Language of document : ECLI:EU:C:2003:57

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

SIEGBERT ALBER

apresentadas em 30 de Janeiro de 2003 (1)

Processo C-167/01

Kamer van Koophandel en Fabrieken voor Amsterdam

contra

Inspire Art Ltd, sociedade de direito inglês

[Pedido de decisão prejudicial

apresentado pelo Kantongerecht Amsterdam (Países Baixos)]

«Livre circulação - Liberdade de estabelecimento - Sociedade constituída em conformidade com o direito do Estado-Membro no qual se situa a sua sede estatutária - Sociedade que estabelece uma sucursal noutro Estado-Membro com o objectivo de aí exercer a totalidade ou, pelo menos, o essencial da sua actividade comercial - Forma da inscrição no registo comercial - Justificação»

I - Introdução

1.
    O Kantongerecht Amsterdam submeteu ao Tribunal de Justiça duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 43.° CE e 48.° CE e às causas de justificação previstas no artigo 46.° CE. Estas questões são suscitadas num litígio que opõe a Kamer van Koophandel en Fabrieken voor Amsterdam e a Inspire Art Ltd. Está principalmente em causa a questão de saber se a sucursal neerlandesa da Inspire Art Ltd, uma sociedade constituída no Reino Unido, deve ser inscrita no registo comercial neerlandês com o complemento «sociedade formalmente estrangeira». Nos termos da Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen (lei sobre as sociedades formalmente estrangeiras, a seguir «WFBV»), é necessária a inscrição deste elemento adicional no registo comercial e a sua ulterior introdução na vida comercial. O Kantongerecht questiona a compatibilidade deste regime com as regras em matéria de liberdade de estabelecimento. Relacionadas com esta questão, estão também em causa outras obrigações legais eventualmente restritivas da liberdade de estabelecimento como, por exemplo, as relativas ao capital social mínimo, à responsabilidade pessoal e solidária dos gestores e a outras exigências de forma suplementares.

II - Enquadramento jurídico

2.
    Os artigos 1.° a 5.° da WFBV (2) dispõem o seguinte:

Artigo 1.°

Nos termos da presente lei, deve entender-se por sociedade formalmente estrangeira uma sociedade de capitais, com personalidade jurídica, que tenha sido constituída em conformidade com outro direito que não o neerlandês e que exerça as suas actividades integral ou quase integralmente nos Países Baixos e que, além disso, não tenha um vínculo real com o Estado no qual se aplica o direito em conformidade com o qual foi constituída [...]

Artigo 2.°

(1)    Os gestores da sociedade formalmente estrangeira devem declarar, no pedido de inscrição no registo comercial, que a sociedade reúne as condições previstas na definição do artigo 1.° e depositar na Conservatória do Registo Comercial uma cópia do contrato de sociedade autenticada por uma entidade pública ou por um gestor, redigida em língua neerlandesa, francesa, alemã ou inglesa, e dos estatutos, caso estes se encontrem em separado. Devem igualmente indicar no pedido a Conservatória e o número sob o qual a sociedade se encontra registada, bem como a data da sua primeira inscrição no registo. O pedido de registo deve ainda conter o nome, caso esteja em causa uma pessoa singular, os dados pessoais e a residência do sócio único da sociedade ou do cônjuge à qual pertençam todas as participações no capital da sociedade, não contando para este efeito as participações detidas pela sociedade ou pelas suas filiais. Os gestores de uma sociedade formalmente estrangeira devem requerer o registo de todas as alterações às inscrições obrigatórias no registo comercial, indicando a data da sua ocorrência. Para a prática dos actos previstos na presente lei não pode ser conferida procuração.

(2)    O registo comercial referido no n.° 1 corresponde ao registo organizado pela Câmara da Indústria e do Comércio competente para esse efeito, em conformidade com os artigos 6.° e 7.° da Lei relativa ao Registo Comercial de 1996.

Artigo 3.°

(1)    Com excepção dos telegramas e da publicidade, todos os documentos, publicações e comunicações que digam respeito à sociedade formalmente estrangeira ou que esta elabore devem mencionar a denominação integral da sociedade, a sua forma jurídica, a sua sede, e o local onde se situa o estabelecimento da empresa à qual pertença, bem como, caso a legislação que lhe seja aplicável imponha a sua inscrição no registo, em que Conservatória e sob que número a sociedade se encontra registada, bem como a data da sua primeira inscrição no registo. Devem também fazer referência ao número da inscrição da sociedade no registo comercial e ao facto de a sociedade ser formalmente estrangeira. É proibido dar a entender erradamente nos documentos, publicações e comunicações que a empresa pertence a uma pessoa colectiva neerlandesa.

(2)    A referência ao capital da sociedade deve incluir sempre a indicação do valor do capital nominal e a percentagem já realizada do mesmo.

(3)    Se a sociedade permanecer em actividade após a sua dissolução, deve ser acrescentada à sua denominação o complemento «em liquidação».

Artigo 4.°

(1)    O capital social nominal de uma sociedade formalmente estrangeira e a percentagem deste já realizada devem atingir, pelo menos, o montante do capital social mínimo previsto no artigo 178.°, n.° 2, do livro segundo, do Burgerlijk Wetboek (Código Civil), à data em que a sociedade corresponde, pela primeira vez, à definição do artigo 1.°

(2)    Na data em que a sociedade corresponde pela primeira vez à definição do artigo 1.°, o seu capital próprio deve atingir, pelo menos, o capital social mínimo previsto no n.° 1.

(3)    Os gestores devem, em conjunto com os elementos previstos no artigo 2.°, n.° 1, depositar na Conservatória aí designada, uma cópia de uma declaração de um Registeraccountant ou de um Accountant-administratieconsulent [dois contabilistas diferentes] que ateste a conformidade da sociedade com os n.os 1 e 2. O artigo 204a, n.° 2, segunda e terceira frases, do livro segundo do Burgerlijk Wetboek é correspondentemente aplicável. A declaração deve ser emitida dentro dos cinco meses anteriores à data em que a sociedade reuniu pela primeira vez as condições previstas na definição do artigo 1.°

(4)    Os gestores respondem solidariamente com a sociedade por todos os negócios jurídicos realizados durante a sua administração que vinculem a sociedade no período anterior ao cumprimento do disposto no artigo 2.°, n.os 1 a 3, ou em qualquer outro período no qual o n.° 1 não seja observado ou o capital próprio se torne inferior ao montante previsto no n.° 1 na sequência de distribuições de dividendos a sócios ou de aquisições de participações abaixo do preço.

(5)    Os n.os 1 a 4 não são aplicáveis às sociedades que se encontrem sujeitas ao direito de um dos Estados-Membros da União Europeia ou de uma das partes do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu de 2 de Maio de 1992, e ainda à Segunda Directiva 77/91/CEE do Conselho, de 13 de Dezembro de 1976, tendente a coordenar as garantias que, para protecção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados-Membros às sociedades, na acepção do segundo parágrafo do artigo 58.° do Tratado, no que respeita à constituição da sociedade anónima, bem como à conservação e às modificações do seu capital social, a fim de tornar equivalentes essas garantias em toda a Comunidade (JO L 26; EE 17 F1 p. 44).

Artigo 5.°

(1)    Sem prejuízo do n.° 2, o artigo 10.°, do segundo livro, do Burgerlijk Wetboek é correspondentemente aplicável às sociedades formalmente estrangeiras. As obrigações nele referidas incumbem aos gestores da sociedade.

(2)    Os gestores devem elaborar em cada ano, no prazo de cinco meses após o fim do ano económico, as contas e o relatório anuais, excepto se este prazo for prorrogado até a um máximo de seis meses através de uma deliberação fundada em circunstâncias extraordinárias. O título nono, do livro segundo, do Burgerlijk Wetboek é correspondentemente aplicável às contas e ao relatório anuais e às restantes informações, sendo a publicidade prevista no artigo 394.° deste livro substituída pelo depósito no registo comercial referido no artigo 2.°, n.° 2.

(3)    O n.° 2 não é aplicável às sociedades que se encontrem sujeitas ao direito de um dos Estados-Membros da União Europeia ou de uma das partes do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu de 1992, e ainda à Quarta Directiva 78/660/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1978, baseada no artigo 54.°, n.° 3, alínea g), do Tratado e relativa às contas anuais de certas formas de sociedades (JO L 222, p. 11; EE 17 F1 p. 55), e à Sétima Directiva 83/349/CEE do Conselho, de 13 de Junho de 1983, baseada no n.° 3, alínea g), do artigo 54.° do Tratado e relativa às contas consolidadas (JO L 193, p. 1; EE 17 F1 p. 119).

(4)    Em cada ano civil, os gestores devem depositar na Conservatória do Registo Comercial, antes do dia 1 de Abril do ano a que digam respeito, um documento comprovativo da inscrição da sociedade no registo no qual se encontra inscrita em conformidade com a legislação que lhe é aplicável. O documento comprovativo deve ser emitido nas quatro semanas anteriores à data do depósito.

III - Matéria de facto e questões prejudiciais

3.
    A Inspire Art Ltd é uma sociedade de responsabilidade limitada constituída em conformidade com o direito inglês. A sua sede estatutária situa-se em Folkestone, no Reino Unido. A sociedade desenvolve a sua actividade comercial exclusivamente nos Países Baixos, não pretendendo iniciar a sua actividade no Reino Unido.

4.
    A constituição da sociedade no Reino Unido teve lugar para que pudesse beneficiar das vantagens que a legislação inglesa em matéria de constituição e de funcionamento das sociedades oferece em comparação com as disposições da lei neerlandesa. Tal como foi afirmado pelo órgão jurisdicional nacional, o qual se fundamentou, por seu turno, nas alegações da Inspire Art Ltd, as vantagens residem no facto de o direito inglês não prescrever a realização integral do capital até ao montante de 18 000 euros, de a constituição poder ser efectuada de forma consideravelmente mais célere, de não haver necessidade de um controlo prévio à constituição e de as alterações estatutárias, a transmissão de participações sociais e a publicidade se encontrarem sujeitas a condições menos restritivas.

5.
    Tal como o órgão jurisdicional nacional reconheceu, a Inspire Art Ltd preenche as condições referidas na definição do artigo 1.° da WFBV, devendo, por conseguinte, ser inscrita no registo comercial na qualidade de «sociedade formalmente estrangeira». Coloca-se a questão de saber se esta inscrição no registo é compatível com as disposições relativas à liberdade de estabelecimento.

6.
    Na perspectiva do órgão jurisdicional nacional, as regras da WFBV restringem a liberdade de estabelecimento da sucursal neerlandesa, uma vez que o gestor da Inspire Art Ltd responde pessoalmente como devedor solidário caso proceda ao registo da sociedade e inicie a actividade comercial sem respeitar as disposições especiais previstas na WFBV.

7.
    O Kantongerecht esclarece que o disposto da WFBV não é aplicável às sociedades de direito inglês que também exerçam alguma actividade num outro Estado-Membro que não os Países Baixos, cujo estabelecimento principal se situe no Reino Unido ou quando exista um qualquer outro vínculo real, embora ténue, com o Reino Unido.

8.
    O órgão jurisdicional nacional refere ainda, citando os já referidos artigos 2.° a 5.° da WFBV, que as disposições legislativas neerlandesas foram adoptadas com o objectivo de restringir a utilização de estruturas societárias estrangeiras por empresas puramente neerlandesas, impondo obrigações adicionais a sociedades formalmente estrangeiras. Através destas disposições, o legislador pretendeu proteger de eventuais prejuízos os terceiros que entram em contacto com a sociedade.

9.
    O Kantongerecht Amsterdam solicita ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre as seguintes questões:

«1)    Devem as disposições conjugadas dos artigos 43.° CE e 48.° CE ser interpretadas no sentido de que obstam a que os Países Baixos subordinem, nos termos da Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen de 17 de Dezembro de 1997, a condições adicionais, como as enunciadas nos artigos 2.° a 5.° desta lei, o estabelecimento, nos Países Baixos, de uma sucursal de uma sociedade que foi constituída no Reino Unido apenas com o objectivo de gozar das vantagens que a sua legislação oferece em comparação com uma constituição da sociedade nos termos do direito neerlandês, que impõe normas mais rígidas do que as aplicáveis no Reino Unido no que respeita à constituição das sociedades e à realização do seu capital, quando o direito neerlandês deduz aquele objectivo do facto de a sociedade exercer as suas actividades inteira ou quase inteiramente nos Países Baixos e, além disso, não ter qualquer ligação efectiva com o Estado em que vigora a legislação nos termos da qual a sociedade foi constituída?

2)    Se da adequada interpretação destes artigos resultar que o disposto na Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen é incompatível com eles, deve o artigo 46.° CE ser interpretado no sentido de que o disposto nos artigos 43.° CE e 48.° CE não obsta à aplicabilidade das disposições neerlandesas da Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen, pelas razões avançadas na fundamentação desta lei pelo legislador neerlandês?»

IV - Observações dos intervenientes

A - Quanto à questão da contrariedade ao Tratado (primeira questão)

1. Os defensores da contrariedade ao Tratado

10.
    A Inspire Art Ltd, o Governo do Reino Unido e a Comissão sustentam que as normas da WFBV violam a liberdade de estabelecimento, uma vez que tornam o estabelecimento nos Países Baixos, no mínimo, menos atraente.

11.
    A Comissão discute, a título liminar, a questão de saber se as regras sobre a liberdade de estabelecimento são de todo aplicáveis a um caso como o que está a ser apreciado, concluindo de forma afirmativa. Remetendo para os acórdãos Centros (3) e Segers (4), afirma que uma sociedade também pode invocar a liberdade de estabelecimento quando é constituída num Estado-Membro apenas com o objectivo de se poder estabelecer num segundo Estado-Membro, onde seria exercido o essencial, ou mesmo a totalidade, das suas actividades económicas. De harmonia com estas acórdãos, o facto de a constituição num Estado-Membro ter tido lugar com a finalidade exclusiva de se eximir à aplicação da legislação do outro Estado-Membro também não é significativo. Segundo a jurisprudência referida, esta prática não constitui um comportamento abusivo, traduzindo tão-só o exercício da liberdade de estabelecimento garantida pelo Tratado. A Inspire Art Ltd e o Governo do Reino Unido defendem entendimentos semelhantes.

12.
    Na perspectiva da Comissão, a invocação das regras sobre a liberdade de estabelecimento também não é excluída pela aplicação da designada «teoria da sede». De acordo com esta teoria, a sociedade é regulada pela legislação do Estado onde se situa a sua sede efectiva. Esta é determinada através do local onde está situada a administração ou a sua administração central.

13.
    Todavia, do ponto de vista da Comissão e da Inspire Art Ltd, a WFBV não representa nenhuma aplicação da teoria da sede. O artigo 1.° da WFBV toma antes por base a actividade da sociedade. Prevalecendo-se dos trabalhos preparatórios da WFBV, defendem que esta segue a conhecida concepção da «conexão mais estreita» do direito internacional privado que conduz à aplicação de determinadas regras imperativas do Estado de acolhimento. O elemento de conexão da actividade efectiva que foi eleito pelo artigo 1.° da WFBV não corresponde, porém, a nenhum dos critérios estabelecidos no artigo 48.° CE, violando desta forma a liberdade de estabelecimento.

14.
    A Inspire Art Ltd defende uma interpretação análoga da WFBV. Salienta que o presente litígio tem por fundamento o facto de o direito neerlandês aplicar, em princípio, às sociedades o direito do Estado de constituição. Apenas por este motivo é que os cidadãos neerlandeses têm a possibilidade de constituir sociedades ao abrigo de uma legislação estrangeira com o objectivo de exercer a totalidade ou o essencial da sua actividade nos Países Baixos. Tal como decorre dos trabalhos preparatórios da WFBV, o legislador tinha precisamente o objectivo de obstar a este fenómeno. Com a aplicação das normas do direito das sociedades neerlandês a estas sociedades, pretendia combater esta possibilidade qualificada de abusiva, tendo invocado como fundamento a protecção dos credores. Por conseguinte, não deve entender-se a WFBV como uma aplicação da teoria da sede.

15.
    A Inspire Art Ltd refere ainda que a WFBV se limita a modificar a norma de conflitos já vigente no direito neerlandês que faz depender a apreciação jurídica da sociedade do Estado de constituição em causa, no sentido em que aplica determinadas disposições imperativas do direito das sociedades neerlandês a sociedades formalmente estrangeiras, ou seja, que não exercem fora dos Países Baixos uma actividade comercial ou o fazem de forma não significativa. Além disso, instituiu condições adicionais para o registo e para as menções a apresentar em documentos.

16.
    A Comissão entende ainda que um Estado-Membro não se pode prevalecer da «teoria da sede» com o objectivo de recusar o direito ao livre estabelecimento por parte de uma sociedade que foi regularmente constituída em conformidade com a legislação de um Estado-Membro.

17.
    Na perspectiva da Inspire Art Ltd, do Governo do Reino Unido e da Comissão, só o facto de a WFBV tornar o estabelecimento menos atraente constitui, desde logo, uma restrição à liberdade de estabelecimento. Segundo os trabalhos preparatórios, a WFBV prossegue precisamente o objectivo de combater a constituição de sociedades estrangeiras com a finalidade de exercer uma actividade exclusiva nos Países Baixos.

18.
    A Inspire Art Ltd alega ainda que apenas pelo facto de além das disposições do Estado de constituição serem ainda aplicáveis outras disposições existe, desde logo, um entrave à liberdade de estabelecimento, por deste modo o exercício da liberdade de estabelecimento se tornar menos atraente.

19.
    O Governo do Reino Unido refere ainda que a possibilidade de criar sucursais noutros Estados-Membros assume um significado fundamental para o funcionamento do mercado comum e considera que a jurisprudência proferida no acórdão Centros é inteiramente transponível para o caso em apreço.

20.
    Relativamente a cada uma das disposições individualmente consideradas, a Inspire Art Ltd e a Comissão alegam ainda o seguinte.

21.
    A Comissão considera que o artigo 2.°, n.° 1, da WFBV - na parte em que se refere à declaração de que a sociedade reúne as condições previstas na definição do artigo 1.°, assim como à indicação da primeira inscrição num registo comercial estrangeiro e às indicações relativas ao sócio único - é incompatível com o artigo 2.° da Décima Primeira Directiva 89/666/CEE (5) e os artigos 43.° CE e 48.° CE. Estas declarações e indicações constituem informações que não eram fornecidas ao abrigo da Décima Primeira Directiva. Por conseguinte, eram contrárias à liberdade de estabelecimento. Ao invés, a Comissão considera que as restantes prescrições do artigo 2.°, n.° 1 (a indicação do registo comercial estrangeiro, a indicação do número da inscrição no registo, o depósito de uma cópia autenticada do acto constitutivo e dos estatutos em língua neerlandesa, francesa, inglesa ou alemã) são compatíveis com a Décima Primeira Directiva e com a liberdade de estabelecimento.

22.
    O artigo 4.°, n.° 3, da WFBV (a apresentação da declaração dos contabilistas) também é considerado incompatível com o artigo 2.° da Décima Primeira Directiva e com os artigos 43.° CE e 48.° CE. Esta declaração não é mencionada na enumeração taxativa do artigo 2.° desta directiva.

23.
    A Comissão sustenta, porém, que o dever de apresentar anualmente uma certidão da inscrição no registo comercial estrangeiro imposto pelo artigo 5.°, n.° 4 é compatível com a Décima Primeira Directiva e com os artigos 43.° CE e 48.° CE.

24.
    A Comissão pretende reformular as questões submetidas e, apoiando-se, em particular, no acórdão Lourenço Dias (6), excluir da apreciação as normas da WFBV que não se referem ao registo propriamente dito. Pretende, nomeadamente, excluir a apreciação dos artigos 3.° e 6.° da WFBV, bem como do artigo 4.°, n.os 1, 2 e 4, da WFBV. Além disso, o artigo 5.°, n.os 1 e 2, da WFBV não seria aplicável por força da intervenção da norma excepcional do n.° 3.

2. Os adversários da contrariedade ao Tratado

25.
    Ao invés, a Kamer van Koophandel e os Governos alemão, italiano, neerlandês e austríaco defendem que as disposições da WFBV são compatíveis com as regras sobre a liberdade de estabelecimento ou conformes às directivas em matéria de sociedades, em particular às Primeira, Segunda, Quarta, Sétima, Décima Primeira e Décima Segunda Directivas (7), ou então que aplicam de forma não discriminatória as disposições que regulam as sociedades de capitais constituídas ao abrigo do direito neerlandês.

26.
    O Governo italiano sustenta que a Inspire Art Ltd não pode invocar as regras sobre a liberdade de estabelecimento. Uma vez que não desenvolvia qualquer actividade comercial no Estado de constituição, o seu estabelecimento nos Países Baixos deve ser considerado a constituição originária e não como a de uma sucursal.

27.
    O Governo alemão pronunciou-se no mesmo sentido. Este governo é de opinião de que o sentido e a finalidade dos artigos 43.° CE e 48.° CE não consistem em beneficiar as designadas sociedades «caixa de correio» que não desenvolvem qualquer actividade empresarial no Estado da sua sede estatutária. Os artigos 43.° CE e 48.° CE têm antes por base a regra geral de que as empresas em causa exercem uma actividade comercial no seu Estado de origem. O Governo alemão considera problemática a jurisprudência assente no acórdão Centros, segundo a qual era suficiente que a sociedade tivesse sido legalmente constituída nos termos da legislação de um Estado-Membro, não sendo, ao invés, necessário o exercício de uma actividade comercial nesse mesmo Estado. Assim, do seu ponto de vista, as medidas nacionais contra as sociedades «caixa de correio» devem continuar a ser admissíveis. O Governo austríaco também chega esta conclusão.

28.
    O Governo italiano traça uma distinção entre a liberdade de estabelecimento das pessoas singulares, por um lado, e a das pessoas colectivas, por outro. No seu entendimento, o fundamento e os limites do reconhecimento de uma sociedade constituída em conformidade com o direito estrangeiro resultavam das actividades que a sociedade tencionava desenvolver. O reconhecimento como pessoa colectiva ocorre no quadro de um ordenamento jurídico concreto. A medida em que a sociedade é reconhecida noutros ordenamentos jurídicos depende da equivalência das condições que lhe eram impostas pelo Estado de constituição e pelo Estado de estabelecimento. Nesta matéria, os Estados-Membros são competentes para exigir a observância de condições adicionais com o objectivo de estabelecer uma situação equivalente à das sociedades constituídas nos termos da sua legislação.

29.
    A Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês são de opinião de que a WFBV não restringe a liberdade de estabelecimento. Ao contrário do que sucedia no acórdão Centros, o registo da sociedade formalmente estrangeira não é recusado. Só estão assim em causa regras relativas à conduta da sociedade formalmente estrangeira, e não a sua constituição ou reconhecimento.

30.
    A Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês confirmam que o direito neerlandês determina, em princípio, o direito aplicável com base na sede estatutária da sociedade, fazendo referência ao artigo 2.° da Wet conflictenrecht corporaties (8) e ao regime do artigo 6.° desta lei, segundo o qual esta lei é aplicável, sem prejuízo da aplicação das normas da WFBV. A conexão eleita pelo direito internacional privado neerlandês opera independentemente do eventual exercício de uma actividade no Estado de constituição. A sede efectiva da sociedade é, em princípio, irrelevante.

31.
    Em virtude do número crescente de sociedades «pseudo-estrangeiras», constituídas principalmente em conformidade com o direito inglês e com o direito do Estado do Delaware dos E.U.A. e desprovidas de qualquer espécie de vínculo real com o Estado de constituição, o legislador neerlandês adoptou na WFBV determinadas medidas específicas com o objectivo de proteger os interesses dos credores, de combate à fraude, de garantir um controlo fiscal eficaz e de evitar o recurso abusivo às estruturas societárias estrangeiras. A Kamer van Koophandel acrescenta que um grande número destas sociedades faliu e que as possibilidades de os credores limitarem os seus prejuízos têm sido praticamente inexistentes.

32.
    Neste contexto, a Kamer van Koophandel refere que decorre do preâmbulo da WFBV que esta lei visa assegura a aplicação de determinadas disposições do direito das sociedades neerlandês a pessoas colectivas estrangeiras que exercem a sua actividade exclusivamente ou, no mínimo, de modo predominante nos Países Baixos e que só em termos puramente formais são sociedades estrangeiras. A WFBV tem por objectivo impedir o recurso abusivo a estruturas societárias estrangeiras, bem como garantir a protecção dos credores.

33.
    A Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês opinam que as medidas estabelecidas na WFBV não são discriminatórias, constituindo apenas uma aplicação das disposições imperativas do direito das sociedades neerlandês que também vigoram para todas as sociedades criadas ao abrigo deste direito.

34.
    Relativamente a cada uma das disposições da WFBV, a Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês chegaram à seguinte conclusão.

35.
    As obrigações impostas pelo artigo 2.° da WFBV (declaração de que a sociedade é uma sociedade formalmente estrangeira na acepção do artigo 1.°, o depósito de uma cópia autenticada do acto constitutivo e, eventualmente, do pacto social em língua neerlandesa, francesa, inglesa ou alemã, a indicação do registo comercial estrangeiro e da data da primeira inscrição) têm correspondência no artigo 2.°, n.° 2, alínea b), e no artigo 4.° da Décima Primeira Directiva, assim como no artigo 2.°, n.° 2, alínea c), conjugado com o artigo 2.°, n.° 1, alínea c), da Décima Primeira Directiva. O Governo neerlandês acrescenta que as restantes regras (o nome, os dados pessoais e o domicílio do sócio único) são conformes às disposições aplicáveis às sociedades neerlandesas.

36.
    No entendimento do Governo neerlandês, esta afirmação também é válida para a responsabilidade solidária dos gestores (artigo 4.°, n.° 4, da WFBV). Segundo o Código Civil (artigos 2:69, n.° 2, e 2:180, n.° 2), esta responsabilidade é igualmente aplicável às sociedades constituídas em conformidade com a legislação neerlandesa.

37.
    As obrigações previstas no artigo 3.° da WFBV são, de igual modo, conformes às prescritas pelo Código Civil para as sociedades de capitais neerlandesas (artigo 2:75, n.os 1 e 2, artigo 2.168; Decreto sobre o registo comercial de 1996). Estão especificamente em causa as normas sobre a firma utilizada pela sociedade. De resto, as exigências do artigo 3.° têm correspondência quer no artigo 4.° da Primeira Directiva - que, por força dos actos de adesão, também se aplica às sociedades constituídas em conformidade com o direito inglês - quer no artigo 6.° da Décima Primeira Directiva.

38.
    Da mesma maneira, o artigo 4.°, n.os 1 a 3, da WFBV não acrescenta mais nada em relação às disposições aplicáveis às sociedades de capitais segundo o Código Civil neerlandês (artigos 2:178 e 2:204a, n.° 2). Ao invés, a responsabilidade solidária dos gestores prevista no artigo 4.°, n.° 4, da WFBV só é imposta aos gestores de uma sociedade formalmente estrangeira. Por seu turno, ao remeter para a Segunda Directiva, o artigo 4.°, n.° 5, da WFBV limita-se a comprovar a compatibilidade da WFBV com o direito comunitário.

39.
    O Governo neerlandês alega que o artigo 5.° da WFBV é conforme às regras sobre as contas anuais previstas no título nono, do livro segundo, do Código Civil neerlandês. Estas normas são ainda conformes às Quarta e Sétima Directivas. A obrigação resultante do artigo 5.°, n.° 4, da WFBV tem correspondência no artigo 2.°, n.° 2, alínea c), da Décima Primeira Directiva. O Governo neerlandês invoca ainda o artigo 5.°, n.° 3, da WFBV, o qual, com a sua referência ao direito comunitário, volta a confirmar a compatibilidade da disposição com esse direito.

40.
    Não obstante as suas extensas considerações sobre cada uma das normas da WFBV, a Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês sustentam, à semelhança da Comissão, que as questões prejudiciais têm uma formulação demasiado ampla. De acordo com a jurisprudência assente no acórdão Lourenço Dias (9), a apreciação do Tribunal de Justiça deve restringir-se às disposições da WFBV relacionadas com a inscrição no registo comercial. Estas são o artigo 2.°, n.° 1, primeiro a terceiro períodos (registo na qualidade de sociedade formalmente estrangeira), o artigo 4.°, n.° 4 (responsabilidade solidária dos gestores), bem como o artigo 4.°, n.os 1 a 3 (relatório de um contabilista, capital mínimo, capital próprio e a responsabilidade solidária dos gestores por estas declarações). Todas as outras disposições são irrelevantes para o processo principal, não devendo, por conseguinte, ser consideradas pelo Tribunal de Justiça.

41.
    A Kamer van Koophandel e os Governos alemão e neerlandês invocam ainda o acórdão Daily Mail (10). Neste acórdão, o Tribunal de Justiça reconheceu que o Direito Internacional Privado dos Estados-Membros apresenta configurações muito diversas quanto ao elemento de conexão escolhido para a determinação do direito aplicável às sociedades. O Tribunal decidiu que as normas sobre a liberdade de estabelecimento não se sobrepõem a estes regimes. A WFBV limita-se a complementar as regras do direito neerlandês que utilizam a sede estatutária de uma sociedade como elemento de conexão (artigo 2.° da Wet conflictenrecht corporaties), determinando a aplicação de certas disposições imperativas do direito das sociedades neerlandês a sociedades que apenas exercem a sua actividade nos Países Baixos e que se encontravam desprovidas de qualquer espécie de vínculo real com o Estado de constituição. Por conseguinte, a WFBV limita-se a estabelecer uma conexão com o lugar onde a sociedade exerce efectivamente a sua actividade. Assim, de harmonia com a jurisprudência fixada no acórdão Daily Mail, as disposições em apreço devem ser consideradas compatíveis com a liberdade de estabelecimento.

42.
    A Kamer van Koophandel e o Governo alemão observam a título complementar que, mesmo após o acórdão Daily Mail, ainda nenhuma directiva em matéria de direito das sociedades procedeu à harmonização do elemento de conexão. Por conseguinte, as declarações proferidas neste acórdão mantêm a sua validade.

43.
    Além disso, a Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês referem que só com o Tratado de Amesterdão a Comunidade Europeia obteve pela primeira vez competência em matéria de Direito Internacional Privado. No entanto, nos termos do artigo 293.° CE, certas questões no âmbito do direito das sociedades devem continuar a ser solucionadas por meio de um acordo entre os Estados-Membros mesmo após a introdução do artigo 65.° CE, o que comprova o estatuto especial que o Direito Internacional Privado continuava a merecer.

44.
    Na perspectiva do Governo neerlandês, os Estados-Membros mantêm a competência para adoptar a teoria da constituição, como concretizada na Wet conflictenrecht corporaties e na WFBV. As disposições relativas à liberdade de estabelecimento não obstam a esta opção. Segundo o acórdão Centros (11), os Estados-Membros têm o direito de tomar medidas que os protejam de um uso abusivo das liberdades fundamentais. O Governo neerlandês sustenta que a WFBV é uma medida deste género.

45.
    O Governo alemão considera igualmente que a WFBV constitui uma medida destinada a impedir o recurso abusivo à liberdade de estabelecimento e a subtracção à legislação nacional mais restritiva. O Tribunal de Justiça reconheceu expressamente, no acórdão Centros (12), que os Estados-Membros têm o direito de adoptar este género de medidas.

46.
    O Governo neerlandês sustenta que este entendimento é igualmente compatível com a decisão proferida no acórdão Segers (13). É certo que a mera salvaguarda da liberdade decorrente do Tratado não constitui ainda um comportamento abusivo. Porém, a WFBV também não recusa o reconhecimento das sociedades constituídas em conformidade com uma legislação estrangeira, limitando-se a prevenir a possibilidade de uma sociedade se subtrair às disposições imperativas do Estado-Membro onde desenvolve a sua actividade comercial. Na perspectiva do Governo neerlandês, há que considerar abusivo o comportamento de uma sociedade que actua com o único objectivo de se subtrair à aplicação das disposições que regulam a sua constituição, sendo lícito à WFBV combatê-lo, pelo menos, no actual estádio do direito comunitário.

47.
    O Governo neerlandês considera que as obrigações prescritas pela WFBV são fundamentalmente de natureza administrativa, sendo impostas condições equivalentes a todas as sociedades criadas ao abrigo do direito neerlandês.

48.
    Na opinião do Governo neerlandês, a Décima Primeira Directiva procede apenas a uma harmonização parcial. Fora do seu âmbito de aplicação, os Estados-Membros preservam as suas competências legislativas.

49.
    Caso seja admitida a existência de uma violação da liberdade de estabelecimento, esta violação deve, em qualquer caso, ser considerada de pouca importância e, enquanto tal, compatível com o direito comunitário. No âmbito da interpretação das outras liberdades fundamentais, a jurisprudência exigiu sempre uma violação de uma certa intensidade (14).

B - Quanto à questão da justificação (segunda questão)

1. Os que se opõem à existência de uma justificação

50.
    A Inspire Art Ltd e a Comissão também não consideram justificadas as regras da WFBV.

51.
    Do ponto de vista da Inspire Art Ltd, do Governo do Reino Unido e da Comissão deve ser excluída a existência de uma justificação nos termos do artigo 46.° CE. Com efeito, resulta do acórdão Centros (15) uma proibição de invocar de forma abusiva a liberdade de estabelecimento. No entanto, um tal comportamento abusivo não decorre só por si do facto de a sociedade não desenvolver qualquer actividade no Estado de constituição. Perante cada caso concreto, as entidades administrativas e os tribunais têm, ao invés, a obrigação de verificar a existência dos pressupostos dos quais depende a justificação da restrição à liberdade de estabelecimento. A existência de uma lei geral como a WFBV não é suficiente.

52.
    Por outro lado, o acórdão Centros admitiu, quando muito, uma possibilidade de restrição quando esteja em causa o cumprimento de normas relativas ao exercício de determinadas actividades profissionais. No entanto, no caso da Inspire Art Ltd, só estava em causa simplesmente o estabelecimento e a questão de saber se as regras do direito das sociedades neerlandês, por exemplo, sobre o capital mínimo, devem ser observadas. Tal como fora afirmado no acórdão Centros, o aproveitamento das regras mais favoráveis de um outro Estado-Membro não constitui um comportamento abusivo, mas justamente o exercício da liberdade de estabelecimento.

53.
    Segundo a Inspire Art Ltd, a aplicação do artigo 46.° CE pressupõe a existência de um perigo concreto para a ordem pública. De resto, a Inspire Art Ltd, o Governo do Reino Unido e a Comissão remetem para a decisão do Tribunal de Justiça no acórdão Centros (16), segundo a qual a protecção dos credores não é, em princípio, abrangida pelo regime derrogatório do artigo 46.° CE.

54.
    Por último, a Inspire Art Ltd, o Governo do Reino Unido e a Comissão entendem que a invocação de razões imperativas de interesse geral não é suficiente para justificar as normas da WFBV. É certo que a protecção dos credores constituía uma razão de interesse geral, não sendo, porém, as normas dos artigos 2.°, 4.° e 5.° da WFBV adequadas a garantir esta protecção.

55.
    Em primeiro lugar, a Inspire Art Ltd e a Comissão referem que a sociedade se apresenta na vida comercial como uma sociedade de direito inglês, não podendo assim os credores ser induzidos em erro a este respeito. As disposições da Quarta e da Décima Primeira Directivas garantem uma certa transparência das contas anuais e das relações da sociedade. Os credores são, de certa forma, responsáveis pela sua actuação. Se as garantias previstas no direito inglês não são, no seu entender, suficientes, têm a faculdade de exigir garantias adicionais ou de se absterem de contratar com a sociedade constituída ao abrigo do direito estrangeiro.

56.
    O Governo do Reino Unido e a Comissão referem ainda que a WFBV não seria aplicável no caso de a Inspire Art Ltd desenvolver uma actividade, mesmo reduzida, noutro Estado-Membro. Nesta circunstância, o risco para os credores é, porém, tão elevado como no caso em que a actividade é exercida de forma exclusiva nos Países Baixos.

57.
    No entendimento da Inspire Art Ltd, as regras sobre o capital mínimo não garantem a protecção dos credores. O direito neerlandês permite que o capital social mínimo seja, por exemplo, integralmente mutuado logo após a sua realização e o registo da sociedade, ficando assim os credores privados do mesmo. Nesta medida, estas normas da WFBV não são sequer adequadas para alcançar a desejada protecção dos credores.

58.
    Segundo a Inspire Art Ltd e a Comissão, as normas relativas à responsabilidade solidária dos directores são, além disso, discriminatórias. Nos termos do artigo 4.°, n.° 4, da WFBV, os gestores são também responsáveis no caso de, após a inscrição no registo comercial, o capital social mínimo se tornar inferior ao limite prescrito. Ao invés, os gestores de uma sociedade de responsabilidade limitada (b. v.) criada ao abrigo do direito neerlandês não se encontram sujeitos a esta responsabilidade gravosa. Além disso, em comparação com o estipulado para as sociedades neerlandesas, o círculo dos responsáveis é alargado às pessoas que efectivamente dirigem os negócios da sociedade.

59.
    Na perspectiva da Comissão, as disposições do artigo 4.°, n.os 1, 2 e 4, da WFBV são ainda desproporcionadas pelo facto de a Inspire Art Ltd se apresentar na vida comercial como uma sociedade de direito inglês. Além do mais, as normas da Quarta e da Décima Primeira Directivas já proporcionavam a transparência necessária.

60.
    A Inspire Art Ltd e o Governo do Reino Unido chegam à mesma conclusão. O Governo do Reino Unido acrescenta que os Estados-Membros não têm competência para impor às sucursais de sociedades estrangeiras condições adicionais relativamente às instituídas a nível comunitário através da Quarta e da Décima Primeira Directivas com o objectivo de harmonizar a protecção dos credores.

61.
    Além disso, são concebíveis medidas menos drásticas. É, por exemplo, possível criar as condições legais para que os credores públicos possam obter destas sucursais as garantias necessárias (17).

62.
    O Governo do Reino Unido considera ainda que as disposições da WFBV sobre a contabilidade e as contas anuais são desnecessárias. O direito inglês impõe regras adequadas às contas anuais das sociedades de responsabilidade limitada. Além do mais, estas normas violam a Décima Primeira Directiva, que proíbe os Estados onde está localizada a sede da sucursal de exigir determinadas informações.

2. Os defensores da existência de uma justificação

63.
    Pelo contrário, a Kamer van Koophandel e os Governos alemão, neerlandês e austríaco consideram que as disposições da WFBV são, em todo o caso, justificadas tanto com fundamento no artigo 46.° CE, como em razões imperativas de interesse geral.

64.
    A WFBV tem por objectivo a luta contra a fraude. Os acórdãos Centros e Segers tinham reconhecido expressamente este objectivo como uma causa legítima de justificação (18). A WFBV visa ainda proteger os credores, o que também constitui uma causa de justificação reconhecida pela jurisprudência (19). Por outro lado, a WFBV visa assegurar um controlo fiscal eficaz, justificação esta que foi igualmente aceite pela jurisprudência (20). Por fim, é protegida a lealdade nas trocas comerciais, a qual também é uma causa legítima de justificação (21).

65.
    Do ponto de vista do Governo austríaco, o registo das designadas sociedades «caixa de correio» assume uma função preventiva. A informação é importante para que potenciais parceiros negociais possam decidir se querem estabelecer relações negociais com a sociedade em causa. No acórdão Centros, foi expressamente reconhecida a necessidade desse género de informações no âmbito das relações comerciais (22).

66.
    A argumentação da Kamer van Koophandel e do Governo neerlandês vai no mesmo sentido. A indicação da primeira inscrição num registo comercial estrangeiro exigida pelo artigo 2.°, n.° 1, da WFBV informa os terceiros acerca do momento a partir do qual a sociedade se encontra constituída, a partir do qual desenvolve a sua actividade económica e sobre se eventualmente ocupa uma posição estável no mercado. A esta data são também susceptíveis de ser associados determinados efeitos jurídicos, como a obtenção da personalidade jurídica.

67.
    A informação sobre a natureza formalmente estrangeira da sociedade dá aos terceiros a possibilidade de tomarem conhecimento desta circunstância e de a tomarem em consideração na apreciação da solidez da sociedade. A informação de que a sociedade era regulada por um direito estrangeiro reveste igualmente importância para as autoridades estatais competentes.

68.
    O interesse de terceiros em saber que existe apenas um sócio único (v. o artigo 3.° da WFBV) foi expressamente reconhecido no artigo 3.° da Décima Segunda Directiva.

69.
    O regime do artigo 4.° da WFBV tem por fim a protecção dos credores. O artigo 6.° da Segunda Directiva admitiu expressamente a importância do capital social mínimo para as sociedades abrangidas pelo seu âmbito de aplicação. As regras sobre o capital social mínimo têm como principal objectivo fortalecer a solidez financeira das sociedades e, por conseguinte, assegurar uma maior protecção aos credores públicos e privados. Visam ainda, de forma mais geral, proteger todos os credores contra o risco da existência de falências fraudulentas induzidas através da constituição de sociedades que não eram dotadas de início com o capital necessário.

70.
    Finalmente, a responsabilidade solidária dos gestores limita-se a sancionar de forma equitativa o incumprimento das normas da WFBV. Por outro lado, os gestores de uma sociedade neerlandesa encontravam-se submetidos a uma responsabilidade comparável. Esta responsabilidade também não é estranha ao direito comunitário, como demonstra o artigo 51.° da proposta de regulamento sobre a sociedade europeia. Além disso, o artigo 4.°, n.° 1, da Segunda Directiva autoriza os Estados-Membros a adoptarem normas de responsabilidade adequadas no caso de não ser possível dissolver a sociedade.

71.
    A Kamer van Koophandel alega que a regulamentação prevista na WFBV não é discriminatória. Estas regras davam justamente lugar a que fossem aplicadas às sociedades estrangeiras as normas que também vigoram para as sociedades constituídas ao abrigo do direito neerlandês. Estas são, para além do Código Civil, a Lei sobre o registo comercial de 1996 e o Decreto sobre o registo comercial de 1996.

72.
    Do ponto de vista da Kamer van Koophandel e do Governo austríaco, estas medidas também são adequadas à realização dos objectivos prosseguidos. Elas contribuem para que os credores da sociedade sejam informados de que está em causa uma sociedade regida por uma legislação estrangeira. Além disso, asseguram aos credores a protecção que podiam legitimamente esperar de uma sociedade criada em conformidade com o direito neerlandês.

73.
    Face ao exposto, o Governo austríaco sustenta que as normas sobre o capital social mínimo constituem um meio adequado e proporcionado. A própria Segunda Directiva estabeleceu a importância do capital social mínimo para as sociedades anónimas. No entanto, não existe uma norma análoga para as sociedades de responsabilidade limitada. Com excepção da Irlanda e do Reino Unido, existem, porém, em todos os Estados-Membros disposições sobre o capital social mínimo que estas sociedades devem assegurar. Ao contrário da responsabilidade pessoal dos sócios, da qual não advém frequentemente qualquer vantagem em situações de falência, a exigência de um capital social de responsabilidade oferecia uma maior segurança.

74.
    As exigências da WFBV no que respeita à contabilidade, bem como à elaboração e à publicidade de contas anuais constituem igualmente uma garantia necessária e eficaz para os credores. A Quarta Directiva só institui condições mínimas. Devido às múltiplas liberdades de escolha que concedia aos Estados-Membros, estes tinham um interesse digno de reconhecimento em impor a aplicação das normas de transposição da referida directiva a todas as sociedades que vão exercer uma actividade no seu território.

75.
    Na opinião da Kamer van Koophandel, as medidas também não excedem a medida do necessário para alcançar o objectivo prosseguido. A inobservância das obrigações que decorrem da WFBV não dá lugar à recusa de reconhecimento da sociedade estrangeira, mas tão-só à responsabilidade dos directores. A Kamer van Koophandel conclui, a este respeito, que a circunstância de uma sociedade não cumprir ou ter deixado de cumprir as disposições relativas ao capital social mínimo constitui um claro indício da existência de um comportamento abusivo ou fraudulento.

V - Apreciação

76.
    O presente caso dá azo a um desvio da jurisprudência fixada no acórdão Centros? Esta é, afinal, a questão que é suscitada no presente pedido de reenvio prejudicial.

77.
    A factualidade subjacente a este caso diverge da do processo Centros pelo facto de o direito neerlandês não recusar o registo da sucursal, exigindo, porém, a sua qualificação como sociedade formalmente estrangeira e associar ao registo nesta qualidade determinadas consequências. Por conseguinte, coloca-se a questão de saber se e, em caso afirmativo, em que medida esta diferença conduz a uma apreciação jurídica divergente da do caso Centros no que respeita à compatibilidade deste regime com as regras em matéria de liberdade de estabelecimento.

78.
    As posições de fundo defendidas pelos intervenientes podem ser resumidas, em traços largos, da seguinte forma. Alguns são de opinião de que a regulamentação prevista na WFBV constitui uma restrição injustificada à liberdade de estabelecimento, uma vez que aquela determinava a aplicação do direito neerlandês das sociedades, nomeadamente as regras relativas ao capital social mínimo, à sociedade estrangeira. Outros sustentam que a WFBV não restringe a liberdade de estabelecimento, visto que as sociedades estrangeiras não apresentam qualquer conexão efectiva com o Estado de constituição e que se limitava a instituir determinadas condições adicionais ao exercício da sua actividade comercial. A restrição deve, pelo menos, ser considerada justificada por razões de protecção dos credores e de prevenção do uso abusivo das possibilidades conferidas pela liberdade de estabelecimento.

A - Aplicabilidade das regras sobre a liberdade de estabelecimento

79.
    Antes de apreciar cada um dos argumentos, cumpre proceder a duas constatações relacionadas com o âmbito de aplicação das disposições relativas à liberdade de estabelecimento e que têm por base os acórdãos Segers e Centros.

80.
    Em primeiro lugar, o exercício de uma actividade no Estado de constituição não é uma condição prevista no Tratado para a criação de sucursais noutros Estados-Membros (23). O facto de uma sociedade não desenvolver nenhuma actividade económica no Estado de constituição não a priva da possibilidade de invocar a liberdade de estabelecimento.

81.
    Em segundo lugar, as razões que levam à criação da sociedade no estrangeiro são irrelevantes, conquanto não sejam desleais. Ainda que a constituição tenha lugar com o objectivo exclusivo de se subtrair às disposições sobre a constituição e o funcionamento das sociedades do Estado-Membro no qual deve ser desenvolvida a actividade, esta razão não exclui por si só a possibilidade de recorrer às regras sobre a liberdade de estabelecimento (24).

82.
    Na minha opinião, as questões prejudiciais submetidas pelo Kantongerecht Amsterdam e a factualidade subjacente ao processo principal não constituem fundamento bastante para uma alteração desta jurisprudência assente. Aliás, esta também não foi posta em causa nos acórdãos Daily Mail (25) e Überseering (26).

83.
    A determinação do âmbito de aplicação dos artigos 43.° CE e 48.° CE efectuada nos acórdãos Segers e Centros afigura-se para alguns insatisfatória, uma vez que pode ter como consequência a não aplicação de normas nacionais consideradas importantes e justas. Ela contribui, porém, para a realização no mercado interno do direito à liberdade de estabelecimento concedido pelo Tratado.

B - Restrição à liberdade de estabelecimento

84.
    Cumpre agora verificar se as disposições da WFBV constituem um entrave à liberdade de estabelecimento.

1. As disposições da Wet op de formeel buitenlandse vernootschappen em apreciação

85.
    Em primeiro lugar, há que verificar quais as disposições da WFBV que constituem o objecto do presente pedido de reenvio prejudicial. O órgão jurisdicional de reenvio invocou os artigos 2.° a 5.° da WFBV e, nomeadamente, o facto de a sociedade formalmente estrangeira dever ser inscrita nessa qualidade no registo comercial (artigo 2.°), de os documentos por ela elaborados deverem conter determinadas menções obrigatórias (artigo 3.°), e de o capital social nominal e a percentagem já liberada do mesmo deverem atingir, no mínimo, o montante previsto para as sociedades constituídas em conformidade com o direito neerlandês (artigo 4.°). Fez ainda referência a outras disposições aplicáveis à elaboração e à apresentação das contas anuais e do relatório anual. Além disso, considerou que a imposição da responsabilidade pessoal e solidária dos gestores em caso de incumprimento das obrigações previstas na WFBV representa um entrave à liberdade de estabelecimento. Com base nesta exposição, o pedido de reenvio prejudicial é susceptível de ser interpretado no sentido de que devem ser apreciadas as questões da qualificação da sociedade como formalmente estrangeira (artigos 2.° e 3.°), do capital social mínimo a realizar (artigo 4.°, n.os 1 a 3) e da responsabilidade pessoal dos gestores (artigo 4.°, n.° 4).

86.
    Ao invés, a Kamer van Koophandel, o Governo neerlandês, o Governo do Reino Unido e a Comissão pretendem restringir a análise às disposições que regulam a inscrição da sociedade no registo comercial. Defendem que as questões prejudiciais devem ser examinadas à luz do litígio no processo principal. Uma vez que este só tem por objecto a inscrição no registo comercial, os artigos 3.° e 6.° da WFBV, em particular, não devem ser apreciados no presente processo de reenvio. Além disso, a Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês pretendem ainda excluir da apreciação certas partes dos artigos 2.° e 5.°

87.
    Segundo a jurisprudência invocada por estes intervenientes (27), «[...] o juiz nacional, único a ter um conhecimento directo dos factos do processo, é quem está melhor colocado para julgar, à luz das especificidades deste, da necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua própria decisão. Consequentemente, incidindo as questões submetidas pelo juiz nacional sobre a interpretação de uma disposição de direito comunitário, o Tribunal de Justiça tem, em princípio, o dever de decidir [...]». Todavia, a fim de ajuizar da sua própria competência, analisa as condições «[...] em que o juiz nacional efectuou o reenvio». Efectivamente, o Tribunal de Justiça considera ser sua missão «[...] contribuir para a administração da justiça nos Estados-Membros e não dar opiniões sobre questões gerais ou hipotéticas [...] É em atenção a esta missão que o Tribunal de Justiça considera não poder pronunciar-se sobre uma questão prejudicial suscitada perante um órgão jurisdicional nacional, designadamente quando [...] a interpretação do direito comunitário [...] [solicitada] pelo órgão jurisdicional nacional, não [tiver] qualquer relação com a realidade ou o objecto do litígio no processo principal [...]» (28).

88.
    É certo que há que concordar com os intervenientes que na acção principal está em causa a questão de saber se a Inspire Art Ltd deve ser inscrita no registo comercial na qualidade de sociedade formalmente estrangeira. Contudo, são associadas a esta inscrição determinadas consequências jurídicas que se encontram estabelecidas em pormenor nos artigos 2.° a 5.° da WFBV. Estas consequências jurídicas são indissociáveis e só dependem do registo da sociedade como formalmente estrangeira. A decisão sobre o montante do capital social mínimo que a Inspire Art Ltd deve realizar, sobre a denominação que deve apresentar na correspondência comercial e sobre se os seus gestores podem, se for o caso, ser responsabilizados pessoal e solidariamente, decorre directamente da decisão sobre se ela deve ou não ser registada como uma sociedade formalmente estrangeira. Nesta medida, devem ser consideradas no presente processo as normas respectivas dos artigos 2.°, 3.° e 4.° da WFBV, não parecendo razoável apreciar a questão do registo sem considerar as consequências jurídicas que lhe estão necessariamente associadas.

89.
    Na presente acção, não existem quaisquer indícios que confirmem a existência de um litígio simulado ou de que o Tribunal de Justiça seja chamado a pronunciar-se sobre uma questão jurídica hipotética sem qualquer relevância para a acção principal.

90.
    Uma questão diferente consiste em saber quais as disposições da WFBV concretamente aplicáveis à Inspire Art Ltd; por exemplo, se os regimes derrogatórios do artigo 4.°, n.° 5, e do artigo 5.°, n.° 3, da WFBV têm aplicação. Esta questão deve ser esclarecida pelo juiz nacional, não sendo apreciada no âmbito do processo de reenvio.

91.
    Por conseguinte, cumpre concluir que os artigos 2.° a 5.° da WFBV constituem o objecto do pedido de decisão prejudicial. Em conformidade com a jurisprudência acima referida, irão ser especialmente abordados os aspectos realçados pelo órgão jurisdicional nacional relativos ao registo da sociedade formalmente estrangeira nessa qualidade, a denominação que deve apresentar em documentos, o capital social mínimo que deve realizar e a responsabilidade pessoal e solidária dos gestores.

92.
    Pelo exposto, afigura-se desnecessário apreciar a questão, discutida por alguns intervenientes, quanto a saber em que medida as disposições da WFBV são compatíveis com as diversas directivas de harmonização do direito das sociedades. É que, na opinião de todos os intervenientes no processo, as disposições tidas em conta pelo órgão jurisdicional nacional não se incluem no âmbito de aplicação destas directivas.

2. Existência de uma restrição à liberdade de estabelecimento

93.
    O artigo 43.° CE, conjugado com o artigo 48.° CE, concede às sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro, que tenham a sua sede social, a sua administração central ou o seu estabelecimento principal na Comunidade, o direito de constituir e gerir agências, sucursais ou filiais noutros Estados-Membros e nas mesmas condições que o Estado de acolhimento estabelece para os seus próprios nacionais.

94.
    Segundo jurisprudência assente, daqui resulta directamente que as sociedades têm o direito de exercer a sua actividade noutro Estado-Membro, servindo a localização da sua sede social, da sua administração central ou do seu estabelecimento principal para determinar, tal como a nacionalidade das pessoas singulares, a sua conexão com a ordem jurídica de um Estado-Membro (29). No acórdão Überseering, o Tribunal de Justiça inferiu desta afirmação que o exercício da liberdade de estabelecimento pressupõe necessariamente o reconhecimento das referidas sociedades por qualquer Estado-Membro no qual as mesmas pretendam estabelecer-se (30).

95.
    O Governo neerlandês entende que a WFBV é compatível com esta jurisprudência. Diversamente do que sucedia no acórdão Centros, a ordem jurídica neerlandesa não recusa o reconhecimento da Inspire Art Ltd. A WFBV limita-se a impor-lhe determinadas obrigações adicionais que eram qualificadas pelo Governo neerlandês como «administrativas».

96.
    Estas designadas obrigações administrativas abrangem a aplicação das disposições neerlandesas relativas ao capital social mínimo da sociedade e a instituição de uma responsabilidade solidária dos gestores pelas obrigações da sociedade, em caso de incumprimento das obrigações previstas na WFBV. Era legítimo afirmar-se a este respeito que as obrigações impostas pela WFBV vinculam os gerentes ou «administradores» da sociedade, tal como é observado pela Kamer van Koophandel. Por conseguinte, não estão em causa quaisquer obrigações «administrativas» que se limitem a regular o exercício de uma actividade económica. A realização de um determinado capital social mínimo diz respeito à constituição da sociedade, facto este que é confirmado pelo direito neerlandês. As disposições reguladoras do capital social mínimo encontram-se previstas no artigo 178.° do Burgerlijk Wetboek, ou seja, entre as regras gerais sobre a constituição das sociedades de responsabilidade limitada.

97.
    Em última instância, as regras da WFBV conduzem à aplicação das disposições consideradas imperativas do direito neerlandês - nomeadamente as relativas ao capital social mínimo - às sociedades que foram constituídas ao abrigo do direito de outro Estado-Membro no qual também se situa a sua sede estatutária, mas que desenvolvem a sua actividade económica integral ou quase integralmente nos Países Baixos.

98.
    Este também era o resultado pretendido pelo legislador neerlandês, o que é comprovado pelo preâmbulo da WFBV, pelas diversas referências, acima mencionadas, ao Burgerlijk Wetboek neerlandês e às regras sobre o registo comercial que constam das observações da Kamer van Koophandel e do Governo neerlandês, bem como pela documentação relativa aos trabalhos preparatórios da WFBV invocada por vários intervenientes. A WFBV tem por objectivo obstar ao crescente recurso, na prática comercial, a estruturas societárias estrangeiras, nomeadamente do direito inglês e do direito do Estado do Delaware dos E.U.A. (31). Como foi alegado pela Kamer van Koophandel, muitas destas sociedades, que desenvolviam a sua actividade nos Países Baixos exclusivamente por intermédio de sucursais, entraram em falência. Por isso, as sociedades que desenvolviam a sua actividade inteira ou quase inteiramente nos Países Baixos deviam voltar a gozar do benefício que pretendiam obter através da constituição de uma sociedade ao abrigo de uma legislação estrangeira. Estas sociedades deviam ser submetidas às disposições do direito das sociedades neerlandês, especialmente no que diz respeito ao seu capital social mínimo e à protecção dos seus credores (32).

99.
    Se uma sucursal for submetida ao mesmo regime que um estabelecimento principal, o resultado equivale a um não reconhecimento das sociedades constituídas em conformidade com o direito estrangeiro. Segundo a WFBV, a criação de uma sucursal deve obedecer às mesmas condições que se encontram estabelecidas para a constituição de uma sociedade de responsabilidade limitada nos Países Baixos. A WFBV nega os efeitos do direito estrangeiro, do qual já decorria a existência da sociedade.

100.
    A liberação do capital social mínimo e a responsabilidade dos gestores são, em princípio, reguladas pelo direito do Estado em conformidade com o qual a sociedade foi constituída, ou seja, no caso da Inspire Art Ltd, em conformidade com o direito inglês. As condições impostas pela WFBV sobrepõem-se a estes regimes. Nesta medida, a WFBV restringe a liberdade de estabelecimento. Esta abrange igualmente o direito de um nacional constituir uma sociedade no Estado-Membro cujas regras de direito das sociedades lhe parecem menos rigorosas e de criar a seguir sucursais noutro Estado-Membro. O referido efeito da WFBV é incompatível com a jurisprudência proferida nos acórdãos Centros (33) e Überseering (34). O direito neerlandês acaba por negar à sociedade constituída ao abrigo do direito inglês o reconhecimento que é exigido pelo direito comunitário.

101.
    Como fundamento para o reconhecimento incompleto das regras do Estado de constituição é constantemente invocado o facto de a sociedade não possuir um vínculo real com esse mesmo Estado. Esta consideração foi igualmente determinante no caso da WFBV, como demonstram os trabalhos preparatórios e o seu artigo 1.° No caso da Inspire Art Ltd, é tomado em conta que a sociedade não desenvolve nenhuma actividade comercial no Reino Unido, mas sim integralmente nos Países Baixos e tal como pretendido desde o início. O próprio órgão jurisdicional de reenvio afirma que a decisão seria diferente caso a Inspire Art Ltd desenvolvesse ainda alguma actividade comercial em qualquer outro Estado-Membro.

102.
    Tal como resulta designadamente das observações da Kamer van Koophandel, a WFBV tem por efeito associar a aplicação de determinadas regras jurídicas ao facto de a pessoa colectiva não apresentar qualquer ligação efectiva com o Estado de constituição e exercer a sua actividade comercial integral ou quase integralmente nos Países Baixos. Não obstante todos os intervenientes processuais salientarem sempre, com base no artigo 2.° da Wet conflictenrecht corporaties, que o direito neerlandês não tem por fundamento a teoria da sede, defendida, por exemplo, pela jurisprudência e pela doutrina dominante na Alemanha, mas sim a designada teoria da constituição, a WFBV tem, porém, o mesmo efeito do que a aplicação da teoria da sede. A existência de uma sociedade estrangeira não é reconhecida sem mais.

103.
    De acordo com a jurisprudência actual, o exercício do direito à constituição de uma sucursal não está sujeito ao desenvolvimento de uma actividade comercial no Estado de constituição, tal como já foi referido no início da apreciação jurídica. Inteiramente nesta linha, o Tribunal de Justiça afirmou, no acórdão Überseering, que a consequência jurídica da «teoria da sede», nomeadamente o facto de a sociedade que transfere a sua sede efectiva dever ser reconstituída para lhe ser reconhecida capacidade jurídica, é incompatível com a liberdade de estabelecimento. A exigência de reconstituição no segundo Estado-Membro equivale à própria negação da liberdade de estabelecimento (35). O que foi decidido no acórdão Überseering sobre a transferência involuntária do estabelecimento principal deve também valer para a constituição de uma sucursal.

104.
    No presente caso, não vejo qualquer motivo para divergir desta jurisprudência. Os resultados, segundo alguns insatisfatórios, não são mais do que a consequência do actual estádio de desenvolvimento do direito comunitário. O Tratado garante o direito, integral e sem reservas, à liberdade de estabelecimento, incluindo a possibilidade de criar sucursais, com excepção do disposto no artigo 46.° CE. Os Estados-Membros ainda não lograram chegar a acordo sobre uma harmonização das suas disposições relativas ao capital social mínimo das sociedades de responsabilidade limitada, o que tinha sido possível quer com base no artigo 44.° CE quer, também, no artigo 293.° CE. A Segunda Directiva (36) procedeu a uma harmonização desta matéria no que diz respeito às sociedades anónimas. Se a partir de agora fosse admitida a aplicação às sociedades estrangeiras como a Inspire Art Ltd das disposições sobre o capital social mínimo consideradas «imperativas», o direito à liberdade de estabelecimento concedido pelo Tratado, incluindo o direito à constituição de sucursais, ou seja, a designada liberdade de estabelecimento secundária, ficava desprovido de conteúdo. Esta interpretação dos artigos 43.° CE e 48.° CE é incompatível com o Tratado.

105.
    Contra a jurisprudência aqui referida, alegou-se que o Tribunal de Justiça tinha reconhecido, no acórdão Daily Mail, a disparidade dos regimes de direito internacional privado dos Estados-Membros no que concerne à determinação do direito aplicável às sociedades. O Tribunal de Justiça declarou expressamente que as regras sobre a liberdade de estabelecimento não tinham conduzido a uma aproximação destas disposições de direito internacional privado dos Estados-Membros. Com base nesta afirmação, exigem alguns a faculdade de os Estados-Membros poderem reagir contra as referidas sociedades «caixa de correio» que não apresentam qualquer conexão real com o Estado onde foram constituídas.

106.
    De facto, o Tribunal de Justiça afirmou no acórdão Daily Mail que o Tratado «[...] considera a disparidade das legislações nacionais relativas ao vínculo de dependência exigido às suas sociedades, bem como a possibilidade e, se tal for o caso, as normas referentes à transferência da sede, social ou real, de uma sociedade de um Estado-Membro para outro, como problemas que não são resolvidos pelas normas sobre o direito de estabelecimento, mas que o devem ser por via legislativa ou convencional [...]» (37). No entanto, o Tribunal declarou expressamente no acórdão Überseering que esta passagem do acórdão Daily Mail não concede aos Estados-Membros a faculdade de sujeitar à observância do seu direito nacional das sociedades o exercício efectivo, no seu território, da liberdade de estabelecimento (38). Contudo, a WFBV tem precisamente este efeito. Esta lei faz precisamente depender o exercício do direito à constituição de uma sucursal da observância das regras do direito das sociedades neerlandês sobre o capital social mínimo. Por conseguinte, a invocação do acórdão Daily Mail e a liberdade dos Estados-Membros de definirem o seu direito internacional privado também não obstam à solução aqui defendida.

107.
    Verificada a incompatibilidade da WFBV com as regras do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento, no que diz respeito ao capital social mínimo e à responsabilidade dos gestores, deve ser sucintamente analisado o outro aspecto realçado pelo órgão jurisdicional de reenvio, ou seja, a inscrição da sociedade no registo comercial como formalmente estrangeira e a correspondente apresentação dessa denominação em documentos. Na audiência, a Inspire Art Ltd e o Governo do Reino Unido invocaram a existência de uma estigmatização das sociedades em causa através desta forma de registo.

108.
    De acordo com os esclarecimentos do governo sobre o projecto da WFBV, o registo como sociedade formalmente estrangeira tem por função elucidar os terceiros que têm relações comerciais com a sociedade de que esta não foi criada ao abrigo do direito neerlandês, mas não mantém qualquer vínculo real com o Estado de constituição, exercendo, pelo contrário, a sua actividade integral ou quase integralmente nos Países Baixos. Os terceiros devem poder decidir, com pleno conhecimento desta circunstância, se desejam estabelecer relações comerciais com a sociedade (39).

109.
    Nesta medida, o registo assume uma função de prevenção. Com base na apreciação do legislador neerlandês de acordo com a qual estas sociedades apresentam, em geral, uma menor solidez, sendo, por esse motivo, aplicáveis a estas sociedades as disposições neerlandesas sobre o capital social mínimo e as restantes regras relativas à protecção dos credores, deve admitir-se que a qualificação como sociedade formalmente estrangeira pretende dificultar ou, pelo menos, tornar menos atraente, o estabelecimento de relações comerciais. Salvo o devido respeito por esta fundamentação, conclui-se, porém, no actual estádio de desenvolvimento do direito comunitário e perante a ausência de uma harmonização nesta matéria até ao presente, no sentido da existência de uma restrição à liberdade de estabelecimento. O mesmo é válido para a menção da qualidade de sociedade formalmente estrangeira nos documentos.

110.
    Face ao exposto, deve responder-se à primeira questão que os artigos 43.° CE e 48.° CE devem ser interpretados no sentido de que obstam à aplicação das disposições nacionais sobre a constituição de sucursais por uma sociedade - que foi constituída noutro Estado-Membro com vista a gozar das vantagens que a legislação do Estado no qual a sucursal se situa oferece em comparação com a legislação do Estado de constituição da sucursal, a qual impõe normas mais rígidas no que respeita à constituição das sociedades e à realização do seu capital social e uma vez que este direito faz presumir esta qualidade do facto de a sociedade exercer as suas actividades inteira ou quase inteiramente no Estado onde a sucursal foi criada e, além disso, não ter qualquer vínculo real com o Estado em que vigora a legislação nos termos da qual a sucursal foi constituída - que determinam a aplicação do direito mais restritivo do Estado no qual a sucursal é constituída.

C - Justificação da restrição

111.
    De seguida, cumpre analisar em que medida é que a restrição à liberdade de estabelecimento deve ser considerada justificada. Nos termos do artigo 46.° CE, o direito ao livre estabelecimento pode ser limitado através de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas que prevejam um regime especial para os estrangeiros e sejam justificadas por razões de ordem pública, segurança pública ou saúde pública. Acresce ainda que, segundo jurisprudência assente, não é permitido o recurso abusivo ou fraudulento às normas comunitárias (40). Além disso, a jurisprudência reconheceu que as medidas nacionais susceptíveis de afectar ou de tornar menos atraente o exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado devem preencher as seguintes condições: devem aplicar-se de modo não discriminatório, justificar-se por razões imperativas de interesse geral, ser adequadas para garantir a realização do objectivo que prosseguem e não ultrapassar o que é necessário para atingir esse objectivo (41).

112.
    Como decorre dos trabalhos preparatórios, a WFBV foi instituída sobretudo para protecção dos credores de sociedades estrangeiras. O Governo neerlandês invoca ainda a protecção contra o uso abusivo da liberdade de estabelecimento, o combate à fraude, a garantia de um controlo fiscal eficaz e a lealdade nas trocas comerciais.

1. Existência de uma justificação nos termos do artigo 46.° CE

113.
    A protecção dos credores não é referida expressamente no artigo 46.° CE. Segundo jurisprudência assente, a protecção dos credores também não é abrangida pelos conceitos de ordem pública ou de segurança pública (42). Por conseguinte, deve ser excluída uma justificação nos termos do artigo 46.° CE.

114.
    O mesmo se aplica à garantia de um controlo fiscal eficaz e à lealdade nas trocas comerciais.

2. Existência de justificação com base na prevenção do exercício abusivo da liberdade de estabelecimento

115.
    Como também sublinham nomeadamente a Kamer van Koophandel e o Governo neerlandês, a WFBV destina-se ainda a combater o exercício abusivo de uma actividade através do recurso ao direito das sociedades estrangeiro. Tais sociedades entram frequentemente em falência pelo facto de não possuírem desde o início o capital social necessário.

116.
    É certo que o Tribunal de Justiça proibiu o recurso fraudulento ou abusivo às liberdades fundamentais previstas no Tratado (43). Além disso, reconheceu que os Estados-Membros têm o direito de tomar medidas destinadas a impedir os comportamentos abusivos (44).

117.
    Contudo, o Tribunal de Justiça subordinou sempre a admissibilidade jurídica destas medidas de protecção à verificação casuística de indícios concretos da existência de um comportamento abusivo. O Tribunal recusou uma apreciação geral e abstracta apoiada numa disposição legal, e saliente-se, pela sua insuficiência (45).

118.
    O Tribunal decidiu ainda que o facto de um nacional de um Estado-Membro, que pretenda criar uma sociedade, optar por constituí-la num Estado-Membro cujas regras de direito das sociedades lhe parecem menos rigorosas e criar sucursais noutros Estados-Membros não pode constituir, em si, um uso abusivo do direito de estabelecimento (46).

119.
    O não reconhecimento da sucursal da Inspire Art Ltd é consequência de uma aplicação da WFBV que efectua uma apreciação geral e abstracta do recurso à possibilidade de um Estado-Membro constituir uma sociedade com o objectivo de exercer a sua actividade inteira ou quase inteiramente noutros Estados-Membros por intermédio de sucursais. Segundo a jurisprudência, o simples exercício da liberdade de estabelecimento não representa, porém, só por si, um comportamento abusivo.

120.
    Este resultado é igualmente compatível com o acórdão TV 10 (47), que foi invocado pelo Governo neerlandês na audiência. Esse processo de reenvio prejudicial também só deu origem a uma decisão adequada ao caso concreto. O Commissariaat voor de Media não reconheceu a autora na acção principal, a TV 10, que tinha a sua sede no Luxemburgo, embora emitisse programas radiofónicos e televisivos para os Países Baixos, como um organismo de radiodifusão estrangeiro na acepção da Mediawet, uma vez que, por se ter instalado no Luxemburgo, pretendia claramente subtrair-se à aplicação da legislação neerlandesa. Este caso também culminou assim, repete-se, com uma decisão adequada ao caso concreto. De resto, o Tribunal de Justiça remeteu neste acórdão para a sua jurisprudência já existente, nos termos da qual o artigo 49.° CE não pode negar a um Estado-Membro o direito de tomar as medidas destinadas a impedir, no caso concreto, que as liberdades garantidas pelo Tratado sejam utilizadas por um prestador cuja actividade seja inteira ou principalmente dirigida para o seu território com vista a subtrair-se às regras que lhe seriam aplicáveis no caso de estar estabelecido no território de tal Estado (48). Com base nestas considerações, há então que decidir em função das circunstâncias do caso concreto. A possibilidade geral e abstracta de existência de um comportamento abusivo não é suficiente para justificar uma restrição às liberdades de prestação de serviços e de estabelecimento.

121.
    O processo Comissão/França (49), igualmente invocado pelo Governo neerlandês na audiência, não se opõe à jurisprudência aqui citada. Neste acórdão estava em causa uma restrição geral e abstracta à livre circulação de capitais por meio de um decreto. No entanto, o Tribunal de Justiça não se pronunciou no seu acórdão sobre a questão de saber se uma tal restrição pode ter lugar sob esta forma. O Tribunal limitou-se a constatar a desproporcionalidade da medida e, por conseguinte, a existência de uma violação ao Tratado. A questão que ora nos interessa não foi, por conseguinte, objecto do referido acórdão.

122.
    Na audiência, o representante do Governo alemão solicitou ao Tribunal de Justiça que, na sequência dos acórdãos Centros e Überseering, indicasse no litígio em apreço os meios através dos quais os Estados-Membros podiam obstar à constituição de sociedades «caixa de correio», a qual constituía um exercício supostamente «abusivo» da liberdade de estabelecimento.

123.
    Este pedido causa surpresa, uma vez que são os próprios Estados-Membros que deviam ser os destinatários desta exigência. O Tribunal de Justiça não é competente para indicar os meios através dos quais os Estados-Membros podem regularmente obstar ao exercício abusivo ou supostamente abusivo dos direitos concedidos pelo Tratado. Nos processos Centros e Überseering, o Tribunal de Justiça afirmou que é, em princípio, admissível adoptar medidas destinadas a impedir o exercício abusivo aos direitos concedidos pelo Tratado. Segundo o artigo 220.° CE, compete ao Tribunal de Justiça interpretar as normas do Tratado. Por conseguinte, no presente litígio, à semelhança dos processos Centros e Überseering, o Tribunal só tem a faculdade de indicar as limitações aos direitos dos cidadãos e das empresas que decorram dos artigos 43.° CE e 48.° CE. Incumbe aos Estados-Membros extrair daquelas limitações as consequências pretendidas e que se afigurem necessárias.

124.
    Uma vez que não foram alegados quaisquer outros factos que fundamentem a existência de um comportamento abusivo, a luta contra este exercício abusivo também deve ser excluída como possível causa de justificação da restrição à liberdade de estabelecimento levada a cabo pela WFBV.

3. Existência de uma justificação com base noutras razões imperativas de interesse geral

125.
    Resta então verificar em que medida a WFBV pode ser justificada por outras razões imperativas de interesse geral.

126.
    O Governo neerlandês invoca, assim, quatro razões imperativas de interesse geral, a saber, a protecção dos credores, a eficácia no controlo fiscal, a luta contra a fraude e a prevenção dos comportamentos abusivos. A prevenção dos comportamentos abusivos já foi abordada no ponto anterior. As restantes três razões dizem respeito à protecção dos credores públicos e privados da sociedade, podendo assim ser subsumidas no conceito de protecção dos credores.

127.
    O Tribunal de Justiça reconheceu que a protecção dos interesses dos credores constituíam, em princípio, uma razão imperativa de interesse geral (50). Segundo jurisprudência constante, uma restrição à liberdade de estabelecimento com este fundamento deve preencher as seguintes condições: deve aplicar-se de modo não discriminatório, ser adequada para garantir a realização do objectivo que prossegue e não ultrapassar o que é necessário para atingir esse objectivo (51).

a) Discriminação

128.
    Como foi particularmente observado pela Kamer van Koophandel e pelo Governo neerlandês, as regras da WFBV conduzem à igualdade de tratamento entre as sociedades constituídas ao abrigo do direito estrangeiro e as sociedades criadas em conformidade com o direito neerlandês. Ambas devem satisfazer determinadas disposições consideradas imperativas do direito neerlandês. Na audiência, o Governo alemão acrescentou ainda que o regime da WFBV instituía condições iguais de concorrência para as empresas.

129.
    Há que opor a esta afirmação que, pelo menos sob um determinado aspecto, a WFBV ultrapassa as condições aplicáveis às sociedades constituídas nos termos do direito neerlandês. Não existe no direito neerlandês nenhuma regulamentação correspondente ao artigo 4.°, n.° 4, da WFBV que preveja a responsabilidade dos gestores quando, após a constituição e o registo da sociedade, o capital próprio da sociedade deixe de atingir o capital social mínimo prescrito. Esta constatação decorre dos esclarecimentos do Governo neerlandês sobre o projecto da WFBV (52).

130.
    Para as sociedades constituídas nos Países Baixos, o artigo 2:180, n.° 2, do Burgerlijk Wetboek só prevê a responsabilidade pessoal e solidária dos gestores no período prévio à constituição e ao registo. Esta modalidade de responsabilidade também é prescrita pelo artigo 4.°, n.° 4, da WFBV, que impõe ainda a responsabilidade pessoal e solidária sempre que o capital social se torne posteriormente inferior ao mínimo prescrito. Caso uma sociedade constituída ao abrigo do direito neerlandês venha a estar numa situação comparável após a constituição e o registo, a sua dissolução poderá ser ordenada por despacho judicial (v. artigo 2:185 do Burgerlijk Wetboek). Neste caso, não está prevista a responsabilidade dos gestores.

131.
    Com base na teoria da constituição aplicada no direito neerlandês, uma sociedade estrangeira não pode ser dissolvida através de uma decisão judicial deste género proferida por um tribunal neerlandês. É que a sua existência depende do direito do Estado de constituição. Por este motivo, o legislador neerlandês impôs, no artigo 4.°, n.° 4, da WFBV, a responsabilidade dos gestores de sociedades formalmente estrangeiras como uma «alternativa adequada» à sanção prevista para as sociedades constituídas ao abrigo do direito neerlandês (53).

132.
    Esta diferença de tratamento entre sociedades neerlandesas e estrangeiras contradiz, desde logo, a tese segundo a qual a WFBV trata de igual forma as sociedades estrangeiras e as sociedades constituídas em conformidade com o direito neerlandês.

133.
    É verdade que a desigualdade de tratamento é justificada pelos limites que o direito neerlandês apresenta quanto à possibilidade de influir sobre a existência de uma sociedade constituída ao abrigo do direito estrangeiro, sendo assim invocada uma causa objectiva para a diferença de tratamento.

134.
    Não obstante, há que considerar que não está prevista a responsabilidade dos gestores pelas dívidas da sociedade quando haja lugar à dissolução judicial de uma sociedade constituída segundo o direito neerlandês. A WFBV institui uma responsabilidade pessoal e solidária dos gestores que é, em princípio, estranha ao sistema aplicável às sociedades de capitais de limitação da responsabilidade ao montante do capital da sociedade e que só tem lugar em circunstâncias muito excepcionais.

135.
    É certo que a responsabilidade dos gestores instituída pela WFBV também não é automática devendo, ao invés, ser declarada judicialmente em cada caso concreto (54). Decorre, porém, dos esclarecimentos sobre o artigo 2.° da WFBV que o legislador atribuiu um efeito dissuasor à sanção do artigo 4.°, n.° 4, da WFBV, que é igualmente imposta em caso de incumprimento das obrigações previstas no artigo 2.° da WFBV, ou seja, no período anterior à inscrição no registo comercial. O objectivo da WFBV consiste em obstar a que os intervenientes económicos recorram a sociedades formalmente estrangeiras. Pretendia-se instituir uma sanção dotada de um efeito intimidatório ainda maior do que o presente numa sanção penal (55).

136.
    Isto demonstra que o legislador neerlandês não pretendeu consagrar um tratamento excepcional no artigo 4.°, n.° 4, da WFBV que possa também excepcionalmente conduzir, no caso das sociedades criadas ao abrigo do direito neerlandês, a uma responsabilização dos responsáveis pela actividade comercial da sociedade através da desconsideração da personalidade jurídica desta última. Da legislação devia resultar um efeito dissuasor que excedesse o das sanções penais. É manifesta a adequação da imposição de uma responsabilidade pessoal pelas obrigações da sociedade ao efeito pretendido.

137.
    É possível concluir, só com base nestas considerações, que o legislador neerlandês pretendeu instituir para as sociedades estrangeiras uma sanção mais gravosa do que a que se encontra prevista para as sociedades neerlandesas numa situação comparável. Por conseguinte, o regime de responsabilidade dos gestores discrimina com base na nacionalidade. A localização da sede social de uma sociedade, tal como a nacionalidade das pessoas singulares, serve para determinar a sua conexão com a ordem jurídica de um Estado-Membro (56). Por esta razão, o regime da responsabilidade pessoal e solidária dos gestores previsto no artigo 4.°, n.° 4, da WFBV, e que é imposto no caso de o capital social se tornar inferior ao mínimo prescrito, é incompatível com a liberdade de estabelecimento tutelada pelos artigos 43.° CE e 48.° CE.

138.
    Diversamente do alegado pelo Governo alemão, a WFBV também não institui condições iguais de concorrência. É verdade que a aplicação da WFBV conduz a uma aplicação do direito neerlandês das sociedades a todas as sociedades que exerçam a sua actividade inteira ou quase inteiramente nos Países Baixos. No entanto, esta aplicação suprime a concorrência entre os diversos sistemas dos Estados-Membros. No estádio actual do direito comunitário, não existe, porém, qualquer motivo para restringir a liberdade dos cidadãos na escolha da ordem jurídica mais adequada ao seu projecto de constituição da sociedade.

139.
    O regime da responsabilidade pessoal e solidária dos gestores destina-se, entre outros, a garantir a observância das regras relativas ao capital social mínimo (artigo 4.°, n.os 1 a 3, da WFBV). Pelo menos no que diz respeito às sociedades «caixa de correio» constituídas em conformidade com o direito inglês, as dificuldades a que a WFBV visa obstar têm origem, tal como já foi salientado por diversas vezes, no facto de os Estados-Membros ainda não terem conseguido chegar a acordo sobre a harmonização das disposições sobre o capital social mínimo das sociedades de responsabilidade limitada e sobre as disposições mais eficazes para protecção dos credores. Enquanto este quadro normativo se mantiver, não existe qualquer motivo para restringir a concorrência entre os diversos sistemas através de uma correspondente interpretação das regras do Tratado em matéria de liberdade de estabelecimento.

140.
    Importa assim reter, a título provisório, que a WFBV constitui uma medida que discrimina as sociedades estrangeiras e, por conseguinte, uma restrição não justificada à liberdade de estabelecimento.

b) Adequação

141.
    Existem igualmente dúvidas quanto à questão de saber em que medida as regras da WFBV são adequadas a garantir a protecção dos credores. Há de facto que conceder aos defensores desta opinião que o instituto do capital social mínimo foi reconhecido pelo direito comunitário na Segunda Directiva e no Regulamento (CE) n.° 2157/2001 do Conselho, de 8 de Outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (57), como um instrumento destinado a assegurar a existência de um património suficiente (58). Quando o capital social mínimo é realizado, está disponível, pelo menos no momento da constituição, um capital correspondente destinado a salvaguardar os interesses dos credores.

142.
    Contudo, o advogado-geral A. La Pergola já havia manifestado dúvidas quanto à eficácia deste instrumento nas conclusões apresentadas no acórdão Centros (59). O diferente significado que as normas de direito das sociedades dos Estados-Membros atribuem ao capital social mínimo, e que se manifesta no diverso valor dos montantes a liberar, demonstra claramente que não existe a este respeito um único entendimento correcto. Os ordenamentos jurídicos irlandês e inglês não concedem nenhum papel significativo ao capital social mínimo. Por último, deve ser feita referência ao relatório do chamado grupo Winter. Neste relatório da comissão de peritos que tem o nome do seu presidente, Jaap Winter, e que foi recentemente entregue à Comissão, é afirmado que as regras relativas ao capital social mínimo são maioritariamente consideradas como a pedra angular essencial à garantia da protecção dos credores e dos interesses dos sócios. Todavia, a comissão de peritos chega à conclusão de que as regras sobre o capital social mínimo só realizam uma única função, designadamente a de dissuadir os particulares de criar sociedades de uma forma imprudente. Não obstante, estas regras apenas conferem aos credores uma protecção reduzida contra o investimento precipitado de capitais e não asseguram qualquer protecção quando o capital é utilizado para saldar prejuízos. A criação de um exame de solvabilidade adequado seria susceptível de conceder aos credores e aos sócios uma maior protecção (60).

143.
    No acórdão Centros, o Tribunal de Justiça verificou que as normas dinamarquesas sobre o capital social mínimo não eram inteiramente adequadas à realização do objectivo de protecção dos credores, uma vez que, se a sociedade em causa tivesse exercido uma actividade no Reino Unido, a sua sucursal teria sido registada, apesar de os credores dinamarqueses poderem ficar igualmente expostos (61).

144.
    Neste ponto, o caso vertente parece ser análogo àquele. O órgão jurisdicional de reenvio até declarou expressamente que a WFBV não seria aplicável à Inspire Art Ltd se esta exercesse uma actividade comercial em qualquer outro Estado-Membro que não os Países Baixos. Não é evidente que neste último caso os credores tivessem à disposição um capital de garantia mais elevado. Face ao exposto, esta restrição não é adequada para atingir o objectivo de protecção dos credores.

145.
    De igual forma, existem dúvidas consideráveis sobre se o registo da sociedade formalmente estrangeira nessa qualidade e a firma que deve apresentar em documentos constituem medidas adequadas a proteger os credores. Através da informação de que a sociedade não exerce nenhuma actividade comercial fora dos Países Baixos, o capital que se encontra à disposição dos credores em caso de responsabilidade não é aumentado ou salvaguardado.

146.
    Pelos motivos referidos, as regras sobre o capital social mínimo, sobre o registo enquanto sociedade formalmente estrangeira e sobre a sua firma não devem ser consideradas adequadas para atingir o objectivo de protecção dos credores por elas prosseguido. Nesta medida, há também que concluir pela existência de uma restrição não justificada à liberdade de estabelecimento.

c) Proporcionalidade

147.
    Por último, a restrição operada pela WFBV só seria justificada se não existissem meios menos gravosos para atingir o objectivo de protecção dos credores.

148.
    Existem dúvidas quanto à necessidade da regulamentação atinente à inscrição da sociedade formalmente estrangeira nesta qualidade no registo comercial e às regras sobre a denominação que deve apresentar na documentação que dela provenha. A Inspire Art Ltd está inscrita no registo comercial como uma sociedade de direito inglês sob a forma de uma «Limited». Na sua actividade comercial, adopta a designação de «Limited». Desta forma, os parceiros comerciais são informados de que não se trata de uma sociedade constituída segundo o direito neerlandês. A função de prevenção adicional que a sua identificação como uma sociedade formalmente estrangeira visa realizar não se afigura necessária para salvaguardar os interesses dos credores da sociedade, nem para preservar a lealdade nas relações comerciais. Nesta medida, a regulamentação é desproporcionada.

149.
    Por outro lado, a sociedade de direito inglês encontra-se submetida às regras das Quarta e Décima Primeira Directivas. Os credores da Inspire Art Ltd podem também recorrer a estas normas que os protegem (62).

150.
    Além disso, há que verificar que o Tribunal de Justiça já decidiu em relação à protecção dos credores públicos que, em alternativa à exigência do cumprimento das regras sobre o capital social mínimo, existe a possibilidade legal de aqueles obterem as garantias necessárias (63). Esta possibilidade também existe para os credores privados. Por conseguinte, encontra-se disponível um meio menos gravoso do que o escolhido na WFBV. Também por este motivo, a restrição à liberdade de estabelecimento efectuada pela WFBV deve ser considerada desproporcionada.

151.
    Finalmente, o carácter proporcional da WFBV é ainda discutível sob um outro ponto de vista. A lei é aplicável a sociedades que desenvolvem a sua actividade inteira ou quase inteiramente nos Países Baixos. No entanto, não contém quaisquer critérios que permitam determinar quando é que este facto se verifica. Caso 10%, 15% ou 20% da actividade seja exercida fora dos Países Baixos, pode ainda considerar-se que a actividade é exercida quase inteiramente neste país? Esta indefinição conduz a uma incerteza na questão de saber se a WFBV deve ou não ser aplicada a uma sociedade. Um instrumento tão incerto não pode, porém, constituir uma medida adequada a garantir a protecção dos credores. Tanto mais que a sua aplicabilidade a uma sociedade pode variar sem que este facto decorra necessariamente do registo comercial, tal como resulta da exposição de motivos do governo sobre o projecto da WFBV (64).

152.
    Semelhante insegurança é válida para a responsabilidade ilimitada pessoal e solidária dos gestores, a qual tem lugar quando o capital se torna inferior ao capital social mínimo previsto na lei.

153.
    Estes dois regimes asseguram que é efectivamente aplicada aos credores a regulamentação mais favorável. Contudo, criam um risco quase incalculável, especialmente para os gestores da sociedade. Os regimes parecem ser particularmente desproporcionados, por força das consequências imprevisíveis que deles podem advir para os gestores.

154.
    Por conseguinte, deve responder-se à segunda questão que nem o artigo 46.° CE, nem o combate aos comportamentos abusivos, nem mesmo razões imperativas de interesse geral são susceptíveis de justificar as restrições à liberdade de estabelecimento previstas nos artigos 2.° a 5.° da Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen.

VI - Conclusão

155.
    Pelos fundamentos expostos, proponho que se responda às questões submetidas da seguinte forma:

1)    Os artigos 43.° CE e 48.° CE devem ser interpretados no sentido de que obstam à aplicação das disposições nacionais sobre a constituição de sucursais por uma sociedade - que foi constituída noutro Estado-Membro com vista a gozar das vantagens que a legislação do Estado no qual a sucursal se situa oferece em comparação com a legislação do Estado de constituição da sucursal, a qual impõe normas mais severas no que toca à constituição das sociedades e à realização do seu capital social e uma vez que este direito faz presumir esta qualidade do facto de a sociedade exercer as suas actividades inteira ou quase inteiramente no Estado onde a sucursal foi criada e, além disso, não ter qualquer vínculo real com o Estado em que vigora a legislação nos termos da qual a sucursal foi constituída - que determinam a aplicação do direito mais restritivo do Estado onde a sucursal é constituída.

2)    Nem o artigo 46.° CE, nem o combate aos comportamentos abusivos, nem mesmo razões imperativas de interesse geral são susceptíveis de justificar as restrições à liberdade de estabelecimento previstas nos artigos 2.° a 5.° da Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen.


1: -     Língua original: alemão.


2: -     Wet van 17 december 1997, houdende regels met betrekking tot naar buitenlands recht opgerichte, rechtspersoonlijkheid bezittende kapitaalvennootschappen die hun werkzaamheid geheel of nagenoeg geheel in Nederland verrichten en geen werkelijke band hebben met de staat naar welks recht zij zijn opgericht (Wet op de formeel buitenlandse vennootschappen), Staatsblad 1997, p. 697.


3: -     Acórdão de 9 de Março de 1999 (C-212/97, Colect., p. I-1459, em especial n.os 16 a 18).


4: -     Acórdão de 10 de Julho de 1986 (79/85, Colect., p. 2375, em especial n.° 16).


5: -     Décima Primeira Directiva 89/666/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativa à publicidade das sucursais criadas num Estado-Membro por certas formas de sociedades reguladas pelo direito de outro Estado (JO L 395, p. 36).


6: -     Acórdão de 16 de Julho de 1992, Lourenço Dias (C-343/90, Colect., p. I-4673, n.os 18 a 20). A Comissão invoca ainda os acórdãos de 17 de Maio de 1994, Corsica Ferries (C-18/93, Colect., p. I-1783, n.° 14); de 16 de Julho de 1992, Meilicke (C-83/91, Colect., p. I-4871); de 13 de Dezembro de 1994, Grau-Hupka (C-297/93, Colect., p. I-5535, n.° 19); e de 26 de Outubro de 1995, Furlanis (C-143/94, Colect., p. I-3633, n.° 12).


7: -    Primeira Directiva 68/151/CEE do Conselho, de 9 de Março de 1968, tendente a coordenar as garantias que, para protecção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados-Membros às sociedades, na acepção do segundo parágrafo do artigo 58.° do Tratado, a fim de tornar equivalentes essas garantias em toda a Comunidade (JO L 65, p. 8; EE 17 F1 p. 3); Segunda Directiva 77/91/CEE do Conselho, de 13 de Dezembro de 1976, tendente a coordenar as garantias que, para protecção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados-Membros às sociedades, na acepção do segundo parágrafo do artigo 58.° do Tratado, no que respeita à constituição da sociedade anónima, bem como à conservação e às modificações do seu capital social, a fim de tornar equivalentes essas garantias em toda a Comunidade (JO L 26, p. 1; EE 17 F1 p. 44); Quarta Directiva 78/660/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1978, baseada no artigo 54.°, n.° 3, alínea g), do Tratado e relativa às contas anuais de certas formas de sociedades (JO L 222, p. 11; EE 17 F1 p. 55); Sétima Directiva 83/349/CEE do Conselho, de 13 de Junho de 1983, baseada no n.° 3, alínea g), do artigo 54.° do Tratado e relativa às contas consolidadas (JO L 193, p. 1; EE 17 F1 p. 119); Décima primeira Directiva 89/666/CEE (já referida na nota 5); Décima Segunda Directiva 89/667/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, em matéria de direito das sociedades relativa às sociedades de responsabilidade limitada com um único sócio (JO L 395, p. 40).


8: -     Staatsblad 1997, p. 699.


9: -     Já referido na nota 6.


10: -     Acórdão de 27 de Setembro de 1988 (81/87, Colect., p. 5483).


11: -     Já referido na nota 3. O Governo neerlandês invoca, em particular, o n.° 24 do acórdão.


12: -     O Governo alemão invoca o n.° 18 do acórdão.


13: -     Já referido na nota 4.


14: -     A este respeito, o Governo neerlandês remete para os acórdãos de 7 de Março de 1990, Krantz (C-69/88, Colect., p. I-583, n.° 11), e de 14 de Julho de 1994, Matteo Peralta (C-379/92, Colect., p. I-3453, n.° 24).


15: -     A Comissão invoca, em especial, o n.° 24 do acórdão (já referido na nota 3).


16: -     A Comissão refere o n.° 34 do acórdão.


17: -     O Governo do Reino Unido remete, a este respeito, para o n.° 37 do acórdão Centros (já referido na nota 3).


18: -     Invocam o n.° 38 do acórdão Centros (já referido na nota 3) e o n.° 17 do acórdão Segers (já referido na nota 4).


19: -     Remetem para os acórdãos de 4 de Dezembro de 1986, Comissão/Alemanha (C-205/84, Colect., p. 3755); de 25 de Julho de 1991, Stichting Collectieve Antennevoorziening Gouda (C-288/89, Colect., p. I-4007); de 28 de Janeiro de 1992, Bachmann (C-204/90, Colect., p. I-249); e de 12 de Dezembro de 1996, Reisebüro Broede (C-3/95, Colect., p. I-6511).


20: -     Referem o acórdão Bachmann (já referido na nota 19).


21: -     Remetem para o acórdão de 10 de Maio de 1995, Alpine Investments (C-384/93, Colect., p. I-1141).


22: -     O Governo austríaco invoca o n.° 36 do acórdão (já referido na nota 3).


23: -     Acórdão Segers (já referido na nota 4, n.° 16); acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 17).


24: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 18). A irrelevância dos motivos de actuação do sujeito jurídico é igualmente aceite no domínio da liberdade de prestação de serviços; v. acórdão de 5 de Outubro de 1994, TV 10 (C-23/93, Colect., p. I-4795, n.° 15).


25: -     Já referido na nota 10.


26: -     Acórdão de 5 de Novembro de 2002 (C-208/00, Colect., p. I-0000).


27: -     V. as referências citadas na nota 6.


28: -     Acórdão Lourenço Dias (já referido na nota 6, n.os 14 a 18).


29: -     Acórdão Segers (já referido na nota 4, n.° 13); acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 20); acórdão Überseering (já referido na nota 26, n.° 57).


30: -     Já referido na nota 26, n.° 59. Esta conclusão já decorria de forma incidental do acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 21).


31: -     V. esclarecimentos em Memorie van Toelichting, Tweede Kamer der Staten-General, Vergaderjaar 1994-1995, publicação de 19 de Abril de 1995, n.° 24139, n.° 3, p. 2, divulgada na página da Internet do Parlamento do Reino dos Países Baixos, www.tweede-kamer.nl.


32: -     Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 3).


33: -     Já referido na nota 3, n.° 27.


34: -     Já referido na nota 26, n.° 59.


35: -     Acórdão Überseering (já referido na nota 26, n.° 81).


36: -     Já referida na nota 7.


37: -     Já referido na nota 10, n.° 23.


38: -     Já referido na nota 26, n.° 72.


39: -     Memorie van Toelichtling (já referido na nota 31), p. 6, último parágrafo, e p. 7, supra.


40: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 24, com mais indicações).


41: -     Acórdãos de 31 de Março de 1993, Kraus (C-19/92, Colect., p. I-1663, n.° 32); de 30 de Novembro de 1995, Gebhard (C-55/94, Colect., p. I-4165, n.° 37); e Centros (já referido na nota 3, n.° 34).


42: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 34).


43: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 24, com mais indicações).


44: -     Acórdãos Segers (já referido na nota 4, n.° 17) e Centros (já referido na nota 3, n.° 24, com mais indicações).


45: -     Acórdãos Centros (já referido na nota 3, n.° 25) e Überseering (já referido na nota 26, n.° 92 («[...] em determinadas circunstâncias e respeitando determinadas condições [...]»).


46: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 27).


47: -     Já referido na nota 24.


48: -     Acórdão TV 10 (já referido na nota 24, n.° 20).


49: -     Acórdão de 4 de Junho de 2002 (C-483/99, Colect., p. I-4781).


50: -     V. o afirmado no acórdão Centros (já referido na nota 3, n.os 32 e segs.).


51: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 34).


52: -     Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 9).


53: -     V. os esclarecimentos em Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 9).


54: -     V. a explicação apresentada em Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 9, último parágrafo).


55: -     V. os fundamentos invocados em Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 7 a respeito do artigo 2.°).


56: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 20, com mais indicações).


57: -     JO L 294, p. 1.


58: -     V. o quarto considerando da Segunda Directiva e o décimo terceiro considerando do Regulamento n.° 2157/2001.


59: -     Conclusões apresentadas em 16 de Julho de 1998 no processo C-212/97 (Colect. 1999, p. I-1461, n.° 21).


60: -     V. a argumentação utilizada no Report of the High Level Group of Company Law Experts on a Modern Regulatory Framework for Company Law in Europe, de 4 de Novembro de 2002, síntese nas pp. 14 e detalhes na p. 82 e segs., em especial na p. 87, publicado na página da Comissão Europeia na Internet www.europa.eu.int/comm/internal_market/en/company/company/modern.


61: -     Já referido na nota 3, n.° 35.


62: -     V. o afirmado a este respeito no acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 36).


63: -     Acórdão Centros (já referido na nota 3, n.° 37).


64: -     Memorie van Toelichting (já referido na nota 31, p. 6 a respeito do artigo 1.°).