Language of document : ECLI:EU:C:2002:44

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

JEAN MISCHO

apresentadas em 24 de Janeiro de 2002 (1)

Processo C-499/99

Comissão das Comunidades Europeias

contra

Reino de Espanha

«Incumprimento de Estado - Auxílios de Estado - Decisão da Comissão de 20 de Dezembro de 1989 - Decisão da Comissão de 14 de Outubro de 1998»

1.
    A Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de Justiça que declare que o Reino de Espanha, ao não adoptar no prazo fixado as medidas necessárias para dar cumprimento às Decisões da Comissão 91/1/CEE, de 20 de Dezembro de 1989, relativa aos auxílios concedidos em Espanha pelo Governo central e por vários governos autónomos à Magefesa, produtora de artigos domésticos de aço inoxidável e de pequenos aparelhos eléctricos (2) (a seguir «Decisão de 1989»), e 1999/509/CE, de 14 de Outubro de 1998, relativa aos auxílios concedidos pela Espanha às empresas do grupo Magefesa e seus sucessores (3) (a seguir «Decisão de 1998»), não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 249.°, quarto parágrafo, CE, e dos artigos 2.° e 3.° das referidas decisões.

I - Os antecedentes do litígio

As empresas em causa

2.
    O grupo Magefesa é constituído essencialmente por quatro empresas industriais: a sociedade Investigación y Desarrollo Udala SA (a seguir «Indosa»), estabelecida no País Basco, a sociedade Cubertera del Norte SA (a seguir «Cunosa») e a sociedade Manufacturas Gur SA (a seguir «GURSA»), estabelecidas na Cantábria, e a sociedade Manufacturas Inoxidables de Gibraltar SA (a seguir «MIGSA»), estabelecida na Andaluzia.

3.
    A situação destas empresas pode ser resumida do seguinte modo:

-    A Indosa foi declarada em falência em 19 de Abril de 1994, a pedido dos seus empregados, mas prosseguiu as suas actividades.

-    A Cunosa cessou as suas actividades em 1994 e foi declarada em falência em 13 de Abril de 1994, a pedido dos seus empregados. As operações de liquidação começaram em Março de 1998.

-    A MIGSA cessou as suas actividades em 1993 e foi declarada em falência em 27 de Maio de 1999, a pedido dos seus empregados.

-    A GURSA está inactiva desde 1994, mas não foi declarada em falência.

4.
    Com o objectivo de atribuir os auxílios em causa, foram criadas sociedades de gestão nas comunidades autónomas em causa: a Fiducias de la Cocina y Derivados SA (a seguir «Ficodesa») no País Basco, a Gestión de Magefesa en Cantabria SA (a seguir «Gemacasa») na Cantábria, e a Manufacturas Damma SA (a seguir «Damma») na Andaluzia. A função destas sociedades está descrita na Decisão de 1989 do seguinte modo (4):

«[...] Estas sociedades tinham dois objectivos principais: por um lado, permitir o controlo por parte das autoridades públicas não só da utilização dos auxílios a serem concedidos, mas também da execução das directivas da Gestiber [sociedade espanhola de consultadoria]; por outro lado, garantir o funcionamento das empresas da Magefesa, impedindo, principalmente, a execução pelos credores dos seus recursos financeiros e existências. Para este efeito, e com base em acordos conjuntos, essas sociedades intermédias comercializam toda a produção da Magefesa previamente adquirida às empresas individuais; simultaneamente, administram os fundos, as matérias-primas e os produtos semi-acabados necessários às empresas, que fornecem à medida que o trabalho progride ou da apresentação de despesas justificadas.»

5.
    A Ficodesa foi declarada em falência em 19 de Janeiro de 1995 a pedido dos empregados do grupo Magefesa. A Damma está inactiva desde 1993, mas não foi declarada em falência.

A Decisão de 1989

6.
    O dispositivo da Decisão de 1989 tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.°

O apoio público concedido às empresas da Magefesa traduzido em:

i)    Garantias de empréstimos no valor de 1 580 milhões de pesetas espanholas;

ii)    Um empréstimo de 2 085 milhões de pesetas espanholas em condições diferentes das de mercado;

iii)    Subsídios a fundo perdido no valor de 1 095 milhões de pesetas espanholas;

iv)    Uma bonificação de juros avaliada em 9 milhões de pesetas espanholas;

foi concedido ilegalmente, sendo, além disso, incompatível com o mercado comum, nos termos do artigo 92.° do Tratado CEE.

Artigo 2.°

Nestas circunstâncias, devem ser suprimidos os elementos de auxílio envolvidos no apoio referido no artigo 1.° O Governo espanhol deve, assim, tomar as seguintes medidas:

a)    Suprimir as garantias estatais de empréstimos, no valor de 1 580 milhões de pesetas espanholas;

b)    Converter o empréstimo em condições favoráveis num crédito normal em condições de mercado, no que se refere à taxa de juro e ao reembolso, ou suprimir o empréstimo ou tomar qualquer outra medida adequada que assegure a supressão integral dos elementos de auxílio; a medida tomada retroage à data da concessão do empréstimo;

c)    No caso da conversão, assegurar que as prestações relativas ao empréstimo acima referido são pagas de acordo com o calendário fixado;

d)    Recuperar 1 104 milhões de pesetas espanholas correspondentes aos subsídios concedidos a fundo perdido.

Artigo 3.°

As autoridades espanholas informarão a Comissão, num prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, das medidas tomadas para lhe dar cumprimento. Caso a execução da decisão ocorra posteriormente ao período referido, é aplicável a lei nacional relativa aos juros de mora a pagar ao Estado.

Artigo 4.°

O Reino de Espanha é o destinatário da presente decisão.»

7.
    Os auxílios declarados incompatíveis tinham sido concedidos pelas seguintes entidades:

-    O Governo basco:

    -    uma garantia de empréstimo de 300 milhões de ESP concedida directamente à Indosa;

    -    uma garantia de 672 milhões de ESP concedida à Ficodesa para ser aplicada às empresas dos subgrupos Magefesa e Licasa estabelecidas no País Basco, entre as quais a Indosa;

    -    auxílios, sob a forma de um subsídio a fundo perdido no montante de 794 milhões de ESP e de uma bonificação de juros de 9 milhões de ESP, igualmente concedidos à Ficodesa para serem atribuídos às empresas dos subgrupos Magefesa e Licasa situadas no País Basco.

-    O Governo cantábrico:

    -    uma garantia de empréstimo no montante total de 512 milhões de ESP à Gemacasa para ser aplicada à Cunosa e à GURSA;

    -    um subsídio a fundo perdido de 262 milhões de ESP com o mesmo destino.

-    O Governo andaluz:

    -    uma garantia de empréstimo no montante total de 96 milhões de ESP concedida à Damma para ser aplicada à MIGSA;

    -    um subsídio a fundo perdido de 29 milhões de ESP (5) com o mesmo destino.

-    O Fogasa (Fundo nacional de garantia dos direitos dos trabalhadores no caso de insolvência do seu empregador): empréstimo em condições diferentes das do mercado no montante de 2 085 milhões de ESP.

8.
    Para dar cumprimento à Decisão de 1989, as empresas do grupo Magefesa e o Fogasa celebraram um contrato de reembolso do empréstimo concedido por este último, contrato que foi alterado para ser adaptado às exigências da referida decisão. Esta medida não foi contestada pela Comissão.

9.
    Em relação aos outros auxílios, o Reino de Espanha informou a Comissão por ofícios de 23 de Outubro de 1991, 8 de Abril de 1994 e 23 de Abril de 1997 das medidas adoptadas pelas autoridades espanholas.

10.
    Essas medidas foram consideradas insuficientes pela Comissão.

A Decisão de 1998

11.
    O dispositivo da Decisão de 1998 tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.°

O auxílio sob a forma de não pagamento sistemático dos impostos e das contribuições para a segurança social:

-    por parte da Indosa e Cunosa até à sua declaração de falência,

-    por parte da MIGSA e GURSA até à interrupção das suas actividades,

-    por parte da Indosa após a sua declaração de falência, e até Maio de 1997,

é ilegal, ao ter sido concedido pela Espanha em incumprimento da obrigação que lhe incumbia nos termos do n.° 3 do artigo 93.° do Tratado CE.

Nos termos do n.° 1 do artigo 92.° do Tratado, o auxílio é incompatível com o mercado comum uma vez que não preenche qualquer dos critérios necessários para a aplicação das excepções previstas nos n.os 2 e 3 do mesmo artigo.

Artigo 2.°

1.    A Espanha adoptará as medidas necessárias para recuperar junto dos beneficiários o auxílio mencionado no artigo 1.°, concedido ilegalmente.

2.    A restituição do auxílio deverá efectuar-se de acordo com os procedimentos e disposições previstos na legislação espanhola, devendo o montante ser majorado de juros a contar da data de concessão até à data da sua restituição efectiva, a uma taxa correspondente à taxa de referência aplicável ao cálculo do equivalente subvenção líquido dos auxílios regionais em Espanha.

Artigo 3.°

A Espanha comunicará à Comissão, no prazo de dois meses a contar da data de notificação da presente decisão, as medidas adoptadas para lhe dar cumprimento.»

12.
    Esta decisão foi objecto de um recurso interposto pelo Reino de Espanha. Por acórdão de 12 de Outubro de 2000, Espanha/Comissão (6), o Tribunal de Justiça, no essencial, julgou esse recurso improcedente, anulando contudo a Decisão de 1998 na medida em que impõe, entre os montantes de auxílios a recuperar, a cobrança de juros vencidos posteriormente à declaração de falência das empresas Indosa e Cunosa sobre os auxílios ilegalmente recebidos antes dessa declaração.

13.
    O Governo espanhol informou a Comissão por ofícios de 21 de Janeiro de 1998, no âmbito do procedimento contraditório, bem como em 21 de Janeiro de 1999 e 22 de Julho de 1999, em resposta à decisão da Comissão, das medidas adoptadas para recuperar o montante dos auxílios.

14.
    A eficácia dessas medidas foi contestada pela Comissão.

II - A acção

15.
    A Comissão pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

-    declarar que, ao não adoptar no prazo fixado as medidas necessárias para dar cumprimento às Decisões da Comissão, de 20 de Dezembro de 1989 e de 14 de Outubro de 1998, que declaram que determinados auxílios foram ilegalmente concedidos às empresas do grupo Magefesa, além de serem incompatíveis com o mercado comum, o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 249.°, quarto parágrafo, CE, e dos artigos 2.° e 3.° das decisões em causa;

-    condenar o Reino de Espanha nas despesas.

16.
    O Reino de Espanha pede ao Tribunal de Justiça que julgue improcedente a acção por incumprimento e condene a Comissão nas despesas.

17.
    Pede também que seja suspensa a instância aguardando-se o acórdão no processo C-480/98. No entanto, tendo já sido proferido esse acórdão, o pedido de suspensão formulado pelo Reino de Espanha ficou sem objecto.

III - Análise

Os auxílios declarados incompatíveis pela Decisão de 1989

A - Os auxílios concedidos pelo Governo basco

18.
    No que diz respeito às garantias de empréstimo, a Comissão salienta que «o Governo basco decidiu, em 28 de Junho de 1988 (quer dizer antes da adopção da Decisão de 1989) intervir por sub-rogação no reembolso dos empréstimos garantidos [(7)] [...]. Em conformidade com esta decisão, o Governo basco efectuou vários pagamentos, entre 1988 e 1993, aos credores no montante total de 1 365 717 623 ESP [...]. À medida que efectuava esses pagamentos, o Governo basco reclamava o seu reembolso à Ficodesa. Em 30 de Dezembro de 1993, o montante total coercivamente reclamado à Ficodesa ascendia a 1 638 315 148 ESP [...].»

19.
    No que diz respeito ao subsídio a fundo perdido e à bonificação de juros, a Comissão refere que «o Governo basco [em 25 de Janeiro de 1995] notificou os ‘representantes legais da empresa Ficodesa do grupo Magefesa [...]’. Nessa altura, a Ficodesa, que tinha pedido a cessação dos pagamentos em 4 de Maio de 1994, estava em situação legal de falência há uma semana (em 19 de Janeiro de 1995) [...]».

20.
    Também como a Comissão refere, «[s]egundo a declaração de falência da Ficodesa, os pagamentos efectuados em execução das garantias e dos subsídios a fundo perdido foram reconhecidos no passivo pela assembleia geral dos credores da falência dessa sociedade, no montante total de 2 168 717 623 ESP».

21.
    Com base nestes factos, que não são contestados pelo Governo espanhol, a Comissão formula, em suma, duas censuras quanto ao cumprimento pelo Reino de Espanha da Decisão de 1989. Uma diz respeito à não retirada pelo Governo basco da garantia de empréstimo concedida à Ficodesa e a outra à inacção por esse mesmo Governo contra a Indosa.

A censura relativa à não retirada pelo Governo basco das garantias de empréstimo

22.
    Segundo a Comissão, «pela sub-rogação no empréstimo sob garantia e pelo pedido de reembolso posterior à Ficodesa dos montantes pagos à medida que os prazos do empréstimo sob garantia expiravam», «[o] Governo basco limitou-se a transformar um empréstimo garantido pelo Governo autónomo basco num empréstimo concedido directamente pelo Governo autónomo basco nas mesmas condições, quer dizer, condições diferentes das do mercado e constituindo, a esse título, um auxílio. Assim, mesmo pressupondo que a Ficodesa reembolsasse pontualmente os montantes reclamados, o Governo basco não cumpriu a Decisão de 1989. Para o fazer, o Governo autónomo basco deveria reembolsar o montante total do crédito, sem esperar o termo do prazo, e exigir imediatamente o seu reembolso ao beneficiário».

23.
    O Governo espanhol considera que «não é verdade que o Governo basco se tenha limitado a transformar um empréstimo que ele próprio garantiu num empréstimo que concedeu em condições não comerciais. O Governo basco cancelou a garantia, subrogando-se na posição das entidades que tinham concedido o empréstimo e exigiu coercivamente o reembolso integral deste último, com juros de mora e 20% de acréscimo, incluindo esse montante nas dívidas reconhecidas pela assembleia dos credores».

24.
    O que pode dizer-se quanto à primeira censura da Comissão?

25.
    Deve referir-se que a Decisão de 1989, no seu artigo 2.°, obriga o Reino de Espanha a «suprimir as garantias estatais de empréstimos, no valor de 1 580 milhões de pesetas espanholas».

26.
    Assim, tendo em consideração a jurisprudência constante (8) segundo a qual a obrigação de um Estado-Membro suprimir um auxílio considerado pela Comissão incompatível com o mercado comum visa o restabelecimento da situação anterior, o Governo basco tem a obrigação de pôr termo a qualquer efeito que pudessem ter as garantias que concedeu relativas ao empréstimo e que foram declaradas incompatíveis com o mercado comum.

27.
    Ora, é justificadamente que a Comissão refere que o Governo basco deveria, para o fazer, reembolsar desde 1989 o montante total do crédito, sem esperar o termo do prazo, e exigir imediatamente o seu reembolso ao beneficiário. Esta mesma solução, aliás, fora proposta pelo Conselho de Estado espanhol, órgão consultivo supremo espanhol, nos termos de uma consulta em 1990 sobre o modo como o Reino de Espanha devia aplicar a Decisão de 1989 (9).

28.
    Com efeito, essa diligência seria o único meio para pôr termo aos efeitos da garantia, não sendo já possível a simples retirada da garantia porque esta já tinha dado origem a uma sub-rogação em 1988, portanto anterior à Decisão de 1989. Em contrapartida, ao efectuar pagamentos aos organismos credores entre 1988 e 1993, portanto ao ritmo do termo dos prazos, e ao solicitar em seguida o reembolso desses pagamentos à Ficodesa, o Governo basco não retirou a garantia e não fez outra coisa senão continuar a prestá-la.

29.
    O argumento do Governo espanhol segundo o qual o Governo basco cumpriu a Decisão de 1989 ao solicitar o reembolso dos pagamentos efectuados aos organismos credores não pode ser acolhido. Com efeito, há que recordar que o auxílio consistia numa garantia e não numa subvenção. Assim, não era normal que o Governo basco solicitasse o reembolso dos pagamentos efectuados. O simples facto de o Governo basco ter reclamado esse reembolso não demonstra, assim, que tinha retirado a garantia.

30.
    Assim, sou de opinião que o necessário não foi feito para que se procedesse à retirada das garantias sobre o empréstimo prestadas pelo Governo basco.

A censura relativa à inacção do Governo basco contra a Indosa

31.
    A Comissão censura também o Reino de Espanha pelo facto de o Governo basco não ter feito o necessário para obter o reembolso dos pagamentos efectuados, bem como para recuperar o subsídio a fundo perdido e a bonificação de juros, uma vez que «este dirigiu todas as suas acções contra a Ficodesa. Todavia, esta sociedade sendo apenas uma sociedade de fachada, que não tem qualquer actividade de produção nem património próprio e que foi criada com o único objectivo de canalizar os auxílios públicos a favor da Indosa». Ora, segundo a Comissão, «é incontestável que os verdadeiros beneficiários dos auxílios são as empresas do grupo Magefesa, e em especial a Indosa, e não a Ficodesa».

32.
    A este respeito, a Comissão salienta, sem ser contestada pelo Governo espanhol, que tanto a garantia de 672 milhões de ESP como o subsídio a fundo perdido e a bonificação de juros foram concedidas à Ficodesa «para serem aplicadas» às empresas dos subgrupos Magefesa e Licasa estabelecidas no País Basco, entre as quais figura a Indosa. Por outro lado, sem ser contraditada pelo Governo espanhol, a Comissão sublinha que a garantia de empréstimo de 300 milhões de ESP foi prestada directamente à Indosa, e não à Ficodesa.

33.
    No respeitante aos auxílios concedidos à Ficodesa, o Governo espanhol responde que foi feito o necessário uma vez que o Governo basco, em primeiro lugar, solicitou coercivamente à Ficodesa o reembolso das quantias em causa e, em seguida, aquando do processo de recuperação judicial, obtive a inclusão dessas somas nos créditos reconhecidos pela assembleia dos credores da falência da Ficodesa.

34.
    O Governo espanhol sustenta também que o Governo basco não podia reclamar esses auxílios directamente à Indosa. Com efeito, em sua opinião, «os auxílios concedidos pelo Governo basco sob a forma de garantias e de subsídios a fundo perdido foram a favor da Ficodesa; o reembolso dos auxílios, por conseguinte, só pode ser exigido a essa empresa, única devedora do Governo basco».

35.
    O Governo espanhol acrescenta que «a reclamação dessas quantias pelo Governo basco às empresas que puderam, por sua vez, receber esses montantes da Ficodesa é totalmente infrutuosa, como o demonstra a tentativa de reconhecimento de crédito efectuada pelo Governo basco em 7 de Junho de 1996 no processo de recuperação judicial da Magefesa. Com efeito, [...], a assembleia dos credores não reconheceu o crédito do Governo basco em 3 de Julho de 1996, embora tenha reconhecido o crédito da Ficodesa».

36.
    No respeitante à garantia concedida directamente à Indosa, o Governo espanhol salienta que «o Governo basco efectivamente reclamou à Indosa os montantes correspondentes aos créditos de que era titular em relação a essa empresa. Assim, a assembleia dos credores reconheceu, em 12 de Junho de 1995, um crédito de 2 800 200 [ESP]».

37.
    A segunda censura da Comissão dá origem às seguintes observações.

38.
    Em primeiro lugar, no que diz respeito aos auxílios concedidos à Ficodesa, o Governo espanhol não contesta que os auxílios foram concedidos para serem atribuídos à Indosa e que esta última, na realidade, foi o seu beneficiário principal.

39.
    Além disso, o Governo espanhol não contesta que a Ficodesa era uma simples sociedade de gestão que não tinha qualquer actividade de produção nem património próprio e que foi criada com o objectivo de canalizar os auxílios públicos a favor da Indosa.

40.
    Nestas circunstâncias, sou de opinião que, no momento em que era patente que os pedidos de reembolso dirigidos à Ficodesa eram infrutuosos, o Governo basco deveria igualmente diligenciar a fim de obter do beneficiário real dos auxílios a sua recuperação.

41.
    Com efeito, por um lado, a recuperação dos auxílios à Indosa entra no quadro da execução da Decisão de 1989 na medida em que esta faz referência, no seu artigo 1.°, ao «apoio público concedido às empresas da Magefesa» de que faz parte a Indosa.

42.
    Por outro lado, como salienta também a Comissão, o facto de decidir de outro modo permitiria aos Estados-Membros eludir as normas do Tratado em matéria de auxílios públicos mediante a sua concessão por intermédio de sociedades que não são os reais beneficiários do auxílio. O efeito útil que deve ter o artigo 2.° da Decisão de 1989, que impõe a recuperação dos auxílios, exige, portanto, que as autoridades competentes empreendam diligências para recuperar os auxílios não apenas à sociedade de gestão que os recepcionou mas também, se se afigurar necessário a fim de conduzir à sua supressão, à sociedade que é a beneficiária real.

43.
    O Governo espanhol sustenta, no entanto, que o Governo basco estava na impossibilidade de exigir os auxílios à Indosa, sendo a sociedade Ficodesa a única devedora do Governo basco. Assim, invoca, em suma, uma «impossibilidade absoluta» quanto à recuperação dos auxílios à Indosa porque não tinha qualquer título em relação a esta última para recuperar o auxílio.

44.
    Ora, há que recordar que, segundo a jurisprudência constante, um Estado-Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica interna para se subtrair ao cumprimento das obrigações que lhe incumbem por força do direito comunitário (10).

45.
    Mais concretamente, no acórdão de 21 de Março de 1991, Itália/Comissão (11), em resposta ao Governo italiano que sustentava que «segundo o direito italiano, [a República Italiana] não tem qualquer legitimidade para recuperar (12) dos compradores das quatro filiais montantes que não foram tomados em consideração nas condições de venda das empresas em questão» (13), o Tribunal de Justiça decidiu que «mesmo que, nos termos do direito italiano, o ENI não possa recuperar os montantes que não foram tomados em consideração nas condições de venda das quatro filiais, este facto não obsta à plena aplicação do direito comunitário e, por isso, não tem qualquer influência na obrigação de proceder à recuperação dos auxílios em questão» (14).

46.
    Resulta desta jurisprudência que o facto de o Governo basco não ter legitimidade em relação à Indosa é irrelevante quanto à sua obrigação de proceder à recuperação dos auxílios em questão ao beneficiário real destes últimos. Tanto mais que o Governo basco contribuiu para o desenvolvimento da prática que consistiu na atribuição do auxílio ao beneficiário real, a Indosa, por intermédio de uma sociedade de gestão, a Ficodesa. Como resulta da Decisão de 1989, foi o próprio Governo basco que criou a Ficodesa (15). Nestas circunstâncias, a falta de legitimidade em relação à Indosa só pode ser atribuída ao próprio Governo basco.

47.
    O Governo espanhol sustenta ainda que as medidas adoptadas pelas autoridades espanholas para obter a recuperação dos auxílios devem manter-se no quadro dos processos de recuperação judicial e, por conseguinte, respeitar as regras que os regem. Assim, se a assembleia dos credores não reconhecer, segundo as regras nacionais em vigor, um crédito, como ocorreu no caso da Magefesa, o credor não pode intentar qualquer acção em relação ao património do devedor para recuperar o seu crédito.

48.
    Ora, a este respeito, o Governo espanhol limita-se a fazer referência ao caso da Magefesa para daí deduzir que, no caso da Indosa, o crédito do Governo basco não foi reconhecido pela assembleia dos credores. No entanto, concretamente, o Governo basco não fez qualquer tentativa para que o seu crédito fosse reconhecido pela assembleia dos credores da Indosa.

49.
    Além disso, o facto de o crédito não ter sido reconhecido foi a consequência directa de o Governo basco não dispor de legitimidade em relação à Indosa. Essa falta de legitimidade, como já o referi, deve ser imputada ao próprio Governo basco e não pode repercutir-se na obrigação de proceder à recuperação dos auxílios.

50.
    Por outro lado, mesmo que a falta de legitimidade ou a «hipotética» recusa de reconhecer o crédito do Governo basco na falência da Indosa pudessem ser qualificadas como uma dificuldade imprevista e imprevisível pelo Governo basco, o que me parece já muito discutível, o Governo espanhol deveria, segundo a jurisprudência constante (16), submeter o problema à apreciação da Comissão e, nos termos da regra que impõe aos Estados-Membros e às instituições comunitárias deveres recíprocos de cooperação leal, que inspira, nomeadamente, o artigo 10.° CE, colaborar de boa fé com vista a superar as dificuldades, respeitando plenamente as disposições do Tratado. Ora, não existe qualquer indício segundo o qual o Governo espanhol, a quem competia tomar a iniciativa (17), teria efectuado qualquer diligência a fim de submeter o problema à Comissão. Como resulta dos autos, limitou-se a invocar a falta de legitimidade do Governo basco em relação à Indosa.

51.
    Há que acrescentar que, como salienta a Comissão, na fase pré-contenciosa, o Governo basco referiu-se ainda à impossibilidade de determinar os montantes de que tinha beneficiado cada empresa do grupo, devido a lacunas da sua contabilidade, para justificar o facto de não ter empreendido qualquer acção contra a Indosa.

52.
    Ora, a este respeito, basta referir que, sob pena de esvaziar de conteúdo a obrigação de recuperar os auxílios, as dificuldades de natureza contabilística relativas à determinação exacta do beneficiário de um auxílio não podem ser consideradas uma «impossibilidade absoluta» de recuperar o auxílio em questão.

53.
    Assim, sou de opinião de que, ao dirigir-se, para recuperar os auxílios, apenas à Ficodesa, simples sociedade de gestão pela qual os auxílios transitaram, e não à Indosa, beneficiária real e principal dos auxílios, o Governo basco não fez o necessário a fim de correctamente executar a Decisão de 1989.

54.
    Em segundo lugar, no que diz respeito à garantia de empréstimo de 300 milhões de ESP prestada directamente pelo Governo basco à Ficodesa, a Comissão refere na sua petição que, «depois de terem decorrido dez anos desde a adopção da Decisão de 1989, o Governo basco não empreender qualquer acção contra a Indosa».

55.
    Na verdade, o Governo espanhol salienta, em resposta a este argumento da Comissão, que a assembleia dos credores da Indosa reconheceu, em 12 de Junho de 1995, um crédito no montante de 2 800 000 ESP.

56.
    No entanto, parece-me que esta diligência não é suficiente para suprimir um auxílio que consistiu numa garantia de empréstimo no montante de 300 milhões de ESP que deu origem a uma sub-rogação e cujo montante devia, assim, ser reembolsado pela Indosa. Com efeito, basta referir, a este respeito, que o montante da dívida reconhecida não representa mesmo 1% do montante da garantia que deu origem à sub-rogação.

57.
    Assim, sou de opinião que a segunda censura da Comissão é igualmente fundamentada.

58.
    Resulta das considerações precedentes que, sendo as duas censuras da Comissão fundamentadas e abrangendo estas, no seu conjunto, todos os auxílios concedidos pelo Governo basco, a Comissão, em minha opinião, demonstrou que os artigos 2.° e 3.° da Decisão de 1989 não foram correctamente executados quanto aos auxílios concedidos pelo Governo basco.

B - Os auxílios concedidos pelo Governo cantábrico

59.
    Segundo a Comissão, o Governo cantábrico não tomou qualquer medida para a recuperação dos auxílios contra as sociedades beneficiárias (Cunosa e GURSA), nem contra a sociedade de gestão que permitiu canalizar o auxílio (Gemacasa).

60.
    O Governo espanhol responde que o Governo cantábrico anulou várias garantias entre Dezembro de 1994 e Maio de 1995 mas que era impossível obter o reembolso dos montantes dos auxílios por parte da GURSA, Cunosa e Gemacasa, uma vez que estas empresas já não estavam em actividade e não dispunham de bens permitindo a execução das dívidas pendentes.

61.
    Ora, é justificadamente que a Comissão considera que a Decisão de 1989 não foi correctamente executada quanto aos auxílios concedidos pelo Governo cantábrico. Com efeito, segundo a jurisprudência constante, a condição de impossibilidade de executar correctamente a decisão da Comissão «não está preenchida quando o Governo demandado se limita a comunicar à Comissão as dificuldades jurídicas, políticas ou práticas que a execução da decisão apresentava, sem efectuar qualquer espécie de diligência junto das empresas em causa para recuperar o auxílio e sem propor à Comissão formas alternativas de aplicação da decisão que teriam permitido superar as dificuldades» (18).

62.
    Assim, limitando-se o Governo cantábrico a dizer que era impossível obter a recuperação sem ter feito qualquer tentativa, não se pode considerar que a Decisão de 1989 tenha sido correctamente executada quanto à recuperação dos auxílios concedidos por esse Governo.

63.
    O Governo espanhol sublinha ainda que, de qualquer forma, a Cunosa e a MIGSA (bem como a GURSA) cessaram as suas actividades ou já tinham sido objecto de uma liquidação. Conclui-se, em sua opinião, que, «se o objectivo da obrigação de restituição de um auxílio fosse restabelecer a situação anterior evitando que o beneficiário do auxílio goze de uma vantagem concorrencial em relação aos seus outros concorrentes, exigir o reembolso não tem nada a ver com a finalidade dessa obrigação».

64.
    Ora, este argumento não ser acolhido.

65.
    Com efeito, em primeiro lugar, este argumento não tem em conta o facto de que, segundo a jurisprudência constante, «o único (19) fundamento de defesa susceptível de ser invocado por um Estado-Membro numa acção por incumprimento intentada pela Comissão com base no artigo 93.°, n.° 2, do Tratado consiste na impossibilidade absoluta de executar correctamente a decisão» (20).

66.
    Em seguida, o argumento do Governo espanhol implica que a execução de uma decisão adoptada pela Comissão com fundamento no artigo 88.°, n.° 2, CE seja subordinada a uma análise da situação concorrencial da empresa no momento da execução da decisão que impõe a recuperação. Ora, além de essa condição não figurar na regulamentação, ela esvaziaria a decisão de todo o seu sentido, já que é precisamente baseada numa análise do efeito sobre a concorrência que teve o auxílio concedido. Assim, essa condição teria na realidade por efeito que a decisão fosse revista cada vez que se começasse a sua execução.

67.
    Por último, é justificadamente que Comissão refere que «[e]nquanto não se proceder à liquidação das empresas em questão, subsistirá a possibilidade de elas retomarem a sua actividade». A este respeito, ela sublinha que essa possibilidade não é puramente teórica. «A prova disso», em sua opinião, é «o facto de as sociedades Idisur S.A.L., Loc S.A.L. e Vitrinor S.A.L., criadas respectivamente pelos trabalhadores da Migsa, Cunosa e Gursa, operarem, em parte, com os activos destas últimas, o que motivou a abertura de um inquérito pelo Ministério das Finanças para determinar a existência de uma eventual sucessão de empresas».

68.
    O Governo espanhol não contesta estas informações. Limita-se a referir, na tréplica, que a Cunosa foi liquidada. No entanto, não fornece qualquer informação relativa a essa liquidação que permita concluir que esta já tinha ocorrido antes da propositura da presente acção e que, por conseguinte, o argumento invocado pela Comissão, e fundado na cessação das actividades, já não se aplicaria à Cunosa.

C - Os auxílios concedidos pelo Governo andaluz

69.
    No que diz respeito à garantia de empréstimo, segundo as informações da Comissão, não contestadas pelo Governo espanhol, o Instituto de Fomento Andaluz (a seguir «IFA») procedeu, em 6 de Novembro de 1990, ao pagamento do montante garantido à instituição de crédito em causa. Em 20 de Novembro de 1990, enviou à Damma uma carta exigindo esse montante o mais rapidamente possível. Segundo a Comissão, nenhuma outra diligência foi feita, com excepção da declaração pelo IFA desse crédito, em Junho de 1992, no passivo da falência da Damma.

70.
    Quanto ao subsídio a fundo perdido, a Comissão sustenta, sem ser contraditada pelo Governo espanhol, que o Governo andaluz propôs, em 21 de Novembro de 1990, uma acção oficiosa de revisão para o anular. Todavia, decidiu não continuar o processo, considerando que poderia ser inútil, visto a Damma não dispor de activos penhoráveis.

71.
    Concretamente, a censura da Comissão consiste no facto de a Decisão de 1989 não ter sido correctamente executada, não tendo o Governo andaluz feito qualquer diligência em relação à MIGSA, a beneficiária real dos auxílios, a fim de os recuperar.

72.
    Ora, concordo com a posição da Comissão pelas razões já explicadas supra ao examinar os auxílios concedidos pelo Governo basco à Ficodesa para serem atribuídos à Indosa. As circunstâncias, são idênticas no sentido de que a Damma é apenas, como a Ficodesa, uma simples sociedade de gestão sem actividade nem património próprio, criada com o objectivo de canalizar os auxílios, e que, como a Indosa, a MIGSA é a beneficiária real dos auxílios concedidos. Portanto, o Governo andaluz deveria diligenciar junto da MIGSA para recuperar esses auxílios, sem que a falta de legitimidade possa ser considerada uma «impossibilidade absoluta».

Os auxílios declarados incompatíveis pela Decisão de 1998

73.
    Quanto à Decisão de 1998, o Governo espanhol sublinha que a considerou ilegal e que, por essa razão, interpôs um recurso de anulação dessa decisão registada sob o número C-480/98.

74.
    Ora, posto de lado o facto de o presente processo não dizer respeito à validade da Decisão de 1998 mas à sua execução, há que referir que, pelo seu acórdão de 12 de Outubro de 2000, Espanha/Comissão, já referido, o Tribunal de Justiça, em suma, confirmou esta decisão, reformando apenas o cálculo dos juros a acrescer ao montante das quantias a recuperar. Assim, há apenas que me debruçar sobre a execução da Decisão de 1998.

A - Os auxílios concedidos à Indosa

75.
    A Comissão sublinha que a tesouraria da segurança social (a seguir «TSS») e a Hacienda Foral de Vizcaya representam, com os outros credores públicos da Indosa, 82,65% do montante dos empréstimos declarados no passivo da falência e dispõem, por conseguinte, de uma larga maioria na assembleia dos credores da Indosa.

76.
    Não obstante este facto, os credores públicos da Indosa, segundo a Comissão, não tomaram qualquer iniciativa para que os administradores da falência procedessem de uma vez por todas à liquidação da massa activa da falência ou submetessem à assembleia dos credores uma proposta de acordo, nem solicitaram ao juiz que demitisse os administradores da falência como sanção da sua inactividade.

77.
    A Comissão admite que, em 28 de Dezembro de 1998, a TSS dirigiu ao tribunal encarregado da falência da Indosa um pedido solicitando a liquidação desta última ou a celebração de um acordo com os credores «que ponha termo à situação irregular da falência da Indosa». Apesar disso, segundo a Comissão, esse pedido não era fundamentado em nenhuma disposição da ordem jurídica espanhola relativa às falências e não teve qualquer seguimento, nem o podia ter.

78.
    O Governo espanhol contesta que esse pedido não tenha tido qualquer seguimento. Descreve o procedimento que teve lugar em 1999 no Juzgado de Primera Instancia n.° 7 de Bilbau e que conduziu ao despacho de 7 de Novembro de 1999 pelo qual este órgão jurisdicional aceitou convocar uma assembleia geral dos credores. Inicialmente prevista para 18 de Fevereiro de 2000, essa assembleia, segundo o Governo espanhol, teve lugar em 4 de Julho de 2000. Foi convencionado, sempre segundo esse Governo, sob proposta da TSS e depois do voto favorável de todos os presentes, proceder, com base num acordo, à liquidação da empresa num prazo de quatro meses.

79.
    Ao ter renunciado à efectuação de uma audiência, a Comissão não quis tomar posição sobre estas últimas informações do Governo espanhol, que figuravam na réplica deste último. Daqui deduzo que a Comissão não as contesta.

80.
    Assim, resulta das considerações precedentes que, depois da Decisão de 1998, as autoridades espanholas competentes adoptaram medidas que visavam, concretamente, liquidar a Indosa.

81.
    Ora, como a própria Comissão salienta, o Tribunal de Justiça decidiu no seu acórdão de 15 de Janeiro de 1986, Comissão/Bélgica (21), «[o] facto de, por razões que se prendem com a situação financeira da empresa, as autoridades belgas não poderem recuperar o montante pago não constitui uma impossibilidade de execução, desde logo porque o objectivo da Comissão era a supressão do auxílio, o que [...] era susceptível de ser alcançado pela liquidação da sociedade (22), que as autoridades belgas podiam provocar, na sua qualidade de accionistas ou de credores».

82.
    Dito de modo diferente, se não houver outra solução para recuperar o auxílio, a recuperação da empresa é a medida a tomar para conseguir o objectivo prosseguido pela Comissão, que é a supressão do auxílio.

83.
    No caso em apreço, não há indícios que a TSS, para recuperar os auxílios, poderia fazer mais do que solicitar a liquidação da Indosa. Tendo solicitado essa liquidação, parece-me que as medidas necessárias destinadas à recuperação dos auxílios concedidos à Indosa e referidas pela Decisão de 1998 foram tomadas. A acção por incumprimento não é assim, em minha opinião, fundamentada quanto à execução do artigo 2.° da Decisão de 1998.

84.
    No que diz respeito à questão de saber se o Reino de Espanha executou correctamente o artigo 3.° da Decisão de 1998, que o obrigava a informar a Comissão, no prazo de dois meses a contar da data da notificação da decisão, das medidas adoptadas em sua aplicação, há que referir que o Governo espanhol avisou a Comissão, por ofício de 21 de Janeiro de 1999, da diligência que tinha feito a TSS em 28 de Dezembro de 1998. Uma referência a essa diligência, apoiada por documentos comprovativos, figura, com efeito, numa carta da TSS de 29 de Dezembro de 1998, anexa ao referido ofício de 21 de Janeiro de 1999.

85.
    Ora, este ofício foi enviado mais de dois meses depois da notificação da Decisão de 1998, que ocorreu em 29 de Outubro de 1998 (23).

86.
    Assim, sou de opinião que, quanto aos auxílios concedidos à Indosa, o Reino de Espanha não executou correctamente o artigo 3.° da Decisão de 1998.

B - Os auxílios concedidos à Cunosa

87.
    A Comissão recorda que a Cunosa foi declarada em falência em Abril de 1994, a pedido dos seus empregados, e não dos credores públicos, tendo começado o processo de liquidação em Março de 1998. Em sua opinião, as autoridades espanholas, no âmbito desse processo, não adoptaram as medidas que se impunham para recuperar os auxílios, incluindo os juros devidos em conformidade com o artigo 2.°, n.° 2, da Decisão de 1998.

88.
    O Governo espanhol limita-se a responder que, quanto às dívidas à segurança social, o recurso do despacho do Juzgado de lo Social n.° 1 de Santander, de 7 de Fevereiro de 1996, que declara a insolvabilidade da empresa, está actualmente pendente no Tribunal Superior de Justicia da Cantábria.

89.
    Ora, sem contestar que não foi adoptada qualquer medida posteriormente à Decisão de 1998, o Governo espanhol não explica mesmo em que medida o mencionado recurso, com toda a probabilidade interposto antes da Decisão de 1998, faz parte da execução dessa decisão.

90.
    Do mesmo modo, quanto às dívidas à Fazenda Pública, o Governo espanhol não explica em que condições a medida adoptada em 23 de Junho de 1999 - muito tardia em relação ao prazo fixado pelo artigo 3.° da Decisão de 1998 - pela Oficina Nacional de Recaudación (serviços de cobrança nacionais) e que consistiu na notificação da audiência e na comunicação do dossier à sociedade Industrias Domésticas Inoxidables del Sur SAL, devido à existência de indícios de sucessão na actividade da Cunosa, faz concretamente parte da recuperação dos auxílios declarados incompatíveis com o mercado comum.

91.
    Assim, sou de opinião que é justificadamente que a Comissão considera que as autoridades espanholas não adoptaram qualquer medida para recuperar os auxílios concedidos à Cunosa e declarados incompatíveis com o mercado comum pela Decisão de 1998.

C - Os auxílios concedidos à GURSA

92.
    Segundo a Comissão, os credores públicos da GURSA não apresentaram qualquer pedido de declaração de falência dessa sociedade, alegando a «ineficácia provável desse processo».

93.
    O Governo espanhol assinala, quanto às dívidas à segurança social que, depois da adopção da Decisão de 1998, os tribunais deferiram a oposição de terceiros apresentada contra a TSS pelos empregados da GURSA fundamentando-se no carácter privilegiado do seu crédito. Todavia, em sua opinião, a diligência da acção da TSS permitiu penhorar os únicos bens de que dispunha a sociedade e, pela execução da penhora, liquidar o único activo de uma sociedade que cessou a actividade e já não dispunha de bens desde 1994. Quanto às dívidas à Fazenda Pública, o Governo espanhol limita-se a referir que os serviços de cobrança nacionais adoptaram, em 23 de Junho de 1999, uma medida similar àquela que tinha sido adoptada em relação à Cunosa.

94.
    Ora, foi justificadamente que a Comissão considerou que essas medidas não são suficientes para executar correctamente a Decisão de 1998.

95.
    Com efeito, embora o activos de uma empresa não permitam reembolsar os auxílios declarados incompatíveis com o mercado comum, o que o Governo espanhol não contesta que é a situação no caso em apreço, a supressão desses auxílios, como o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão de 15 de Janeiro de 1986, Comissão/Bélgica, já referido, passa pela liquidação da empresa. Com efeito, esta medida é a única que permite obter a supressão integral dos auxílios em questão.

96.
    Por outro lado, se, como sublinha o Governo espanhol, a GURSA já não tem actividades nem bens desde há anos, não vejo por que razão se opõe ainda à sua liquidação a não ser a perspectiva de retomada de actividade, que poderia ser facilitada pelo não reembolso dos auxílios.

97.
    O Governo espanhol alega ainda que a liquidação total do património de um falido e o pagamento dos seus credores devem ser efectuados em conformidade com as normas nacionais em matéria de falência. A este respeito, precisa que os credores públicos, que não atingiram a maioria exigida, não podem obter a liquidação da empresa contra a vontade dos outros credores.

98.
    Ora, há que referir que, no caso em apreço, o incumprimento não reside no facto de as autoridades espanholas competentes terem omitido obter a liquidação contra a vontade dos outros credores mas o facto de não terem adoptado, contrariamente ao que tinham feito no caso da Indosa, qualquer medida susceptível de conduzir à liquidação da GURSA. O argumento do Governo espanhol não me parece, portanto, pertinente para refutar a afirmação segundo a qual o Reino de Espanha não executou correctamente a Decisão de 1998 quanto aos auxílios concedidos à GURSA.

D - Os auxílios concedidos à MIGSA

99.
    A Comissão recorda que a MIGSA foi declarada em falência em 27 de Maio de 1999 a pedido dos seus empregados, e não a pedido da TSS ou do fisco. Em sua opinião, nem a TSS nem o fisco adoptaram medidas com o objectivo de obter a liquidação da MIGSA ou a celebração de um acordo com os credores.

100.
    O Governo espanhol responde, quanto às dívidas à segurança social, que a atitude hostil e os encargos elevados que incidem sobre os bens deitaram por terra os esforços de venda. Sustenta, no entanto, que se procederá à penhora, pela TSS, do único bem existente, que, aliás, quase não tem valor. Além disso, segundo o Governo espanhol, resulta de uma decisão da TSS de 20 de Janeiro de 2000 que a responsabilidade das dívidas da MIGSA em relação à Indosa foi transferida para um administrador da primeira sociedade. Quanto às dívidas à Fazenda Pública, o Governo espanhol invoca a mesma medida que foi adoptada no caso da Cunosa e da GURSA.

101.
    Ora, há que referir que estas medidas não permitem recuperar os auxílios que foram concedidos à MIGSA, o que não é, aliás, contestado pelo Governo espanhol. Daqui resulta, em minha opinião, como o salienta também a Comissão, que as autoridades espanholas deveriam empreender diligências com vista à liquidação da MIGSA, sendo esta medida também a única que permite a supressão dos auxílios.

102.
    Não tendo as autoridades espanholas empreendido essas diligências, sou de opinião que a Decisão de 1998 não foi correctamente executada.

As despesas

103.
    Resulta das considerações precedentes que a maior parte dos fundamentos apresentados pelo Reino de Espanha não foi acolhida. Assim, tendo a Comissão pedido a condenação do Reino de Espanha nas despesas, proponho, nos termos do artigo 69.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, repartir as despesas entre as partes e condenar o Reino de Espanha a suportar, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas da Comissão e a Comissão a suportar um quarto das suas próprias despesas.

IV - Conclusões

104.
    Tendo em conta todas as considerações precedentes proponho que o Tribunal se digne:

-    declarar que, ao não dar cumprimento,

    -    quanto aos auxílios concedidos pelos Governos basco, cantábrico e andaluz, aos artigos 2.° e 3.° da Decisão 91/1/CEE, de 20 de Dezembro de 1989, relativa aos auxílios concedidos em Espanha pelo Governo central e por vários governos autónomos à Magefesa, produtora de artigos domésticos de aço inoxidável e de pequenos aparelhos eléctricos;

    -    quanto aos auxílios concedidos à Cubertera del Norte SA, à Manufacturas Gur SA e à Manufacturas Inoxidables de Gibraltar SA, aos artigos 2.° e 3.° da Decisão 1999/509/CE, de 14 de Outubro de 1998, relativa aos auxílios concedidos pela Espanha às empresas do grupo Magefesa e seus sucessores;

    -    quanto aos auxílios concedidos à Investigación y Desarrollo Udala SA, ao artigo 3.° da Decisão 1999/509;

    o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CE;

-    julgar improcedente a acção quanto ao restante;

-    condenar o Reino de Espanha a suportar, além das suas próprias despesas, três quartos das despesas da Comissão das Comunidades Europeias;

-    condenar a Comissão das Comunidades Europeias a suportar um quarto das suas próprias despesas.


1: -     Língua original: francês.


2: -     JO 1991, L 5, p. 18.


3: -     JO 1999, L 198, p. 15.


4: -     Ponto I, último parágrafo, dos considerandos.


5: -     Segundo as informações da Comissão, não contestadas pelo Governo espanhol, o montante de 39 milhões de ESP que figurava na Decisão de 1989 foi depois corrigido com base nas informações fornecidas pelas autoridades espanholas.


6: -     C-480/98, Colect., p. I-8717.


7: -     A este respeito, a Comissão apresentou um acordo do Governo basco de 28 de Junho de 1988 e confirmando a sub-rogação quanto às garantias concedidas à Indosa e à Ficodesa.


8: -     V., nomeadamente, acórdãos de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão (C-278/92, C-279/92 e C-280/92, Colect., p. I-4103, n.° 75), e de 4 de Abril de 1995, Comissão/Itália (C-350/93, Colect., p. I-699, n.° 21).


9: -     V. os considerandos da Decisão de 1989, ponto V, alínea a).


10: -     V., nomeadamente, acórdãos de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha (C-5/89, Colect., p. I-3437, n.° 18), e de 20 de Setembro de 2001, Banks (C-390/98, Colect., p. I-6117, n.° 122).


11: -     C-303/88, Colect., p. I-1433.


12: -     O sublinhado é meu.


13: -     Acórdão Itália/Comissão, já referido, n.° 56.


14: -     Acórdão Itália/Comissão, já referido, n.° 60.


15: -     V. ponto I, último parágrafo, dos considerandos.


16: -     V., nomeadamente, acórdãos de 22 de Março de 2001, Comissão/França (C-261/99, Colect., p. I-2537, n.° 24), e de 3 de Julho de 2001, Comissão/Bélgica (C-378/98, Colect., p. I-5107, n.° 31).


17: -     Acórdão Comissão/Bélgica, já referido, n.° 50.


18: -     Acórdão de 29 de Janeiro de 1998, Comissão/Itália (C-280/95, Colect., p. I-259, n.° 14). V. igualmente acórdãos de 2 de Fevereiro de 1989, Comissão/Alemanha (94/87, Colect., p. 175, n.° 10), e de 10 de Junho de 1993, Comissão/Grécia (C-183/91, Colect., p. I-3131, n.° 20).


19: -     O sublinhado é meu.


20: -     V., nomeadamente, acórdãos de 4 de Abril de 1995, Comissão/Itália, já referido, n.° 16; de 27 de Junho de 2000, Comissão/Portugal (C-404/97, Colect., p. I-4897, n.° 39); e Comissão/França, já referido, n.° 23.


21: -     52/84, Colect., p. 89, n.° 14.


22: -     O sublinhado é meu.


23: -     V. acórdão de 12 de Outubro de 2000, Espanha/Comissão, já referido, n.° 9.