Language of document : ECLI:EU:T:2017:487

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

13 de julho de 2017 (*)

«Mercado interno — Decisão do EUIPO que indefere um pedido de inscrição na lista de mandatários autorizados — Requisito relativo à existência de um domicílio profissional na União — Artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 207/2009 — Livre prestação de serviços — Artigo 36.o do Acordo EEE — Interpretação conforme»

No processo T‑527/14,

Paul Rosenich, residente em Triesenberg (Listenstaine), representado por A. von Mühlendahl e C. Eckhartt, advogados,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado inicialmente por G. Schneider e, em seguida, por D. Walicka, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto um recurso da decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO de 29 de abril de 2014 (processo R 2063/2012‑4), relativo à recusa do EUIPO de inscrever o recorrente na lista dos mandatários autorizados prevista no 93.o do Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: A. Dittrich, presidente, J. Schwarcz (relator) e V. Tomljenović, juízes,

secretário: A. Lamote, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de julho de 2014,

vista a resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de dezembro de 2014,

vista a réplica apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 10 de março de 2015,

vista a tréplica apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de maio de 2015,

após a audiência de 14 de janeiro de 2016,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

 Acordo sobre o EEE

1        O artigo 1.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), entrado em vigor no Listenstaine em 1 de maio de 1995 através da Decisão n.o 1/95 do Conselho do EEE, de 10 de março de 1995, relativa à entrada em vigor do [Acordo EEE] em relação ao Principado do Listenstaine (JO 1995, L 86, p. 58), enuncia:

«O objetivo do presente Acordo de associação é o de promover um reforço permanente e equilibrado das relações comerciais e económicas entre as Partes Contratantes, em iguais condições de concorrência e no respeito por normas idênticas, com vista a criar um Espaço Económico Europeu homogéneo, a seguir designado “EEE”».

2        Em conformidade com o artigo 2.o do Acordo EEE

«Para efeitos do presente acordo, entende‑se por:

a)      “Acordo”, o texto do Acordo principal, os seus Protocolos e Anexos, bem como os atos neles referidos;

[…]»

3        No que diz respeito à interpretação do Acordo EEE, o artigo 6.o enuncia o princípio da homogeneidade nos termos seguintes:

«Sem prejuízo da jurisprudência futura, as disposições do presente Acordo, na medida em que sejam idênticas, quanto ao conteúdo, às normas correspondentes do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço e aos atos adotados em aplicação destes dois Tratados, serão, no que respeita à sua execução e aplicação, interpretadas em conformidade com a jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias anterior à data de assinatura do presente Acordo.»

4        O artigo 7.o do Acordo EEE enuncia:

«Os atos referidos ou previstos nos Anexos do presente Acordo ou nas decisões do Comité Misto do EEE vinculam as Partes Contratantes e integram a sua ordem jurídica interna, ou serão nela integrados, da seguinte forma:

a)      Os atos correspondentes a regulamentos CEE integram, enquanto tal, a ordem jurídica interna das Partes Contratantes; […]»

5        O artigo 36.o, n.o 1, do acordo EEE, relativo à livre prestação de serviços, enuncia:

«No âmbito das disposições do presente Acordo, são proibidas quaisquer restrições à livre prestação de serviços no território das Partes Contratantes em relação aos nacionais dos Estados‑Membros [da União Europeia] e dos Estados da [Associação Europeia de Comércio Livre] estabelecidos num Estado‑Membro [da União] ou num Estado da EFTA que não seja o do destinatário da prestação.»

6        O artigo 65.o do Acordo EEE prevê, no n.o 2:

«O Protocolo n.o 28 e o Anexo XVII contêm as modalidades e disposições específicas relativas à propriedade intelectual, industrial e comercial que, salvo disposição em contrário, são aplicáveis a todos os produtos e serviços.»

7        O Protocolo n.o 1 do acordo EEE relativo às adaptações horizontais indica:

«As disposições dos atos referidos no anexo II são aplicáveis em conformidade com a Decisão n.o 1/95 e o presente anexo, salvo disposição em contrário do anexo II. As adaptações específicas necessárias a determinados atos constam do anexo onde figura o ato em questão.»

[…]

8.      Referência a territórios

Sempre que os atos referidos contenham referências ao território da “Comunidade” ou do “mercado comum”, tais referências devem, para efeitos do acordo, ser entendidas como referências aos territórios das partes contratantes, tal como definidos no artigo 126.o do acordo.»

8        Segundo o anexo XVII do Acordo EEE, sempre que os atos referidos no presente anexo contenham noções ou referências a procedimentos específicos da ordem jurídica da União Europeia, é aplicável o Protocolo 1 relativo às adaptações horizontais, salvo disposição em contrário do referido anexo. A este título, não menciona o Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), e também nunca mencionou o Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca da União Europeia (JO 1994, L 11, p. 1), que foi revogado e substituído pelo Regulamento n.o 207/2009.

 Regulamento n.o 207/2009

9        O artigo 93.o, n.os 1 a 3, do Regulamento n.o 207/2009, na sua versão em vigor no momento dos factos, prevê:

«1.      A representação das pessoas singulares ou coletivas junto do Instituto só pode ser assegurada:

[…]

b)      Pelos mandatários autorizados inscritos numa lista mantida para o efeito pelo Instituto […].

[…]

2.      Pode ser inscrita na lista de mandatários autorizados qualquer pessoa singular que:

a)      Possua a nacionalidade de um dos Estados‑Membros;

b)      Tenha o seu domicílio profissional ou local de trabalho na Comunidade;

c)      Esteja habilitada a representar, em matéria de marcas, pessoas singulares ou coletivas perante o serviço central da propriedade industrial de um Estado‑Membro […]

3.      A inscrição será feita mediante requerimento acompanhado de uma declaração fornecida pelo serviço central da propriedade industrial do Estado‑Membro em causa indicando que se encontram preenchidas as condições referidas no n.o 2».

10      Através do artigo 1.o, n.o 87, do Regulamento (UE) 2015/2424 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2015, que altera o Regulamento n.o 207/2009 e o Regulamento (CE) n.o 2868/95 da Comissão relativo à execução do Regulamento n.o 40/94, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 2869/95 da Comissão relativo às taxas a pagar ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (JO 2015, L 341, p. 21), o artigo 93.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009 foi substituído pelas disposições seguintes, que remetem agora para o território do EEE:

«Pode ser inscrita na lista de mandatários autorizados qualquer pessoa singular que:

a)      Possua a nacionalidade de um dos Estados‑Membros do [EEE];

b)      Tenha o seu domicílio profissional ou local de trabalho [no EEE];

c)      Esteja habilitada a representar, em matéria de marcas, pessoas singulares ou coletivas junto do Instituto Benelux da Propriedade Intelectual ou do instituto central da propriedade industrial de um Estado‑Membro do [EEE] […]»

11      Em conformidade com o artigo 4.o do Regulamento 2015/2424, estas alterações entraram em vigor em 23 de março de 2016.

 Antecedentes do litígio

12      O recorrente, Paul Rosenich, de nacionalidade austríaca, mandatário autorizado no Österreichisches Patentamt (Instituto de Patentes austríaco), explora um gabinete de consultadoria em patentes no seu domicílio profissional, situado no Listenstaine.

13      Em 17 de janeiro de 2011, o recorrente apresentou no Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) um pedido de inscrição na lista dos mandatários autorizados, ao abrigo do artigo 93.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009.

14      Por decisão de 7 de setembro de 2012, o diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO, agindo na sua qualidade de membro da Divisão da Administração das Marcas, Desenhos e Modelos, indeferiu o referido pedido com o fundamento de que o recorrente não preenchia a condição de um domicílio profissional na União, requerida pelo artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009.

15      Em 7 de novembro de 2012, o recorrente interpôs recurso dessa decisão.

16      Por decisão de 29 de abril de 2014 (a seguir «decisão impugnada»), a Quarta Câmara de Recurso julgou o recurso improcedente.

17      A este propósito, em primeiro lugar, a Câmara de Recurso rejeitou a tese do recorrente segundo a qual, em substância, por força do artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009, qualquer pessoa habilitada a representar um cliente num instituto nacional está automaticamente habilitada a fazê‑lo igualmente no EUIPO, «constitui[ndo] a [a]utorização de representação num instituto nacional o elemento de ligação que permite saber qual das regras do artigo 93.o, n.o 2, [alínea] c), do [Regulamento n.o 207/2009] se aplica».

18      Em segundo lugar, a Câmara de Recurso considerou que o argumento segundo o qual a referência geográfica à União devia ser substituída por uma referência geográfica a um Estado‑Membro do EEE não resultava do Acordo EEE, uma vez que o Regulamento n.o 207/2009 não figurava no seu anexo XVII, o que tinha, designadamente, por consequência que o Protocolo n.o 1 do referido Acordo relativo às adaptações horizontais não lhe era aplicável. Precisou que, embora o anexo XVII fizesse referência à Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 2008, L 299, p. 25), era apenas na medida em que, para efeito do «princípio do esgotamento dos direitos da marca» à escala da União, a referência a uma colocação em circulação na União era substituída pela referência a uma colocação em circulação num Estado‑Membro do EEE. Esta disposição teve incidência sobre o artigo 13.o do Regulamento n.o 207/2009. Quanto ao Protocolo n.o 28 do Acordo EEE, este também não contém nenhuma disposição pertinente para o caso vertente.

19      Em terceiro lugar, no que diz respeito à aplicação das regras relativas à livre prestação de serviços no direito do EEE, a Câmara de Recurso considerou que a prestação de serviços não era restringida pela disposição controvertida, visto que o aconselhamento dado, mediante remuneração, pelo recorrente a partir do Listenstaine a clientes estabelecidos na União não é afetado pelo artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009. Assim, o recorrente não está sujeito a nenhuma restrição no exercício da sua profissão de consultor em patentes que não seja aquela que ele se tiver imposta ele próprio. A Câmara de Recurso sublinhou, neste sentido, que o artigo 36.o do Acordo EEE remetia par disposições especiais aplicáveis à livre prestação de serviços que figuram nos anexos IX a XI do acordo EEE, que não mencionam o direito de representação.

20      Para a Câmara de Recurso, os artigos 92.o e 93.o do Regulamento n.o 207/2009 visam garantir que os representantes no EUIPO tenham uma certa qualificação e que o EUIPO comunique unicamente com partes ou representantes que tenham uma morada na União.

21      Em quarto lugar, o artigo 4.o do Acordo EEE, que proíbe as discriminações fundadas na nacionalidade, não é pertinente no caso vertente, uma vez que o recorrente possui a nacionalidade de um Estado‑Membro da União e que a recusa da inscrição não se baseia neste fundamento.

22      A Câmara de Recurso referiu igualmente que o direito listenstainiano em matéria de representação não concedia reciprocidade, mas prevê que um titular estrangeiro de uma marca depositada no Amt für Volkswirtschaft (Instituto da Propriedade Intelectual, Listenstaine) deve mandatar como representante um advogado ou um consultor em patentes do Listenstaine.

23      Em quinto e último lugar, a Câmara de Recurso considerou que o EUIPO não podia deixar de aplicar uma disposição do Regulamento n.o 207/2009 pelo facto de esta não ser conforme com uma norma de grau superior. Só o Tribunal de Justiça pode fazê‑lo. Do mesmo modo, uma interpretação conforme com o sentido e o objetivo das normas de graus superior não pode ser equacionada na medida em que o artigo 93.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009 está formulado de maneira clara e unívoca.

 Tramitação processual e pedidos das partes

24      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de julho de 2014, o recorrente interpôs o presente recurso.

25      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        anular a decisão do diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO de 7 de setembro de 2012;

–        condenar o EUIPO nas despesas, incluindo as despesas do processo efetuadas na Câmara de Recurso.

26      O EUIPO conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

27      Em 20 de novembro de 2015, o Tribunal Geral (Quinta Secção) convidou o EUIPO a apresentar‑lhe certos documentos suscetíveis de esclarecer, por um lado, a relação entre os Regulamentos n.os 40/94 e 207/2009 e o Acordo EEE e, por outro, sobre a natureza da representação profissional no domínio da marca da União Europeia. O EUIPO responder por carta de 7 de dezembro de 2015. Por carta de 22 de dezembro de 2015, o recorrente reagiu a essa resposta.

28      Mediante proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral do processo. Na audiência de 14 de janeiro de 2016, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas feitas pelo Tribunal.

29      Registando a alteração do artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n 207/2009 (v. n.os 10 e 11, supra), as partes indicaram na audiência que o objeto do recurso desapareceria se o recorrente estivesse inscrito na lista dos mandatários autorizados em questão na sequência da entrada em vigor do Regulamento 2015/2424.

30      Em consequência, o Tribunal Geral não procedeu, na sequência da audiência, ao encerramento da fase oral do processo e pediu às partes que o informassem antes de 15 de abril de 2016 se o recorrente tinha efetivamente sido inscrito nessa lista.

31      Por cartas de 14 e 15 de abril de 2016, o recorrente e o EUIPO indicaram que o recorrente ainda não tinha sido inscrito na lista dos mandatários autorizados e que informariam o Tribunal Geral da eventual conclusão do processo de inscrição.

32      Por carta de 16 de junho de 2016, o EUIPO informou o Tribunal Geral de que tinha pedido ao recorrente, pela segunda vez, que apresentasse um certificado recente em conformidade com o artigo 93.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009 e que, por tal documento não ter sido fornecido, o recorrente não podia ser inscrito na lista dos mandatários autorizados.

33      O Tribunal Geral fixou ao recorrente um prazo que terminava em 24 de agosto de 2016 para apresentar as suas observações acerca dessa carta.

34      Por carta de 24 de agosto de 2016, o recorrente informou o Tribunal Geral de que ainda não tinha sido inscrito na lista em questão. Apresentou igualmente ao Tribunal Geral as trocas de correspondência que tinha tido com o EUIPO.

35      Registando a falta de inscrição do recorrente na lista dos mandatários autorizados e por entender que a resolução do litígio entre as partes era improvável, o Tribunal Geral encerrou a fase oral do processo, em 6 de setembro de 2016.

 Questão de direito

36      O recorrente apresenta, em apoio do seu recurso, um fundamento único, relativo a violação do artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009, tal como o mesmo deveria, em seu entender, ser interpretado à luz da livre prestação de serviços garantida no EEE por força do Acordo EEE.

37      O recorrente alega que o Acordo EEE tem, designadamente, por objeto realizar do modo o mais completo possível a livre prestação de serviços que deveria, segundo a jurisprudência (v. acórdãos de 1 de abril de 2004, Bellio F.lli, C‑286/02, EU:C:2004:212, n.os 34 e 35 e jurisprudência referida, e de 28 de outubro de 2010, Établissements Rimbaud, C‑72/09, EU:C:2010:645, n.o 20 e jurisprudência referida), ser interpretada e aplicada da mesma maneira que a livre prestação de serviços garantida entre os Estados‑Membros da União. Ora, nas relações entre os Estados‑Membros da União, o Tribunal de Justiça declarou que o facto de exigir a um agente de patentes, já estabelecido e autorizado noutro Estado‑Membro e desejoso de fornecer prestações de serviços, que tenha uma residência ou um domicílio profissional estável no Estado‑Membro de acolhimento constituía uma restrição à livre prestação de serviços que vai além do necessário para alcançar objetivos tais como a possibilidade de determinar o tribunal territorialmente competente em caso de contestação tendo por objeto uma patente registada no Estado‑Membro de acolhimento bem como o de assegurar o bom desenrolar do processo (acórdãos de 13 de fevereiro de 2003, Comissão/Itália, C‑131/01, EU:C:2003:96, n.os 42 a 45, e de 11 de junho de 2009, Comissão/Áustria, C‑564/07, não publicado, EU:C:2009:364, n.os 47 a 53). Em consequência, a livre prestação de serviços, garantida pelo Acordo EEE e conhecida como um direito individual e diretamente aplicável, determinaria quer a ineficácia das disposições adotadas pelas partes contratantes no Acordo EEE, que fazem depender o livre exercício de uma profissão da existência de um domicílio ou de uma sede na União, quer da interpretação destas disposições de maneira tal que um domicílio profissional num Estado‑Membro do EEE seria suficiente.

38      As obrigações que decorrem do Acordo EEE vinculam não só os Estados‑Membros da União, mas igualmente a própria União, cujas instituições e órgãos são diretamente obrigados a respeitar as liberdades fundamentais consagradas neste acordo, como a livre prestação de serviços.

39      O recorrente alega que o facto de o Regulamento n.o 207/2009 não ser expressamente mencionado nos instrumentos do Acordo EEE, designadamente no Protocolo n.o 28 e no anexo XVII, não põe esta conclusão em causa. O artigo 1.o, n.o 2, do Protocolo n.o 28 do Acordo EEE, segundo o qual as partes contratantes deveriam tomar em conta os princípios da livre prestação de serviços, opõe‑se à exigência de um domicílio profissional na União. Além do mais, é geralmente reconhecido que uma primeira colocação em circulação num Estado do EEE levaria ao esgotamento dos direitos no interior da União.

40      Em resposta ao EUIPO, em primeiro lugar, o recorrente precisa que, segundo o direito listenstainiano, o aconselhamento em patentes qualificadas num Estado‑Membro do EEE tem autorização, mediante o cumprimento de determinadas formalidades, para exercer uma atividade transfronteiriça de consultadoria e de representação no Listenstaine. O direito listenstainiano corresponde, a este respeito, ponto por ponto, ao Regulamento n.o 207/2009. Por outro lado, mesmo na falta de reciprocidade, a aplicação direta das disposições do Acordo EEE não pode ser posta em causa.

41      Seguidamente, por um lado, o recorrente considera que o argumento do EUIPO segundo o qual a obrigação de sede profissional no território da União se justifica por razões de responsabilidade e de proteção da outra parte nos processos bilaterais é novo, e, por conseguinte, inadmissível. Por outro lado, embora a exigência de apresentar, sendo caso disso, a prova da subscrição de um seguro de responsabilidade civil profissional não seja contrária à livre prestação de serviços, uma vez que o direito listenstainiano impõe, de resto, aos consultores a subscrição desse seguro, tal seguro não pode, em si, justificar a necessidade de um domicílio profissional na União.

42      Por último, o recorrente considera que, a partir do momento em que, nos termos do artigo 19.o, n.o 4, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, os advogados autorizados a exercer num país do EEE estão autorizados a pleitear no Tribunal de Justiça, não existe nenhuma razão para que se apliquem disposições mais estritas à representação no EUIPO, estando este sujeito a regras de grau inferior.

43      O EUIPO alega que o recorrente pede que o artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009 não seja aplicado em razão de violação de uma norma de grau superior, a saber, o Acordo EEE. Ora, ao fazer referência ao acórdão de 12 de julho de 2001, Kik/IHMI (Kik) (T‑120/99, EU:T:2001:189, n.o 55), o EUIPO não tem competência para deixar de aplicar uma norma cuja redação é clara, sem violar o princípio da presunção de legalidade.

44      O EUIPO considera igualmente que nenhum dos argumentos do recorrente demonstra que a referência geográfica à União feita no artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009 deve ser interpretada como uma referência ao EEE, uma vez que o anexo XVII do Acordo EEE não menciona este regulamento como fazendo parte dos atos aos quais se aplica o Protocolo n.o 1 deste acordo.

45      Apesar de o artigo 1.o, n.o 2, do Protocolo n.o 28 deste acordo conter uma obrigação para a União adaptar as suas disposições jurídicas, em especial, o artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009, essa obrigação assenta não no EUIPO, mas no Órgão de Fiscalização da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) ou na Comissão Europeia.

46      Segundo o EUIPO, admitindo que a exigência de um domicílio profissional na União para os mandatários autorizados deva ser analisada como uma restrição à livre prestação de serviços no EEE, tal restrição está justificada por razões de direito de responsabilidade e de proteção da outra parte nos processos bilaterais.

47      O EUIPO alega igualmente que as observações que figuram na réplica sobre a reciprocidade do direito listenstainiano constituem argumentos novos e são, portanto, inadmissíveis. De qualquer modo, não existe nenhuma reciprocidade na medida em que o direito listenstainiano prevê unicamente um exercício «temporário» e «transfronteiriço» da atividade de consultadoria em patentes onde o Regulamento n.o 207/2009 prevê uma representação e exercida no país membro no qual o representante tem o seu domicílio profissional. O EUIPO precisa, no entanto, que a referência à situação jurídica no Listenstaine, no n.o 18 da decisão impugnada, é unicamente para ilustrar o facto de que o legislador do Listenstaine não aprecia a situação jurídica diversamente do legislador da União.

48      A este propósito, constate‑se que, ainda que o Regulamento n.o 207/2009 contenha a menção «Texto relevante para efeitos do EEE», o recorrente não contesta o facto de que nem o Acordo EEE nem os respetivos protocolos ou anexos lhe fazem referência.

49      Assim, e em aplicação do artigo 2.o, alínea a), do Acordo EEE, que define este acordo como «o texto do Acordo principal, os seus Protocolos e Anexos, bem como os atos neles referidos», deve observar‑se que o Regulamento n.o 207/2009 não faz parte do Acordo EEE.

50      Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou acertadamente que o n.o 8 do Protocolo n.o 1 do Acordo EEE, para o qual remete o anexo XVII deste último e segundo o qual, «[s]empre que os atos referidos contenham referências ao território da [União] ou do “Mercado Comum”, tais referências devem, para efeitos do Acordo, ser entendidas como referências aos territórios das Partes Contratantes, tal como definido no artigo 126.o do Acordo», não se aplica ao caso vertente.

51      Todavia, através dos seus argumentos, o recorrente alega, em substância, que a decisão impugnada é contrária ao artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, tal como este devia, em seu entender, ter sido interpretado e aplicado à luz da livre prestação de serviços consagrada no Acordo EEE. Em caso de impossibilidade de tal interpretação conforme, o recorrente entende que a condição controvertida relativa ao estabelecimento na União, prevista por esta disposição, deveria ter sido afastada, por ser ilegal, em proveito de uma aplicação direta do princípio da livre prestação de serviços no EEE, do qual decorre que não pode existir nesta matéria qualquer restrição, ou mesmo descriminação, das pessoas estabelecidas fora do território da União, mas num Estado da EFTA, pertencente ao EEE, como o Listenstaine. Suscita, assim, uma exceção de ilegalidade na aceção do artigo 277.o TFUE.

52      Resulta do artigo 216.o, n.o 2, TFUE que os acordos celebrados pela União vinculam as instituições da União e os Estados‑Membros.

53      Resulta de jurisprudência constante que as disposições de tais acordos fazem parte integrante, a partir da sua entrada em vigor, da ordem jurídica da União (acórdãos de 30 de abril de 1974, Haegeman, 181/73, EU:C:1974:41, n.o 5; de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o., C‑366/10, EU:C:2011:864, n.os 73 e 79, e de 18 de março de 2014, Z., C‑363/12, EU:C:2014:159, n.o 73).

54      A este título, o Tribunal de Justiça já precisou que o primado dos acordos internacionais celebrados pela Comunidade sobre os textos de direito comunitário derivado exige interpretar estes últimos, na medida do possível, em conformidade com esses acordos (acórdão de 10 de setembro de 1996, Comissão/Alemanha, C‑61/94, EU:C:1996:313, n.o 52).

55      Resulta igualmente de jurisprudência consolidada que as disposições de tal acordo podem produzir efeito direto se forem incondicionais e suficientemente precisas (v., neste sentido, acórdãos de 5 de fevereiro de 1976, Conceria Bresciani, 87/75, EU:C:1976:18, n.o 25, e de 26 de outubro de 1982, Kupferberg, 104/81, EU:C:1982:362, n.o 23). No entanto, para que o juiz da União possa proceder ao exame da incompatibilidade alegada de um ato da União com as disposições desse acordo, é ainda necessário que a sua natureza e a sua economia a tal não se oponham (v., neste sentido, acórdão de 16 de julho de 2015, ClientEarth/Comissão, C‑612/13 P, EU:C:2015:486, n.o 35 e jurisprudência referida).

56      Quanto ao Acordo EEE, o juiz da União já confirmou que as suas disposições, incluindo no que diz respeito ao Listenstaine, fazem parte integrante da ordem jurídica da União (v., neste sentido, acórdãos de 28 de outubro de 2010, Établissements Rimbaud, C‑72/09, EU:C:2010:645, n.os 13 e 19, e de 22 de janeiro de 1997, Opel Austria/Conselho, T‑115/94, EU:T:1997:3, n.o 101).

57      Em conformidade com o quinto parágrafo do seu preâmbulo, o Acordo EEE visa, designadamente, realizar da maneira o mais completa possível a livre circulação das mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais em todo o EEE, de modo a que o mercado interno realizado no território da União seja alargado aos Estados da EFTA (v. acórdãos de 28 de outubro de 2010, Établissements Rimbaud, C‑72/09, EU:C:2010:645, n.o 20 e jurisprudência referida, e de 26 de setembro de 2013, Reino Unido/Conselho, C‑431/11, EU:C:2013:589, n.o 50).

58      A este respeito, as regras aplicáveis nas relações entre as partes contratantes nos domínios abrangidos pelo Acordo EEE são, em substância, as das disposições correspondentes do Tratado FUE e dos atos adotados em aplicação deste (v., neste sentido, acórdão de 22 de janeiro de 1997, Opel Austria/Conselho, T‑115/94, EU:T:1997:3, n.o 107).

59      Nesta perspetiva, várias disposições do Acordo EEE visam garantir uma interpretação tão uniforme quanto possível deste em todo o EEE. Cabe, neste quadro, ao juiz da União, assegurar que as normas do Acordo EEE idênticas, em substância, às do Tratado FUE sejam interpretadas de modo uniforme na ordem jurídica da União (v., neste sentido, acórdãos de 28 de outubro de 2010, Établissements Rimbaud, C‑72/09, EU:C:2010:645, n.o 20 e jurisprudência referida, e de 22 de janeiro de 1997, Opel Austria/Conselho, T‑115/94, EU:T:1997:3, n.os 106 a 108).

60      No caso vertente, ao mesmo tempo que está demonstrado no Listenstaine, o recorrente pretende propor os seus serviços enquanto mandatário autorizado perante o EUIPO. Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que tal atividade é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação da livre prestação de serviços, conforme previsto pelo Acordo EEE (v., neste sentido, acórdão de 13 de fevereiro de 2003, Comissão/Itália, C‑131/01, EU:C:2003:96, n.os 21 a 25).

61      Ora, já foi declarado que as regras que proíbem restrições à livre prestação de serviços enunciadas no artigo 36.o, n.o 1, do Acordo EEE revestem o mesmo alcance jurídico que aquelas que o artigo 56.o TFUE impõe. O Tribunal de Justiça precisou deste modo que, no domínio considerado, as regras fixadas pelo Acordo EEE e aquelas que o são pelo Tratado FUE devem ser objeto de interpretação uniforme (acórdãos de 5 de julho de 2007, Comissão/Bélgica, C‑522/04, EU:C:2007:405, n.os 45 e 46, e de 6 de outubro de 2009, Comissão/Espanha, C‑153/08, EU:C:2009:618, n.o 48).

62      Todavia, o Tribunal de Justiça atenuou este princípio ao indicar que a jurisprudência da União, relativa a restrições ao exercício das liberdades de circulação na União, não pode ser integralmente transposta para as liberdades garantidas pelo Acordo EEE, uma vez o exercício destas últimas se inscreve num contexto jurídico diferente (v. acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão/Dinamarca, C‑261/11, não publicado, EU:C:2013:480, n.o 44 e jurisprudência referida).

63      Assim sendo, no presente processo, basta declarar que nem a Câmara de Recurso nem o EUIPO sustentaram e ainda menos demonstraram que o exercício da livre prestação de serviços no domínio da representação perante os Institutos de Propriedade Intelectual se inscrevia, no caso vertente, num contexto jurídico distinto, o que teria por consequência que a jurisprudência pertinente da União relativa a restrições ao exercício da livre prestação de serviços na União não pode ser integralmente transposta para essa mesma liberdade garantida pelo Acordo EEE (v., neste sentido, acórdão de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha, C‑591/13, EU:C:2015:230, n.o 82). 

64      Impõe‑se, portanto, verificar se a condição relativa a um domicílio profissional na União que figura no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, conforme interpretada pela Câmara de Recurso, ou seja, que o termo «comunidade» não pode remeter para o EEE, é compatível com o artigo 36.o, n.o 1, do Acordo EEE, que consagra à escala do EEE a livre prestação de serviços.

65      Neste âmbito, o Tribunal de Justiça, tem declarado reiteradamente que o artigo 56.o TFUE, que consagra, tal como o artigo 36.o, n.o 1, do Acordo EEE, a livre prestação de serviços, é suficientemente preciso e incondicional, sendo, por isso, de efeito direto (acórdãos de 3 de dezembro de 1974, van Binsbergen, 33/74, EU:C:1974:131, n.o 27, e de 14 de julho de 1976, Donà, 13/76, EU:C:1976:115, n.o 20). Quanto à natureza e à economia do Acordo EEE, nem a Câmara de Recurso nem o EUIPO adiantaram argumentos suscetíveis de demonstrar que tal acordo não pode ser diretamente invocado pelos particulares. Muito pelo contrário, esta possibilidade resulta do oitavo parágrafo do preâmbulo do Acordo EEE, que sublinha a importância do papel que os particulares desempenham no EEE pelo exercício dos direitos que este acordo lhes confere e pela defesa judicial desses direitos. Por outro lado, importa referir que o Tribunal de Justiça já procedeu à fiscalização da compatibilidade de um ato da União tendo em conta o Acordo EEE (acórdão de 1 de abril de 2004, Bellio F.lli, C‑286/02, EU:C:2004:212, n.os 57 a 63).

66      O artigo 56.o TFUE exige não só a eliminação de qualquer discriminação contra o prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro em razão da sua nacionalidade, mas igualmente a supressão de qualquer restrição, ainda que indistintamente aplicada aos prestadores nacionais e aos dos restantes Estados‑Membros, quando seja de natureza a proibir, obstruir ou tornar menos atrativas as atividades do prestador estabelecido noutro Estado‑Membro, onde presta legalmente serviços análogos (v. acórdão de 17 de março de 2011, Peñarroja Fa, C‑372/09 e C‑373/09, EU:C:2011:156, n.o 50 e jurisprudência referida).

67      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o facto de exigir a um agente em patentes autorizado perante o Instituto das Patentes noutro Estado‑Membro e que pretenda fornecer prestações de serviços que tenha um domicílio profissional estável no Estado‑Membro de acolhimento, ou mesmo que designe um representante domiciliado, constitui uma restrição à livre prestação de serviços (v., neste sentido, acórdãos de 13 de fevereiro de 2003, Comissão/Itália, C‑131/01, EU:C:2003:96, n.o 42 e jurisprudência referida, e de 11 de junho de 2009, Comissão/Áustria, C‑564/07, não publicado, EU:C:2009:364, n.o 47).

68      A condição enunciada no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, conforme interpretada pela Câmara de Recurso, constitui, portanto, uma restrição à livre prestação de serviços no EEE.

69      No entanto, resulta igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que as medidas nacionais suscetíveis de obstruir ou de tornar menos atrativo o exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado FUE são consideradas compatíveis com este se preencherem quatro condições, a saber, que sejam aplicáveis de maneira não discriminatória, que se justifiquem por razões imperativas de interesse geral, que sejam adequadas para garantir a realização do objetivo que perseguem e que não vão além do que é necessário para alcançar esse objetivo (acórdãos de 30 de novembro de 1995, Gebhard, C‑55/94, EU:C:1995:411, n.o 37, e de 11 de junho de 2009, Comissão/Áustria, C‑564/07, não publicado, EU:C:2009:364, n.o 31).

70      Em primeiro lugar, no n.o 16 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso referiu que o artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009 garantia, por um lado, que as pessoas, cuja atividade profissional consiste em representar terceiros perante o EUIPO tenham uma qualificação profissional cuja definição varia em função do Estado‑Membro, e, por outro, lido em conjugação com o artigo 92.o deste mesmo regulamento, que o EUIPO deva comunicar unicamente com partes ou representantes destas que possuem um endereço na União. O recorrente, que tem o seu domicílio profissional no Listenstaine, não se encontra em posição de preencher esta condição.

71      No que diz respeito ao primeiro objetivo, ou seja, o que é relativo ao domicílio profissional, o EUIPO não explicou em que é que um domicílio profissional na União garantiria uma melhor qualificação do que um domicílio profissional num Estado da EFTA pertencente ao EEE. Impõe‑se igualmente constatar que, para alcançar esse objetivo, existe ma medida menos restritiva do que aquela que foi objeto do presente litígio, a saber, a exigência de prova da qualificação profissional.

72      Quanto ao segundo objetivo, este poderia ser aproximado da necessidade de assegurar o bom desenrolar do processo. Assim, poderia ser invocado ao abrigo das razões imperativas de interesse geral suscetíveis de justificar uma restrição à livre prestação de serviços (v., neste sentido, acórdão de 11 de junho de 2009, Comissão/Áustria, C‑564/07, não publicado, EU:C:2009:364, n.o 49 e jurisprudência referida).

73      Todavia, a exigência de ter um domicílio profissional no território da União, conforme prevista no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, como interpretado pela Câmara de Recurso, vai além do que é necessário para alcançar este objetivo. Basta declarar que os meios atuais de comunicação eletrónica permitem aos mandatários autorizados comunicar de maneira adequada com o EUIPO. Com efeito, está assente que existem meios técnicos variados, como a telecópia, o correio eletrónico, ou até meios informáticos (programas) em linha, como o efiling, que permitem assegurar a comunicação de documentos entre o EUIPO e as pessoas em questão.

74      Em segundo lugar, nos articulados apresentados no Tribunal Geral, o EUIPO alegou que a exigência de um domicílio profissional na União justificar‑se‑ia pelo interesse da justiça, a saber, por razões de direito da responsabilidade e pela proteção da outra parte nos processos bilaterais.

75      Estes argumentos devem ser rejeitados.

76      Com efeito, por um lado, no que diz respeito ao objetivo relativo ao direito da responsabilidade, na sua argumentação, o EUIPO limita‑se a remeter para os n.os 22 e seguintes do acórdão de 11 de junho de 2009, Comissão/Áustria (C‑564/07, não publicado, EU:C:2009:364), que respeitam à obrigação de subscrever um seguro profissional. No entanto, a obrigação de residência, por si só, não permite assegurar que os mandatários autorizados disponham de um seguro profissional suficiente, dado que o EUIPO não alegou, de resto, e ainda menos demonstrou, que todos os Estados‑Membros da União impunham uma obrigação de subscrever um seguro profissional, quando não é esse o caso de certos Estados da EFTA pertencentes ao EEE. Além de que o legislador da União, se tivesse por objetivo garantir que os mandatários autorizados dispõem desse seguro, teria podido recorrer a medidas menos restritivas da livre prestação de serviços, como uma obrigação expressa para qualquer mandatário autorizado de subscrever esse seguro, que cobriria igualmente as suas prestações perante o EUIPO.

77      Por outro lado, o EUIPO de modo nenhum expôs em que é que o estabelecimento dos mandatários autorizados num Estado‑Membro da União em vez de num Estado da EFTA pertencente ao EEE, como o Listenstaine, oferecia maior proteção à outra parte nos processos bilaterais.

78      Por conseguinte, nem a Câmara de Recurso nem o EUIPO invocaram razões imperativas de interesse geral suscetíveis de justificar a restrição à livre prestação de serviços, declarada no n.o 68, supra. Assim, impõe‑se declarar que a condição de residência profissional na União, prevista no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, tal como interpretado pela Câmara de Recurso, é contrária ao artigo 36.o, n.o 1, do Acordo EEE.

79      A Câmara de Recurso indicou ainda, como o EUIPO igualmente alega, que o Listenstaine não concedia reciprocidade na matéria. Todavia, primeiro, nem a Câmara de Recurso nem o EUIPO demonstraram que a inscrição no registo dos mandatários autorizados perante o Instituto da Propriedade Intelectual dependia de uma residência profissional do interessado nesse Estado. Os argumentos das partes incidiam antes na questão de saber se e em que medida um mandatário autorizado num Estado‑Membro da União podia representar um cliente perante o Instituto da Propriedade Intelectual. Segundo, nem a Câmara de Recurso nem o EUIPO consideraram que essa pretensa falta de reciprocidade era suscetível de justificar a referida restrição à livre prestação de serviços. Para o EUIPO, trata‑se de um argumento destinado unicamente a ilustrar o facto de que o legislador do Listenstaine não aprecia a situação jurídica diversamente do legislador da União. Terceiro, e de qualquer modo, basta referir que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 13 de fevereiro de 2003, Comissão/Itália, C‑131/01, EU:C:2003:96, n.o 46 e jurisprudência referida), um Estado‑Membro não pode invocar o desrespeito do princípio da reciprocidade ou basear‑se no desconhecimento eventual do Tratado por um outro Estado‑Membro para justificar o seu próprio incumprimento. O EUIPO não adiantou nenhum elemento de direito ou de facto que tivesse por consequência a não aplicação desta jurisprudência em matéria de liberdades de circulação, consagradas no Acordo EEE. Além disso, uma aplicação do princípio da reciprocidade seria contrária às vias específicas em matéria de processo de fiscalização e de resolução dos diferendos previstas nos artigos 109.o e 111.o do Acordo EEE.

80      Em terceiro lugar, a Câmara de Recurso indicou, como o EUIPO igualmente alegou, que o EUIPO não tinha competência para não aplicar a condição de residência profissional prevista no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009.

81      A este respeito, basta observar que decorre da jurisprudência referida no n.o 54, supra, que o primado dos acordos internacionais celebrados pela União, tais como o Acordo EEE, sobre os textos de direito derivado da União impõe que estes últimos sejam, na medida do possível, interpretados em conformidade com esses acordos.

82      Assim, sem que tenha sido, porém, necessário afastar a condição controvertida, cabe ao EUIPO interpretá‑la e aplica‑la em conformidade com as obrigações que decorrem do Acordo EEE.

83      Embora seja verdade que a interpretação conforme dos textos do direito derivado da União não pode servir de fundamento a uma interpretação contra legem desses textos (v. despacho de 17 de julho de 2015, EEB/Comissão, T‑685/14, não publicado, EU:T:2015:560, n.o 31 e jurisprudência referida), esse não é o caso vertente.

84      Com efeito, não resulta do Regulamento n.o 207/2009, na versão aplicável antes da entrada em vigor do Regulamento n.o 2015/2424, nem dos elementos de facto e de direito adiantados pelo EUIPO que a vontade específica do legislador da União tenha sido excluir as pessoas que tenham a sua residência profissional num Estado da EFTA pertencente ao EEE, como o Listenstaine, do acesso à lista dos mandatários autorizados.

85      Como indicou, em substância, a Câmara de Recurso, a intenção do legislador da União tinha sido, ao invés, assegurar uma certa qualidade e uma certa fiabilidade nas comunicações entre o EUIPO e as partes interessadas. Ora, como decorre do n.o 73, supra, esse objetivo não exige necessariamente um domicílio profissional do interessado no território da União.

86      Esta interpretação é corroborada pelo Regulamento 2015/2424, através do qual as remissões para o território da União foram substituídas por remissões para o território do EEE no que diz respeito, designadamente, às condições para a inscrição na lista dos mandatários autorizados que constam do artigo 93.o do Regulamento n.o 207/2009. Ainda que se trate de uma alteração que tem um impacto prático importante, não se afigura de modo nenhum que a mesma decorra de uma vontade de mudança de política em relação aos Estados da EFTA pertencentes ao EEE. Com efeito, por um lado, esta modificação não figura na Proposta Legislativa COM(2013) 161 final da Comissão, de 27 de março de 2013, e só posteriormente foi introduzida no processo legislativo. Por outro lado, o legislador não esclareceu de modo nenhum a sua iniciativa no preâmbulo do Regulamento 2015/2424. Assim, esta modificação deve ser considerada uma adaptação de ordem técnica, que não tem outro objeto que não seja o de alinhar o direito derivado da União pelas obrigações que decorrem do Acordo EEE.

87      Daqui resulta que o fundamento único do recurso deve ser acolhido, pelo que a decisão impugnada deve ser anulada.

88      Quanto ao segundo pedido do recorrente, este tem por objeto a anulação da decisão do diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO de 7 de setembro de 2012. Assim, através deste pedido, o recorrente pede ao Tribunal Geral, em substância, que adote a decisão que a Câmara de Recurso deveria, em seu entender, ter adotado. Por conseguinte, o recorrente pede a reforma da decisão impugnada, conforme a mesma se encontra prevista no artigo 65.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009.

89      Além disso, recorde‑se que o poder de reforma, reconhecido ao Tribunal Geral por força do artigo 65.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009, não tem por efeito conferir a este o poder de proceder a uma apreciação acerca da qual a Câmara de Recurso ainda não tomou posição. O exercício do poder de reforma deve, em princípio, ser limitado às situações em que o Tribunal Geral, depois de ter fiscalizado a apreciação feita pela Câmara de Recurso, esteja em condições de determinar, com base nos elementos de facto e de direito que tenham sido provados, a decisão que a Câmara de Recurso devia ter tomado (acórdão de 5 de julho de 2011, Edwin/IHMI, C‑263/09 P, EU:C:2011:452, n.o 72).

90      No caso vertente, as condições para o exercício do poder de reforma do Tribunal Geral estão preenchidas. Com efeito, resulta do n.o 2 da decisão impugnada que a recusa do diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO assentava no desrespeito pelo recorrente do critério previsto no artigo 93.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. Ora, resulta das considerações retomadas nos n.os 36 a 87, supra, que a Câmara de Recurso deveria ter declarado, contrariamente ao que o diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO tinha considerado, que esta disposição não se opunha à inscrição do recorrente na lista dos mandatários autorizados. Por conseguinte, procedendo à reforma da decisão impugnada, há igualmente que anular a decisão do diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO.

 Quanto às despesas

91      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

92      Nos termos do artigo 190.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, são consideradas despesas reembolsáveis as despesas indispensáveis efetuadas pelas partes para efeitos do processo perante a Câmara de Recurso do EUIPO.

93      Tendo o EUIPO sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, incluindo nas despesas na Câmara de Recurso, em conformidade com os pedidos do recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      A decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 29 de abril de 2014 (Processo R 2063/20124) é anulada.

2)      A decisão do diretor do departamento «Apoio às operações» do EUIPO de 7 de setembro de 2012 é anulada.

3)      O EUIPO é condenado nas despesas.

Dittrich

Schwarcz

Tomljenović

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de julho de 2017.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão