Language of document : ECLI:EU:C:2008:59

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

31 de Janeiro de 2008 (*)

«Livre prestação de serviços – Comunicações electrónicas – Actividades de radiodifusão televisiva – Novo quadro regulamentar comum – Atribuição de radiofrequências de emissão»

No processo C‑380/05,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Consiglio di Stato (Itália), por decisão de 19 de Abril de 2005, entrado no Tribunal de Justiça em 18 de Outubro de 2005, no processo

Centro Europa 7 Srl

contra

Ministero delle Comunicazioni e Autorità per le garanzie nelle comunicazioni,

Direzione generale per le concessioni e le autorizzazioni Ministero delle Comunicazioni,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: K. Lenaerts (relator), presidente de secção, G. Arestis, R. Silva de Lapuerta, J. Malenovský e T. von Danwitz, juízes,

advogado‑geral: M. Poiares Maduro,

secretário: B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de Novembro de 2006,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Centro Europa 7 Srl, por A. Pace, R. Mastroianni e O. Grandinetti, avvocati,

–        em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por P. Gentili, avvocato dello Stato,

–        em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por F. Benyon, E. Traversa, M. Shotter e F. Amato, na qualidade de agentes, assistidos por L. G. Radicati di Brozolo, avvocato,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 12 de Setembro de 2007,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação, no domínio da radiodifusão televisiva por via hertziana a nível nacional, das disposições do Tratado CE sobre a livre prestação de serviços e a concorrência, da Directiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva‑quadro) (JO L 108, p. 33, a seguir «directiva‑quadro»), da Directiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva autorização) (JO L 18, p. 21, a seguir «directiva autorização»), da Directiva 2002/77/CE da Comissão, de 16 de Setembro de 2002, relativa à concorrência nos mercados de redes e serviços de comunicações electrónicas (JO L 249, p. 21) (a seguir «directiva ‘concorrência’»), bem como do artigo 10.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), na medida em que o artigo 6.° UE lhe faz referência.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a sociedade Centro Europa 7 Srl (a seguir «Centro Europa 7») ao Ministero delle Comunicazioni e à Autorità per le garanzie nelle comunicazioni, bem como à Direzione generale per le concessione e le autorizzazioni del Ministero delle Comunicazioni (a seguir, conjuntamente, «recorridos no processo principal»).

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3        O novo quadro regulamentar comum aos serviços de comunicações electrónicas, às redes de comunicações electrónicas e aos recursos e serviços conexos (a seguir «NCRC») é composto pela directiva‑quadro e por quatro directivas específicas, entre as quais a directiva autorização, que são completadas pela directiva «concorrência».

 A directiva‑quadro

4        Nos termos do artigo 1.°, n.° 1, da directiva‑quadro:

«A presente directiva estabelece um quadro harmonizado para a regulamentação dos serviços de comunicações electrónicas, das redes de comunicações electrónicas e dos recursos e serviços conexos. Define as funções das autoridades reguladoras nacionais e fixa um conjunto de procedimentos para assegurar a aplicação harmonizada do quadro regulamentar em toda a Comunidade.»

5        O artigo 1.°, n.° 3, desta directiva enuncia:

«A presente directiva e as directivas específicas não afectam as medidas tomadas a nível comunitário ou nacional, no respeito do direito comunitário, com vista a prosseguir objectivos de interesse geral, em especial relacionados com a regulamentação de conteúdos e a política audiovisual.»

6        O artigo 2.° da directiva‑quadro dispõe:

«Para efeitos da presente directiva, entende‑se por:

a)      ‘Rede de comunicações electrónicas’: os sistemas de transmissão […] que permitem o envio de sinais por cabo, feixes hertzianos, meios ópticos, ou por outros meios electromagnéticos, incluindo as redes de satélites, as redes terrestres fixas […] e móveis, […] as redes utilizadas para a radiodifusão sonora e televisiva e as redes de televisão por cabo, independentemente do tipo de informação transmitida;

[…]

c)      ‘Serviço de comunicações electrónicas’: o serviço oferecido em geral mediante remuneração, que consiste total ou principalmente no envio de sinais através de redes de comunicações electrónicas, incluindo os serviços de telecomunicações e os serviços de transmissão em redes utilizadas para a radiodifusão […]

[…]»

7        O artigo 8.° da directiva‑quadro, intitulado «Objectivos de política geral e princípios de regulação», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros deverão assegurar que, no desempenho das funções de regulação constantes da presente directiva e das directivas específicas, as autoridades reguladoras nacionais tomem todas as medidas razoáveis para realizar os objectivos fixados nos n.os 2, 3 e 4. Tais medidas deverão ser proporcionais a esses objectivos.

[…]

2.      As autoridades reguladoras nacionais devem promover a concorrência na oferta de redes de comunicações electrónicas, de serviços de comunicações electrónicas e de recursos e serviços conexos, nomeadamente:

[…]

b)      Assegurando que a concorrência no sector das comunicações electrónicas não seja distorcida nem entravada;

[…]

d)      Incentivando uma utilização eficiente e assegurando uma gestão eficaz das radiofrequências e dos recursos de numeração.

3.      As autoridades reguladoras nacionais devem contribuir para o desenvolvimento do mercado interno, nomeadamente:

a)      Eliminando os obstáculos ainda existentes à oferta de redes de comunicações electrónicas, de recursos e serviços conexos e de serviços de comunicações electrónicas a nível europeu;

[…]»

8        O artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro prevê que «[o]s Estados‑Membros assegurarão uma gestão eficaz das radiofrequências para serviços de comunicações electrónicas no seu território» e que «a atribuição e consignação dessas radiofrequências pelas autoridades reguladoras nacionais se baseie em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais».

9        O artigo 28.°, n.° 1, da directiva‑quadro precisa que «[o]s Estados‑Membros aprovarão e publicarão as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente directiva o mais tardar em 24 de Julho de 2003» e que «[e]ssas disposições serão aplicáveis a partir de 25 de Julho de 2003».

 A directiva autorização

10      O artigo 1.° da directiva autorização dispõe:

«1.      A presente directiva destina‑se a instaurar um mercado interno dos serviços e redes de comunicações electrónicas através da harmonização e simplificação das regras e condições de autorização, a fim de facilitar a sua oferta em toda a Comunidade.

2.      A presente directiva aplica‑se às autorizações de oferta de serviços e redes de comunicações electrónicas.»

11      O artigo 2.°, n.° 1, da directiva autorização enuncia:

«Para efeitos da presente directiva, aplicam‑se as definições constantes do artigo 2.° da [directiva‑quadro].»

12      Nos termos do artigo 2.°, n.° 2, alínea a), da directiva autorização, entende‑se por «autorização geral» «um quadro regulamentar estabelecido pelos Estados‑Membros que garante os direitos relacionados com a oferta de serviços ou redes de comunicações electrónicas, e que fixa obrigações sectoriais específicas que podem ser aplicadas a todos os géneros ou a géneros específicos de serviços e redes de comunicações electrónicas, em conformidade com a presente directiva».

13      O artigo 3.° da directiva autorização, intitulado «Autorização geral de redes e serviços de comunicações electrónicas», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros garantirão a liberdade de oferecer serviços e redes de comunicações electrónicas, sob reserva das condições fixadas na presente directiva. Para o efeito, os Estados‑Membros não impedirão que uma empresa ofereça serviços ou redes de comunicações electrónicas, excepto pelos motivos constantes do n.° 1 do artigo 46.° do Tratado.

2.      A oferta de serviços de comunicações electrónicas ou a oferta de redes de comunicações electrónicas pode, sem prejuízo das obrigações específicas referidas no n.° 2 do artigo 6.° ou dos direitos de utilização referidos no artigo 5.°, apenas estar sujeita a uma autorização geral. Pode exigir‑se que a empresa em causa apresente uma notificação mas não que obtenha uma decisão expressa ou qualquer outro acto administrativo da autoridade reguladora nacional para poder exercer os direitos decorrentes da autorização. Após a notificação, se exigida, a empresa pode iniciar a sua actividade, sob reserva, se necessário, do disposto nos artigos 5.°, 6.° e 7.° sobre direitos de utilização.

[…]»

14      O artigo 5.° da directiva autorização, intitulado «Direitos de utilização de radiofrequências e números», tem a seguinte redacção:

«1.      Se possível, nomeadamente quando seja mínimo o risco de interferências nocivas, os Estados‑Membros não farão depender a utilização das radiofrequências da concessão de direitos de utilização individuais, mas incluirão as condições de utilização dessas radiofrequências na autorização geral.

2.      Se for necessário conceder direitos individuais de utilização de radiofrequências e números, os Estados‑Membros concederão esses direitos, mediante pedido, a qualquer empresa que ofereça ou utilize serviços ou redes ao abrigo da autorização geral, sob reserva do disposto nos artigos 6.°, 7.° e no n.° 1, alínea c), do artigo 11.° da presente directiva e de quaisquer outras regras que garantam a utilização eficiente desses recursos, em conformidade com a [directiva‑quadro].

Sem prejuízo dos critérios e procedimentos específicos, aprovados pelos Estados‑Membros para a concessão de direitos de utilização de radiofrequências aos prestadores de serviços de difusão de conteúdos de rádio e televisão, para alcançar objectivos de interesse geral, em conformidade com o direito comunitário, esses direitos de utilização serão concedidos através de procedimentos abertos, transparentes e não discriminatórios […]

[…]

5.      Os Estados‑Membros não limitarão o número de direitos de utilização a conceder, excepto quando tal seja necessário para garantir a utilização eficiente das radiofrequências, nos termos do disposto no artigo 7.°»

15      O artigo 7.° da directiva autorização, intitulado «Procedimento aplicável à limitação do número de direitos de utilização de radiofrequências a conceder», prevê:

«1.      Caso um Estado‑Membro considere a hipótese de limitar o número de direitos de utilização de radiofrequências a conceder, deve designadamente:

a)      Ter em devida conta a necessidade de maximizar os benefícios para os utilizadores e facilitar o desenvolvimento da concorrência;

[…]

c)      Publicar qualquer decisão de limitar a concessão de direitos de utilização, apresentando as razões dessa decisão;

d)      Após haver determinado o procedimento, lançar um convite à apresentação de candidaturas a direitos de utilização; e

e)      Rever a limitação com uma periodicidade razoável ou na sequência de um pedido razoável das empresas afectadas.

[…]

3.      Se a concessão de direitos de utilização de radiofrequências tiver de ser limitada, os Estados‑Membros conferirão esses direitos com base em critérios de selecção objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais. Esses critérios de selecção devem ter na devida conta a consecução dos objectivos constantes do artigo 8.° da [directiva‑quadro].

[…]»

16      O artigo 17.° da directiva autorização, intitulado «Autorizações existentes», tem a seguinte redacção:

«1.      O mais tardar na data de início de aplicação referida no n.° 1, segundo parágrafo, do artigo 18.°, os Estados‑Membros tornarão conformes com as disposições da presente directiva as autorizações já existentes à data da sua entrada em vigor.

[…]»

17      O artigo 18.°, n.° 1, da directiva autorização precisa que «[o]s Estados‑Membros aprovarão e porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para darem cumprimento à presente directiva, o mais tardar em 24 de Julho de 2003» e que «aplicarão estas disposições a partir de 25 de Julho de 2003».

 A directiva «concorrência»

18      Resulta do seu artigo 1.°, pontos 1 e 3, que a directiva «concorrência» se aplica às redes e aos serviços de comunicações electrónicas, tal como definidos no artigo 2.°, alíneas a) e c), da directiva‑quadro.

19      O artigo 2.° da directiva «concorrência», intitulado «Direitos especiais e exclusivos relativos às redes de comunicações electrónicas e aos serviços de comunicações electrónicas», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros não podem conceder ou manter em vigor direitos especiais ou exclusivos para o estabelecimento e/ou oferta de redes de comunicações electrónicas nem para a prestação de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis.

2.      Os Estados‑Membros tomarão todas as medidas necessárias para garantir que qualquer empresa possa fornecer os serviços de comunicações electrónicas ou estabelecer, alargar ou oferecer redes de comunicações electrónicas.

[…]

4.      Os Estados‑Membros garantirão que uma autorização geral concedida a uma empresa para prestar serviços de comunicações electrónicas ou para estabelecer e/ou oferecer redes de comunicações electrónicas, bem como as respectivas condições, serão baseadas em critérios objectivos, não discriminatórios, proporcionais e transparentes.

[…]»

20      O artigo 4.° da directiva «concorrência», intitulado «Direitos de utilização das frequências», precisa:

«Sem prejuízo dos critérios e procedimentos específicos aprovados pelos Estados‑Membros para a concessão de direitos de utilização de radiofrequências aos prestadores de serviços de difusão de conteúdos de rádio e televisão, para alcançar objectivos de interesse geral, em conformidade com o direito comunitário:

1)      Os Estados‑Membros não podem conceder direitos especiais ou exclusivos para a utilização de radiofrequências para a prestação de serviços de comunicações electrónicas.

2)      A atribuição de radiofrequências para serviços de comunicações electrónicas deve basear‑se em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.»

21      Nos termos do artigo 9.° da directiva «concorrência»:

«Os Estados‑Membros fornecerão à Comissão[,] o mais tardar em 24 de Julho de 2003[,] [as] informações [que permitam a esta] confirmar o cumprimento das disposições da presente directiva.»

 Legislação nacional

 A Lei n.° 249, de 31 de Julho de 1997

22      A Lei n.° 249, de 31 de Julho de 1997 (suplemento ordinário do GURI n.° 177, de 31 de Julho de 1997, a seguir «Lei n.° 249/1997»), que entrou em vigor em 1 de Agosto de 1998, instituiu a Autorità per le garanzie nelle comunicazioni (Autoridade reguladora das comunicações, a seguir «Autorità»).

23      O artigo 2.°, n.° 6, da Lei n.° 249/1997 impunha limites à concentração no mercado da radiodifusão televisiva, proibindo que um mesmo operador fosse titular de concessões que lhe permitissem emitir, à escala nacional, em mais de 20% dos canais de televisão que operassem nas radiofrequências hertzianas.

24      O artigo 3.° da Lei n.° 249/1997 previa, no seu n.° 1, a possibilidade de os operadores autorizados a emitir ao abrigo do quadro jurídico anterior continuarem a emitir a nível nacional e local até à atribuição de novas concessões ou ao indeferimento dos pedidos de novas concessões, mas, em todo o caso, nunca após 30 de Abril de 1998.

25      O artigo 3, n.° 2, da Lei n.° 249/1997 previa a adopção pela Autorità de um plano nacional de atribuição das radiofrequências para a radiodifusão televisiva (a seguir «plano nacional de atribuição das radiofrequências») o mais tardar em 31 de Janeiro de 1998 e, com base no referido plano, a atribuição de novas concessões o mais tardar em 30 de Abril de 1998.

26      Decorre das indicações constantes da decisão de reenvio e confirmadas pelas observações do Governo italiano e da Comissão das Comunidades Europeias que o plano nacional de atribuição das radiofrequências foi adoptado em 30 de Outubro de 1998 mediante a Deliberação n.° 68/98 da Autorità e que esta última adoptou, através da Deliberação n.° 78/98, de 1 de Dezembro de 1998, o regulamento relativo aos requisitos e às modalidades de atribuição das concessões para a radiodifusão televisiva nas radiofrequências hertzianas analógicas.

27      No seu artigo 3.°, n.° 6, a Lei n.° 249/1997 previa um regime transitório para os canais de televisão nacionais existentes e que excedessem os limites de concentração impostos pelo artigo 2.°, n.° 6, desta lei (a seguir «canais excedentários»), que permitia aos referidos canais continuar a emitir nas radiofrequências hertzianas, a título transitório após 30 de Abril de 1998, no respeito das obrigações impostas aos canais concessionários, na condição de as emissões serem difundidas simultaneamente por satélite ou por cabo.

28      Em aplicação do artigo 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997, foi confiada à Autorità a incumbência de fixar o prazo dentro do qual, tendo em conta o aumento efectivo e importante dos utentes dos programas por cabo ou por satélite, os canais excedentários deviam difundir os respectivos programas unicamente por satélite ou par cabo, abandonando as radiofrequências hertzianas.

29      Resulta das indicações constantes da decisão de reenvio e confirmadas pelas observações do Governo italiano e da Comissão que, por acórdão n.° 466 da Corte costituzionale, de 20 de Dezembro de 2002 (GURI de 27 de Dezembro de 2002), este prazo foi fixado em 31 de Dezembro de 2003.

 A Lei n.° 66, de 20 de Março de 2001

30      Decorre dos elementos que constam dos autos que, em aplicação do Decreto‑Lei n.° 5, de 23 de Janeiro de 2001 (GURI n.° 19, de 24 de Janeiro de 2001, p. 5), convertido em lei e alterado pela Lei n.° 66, de 20 de Março de 2001 (GURI n.° 70, de 24 de Março de 2001, p. 3), os operadores que exerciam legalmente a actividade de radiodifusão televisiva nas radiofrequências hertzianas foram autorizados a continuar a emitir até à implementação do plano nacional de atribuição das radiofrequências para a televisão digital.

 As Leis n.os 43, de 24 de Fevereiro de 2004, e 112, de 3 de Maio de 2004

31      O artigo 1.° do Decreto‑Lei n.° 352, de 24 de Dezembro de 2003 (GURI n.° 300, de 29 de Dezembro de 2003, p. 4, a seguir «Decreto‑Lei n.° 352/2003»), convertido em lei e alterado pela Lei n.° 43, de 24 de Fevereiro de 2004 (GURI n.° 47, de 26 de Fevereiro de 2004, p. 4), autorizou os canais excedentários a prosseguir as respectivas emissões nas redes de radiodifusão televisiva em modos analógico e digital até à conclusão de um estudo sobre o desenvolvimento das cadeias de televisão digitais.

32      A Lei n.° 112, de 3 de Maio de 2004 (suplemento ordinário do GURI n.° 82, de 5 de Maio de 2004, a seguir «Lei n.° 112/2004»), precisou as várias etapas de lançamento da fase de emissão em modo digital nas radiofrequências hertzianas.

33      O artigo 23.° da Lei n.° 112/2004 dispõe:

«1.      Até à realização do plano nacional de atribuição das radiofrequências de televisão em técnica digital, os operadores que exerçam a qualquer título actividades de difusão radiotelevisiva a nível nacional ou local e que preencham as condições impostas para obterem a autorização de emissões experimentais em técnica digital hertziana em aplicação […] do Decreto‑Lei n.° 5, [de 23 de Janeiro de 2001], convertido, após alteração, na Lei n.° 66, [de 20 de Março de 2001], podem efectuar, inclusive através de redifusão simultânea de programas já difundidos em técnica analógica, as experiências em questão, até à conversão completa das redes, bem como requerer, a partir da data de entrada em vigor da presente lei, […] as licenças e autorizações necessárias para proceder a emissões em técnica digital hertziana.

2.      As emissões experimentais em técnica digital podem ser realizadas através de instalações que emitam legalmente em técnica analógica à data da entrada em vigor da presente lei.

3.      A fim de permitir a constituição das redes digitais, são autorizadas as transferências de instalações ou de ramos de empresas entre operadores que exerçam legalmente uma actividade televisiva a nível nacional ou local, na condição de as aquisições se destinarem à difusão em técnica digital.

[…]

5.      A partir da data da entrada em vigor da presente lei, a licença de operador de rede televisiva é concedida, a pedido do interessado, a quem exercer legalmente a actividade de difusão televisiva em virtude de concessão ou da autorização geral referida no n.° 1, desde que demonstre ter alcançado uma cobertura não inferior a 50% da população ou de uma determinada área local.

[…]

9.      A fim de facilitar a conversão do sistema da técnica analógica para a técnica digital, a difusão dos programas radiotelevisivos será prosseguida mediante a exploração das instalações legalmente em actividade à data da entrada em vigor da presente lei […]»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

34      O litígio no processo principal prende‑se com a reparação do prejuízo que a Centro Europa 7 considera ter sofrido devido ao facto de não lhe terem sido atribuídas, pelos recorridos no processo principal, radiofrequências de emissão para a radiodifusão televisiva por via hertziana em modo analógico.

35      Em 28 de Julho de 1999, foi atribuída pelas autoridades italianas competentes à Centro Europa 7, em aplicação da Lei n.° 249/1997, uma concessão para a radiodifusão televisiva por via hertziana a nível nacional que a autorizava a instalar e a explorar uma rede de radiodifusão televisiva em técnica analógica. A concessão remetia, para a atribuição das radiofrequências, para o plano nacional de atribuição das radiofrequências, o qual foi adoptado em 30 de Outubro de 1998. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o referido plano não foi, todavia, implementado, de modo que, apesar de dispor de uma concessão, a Centro Europa 7 nunca esteve em condições de poder emitir, por não lhe terem sido atribuídas radiofrequências.

36      A Centro Europa 7 submeteu ao Tribunale amministrativo regionale del Lazio um pedido que visava, nomeadamente, o reconhecimento do seu direito de obter a atribuição de radiofrequências e a reparação do prejuízo sofrido.

37      O referido tribunal julgou este pedido improcedente por acórdão de 16 de Setembro de 2004.

38      Resulta da decisão de reenvio que, no quadro do recurso que a Centro Europa 7 interpôs deste acórdão para o Consiglio di Stato, os recorridos no processo principal contrapõem, nomeadamente, com a Lei n.° 112/2004.

39      Esclarecendo, na referida decisão, que limita o seu exame ao pedido de reparação da Centro Europa 7 e que não tenciona nesta fase pronunciar‑se sobre o pedido de atribuição de radiofrequências, o Consiglio di Stato observa que a falta de atribuição de radiofrequências à Centro Europa 7 teve como causa factores essencialmente legislativos.

40      Recorda que o artigo 3.°, n.° 2, da Lei n.° 249/1997 permitia aos «ocupantes de facto» de radiofrequências, habilitados a exercer a respectiva actividade ao abrigo do regime anterior, manterem as suas emissões até à atribuição de novas concessões ou até ao indeferimento dos pedidos de novas concessões e, em todo o caso, o mais tardar até 30 de Abril de 1998.

41      Recorda ainda que o artigo 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997 autorizava a prossecução das referidas emissões, remetendo para a Autorità a fixação de uma data‑limite, estabelecendo como única condição que as emissões fossem difundidas simultaneamente em radiofrequências hertzianas e por satélite ou por cabo. Na falta de fixação de uma data pela Autorità, a Corte costituzionale fixou em 31 de Dezembro de 2003 a data a partir da qual os programas difundidos pelas cadeias excedentárias deveriam ter passado a ser difundidos unicamente por satélite ou por cabo, de modo que, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, as radiofrequências a atribuir à Centro Europa 7 deveriam ter sido libertadas.

42      No entanto, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, este prazo não foi respeitado na sequência da intervenção do legislador nacional, uma vez que o artigo 1.° do Decreto‑Lei n.° 352/2003, convertido na Lei n.° 43, de 24 de Fevereiro de 2004, prorrogou o exercício da actividade das cadeias excedentárias até à conclusão de um inquérito da Autorità sobre o desenvolvimento das cadeias de televisão digitais, e que, posteriormente, foi adoptada a Lei n.° 112/2004, especialmente o seu artigo 23.°, n.° 5.

43      Ainda segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a Lei n.° 112/2004, através de um mecanismo de autorização geral, prorrogou a possibilidade de os canais excedentários continuarem a emitir nas radiofrequências hertzianas até à implementação do plano nacional de atribuição das radiofrequências para a televisão digital, de modo que estes canais não foram obrigados a libertar as radiofrequências destinadas a ser atribuídas às pessoas titulares de concessões.

44      Esta lei teve, pois, por efeito, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, não libertar as radiofrequências destinadas a ser atribuídas às pessoas titulares de concessões em modo analógico e impedir os outros operadores que de facto não emitem nas radiofrequências hertzianas de participar nas experiências em televisão digital.

45      Dado que a Centro Europa 7 contesta a conformidade do Decreto‑Lei n.° 352/2003 e da Lei n.° 112/2004 com o direito comunitário, o Consiglio di Stato interroga‑se sobre a conformidade da legislação italiana, a partir da Lei n.° 249/1997, com as disposições do Tratado sobre a livre prestação de serviços e a concorrência, com os artigos 8.° e 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro e com os artigos 5.°, 7.° e 17.° da directiva autorização, bem como com o princípio do pluralismo das fontes de informação, inscrito no artigo 10.° da CEDH, enquanto princípio geral de direito comunitário.

46      Nestas condições, o Consiglio di Stato decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 10.° da [CEDH], como referido no artigo 6.° [UE], garante o pluralismo informativo externo no sector de televisão, obrigando com isto os Estados‑Membros a garantirem um pluralismo efectivo e uma concorrência efectiva no sector, baseada num sistema anticoncentração que, relativamente ao desenvolvimento tecnológico, garanta o acesso às redes e uma pluralidade de operadores, não se podendo considerar lícitas situações de duopólio que existam no mercado?

2)      As disposições do Tratado […] que garantem a liberdade de prestação de serviços e a concorrência, na interpretação dada pela Comissão na comunicação interpretativa, de 29 de Abril de 2000, sobre as concessões no direito comunitário, exigem princípios de concessão de licenças que permitam assegurar um tratamento não discriminatório, igualitário, e ainda a transparência, a proporcionalidade e o respeito dos direitos dos indivíduos? As disposições e os princípios do Tratado opõem‑se às disposições de direito italiano previstas nos artigos 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997 e 1.° do Decreto‑Lei [n.° 352/2003], na medida em que permitiram que entidades operadoras de [canais] televisiv[o]s que excedem os limites anticoncentração ([canais] excedentári[o]s) continuem a exercer as respectivas actividades, excluindo operadores, como a sociedade recorrente, que, não obstante a concessão lhes ter sido adjudicada na sequência de concurso, não puderam desenvolver a actividade adjudicada por falta de atribuição de frequências (devida à insuficiência ou escassez das frequências causada pela referida continuação do exercício da actividade por parte dos titulares d[o]s denominad[o]s [canais] excedentári[o]s)?

3)      A partir de 25 de Julho de 2003, o artigo 17.° da [...] directiva autorização impõe o efeito directo desta directiva no ordenamento jurídico interno e obriga o Estado‑Membro que tenha concedido licenças para a actividade de difusão televisiva (que inclui o direito de instalar redes ou de fornecer serviços de comunicações electrónicas e o direito à utilização das frequências) a proceder ao seu alinhamento com o regime comunitário, implicando tal obrigação a necessidade de atribuir efectivamente as frequências necessárias para o desenvolvimento da actividade?

4)      O artigo 9.° da [...] directiva‑quadro e o artigo 5.° da directiva autorização, que prevê a adopção de procedimentos públicos, transparentes e não discriminatórios (artigo 5.°) que se desenrolem com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais (artigo 9.°), opõem‑se ao regime de autorização genérica previsto no direito nacional (artigo 23.°, n.° 5, da Lei n.° 112/2004), que, ao admitir a continuação da actividade d[o]s denominad[o]s ‘[canais] excedentári[o]s’ não seleccionad[o]s por meio de concurso, lesa os direitos de que outras empresas gozam por força do direito comunitário (artigo 17.°, n.° 2, da directiva autorização), na medida em que essas empresas, não obstante terem vencido o concurso, se vêem impossibilitadas de operar?

5)      Os artigos 9.° da directiva‑quadro, 5.°, n.° 2, segundo parágrafo […], e 7.°, n.° 3, da directiva autorização e 4.° da [directiva ‘concorrência’] impõem que os Estados‑Membros ponham fim, o mais tardar a partir de 25 de Julho de 2003 (v. artigo 17.° da directiva autorização), a uma situação de ocupação de facto das frequências (utilização de infra‑estruturas sem uma licença ou autorização emitida após comparação dos proponentes) relativamente às actividades de difusão televisiva, como a que é actualmente desenvolvida, por forma a que não se admita por esta via um desenvolvimento da actividade fora de qualquer correcta planificação da utilização do espectro e fora de qualquer lógica de incremento do pluralismo, além de estar em contradição com as próprias licenças atribuídas pelo Estado‑Membro na sequência de um concurso público?

6)      A derrogação prevista nos artigos 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, da [...] directiva autorização e 4.° da [directiva ‘concorrência’] podia e pode ser invocada pelo Estado‑Membro apenas para tutela do pluralismo informativo e para garantir a tutela da diversidade cultural ou linguística, e não em benefício daqueles que desenvolvem a sua actividade através de [canais] que excedem os limites anticoncentração já previstos na legislação nacional?

7)      O Estado‑Membro, ao invocar a derrogação prevista no artigo 5.° da [directiva autorização], tem de identificar os objectivos que são efectivamente prosseguidos pela disposição nacional derrogatória?

8)      Esta derrogação pode aplicar‑se fora dos casos em que esteja em causa a concessionária do serviço público televisivo (RAI, em Itália), em favor de operadores privados que não tenham vencido concursos e em prejuízo de empresas a quem, pelo contrário, foi atribuída uma licença na sequência de um concurso público?

9)      O quadro de regras resultante do direito comunitário primário e derivado, destinado a garantir uma concorrência efectiva (‘workable competition’) também no sector do mercado televisivo, não impõe ao legislador nacional a obrigação de evitar a sobreposição da prorrogação do antigo regime transitório [aplicável à difusão analógica] para o sistema analógico com o lançamento da chamada televisão digital terrestre, uma vez que só no caso do denominado ‘switch‑off’ das transmissões analógicas (com a consequente passagem generalizada para a televisão digital) seria possível reafectar as frequências libertadas para outros usos, ao passo que no caso de mero início do processo de transição para a televisão digital terrestre se corre o risco de agravar no futuro a escassez das frequências disponíveis, devido à difusão analógica e digital em simultâneo (‘simulcast’)?

10)      Finalmente, a tutela do pluralismo das fontes de informação e da concorrência no sector da difusão televisiva garantida pelo direito europeu deve ser garantida por legislação nacional – como a Lei n.° 112/2004 – que prevê um novo limite de 20% dos recursos, relacionado com um novo critério de valorização [denominado SIC (sistema integrado de comunicações): nos artigos 2.°, alínea g), e 15.° da Lei n.° 112/2004] muito amplo que inclui igualmente actividades que não têm impacto no pluralismo das fontes de informação, ao passo que o ‘mercado relevante’ no direito anticoncentração é normalmente construído através da diferenciação dos mercados no sector televisivo, fazendo‑se até a distinção entre televisão por subscrição (‘pay‑tv’) e televisão de livre acesso operando por intermédio de ondas hertzianas [v., entre outras, a Decisão da Comissão, de 21 de Março de 2000, relativa à compatibilidade com o mercado comum de uma operação de concentração (Processo n.° COMP/JV.37 – B SKY B/Kirch Pay TV), com base no Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho, […] e […] de 2 de Abril de 2003, que declara uma concentração compatível com o mercado comum e com o funcionamento do acordo EEE (Processo n.° COMP/M. 2876 – Newscorp/Telepiù) […]?»

 Quanto às questões prejudiciais

47      Com as suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio solicita ao Tribunal de Justiça, no essencial, que se pronuncie relativamente à interpretação das disposições do Tratado sobre a prestação de serviços e sobre a livre concorrência, da directiva‑quadro, da directiva autorização e da directiva «concorrência», bem como do artigo 10.° da CEDH, na medida em o artigo 6.° UE que lhe faz referência.

 Quanto à competência do Tribunal de Justiça e à admissibilidade das questões

48      A título liminar, importa, em primeiro lugar, assinalar que, com algumas das suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre a conformidade com o direito comunitário de certas disposições da legislação italiana aplicável.

49      Ora, não compete ao Tribunal de Justiça, no quadro do processo prejudicial, pronunciar‑se sobre a compatibilidade de normas de direito interno com o direito comunitário nem interpretar disposições legislativas ou regulamentares nacionais (v. acórdãos de 9 de Setembro de 2003, Jaeger, C‑151/02, Colect., p. I‑8389, n.° 43, e de 23 de Março de 2006, Enirisorse, C‑237/04, Colect., p. I‑2843, n.° 24 e jurisprudência aí referida).

50      No entanto, o Tribunal de Justiça também decidiu reiteradamente que tem competência para fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio todos os elementos de interpretação que se prendam com o direito comunitário e que possam permitir‑lhe apreciar essa compatibilidade para decidir o processo perante ele pendente (v., designadamente, acórdãos de 15 de Dezembro de 1993, Hünermund e o., C‑292/92, Colect., p. I‑6787, n.° 8, e Enirisorse, já referido, n.° 24).

51      Consequentemente, incumbe ao Tribunal de Justiça, no presente processo, limitar o seu exame às disposições do direito comunitário, delas fornecendo uma interpretação que seja útil ao órgão jurisdicional de reenvio, ao qual cabe apreciar a conformidade das disposições legislativas nacionais com o direito comunitário para efeitos da decisão do litígio nele pendente.

52      Importa, em segundo lugar, recordar que, segundo jurisprudência assente, compete em exclusivo ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (acórdãos de 15 de Dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, Colect., p. I‑4921, n.° 59, e de 15 de Junho de 2006, Acereda Herrera, C‑466/04, Colect., p. I‑5341, n.° 47).

53      Porém, o Tribunal de Justiça não pode pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação de uma regra comunitária, solicitada pela jurisdição nacional, não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (acórdãos Bosman, já referido, n.° 61; Acereda Herrera, já referido, n.° 48; e de 5 de Dezembro de 2006, Cipolla e o., C‑94/04 e C‑202/04, Colect., p. I‑11421, n.° 25).

54      A este respeito, a decisão de reenvio deve indicar as razões precisas que conduziram o juiz nacional a interrogar‑se sobre a interpretação do direito comunitário e a considerar necessário apresentar questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça. Neste contexto, é indispensável que o juiz nacional forneça um mínimo de explicações sobre os motivos da escolha das disposições comunitárias cuja interpretação pede e sobre o nexo que estabelece entre estas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal (despacho de 7 de Abril de 1995, Grau Gomis e o., C‑167/94, Colect., p. I‑1023, n.° 9; acórdãos de 6 de Dezembro de 2005, ABNA e o., C‑453/03, C‑11/04, C‑12/04 e C‑194/04, Colect., p. I‑10423, n.° 46; de 6 de Março de 2007, Placanica e o., C‑338/04, C‑359/04 e C‑360/04, Colect., p. I‑1891, n.° 34; e de 19 de Abril de 2007, Asemfo, C‑295/05, Colect., p. I‑2999, n.° 33).

55      Ora, é forçoso reconhecer que, no que diz respeito à sua décima questão, o órgão jurisdicional de reenvio não fornece qualquer indicação quanto às disposições de direito comunitário cuja interpretação solicita, nem qualquer explicação sobre o nexo que estabelece entre essas disposições e o litígio no processo principal ou o objecto do referido litígio.

56      Por conseguinte, a décima questão é inadmissível.

57      Importa, em terceiro lugar, recordar que a necessidade de obter uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige que este defina o quadro factual e legal em que se inserem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões (v. acórdãos de 26 de Janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C‑320/90 a C‑322/90, Colect., p. I‑393, n.° 6; de 14 de Julho de 1998, Bettati, C‑341/95, Colect., p. I‑4355, n.° 67; de 21 de Setembro de 1999, Albany Internacional, C‑67/96, Colect., p. I‑5751, n.° 39, e Cipolla e o., já referido, n.° 25).

58      Estas exigências são particularmente válidas no domínio da concorrência, que se caracteriza por situações de facto e de direito complexas (acórdãos, já referidos, Telemarsicabruzzo e o., n.° 7; Bettati, n.° 68; e Albany Internacional, n.° 39).

59      Ora, no presente processo, como refere o advogado‑geral no n.° 27 das suas conclusões, ao solicitar, com a sua segunda questão, uma interpretação das regras de concorrência do Tratado, o órgão jurisdicional de reenvio parece referir‑se principalmente ao artigo 86.°, n.° 1, CE, em conjugação com o artigo 82.° CE.

60      Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um Estado‑Membro viola as proibições estabelecidas nestas duas disposições quando a empresa em causa seja levada, pelo simples exercício dos direitos especiais ou exclusivos que lhe foram atribuídos, a explorar a sua posição dominante de modo abusivo ou quando esses direitos possam criar uma situação em que essa empresa seja levada a cometer esses abusos (acórdãos de 12 de Setembro de 2000, Pavlov e o., C‑180/98 a C‑184/98, Colect., p. I‑6451 n.° 127; de 25 de Outubro de 2001, Ambulanz Glöckner, C‑475/99, Colect., p. I‑8089, n.° 39; e de 30 de Março de 2006, Servizi Ausiliari Dottori Commercialisti, C‑451/03, Colect., p. I‑2941, n.° 23).

61      Todavia, a decisão de reenvio não contém qualquer indicação no que respeita, nomeadamente, à definição do mercado pertinente, ao cálculo das quotas de mercado detidas pelas diferentes empresas que operam no referido mercado ou ao suposto abuso de posição dominante.

62      Por conseguinte, há que concluir que, na medida em que respeita às disposições do Tratado sobre a concorrência, a segunda questão é inadmissível (v., neste sentido, acórdão de 17 de Fevereiro de 2005, Viacom Outdoor, C‑134/03, Colect., p. I‑1167, n.os 25 a 29).

63      Pelos mesmos motivos, há que concluir que a nona questão é inadmissível.

64      Importa, em quarto lugar, verificar se o Tribunal de Justiça é competente no presente processo para se pronunciar sobre o artigo 49.° CE, uma vez que é pacífico que todos os elementos do litígio no processo principal estão confinados no interior de um único Estado‑Membro.

65      Com efeito, uma legislação nacional como a em causa no processo principal, indistintamente aplicável aos cidadãos italianos e aos cidadãos dos outros Estados‑Membros, regra geral, só é susceptível de ser abrangida pelas disposições relativas à livre prestação de serviços previstas pelo Tratado na medida em que seja aplicável a situações que tenham um nexo com as trocas comerciais intracomunitárias (acórdãos de 15 de Dezembro de 1982, Oosthoek’s Uitgeversmaatschappij, 286/81, Recueil, p. 4575, n.° 9, e de 11 de Setembro de 2003, Anomar e o., C‑6/01, Colect., p. I‑8621, n.° 39).

66      Ora, não se pode excluir que, no processo principal, empresas estabelecidas em Estados‑Membros diferentes da República Italiana tenham estado ou estejam interessados em fornecer os serviços em questão (v., neste sentido, acórdãos de 25 de Abril de 1996, Comissão/Bélgica, C‑87/94, Colect., p. I‑2043, n.° 33, e de 13 de Outubro de 2005, Parking Brixen, C‑458/03, Colect., p. I‑ 8585, n.° 55).

67      A existência de um nexo com as trocas comerciais intracomunitárias presume‑se se o mercado em causa apresentar um interesse transfronteiriço certo (acórdão de 13 de Novembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑507/03, Colect., p. I‑0000, n.° 29), o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

68      Em todo o caso, há que responder à segunda questão submetida ao Tribunal de Justiça no presente processo na medida em que visa o artigo 49.° CE.

69      Efectivamente, tal resposta pode ser útil ao órgão jurisdicional de reenvio no caso de o seu direito nacional impor que sejam reconhecidos a um cidadão italiano os mesmos direitos que aqueles que, na mesma situação, seriam conferidos pelo direito comunitário a um cidadão de outro Estado‑Membro (acórdãos de 5 de Dezembro de 2000, Guimont C‑448/98, Colect., p. I‑10663, n.° 23; de 5 de Março de 2002, Reisch e o., C‑515/99, C‑519/99 a C‑524/99 e C‑526/99 a C‑540/99, Colect., p. I‑2157, n.° 26; Anomar e o., já referido, n.° 41; Servizi Ausiliari Dottori Commercialisti, já referido, n.° 29; e Cipolla e o., já referido, n.° 30).

70      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça é competente para se pronunciar sobre a interpretação do artigo 49.° CE.

71      Portanto, a segunda questão é admissível na medida em que visa o artigo 49.° CE.

 Quanto à segunda, quarta e quinta questões

72      A segunda, quarta e quinta questões visam todas, no essencial, saber se as disposições do artigo 49.° CE ou do NCRC se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem atribuídas radiofrequências de emissão.

73      É certo que, no âmbito da segunda questão, o Tribunal de Justiça só pode responder na perspectiva do artigo 49.° CE na medida em que esta questão visa a legislação italiana, a saber, o artigo 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997, que é anterior à aplicabilidade do NCRC, como resulta dos artigos 28.°, n.° 1, da directiva‑quadro, 18.°, n.° 1, da directiva autorização e 9.° da directiva «concorrência».

74      De igual modo, a quarta e quinta questões apenas têm por objecto o NCRC, uma vez que respeitam à legislação nacional posterior à data de aplicação deste último, a saber, as disposições da Lei n.° 112/2004.

75      Porém, por um lado, a segunda questão tem igualmente por objecto a legislação italiana posterior à aplicabilidade do NCRC, a saber, o artigo 1.° do Decreto‑Lei n.° 352/2003.

76      Por outro lado, como referiu a Comissão nas observações que apresentou ao Tribunal de Justiça, o NCRC deu execução às disposições do Tratado, em especial às relativas à livre prestação de serviços, no domínio das redes e serviços de comunicações electrónicas, como definidos nos artigos 2.°, alíneas a) e c), da directiva‑quadro, 2.°, n.° 1, da directiva autorização e 1.°, pontos 1 e 3, da directiva «concorrência».

77      A segunda, quarta e quinta questões devem, pois, ser tratadas conjuntamente, desde já se esclarecendo que os elementos de resposta fornecidos a respeito do NCRC apenas são pertinentes a contar da data da respectiva aplicabilidade, como indicada nos artigos 28.°, n.° 1, da directiva‑quadro, 18.°, n.° 1, da directiva autorização e 9.° da directiva «concorrência».

78      Com vista a dar a estas questões uma resposta útil para o órgão jurisdicional de reenvio, importa recordar que o Tratado não exige a abolição total dos monopólios nacionais de natureza comercial, mas impõe a sua adaptação de forma a excluir qualquer discriminação entre nacionais dos Estados‑Membros quanto às condições de abastecimento e de escoamento (acórdão de 23 de Outubro de 1997, Franzén, C‑189/95, Colect., p. I‑5909, n.° 38 e jurisprudência aí referida).

79      Porém, o artigo 49.° CE opõe‑se à aplicação de qualquer legislação nacional que tenha por efeito tornar a prestação de serviços entre Estados‑Membros mais difícil do que a prestação de serviços puramente interna a um Estado‑Membro (acórdão de 8 de Setembro de 2005, Mobistar e Belgacom Mobile, C‑544/03 e C‑545/03, Colect., p. I‑7723, n.° 30).

80      No domínio das redes e dos serviços de comunicações electrónicas, o NCRC deu aplicação a estes princípios.

81      Com efeito, o artigo 8.° da directiva‑quadro impõe aos Estados‑Membros a obrigação de assegurarem que as autoridades reguladoras nacionais tomarão todas as medidas razoáveis a fim de promover a concorrência na oferta dos serviços de comunicações electrónicas, velando por que a concorrência não seja falseada ou entravada no sector das comunicações electrónicas e eliminando os últimos obstáculos à oferta dos referidos serviços a nível europeu.

82      De igual modo, o artigo 2.°, n.° 2, da directiva «concorrência» obriga os Estados‑Membros a tomarem todas as medidas necessárias para garantir que qualquer empresa possa fornecer serviços de comunicações electrónicas ou estabelecer, alargar ou oferecer redes de comunicações electrónicas.

83      Por outro lado, o artigo 3.°, n.° 1, da directiva autorização obriga os Estados‑Membros a garantirem a liberdade de oferecer redes e serviços de comunicações electrónicas e proíbe‑os de impedir que uma empresa ofereça essas redes ou serviços, ressalvados os motivos constantes do n.° 1 do artigo 46.° CE.

84      Para esse efeito, o artigo 3.°, n.° 2, da directiva autorização esclarece que a oferta de redes ou de serviços de comunicações electrónicas apenas pode estar sujeita a uma autorização geral.

85      Quanto a esta questão, importa esclarecer que, no domínio das emissões radiotelevisivas, a livre prestação de serviços, como consagrada no artigo 49.° CE e executada neste domínio pelo NCRC, exige não apenas a concessão de autorizações de emissão mas também a atribuição de radiofrequências de emissão.

86      Na verdade, um operador não pode exercer de modo efectivo os direitos que lhe são conferidos pelo direito comunitário em termos de acesso ao mercado da radiodifusão televisiva na falta de radiofrequências de emissão.

87      Para este efeito, o artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro prevê que «[o]s Estados‑Membros assegurarão uma gestão eficaz das radiofrequências para serviços de comunicações electrónicas no seu território».

88      De igual modo, o artigo 5.°, n.° 1, da directiva autorização esclarece que, se possível, nomeadamente quando seja mínimo o risco de interferências nocivas, os Estados‑Membros não farão depender a utilização das radiofrequências da concessão de direitos de utilização individuais, mas incluirão as condições de utilização dessas radiofrequências na autorização geral.

89      Por outro lado, o artigo 4.°, ponto 1, da directiva «concorrência» proíbe os Estados‑Membros de concederem direitos especiais ou exclusivos de utilização de radiofrequências para a prestação de serviços de comunicações electrónicas.

90      No presente processo, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre os critérios instituídos para a atribuição de radiofrequências com vista a operar no mercado das emissões de radiodifusão televisiva em modo analógico.

91      Com efeito, por um lado, o órgão jurisdicional de reenvio não interroga o Tribunal de Justiça sobre os critérios que foram postos em prática, em aplicação da Lei n.° 249/1997, para a concessão dos direitos de operar no mercado das emissões de radiodifusão televisiva em modo analógico. Estes critérios também não foram contestados pela Centro Europa 7, nem perante o órgão jurisdicional de reenvio nem nas observações que apresentou ao Tribunal de Justiça, uma vez que foi atribuída uma concessão à Centro Europa 7 em aplicação dos referidos critérios.

92      Não cabe, pois, ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre esses critérios.

93      O órgão jurisdicional de reenvio apenas tem dúvidas sobre a conformidade com o direito comunitário da Lei n.° 249/1997 na medida em que o seu artigo 3.°, n.° 7, instituiu um regime transitório a favor das cadeias existentes, o qual teve por efeito impedir o acesso ao mercado em causa de operadores desprovidos de radiofrequências, como a Centro Europa 7.

94      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio apenas interroga o Tribunal de Justiça sobre os critérios postos em prática, em aplicação da Lei n.° 112/2004, para a concessão dos direitos de operar no mercado das emissões de radiodifusão televisiva em modo digital e em modo analógico, na medida em que estes critérios consolidaram o regime transitório organizado a favor das cadeias existentes pelo artigo 1.° do Decreto‑Lei n.° 352/2003, o qual teve por efeito opor‑se à atribuição a certos operadores, apesar de serem titulares de concessões atribuídas em aplicação da Lei n.° 249/1997, de radiofrequências com vista a operar no mercado das emissões de radiodifusão televisiva em modo analógico.

95      A este respeito, cabe salientar que a aplicação sucessiva dos regimes transitórios organizados a favor das cadeias existentes pelos artigos 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997 e 1.° do Decreto‑Lei n.° 352/2003 teve por efeito impedir o acesso ao mercado em causa dos operadores desprovidos de radiofrequências de emissão.

96      Cabe igualmente ter em conta que, ao prever uma autorização geral para operar no mercado dos serviços de radiodifusão unicamente a favor das cadeias existentes, o artigo 23.°, n.° 5, da Lei n.° 112/2004 consolidou o efeito restritivo constatado no número anterior.

97      Efectivamente, por um lado, ao limitar de facto o número de operadores que podem emitir no mercado em causa, estas medidas são e/ou foram susceptíveis de entravar a prestação de serviços no domínio da radiodifusão televisiva.

98      Por outro lado, estas medidas têm e/ou tiveram por efeito cristalizar as estruturas do mercado nacional e proteger a posição dos operadores nacionais já activos em tal mercado.

99      Por conseguinte, o artigo 49.° CE e, a partir da data da respectiva aplicabilidade, os artigos 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro, 5.°, n.° 1, da directiva autorização e 4.°, ponto 1, da directiva «concorrência» opõem‑se a tais medidas, excepto se forem justificadas.

100    A este respeito, importa recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um regime de licenças que limita o número dos operadores no território nacional pode ser justificado por objectivos de interesse geral (v., neste sentido, acórdão Placanica e o., já referido, n.° 53), desde que as restrições dele decorrentes sejam adequadas e não ultrapassem aquilo que é necessário para alcançar os referidos objectivos.

101    Assim, o NCRC permite expressamente aos Estados‑Membros, ao abrigo do artigo 1.°, n.° 3, da directiva‑quadro, aprovar ou manter, no respeito do direito comunitário, disposições que prossigam objectivos de interesse geral, nomeadamente no tocante à política audiovisual.

102    De igual modo, o artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da directiva autorização permite que os Estados‑Membros procedam à atribuição de direitos de utilização das radiofrequências numa base individual com vista ao respeito do objectivo de uma utilização eficiente das radiofrequências, como recordado na directiva‑quadro.

103    Todavia, como salientou o advogado‑geral nos n.os 34 e 37 das suas conclusões, para ser justificado, tal regime, que, em princípio, infringe o artigo 49.° CE e o NCRC, deve não apenas obedecer a objectivos de interesse geral mas também ser organizado com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais (v., neste sentido, acórdão Placanica e o., já referido, n.° 49 e jurisprudência aí referida).

104    Assim, o artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro prevê que os Estados‑Membros assegurem que a atribuição e a consignação das radiofrequências pelas autoridades reguladoras nacionais se baseiem em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.

105    Acresce que, quando seja necessário conceder direitos individuais de utilização das radiofrequências, estes direitos devem ser concedidos, nos termos do artigo 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, da directiva autorização, «através de procedimentos abertos, transparentes e não discriminatórios».

106    Do mesmo modo, por força do artigo 7.°, n.° 3, da directiva autorização, «[s]e a concessão de direitos de utilização de radiofrequências tiver de ser limitada, os Estados‑Membros conferirão esses direitos com base em critérios de selecção objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais».

107    Esta exigência é confortada pelo artigo 4.°, ponto 2, da directiva «concorrência», nos termos do qual «a atribuição de radiofrequências para serviços de comunicações electrónicas deve basear‑se em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais».

108    Ora, no processo principal, resulta dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional de reenvio que, em aplicação da Lei n.° 249/1997, a atribuição das radiofrequências a um número limitado de operadores não foi efectuada com base em tais critérios.

109    Efectivamente, por um lado, as referidas radiofrequências foram atribuídas de facto às cadeias existentes em aplicação do regime transitório organizado pelo artigo 3.°, n.° 7, da Lei n.° 249/1997, apesar de não terem sido atribuídas a algumas destas cadeias concessões no quadro desta lei.

110    Por outro lado, alguns operadores, como a Centro Europa 7, não beneficiaram de radiofrequências, apesar de lhes terem sido atribuídas concessões no quadro da referida lei.

111    Por conseguinte, independentemente dos objectivos prosseguidos pela Lei n.° 249/1997 no tocante ao regime de concessão de radiofrequências a um número limitado de operadores, há que considerar que o artigo 49.° CE se opunha a tal regime.

112    Impõe‑se a mesma apreciação a respeito do regime de concessão das radiofrequências a um número limitado de operadores em aplicação da Lei n.° 112/2004, no sentido de que este regime não foi organizado com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais, em violação do artigo 49.° CE e, a contar da data da respectiva aplicabilidade, do artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro, dos artigos 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, e 7.°, n.° 3, da directiva autorização, bem como do artigo 4.°, ponto 2, da directiva «concorrência».

113    Efectivamente, em aplicação da Lei n.° 112/2004, as radiofrequências foram atribuídas às cadeias existentes e estas últimas foram autorizadas a emitir em aplicação do regime transitório organizado pelo artigo 1.° do Decreto‑Lei n.° 352/2003, o qual se limitou a prorrogar o regime transitório instituído pela Lei n.° 249/1997.

114    Em todo o caso, as restrições antes constatadas não podem ser justificadas pela necessidade de assegurar uma mutação rápida para a radiodifusão televisiva em modo digital.

115    Com efeito, independentemente da questão de saber se tal objectivo pode constituir um objectivo de interesse geral susceptível de justificar tais restrições, é forçoso concluir, como correctamente sublinhou a Comissão nas observações que apresentou ao Tribunal, que a legislação italiana, nomeadamente a Lei n.° 112/2004, não se limita a atribuir aos operadores existentes um direito prioritário de obterem as radiofrequências, mas reserva‑lhes este direito em exclusividade, e isto sem um limite temporal à situação de privilégio atribuída a estes operadores e sem prever a obrigação de restituição das radiofrequências excedentárias após a passagem à radiodifusão televisiva em modo digital.

116    Tendo em conta as precedentes considerações, importa responder à segunda, quarta e quinta questões, no seu conjunto, que o artigo 49.° CE e, a contar da data da respectiva aplicabilidade, o artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro, os artigos 5.°, n.os 1 e 2, segundo parágrafo, e 7.°, n.° 3, da directiva autorização, bem como o artigo 4.° da directiva «concorrência», devem ser interpretados no sentido de que se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem concedidas radiofrequências de emissão com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.

 Quanto à primeira e terceira questões

117    Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça, no essencial, que declare se as disposições do artigo 10.° da CEDH, na medida em que o artigo 6.° UE lhes faz referência, se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão, como a Centro Europa 7, fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem concedidas radiofrequências de emissão.

118    Com a terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre a obrigação, decorrente do eventual efeito directo do artigo 17.° da directiva autorização a contar da data da sua aplicabilidade, de o Estado‑Membro que tenha atribuído concessões para a actividade de radiodifusão televisiva pôr estas em conformidade com o direito comunitário e, portanto, atribuir à Centro Europa 7 as radiofrequências de emissões necessárias ao exercício da referida actividade.

119    Com estas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, assim, verificar a existência de violações do direito comunitário com vista a pronunciar‑se sobre um pedido de reparação dos prejuízos delas resultantes.

120    Ora, decorre da resposta à segunda, quarta e quinta questões que o artigo 49.° CE e, a contar da data da respectiva aplicabilidade, o artigo 9.°, n.° 1, da directiva‑quadro, os artigos 5.°, n.os 1 e 2, segundo parágrafo, e 7.°, n.° 3, da directiva autorização, bem como o artigo 4.° da directiva «concorrência», devem ser interpretados no sentido de que se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem concedidas radiofrequências de emissão com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.

121    Por conseguinte, esta resposta permite, por si só, ao órgão jurisdicional de reenvio pronunciar‑se sobre o pedido de reparação dos prejuízos sofridos, apresentado pela Centro Europa 7.

122    Assim, tendo em conta a resposta dada pelo Tribunal de Justiça à segunda, quarta e quinta questões, não há que se pronunciar sobre a primeira e terceira questões.

 Quanto à sexta, sétima e oitava questões

123    Com a sexta, sétima e oitava questões, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, no essencial, sobre as condições de aplicação, pelos Estados‑Membros, da derrogação prevista nos artigos 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, da directiva autorização e 4.° da directiva «concorrência».

124    Ora, resulta da resposta à quarta e quinta questões que, a contar da data da respectiva aplicabilidade, os artigos 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, da directiva autorização e 4.° da directiva «concorrência» devem ser interpretados no sentido de que se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem concedidas radiofrequências de emissão com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.

125    Resulta, pois, desta resposta que o respeito de critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais constitui uma condição necessária para a aplicação da derrogação prevista nos artigos 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, da directiva autorização e 4.° da directiva «concorrência».

126    Portanto, não há que se pronunciar sobre outras eventuais condições de aplicação da referida derrogação, como as mencionadas na sexta, sétima e oitava questões.

127    Por conseguinte, tendo em conta a resposta dada pelo Tribunal de Justiça à quarta e quinta questões, em conjunto com a segunda questão, não há que se pronunciar sobre a sexta, sétima e oitava questões.

 Quanto às despesas

128    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

O artigo 49.° CE e, a contar da data da respectiva aplicabilidade, o artigo 9.°, n.° 1, da Directiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva‑quadro), os artigos 5.°, n.os 1 e 2, segundo parágrafo, e 7.°, n.° 3, da Directiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva autorização), bem como o artigo 4.° da Directiva 2002/77/CE da Comissão, de 16 de Setembro de 2002, relativa à concorrência nos mercados de redes e serviços de comunicações electrónicas, devem ser interpretados no sentido de que se opõem, em matéria de radiodifusão televisiva, a uma legislação nacional cuja aplicação tem como consequência que um operador titular de uma concessão fique impossibilitado de emitir pelo facto de não lhe serem concedidas radiofrequências de emissão com base em critérios objectivos, transparentes, não discriminatórios e proporcionais.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.