Language of document : ECLI:EU:C:2012:217

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

19 de abril de 2012 (*)

«Diretivas 2000/43/CE, 2000/78/CE e 2006/54/CE ― Igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional ― Trabalhador que alega de forma plausível que preenche os requisitos indicados num anúncio de recrutamento ― Direito do trabalhador a aceder à informação sobre se o empregador contratou outro candidato»

No processo C‑415/10,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Bundesarbeitsgericht (Alemanha), por decisão de 20 de maio de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 20 de agosto de 2010, no processo

Galina Meister

contra

Speech Design Carrier Systems GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus, A. Rosas (relator), A. Arabadjiev e C. G. Fernlund, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de novembro de 2011,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação de G. Meister, por R. Wißbar, Rechtsanwalt,

¾        em representação da Speech Design Carrier Systems GmbH, por U. Kappelhoff, Rechtsanwältin,

¾        em representação do Governo alemão, por T. Henze e J. Möller, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Comissão Europeia, por V. Kreuschitz, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 12 de janeiro de 2012,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 de junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica (JO L 180, p. 22), 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO L 303, p. 16), e 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional (JO L 204, p. 23).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe G. Meister à Speech Design Carrier Systems GmbH (a seguir «Speech Design»), a propósito de uma discriminação baseada no sexo, na idade e na origem étnica, de que alega ter sido objeto num processo de recrutamento.

 Quadro jurídico

 Regulamentação da União

 Diretiva 2000/43

3        O décimo quinto considerando da Diretiva 2000/43 enuncia que «[a] apreciação dos factos dos quais se pode deduzir que houve discriminação direta ou indireta é da competência dos órgãos judiciais, ou outros órgãos competentes, a nível nacional, de acordo com as normas ou a prática do direito nacional. Essas normas podem prever, em especial, que a determinação da discriminação indireta se possa fazer por quaisquer meios de prova, incluindo os estatísticos».

4        Resulta do vigésimo primeiro considerando da mesma diretiva que «[se impõe] a adaptação das regras do ónus da prova em caso de presumível discriminação e, nos casos em que essa situação se verifique, a aplicação efetiva do princípio da igualdade de tratamento exige que o ónus da prova incumba à parte demandada».

5        Nos termos do artigo 1.° da referida diretiva:

«A presente diretiva tem por objetivo estabelecer um quadro jurídico para o combate à discriminação baseada em motivos de origem racial ou étnica, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento.»

6        O artigo 3.°, n.° 1, da mesma diretiva dispõe:

«Dentro dos limites das competências da Comunidade, a presente diretiva é aplicável, no que diz respeito tanto aos setores público como privado, incluindo os organismos públicos:

a)      Às condições de acesso ao emprego, ao trabalho independente ou à atividade profissional, incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de atividade e a todos os níveis da hierarquia profissional, incluindo a promoção;

[…]»

7        O artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43 prevê:

«Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento, possam recorrer a processos judiciais e/ou administrativos, incluindo, se considerarem adequado, os processos de conciliação, para exigir o cumprimento das obrigações impostas pela presente diretiva, mesmo depois de extinta a relação contratual no âmbito da qual a discriminação tenha alegadamente ocorrido.»

8        O artigo 8.° da referida diretiva, que tem por epígrafe «Ónus da prova», tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias, de acordo com os respetivos sistemas judiciais, para assegurar que, quando uma pessoa que se considere lesada pela não aplicação, no que lhe diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento apresentar, perante um tribunal ou outra instância competente, elementos de facto constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta, incumba à parte demandada provar que não houve violação do princípio da igualdade de tratamento.

2.      O n.° 1 do presente artigo não obsta a que os Estados‑Membros imponham um regime probatório mais favorável à parte demandante.

3.      O n.° 1 não se aplica aos processos penais.

4.      O disposto nos n.os 1, 2 e 3 aplica‑se igualmente às ações intentadas nos termos do n.° 2 do artigo 7.°

5.      Os Estados‑Membros podem não aplicar o disposto no n.° 1 nas ações em que a averiguação dos factos incumbe ao tribunal ou à instância competente.»

 Diretiva 2000/78

9        O décimo quinto considerando da Diretiva 2000/78 enuncia que «[a] apreciação dos factos dos quais se pode presumir que houve discriminação direta ou indireta é da competência dos órgãos judiciais ou de outros órgãos competentes, a nível nacional, de acordo com as normas ou as práticas nacionais, que podem prever, em especial, que a discriminação indireta possa ser estabelecida por quaisquer meios e, inclusive, com base em dados estatísticos».

10      O trigésimo primeiro considerando da mesma diretiva indica que «[se impõe] a adaptação das regras relativas ao ónus da prova em caso de presunção de discriminação e, nos casos em que essa situação se verifique, a aplicação efetiva do princípio da igualdade de tratamento exige que o ónus da prova incumba à parte demandada. Não cabe, contudo, à parte demandada provar que a parte demandante pertence a uma dada religião, possui determinadas convicções, apresenta uma dada deficiência ou tem uma determinada idade ou orientação sexual».

11      Nos termos do artigo 1.° da referida diretiva:

«A presente diretiva tem por objeto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à atividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento.»

12      O artigo 3.°, n.° 1, da mesma diretiva dispõe:

«Dentro dos limites das competências atribuídas à Comunidade, a presente diretiva é aplicável a todas as pessoas, tanto no setor público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito:

a)      Às condições de acesso ao emprego, ao trabalho independente ou à atividade profissional, incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de atividade e a todos os níveis da hierarquia profissional, incluindo em matéria de promoção;

[…]»

13      O artigo 9.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 prevê:

«Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento, possam recorrer a processos judiciais e/ou administrativos, incluindo, se considerarem adequado, os processos de conciliação, para exigir o cumprimento das obrigações impostas pela presente diretiva, mesmo depois de extintas as relações no âmbito das quais a discriminação tenha alegadamente ocorrido.»

14      O artigo 10.° da referida diretiva, que tem por epígrafe «Ónus da prova», enuncia:

«1.      Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias, de acordo com os respetivos sistemas judiciais, para assegurar que, quando uma pessoa que se considere lesada pela não aplicação, no que lhe diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento apresentar, perante um tribunal ou outra instância competente, elementos de facto constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta, incumba à parte requerida provar que não houve violação do princípio da igualdade de tratamento.

2.      O disposto no n.° 1 não obsta a que os Estados‑Membros imponham um regime probatório mais favorável à parte demandante.

3.      O disposto no n.° 1 não se aplica aos processos penais.

4.      O disposto nos n.os 1, 2 e 3 aplica‑se igualmente às ações judiciais intentadas nos termos do n.° 2 do artigo 9.°

5.      Os Estados‑Membros podem não aplicar o disposto no n.° 1 nas ações em que a averiguação dos factos incumbe ao tribunal ou à instância competente.»

 Diretiva 2006/54

15      O trigésimo considerando da Diretiva 2006/54 tem a seguinte redação:

«A adoção de disposições relativas ao ónus da prova tem um papel significativo na garantia da aplicação efetiva do princípio da igualdade de tratamento. De acordo com o Tribunal de Justiça deverão, pois, ser tomadas medidas para garantir que o ónus da prova incumba à parte demandada em caso de presumível discriminação, exceto em relação a processos em que cabe ao tribunal ou à instância nacional competente a averiguação dos factos. É no entanto necessário clarificar que a apreciação dos factos constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta continua a incumbir à instância nacional competente, de acordo com o direito nacional e/ou as práticas nacionais. Acresce que é deixada aos Estados‑Membros a possibilidade de introduzirem, em qualquer fase do processo, um regime probatório mais favorável à parte demandante.»

16      Nos termos do artigo 1.° da referida diretiva:

«A presente diretiva visa assegurar a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no emprego e na atividade profissional.

Para o efeito, contém disposições de aplicação do princípio da igualdade de tratamento em matéria de:

a)      Acesso ao emprego, incluindo a promoção, e à formação profissional;

[…]»

17      O artigo 14.°, n.° 1, da mesma diretiva enuncia:

«Não haverá qualquer discriminação direta ou indireta em razão do sexo, nos setores público e privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito:

a)      Às condições de acesso ao emprego, ao trabalho independente ou à atividade profissional, incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de atividade e a todos os níveis da hierarquia profissional, incluindo a promoção;

[…]»

18      O artigo 17.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54 dispõe:

«Os Estados‑Membros devem assegurar que todas as pessoas que se considerem lesadas pela não aplicação, no que lhes diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento possam ter acesso a processos judiciais, após eventual recurso a outras autoridades competentes, incluindo, se considerarem adequado, aos processos de conciliação, para exigir o cumprimento das obrigações impostas pela presente diretiva, mesmo depois de extintas as relações no âmbito das quais a discriminação tenha alegadamente ocorrido.»

19      O artigo 19.° da referida diretiva, que tem por epígrafe «Ónus da prova», tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias, em conformidade com os respetivos sistemas jurídicos, para assegurar que quando uma pessoa que se considere lesada pela não aplicação, no que lhe diz respeito, do princípio da igualdade de tratamento apresentar, perante um tribunal ou outra instância competente, elementos de facto constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta, incumba à parte demandada provar que não houve violação do princípio da igualdade de tratamento.

2.      O n.° 1 não obsta a que os Estados‑Membros imponham um regime probatório mais favorável à parte demandante.

3.      Os Estados‑Membros podem não aplicar o disposto no n.° 1 nas ações em que a averiguação dos factos incumbe ao tribunal ou à instância competente.

4.      Os n.os 1, 2 e 3 aplicar‑se‑ão também:

a)       Às situações abrangidas pelo artigo 141.° do Tratado e, na medida em que haja discriminação baseada no sexo, pelas Diretivas 92/85/CEE e 96/34/CE;

b)       Ao processo civil ou administrativo, no setor público ou privado, cujo recurso seja previsto no direito nacional em aplicação das disposições previstas na alínea a), com exceção dos processos graciosos de natureza voluntária ou previstos no direito nacional.

5.      O presente artigo não é aplicável a processos penais, salvo disposição em contrário dos Estados‑Membros.»

 Regulamentação nacional

20      O § 1 da Lei geral sobre a igualdade de tratamento (Allgemeines Gleichbehandlungsgesetz), de 14 de agosto de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1897), na versão aplicável à data dos factos no processo principal (a seguir «AGG»), tem a seguinte redação:

«A presente lei tem por objeto impedir ou eliminar qualquer discriminação baseada na raça ou na origem étnica, no sexo, na religião ou em convicções, nas deficiências, na idade ou na identidade sexual.»

21      Nos termos do § 3, n.° 1, da AGG:

«Considera‑se que existe discriminação direta sempre que, com base num dos motivos previstos no § 1, uma pessoa seja objeto de tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável. Existe igualmente discriminação direta baseada no sexo, na aceção do § 2, n.° 1, pontos 1 a 4, sempre que uma mulher seja vítima de um tratamento menos favorável em razão da sua gravidez ou da sua maternidade.»

22      O § 6, n.° 1, da AGG enuncia:

«Na aceção da presente lei, entende‑se por trabalhadores:

1.      Os trabalhadores por conta de outrem;

2.      As pessoas empregadas para fins de formação profissional;

3.      As pessoas cujo estatuto, em razão da sua dependência económica, seja equiparado ao estatuto dos trabalhadores por conta de outrem; são designadamente abrangidas por esta categoria as pessoas que trabalham ao domicílio e as pessoas equiparadas.

Consideram‑se igualmente trabalhadores as pessoas que se candidatam a um emprego e as pessoas cuja relação laboral cessou.»

23      Em conformidade com o disposto no § 7, n.° 1, da AGG, os trabalhadores não devem ser alvo de nenhuma discriminação baseada num dos motivos previstos no § 1. Esta proibição aplica‑se igualmente sempre que o autor da discriminação apenas presuma a existência de um dos motivos previstos no § 1, no âmbito do facto discriminatório.

24      Nos termos do § 15, n.° 2, da AGG:

«O trabalhador pode pedir uma indemnização pecuniária adequada por um dano não patrimonial. Em caso de não recrutamento, a indemnização não pode exceder três meses de salário se o trabalhador não tivesse sido recrutado mesmo no caso de a seleção não ter sido discriminatória.»

25      O § 22 da AGG dispõe:

«Sempre que, em caso de litígio, uma das partes apresentar indícios que permitam concluir que existe uma discriminação baseada num dos motivos previstos no § 1, incumbe à parte contrária provar que não houve violação das disposições sobre a proteção contra as discriminações.»

 Factos na origem do litígio no processo principal e questões prejudiciais

26      G. Meister, nascida em 7 de setembro de 1961 e de origem russa, é titular de um diploma russo de Engenheira de Sistemas, ao qual foi reconhecida, na Alemanha, a equivalência a um diploma alemão emitido por uma Fachhochshule (estabelecimento de ensino profissional superior).

27      A Speech Design publicou um anúncio na imprensa, para o recrutamento de um «programador/a experiente de software», ao qual G. Meister respondeu, candidatando‑se em 5 de outubro de 2006. Por carta de 11 de outubro seguinte, a Speech Design recusou a candidatura, sem a convocar para uma entrevista de emprego. Pouco tempo depois, essa sociedade difundiu um segundo anúncio na Internet, cujo conteúdo era análogo ao primeiro. Em 19 de outubro de 2006, G. Meister candidatou‑se de novo, tendo a Speech Design recusado outra vez a sua candidatura, sem a convocar para uma entrevista nem lhe dar nenhuma indicação sobre os motivos da recusa.

28      Nenhum elemento dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça indica que a referida sociedade tenha alegado que o nível de qualificação de G. Meister não correspondia ao procurado no âmbito dessa operação de recrutamento.

29      Acreditando que preenchia os requisitos exigidos para ocupar o lugar em questão, G. Meister considerou ter sido alvo de um tratamento menos favorável do que o que foi dado a outra pessoa numa situação semelhante, em razão do seu sexo, da sua idade e da sua origem étnica. Intentou então uma ação contra a Speech Design no Arbeitsgericht, pedindo, em primeiro lugar, que a sociedade lhe pagasse uma indemnização por discriminação laboral e, em segundo lugar, que juntasse aos autos o processo do candidato recrutado, o que lhe iria permitir demonstrar que era mais qualificada do que ele.

30      Na medida em que a ação foi declarada improcedente em primeira instância, G. Meister interpôs recurso dessa sentença de improcedência para o Landesarbeitsgericht, órgão jurisdicional que também julgou improcedente o seu pedido. Interpôs recurso de «Revision» para o Bundesarbeitsgericht. Este órgão jurisdicional interroga‑se sobre a questão de saber se G. Meister pode invocar um direito à informação com base nas Diretivas 2000/43, 2000/78 e 2006/54 e, se for esse o caso, sobre as consequências de uma recusa de informação oposta pela Speech Design.

31      Nestas condições, o Bundesarbeitsgericht suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54[…], o artigo 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43[…] e o artigo 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78[…] devem ser interpretados no sentido de que tem de ser reconhecido a um trabalhador que alegue preencher os requisitos indicados pelo empregador para um determinado emprego, caso a sua candidatura não seja considerada, o direito a obter do empregador a informação sobre se admitiu outro candidato e, em caso afirmativo, com base em que critérios decidiu admiti‑lo?

2)      Caso a resposta à primeira questão seja afirmativa: o facto de o empregador não fornecer essa informação constitui uma circunstância que permite presumir a existência da discriminação alegada pelo trabalhador?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

32      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43, 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 e 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54 devem ser interpretados no sentido de que preveem o direito de um trabalhador, que alegue de forma plausível preencher os requisitos indicados num anúncio de recrutamento e cuja candidatura não tenha sido aceite, aceder à informação sobre se o empregador, no final do processo de recrutamento, contratou outro candidato e, se for esse o caso, com base em que critérios o contratou.

33      A título preliminar, importa recordar que resulta dos artigos 3.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2000/43, 3.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2000/78 e 1.°, segundo parágrafo, alínea a), e 14.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2006/54 que estas diretivas são aplicáveis a qualquer pessoa que procure emprego, incluindo no que respeita aos critérios de seleção e aos requisitos de recrutamento para esse emprego.

34      Estas mesmas diretivas dispõem, em substância, nos artigos 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43, 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 e 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54, que os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias, em conformidade com o respetivo sistema judicial, de forma a que, sempre que uma pessoa se considere lesada pela inobservância, a seu respeito, do princípio da igualdade de tratamento e demonstre, num órgão jurisdicional ou noutra instância competente, factos que permitem presumir a existência de uma discriminação direta ou indireta, incumba ao demandado provar que não houve violação do referido princípio.

35      Importa observar que a redação dessas disposições é praticamente idêntica à do artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 97/80/CE do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa ao ónus da prova nos casos de discriminação baseada no sexo (JO 1998, L 14, p. 6), disposição essa que o Tribunal de Justiça teve oportunidade de interpretar, designadamente, no acórdão de 21 de julho de 2011, Kelly (C‑104/10, Colet., p. I‑6813). Efetivamente, o referido artigo 4.°, n.° 1, que foi revogado pela Diretiva 2006/54 com efeitos a partir de 15 de agosto de 2009, bem como a Diretiva 97/80 na sua totalidade, sujeitava, no que respeita ao ónus da prova, os casos de discriminação baseada no sexo ao mesmo regime jurídico das diretivas em causa no processo principal.

36      Ao interpretar o artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 97/80, no seu acórdão Kelly, já referido, o Tribunal de Justiça declarou, no n.° 30 do mesmo, que é à pessoa que se considera lesada pela inobservância do princípio da igualdade de tratamento que incumbe, numa primeira fase, demonstrar factos que permitam presumir a existência de uma discriminação direta ou indireta. Só quando essa pessoa demonstrar esses factos é que cabe ao demandado, numa segunda fase, provar que não houve violação do princípio da não discriminação.

37      O Tribunal de Justiça considerou também que compete à instância jurisdicional nacional ou a outras instâncias competentes apreciar, em conformidade com o direito nacional e/ou com as práticas nacionais, os factos dos quais se possa deduzir que houve uma discriminação direta ou indireta (acórdão Kelly, já referido, n.° 31), conforme preveem o décimo quinto considerando das Diretivas 2000/43 e 2000/78 e o trigésimo considerando da Diretiva 2006/54.

38      Além disso, o Tribunal de Justiça sublinhou que a Diretiva 97/80, em conformidade com o disposto no seu artigo 1.°, visa garantir uma maior eficácia das medidas adotadas pelos Estados‑Membros, em aplicação do princípio da igualdade de tratamento, para que qualquer pessoa que se considere lesada pela não aplicação desse princípio, no que lhe diz respeito, possa fazer valer os seus direitos através da via judicial, eventualmente após recurso a outras instâncias competentes (acórdão Kelly, já referido, n.° 33). A este respeito, importa observar que os artigos 7.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43, 9.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 e 17.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54 se referem ao mesmo princípio.

39      Nestas condições, o Tribunal de Justiça, no n.° 34 do acórdão Kelly, já referido, concluiu que, embora o artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 97/80 não preveja, a favor de quem se considera lesado pela não aplicação do princípio da igualdade de tratamento, no que a si respeita, um direito específico de acesso a informações para poder apresentar «elementos de facto constitutivos da presunção de discriminação direta ou indireta» em conformidade com essa disposição, não é menos certo que não se pode excluir a possibilidade de a recusa de informação por parte da demandada, no âmbito da demonstração desses factos, comprometer a realização do objetivo prosseguido por essa diretiva e, nomeadamente, privar a dita disposição do seu efeito útil.

40      Conforme foi recordado no n.° 35 do presente acórdão, a Diretiva 97/80 foi revogada e substituída pela Diretiva 2006/54. Todavia, atendendo à redação e à sistemática dos artigos que são objeto do presente reenvio prejudicial, nenhum elemento permite concluir que, ao adotar as Diretivas 2000/43, 2000/78 e 2006/54, o legislador da União teve a intenção de alterar o regime relativo ao ónus da prova estabelecido no artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 97/80. Por conseguinte, no âmbito da demonstração dos factos que permitam presumir a existência de uma discriminação direta ou indireta, importa verificar se a recusa de informação por parte do demandado não cria o risco de comprometer a realização dos objetivos prosseguidos pelas Diretivas 2000/43, 2000/78 e 2006/54.

41      Nos termos, respetivamente, do segundo e terceiro parágrafos do artigo 4.°, n.° 3, TUE, os Estados‑Membros, designadamente, «tomam todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos atos das instituições da União» e «abstêm‑se de qualquer medida suscetível de pôr em perigo a realização dos objetivos da União», incluindo os prosseguidos pelas diretivas (v. acórdãos de 28 de abril de 2011, El Dridi, C‑61/11 PPU, Colet., p. I‑3015, n.° 56, e Kelly, já referido, n.° 36).

42      Assim, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio assegurar que a recusa de informação por parte da Speech Design, no âmbito da demonstração dos factos dos quais se possa deduzir que houve uma discriminação direta ou indireta em detrimento de G. Meister, não cria o risco de comprometer a realização dos objetivos prosseguidos pelas Diretivas 2000/43, 2000/78 e 2006/54. Incumbe‑lhe, designadamente, ter em conta todas as circunstâncias da causa no processo principal, a fim de determinar se existem indícios suficientes para que os factos dos quais se possa deduzir que houve essa discriminação sejam considerados provados.

43      A este respeito, importa recordar que, conforme decorre do décimo quinto considerando das Diretivas 2000/43 e 2000/78 e do trigésimo considerando da Diretiva 2006/54, o direito nacional ou as práticas nacionais dos Estados‑Membros podem prever, em especial, que a demonstração da discriminação indireta se possa fazer por quaisquer meios, incluindo os dados estatísticos.

44      Entre os elementos que podem ser tidos em conta figura, nomeadamente, o facto de, contrariamente ao que acontecia no processo que deu origem ao acórdão Kelly, já referido, o empregador em causa no processo principal parecer ter recusado a G. Meister o acesso à informação por ela solicitada.

45      Além disso, conforme notou o advogado‑geral nos n.os 35 a 37 das suas conclusões, podem também ser tidos em conta, nomeadamente, o facto de a Speech Design não contestar a adequação do nível de qualificação de G. Meister ao mencionado no anúncio de recrutamento, bem como a dupla circunstância de, apesar disso, o empregador não a ter convocado para uma entrevista de emprego e de a interessada também não ter sido convocada no âmbito do novo processo de seleção de candidatos para preencher o lugar em causa.

46      Em face do exposto, há que responder à primeira questão que os artigos 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43, 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 e 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54 devem ser interpretados no sentido de que não preveem o direito de um trabalhador, que alegue de forma plausível preencher os requisitos indicados num anúncio de recrutamento e cuja candidatura não tenha sido aceite, aceder à informação sobre se o empregador, no final do processo de recrutamento, contratou outro candidato.

47      Contudo, não se pode excluir a possibilidade de a recusa de acesso à informação por parte da demandada constituir um dos elementos a ter em conta no âmbito da demonstração dos factos que permitam presumir a existência de uma discriminação direta ou indireta. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio, tendo em conta todos os factos do litígio que lhe foi submetido, verificar se é esse o caso no processo principal.

 Quanto à segunda questão

48      Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio.

 Quanto às despesas

49      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

Os artigos 8.°, n.° 1, da Diretiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 de junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, 10.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, e 19.°, n.° 1, da Diretiva 2006/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2006, relativa à aplicação do princípio da igualdade de oportunidades e igualdade de tratamento entre homens e mulheres em domínios ligados ao emprego e à atividade profissional, devem ser interpretados no sentido de que não preveem o direito de um trabalhador, que alegue de forma plausível preencher os requisitos indicados num anúncio de recrutamento e cuja candidatura não tenha sido aceite, aceder à informação sobre se o empregador, no final do processo de recrutamento, contratou outro candidato.

Contudo, não se pode excluir a possibilidade de a recusa de acesso à informação por parte da demandada constituir um dos elementos a ter em conta no âmbito da demonstração dos factos que permitam presumir a existência de uma discriminação direta ou indireta. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio, tendo em conta todos os factos do litígio que lhe foi submetido, verificar se é esse o caso no processo principal.

Assinaturas


** Língua do processo: alemão.