Language of document : ECLI:EU:C:2017:218

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

16 de março de 2017 *

«1* Língua do processo: alemão.Reenvio prejudicial — Propriedade intelectual — Direitos de autor e direitos conexos na sociedade da informação — Diretiva 2001/29/CE — Direito de comunicação de obras ao público — Artigo 3.°, n.° 1 — Exceções e limitações — Artigo 5.°, n.° 3, alínea o) — Difusão de emissões televisivas por uma rede de cabo local — Legislação nacional que prevê exceções para as instalações que permitam o acesso, no máximo, a 500 utilizadores com assinatura e para a retransmissão de emissões da radiodifusão pública no território nacional»

No processo C‑138/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Handelsgericht Wien (tribunal de comércio de Viena, Áustria), por decisão de 16 de fevereiro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de março de 2016, no processo

Staatlich genehmigte Gesellschaft der Autoren, Komponisten und Musikverleger registrierte Genossenschaft mbH (AKM)

contra

Zürs.net Betriebs GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente de secção, J. Malenovský (relator) e M. Safjan, juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

considerando as observações apresentadas:

–        em representação da Staatlich genehmigte Gesellschaft der Autoren, Komponisten und Musikverleger registrierte Genossenschaft mbH (AKM), por M. Walter, Rechtsanwalt,

–        em representação de Zürs.net Betriebs GmbH, por M. Ciresa, Rechtsanwalt,

–        em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por T. Scharf e J. Samnadda, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.°, n.° 1, e do artigo 5.° da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10), e ainda do artigo 11.° bis, n.° 1, ponto 2, da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1886, na versão resultante do ato de Paris de 24 de julho de 1971, conforme alterada em 28 de setembro de 1979 (a seguir «Convenção de Berna»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre a Staatlich genehmigte Gesellschaft der Autoren, Komponisten und Musikverleger registrierte Genossenschaft mbH (AKM) à Zürs.net Betriebs GmbH (a seguir «Zürs.net») a respeito do pedido da AKM no sentido de que a Zürs.net lhe prestasse informações sobre o número de assinantes ligados à rede por cabo que explora e, eventualmente, de lhe pagar uma remuneração acrescida de juros de mora pela disponibilização de obras protegidas pelo direito de autor e direitos conexos.

 Quadro jurídico

 Direito internacional

 O Tratado da OMPI sobre o direito de autor

3        A Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) adotou em Genebra, em 20 de dezembro de 1996, o Tratado da OMPI sobre o direito de autor, que entrou em vigor a 6 de março de 2002. Este tratado foi aprovado em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2000/278/CE do Conselho, de 16 de março de 2000 (JO 2000, L 89, p. 6).

4        O Tratado da OMPI sobre direito de autor prevê, no seu artigo 1.°, n.° 4, que as partes contratantes devem observar o disposto nos artigos 1.° a 21.° da Convenção de Berna.

 A Convenção de Berna

5        O artigo 11.° bis, n.° 1, da Convenção de Berna prevê o seguinte:

«1) Os autores de obras literárias e artísticas gozam do direito exclusivo de autorizar:

[…]

2°      Qualquer comunicação pública, quer por fio, quer sem fio, da obra radiodifundida, quando essa comunicação seja feita por outro organismo que não o de origem;»

 Direito da União

 A Diretiva 2001/29

6        O considerando 9 da Diretiva 2001/29 tem a seguinte redação:

«Qualquer harmonização do direito de autor e direitos conexos deve basear‑se num elevado nível de proteção, uma vez que tais direitos são fundamentais para a criação intelectual. […].»

7        Nos termos do artigo 3.°, n.° 1, desta diretiva:

«Os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.»

8        O artigo 5.°, n.° 3, alínea o), da referida diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros podem prever exceções ou limitações aos direitos previstos nos artigos 2.° e 3.° nos seguintes casos:

[…]

o)      Utilização em certos casos de menor importância para os quais já existam exceções ou limitações na legislação nacional, desde que a aplicação se relacione unicamente com a utilização não‑digital e não condicione a livre circulação de bens e serviços na Comunidade, sem prejuízo das exceções e limitações que constam do presente artigo.»

 Direito austríaco

9        Nos termos do § 17.° da Urheberrechtgesetz (lei dos direitos de autor, BGBl. 111/1936), na versão do BGBl. I, 99/2015:

«(1) O autor tem o direito exclusivo de emitir a obra por meio de radiodifusão ou por um meio equivalente.

(2)      Equivale a uma emissão por radiodifusão a transmissão da obra ao público no território nacional a partir de um local no território nacional ou no estrangeiro de um modo equivalente à radiodifusão, mas por cabo.

(3)      A transmissão de emissões de radiodifusão

[…]

2.      mediante uma antena coletiva

[…]

b)      não se considera uma nova emissão de radiodifusão se à instalação não estiverem ligados mais do que 500 utilizadores.

A transmissão simultânea, completa e inalterada de emissões do [organismo nacional de radiodifusão (ORF)] por cabo em território nacional é considerada parte da emissão de radiodifusão originária.»

 Litígio no processo principal e a questão prejudicial

10      A AKM é uma sociedade de gestão coletiva de direitos de autor.

11      A Zürs.net explora uma instalação da rede por cabo em Zürs (Áustria), através da qual transmite emissões televisivas e radiofónicas, algumas inicialmente emitidas pelo organismo nacional de radiodifusão (ORF) e outras emitidas inicialmente por outros organismos de radiodifusão. O tribunal de reenvio indicou que, à data de decisão de reenvio, estavam ligados à rede por cabo da Zürs.net cerca de 130 assinantes.

12      A AKM exige à Zürs.net a prestação de informações sobre o número de assinantes, em várias datas de referência, ligados à rede de cabo que ela explora e sobre os conteúdos difundidos. Pede‑lhe ainda que, após verificação das informações que lhe tenham sido prestadas, lhe pague uma remuneração adequada.

13      A Zürs.net considera que, nos termos do § 17, n.° 3, ponto 2, alínea b), da lei austríaca dos direitos de autor, na versão do BGBl. I, 99/2015, que se refere às pequenas instalações com o máximo de 500 assinantes, as emissões que difunde não podem ser consideradas como uma nova difusão e que não tem, portanto, a obrigação de prestar as informações exigidas pela AKM.

14      A AKM alega essa norma é incompatível com o direito da União e com a Convenção de Berna.

15      Neste contexto, o Handelsgericht Wien (Tribunal de Comércio de Viena, Áustria), devendo pronunciar‑se sobre o litígio entre a AKM e a Zürs.net, decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial seguinte:

«Devem os artigos 3.°, n.° 1, ou 5.°, da Diretiva [2001/29/CE] ou o artigo 11.° bis, n.° 1, 2.° ponto, da Convenção de Berna [...] ser interpretados no sentido de que um regime nos termos do qual a transmissão de emissões de radiodifusão mediante ‘instalações de antena coletivas’, como as da recorrida no processo principal,

a)      não é considerada uma nova emissão de radiodifusão se à instalação não estiverem ligados mais de 500 utilizadores e/ou

b)      é considerada parte da emissão de radiodifusão originária quando se trate da transmissão simultânea, completa e inalterada de emissões da radiodifusão austríaca (ORF) por cabo em território nacional (Áustria),

e estas utilizações não são abrangidas por outro direito exclusivo de comunicação ao público à distância, na aceção do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29/CE e, consequentemente, não dependem da autorização do autor nem estão sujeitas a retribuição, é contrário ao direito da União ou às disposições da Convenção de Berna, enquanto acordo internacional que faz parte do ordenamento jurídico da União?»

 Quanto à questão prejudicial

16      Com a sua questão, o tribunal de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.°, n.° 1, ou o artigo 5.° da Diretiva 2001/29 ou ainda o artigo 11.° bis, n.° 1, ponto 2, da Convenção de Berna devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, segundo a qual não estão sujeitas, a título do direito exclusivo de comunicação ao público, à exigência de obter a autorização do autor:

–        Nem a transmissão simultânea, completa e não modificada de emissões radiodifundidas pelo organismo nacional de radio difusão, por meio de cabos situados em território nacional,

–        Nem a radiodifusão por meio de antena coletiva quando o número de assinantes ligados a essa antena não for superior a 500.

17      Há que analisar a questão em duas fases.

18      Em primeiro lugar, há que determinar se a transmissão simultânea, completa e não modificada de emissões radiodifundidas pelo organismo nacional de radiodifusão, por meio de cabos situados em território nacional, como a que está em causa no processo principal, é suscetível de constituir uma «comunicação ao público», no sentido do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29 ou do artigo 11.° bis, n.° 1, ponto 2, da Convenção de Berna.

19      A este respeito, cabe salientar que o artigo 11.° bis, n.° 1, ponto 2, da Convenção de Berna prevê que os autores de obras literárias e artísticas gozam do direito exclusivo de autorizar qualquer comunicação ao público, quer por fio, quer sem fio, da obra radiodifundida, quando essa comunicação for feita por um organismo de radiodifusão diferente do organismo de origem.

20      O artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29 prevê que os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.

21      Há que constatar que o artigo 3, n.° 1, corresponde, em substância, ao artigo 11.° bis, n.° 1, ponto 2, da Convenção de Berna. Assim, quando o Tribunal de Justiça procede à interpretação da noção de «comunicação ao público», no sentido do artigo 3.°, n.° 1, esta é operada em conformidade com a referida disposição da convenção nos termos de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (v., neste sentido, acórdão de 7 de dezembro de 2006, SGAE, C‑306/05, EU:C:2006:764, n.os 40 e 41).

22      O Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de «comunicação ao público», na aceção no artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29, associa dois elementos cumulativos, a saber, um «ato de comunicação» de uma obra e a comunicação desta última a um «público» (v. acórdão de 31 de maio de 2016, Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.° 37).

23      Mais particularmente, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, por um lado, que o ato de comunicação se refere a toda e qualquer transmissão das obras protegidas, independentemente do meio ou do processo técnico utilizado, devendo cada transmissão que utiliza um modo técnico específico ser, em princípio, individualmente autorizada pelo autor da obra (v. acórdão de 31 de maio de 2016, Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.os 38 e 39).

24      Por outro lado, para relevar da noção de «comunicação ao público», no sentido do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29, é necessário que as obras protegidas sejam efetivamente comunicadas a um «público», ficando entendido que a noção de «público» se refere a um número indeterminado de destinatários potenciais e implica, além disso, um número considerável de pessoas (v. acórdão de 31 de maio de 2016, Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.os 40 e 41).

25      Além disso, o Tribunal de Justiça já declarou que a transmissão de obras protegidas por um organismo diferente daquele que obteve a autorização de transmissão inicial constitui uma «comunicação ao público», no sentido dessa disposição, quando tais obras são transmitidas a um público novo, a saber, a um público que não era considerado pelos titulares dos direitos em causa quando concederam a autorização inicial de utilização das suas obras (v., neste sentido, acórdão de 31 de maio de 2016, Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.° 45 e jurisprudência aí referida).

26      No caso em apreço, o facto de no processo principal a transmissão ser efetuada por cabo, ou seja, por um meio técnico diferente do utilizado na transmissão radiodifundida inicial, permite constatar que a Zürs.net realiza uma comunicação, no sentido do artigo 3.° da Diretiva 2001/29.

27      Há no entanto que verificar ainda se essa comunicação é destinada a um público novo, diferente daquele a que são destinadas as emissões radiodifundidas pela ORF.

28      Resulta das observações da Zürs.net, que a AKM não contesta quanto a este ponto, que, quando os titulares dos direitos em causa dão uma autorização de difusão à ORF, os titulares dos direitos em causa têm conhecimento do facto de as emissões efetuadas por esse organismo nacional poderem ser recebidas por todas as pessoas que se encontrem no território nacional.

29      Na medida em que a distribuição das obras protegidas através de cabo é feita no território nacional, como resulta do teor da questão prejudicial, e em que as pessoas em causa foram tidas em conta pelos titulares do direito quando autorizaram a difusão inicial pelo organismo nacional de radiodifusão, o público a que a Zürs.net distribui as referidas obras não pode ser considerado um público novo.

30      Daqui decorre que a transmissão de emissões nas condições precisadas no n.° 18 do presente acórdão não constitui uma comunicação ao público, no sentido do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29. Assim, essa transmissão não está sujeita à exigência de autorização dos titulares dos direitos prevista nessa disposição.

31      Em segundo lugar, o tribunal de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que prevê que a transmissão de emissões através de uma antena coletiva a que estejam ligados no máximo 500 assinantes não é considerada como uma nova radiodifusão, releva do artigo 5.° da Diretiva 2001/29, mais particularmente do seu n.° 3, alínea o), e se os distribuidores dessas emissões transmitidas por meio dessas antenas podem, assim, escapar à exigência de autorização do titular do direito. Com efeito, resulta das explicações do tribunal de reenvio que se pode considerar que a Zürs.net explora uma «pequena antena coletiva», no sentido da legislação nacional.

32      A este respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que, como salientou o Tribunal de Justiça no n.° 25 do presente acórdão, a transmissão de obras protegidas por um organismo diferente do que obteve a autorização de comunicação inicial constitui uma comunicação ao público no sentido do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29, quando essas obras são transmitidas a um público novo, ou seja, a um público que não foi considerado pelos titulares do direito quando concederam a autorização inicial de utilização das suas obras.

33      No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que a «pequena antena coletiva» da Zürs.net permite transmitir, além das emissões da ORF, igualmente as de outros emitentes estabelecidos noutros Estados‑Membros, de forma que tais transmissões são passíveis de ser consideradas como comunicações ao público no sentido do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29. Cabe, contudo, ao órgão jurisdicional de reenvio proceder às verificações que se impõem a este respeito.

34      Nestas condições, devemos interrogar‑nos sobre a questão de saber se os exploradores das referidas antenas coletivas podem escapar à exigência de obtenção de uma autorização do titular do direito a título da exceção prevista no artigo 5.° da Diretiva 2001/29.

35      A este respeito, resulta do artigo 5.°, n.° 3, alínea o), da Diretiva 2001/29 que os Estados‑Membros têm a faculdade de prever exceções ou limitações aos direitos previstos nos artigos 2.° e 3.° dessa diretiva quando se trate da utilização em alguns casos de menor importância para os quais existam já exceções ou limitações na legislação nacional, desde que isso apenas diga respeito a utilizações analógicas e não afete a livre circulação de mercadorias e dos serviços na União Europeia, sem prejuízo das exceções e limitações previstas nesse artigo.

36      Remetendo para o artigo 3.° da Diretiva 2001/29, o artigo 5, n.° 3, alínea o), da mesma diretiva constitui uma disposição suscetível de derrogar o direito de comunicação ao público previsto no artigo 3.°

37      Ora, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as disposições de uma diretiva que derrogam um princípio geral estabelecido por essa mesma diretiva devem ser objeto de interpretação estrita (acórdãos de 16 de julho de 2009, Infopaq International, C‑5/08 EU:C:2009:465, n.° 56, e de 10 de abril de 2014, ACI Adam e o., C‑435/12, EU:C:2014:254, n.° 22).

38      Daqui decorre que as diferentes exceções e limitações previstas no artigo 5.°, n.° 3, da Diretiva 2001/29, entre elas a prevista na sua alínea o), devem ser objeto de interpretação estrita (v., neste sentido, acórdão de 1 de dezembro de 2011, Painer, C‑145/10, EU:C:2011:798, n.° 109).

39      No processo principal resulta dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça que a legislação nacional em causa no processo principal permite aos operadores económicos prosseguir uma atividade no domínio da difusão de obras protegidas através de antenas coletivas, sem obrigação de pedir autorização aos autores a título do direito de comunicação ao público por eles detido, na condição de que o número de assinantes ligadas à antena não exceda os 500.

40      A referida possibilidade, prevista na lei, é suscetível de atrair os operadores económicos que desejam dela beneficiar e de conduzir à utilização contínua e paralela de uma pluralidade de antenas coletivas. Em consequência isso poderia criar, em todo o território nacional, uma situação em que um grande número de assinantes teriam acesso paralelo às emissões distribuídas dessa forma.

41      Ora, o Tribunal de Justiça já declarou que é o critério do número acumulado dos destinatários potenciais com acesso à mesma obra paralelamente que constitui um elemento importante da noção de «público» e, por consequência, um elemento pertinente da comunicação ao público sujeito à exigência de obter a autorização do titular do direito em causa (v., neste sentido, o acórdão de 31 de maio de 2016, Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.os 42 a 44).

42      Assim, tendo em conta a interpretação estrita que se deve dar ao artigo 5.°, n.° 3, alínea o), da Diretiva 2001/29, e ao objetivo de proteção elevada dos direitos de autor mencionado no considerando 9 desta diretiva, uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite a uma pluralidade de operadores económicos distribuir paralelamente, sem autorização dos autores, obras protegidas através de antenas coletivas com uma capacidade limitada de assinantes, não pode ser considerada, designadamente devido ao seu efeito cumulativo precisado no n.° 40 do presente acórdão, como relativa a uma «utilização em certos casos de menor importância», no sentido desse artigo 5, n.° 3, alínea o).

43      Nestas condições, sem ter de analisar se as outras condições formuladas no artigo 5.°, n.° 3, alínea o), da Diretiva 2001/29 estão preenchidas, há que considerar que uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, não podia ser criada ao abrigo da faculdade concedida aos Estados‑Membros de prever exceções ou limitações aos direitos previstos nos artigos 2.° e 3.° da mesma diretiva. Por consequência, tal legislação dever respeitar o princípio formulado no artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29, segundo o qual os autores de obras protegidas dispõem do direito exclusivo de autorizar ou proibir a sua comunicação ao público.

44      Em face das considerações precedentes, há que responder à questão submetida no sentido de que:

–        O artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29 e o artigo 11.° bis da Convenção de Berna devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, segundo a qual não está sujeita, ao abrigo do direito exclusivo de comunicação ao público, à exigência de obter uma autorização do autor a transmissão simultânea, completa e não modificada de emissões radiodifundidas do organismo nacional de radiodifusão por meio de cabos situados no território nacional, desde que constitua uma simples modalidade técnica de comunicação e tenha sido tida em conta pelo autor da obra ao autorizar a comunicação inicial, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar;

–        O artigo 5.° da Diretiva 2001/29, e designadamente o seu n.° 3, alínea o), deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, a qual não sujeita, ao abrigo do direito exclusivo de comunicação ao público, à exigência de obtenção de autorização do autor a radiodifusão através de antena coletiva, se o número de assinantes ligados a essa antena não for superior a 500, e de que essa legislação deve, por conseguinte, ser aplicada em conformidade com o artigo 3, n.° 1, dessa diretiva, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

 Quanto às despesas

45      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

O artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, e o artigo 11.° bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1886, na versão resultante do ato de Paris de 24 de julho de 1971, conforme alterada em 28 de setembro de 1979, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, segundo a qual não está sujeita, ao abrigo do direito exclusivo de comunicação ao público, à exigência de obter uma autorização do autor a transmissão simultânea, completa e não modificada de emissões radiodifundidas do organismo nacional de radiodifusão por meio de cabos situados no território nacional, desde que constitua uma simples modalidade técnica de comunicação e tenha sido tida em conta pelo autor da obra ao autorizar a comunicação inicial, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar;

O artigo 5.° da Diretiva 2001/29, e designadamente o seu n.° 3, alínea o), deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, a qual não sujeita, ao abrigo do direito exclusivo de comunicação ao público, à exigência de obtenção de autorização do autor a radiodifusão através de antena coletiva, se o número de assinantes ligados a essa antena não for superior a 500, e de que essa legislação deve, por conseguinte, ser aplicada em conformidade com o artigo 3, n.° 1, dessa diretiva, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

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