Language of document : ECLI:EU:C:2011:573

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

13 de Setembro de 2011 (*)

«Directiva 2000/78/CE – Artigos 2.°, n.° 5, 4.°, n.° 1, e 6.°, n.° 1 – Proibição das discriminações relacionadas com a idade – Pilotos de linha – Convenção colectiva – Cláusula de cessação automática dos contratos de trabalho aos 60 anos»

No processo C‑447/09,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Bundesarbeitsgericht (Alemanha), por decisão de 17 de Junho de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 18 de Novembro de 2009, no processo

Reinhard Prigge,

Michael Fromm,

Volker Lambach

contra

Deutsche Lufthansa AG,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, J.‑C. Bonichot, K. Schiemann, D. Šváby, presidentes de secção, R. Silva de Lapuerta, E. Juhász, P. Lindh (relatora), M. Berger, A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: P. Cruz Villalón,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 8 de Março de 2011,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de R. Prigge, M. Fromm e V. Lambach, por E. Helmig e J. Rodríguez Nieto, Rechtsanwälte,

–        em representação da Deutsche Lufthansa AG, por K. Streichardt e C. Kremser‑Wolf, Rechtsanwältinnen,

–        em representação do Governo alemão, por J. Möller e C. Blaschke, na qualidade de agentes,

–        em representação da Irlanda, por D. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por D. Keane, SC,

–        em representação da Comissão Europeia, por J. Enegren e V. Kreuschitz, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 19 de Maio de 2011,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 2.°, n.° 5, 4.°, n.° 1, e 6.°, n.° 1, da Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional (JO L 303, p. 16).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe, por um lado, R. Prigge, M. Fromm e V. Lambach e, por outro, o seu empregador, Deutsche Lufthansa AG (a seguir «Deutsche Lufthansa»), a respeito da cessação dos seus contratos de trabalho aos 60 anos, em aplicação de uma cláusula de uma convenção colectiva.

 Quadro jurídico

 Regulamentação da União

3        Nos termos do seu artigo 1.°, a Directiva 2000/78 tem por objecto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à actividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento.

4        O vigésimo terceiro, vigésimo quinto e trigésimo sexto considerandos desta directiva enunciam:

«(23) Em circunstâncias muito limitadas, podem justificar‑se diferenças de tratamento sempre que uma característica relacionada com a religião ou as convicções, com uma deficiência, com a idade ou com a orientação sexual constitua um requisito genuíno e determinante para o exercício da actividade profissional, desde que o objectivo seja legítimo e o requisito proporcional. [...]

[...]

(25)      A proibição de discriminações relacionadas com a idade constitui um elemento essencial para atingir os objectivos estabelecidos pelas orientações para o emprego [em 2000, aprovadas pelo Conselho Europeu, em Helsínquia, em 10 e 11 de Dezembro de 1999] e encorajar a diversidade no emprego. Todavia, em determinadas circunstâncias, podem‑se justificar diferenças de tratamento com base na idade, que implicam a existência de disposições específicas que podem variar consoante a situação dos Estados‑Membros. Urge pois distinguir diferenças de tratamento justificadas, nomeadamente por objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e da formação profissional, de discriminações que devem ser proibidas.

[...]

(36)      Os Estados‑Membros podem confiar aos parceiros sociais, a pedido conjunto destes, a aplicação da presente directiva no que se refere às disposições que são do âmbito de convenções colectivas, desde que sejam tomadas todas as disposições necessárias para que possam garantir, a todo o tempo, os resultados impostos pela presente directiva.»

5        O artigo 2.° da referida directiva, intitulado «Conceito de discriminação», precisa:

«1.      Para efeitos da presente directiva, entende‑se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, directa ou indirecta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°

2.      Para efeitos do n.° 1:

a)      Considera‑se que existe discriminação directa sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°, uma pessoa seja objecto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável;

[...]

5      A presente directiva não afecta as medidas previstas na legislação nacional que, numa sociedade democrática, sejam necessárias para efeitos de segurança pública, defesa da ordem e prevenção das infracções penais, protecção da saúde e protecção dos direitos e liberdades de terceiros.»

6        O artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da mesma directiva, intitulado «Âmbito de aplicação», precisa que esta é aplicável a todas as pessoas, tanto no sector público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito, nomeadamente, às condições de emprego e de trabalho, incluindo as condições de despedimento.

7        O artigo 4.° da Directiva 2000/78, intitulado «Requisitos para o exercício de uma actividade profissional», prevê no seu n.° 1:

«Sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 2.°, os Estados‑Membros podem prever que uma diferença de tratamento baseada numa característica relacionada com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.° não constituirá discriminação sempre que, em virtude da natureza da actividade profissional em causa ou do contexto da sua execução, essa característica constitua um requisito essencial e determinante para o exercício dessa actividade, na condição de o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional.»

8        O artigo 6.° desta directiva, intitulado «Justificação das diferenças de tratamento com base na idade», prevê no seu n.° 1:

«Sem prejuízo do disposto no n.° 2 do artigo 2.°, os Estados‑Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objectiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objectivo legítimo, incluindo objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objectivo sejam apropriados e necessários.

Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

a)      O estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, nomeadamente condições de despedimento e remuneração, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua protecção;

b)      A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego;

c)      A fixação de uma idade máxima de contratação, com base na formação exigida para o posto de trabalho em questão ou na necessidade de um período razoável de emprego antes da reforma.»

9        O artigo 16.° da referida directiva enuncia:

«Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que:

[...]

b)      Sejam ou possam ser declaradas nulas e sem efeito, ou revistas, as disposições contrárias ao princípio da igualdade de tratamento que figurem nos contratos ou convenções colectivas [...]»

10      O artigo 18.° da Directiva 2000/78 precisa:

«Os Estados‑Membros […] poderão confiar aos parceiros sociais, a pedido conjunto destes, a execução da presente directiva, no que se refere às disposições que são do âmbito de convenções colectivas. Nesse caso, devem assegurar que, o mais tardar em 2 de Dezembro de 2003, os parceiros sociais tenham introduzido, por acordo, as disposições necessárias, devendo os Estados‑Membros em causa tomar as medidas necessárias para poderem garantir, a todo o tempo, os resultados impostos pela presente directiva. [...]

Para atender a condições particulares, os Estados‑Membros podem dispor, se necessário, de um prazo suplementar de três anos a contar de 2 de Dezembro de 2003, ou seja, de um total de 6 anos, para executar as disposições da presente directiva relativas à discriminação baseada na idade e na deficiência, devendo, nesse caso, informar imediatamente a Comissão. Qualquer Estado‑Membro que tenha optado por recorrer a esse prazo suplementar[...] deve apresentar anualmente à Comissão um relatório sobre as medidas adoptadas para fazer face à discriminação baseada na idade ou na deficiência e sobre os projectos realizados tendo em vista a execução da directiva. A Comissão apresenta um relatório anual ao Conselho.

[...]»

11      A República Federal da Alemanha fez uso dessa faculdade, de modo que a transposição das disposições da directiva relativas à discriminação baseada na idade e na deficiência devia ser levada a cabo nesse Estado‑Membro, o mais tardar, em 2 de Dezembro de 2006.

 Regulamentação da profissão de piloto

 Regulamentação internacional

12      A regulamentação internacional em matéria de pilotos privados, profissionais ou de linha é elaborada por uma instituição internacional, as Joint Aviation Authorities, na qual a República Federal da Alemanha participa. Uma destas regulamentações, o Joint Aviation Requirements – Flight Crew Licensing 1 (a seguir «JAR‑FCL 1»), foi adoptada em 15 de Abril de 2003.

13      O JAR‑FCL 1 foi publicado pelo Ministério Federal dos Transportes, da Construção e da Habitação, no Bundesanzeiger n.° 80a, de 29 de Abril de 2003.

14      O ponto 1.060 do JAR‑FCL 1 precisa:

«Restrições respeitantes aos titulares de licenças com idade superior a 60 anos:

a)      de 60 a 64 anos:

o titular de uma licença de piloto com idade superior a 60 anos deixa de poder exercer a actividade de piloto de aeronaves de transporte comercial excepto:

1)      se for membro de uma tripulação formada por vários pilotos

2)      e os outros pilotos ainda não tiverem completado 60 anos.

b)      65 anos:

o titular de uma licença de piloto com idade superior a 65 anos deixa de poder exercer a actividade de piloto de aeronaves de transporte comercial.»

 Legislação nacional

15      O § 20, n.° 2, do Decreto relativo aos requisitos de autorização do tráfego aéreo (Luftverkehrs‑Zulassungs‑Ordnung), conforme alterado pelo regulamento que altera as disposições de direito aéreo aplicáveis às tripulações (Verordnung zur Änderung luftrechtlicher Vorschriften über Anforderungen an Flugbesatzungen), de 10 de Fevereiro de 2003 (BGBl. 2003 I, p. 182), prevê:

«Os requisitos de qualificação profissional e as provas para obtenção de uma licença, o alcance, incluindo as qualificações, a duração da validade, a prorrogação e a renovação, bem como os demais requisitos de desenvolvimento dos direitos associados a uma licença ou a uma qualificação, são regulados pelo regulamento relativo ao pessoal das companhias aéreas [Verordnung über Luftfahrtpersonal]. [...]»

16      O § 4 do primeiro regulamento de execução do regulamento relativo ao pessoal das companhias aéreas (Erste Durchführungsverordnung zur Verordnung über Luftfahrtpersonal), de 15 de Abril de 2003 (Bundesanzeiger n.° 82b, de 3 de Maio de 2003), enuncia:

«Após completar 60 anos e até atingir 65 anos, o titular de uma licença de piloto comercial ou de transporte aéreo emitida na República Federal da Alemanha, ou de uma licença obtida em conformidade com o § 46, n.° 5, do regulamento relativo ao pessoal das companhias aéreas, pode igualmente exercer os direitos conferidos pela licença em aeronaves cuja tripulação seja composta por, pelo menos, um piloto para o transporte aéreo comercial de passageiros, correio e/ou carga, limitado ao território da República Federal da Alemanha.

Depois dos 65 anos, o titular de uma licença de piloto deixa de poder pilotar um avião de transporte comercial de passageiros, correio e/ou carga.»

 Convenção colectiva n.° 5a

17      As relações de trabalho entre as partes no processo principal são reguladas pela convenção colectiva geral n.° 5a relativa ao pessoal de bordo da Deutsche Lufthansa, na sua versão em vigor a partir de 14 de Janeiro de 2005 (a seguir «convenção colectiva n.° 5a»).

18      O § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a tem a seguinte redacção:

«A relação de trabalho cessa, sem necessidade de rescisão do contrato, no final do mês em que se completa 60 anos. […]»

 Legislação nacional em matéria de trabalho e de igualdade de tratamento

19      O § 14 da Lei do trabalho a tempo parcial e dos contratos a termo, que altera e revoga disposições de direito do trabalho (Gesetz über Teilzeitarbeit und befristete Arbeitsverträge und zur Änderung und Aufhebung arbeitsrechtlicher Bestimmungen), de 21 de Dezembro de 2000 (BGBl. 2000 I, p. 1966, a seguir «TzBfG»), enuncia:

«(1)      Só é permitida a celebração de um contrato de trabalho a termo quando for justificada por uma razão objectiva [...]»

20      A Lei geral da igualdade de tratamento (Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz), de 14 de Agosto de 2006 (BGBl. 2006 I. p. 1897, a seguir «AGG»), transpôs a Directiva 2000/78.

21      Os §§ 1 a 3 e os §§ 7, 8 e 10 da AGG enunciam:

«§ 1 – Objectivo da lei

A presente lei tem por objectivo impedir ou eliminar qualquer desvantagem baseada na raça ou na origem étnica, no sexo, na religião ou em crenças, numa deficiência, na idade ou na identidade sexual.

§ 2 – Âmbito de aplicação

(1)      Por força da presente lei, as discriminações baseadas num dos motivos indicados no § 1 são ilícitas no que respeita:

[...]

2. Às condições de emprego e de trabalho, incluindo a remuneração e as condições de despedimento, nomeadamente as constantes de acordos individuais e de convenções colectivas, e as medidas adoptadas quando da execução e da cessação de uma relação de trabalho e em caso de progressão na carreira.

[...]

§ 3 – Definições

«(1)      Considera‑se que existe discriminação directa sempre que uma pessoa seja objecto de tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável, com base num dos motivos visados no § 1 [...]

[...]

§ 7 – Proibição da discriminação

(1)      Os trabalhadores não podem ser alvo de discriminação com base num dos motivos enumerados no § 1 [...]

(2)      As disposições que, em acordos, violem a proibição de discriminação na acepção do n.° 1 são nulas.

[...]

§ 8 – Autorização de tratamento diferente em razão de exigências profissionais

(1)      É autorizada uma diferença de tratamento por um dos motivos visados no § 1 quando, em razão da natureza da actividade profissional ou das condições do seu exercício, a característica em causa constitua uma exigência profissional essencial e determinante, desde que o objectivo seja legítimo e a exigência proporcionada.

[...]

§ 10 – Autorização de diferença de tratamento baseada na idade

(1)      Sem prejuízo do § 8, uma diferença de tratamento baseada na idade é igualmente autorizada quando for objectiva e razoavelmente justificada por um objectivo legítimo. Os meios adoptados para realizar esse objectivo devem ser adequados e necessários. Essas diferenças de tratamento podem designadamente incluir:

[...]»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

22      R. Prigge, M. Fromm e V. Lambach foram empregados da Deutsche Lufthansa durante vários anos como pilotos e, posteriormente, como comandantes de bordo.

23      Os seus contratos de trabalho terminaram, respectivamente, em 2006 e 2007, quando atingiram a idade de 60 anos, em aplicação do § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a.

24      Considerando que tinham sido vítimas de uma discriminação em razão da idade contrária à Directiva 2000/78 e à AGG, os recorrentes no processo principal intentaram uma acção no Arbeitsgericht Frankfurt am Main requerendo que esse órgão jurisdicional declarasse que as suas relações de trabalho com a Deutsche Lufthansa não tinham cessado no final do mês em que completaram 60 anos e que ordenasse a prossecução dos seus contratos de trabalho.

25      O Arbeitsgericht Frankfurt am Main julgou a acção improcedente e o Landesarbeitsgericht Hessen negou provimento ao recurso que interpuseram. Os ditos recorrentes interpuseram então um recurso de «Revision» no Bundesarbeitsgericht.

26      Esse órgão jurisdicional refere que, até à entrada em vigor da AGG, considerava válidas disposições como o § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a. Com efeito, na medida em que o § 14, n.° 1, da TzBfG permite limitar a duração do contrato de trabalho quando exista uma razão objectiva para o fazer, esse órgão jurisdicional considerava que um limite de idade previsto por uma convenção colectiva também podia ser justificado por uma razão objectiva, na acepção do referido § 14, n.° 1.

27      O Bundesarbeitsgericht considera que, em aplicação do princípio da autonomia dos parceiros sociais e da liberdade de que dispõem no exercício do seu poder normativo, estes podem adoptar disposições que limitem a duração dos contratos de trabalho mediante a fixação de um limite de idade. Contudo, uma vez que este poder normativo é partilhado com o Estado, este último impôs que a limitação da duração dos contratos de trabalho fosse justificada por uma razão objectiva. Os parceiros sociais dispõem, contudo, de uma margem de apreciação na definição desta razão objectiva. Destes princípios resulta que a fixação de um limite de idade aos 60 anos para os pilotos da Deutsche Lufthansa era da competência dos parceiros sociais.

28      Com excepção da hipótese de o limite de idade ter por fundamento a possibilidade de o trabalhador obter uma pensão de reforma, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a limitação da duração do contrato de trabalho em função da idade do trabalhador só se justifica quando, em razão da actividade exercida por este, o facto de se ultrapassar uma certa idade apresenta um risco. Este requisito está preenchido no que respeita aos pilotos. O limite de idade para os pilotos garante não apenas o correcto exercício da actividade mas também a protecção da vida e da saúde do pessoal de bordo, dos passageiros e das pessoas que vivem nas regiões sobrevoadas. A idade está objectivamente ligada à diminuição das capacidades físicas.

29      O facto de as regulamentações internacional e nacional, bem como outras convenções colectivas, não proibirem totalmente, mas apenas limitarem, o exercício desta profissão depois dos 60 anos reforça a ideia de que o exercício desta profissão depois desta idade apresenta um risco. Ao fixarem o limite de idade em 60 anos, os parceiros sociais mantiveram‑se dentro dos limites do seu poder normativo.

30      O Bundesarbeitsgericht considera que o facto de outras convenções colectivas aplicáveis aos pilotos de outras sociedades do grupo a que pertence a Deutsche Lufthansa não preverem o limite de idade aos 60 anos não afecta o princípio da igualdade. Com efeito, essas outras convenções foram negociadas por parceiros sociais diferentes e por empresas diferentes.

31      O Bundesarbeitsgericht pergunta‑se sobre se, depois da entrada em vigor da Directiva 2000/78 e da AGG, uma interpretação conforme com o direito da União do § 14, n.° 1, da TzBfG não teria por efeito a invalidade do limite de idade de 60 anos para os pilotos da Deutsche Lufthansa.

32      Segundo esse órgão jurisdicional, o § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a contém uma diferença de tratamento directamente baseada na idade. Considera que o objectivo visado pela limitação da idade dos pilotos a 60 anos é garantir a segurança do tráfego aéreo. Pergunta‑se, por conseguinte, sobre se esta diferença de tratamento é ou não contrária a esta directiva e/ou aos princípios gerais do direito da União.

33      Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se sobre se o limite de idade previsto no § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a é abrangido pelo âmbito de aplicação da referida directiva. Com efeito, tendo por fundamento um objectivo de segurança do tráfego aéreo, esta medida é necessária para a segurança pública na acepção do artigo 2.°, n.° 5, da mesma directiva. Contudo, o Bundesarbeitsgericht interroga‑se sobre a questão de saber se as convenções colectivas podem constituir «medidas previstas na legislação nacional», na acepção desta disposição.

34      Em segundo lugar, e na hipótese de a medida de limite de idade ser abrangida pelo âmbito de aplicação da Directiva 2000/78, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a questão de saber se o objectivo de segurança do tráfego aéreo poderia figurar entre os objectivos visados no artigo 6.°, n.° 1, desta directiva. Observa que, para interpretar esta disposição, o Tribunal de Justiça apenas se pronunciou, até hoje, a respeito de medidas que prosseguem objectivos de política social, sem se pronunciar expressamente a respeito de medidas que prosseguem outros objectivos. Caso o objectivo de garantir a segurança do tráfego aéreo figurasse por entre os visados no artigo 6.°, n.° 1, da directiva, haveria que verificar se a limitação da idade dos pilotos a 60 anos é apropriada e necessária para a concretização deste objectivo.

35      Por fim, em terceiro lugar, o Bundesarbeitsgericht interroga‑se sobre se a limitação da idade dos pilotos a 60 anos não poderia ser autorizada em aplicação do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78. Com efeito, garantir a segurança aérea poderia constituir um objectivo legítimo susceptível de justificar a imposição de uma exigência profissional relacionada com a idade. Nesse caso, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a questão de saber se o limite de idade pode ser fixado pelos parceiros sociais no âmbito de uma convenção colectiva ou se decorre do poder normativo do Estado. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio observa que a legislação nacional apenas limita, sem o proibir, o exercício da profissão de piloto entre os 60 e os 65 anos.

36      Atendendo a estas considerações, o Bundesarbeitsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Os artigos 2.°, n.° 5, 4.°, n.° 1, e/ou 6.°, n.° 1, [...] da Directiva 2000/78[…] e/ou o princípio geral de direito comunitário relativo à proibição de discriminaç[ões] em razão da idade[...] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a regulamentações nacionais que admitem uma norma prevista por convenção colectiva que estabelece um limite de idade de 60 anos para os pilotos a fim de garantir a segurança [aérea]?»

 Quanto à questão prejudicial

 Observações preliminares

37      Para responder à questão submetida, importa desde já determinar, por um lado, se a cláusula da convenção colectiva em causa no processo principal é abrangida pelo âmbito de aplicação desta directiva e se comporta uma diferença de tratamento baseada na idade e, por outro, se a referida directiva deve ser interpretada no sentido de que se opõe a que cláusulas de uma convenção colectiva, como a que está em causa no processo principal, prevejam diferenças de tratamento em função da idade.

38      No que respeita à aplicação da Directiva 2000/78, importa recordar que o Tribunal de Justiça reconheceu a existência de um princípio de não discriminação em razão da idade, que deve ser considerado um princípio geral do direito da União e que foi concretizado pela Directiva 2000/78 no domínio do emprego e do trabalho (v., neste sentido, acórdão de 19 de Janeiro de 2010, Kücükdeveci, C‑555/07, Colect., p. I‑365, n.° 21). A proibição de qualquer discriminação com fundamento, nomeadamente, na idade está prevista no artigo 21.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que, desde 1 de Dezembro de 2009, tem o mesmo valor jurídico que os Tratados.

39      Por outro lado, resulta tanto do seu título e do seu preâmbulo como do seu conteúdo e objectivos que esta directiva se destina a estabelecer um quadro geral para garantir a todas as pessoas a igualdade de tratamento «no emprego e na actividade profissional», oferecendo‑lhes uma protecção eficaz contra as discriminações que tenham por base um dos motivos referidos no seu artigo 1.°, entre os quais figura a idade (v. acórdão de 12 de Outubro de 2010, Ingeniørforeningen i Danmark, C‑499/08, Colect., p. I‑0000, n.° 19).

40      Decorre do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da referida directiva que a mesma é aplicável a todas as pessoas, tanto no sector público como no sector privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito, nomeadamente, às condições de emprego e de trabalho, incluindo as condições de despedimento.

41      Ao prever que a relação de trabalho dos pilotos cessa, sem necessidade de rescisão do contrato de trabalho, no fim do mês do seu sexagésimo aniversário, o § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a diz respeito às condições de emprego destes trabalhadores, na acepção do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 2000/78. Esta última é, por conseguinte, aplicável a situações como as que deram origem ao litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio.

42      No que respeita à questão de saber se a medida em causa no processo principal cria uma discriminação em razão da idade na acepção do artigo 2.°, n.° 1, da Directiva 2000/78, há que recordar que, nos termos desta disposição, «entende‑se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, directa ou indirecta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°» desta directiva. O artigo 2.°, n.° 2, alínea a), da referida directiva precisa que, para efeitos da aplicação do seu n.° 1, existe discriminação directa sempre que uma pessoa seja objecto de um tratamento menos favorável do que aquele que é dado a outra pessoa que se encontre numa situação comparável, com base em qualquer dos motivos referidos no artigo 1.° da mesma directiva.

43      No caso em apreço, o § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a prevê que a relação de trabalho de um piloto da Deutsche Lufthansa abrangida pela referida convenção colectiva cessa quando aquele completa 60 anos.

44      Ora, esse piloto está numa situação comparável à de um piloto mais novo que exerce a mesma actividade para a mesma companhia aérea e/ou é abrangido pela mesma convenção colectiva. O primeiro piloto, cujo contrato de trabalho cessa automaticamente quando completa 60 anos, é tratado de forma menos favorável que o segundo, em razão da sua idade.

45      Afigura‑se, por conseguinte, que a medida em causa no processo principal cria uma diferença de tratamento directamente baseada na idade, na acepção das disposições conjugadas dos artigos 1.° e 2.°, n.° 2, alínea a), da Directiva 2000/78.

46      Deve recordar‑se que a circunstância de a legislação nacional, no caso concreto, segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, o § 14, n.° 1, da TzBfG, autorizar que, por uma razão objectiva, uma convenção colectiva preveja a cessação automática dos contratos de trabalho numa determinada idade não dispensa a convenção colectiva em causa da obrigação de respeitar o direito da União, em particular a Directiva 2000/78 (v., neste sentido, acórdão de 12 de Outubro de 2010, Rosenbladt, C‑45/09, Colect., p. I‑0000, n.° 53).

47      Com efeito, o direito à negociação colectiva proclamado no artigo 28.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia deve, no âmbito de aplicação do direito da União, ser exercido em conformidade com este último (v., neste sentido, acórdão de 11 de Dezembro de 2007, International Transport Workers’ Federation e Finnish Seamen’s Union, dito «Viking Line», C‑438/05, Colect., p. I‑10779, n.° 44, e de 18 de Dezembro de 2007, Laval un Partneri, C‑341/05, Colect., p. I‑11767, n.° 91).

48      Assim sendo, quando adoptam medidas que entram no âmbito de aplicação da Directiva 2000/78, a qual, no domínio do emprego e do trabalho, concretiza o princípio da não discriminação em função da idade, os parceiros sociais devem agir no respeito desta directiva (v., neste sentido, acórdão de 27 de Outubro de 1993, Enderby, C‑127/92, Colect., p. I‑5535, n.° 22).

49      Assim, decorre claramente do artigo 16.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 2000/78 que as convenções colectivas, à semelhança das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas, devem respeitar o princípio instituído por esta directiva.

50      Tendo o órgão jurisdicional de reenvio pedido ao Tribunal de Justiça que interpretasse os artigos 2.°, n.° 5, 4.°, n.° 1, e 6.°, n.° 1, da Directiva 2000/78, importa analisar a cláusula da convenção colectiva em causa no processo principal à luz, sucessivamente, de cada uma destas disposições e do objectivo ou dos objectivos prosseguidos por esta medida.

51      Resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que os parceiros sociais previram a cessação automática dos contratos de trabalho dos pilotos aos 60 anos com o objectivo de garantir a segurança do tráfego aéreo. Nas suas observações, o Governo alemão considera que o limite de idade acordado pelos parceiros sociais é necessário à protecção da saúde. Com efeito, o facto de os pilotos com mais de 60 anos serem excluídos do tráfego aéreo permitiria evitar o risco de acidente, bem como proteger a saúde dos pilotos, dos passageiros e dos habitantes das zonas sobrevoadas. É à luz destas considerações que há que interpretar a Directiva 2000/78.

 Quanto à interpretação do artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78

52      O artigo 2.° da Directiva 2000/78, intitulado «Conceito de discriminação», tem por objecto definir o princípio da igualdade de tratamento para efeitos desta directiva. Nos termos do n.° 1 do referido artigo 2.°, este princípio define‑se pela ausência de qualquer discriminação, directa ou indirecta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.° da referida directiva.

53      O artigo 2.°, n.os 2 a 4, da Directiva 2000/78 define os comportamentos considerados como discriminações na acepção do artigo 2.°, n.° 1, desta directiva.

54      Nos termos do artigo 2.°, n.° 5, da dita directiva, esta última «não afecta as medidas previstas na legislação nacional que, numa sociedade democrática, sejam necessárias para efeitos de segurança pública, defesa da ordem e prevenção das infracções penais, protecção da saúde e protecção dos direitos e liberdades de terceiros».

55      Ao adoptar esta disposição, o legislador da União, em matéria de emprego e de trabalho, pretendeu evitar e arbitrar um conflito entre, por um lado, o princípio da igualdade de tratamento e, por outro, a necessidade de garantir a ordem, a segurança e a saúde públicas, a prevenção das infracções e a protecção dos direitos e liberdades individuais, indispensáveis ao funcionamento de uma sociedade democrática. Este mesmo legislador decidiu que, em certos casos enumerados no artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78, os princípios previstos por esta não se aplicam a medidas que contenham diferenças de tratamento com fundamento num dos motivos referidos no artigo 1.° da directiva, desde que, contudo, tais medidas sejam «necessárias» à realização dos objectivos acima referidos.

56      Por outro lado, na medida em que o referido artigo 2.°, n.° 5, prevê uma derrogação ao princípio da proibição das discriminações, deve ser objecto de interpretação estrita. Os termos utilizados nesta disposição conduzem igualmente a essa abordagem (v., neste sentido, acórdão de 12 de Janeiro de 2010, Petersen, C‑341/08, Colect., p. I‑47, n.° 60).

57      Por conseguinte, importa determinar, por um lado, se a segurança aérea figura entre os objectivos enumerados no artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78 e, por outro, se o § 19, n.° 1, da convenção colectiva n.° 5a é uma medida prevista na legislação nacional na acepção da mesma disposição.

58      Quanto à segurança aérea, verifica‑se que as medidas destinadas a evitar acidentes aéreos através do controlo da aptidão e das capacidades físicas dos pilotos, de modo a que as falhas humanas não estejam na origem dos referidos acidentes, são, inegavelmente, medidas susceptíveis de garantir a segurança pública, na acepção do artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78.

59      Quanto à questão de saber se uma medida adoptada por via de acordo colectivo pode constituir uma medida prevista pela legislação nacional, importa realçar, como fez o advogado‑geral no n.° 51 das suas conclusões, que o legislador da União, no artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78, mencionou as medidas decorrentes da «legislação nacional», ao passo que, nem o artigo 4.°, n.° 1, nem o artigo 6.°, n.° 1, desta directiva se referem a um instrumento jurídico preciso.

60      O Tribunal de Justiça já decidiu que os parceiros sociais não constituem entidades de direito público [v. no contexto do artigo 3.°, n.° 10, da Directiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO 1997, L 18, p. 1), acórdão Laval un Partneri, já referido, n.° 84].

61      Contudo, esta consideração não impede que os Estados‑Membros, mediante regras de habilitação, autorizem os parceiros sociais a adoptar medidas, na acepção do artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78, nos domínios referidos nesta disposição e que possam ser objecto de acordos colectivos. Essas regras de habilitação devem ser suficientemente precisas para garantir que as medidas em questão respeitam as exigências previstas no referido artigo 2.°, n.° 5.

62      No que respeita à medida em causa no processo principal, os parceiros sociais consideraram que havia que limitar à idade de 60 anos a possibilidade de os pilotos exercerem as suas actividades por razões relacionadas com a segurança dos passageiros, com os habitantes das regiões sobrevoadas mas também com a saúde e a segurança dos próprios pilotos. Esta medida prossegue objectivos relacionados com a segurança pública e com a protecção da saúde e é objecto de acordos colectivos.

63      Contudo, como exposto nos n.os 14 e 16 do presente acórdão, considerou‑se nas regulamentações nacional e internacional que não era necessário proibir que os pilotos exercessem as suas actividades depois dos 60 anos, mas apenas restringir esse exercício. Por conseguinte, a proibição de pilotar depois dessa idade, contida na medida em causa no processo principal, não era necessária à concretização do objectivo prosseguido.

64      Decorre destas considerações que o artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros, mediante regras de habilitação, podem autorizar os parceiros sociais a adoptar medidas, na acepção do mencionado artigo 2.°, n.° 5, nos domínios referidos nesta disposição que possam ser objecto de acordos colectivos, desde que essas regras de habilitação sejam suficientemente precisas para garantir que as medidas em questão respeitam as exigências previstas no artigo 2.°, n.° 5. Uma medida como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual os pilotos deixam de poder exercer as suas actividades profissionais, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos, não é uma medida necessária à segurança pública e à protecção da saúde, na acepção do mesmo artigo 2.°, n.° 5.

 Quanto à interpretação do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78

65      Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78, «os Estados‑Membros podem prever que uma diferença de tratamento baseada numa característica relacionada com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.° [desta directiva] não constituirá discriminação sempre que, em virtude da natureza da actividade profissional em causa ou do contexto da sua execução, essa característica constitua um requisito essencial e determinante para o exercício dessa actividade, na condição de o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional».

66      Decorre da letra desta disposição que, para não constituir uma discriminação, a diferença de tratamento deve ser fundada numa característica relacionada com um dos motivos referidos no artigo 1.° da Directiva 2000/78, devendo esta característica constituir um requisito profissional «essencial e determinante». O Tribunal de Justiça decidiu que não é o motivo em que se baseia a diferença de tratamento, mas uma característica relacionada com esse motivo, que deve constituir uma exigência essencial e determinante (v. acórdão de 12 de Janeiro de 2010, Wolf, C‑229/08, Colect., p. I‑1, n.° 35).

67      No que respeita aos pilotos de linha, é essencial que possuam, nomeadamente, capacidades físicas particulares, na medida em que nesta profissão as falhas físicas são susceptíveis de ter consequências importantes. É igualmente inegável que essas capacidades diminuem com a idade (v., neste sentido, relativamente à profissão de bombeiro, acórdão Wolf, já referido, n.° 41). Daqui resulta que o facto de possuir capacidades físicas particulares pode ser considerado um «requisito profissional essencial e determinante», na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78, para o exercício da profissão de piloto de linha e que a posse de tais capacidades está ligada à idade.

68      Quanto ao objectivo prosseguido pela medida, como precisado no n.° 51 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio indicou que os parceiros sociais previram a cessação automática dos contratos de trabalho dos pilotos aos 60 anos com o objectivo de garantir a segurança do tráfego aéreo.

69      Esse objectivo constitui um objectivo legítimo na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78.

70      Importa igualmente determinar se, ao decidirem que é a partir dos 60 anos que os pilotos de linha deixam de ter as capacidades físicas para exercer a sua actividade profissional, os parceiros sociais impuseram uma exigência proporcionada.

71      A este respeito, deve realçar‑se que o vigésimo terceiro considerando da Directiva 2000/78 precisa que uma diferença de tratamento pode ser justificada «em circunstâncias muito limitadas» sempre que uma característica relacionada, nomeadamente, com a idade constitua um requisito essencial e determinante.

72      Por outro lado, na medida em que permite derrogar o princípio da não discriminação, o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78 deve ser objecto de interpretação estrita (v., por analogia, no que respeita à discriminação baseada no sexo, acórdãos de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n.° 36, e de 26 de Outubro de 1999, Sirdar, C‑273/97, Colect., p. I‑7403, n.° 23, e, no que respeita ao artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78, neste sentido, acórdão Petersen, já referido, n.° 60).

73      Ora, como ficou exposto nos n.os 14 e 16 do presente acórdão, as regulamentações nacional e internacional prevêem a possibilidade de os pilotos continuarem a exercer as suas actividades, com certas restrições, entre os 60 e os 65 anos. Assim, as autoridades nacionais e internacionais consideram que até aos 65 anos os pilotos têm as capacidades físicas para pilotar, ainda que, entre os 60 e os 65 anos, só o possam fazer enquanto membros de uma tripulação na qual os outros pilotos tenham menos de 60 anos.

74      Por seu turno, os parceiros sociais consideraram que, depois dos 60 anos, os pilotos abrangidos pela convenção colectiva n.° 5a deixam de poder exercer as suas actividades, mesmo com certas restrições. Por outro lado, as razões pelas quais consideram que os pilotos deixam de ter as capacidades físicas para pilotar a partir dos 60 anos não decorrem dos elementos dos autos nem das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça.

75      Ao fixar em 60 anos o limite de idade a partir do qual se considera que os pilotos de linha abrangidos pela convenção colectiva n.° 5a deixam de ter as capacidades físicas para exercer a sua actividade profissional, apesar de as regulamentações nacional e internacional autorizarem o exercício dessa actividade, sob certas condições, até aos 65 anos, os parceiros sociais impuseram aos referidos pilotos uma exigência desproporcionada, na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78.

76      Resulta destas considerações que o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma cláusula de uma convenção colectiva, como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual se considera que os pilotos deixam de ter as capacidades físicas para exercerem a sua actividade profissional, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos.

 Quanto à interpretação do artigo 6.°, n.° 1, da Directiva 2000/78

77      O artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78 prevê que uma diferença de tratamento com base na idade não constitui discriminação se for objectiva e razoavelmente justificada, no quadro do direito nacional, por um objectivo legítimo, nomeadamente objectivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objectivo sejam apropriados e necessários.

78      Como precisado nos n.os 51 e 68 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio indicou que os parceiros sociais previram a cessação automática dos contratos de trabalho dos pilotos aos 60 anos com o objectivo de garantir a segurança do tráfego aéreo.

79      Importa determinar se esse objectivo é legítimo na acepção do artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78.

80      A este respeito, deve observar‑se que, ainda que a lista não seja exaustiva, os objectivos legítimos enumerados nesta disposição estão relacionados com a política de emprego, do mercado de trabalho e da formação profissional.

81      Assim, o Tribunal de Justiça decidiu que os objectivos que podem ser considerados «legítimos» na acepção do referido artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, e, consequentemente, susceptíveis de justificar uma excepção ao princípio da proibição da discriminação com base na idade, são objectivos de política social, como relacionados com a política de emprego, do mercado de trabalho ou da formação profissional (v. acórdãos de 5 de Março de 2009, Age Concern England, C‑388/07, Colect., p. I‑1569, n.° 46, e de 18 de Junho de 2009, Hütter, C‑88/08, Colect., p. I‑5325, n.° 41).

82      Resulta do conjunto destes elementos que um objectivo como a segurança aérea não faz parte dos objectivos referidos no artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78.

83      Atendendo a todas estas considerações, há que responder à questão submetida que:

–        o artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros, mediante regras de habilitação, podem autorizar os parceiros sociais a adoptar medidas, na acepção do mencionado artigo 2.°, n.° 5, nos domínios referidos nesta disposição que possam ser objecto de acordos colectivos, desde que essas regras de habilitação sejam suficientemente precisas para garantir que as medidas em questão respeitam as exigências previstas no dito artigo 2.°, n.° 5. Uma medida como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual os pilotos deixam de poder exercer as suas actividades profissionais, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos, não é uma medida necessária à segurança pública e à protecção da saúde, na acepção do mesmo artigo 2.°, n.° 5;

–        o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma cláusula de uma convenção colectiva, como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual se considera que os pilotos deixam de ter as capacidades físicas para exercerem a sua actividade profissional, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos;

–        o artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que a segurança aérea não constitui um objectivo legítimo na acepção desta disposição.

 Quanto às despesas

84      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O artigo 2.°, n.° 5, da Directiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional, deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros, mediante regras de habilitação, podem autorizar os parceiros sociais a adoptar medidas, na acepção do mencionado artigo 2.°, n.° 5, nos domínios referidos nesta disposição que possam ser objecto de acordos colectivos, desde que essas regras de habilitação sejam suficientemente precisas para garantir que as medidas em questão respeitam as exigências previstas no dito artigo 2.°, n.° 5. Uma medida como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual os pilotos deixam de poder exercer as suas actividades profissionais, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos, não é uma medida necessária à segurança pública e à protecção da saúde, na acepção do mesmo artigo 2.°, n.° 5.

O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma cláusula de uma convenção colectiva, como a que está em causa no processo principal, que fixa em 60 anos o limite de idade a partir do qual se considera que os pilotos deixam de ter as capacidades físicas para exercerem a sua actividade profissional, apesar de as regulamentações nacional e internacional fixarem essa idade em 65 anos.

O artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2000/78 deve ser interpretado no sentido de que a segurança aérea não constitui um objectivo legítimo na acepção desta disposição.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.