Language of document : ECLI:EU:C:2011:736

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PEDRO CRUZ VILLALÓN

apresentadas em 16 de novembro de 2011 (1)

Processo C‑357/10

Duomo Gpa Srl

contra

Comune di Baranzate

Processo C‑358/10

Gestione Servizi Pubblici Srl

contra

Comune di Baranzate

Processo C‑359/10

Irtel Srl

contra

Comune di Venegono Inferiore

[pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Tribunale Amministrativo Regionale per la Lombardia (Itália)]

«Serviços no mercado interno — Liberdade de estabelecimento — Livre prestação de serviços — Concessão de serviços de liquidação, verificação e cobrança de impostos — Legislação nacional que exige um capital social mínimo à empresa concessionária — Aplicabilidade da Diretiva 2006/123 — Artigos 15.° e 16.° da Diretiva 2006/123 — Proporcionalidade»





I —    Introdução

1.        Os três processos ora apensos dizem respeito à compatibilidade entre o direito da União e uma disposição nacional por força da qual as empresas que pretendam obter a adjudicação de um serviço de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das autarquias locais devem ter um capital social mínimo, integralmente realizado, de dez milhões de euros, sob pena de, pura e simplesmente, não poderem participar no correspondente concurso ou, se for esse o caso, a adjudicação ser declarada nula.

2.        Mais precisamente, o tribunal de reenvio questiona‑nos sobre a compatibilidade da referida disposição nacional, por um lado, com os artigos 15.° e 16.° da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (2), e, por outro, com o direito primário.

3.        A integração desta Diretiva no direito da União tem vindo a suscitar diversas questões: em primeiro lugar, sobre o seu caráter harmonizador (3), mas também sobre a sua aplicabilidade a situações meramente internas (4) e sobre o âmbito e a validade do artigo 16.° (5), entre outras. O presente processo não exige, no entanto, uma abordagem de todos, nem sequer da maioria, destas questões. Em especial e na hipótese de uma prestação de serviços sem recurso à liberdade de estabelecimento, irei propor que o Tribunal de Justiça, sem ter necessidade de «percorrer» neste momento todos os pontos referidos, aborde diretamente a compatibilidade da disposição nacional em questão com o direito da União do ponto de vista do princípio da proporcionalidade.

II — Quadro legal

A —    Direito da União: a Diretiva 2006/123

4.        A Diretiva 2006/123, chamada «Diretiva Serviços», estabelece «disposições gerais que facilitam o exercício da liberdade de estabelecimento dos prestadores de serviços e a livre circulação dos serviços, mantendo simultaneamente um elevado nível de qualidade dos serviços» (artigo 1.°, n.° 1).

5.        O seu capítulo III tem por objeto a liberdade de estabelecimento dos prestadores. O seu artigo 15.°, n.° 2, dispõe que «os Estados‑Membros devem verificar se os respetivos sistemas jurídicos condicionam o acesso a uma atividade de serviços ou o seu exercício ao cumprimento» de uma série de requisitos, entre os quais se encontram os «requisitos relativos à detenção do capital de uma sociedade» [alínea c)].

6.        O artigo 15.°, n.° 3, dispõe o seguinte:

«Os Estados‑Membros devem verificar se os requisitos referidos no n.° 2 observam as condições seguintes:

a)      Não discriminação: os requisitos não podem ser direta ou indiretamente discriminatórios, em razão da nacionalidade ou, tratando‑se de sociedades, do local da sede;

b)      Necessidade: os requisitos têm que ser justificados por uma razão imperiosa de interesse geral;

c)      Proporcionalidade: os requisitos têm que ser adequados para garantir a consecução do objetivo prosseguido, não podendo ir além do necessário para atingir este objetivo e não se podendo ser possível obter o mesmo resultado através de outras medidas menos restritivas».

7.        O capítulo IV da Diretiva está consagrado à livre circulação de serviços. O artigo 16.°, incluído naquele capítulo, tem por título «Livre prestação de serviço», e dispõe o seguinte no seu n.° 1:

«Os Estados‑Membros devem respeitar o direito de os prestadores prestarem serviços num Estado‑Membro diferente daquele em que se encontram estabelecidos.

O Estado‑Membro em que o serviço é prestado deve assegurar o livre acesso e exercício da atividade no setor dos serviços no seu território.

Os Estados‑Membros não devem condicionar o acesso ou o exercício de atividades no setor dos serviços no seu território ao cumprimento de qualquer requisito que não respeite os seguintes princípios:

a)      Não discriminação: o requisito não pode ser direta o indiretamente discriminatório em razão da nacionalidade ou, no que respeita às pessoas coletivas, em razão do Estado‑Membro em que estão estabelecidas;

b)      Necessidade: o requisito tem que ser justificado por razões de ordem pública, de segurança pública, de saúde pública ou de proteção do ambiente;

c)      Proporcionalidade: o requisito tem que ser adequado para garantir a consecução do objetivo prosseguido, não podendo ir além do necessário para o conseguir.»

B —    Legislação italiana

8.        O artigo 32.°, n.° 7 A, do Decreto‑lei n.° 185, de 29 de novembro de 2008 (6), ratificado pela Lei n.° 2 de 28 de janeiro de 2009 (7), dispunha o seguinte:

«Nos termos do n.° 3 do artigo 53.° do Decreto Legislativo n.° 446, de 15 de dezembro de 1997, conforme alterado, as empresas inscritas no registo dos sujeitos de direito privado habilitados para proceder à liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das províncias e das autarquias locais, devem possuir um capital social mínimo, integralmente realizado, de dez milhões de euros. Estão excluídas deste limite as sociedades com capital social maioritariamente público. É nula a adjudicação de serviços de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades a empresas que não satisfaçam o referido requisito financeiro. As empresas inscritas no registo devem proceder ao correspondente aumento do seu capital social para o limite mínimo estabelecido. Em qualquer caso, enquanto não procederem ao referido aumento não lhes poderá ser atribuída qualquer adjudicação nem poderão participar em concursos com esse objetivo.»

9.        Esta disposição foi revogada pelo artigo 3.° A, n.° 3, do Decreto‑lei n.° 40, de 25 de março de 2010 (8), ratificado pela Lei n.° 73, de 22 de maio de 2010 (9). A nova regulamentação exige um capital social mínimo que varia consoante o número de habitantes da autarquia local em questão.

III — Os litígios principais e as questões prejudiciais

10.      Os processos C‑357/10 e C‑358/10 têm origem no anúncio, pelo município de Baranzate (Itália), da abertura de um concurso para a adjudicação de uma concessão do serviço de gestão, verificação e cobrança de determinados impostos e outras receitas locais durante o período de cinco anos compreendido entre 1 de maio de 2009 e 30 de abril de 2014. O valor dos serviços para a totalidade do período foi estimado em 57.000 euros. Seis empresas privadas, todas elas estabelecidas em Itália, apresentaram propostas. Entre elas encontravam‑se as empresas Duomo Gpa Srl (a seguir, «Duomo»), Gestione Servizi Pubblici Srl (a seguir «GSP») e Agencia Italiana per le Pubbliche Amministrazioni SpA (a seguir AIPA). Em 1 e 3 de abril de 2009, o município de Baranzate comunicou à Duomo e à GSP que tinham sido excluídas do concurso por não preencherem a condição prevista no artigo 32.°, n.° 7 A, do Decreto‑lei n.° 185/08.

11.      O processo C‑359/10 tem origem no anúncio de um concurso idêntico pelo município de Venegono Inferiore. Nesse caso tratava‑se de adjudicar a concessão do serviço de liquidação, verificação e cobrança ordinária e coerciva do imposto municipal sobre a publicidade e da taxa sobre a colocação de anúncios públicos, correspondentes ao período de quatro anos compreendido entre 23 de fevereiro de 2009 e 31 de dezembro de 2012, num montante previsto de 48.765 euros no total. Entre as empresas que apresentaram propostas encontravam‑se a Irtel SpA (a seguir «Irtel») e a AIPA. Em 9 de março de 2009, a entidade adjudicante decidiu excluir a Irtel do concurso por esta não preencher a condição prevista no artigo 32.°, n.° 7 A, do Decreto‑lei n.° 185/08.

12.      A Duomo, a GSP e a Irtel interpuseram recurso das decisões de exclusão dos referidos processos de adjudicação.

13.      O Tribunale Amministrativo Regionale per la Lombardia suspendeu a instância dos processos em causa, a fim de submeter relativamente a cada um deles as seguintes questões prejudiciais:

«A)      Obstam à correta aplicação dos artigos 15.° e 16.° da Diretiva 2006/123/CE as disposições nacionais do artigo 32.°, n.° 7 A, do [Decreto‑lei] n.° 185, de 29 de novembro de 2008, [ratificado pela Lei] n.° 2, de 28 de janeiro de 2009, conforme alterado pela Lei n.° 14, de 27 de fevereiro de 2009, que, [com exclusão das] sociedades com [capital social] maioritariamente públic[o], preveem:

—      a nulidade da adjudicação de serviços de liquidação, [verificação] e cobrança de impostos e outras receitas das [coletividades] locais a empresas que não tenham um capital [social] mínimo, integralmente realizado, de 10 milhões de euros;

—      a obrigação de [os sujeitos] inscrit[o]s no registo dos sujeitos de direito privado habilitados [para] proceder à liquidação e [verificação] dos impostos e [à] cobrança de impostos e outras receitas das [províncias e das] autarquias […], aumentarem o [seu] capital [social] para o referido montante mínimo;

—      a proibição [de obter] novas adjudicações ou de participação em concursos para a adjudicação de serviços de liquidação, [verificação] e cobrança de impostos e outras receitas das [coletividades] locais, enquanto não tiver sido cumprida a referida obrigação de aumento do capital?

B)      Obstam à correta aplicação dos artigos 3.°, 10.°, 43.°, 49.° e 81.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia as disposições nacionais do artigo 32.°, n.° 7A, do [Decreto‑lei] n.° 185, de 29 de novembro de 2008, [ratificado pela Lei] n.° 2, de 28 de janeiro de 2009, conforme alterado pela [L]ei n.° 14, de 27 de fevereiro de 2009, que, [com exclusão das] sociedades com [capital social] maioritariamente públic[o], preveem:

—      a nulidade da adjudicação de serviços de liquidação, [verificação] e cobrança de impostos e outras receitas das [coletividades] locais a empresas que não tenham um capital [social] mínimo, integralmente realizado, de 10 milhões de euros;

—      a obrigação de [o sujeitos] inscrit[o]s no registo dos sujeitos de direito privado habilitados a proceder à liquidação [e verificação] de impostos e [à cobrança de impostos e] outras receitas das [províncias e das] autarquias locais […], nos termos do n.° 3 do artigo 53.° do Decreto legislativo n.° 446, de 15 de dezembro de 1997, e posteriores alterações, aumentarem o capital [social] para o referido montante mínimo;

—      a proibição da atribuição de novas adjudicações ou de participação em concursos para a adjudicação de serviços de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das [coletividades] locais, enquanto não tiver sido cumprida a referida obrigação de aumento do capital?»

IV — Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

14.      Os pedidos de decisão prejudicial deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 19 de julho de 2010.

15.      Depositaram observações escritas o município de Baranzate, os Governos italiano e neerlandês e a Comissão.

V —    Análise das questões prejudiciais

16.      As duas questões suscitadas nas presentes decisões de reenvio dizem respeito, respetivamente e como já indiquei, à compatibilidade entre uma mesma disposição nacional e as liberdades de estabelecimento e de prestação de serviços tal como se encontram regulamentadas na Diretiva Serviços, em primeiro lugar, e tal como resultam diretamente do Tratado, em segundo lugar.

17.      Embora a segunda pergunta não seja formalmente subsidiária da primeira, não é descabido referir as eventuais dificuldades de aplicação da Diretiva aos casos em análise, que levaram o tribunal de reenvio a solicitar, em segundo lugar, o confronto da disposição nacional em causa com as referidas liberdades tal como resultam diretamente do Tratado.

A —    A primeira questão prejudicial

18.      A primeira questão prejudicial diz respeito à compatibilidade com os artigos 15.° e 16.° da Diretiva Serviços da norma italiana, já aqui várias vezes referida, por força da qual as empresas que pretendam obter a adjudicação de um serviço de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades devem ter um capital social mínimo, integralmente realizado, de dez milhões de euros, sob pena de não poderem participar no respetivo concurso ou, sendo esse o caso, a adjudicação ser declarada nula.

19.      Os mencionados preceitos da Diretiva fazem parte, respetivamente, da regulamentação, diferente para cada um dos casos, das duas «situações» em que se pode encontrar o prestador de serviços: a situação «liberdade de estabelecimento» e a situação «livre prestação de serviços», sujeitas a regimes jurídicos um pouco diferentes (10). Mas, antes de abordar a questão relativa de saber qual dos preceitos é relevante para efeitos do presente processo, ou se ambos o são, há que verificar a aplicabilidade da Diretiva em si.

1.      A questão da aplicabilidade da Diretiva Serviços

20.      A aplicabilidade da Diretiva Serviços foi questionada, fundamentalmente, a partir de dois pontos de vista diferentes: um de ordem temporal e outro de ordem material.

a)      Objeções temporais: disposição nacional adotada durante o prazo de transposição

21.      Tanto a aprovação da disposição nacional em causa como o início dos processos de adjudicação e as decisões de exclusão das empresas recorrentes ocorreram antes de 28 de dezembro de 2009, data do termo do prazo de transposição da Diretiva Serviços (artigo 44.°, n.° 1).

22.      Esta circunstância é, todavia, irrelevante do ponto de vista da liberdade de estabelecimento, uma vez que o artigo 15.°, n.° 6, da Diretiva estabelece que «a partir de 28 de dezembro de 2006, os Estados‑Membros só podem introduzir quaisquer novos requisitos do tipo referido no n.° 2, se os mesmos estiverem em conformidade com as condições previstas no n.° 3». Consequentemente, o requisito controvertido, introduzido posteriormente a esta data, já deve ser avaliado à luz do artigo 15.° da Diretiva.

23.      No caso das disposições relativas à livre prestação de serviços, não consta da Diretiva qualquer cláusula de stand still equivalente a esta, o que não obsta a que a anterior conclusão possa aqui ser reiterada. Em conformidade com os acórdãos de 18 de dezembro de 1997, Inter‑Environnement Wallonie (11), e de 5 de abril de 2011, Société fiduciaire nationale d’expertise comptable (12), durante o prazo de transposição os Estados‑Membros devem abster‑se de adotar disposições «suscetíveis de comprometer seriamente o resultado prescrito» por uma Diretiva.

24.      Quanto ao restante, há que ter em conta que, no caso em análise, não parece que a disposição nacional tenha sido aprovada com caráter transitório (de facto, foi adotada quando já só faltava um ano para o termo do prazo de transposição da Diretiva) (13). O curto período de vigência da norma controvertida não é, por conseguinte, suficiente para considerar que se tratava de uma simples «etapa» na transposição da Diretiva (14), nem para afirmar que não podia «comprometer seriamente o resultado prescrito» pela Diretiva: se atentarmos na redação dos dois acórdãos referidos, determinante não é que a medida tenha efetivamente comprometido o resultado da Diretiva, mas sim que o pudesse ter feito (se se tivesse mantido em vigor).

b)      Objeções materiais: as hipóteses «excluídas» do âmbito de aplicação da Diretiva Serviços

25.      Como acertadamente lembra a Comissão, a atividade de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades locais constitui em Itália um «serviço» na aceção do artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva, incluído, assim, dentro do seu âmbito de aplicação (artigo 2.°, n.° 1).

26.      No entanto, a aplicabilidade da Diretiva «Serviços também se depara com várias objeções de ordem material, relacionadas com a invocação de várias exceções ao âmbito de aplicação daquela. Como as referidas cláusulas excecionais, estas derrogações devem ser interpretadas de forma estrita e, de qualquer forma, sem recorrer à analogia. Nenhuma das que aqui foram invocadas resulta, em meu entender, relevante no presente caso.

27.      Em primeiro lugar há que salientar que, apesar da sua evidente relação com o exercício do poder tributário, a referida atividade de liquidação, verificação e cobrança de impostos não pode ser considerada uma atividade excluída do âmbito de aplicação da Diretiva por estar «ligada ao exercício da autoridade pública» na aceção do artigo 51.° TFUE [artigo 3.°, n.° 2, alínea i)], da Diretiva Serviços. De acordo com uma vasta jurisprudência, a exceção prevista no referido artigo do Tratado não pode ser estendida a funções meramente auxiliares e preparatórias relativamente à entidade que exerce efetivamente a autoridade pública ao tomar a decisão final. O Tribunal de Justiça esclareceu ainda que a possibilidade de invocar o artigo 51.° TFUE fica excluída quando os organismos privados em questão exerçam funções de autoridade pública «sob a supervisão ativa da autoridade pública competente» (15). É evidente que o direito italiano reserva o exercício dos poderes tributários propriamente ditos aos entes públicos, considerando a cobrança de determinados impostos como uma atividade auxiliar que pode ser prestada na modalidade de gestão indireta, sob a tutela daqueles, e que, por conseguinte, está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva.

28.      O caso em análise também não pode ser excluído do âmbito de aplicação da Diretiva Serviços tendo em conta o seu artigo 2.°, n.° 3, o qual dispõe que a Diretiva não se aplica «em matéria de fiscalidade». Segundo resulta do vigésimo nono considerando, esta derrogação exclui a aplicação da Diretiva às medidas fiscais adotadas pelos Estados‑Membros, que se regem pelas disposições específicas do Tratado. Pelo contrário, as atividades administrativas desenvolvidas, como esta, no campo da «fiscalidade», estão abrangidas pelo âmbito de aplicação da Diretiva, da mesma forma que as atividades de consultoria fiscal, especificamente mencionadas no trigésimo terceiro considerando da Diretiva.

29.      Por último, também não parece aqui relevante a exceção prevista no artigo 17.°, n.° 5, da Diretiva, nos termos do qual o artigo 16.° não é aplicável à «atividade de cobrança judicial de dívidas», uma vez que é desenvolvida sem intervenção das autoridades judiciárias. 

30.      Por conseguinte, face às considerações anteriormente expostas, temos que concluir que a Diretiva Serviços é aplicável ao caso em análise.

2.      As liberdades em questão: duas situações possíveis no que respeita ao prestador do serviço

31.      A disposição nacional controvertida configura claramente um «requisito» na aceção da Diretiva Serviços, dirigido aos prestadores do serviço em causa. Por outras palavras, o regime das condições de prestação do serviço contém uma exigência iniludível, a qual deve superar um controlo de compatibilidade com a Diretiva enquanto «requisito». Acontece, todavia, que a Diretiva prevê estes «requisitos» separadamente para as duas situações em que a prestação do serviço pode ter lugar: a situação «liberdade de estabelecimento» e a situação «livre prestação de serviços». Isto transparece já na própria formulação da primeira questão do órgão de reenvio, ao aludir tanto ao artigo 15.° como ao artigo 16.° da Diretiva. Assim sendo, convém determinar se a disposição controvertida deve ou não ser analisada exclusivamente sob o ponto de vista de uma ou outra liberdade.

32.      Numa primeira abordagem, o caso preenche as condições exigidas pela jurisprudência para aplicar a liberdade de estabelecimento (16). Com efeito, por um lado, as concessões em causa tinham uma duração bastante longa (de quatro e cinco anos, respetivamente); por outro lado, parece difícil que uma atividade como a cobrança de impostos possa ser levada a cabo sem um estabelecimento ou «instalação estável» no município em causa ou, pelo menos, no território nacional.

33.      Ora, no que respeita à duração da atividade, há que ter em conta que o conceito de serviço na aceção do Tratado pode incluir aqueles «cuja prestação se efetua ao longo de um período alargado» (17). Apenas «uma atividade exercida a título permanente ou, em todo o caso, sem limitação previsível de duração não pode caber no âmbito das disposições comunitárias em matéria de prestação de serviços» (18): Por conseguinte, a previsão de que a atividade se desenvolva durante quatro ou cinco anos não é suficiente.

34.      Também não é absolutamente determinante a circunstância de se dispor de uma certa base física no Estado onde é desenvolvida a atividade. Nos termos do acórdão Gebhard, não deve excluir‑se «a possibilidade de o prestador de serviços, na aceção do Tratado, se dotar, no Estado‑Membro de acolhimento, de uma certa infraestrutura (incluindo um escritório ou gabinete), na medida em que essa infraestrutura seja necessária para os efeitos da realização da prestação em causa» (19).

35.      Em face do anteriormente exposto, e na medida em que não se pode excluir que, neste caso, a prestação do serviço pode ter lugar tanto numa como noutra situação, entendo que a disposição controvertida deve ser analisada, tal como solicita o tribunal italiano, à luz quer da liberdade de estabelecimento quer da livre prestação de serviços (artigos 15.° e 16.° da Diretiva Serviços) (20).

3.      Análise da disposição controvertida à luz do artigo 15.° da Diretiva Serviços (liberdade de estabelecimento)

36.      A Diretiva Serviços optou por listar as restrições à liberdade de estabelecimento que, utilizando a terminologia clássica do Tribunal de Justiça, não são suscetíveis de justificação, e as que podem sê‑lo desde que preencham uma série de condições. Assim, o artigo 14.° enumera os chamados «requisitos proibidos», entre os quais se encontram os discriminatórios, o de nacionalidade ou o de residência, por exemplo. Os Estados‑Membros não podem sujeitar o acesso a uma atividade de serviços ou o seu exercício ao cumprimento de qualquer destes requisitos. O artigo 15.°, n.° 2, pelo contrário, enumera uma série de requisitos que os Estados‑Membros podem manter desde que cumpram as condições contidas no n.° 3.

37.      Entre os requisitos sujeitos a essa «avaliação» ou prova, o artigo 15.°, n.° 2, alínea c), refere os relativos à «detenção do capital de uma sociedade». O requisito que a disposição controvertida impõe aos candidatos à adjudicação de uma concessão como a que está aqui em causa (dispor de um capital mínimo, integralmente realizado, de 10 milhões de euros) pode facilmente considerar‑se incluída nesse conceito. Por conseguinte, importa apreciar se observa as condições previstas no artigo 15.°, n.° 3, da Diretiva: não discriminação, necessidade e proporcionalidade.

a)      Não discriminação

38.      Como já foi dito, a norma controvertida é aplicável a nacionais e não nacionais. O requisito não é, assim, discriminatório do ponto de vista da nacionalidade (nem da sede social), direta ou indiretamente (21).

b)      A condição da «necessidade» ou o objetivo invocado

39.      Sob a rubrica «necessidade», a Diretiva Serviços refere a tradicional condição de que o requisito possa ser justificado por um objetivo legítimo (22).Mais especificamente, no campo da liberdade de estabelecimento esta condição da «necessidade» refere que «os requisitos têm que ser justificados por uma razão imperiosa de interesse geral» [artigo 15.°, n.° 3, alínea b)]. Em conformidade com o artigo 4.°, n.° 8, da Diretiva, por «razões imperiosas de interesse geral» deve entender‑se quaisquer «razões reconhecidas como tal pela jurisprudência do Tribunal de Justiça» incluindo as que enumera em seguida (23). Esta lista é, todavia, meramente exemplificativa: parece evidente que a intenção da Diretiva não foi limitar o elenco de razões imperiosas de interesse geral às expressamente mencionadas no seu artigo 4.°, mas sim fazer referência a uma categoria genérica que sempre tem sido considerada aberta pela jurisprudência.

40.      No caso vertente, as autoridades italianas argumentam que o requisito do capital social mínimo aqui em causa é necessário para proteger os interesses económicos dos municípios que «externalizam» o serviço de liquidação, verificação e cobrança face ao risco de, no momento de transferir as quantias cobradas para os cofres públicos, as sociedades concessionárias não poderem fazê‑lo por se encontrarem numa situação de insolvência

41.      Esta justificação invocada pelas autoridades italianas poderia, assim, ser considerada uma «razão imperiosa de interesse geral» do ponto de vista do artigo 15.° da Diretiva Serviços e capaz, em princípio, de legitimar o requisito controvertido do ponto de vista da liberdade de estabelecimento.

c)      O teste de proporcionalidade

42.      Questão distinta é a da condição da proporcionalidade.

43.      Em conformidade com a jurisprudência sobre a justificação de restrições às liberdades do Tratado, o artigo 15.°, n.° 3, alínea c), da Diretiva exige que os requisitos sejam adequados para garantir a consecução do objetivo prosseguido, não indo além do necessário para alcançar este objetivo e não sendo possível obter o mesmo resultado através de outras medidas menos restritivas.

44.      Não há qualquer objeção relativamente à conformidade do requisito aqui em causa com o objetivo invocado pelas autoridades italianas, isto é, a proteção dos interesses financeiros dos municípios. Com efeito, não se pode esquecer que as quantias cobradas não são entregues imediatamente ao município, decorrendo um lapso de tempo entre a cobrança e essa entrega (24) durante o qual o concessionário pode utilizar os fundos para efetuar operações financeiras que lhe deem lucro e que, eventualmente, impliquem um risco. Nesses casos, o capital social da concessionária seria uma garantia adequada para o município credor.

45.      Apesar desta «adequação» ao objetivo, a medida controvertida enferma de uma falta de proporcionalidade a dois níveis diferentes.

46.      Em primeiro lugar, o requisito de um capital mínimo, integralmente realizado, de dez milhões de euros vai além do necessário para alcançar o objetivo de proteger a administração pública face a um eventual incumprimento da sociedade concessionária do serviço. Na minha opinião, o problema reside não tanto no elevado valor da quantia fixada mas sim no caráter absolutamente indiferenciado da medida, que impõe o mesmo requisito quantitativo independentemente das quantias que devem ser cobradas e, em última análise, da quantificação económica do risco a que se expõe o município credor.

47.      Efetivamente, é difícil determinar in abstracto se a soma de dez milhões de euros constitui uma quantificação adequada da «garantia» financeira que o concessionário privado deve oferecer ao município, mas, em todo o caso, parece evidente que, se o objetivo prosseguido é oferecer à administração pública uma espécie de «aval» face ao risco de as quantias efetivamente cobradas pelo concessionário não serem transferidas atempadamente para os cofres públicos, o montante desse aval ou garantia deveria variar em função da importância do referido risco. Ora, dado que a avaliação do risco subjetivo representado pelo incumprimento do concessionário não parece uma variável facilmente mensurável ou previsível (25), o mais adequado seria partir de uma valoração do risco objetivo, isto é, da capacidade de cobrança do município em causa, pois quanto maior for a quantia que o concessionário possa cobrar, maior poderá ser o prejuízo causado à administração local no caso de falta ou atraso no pagamento.

48.      A partir daí, a quantificação dessa capacidade de cobrança (e, em última análise, do risco objetivo assumido pelo município) pode ser feita de uma forma mais ou menos exata, tendo exclusivamente em consideração o número de contribuintes do município em causa ou acrescentando outros fatores (estimativas dos montantes cobrados em exercícios anteriores, por exemplo), efetuando uma determinação ad casum do requisito ou então operando por grupos ou parcelas, mas o que é evidente é que, de uma ou de outra forma, apenas se pode considerar proporcionada uma garantia cujo montante seja fixado proporcionalmente ao risco potencial que se pretende cobrir.

49.      Previsivelmente, com uma solução deste tipo acabaria por se concluir que uma garantia de dez milhões de euros não é necessária em todos os casos (26). Se assim for, o requisito controvertido seria desproporcionado na medida em que exclui as empresas de pequena dimensão de qualquer possibilidade de acesso a esta atividade.

50.      Em segundo lugar, considero que o objetivo de garantir os interesses económicos dos municípios afetados poderia ser alcançado através de outras medidas menos restritivas que, além disso, parecem já existir na legislação italiana sobre contratos públicos. O tribunal de reenvio fez referência, efetivamente, ao Decreto Legislativo n.° 163, de 12 de abril de 2006 (27), no qual são estabelecidos requisitos gerais para a participação em processos de adjudicação que também podem servir de garantia, como sejam a constituição de cauções, a prova da capacidade técnica e financeira, solvência e fiabilidade, etc.

51.      Perante o que foi anteriormente exposto, impõe‑se concluir que o artigo 15.° da Diretiva Serviços se opõe a uma disposição nacional como a que está aqui em causa.

4.      Análise da disposição controvertida à luz do artigo 16.° da Diretiva Serviços (livre prestação de serviços)

52.      A análise da disposição controvertida à luz da regulamentação da livre prestação de serviços contida no artigo 16.° da Diretiva é, em certa medida, paralela à que se acaba de fazer relativamente à liberdade de estabelecimento e conduz à mesma conclusão de incompatibilidade com a Diretiva, por falta de proporcionalidade. O regime da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços apresentam, todavia, algumas diferenças que é preciso referir.

53.      A primeira diferença provém do facto de que, ao contrário do artigo 15.° da Diretiva Serviços, o artigo 16.° contém apenas, no seu n.° 2, uma lista com seis tipos de requisitos (28), entre os quais não figura o requisito relativo ao capital social. Nada impede, todavia, que se entenda que o mesmo se inclui entre os requisitos previstos, com caráter geral, no n.° 1 deste artigo, cujo terceiro parágrafo, dispõe que «os Estados‑Membros não devem condicionar o acesso ou o exercício de atividades no setor dos serviços no seu territórios ao cumprimento de qualquer requisito que não respeite» os princípios da não discriminação, necessidade e da proporcionalidade. A análise consiste novamente, portanto, no exame destas três condições.

54.      A segunda diferença diz respeito à definição da condição «necessidade», muito mais estrita no campo da livre prestação de serviços que no da liberdade de estabelecimento. Contrariamente ao artigo 15.°, n.° 3, o artigo 16.°, n.° 1, alínea b), não faz uma remissão genérica para as «razões imperiosas de interesse geral» definidas pela jurisprudência, incorporando no seu lugar una lista aparentemente limitativa de objetivos suscetíveis de justificar o requisito em causa: «razões de ordem pública, de segurança pública, de saúde pública ou de proteção do ambiente» (29).

55.      Este enunciado suscita a questão de saber se um objetivo como o alegado a respeito do requisito controvertido pode ser subsumido em qualquer das quatro categorias mencionadas. Do mesmo modo que nada impede que se ponha em causa o caráter limitativo desta lista do artigo 16.°, n.° 1, alínea b), ou, inclusivamente, a sua compatibilidade com as disposições do Tratado e, em última análise, a própria validade da Diretiva neste ponto (30).

56.      Ora, a aplicação do teste de proporcionalidade não varia no caso da livre prestação de serviços relativamente ao pressuposto da liberdade de estabelecimento, sendo que, como já se referiu, a disposição controvertida não supera esse teste quanto a este último aspeto. Por tudo isto, proponho que, no caso da livre prestação de serviços, ao Tribunal de Justiça aplique diretamente o teste de proporcionalidade nos termos referidos nos números 45 a 50 das presentes conclusões, sem necessidade de abordar previamente a questão da legitimidade do objetivo invocado.

57.      De qualquer modo, por conseguinte, o artigo 16.° da Diretiva Serviços também se opõe a uma disposição nacional como a que está aqui em causa.

5.      Conclusão na primeira questão prejudicial

58.      Face às considerações precedentes, impõe‑se concluir que os artigos 15.° e 16.° da Diretiva Serviços se opõem a uma disposição nacional por força da qual as empresas que pretendam obter a adjudicação de um serviço de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades locais devem ter um capital social mínimo, integralmente realizado, de dez milhões de euros.

B —    A segunda questão prejudicial

59.      Na sua segunda questão prejudicial, o tribunal de reenvio recorre ao direito primário como parâmetro de legalidade, perguntando se a norma controvertida é compatível com os artigos 3.° CE, 10.° CE, 43.° CE, 49.° CE e 81.° CE.

60.      Na minha opinião, a parte desta segunda questão prejudicial que se refere aos artigos 3.° CE (31), 10.° CE (32) e 81.° CE (artigo 101.° TFUE) deve ser declarada inadmissível em razão da falta de indicações suficientes sobre o quadro jurídico e factual que permitam submeter a disposição controvertida às regras do Tratado sobre a concorrência. Com efeito, estas exigências, constantes da jurisprudência, «são particularmente válidas no domínio da concorrência, que se caracteriza por situações de facto e de direito complexas» (33). Excluídos estes preceitos, a segunda questão prejudicial fica limitada aos artigos 43.° CE e 49.° CE (artigos 49.° TFUE e 56.° TFUE), isto é, à compatibilidade da disposição controvertida com a liberdade de estabelecimento e a livre prestação de serviços.

61.      Uma vez reduzida a estes estritos termos e na medida em que concluímos que a Diretiva Serviços é aplicável ao caso vertente, não é necessário dar resposta a esta segunda questão prejudicial. Com efeito, não se deve esquecer que, em conformidade com uma vasta jurisprudência (34), as regras sobre liberdades contidas no Tratado não se aplicam nos domínios que tenham sido objeto de harmonização pelo legislador da União (35).

62.      De qualquer modo, mesmo que se entendesse que a Diretiva Serviços não é aplicável, uma análise da disposição controvertida à luz do Tratado não diferiria, no essencial, do que se disse no número anterior: o problema continuaria a ser a proporcionalidade da medida restritiva adotada.

63.      Desde logo, o caráter puramente interno dos litígios principais não podia ser oposto a uma aplicação «direta» do Tratado. É verdade que uma regulamentação nacional só é suscetível de «ser abrangida pelas disposições relativas às liberdades fundamentais previstas pelo Tratado na medida em que seja aplicável a situações que tenham uma ligação com as trocas comerciais intracomunitárias». Todavia, a jurisprudência também tem vindo a reconhecer que uma resposta do Tribunal de Justiça a uma questão sobre a compatibilidade deste tipo de normas com o Tratado pode ser útil ao órgão jurisdicional de reenvio quando a norma em causa se aplica indistintamente a nacionais e não nacionais (36).

64.      Além disso e na minha opinião, o facto de a disposição nacional controvertida já ter sido revogada não prejudica a conclusão anterior uma vez que não se pode excluir que sujeitos estabelecidos noutro Estado‑Membro possam ter sido afetados por ela durante o período em que esteve em vigor. Respondendo aqui às alegações de inadmissibilidade da questão prejudicial formuladas pelo Governo italiano, a resposta do Tribunal de Justiça é necessária para resolver os processos nacionais pendentes, entre os quais se encontram os que foram instaurados pela Duomo, a GSP e a Irtel.

65.      Em conclusão e, de qualquer modo, a título subsidiário, deve entender‑se que os artigos 49.° TFUE e 56.° TFUE se opõem a uma disposição nacional como a controvertida, que enferma de falta de proporcionalidade nos termos expostos nos números 45 a 50 destas conclusões.

VI — Conclusão

66.      Em conclusão, proponho que o Tribunal de Justiça responda às perguntas submetidas pelo Tribunale Amministrativo Regionale per la Lombardia nos seguintes termos:

«1)      É contrária aos artigos 15.° e 16.° da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, uma disposição nacional que, salvo no que respeita às sociedades em que o Estado detenha uma participação maioritária, prevê:

—      a nulidade da adjudicação de serviços de liquidação, verificação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades locais a empresas que não satisfaçam o requisito económico de um capital mínimo, integralmente realizado, de 10 milhões de euros;

—      a obrigação de as empresas inscritas no registo dos sujeitos de direito privado habilitados para exercer atividades de liquidação e verificação de impostos e outras receitas das coletividades locais aumentarem o seu capital social para o referido montante mínimo;

—      a proibição de as referidas empresas obterem a adjudicação ou participarem em concursos para a adjudicação de serviços de liquidação e cobrança de impostos e outras receitas das coletividades locais, enquanto não tiverem cumprido a referida obrigação de aumentar o seu capital social.

2)      A título subsidiário, uma disposição nacional como a descrita em 1) é contrária aos artigos 49.° TFUE e 56.° TFUE.»


1 —      Língua original: espanhol.


2 —      JO L 376, p.36 (a seguir «Diretiva Serviços» ou «Diretiva»).


3 —      Relativamente a este ponto, v. Barnard, C, «Unravelling the Services Directive», Common Maket Law Review, 2008, pp. 382‑383; van de Gronden, J. & de Waele, H, «All’s well that bends well: the constitucional dimension to the Services Directive», European Constitucional Law Review, 2010, p. 404; Klamert, M., «Of empty glasses and double burdens: approaches to regulating the Services Market à propos the implementation of the Services Directive», Legal Issues of Economic Integration 37, n.° 2 (2010), p. 129; e Mortelmans, K., «The relationship between the Treaty rules and Community measures for the establishment and functioning of the internal market — Towards a concordance rule», Common Market Law Review, 2002, pp. 1324 e segs.


4 —      V. Barnard, C, op. cit., p. 351; e De la Quadra‑Salcedo Janini, T. «Mercado interior y Diretiva de servicios», Revista catalana de dret públic, n.° 42, 2011, pp. 257‑293.


5 —      V. van de Gronden, J. e de Waele, H. op. cit., pp. 41 e segs.; e Peglow, K, «La libre prestation de services dans la directive n.° 2006/123/CE. Réflexion sur l’insertion dans le droit communautaire existant», Revue trimestrielle de droit européen, 2008, §§ 62 e segs.


6 —      Decreto legislativo sobre medidas de urgência para apoio às famílias, ao trabalho, ao emprego e às empresas, bem como para a redefinição do quadro estratégico nacional no contexto da luta contra a crise.


7 —      GURI n.° 22, de 28 de janeiro de 2009, suplemento ordinário n.° 14.


8 —      GURI n.° 71, de 26 de março de 2010.


9 —      GURI n.° 120, de 25 de maio de 2010.


10 —      Usarei esta terminologia, que considero adequada à inspiração de base de uma legislação da União cujo objeto essencial é a prestação de serviços, tanto num contexto de estabelecimento como noutro que dele prescinda.


11 —      Processo C‑129/96, Colet., p. I‑7411, n.os 45 e 46.


12 —      Processo C119/09, Colet., p. I‑2551, n.os 19 e 20.


13 —      V., a este respeito, acórdão de 14 de junho de 2007, Comissão/Bélgica (C‑422/05, Colet., p. I‑4749, n.os 64 a 68), no qual o Tribunal de Justiça teve em conta o facto de a norma nacional incompatível com uma Diretiva ter entrado em vigor menos de três meses antes da data do termo do prazo de transposição desta última.


14 —      A este respeito, v. o acórdão Inter‑Environnement Wallonie, já referido, n.° 49.


15 —      Acórdão de 22 de outubro de 2009, Comissão/Portugal (C‑438/08, Colet., p. I‑10219, n.os 36 e 37 e jurisprudência citada).


16 —      Acórdão de 25 de julho de 1991, Factortame (C‑221/89, Colet., p. I‑3905, n.° 20).


17 —      Acórdão de 11 de dezembro de 2003, Schnitzer (C‑215/01, Colet., p. I‑14847, n.os 30 e 31). V. também acórdãos de 29 de abril de 2004, Comissão/Portugal (C‑171/02, Colet., p. I‑5645, n.° 26); de 16 de julho de 2009, von Chamier‑Glisczinski (C‑208/07, Colet., p. I‑6095, n.° 74); de 26 de outubro de 2010, Schmelz (C‑97/09, Colet., p. I‑10465, n.° 42); e de 18 de novembro de 2010, Comissão/Portugal (C‑458/08 Colet., p. I‑11599, n.° 85).


18 —      Acórdãos de 5 de outubro de 1988, Steyman (196/87, Colet., p. 6159 n.° 16); Schnitzer, já referido, n.os 27 a 29; e de 7 de setembro de 2004, Trojani (C‑456/02, Colet., p. I‑7573, n.° 28).


19 —      Acórdão de 30 de novembro de 1995 (C‑55/94, Colet., p. I‑4165, n.° 27). V. também septuagésimo sétimo considerando da Diretiva.


20 —      O Tribunal de Justiça analisa a norma controvertida apenas à luz de uma das liberdades quando que uma delas é completamente secundária em relação à outra e lhe pode ser subordinada. V. acórdãos de 24 de março de 1994, Schindler (C‑275/92, Colet., p. I‑1039, n.° 22); de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital (C‑390/99, Colet., p. I‑607, n.° 31); e de 3 de outubro de 2006, Fidium Finanz (C‑452/04, Colet., p. I‑9521, n.° 34).


21 —      A eventual discriminação das empresas privadas face às empresas de capital maioritariamente público (às quais não se exige este requisito) não seria relevante, no que respeita a esta primeira condição, uma vez que a Diretiva se refere exclusivamente à discriminação em razão da nacionalidade ou da sede social. De resto, a diferença de tratamento poderia ser justificada à luz do objetivo e, de qualquer forma, não é uma questão que se coloque diretamente neste processo.


22 —      Isto pode gerar uma certa confusão, tendo em conta que o teste da «necessidade» tem sido tradicionalmente considerado como uma das fases ou partes do teste da proporcionalidade.


23 —      São elas: «ordem pública; segurança pública e segurança das pessoas; saúde pública; preservação do equilíbrio financeiro do regime de segurança social; defesa dos consumidores; dos destinatários dos serviços e dos trabalhadores; lealdade das transacções comerciais; combate à fraude; proteção do ambiente e do ambiente urbano; saúde animal; propriedade intelectual; conservação do património histórico e artístico nacional; objetivos de política social e de política cultural».


24 —      As entregas são feitas no final de cada trimestre.


25 —      E, em certa medida, o legislador italiano já teve em conta esta circunstância, ao excluir a aplicação do requisito no caso de empresas com capital maioritariamente pública, garantidas pelos cofres públicos.


26 —      O legislador italiano acabou por assumir implicitamente esta falta de proporcionalidade ao alterar, em 2010, a disposição controvertida. A nova regulamentação, constante da Lei n.° 73 de 2010, já referida, desdobra o requisito do capital mínimo em função do número de habitantes do município em causa, de modo que agora apenas é exigido um capital de dez milhões de euros quando se pretende desenvolver a atividade em províncias ou municípios com mais de 200.000 habitantes (caso se trate de cobrança para um município com menos de 100 000 habitantes ou para vários que, em conjunto, não ultrapassem os 100 000, a quantia exigida é de um milhão de euros; caso se trate de municípios com menos de 200 000 habitantes, cinco milhões de euros).


27 —      Codice dei contratti pubblici relativi ai lavori, servizi, forniture in attuazione delle direttive 2004/17/CE e 2004/18/CE (GURI n.° 100, de 2 de maio de 2006),


28 —      Aparentemente, trata‑se de requisitos suscetíveis de justificação, pois o artigo 16.°, n.° 3, dispõe que «O Estado‑Membro para onde o prestador se desloca não está impedido de impor requisitos que sejam justificados por razões de ordem pública, de segurança pública ou de proteção do ambiente, em conformidade com o n.° 1. […]».


29 —      Excetuada a proteção do ambiente, cuja natureza de objetivo de interesse geral foi consagrada pela jurisprudência, os três objetivos restantes coincidem com os previstos no artigo 52.° TFUE (aplicável também à livre prestação de serviços por força do artigo 62.° TFUE).


30 —      Nas suas conclusões no processo Société fiduciaire nationale d’expertise comptable, já referido, apresentadas em 18 de maio de 2010, o advogado‑geral J. Mazák já sublinhara que o eventual carácter limitativo da lista do artigo 16.°, n.° 1, alínea b), podia ser incoerente com outras disposições da própria Diretiva Serviços, em especial com o seu artigo 24.°, n.° 2: «À primeira vista, pareceria que as regrar profissionais que constituam um obstáculo à livre prestação de serviços só poderiam ser justificadas pelas quatro razões mencionadas no artigo 16.°, n.° 1, alínea b), da Diretiva 2006/123. Ora, tal interpretação teria por consequência a impossibilidade da realização do artigo 24.°, n.° 2, primeira frase, da Diretiva 2006/123, que enuncia as razões justificativas da existência de regras deontológicas tais como, no caso vertente, a proibição da angariação de clientela, ou seja, proteção da independência, da dignidade e da integridade da profissão regulamentada, bem como do sigilo profissional. É impossível exigir que as mesmas regras deontológicas respeitem, simultaneamente, as mesmas razões» (n.° 62).


31 —      Atualmente revogado. O seu conteúdo foi integrado nos artigos 3.° TFUE a 6.° TFUE.


32 —      Atualmente revogado. O seu conteúdo foi integrado no artigo 4.°, n.° 3, TUE, relativo à cooperação leal.


33 —      Acórdãos de 26 de janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o. (C‑320/90 a C‑322/90, Colet., p. I‑393, n.° 7); de 13 de abril de 2000, Lehtonen et Castors Braine (C‑176/96, Colet., p. I‑2681, n.° 22); de 17 de fevereiro de 2005, Viacom Outdoor (C‑134/03, Colet., p. I‑1167, n.° 23); de 23 de novembro de 2006, Asnef‑Equifax y Administración del Estado (C‑238/05, Colet., p. I‑11125, n.° 3); de 13 de dezembro de 2007, United Pan‑Europe Communications Belgium e outros (C‑250/06, Colet., p. I‑11135, n.° 20); e de 11 de março de 2010, Attanasio Group (C‑384/08, Colet., p. I‑2055, n.° 32).


34 —      V., neste sentido, acórdãos de 5 de outubro de 1977, Tedeschi (5/77, Colet., p. 1555, n.° 35); de 23 de novembro de 1989, Parfümeriefabrik 4711 (C‑150/88, Colet., p. 3891, n.° 28); de 12 de outubro de 1993, Vanacker e Lesage (C‑37/92; Colet., p. I‑4947, n.° 9); de 23 de maio de 1996, Hedley Lomas (C‑5/94, Colet., p. I‑2553, n.° 18); de 19 de março de 1998, Compassion in World Farming (C‑1/96, Colet., p. I‑1251,n.° 47); de 25 de março de 1999, Comissão/Itália (C‑112/97, Colet., p. I‑1821, n.° 54); de 11 de maio de 1999, Monsees (C‑350/97, Colet., p. I‑2921, n.° 24); de 13 de dezembro de 2001, Daimler Chrysler (C‑324/99; Colet., p. I‑9897, n.° 32); de 22 de outubro de 2002, National Farmers’ Union (C‑241/01, Colet., p. I‑9079, n.° 48); de 24 de outubro de 2002, Linhart et Biffl (C‑99/01, Colet., p. I‑9375, n.° 18); de 24 de janeiro de 2008, Roby Profumi (C‑257/06; Colet., p. I‑189, n.° 14); e de 30 de abril de 2009, Lidl Magyarország (C‑132/08; Colet., p. I‑3841, n.° 42. V. também n.° 45 das conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed, apresentadas em 4 de julho de 2002 [conclusões comuns aos processos Comissão/Áustria (acórdão de 23 de janeiro de 2003, C‑221/00, Colet., p. I‑1007), e Sterbenz e Haug (acórdão de 23 de janeiro de 2003, C‑421/00, C‑426/00 e C‑16/01, Colet., p. I‑1065)]. O advogado‑geral também salienta uma certa falta de coerência da jurisprudência relativamente a este ponto (n.° 44).


35 —      Na minha opinião, esta jurisprudência é aplicável ao caso vertente, e isto apesar de a Diretiva Serviços não se enquadrar completamente no modelo «clássico» de norma harmonizadora da União.


36 —      Acórdãos de 5 de dezembro de 2000, Guimont (C‑448/98, Colet., p. I‑10663, n.° 21); de 11 de setembro de 2003, Anomar e outros (C‑6/01, Colet., p. I‑8621, n.° 39); de 30 de março de 2006, Servizi Ausiliari Dottori Commercialisti (C‑451/03, Colet., p. I‑2941, n.° 29); março de 2010, Atanasio Group, já referido, n.os 23 e 24); e de 1 de junho de 2010, Blanco Pérez e Chao Gómez (C‑570/07 e C‑571/07, Colet., p. I‑4629, n.os 39 e 40).