Language of document : ECLI:EU:C:2014:39

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

30 de janeiro de 2014 (*)

«Diretiva 2004/83/CE — Normas mínimas relativas às condições de concessão do estatuto de refugiado ou do estatuto conferido pela proteção subsidiária — Pessoa elegível para a proteção subsidiária — Artigo 15.°, alínea c) — Ameaça grave e individual contra a vida ou a integridade física de um civil, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado — Conceito de ‘conflito armado interno’ — Interpretação autónoma relativamente ao direito internacional humanitário — Critérios de apreciação»

No processo C‑285/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Conseil d’État (Bélgica), por decisão de 16 de maio de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de junho de 2012, no processo

Aboubacar Diakité

contra

Commissaire général aux réfugiés et aux apatrides,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: L. Bay Larsen (relator), presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Quarta Secção, M. Safjan, J. Malenovský e A. Prechal, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: V. Tourrès, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 29 de maio de 2013,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação de A. Diakité, por D. Caccamisi, avocate,

¾        em representação do Governo belga, por T. Materne e C. Pochet, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo alemão, por T. Henze, N. Graf Vitzthum e B. Beutler, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo francês, por D. Colas, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo do Reino Unido, por L. Christie e A. Robertson, na qualidade de agentes, assistidos por J. Simor, barrister,

¾        em representação da Comissão Europeia, por M. Condou‑Durande, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 18 de julho de 2013,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 15.°, alínea c), da Diretiva 2004/83/CE do Conselho, de 29 de abril de 2004, que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de proteção internacional, bem como relativas ao respetivo estatuto, e relativas ao conteúdo da proteção concedida (JO L 304, p. 12, e retificação no JO 2005, L 204, p. 24, a seguir «diretiva»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe A. Diakité, de nacionalidade guineense, ao Commissaire général aux réfugiés et aux apatrides (a seguir «Commissaire général»), relativo à decisão deste de não lhe conceder a proteção subsidiária.

 Quadro jurídico

 Direito internacional

3        O artigo 3.°, comum às quatro Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, respetivamente, Convenção (I) para melhorar a Situação dos Feridos e Doentes das Forças Armadas em Campanha; Convenção (II) para melhorar a Situação dos Feridos, Doentes e Náufragos das Forças Armadas no Mar; Convenção (III) relativa ao Tratamento dos Prisioneiros de Guerra; e Convenção (IV) relativa à Proteção dos Civis em Tempo de Guerra (a seguir «quatro Convenções de Genebra»), estipula:

«No caso de conflito armado que não apresente um caráter internacional e que ocorra no território de uma das Altas Partes contratantes, cada uma das Partes no conflito será obrigada a aplicar, pelo menos, as seguintes disposições:

1)      As pessoas que não tomem parte diretamente nas hostilidades, incluindo os membros das forças armadas que tenham deposto as armas e as pessoas que tenham sido postas fora de combate por doença, ferimentos, detenção, ou por qualquer outra causa, serão, em todas as circunstâncias, tratadas com humanidade […]

Para este efeito, são e manter‑se‑ão proibidas, […] relativamente às pessoas acima mencionadas:

a)      As ofensas contra a vida e integridade física […]

[…]

c)      As ofensas à dignidade das pessoas, especialmente os tratamentos humilhantes e degradantes;

[…]»

4        O artigo 1.° do Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, relativo à Proteção das Vítimas dos Conflitos Armados Não Internacionais (Protocolo II), de 8 de junho de 1977, estipula:

«1.      O presente Protocolo, que desenvolve e completa o artigo 3.°, comum às [quatro Convenções de Genebra], sem modificar as suas condições de aplicação atuais, aplica‑se a todos os conflitos armados que não estão cobertos pelo artigo 1.° do Protocolo Adicional às [quatro Convenções de Genebra], relativo à Proteção das Vítimas dos Conflitos Armados Internacionais (Protocolo I), e que se desenrolem em território de uma Alta Parte Contratante, entre as suas forças armadas e forças armadas dissidentes ou grupos armados organizados que, sob a chefia de um comando responsável, exerçam sobre uma parte do seu território um controlo tal que lhes permita levar a cabo operações militares contínuas e organizadas e aplicar o presente Protocolo.

2.      O presente Protocolo não se aplica às situações de tensão e de perturbação internas, tais como motins, atos de violência isolados e esporádicos e outros atos análogos, que não são considerados como conflitos armados.»

 Direito da União

5        Os considerandos 5, 6 e 24 da diretiva têm a seguinte redação:

«(5)      As conclusões de Tampere precisam igualmente que o estatuto de refugiado deverá ser completado por medidas relativas a formas subsidiárias de proteção que proporcionem um estatuto adequado a todas as pessoas que necessitem de tal proteção.

(6)      O principal objetivo da presente diretiva consiste em, por um lado, assegurar que todos os Estados‑Membros apliquem critérios comuns de identificação d[as] pessoas que tenham efetivamente necessidade de proteção internacional e, por outro, assegurar que em todos os Estados‑Membros exista um nível mínimo de benefícios à disposição daquelas pessoas.

[…]

(24)      Importa igualmente adotar normas mínimas relativas à configuração e ao conteúdo do estatuto conferido pela proteção subsidiária. A proteção subsidiária deverá completar e suplementar a proteção dos refugiados consagrada pela Convenção de Genebra [relativa ao Estatuto dos Refugiados, assinada em Genebra, em 28 de julho de 1951, Recueil des traités des Nations unies, vol. 189, p. 150, n.° 2545 (1954)].»

6        Nos termos do artigo 2.°, alínea e), da diretiva, para efeitos da mesma entende‑se por «‘pessoa elegível para proteção subsidiária’, o nacional de um país terceiro ou um apátrida que não possa ser considerado refugiado, mas em relação ao qual se verificou existirem motivos significativos para acreditar que, caso volte para o seu país de origem ou, no caso de um apátrida, para o país em que tinha a sua residência habitual, correria um risco real de sofrer ofensa grave na aceção do artigo 15.°, e ao qual não se apliquem os n.os 1 e 2 do artigo 17.°, e que não possa ou, em virtude dos referidos riscos, não queira pedir a proteção desse país».

7        O artigo 15.° da diretiva, intitulado «Ofensas graves», dispõe:

«São ofensas graves:

[…]

c)      A ameaça grave e individual contra a vida ou a integridade física de um civil, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno.»

 Direito belga

8        O artigo 48/4 da Lei de 15 de dezembro de 1980, relativa à entrada no território, à residência, ao estabelecimento e à expulsão dos estrangeiros (loi du 15 décembre 1980 sur l’accès au territoire, le séjour, l’établissement et l’éloignement des étrangers, a seguir «Lei de 15 de dezembro de 1980»), dispõe:

«§ 1.      É concedido o estatuto de proteção subsidiária ao estrangeiro que não possa ser considerado refugiado e que não possa beneficiar do artigo 9.°‑B, e relativamente ao qual haja motivos sérios para acreditar que, se voltasse para o seu país de origem ou, no caso de um apátrida, para o país onde tinha a sua residência habitual, incorreria num risco real de sofrer as ofensas graves referidas no n.° 2, e que não possa ou, tendo em conta esse risco, não queira beneficiar da proteção desse país […]

§ 2. Consideram‑se ofensas graves:

[…]

c)      as ameaças graves contra a vida ou a integridade física de um civil resultantes de violência indiscriminada em situações de conflito armado interno ou internacional.»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

9        Em 21 de fevereiro de 2008, A. Diakité apresentou um primeiro pedido de asilo na Bélgica, invocando a repressão e os atos de violência por ele sofridos no seu país de origem em virtude da sua participação nos movimentos de protesto contra o poder instituído.

10      O Commissaire général recusou reconhecer a A. Diakité a qualidade de refugiado e conceder‑lhe a proteção subsidiária. Esta dupla decisão foi confirmada pelo Conseil du contentieux des étrangers.

11      Não tendo, entretanto, regressado ao seu país de origem, A. Diakité apresentou um segundo pedido de asilo às autoridades belgas, em 15 de julho de 2010.

12      Em 22 de outubro de 2010, o Commissaire général tomou uma nova decisão de recusa de reconhecimento do estatuto de refugiado e de concessão da proteção subsidiária. A recusa de concessão da proteção subsidiária fundamentava‑se na constatação de que não existia, na Guiné, nenhuma situação de violência indiscriminada ou de conflito armado na aceção do artigo 48/4, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980.

13      Foi interposto recurso desta dupla decisão para o Conseil du contentieux des étrangers que, por acórdão de 6 de maio de 2011, confirmou a dupla recusa do Commissaire général.

14      No seu recurso de cassação para o Conseil d’État, A. Diakité critica o acórdão do Conseil du contentieux des étrangers na medida em que se baseia na definição de conflito armado preconizada pelo Tribunal Penal Internacional para a ex‑Jugoslávia para constatar que a condição da existência de um conflito armado, exigida pelo artigo 48/4, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980, não está preenchida.

15      Neste contexto, o Conseil d’État considera que, à luz do acórdão de 17 de fevereiro de 2009, Elgafaji (C‑465/07, Colet., p. I‑921), não se pode excluir, como sustenta A. Diakité, que este conceito de «conflito armado», na aceção do artigo 15.°, alínea c), da diretiva, possa ser interpretado de forma autónoma e possuir um significado diferente do que resulta da jurisprudência do Tribunal Penal Internacional para a ex‑Jugoslávia.

16      Nestas condições, o Conseil d’État decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 15.°, alínea c), da [d]iretiva […] ser interpretado no sentido de que esta disposição apenas oferece uma proteção numa situação de ‘conflito armado interno’, conforme interpretada pelo direito internacional humanitário, em particular com referência ao artigo 3.° comum às quatro Convenções de Genebra […]?

Caso o conceito de ‘conflito armado interno’ referido no artigo 15.°, alínea c), da [d]iretiva […] deva ser interpretado de forma autónoma em relação ao artigo 3.° comum às quatro Convenções de Genebra […], quais são, nesse caso, os critérios para a apreciação da existência de tal ‘conflito armado interno’?»

 Quanto à questão prejudicial

17      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 15.°, alínea c), da diretiva deve ser interpretado no sentido de que a existência de um conflito armado interno deve ser apreciado com base em critérios estabelecidos pelo direito internacional humanitário e, se não for esse o caso, que critérios devem ser empregues para efeitos da apreciação da existência de tal conflito para determinar se um nacional de um país terceiro ou um apátrida pode beneficiar da proteção subsidiária.

18      A este respeito, importa recordar que os três tipos de «ofensas graves» definidas no artigo 15.° da diretiva constituem as condições a preencher para que se possa considerar que uma pessoa é suscetível de beneficiar da proteção subsidiária, quando, em conformidade com o artigo 2.°, alínea e), desta diretiva, existam motivos significativos para acreditar que, caso volte para o país em causa, o requerente correria um risco real de sofrer tais ofensas (acórdão Elgafaji, já referido, n.° 31).

19      A ofensa definida no artigo 15.°, alínea c), da diretiva consiste na ameaça grave e individual contra a vida ou a integridade física de um civil, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno.

20      A este respeito, importa constatar que o legislador da União Europeia empregou a expressão «conflito armado internacional ou interno», que difere dos conceitos que estão na própria base do direito internacional humanitário, sendo que este distingue entre, por um lado, os «conflitos armados internacionais» e, por outro, os «conflitos armados que não apresentem um caráter internacional».

21      Nestas circunstâncias, deve constatar‑se que a vontade do legislador da União foi a de conceder proteção subsidiária às pessoas em causa não apenas em caso de conflitos armados internacionais e de conflitos armados que não apresentem um caráter internacional, como definidos pelo direito internacional humanitário, mas também em caso de conflitos armados internos, na condição de estes conflitos serem caraterizados pelo recurso a uma violência indiscriminada. Quanto a esta questão, não é necessário que estejam preenchidos todos os critérios a que se referem o artigo 3.°, comum às quatro Convenções de Genebra, e o artigo 1.°, n.° 1, do Protocolo Adicional II, de 8 de junho de 1977, que desenvolve e completa este artigo.

22      Por outro lado, cumpre constatar que o direito internacional humanitário rege a condução dos conflitos armados internacionais e dos conflitos que não apresentem um caráter internacional, o que implica que a existência de tal conflito constitui a condição de aplicação das regras por ele estabelecidas (acórdão da Secção de Recursos do Tribunal Penal Internacional para a ex‑Jugoslávia, de 2 de outubro de 1995, Procureur c. Dusko Tadic, alias «Dule», processo n.° IT‑94‑1‑AR72, n.° 67).

23      Apesar de o direito internacional humanitário se destinar, designadamente, a proporcionar, na zona de conflito, proteção à população civil, limitando os efeitos da guerra sobre as pessoas e os bens, o mesmo não prevê, ao contrário do artigo 2.°, alínea e), da diretiva, lido em conjugação com o artigo 15.°, alínea c), da mesma, a concessão de uma proteção internacional a determinados civis fora da zona de conflito e do território das partes no conflito. As definições do conceito de conflito armado que resultam do direito internacional humanitário não se destinam, portanto, a identificar as situações em que tal proteção é necessária e deve ser concedida pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros.

24      De um modo mais geral, importa sublinhar que, como referiu o advogado‑geral nos n.os 66 e 67 das suas conclusões, o direito internacional humanitário e o regime de proteção subsidiária previsto na diretiva prosseguem finalidades diferentes e instituem mecanismos de proteção claramente distintos.

25      Por outro lado, conforme referido pelo advogado‑geral no n.° 70 das suas conclusões, certas violações do direito internacional humanitário dão lugar a responsabilidade penal individual. Por isso, o direito internacional humanitário mantém ligações muito estreitas com o direito penal internacional, apesar de tal relação ser alheia ao mecanismo da proteção subsidiária previsto pela diretiva.

26      Assim, sob pena de ignorar os domínios caraterísticos de cada um dos dois regimes definidos, respetivamente, pelo direito internacional humanitário e pelo artigo 2.°, alínea e), da diretiva, lido em conjugação com o artigo 15.°, alínea c), da mesma, a possibilidade de beneficiar deste último regime não pode ser subordinada à constatação de as condições de aplicação do primeiro regime estarem reunidas.

27      Por conseguinte, na falta de definição, na diretiva, do conceito de conflito armado interno, o significado e o alcance desta expressão devem ser determinados, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, de acordo com o seu sentido habitual na linguagem corrente, tendo em atenção o contexto geral em que é utilizada e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (acórdãos de 22 de dezembro de 2008, Wallentin‑Hermann, C‑549/07, Colet., p. I‑11061, n.° 17, e de 22 de novembro de 2012, Probst, C‑119/12, n.° 20).

28      No seu sentido habitual na linguagem corrente, o conceito de conflito armado interno tem em vista uma situação em que as forças regulares de um Estado se confrontam com um ou mais grupos armados, ou em que dois ou mais grupos armados se confrontam.

29      A este respeito, importa salientar que, enquanto na proposta da Comissão que levou à adoção da Diretiva [COM(2001) 510 final], a definição de ofensas graves que figura no artigo 15.°, alínea c), da diretiva previa que as ameaças contra a vida, a segurança ou a liberdade do requerente podiam ocorrer, quer no âmbito de um conflito armado, quer no âmbito de violações sistemáticas ou generalizadas dos direitos humanos, o legislador da União Europeia decidiu afinal incluir apenas a hipótese de ameaças contra a vida ou a integridade física de um civil resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno.

30      Por outro lado, importa recordar que a existência de um conflito armado interno apenas poderá levar à concessão da proteção subsidiária na medida em que se considere, excecionalmente, que os confrontos entre as forças regulares de um Estado e um ou mais grupos armados, ou entre dois ou mais grupos armados, estão na origem de ameaças graves e individuais contra a vida e a integridade física do requerente da proteção subsidiária, na aceção do artigo 15.°, alínea c), da diretiva, por o grau de violência indiscriminada que os carateriza atingir um nível tão elevado que existem motivos sérios para acreditar que um civil expulso para o país em causa ou, eventualmente, para a região em causa, poderia correr, pelo simples facto de se encontrar no território destes, um risco real de sofrer tais ameaças (v., neste sentido, acórdão Elgafaji, já referido, n.° 43).

31      A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que quanto mais o requerente puder eventualmente demonstrar que é especificamente afetado em razão de elementos próprios da sua situação pessoal, menos elevado será o grau de violência indiscriminada requerido para poder beneficiar da proteção subsidiária (acórdão Elgafaji, já referido, n.° 39).

32      Neste contexto, não é necessário, na análise de um pedido de proteção subsidiária, proceder a uma apreciação específica da intensidade destes confrontos para determinar, independentemente da avaliação do grau de violência que deles resulta, se a condição da existência de um conflito armado está ou não preenchida.

33      Por outro lado, resulta dos considerandos 5, 6 e 24 da diretiva que os critérios mínimos de concessão da proteção subsidiária devem permitir completar a proteção dos refugiados consagrada pela Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, assinada em Genebra, em 28 de julho de 1951, identificando as pessoas que tenham efetivamente necessidade de proteção internacional e concedendo‑lhes um estatuto adequado.

34      Por conseguinte, como referiu o advogado‑geral no n.° 92 das suas conclusões, a constatação da existência de um conflito armado não deve ser subordinada a um determinado nível de organização das forças armadas em causa ou a uma determinada duração do conflito, uma vez que a existência destes basta para que os confrontos em que as forças armadas estejam envolvidas causem o grau de violência mencionado no n.° 30 do presente acórdão, originando, assim, uma necessidade efetiva de proteção internacional por parte do requerente, que corre um risco real de sofrer ameaças graves e individuais contra a sua vida ou a sua integridade física.

35      Daqui resulta que há que responder à questão submetida que o artigo 15.°, alínea c), da diretiva deve ser interpretado no sentido de que se deve reconhecer que existe um conflito armado interno, para efeitos da aplicação desta disposição, quando as forças regulares de um Estado se confrontam com um ou mais grupos armados, ou quando dois ou mais grupos armados se confrontam, sem que seja necessário que este conflito possa ser qualificado de conflito armado que não apresenta caráter internacional, na aceção do direito internacional humanitário, e sem que a intensidade dos confrontos armados, o nível de organização das forças armadas envolvidas ou a duração do conflito sejam objeto de uma apreciação distinta da apreciação relativa ao grau de violência que existe no território em causa.

 Quanto às despesas

36      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

O artigo 15.°, alínea c), da Diretiva 2004/83/CE do Conselho, de 29 de abril de 2004, que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de proteção internacional, bem como relativas ao respetivo estatuto, e relativas ao conteúdo da proteção concedida, deve ser interpretado no sentido de que se deve reconhecer que existe um conflito armado interno, para efeitos da aplicação desta disposição, quando as forças regulares de um Estado se confrontam com um ou mais grupos armados, ou quando dois ou mais grupos armados se confrontam, sem que seja necessário que este conflito possa ser qualificado de conflito armado que não apresenta caráter internacional, na aceção do direito internacional humanitário, e sem que a intensidade dos confrontos armados, o nível de organização das forças armadas envolvidas ou a duração do conflito sejam objeto de uma apreciação distinta da apreciação relativa ao grau de violência que existe no território em causa.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.