida no processo C-369/01

207.
    Esta questão está assim redigida:

«A referida restrição afecta exclusivamente a livre prestação de serviços ou também o acesso ao mercado de trabalho, previstos no artigo 13.° da Decisão n.° 1/80, ou unicamente o referido acesso? [...]»

208.
    Resulta dos desenvolvimento precedentes, que nem o artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional, nem o artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 podem ser invocados no caso vertente. Não é pois necessário responder separadamente a esta questão.

209.
    Acrescentemos, a título de obiter dictum, que existe uma solução que evitaria que os motoristas turcos ficassem reduzidos ao desemprego e que as empresas alemãs não fossem obrigadas a recorrer a motoristas que não conhecem nem a língua turca nem os costumes locais. A solução consistiria em conceder a esses motoristas uma autorização de trabalho desde que sejam contratados por empresas alemãs de acordo com as regras do direito do trabalho e da segurança social alemã.

IV - Conclusão

210.
    Com base nas considerações anteriores, propomos ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões submetidas pela sétima e décima primeira secção do Bundessozialgericht:

1)    O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação adoptada pelo Conselho de Associação criado pelo Acordo de Associação CEE-Turquia de 1963, assinado em 23 de Novembro de 1970, deve ser interpretado no sentido de que, quando um Estado-Membro introduz, em qualquer momento após 1 de Dezembro de 1980, novas restrições no acesso ao emprego dos trabalhadores turcos, estas não se podem aplicar aos trabalhadores turcos que, no momento em que essas restrições entram em vigor, se encontrem já no território em situação regular no que se refere à residência e ao emprego.

2)    O artigo 13.° da Decisão n.° 1/80 do Conselho de Associação não se aplica aos trabalhadores turcos de uma entidade patronal com sede na Turquia e que, enquanto motoristas efectuam transportes internacionais de mercadorias, atravessando regularmente um Estado-Membro da Comunidade sem pertencerem ao mercado regular de emprego desse Estado-Membro.

3)    O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional anexo ao Acordo de Associação CEE-Turquia deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional integrada no sector dos transportes, do tipo da que está em questão nos litígios no processo principal.

4)    O artigo 41.°, n.° 1, do Protocolo Adicional, admitindo que se pudesse aplicar em circunstâncias como as dos litígios no processo principal, deve ser interpretado no sentido de que um trabalhador turco tem o direito de invocar uma nova restrição criada a uma prestação de serviços que a sua entidade patronal pretende realizar.


1: -     Língua original: francês.


2: -     O Protocolo Adicional foi concluído, celebrado e confirmado pelo Regulamento (CEE) n.° 2760/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 293, p. 1; EE 11 F1 p. 213).


3: -     A decisão de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação entrou em vigor em 1 de Julho de 1980. Não foi objecto de uma publicação no Jornal Oficial, mas pode ser consultada numa obra do Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias: Acordo de Associação e Protocolos CEE-Turquia e outros textos de base, Bruxelas, 1992.


4: -     JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18.


5: -     Acórdão de 26 de Novembro de 1998, Birden (C-1/97, Colect., p. I-7747).


6: -     V. acórdão de 20 de Setembro de 1990, Sevince (C-192/89, Colect., p. I-3461).


7: -     Acórdão de 23 de Janeiro de 1997 (C-171/95, Colect., p. I-329).


8: -     Acórdão de 11 de Maio de 2000 (C-37/98, Colect., p. I-2927).


9: -     Sublinhado nosso.


10: -     Sob reserva, contudo, da cláusula de salvaguarda do artigo 12.°, da Decisão n.° 1/80 que tem a seguinte redacção:

    «Quando um Estado-Membro da Comunidade ou a Turquia sofrer ou existir a ameaça de sofrer perturbações graves no seu mercado de emprego que podem implicar riscos graves no nível de vida ou de emprego numa região, ramo de actividade ou profissão, o Estado em causa pode não aplicar automaticamente as disposições dos artigos 6.° e 7.° O Estado em causa informa o Conselho de Associação dessa restrição temporária.»


11: -     Acórdão de 19 de Novembro de 2002 (C-188/00, Colect., p. I-0000, n.° 68).


12: -     Já referido na nota 11, n.° 68.


13: -     Sublinhado nosso.


14: -     V. acórdão Birden, já referido.


15: -     Já referido no n.° 68. Com efeito, a aplicação dos critérios do acórdão Bozkurt leva à conclusão que os motoristas pertencem ao mercado regular de trabalho da Turquia.


16: -     O n.° 3 do acórdão refere que no intervalo das suas viagens e durante as suas férias, este motorista residia nos Países Baixos.


17: -     Acórdão de 27 de Setembro de 1989 (9/88, Colect., p. 2989, n.° 17).


18: -     V. acórdão de 13 de Dezembro de 1989, Corsica Ferries France (C-48/89, Colect., p. 4441).


19: -     Já referido na nota 18.


20: -     Sublinhado nosso.


21: -     Nos Países Baixos, também os motoristas internacionais não são abrangidos pela política geral de estrangeiros. V. acórdão Bozkurt, já referido no n.° 68, n.os 4 e 5.


22: -     JO L 76, p. 1.


23: -     JO L 95, p. 1.


24: -     Sublinhado nosso.


25: -     § 9, n.° 2, do AEVO, na versão alterada, já referido no n.° 16.


26: -     Acórdão de 7 de Novembro de 2002 (C-228/01 e C-289/01, Colect., p. I-0000).


27: -     JO L 335, p. 72; EE 07 F3 p. 225.


28: -     JO L 202, p. 46.


29: -     Tal é também a interpretação que o advogado-geral Van Gerven deu desta regulamentação nas conclusões relativas ao segundo processo Corsica Ferries, acórdão de 17 de Maio de 1994 (C-18/93, Colect., p. I-1783, n.° 25).


30: -    V., designadamente, acórdãos de 3 de Julho de 1986, Lawrie-Blum (66/85, Colect., p. 2121, n.os 16 e 17); de 12 de Maio de 1998, Martínez Sala (C-85/96, Colect., p. I-2691, n.° 32); de 8 de Junho de 1999, Meeusen (C-337/97, Colect., p. I-3289); e Kurz, já referido.


31: -     N.° 7 do acórdão já referido na nota 18, sublinhado nosso.


32: -     Acórdão de 11 de Julho de 1974 (8/74, Recueil, p. 837, Colect., p. 423).


33: -     Acórdão de 29 de Novembro de 2001 (C-17/00, Colect., p. I-9445).


34: -     Acórdão de 8 de Novembro de 1979 (15/79, Recueil, p. 3409, n.° 7).


35: -     Sublinhado nosso. V., também, designadamente, acórdãos de 7 de Fevereiro de 1984, Jongeneel Kass (237/82, Recueil, p. 483, n.° 22); de 9 de Junho de 1992, Delhaize e Le Lion (C-47/90, Colect., p. I-3669, n.° 12); e de 10 de Novembro de 1992, Exportur (C-3/91, Colect., p. I-5529, n.° 21).


36: -     Acórdão de 18 de Março de 1980, Debauve e o. (52/79, Recueil, p. 833, n.° 9). V. também acórdãos de 23 de Abril de 1991, Höfner e Elser (C-41/90, Colect., p. I-1979, n.° 37), e de 17 de Junho de 1997, Sodemare e o. (C-70/95, Colect., p. I-3395, n.° 38).


37: -     Acórdão de 30 de Novembro de 1995 (C-55/94, Colect., p. I-4165, n.° 27).


38: -     Acórdão de 3 de Dezembro de 1974, Van Binsbergen (33/74, Colect. 1974, p. 543, n.° 13). V. também acórdãos de 27 de Setembro de 1989, Van de Bijl (130/88, Colect., p. 3039, n.° 26); de 16 de Dezembro de 1992, Comissão/Bélgica (C-211/91, Colect., p. I-6757, n.° 12); de 3 de Fevereiro de 1993, Veronica Omroep Organisatie (C-148/91, Colect., p. I-487, n.° 12); e de 5 de Outubro de 1994, TV10 (23/93, Colect., p. I-4795, n.° 20).


39: -     Acórdão de 27 de Março de 1990 (C-113/89, Colect., p. I-1417, n.° 16).


40: -     Acórdão Rush Portuguesa, já referido na nota 39, n.° 18. V., também, acórdão Vander Elst, já referido no n.° 169, n.° 23.


41: -     JO 1997, L 18, p. 1.


42: -     Acórdão de 7 de Maio de 1998 (C-350/96, Colect., p. I-2521).


43: -     Já referido na nota 42.


44: -     Já referido na nota 8.


45: -     Já referido na nota 42.