Language of document : ECLI:EU:C:2012:523

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 6 de setembro de 2012 (1)

Processo C‑473/10

Comissão Europeia

contra

Hungria

«Ação por incumprimento — Diretiva 91/440/CEE — Desenvolvimento dos caminhos de ferro comunitários — Diretiva 2001/14/CE — Repartição de capacidade da infraestrutura ferroviária — Artigo 6.°, n.° 3, e anexo II da Diretiva 91/440 — Artigos 4.°, n.° 2, e 14.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14 — Gestor da infraestrutura — Independência da atribuição dos traçados ferroviários — Independência da tarificação — Artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14 — Equilíbrio financeiro do gestor da infraestrutura e medidas de incentivo à redução dos custos e das taxas — Artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14 — Determinação das taxas com base nos custos diretos»





I —    Introdução

1.        Através da presente ação por incumprimento, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que a Hungria não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.°, n.° 3, e do anexo II da Diretiva 91/440/CEE (2), conforme alterada pela Diretiva 2001/12/CE (3) (a seguir «Diretiva 91/440»), e dos artigos 4.°, n.° 2, e 14.°, n.° 2, 6.°, n.os 1 e 2, 7.°, n.° 3, 8.°, n.° 1, e 11.° da Diretiva 2001/14/CE (4), conforme alterada pela Diretiva 2004/49/CE (5) (a seguir, «Diretiva 2001/14»). A Hungria pede que a ação seja julgada improcedente.

2.        O presente processo insere‑se num conjunto de ações por incumprimento (6), intentadas pela Comissão em 2010 e em 2011, que têm por objeto a aplicação pelos Estados‑Membros das Diretivas 91/440 e 2001/14, em especial no que diz respeito ao acesso equitativo e não discriminatório das empresas ferroviárias à infraestrutura, a saber, à rede ferroviária. Estas ações são inéditas porque dão pela primeira vez ao Tribunal de Justiça a oportunidade de se pronunciar sobre a liberalização dos caminhos de ferro na União Europeia e, designadamente, de interpretar o denominado «primeiro pacote ferroviário».

II — Quadro jurídico

A —    Direito da União

3.        O artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 prevê:

«Os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para assegurar que as funções determinantes para um acesso equitativo e não discriminatório à infraestrutura, descritas no anexo II, sejam atribuídas a entidades ou empresas que não efetuem, elas próprias, serviços de transporte ferroviário. Independentemente do tipo de estrutura organizacional, deve ser demonstrado que aquele objetivo foi atingido.

Contudo, os Estados‑Membros podem encarregar as empresas de transporte ferroviário, ou qualquer outra entidade, da cobrança das taxas e da responsabilidade da gestão da infraestrutura ferroviária, nomeadamente dos investimentos, da manutenção e do financiamento.»

4.        O anexo II da Diretiva 91/440 menciona a lista de funções essenciais a que se refere o n.° 3 do artigo 6.°:

¾        «preparação e processo de decisão relativo à concessão de licenças a empresas de transporte ferroviário, incluindo a concessão de licenças individuais,

¾        processo de decisão relativo à atribuição de canais horários, incluindo a definição e a avaliação da disponibilidade e a atribuição de canais horários individuais,

¾        processo de decisão relativo à tarificação da utilização da infraestrutura,

¾        supervisão do cumprimento das obrigações de serviço público impostas pela prestação de determinados serviços.»

5.        Segundo as definições do artigo 2.° da Diretiva 2001/14, para efeitos da referida diretiva, entende‑se por:

«a)      ‘Repartição’, a afetação da capacidade da infraestrutura ferroviária por um gestor de infraestrutura;

[…]

g)      ‘Capacidade de infraestrutura’, a possibilidade de programar traçados solicitados para um elemento da infraestrutura durante um determinado período;

h)      ‘Gestor da infraestrutura’, qualquer entidade ou empresa responsável concretamente pela instalação e manutenção da infraestrutura ferroviária, bem como eventualmente pela gestão dos sistemas de controlo e de segurança. As funções do gestor da infraestrutura de uma rede, ou de parte de uma rede, podem ser repartidas por diferentes organismos ou empresas;

i)      ‘Rede’, o conjunto da infraestrutura ferroviária pertencente a um gestor de infraestrutura e/ou por ele gerida;

[…]

k) ‘Empresa de transporte ferroviário’, qualquer empresa de estatuto privado ou público, detentora de uma licença nos termos da legislação comunitária aplicável, cuja atividade principal consista na prestação de serviços de transporte de mercadorias e/ou de passageiros por caminho de ferro, devendo a tração ser obrigatoriamente assegurada por essa empresa, incluindo empresas que apenas prestem serviços de tração;

l)      ‘Traçado’, a capacidade de infraestrutura necessária para a circulação de um comboio entre dois pontos em determinado momento;

m)      ‘Horário de serviço’, o conjunto de dados que definem todos os movimentos programados de comboios e demais material circulante numa determinada infraestrutura durante o seu período de vigência».

6.        O artigo 4.°, n.os 1 e 2, da Diretiva 2001/14 dispõe:

«1.      […] A determinação das taxas de utilização da infraestrutura e a cobrança dessas taxas é da responsabilidade do gestor da infraestrutura.

2.      Se o gestor da infraestrutura não for independente das empresas de transporte ferroviário, no plano jurídico, organizativo e decisório, as funções descritas no presente capítulo, com exceção da cobrança de taxas, serão desempenhadas por um organismo de tarificação independente, no plano jurídico, organizativo e decisório, das empresas de transporte ferroviário».

7.        O artigo 5.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14 prevê:

«As empresas de transporte ferroviário têm direito, numa base não discriminatória, ao pacote mínimo de acesso, assim como ao acesso por via férrea às instalações de serviços descritas no anexo II. A prestação dos serviços referidos no ponto 2 do anexo II é efetuada de modo não discriminatório e os pedidos de empresas de transporte ferroviário só podem ser recusados quando existam alternativas viáveis em condições normais de mercado. Se os serviços não forem prestados por um gestor da infraestrutura, o fornecedor da ‘infraestrutura principal’ envidará todos os esforços razoáveis para facilitar a prestação desses serviços.»

8.        Nos termos do artigo 6.° da Diretiva 2001/14:

«1.      Os Estados‑Membros devem definir as condições necessárias, incluindo, se for caso disso, pagamentos adiantados, para assegurar que, em condições normais de atividade e ao longo de um período de tempo razoável, as contas do gestor da infraestrutura apresentem pelo menos um equilíbrio entre as receitas provenientes das taxas de utilização da infraestrutura, os excedentes provenientes de outras atividades comerciais e o financiamento estatal, por um lado, e as despesas da infraestrutura, por outro.

[…]

2.      Tendo devidamente em conta as exigências de segurança e a preservação e melhoria da qualidade de serviço da infraestrutura, o gestor da infraestrutura terá acesso a incentivos conducentes à redução dos custos de fornecimento da infraestrutura e do nível das taxas de acesso à mesma.

3.      Os Estados‑Membros devem assegurar que o disposto no n.° 2 seja executado, quer através de um contrato celebrado entre a autoridade competente e o gestor da infraestrutura, válido por um período não inferior a três anos e que preveja o financiamento estatal, quer através da instituição de medidas reguladoras apropriadas, com os poderes necessários.»

9.        O artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14 dispõe:

«Sem prejuízo do disposto nos n.os 4 e 5 e no artigo 8.°, as taxas de utilização do pacote mínimo de acesso e do acesso por via férrea às instalações de serviços devem corresponder ao custo diretamente imputável à exploração do serviço ferroviário.»

10.      O artigo 8.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14 estabelece o seguinte:

«A fim de proceder à plena recuperação dos custos do gestor da infraestrutura, os Estados‑Membros podem, se as condições do mercado o permitirem, aplicar sobretaxas adicionais com base em princípios eficazes, transparentes e não discriminatórios, garantindo ao mesmo tempo a maior competitividade possível, em especial no que se refere ao transporte ferroviário internacional de mercadorias. O regime de tarificação deve respeitar os aumentos de produção alcançados pelas empresas de transporte ferroviário.

No entanto, o nível das taxas não deverá excluir a utilização da infraestrutura por segmentos de mercado que possam pelo menos pagar os custos diretamente imputáveis à exploração do serviço ferroviário, acrescidos de uma taxa de rentabilidade se o mercado o permitir.»

11.      O artigo 13.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 2001/14, dispõe:

«O direito de utilização de uma capacidade de infraestrutura específica na forma de um traçado pode ser concedido aos candidatos por um período máximo correspondente ao período de vigência de um horário de serviço.»

12.      Nos termos do artigo 14.°, n.os 1 e 2, da Diretiva 2001/14:

«[…] O gestor da infraestrutura deve cumprir os procedimentos de repartição da capacidade […]

Se, no plano jurídico, organizativo e decisório, o gestor da infraestrutura não for independente das empresas de transporte ferroviário, as funções referidas no n.° 1 e descritas no presente capítulo serão desempenhadas por um organismo de repartição independente das empresas de transporte ferroviário, no plano jurídico, organizativo e decisório.»

13.      Nos termos do artigo 29.° da Diretiva 2001/14:

«1.      Em caso de perturbação da circulação ferroviária resultante de falha técnica ou acidente, o gestor da infraestrutura deve tomar todas as medidas necessárias para restabelecer a situação normal, devendo, para esse efeito, elaborar um plano de emergência que incluirá uma lista dos diversos organismos públicos a informar em caso de incidentes graves ou de séria perturbação da circulação ferroviária.

2.      Em caso de emergência e de absoluta necessidade motivada por uma falha que torne a infraestrutura temporariamente inutilizável, os traçados atribuídos podem ser retirados sem pré‑aviso pelo período de tempo necessário para a reparação do sistema.

Se o considerar necessário, o gestor da infraestrutura pode exigir às empresas de transporte ferroviário que coloquem à sua disposição os recursos que, no seu entender, forem mais adequados para restabelecer a situação normal o mais rapidamente possível.

3.      Os Estados‑Membros podem exigir que as empresas ferroviárias tomem parte na execução e fiscalização do seu próprio cumprimento das normas e regras de segurança.»

14.      O anexo II, n.° 1, da Diretiva 2001/14 dispõe o seguinte:

«O pacote mínimo de acesso incluirá:

a)      O tratamento dos pedidos de capacidade de infraestrutura;

b)      O direito de utilização da capacidade concedida;

c)      A utilização de agulhas e entroncamentos;

d)      O comando da composição, incluindo a sinalização, a regulação, a expedição e a comunicação e transmissão de informações sobre o movimento da composição;

e)      Quaisquer informações necessárias à implementação ou operação do serviço para o qual a capacidade foi concedida.»

B —    Direito nacional

15.      A Lei XCV. de 1993, relativa aos caminhos de ferro, criou, em 2004, um organismo independente das empresas ferroviárias, o Vasúti Pályakapacitás‑elosztó Szervezet (a seguir «VPE»).

16.      Nos termos do artigo 62.° da Lei CLXXXIII. de 2005, relativa ao transporte por caminhos de ferro (2005 évi CLXXXIII. törvény a vasúti közlekedésről (7), a seguir «Lei relativa aos caminhos de ferro»), incumbem ao VPE as funções de atribuição dos traçados e de determinação das taxas.

17.      O artigo 28.°, n.° 1, da referida Lei relativa aos caminhos de ferro tem a seguinte redação:

«Em nome do Estado, o ministro compromete‑se mediante contrato — com o acordo do ministro responsável pelo orçamento — a financiar as despesas consideradas justificadas suportadas no âmbito da gestão da rede ferroviária nacional e das suas dependências, bem como das vias férreas regionais e das suas dependências, que não estejam abrangidas pela taxa de acesso à rede nem pelas outras operações desta empresa. Os termos do referido contrato devem ser estabelecidos de maneira a incentivar o gestor da rede a reduzir as suas despesas de gestão e as taxas de acesso à rede, sem perturbar a segurança do transporte nem a qualidade do serviço.»

18.      O artigo 31.°, n.° 2, alínea b), desta mesma lei dispõe que «no interesse da segurança do tráfego ferroviário […], o gestor da infraestrutura — até à cessação da situação de perigo — tem o direito de encerrar as vias férreas, ou os troços de via férrea, ameaçados por este perigo, bem como de suprimir os traçados ferroviários atribuídos nos troços em causa, informando, quando este encerramento afeta uma passagem de nível, a administração responsável pela via em causa […]»

19.      O artigo 55.°, n.° 8, da Lei relativa aos caminhos de ferro dispõe:

«Se, de acordo com todas as previsões, as taxas de acesso à rede não cobrem todos os custos e despesas justificados do gestor da infraestrutura de acesso livre, a taxa relativa aos serviços definidos no artigo 54.°, n.os 1 e 3 a 5, pode ser objeto de um aumento geral que não pode exceder o necessário para cobrir todos os custos e despesas justificados, aumento esse que tem em conta os ganhos de produtividade obtidos pelas empresas ferroviárias, a exigência de uma utilização eficaz da infraestrutura, a competitividade do trânsito ferroviário internacional, o princípio da transparência e da igualdade de tratamento.»

20.      O Regulamento n.° 83/2007 (X.6) GKM‑PM é relativo ao enquadramento do regime das taxas de acesso à infraestrutura ferroviária e às regras fundamentais de determinação da taxa de acesso à infraestrutura (8).

21.      O Regulamento n.° 101/2007 (XII.22) GKM relativo às regras do acesso livre às infraestruturas ferroviárias (9) dispõe no artigo 23.°, n.° 1:

«Quando um gestor da infraestrutura tiver suprimido um traçado ferroviário ao abrigo do artigo 31.°, n.° 2, alínea b), da Lei relativa aos caminhos de ferro, a entidade responsável pela atribuição da capacidade disponibiliza, a pedido do interessado, um outro traçado ferroviário escolhido entre a capacidade disponível.»

22.      O VPE publica anualmente um regulamento de exploração da rede (Hálózati Üzletszabályzat). O regulamento de exploração de rede de 2009‑2010 dispõe no ponto 4.3, n.° 9:

«[O VPE] informa das suas decisões de repartição de capacidade os beneficiários afetados, os gestores da infraestrutura e o órgão de gestão dos caminhos de ferro.»

23.      No ponto 4.8.1, intitulado «Princípios orientadores do restabelecimento da circulação normal», este mesmo regulamento dispõe:

«a)      Em caso de desvio em relação ao programa e ao horário normal, a direção dos serviços operacionais de exploração do gestor da infraestrutura tem a obrigação de adotar medidas adequadas a pôr termo às perturbações e a restabelecer o tráfego em conformidade com o programa e o horário. [...]

b)      Os beneficiários do acesso à rede dispõem, permanentemente, de uma pessoa de contacto habilitada a adotar decisões ou do seu próprio órgão de direção, que, em caso de perturbação ou de perigo, é informada pelo órgão de direção do gestor da infraestrutura, e cujas necessidades são tomadas em consideração para o restabelecimento das condições normais de exploração.

c)      Força maior e outras circunstâncias extraordinárias imprevisíveis:

¾        Em caso de perturbações da circulação ferroviária causadas por falhas técnicas ou acidentes, o gestor da infraestrutura tem a obrigação de realizar todas as diligências para o restabelecimento das condições normais de exploração. Para o efeito, deve elaborar um plano de urgência, que inclua os organismos que devem ser informados em caso de acidentes graves ou de perturbações graves na circulação ferroviária.

¾        A pedido do gestor da rede, o beneficiário do acesso à rede tem a obrigação, mediante reembolso, de disponibilizar os meios considerados mais adequados para efeitos do pronto restabelecimento das condições normais de exploração.

¾        Em caso de perigo que torne momentaneamente inutilizável a rede ferroviária, o gestor da infraestrutura pode, informando disso os interessados, suprimir traçados ferroviários atribuídos, durante o período necessário ao restabelecimento da situação. A pedido do interessado, [o VPE] disponibiliza‑lhe, durante este período, outro traçado ferroviário escolhido entre as capacidades disponíveis.»

III — Procedimento pré‑contencioso e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

24.      Por carta de 26 de janeiro de 2008, a Comissão notificou a Hungria para lhe apresentar as suas observações relativas ao incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.°, n.° 3, e do anexo II da Diretiva 91/440, e dos artigos 4.°, n.° 2, e 14.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14, bem como das obrigações por força dos artigos 3.°, 6.°, n.° 1, 6.°, n.os 2 a 5, 7.°, n.° 3, 8.°, 11.° e 30.°, n.° 3, desta mesma diretiva. Por carta de 22 de agosto de 2008, a Hungria respondeu a esta notificação para cumprir. Esta carta foi completada por outras, designadamente em 10 de junho de 2009.

25.      Por carta de 8 de outubro de 2009, a Comissão enviou um parecer fundamentado no qual declarava que a Hungria não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 6.°, n.° 3, e do anexo II da Diretiva 91/440, e dos artigos 4.°, n.° 2, e 14.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14, nem as que lhe incumbem por força dos artigos 6.°, n.° 1, 6.°, n.° 2, 7.°, n.° 3, 8.°, n.° 1, e 11.° desta mesma diretiva. A Comissão convidou a Hungria a adotar as medidas exigidas para dar cumprimento ao parecer fundamentado no prazo de dois meses a contar da receção do mesmo. Por carta de 16 de dezembro de 2009, a Hungria respondeu ao parecer fundamentado e contestou o incumprimento imputado pela Comissão.

26.      Não satisfeita com a resposta da Hungria, a Comissão decidiu intentar a presente ação, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 29 de setembro de 2010.

27.      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 15 de fevereiro de 2011, a República Checa, a República da Letónia e a República da Polónia foram autorizadas a intervir em apoio dos pedidos da Hungria. Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de abril de 2011, a República Italiana foi autorizada a intervir em apoio dos pedidos da Hungria, ao abrigo do disposto no artigo 93.°, n.° 7 do Regulamento de Processo.

28.      Por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 6 de junho de 2012, a Comissão informou que desistia da sexta acusação formulada na sua ação, relativa ao artigo 11.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14, respeitante ao estabelecimento de um regime de melhoria do desempenho da rede ferroviária.

29.      A Comissão, a Hungria, a República Italiana e a República da Polónia estiveram representadas na audiência de 23 de maio de 2012.

IV — Fundamentos e argumentos das partes

A —    Quanto à primeira acusação, relativa à independência da atribuição dos traçados ferroviários

1.      Argumentação das partes

30.      A Comissão argumenta que, por força do artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440, uma empresa ferroviária não pode tomar decisões em matéria de atribuição de traçados, uma vez que a repartição dos mesmos é uma função essencial para garantir um acesso equitativo e não discriminatório à infraestrutura que é referida no anexo II da Diretiva 91/440 e à qual é aplicável a exigência de independência. Consequentemente, a repartição de capacidade da infraestrutura deve ser da responsabilidade de um organismo de repartição independente.

31.      Ora, a gestão do tráfego integra‑se na atribuição de traçado e deveria ser assegurada na Hungria pelo VPE, que é um organismo independente das empresas ferroviárias, e não pelo MÁV Zrt. e pelo GySEV Zrt., que são os gestores da infraestrutura, mas também empresas ferroviárias.

32.      Indica, por um lado, que o gestor do tráfego deve estar informado das decisões de repartição de capacidade para poder efetuar esta gestão. Se, na Hungria, os gestores da infraestrutura, MÁV Zrt. e GySEV Zrt, forem informados, nos termos do regulamento de exploração, de todas as decisões de atribuição de capacidade relativas aos seus concorrentes, os mesmos tornam‑se assim, no essencial, parte interessada neste processo de repartição de capacidade.

33.      Por outro lado, segundo a Comissão, gerir o tráfego implica, em caso de perturbação do serviço ou de perigo, que o gestor do tráfego adote as medidas necessárias ao restabelecimento das condições normais de circulação. Em tal caso, o gestor do tráfego não tem outra possibilidade a não ser afastar‑se do horário anteriormente escolhido para reatribuir os traçados e a capacidade de rede disponíveis. Na Hungria, cabe aos dois gestores da infraestrutura adotar as medidas destinadas a corrigir a perturbação, tomando em consideração as necessidades das empresas ferroviárias.

34.      A Comissão não contesta o facto de que, em situação normal, o gestor do tráfego se limita a executar as decisões adotadas pelo VPE, a fazer circular os comboios de acordo com os horários e não tem influência sobre as decisões de repartição de capacidade ou atribuições. Em contrapartida, o facto de o referido gestor intervir localmente para o restabelecimento da circulação em caso de perigo ou perturbação implica, segundo a Comissão, que ele tome decisões relativas à atribuição de traçados e disponha de uma margem de discricionariedade para o efeito. A supressão de um traçado é também uma intervenção que constitui uma função essencial relativa à atribuição dos traçados, na aceção do anexo II da Diretiva 91/440.

35.      A Comissão considera que uma empresa de transporte ferroviário que trata da gestão do tráfego obtém com isso uma vantagem concorrencial na medida em que, para poder cumprir as funções inerentes à referida gestão, esta empresa deve necessariamente ter um conhecimento pormenorizado dos serviços prestados pelas empresas ferroviárias, do volume dos mesmos e dos horários. Ora, é contrário aos artigos 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 e 14.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14 que uma empresa ferroviária, seja ela qual for, possa ter conhecimento, através da atividade de gestão do tráfego, da utilização da infraestrutura feita pelos seus concorrentes ou que, em certas condições, possa tomar decisões em consequência disso no que respeita à atribuição de traçados ou à repartição de capacidade da infraestrutura. A Comissão acrescenta que, no estabelecimento dos horários, o gestor do tráfego influencia sempre de facto o tráfego e que os concorrentes só conhecem os horários publicados e ignoram os movimentos ferroviários reais.

36.      No que respeita à relação entre a gestão do tráfego e a gestão da infraestrutura, a Comissão recorda que a exigência de independência a que está subordinada a atribuição dos traçados é igualmente aplicável quando esta atribuição tiver lugar no âmbito da gestão do tráfego. Esta última abrange numerosas funções manifestamente sem relação com a atribuição dos traçados, como a manutenção, a construção de vias e de outros investimentos, de que as empresas de transporte ferroviário podem ocupar‑se.

37.      O Governo húngaro alega que, nos termos do artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440, são consideradas funções essenciais as atividades expressamente mencionadas no anexo II da diretiva. O segundo parágrafo deste número define de maneira não exaustiva as funções que, embora podendo ser atividades na aceção do anexo II ou ser abrangidas por estas últimas, podem também ser asseguradas por empresas ferroviárias.

38.      A regulamentação húngara não permite ao gestor do tráfego proceder à redistribuição dos traçados, mesmo em caso de perigo ou de perturbação. Cabe exclusivamente ao VPE, enquanto organismo independente, atribuir os traçados e repartir a capacidade da infraestrutura.

39.      Com efeito, por um lado, a missão essencial do gestor do tráfego é executar as decisões de repartição de capacidade e de atribuição dos traçados adotadas pelo VPE. O gestor do tráfego não dispõe de poder de decisão neste domínio e não pode controlar os traçados atribuídos nem a capacidade. No âmbito do serviço de vigilância de 24 horas, o VPE tem a possibilidade de receber e de tratar os pedidos de traçados a qualquer hora do dia.

40.      Por outro lado, em caso de perigo ou de perturbação do serviço, o gestor do tráfego também não dispõe do poder de repartir a capacidade. Neste caso, a fim de restabelecer uma circulação normal, este gestor tem a possibilidade de intervir imediatamente e adotar medidas que garantam, com a maior rapidez possível, a utilização de um máximo de traçados e de capacidade entre os que são atribuídos pelo VPE.

41.      No entanto, no caso dos traçados que não podem ser utilizados apesar das medidas adotadas, o gestor da infraestrutura pode anular um traçado, direito igualmente previsto no artigo 14.°, n.° 8, do Regulamento n.° 913/2010, em certos casos. O Governo húngaro especifica que a possibilidade de o gestor do tráfego suprimir os traçados ferroviários só existe quando um troço tiver ficado momentaneamente inutilizável e, em qualquer caso, a circulação for impossível. Trata‑se, portanto, não de uma decisão discricionária de proibição de utilização de uma via, mas de um encerramento temporário de um troço ferroviário por razões de segurança durante o qual o VPE se esforça por colocar outro traçado ferroviário à disposição da empresa de transporte ferroviário em causa.

42.      Segundo o Governo húngaro, o restabelecimento da circulação normal dos comboios que implica medidas de carácter técnico e de segurança ferroviária, por um lado, e a reafetação dos traçados ferroviários que cabe ao VPE executar, por outro, são duas atividades distintas.

43.      Consequentemente, segundo as autoridades húngaras, o gestor do tráfego não tem nenhuma influência sobre a repartição dos traçados ferroviários, porque esta ocorre a montante da colocação em circulação. O gestor da infraestrutura tem a obrigação de celebrar um contrato, que é conforme com o traçado atribuído, com o beneficiário do direito de acesso, e de fazer circular o comboio deste de acordo com o traçado atribuído, sob pena de o referido gestor da infraestrutura se expor a consequências jurídicas previstas pelo contrato. Por conseguinte, o facto de tomar conhecimento das decisões de atribuição de capacidade depois de estas terem sido adotadas não equivale a tomar uma decisão relativa à atribuição dos traçados.

44.      O Governo húngaro considera que a gestão do tráfego se integra mais na gestão da infraestrutura, pelo que distinguir estas duas atividades seria irrealista e opor‑se‑ia à sua aplicação prática. A estreita relação entre a gestão do tráfego e a gestão da infraestrutura está, além disso, prevista na Diretiva 91/440, cujo artigo 3.° dispõe que pode fazer parte das missões do gestor da infraestrutura a gestão dos sistemas de regulação e de segurança.

45.      O Governo húngaro contesta que o gestor da infraestrutura, no quadro da sua atividade de gestão do tráfego, obtenha uma vantagem concorrencial na medida em que não procede a nenhuma atribuição dos traçados mesmo em caso de perturbação ou de perigo e em que só pode tomar conhecimento das informações referidas pela Comissão depois de as decisões relativas à repartição dos traçados já terem sido adotadas pelo VPE. Concorda com a Comissão quando diz que o gestor do tráfego deve necessariamente ter um conhecimento pormenorizado dos serviços oferecidos pelas empresas de transporte ferroviário, do volume dos serviços e dos horários.

46.      O Governo polaco apoia a argumentação do Governo húngaro segundo a qual a eventual intervenção do gestor do tráfego em caso de perturbação do tráfego ou de perigo não implica nenhuma nova repartição dos traçados. Trata‑se de adotar uma reação ad hoc, para a qual só está preparada a entidade que assegura a gestão quotidiana do tráfego ferroviário.

47.      O Governo polaco recorda também que o artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 exige unicamente que seja alcançado o objetivo de um acesso equitativo e não discriminatório à infraestrutura. O considerando 11 da Diretiva 2001/14 refere‑se a este objetivo. Ora, segundo o Governo polaco, a Comissão não apresentou nenhum argumento de facto ou de direito que demonstre que a Hungria não alcançou este objetivo.

48.      Nas suas observações relativas às alegações de intervenção da Polónia, a Comissão observa que, dado que a exigência de independência do organismo que atribui os traçados não é respeitada pela regulamentação húngara, é inútil citar casos de abusos concretos por parte dos gestores da infraestrutura na medida em que esta exigência visa precisamente garantir que, pelo estabelecimento das estruturas adequadas, o objetivo fixado pode, em geral, ser alcançado.

2.      Análise da primeira acusação

a)      Observações preliminares

49.      A Diretiva 91/440, na sua versão original, iniciou a liberalização do transporte ferroviário ao instituir um direito de acesso à infraestrutura ferroviária em benefício das empresas de transporte. A instituição deste direito de acesso é acompanhada por um princípio de separação entre a gestão da infraestrutura e a atividade de serviços de transporte. No entanto, o referido princípio de separação não tinha por objeto as estruturas mas as funções, mais precisamente a função contabilística. A separação pode ser realizada a título opcional pela criação de divisões orgânicas distintas dentro da mesma empresa ou confiando‑se a gestão da infraestrutura a uma entidade distinta. O modelo nacional integrado não foi assim posto em causa.

50.      As Diretivas 95/18/CE e 95/19/CE (10), e posteriormente as do primeiro pacote ferroviário, tiveram no entanto por objetivo instituir o direito de acesso, ao prever a criação de licenças para as empresas de transporte e de regras para a repartição de capacidade e para a tarificação das taxas. Para assegurar um acesso não discriminatório, o artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 consagrou o princípio da independência do órgão encarregado das funções essenciais, as quais são atualmente enunciadas no anexo II da referida diretiva.

51.      Trata‑se da concessão de licenças às empresas de transporte ferroviário, da repartição de capacidade, da atribuição de traçados individuais, da determinação da taxa paga pelas empresas de transporte e da supervisão do cumprimento das obrigações de serviço público. O artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 e os artigos 4.°, n.° 2, e 14.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14 referem respetivamente a independência de «entidades ou empresas» de acesso à rede, de um «organismo de tarificação» e de um «organismo de repartição» das capacidades.

52.      As referidas funções essenciais correspondem às funções que não podem em caso algum ser exercidas por uma empresa de transporte ferroviário. Estas funções podem, em contrapartida, ser exercidas quer pelo gestor, se for independente de qualquer empresa ferroviária, designadamente do operador histórico, quer, se assim não for, por um «organismo». Todas as decisões dos órgãos encarregados de funções essenciais podem ser objeto de recurso para uma entidade reguladora independente instituída pelo artigo 30.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14.

53.      A função essencial de repartição e de atribuição de traçados é assegurada na Hungria pelo VPE, que é um organismo independente das empresas de transporte ferroviário. Em contrapartida, a MÁV Zrt. e a GySEV Zrt., que são os gestores da infraestrutura, são também empresas de transporte ferroviário. No cerne da primeira acusação da Comissão está pois a questão de saber se a gestão do tráfego se enquadra no conceito de gestão da infraestrutura e, na afirmativa, se abrange a repartição e a atribuição de traçados e se, consequentemente, deve estar reservada a um organismo independente das empresas de transporte ferroviário. Para poder responder a estas questões, importa clarificar o sentido exato dos conceitos de «função essencial» e de «traçado».

b)      Função essencial e traçado

54.      Nos termos do anexo II da Diretiva 91/440, entre as funções essenciais referidas no artigo 6.°, n.° 3, figuram a «preparação e processo de decisão» relativo à concessão de licenças a empresas de transporte ferroviário, o «processo de decisão» relativo à atribuição de traçados, incluindo a «atribuição» de traçados individuais, o «processo de decisão» relativo à tarificação da infraestrutura, e a «supervisão» do cumprimento das obrigações de serviço público impostas pela prestação de determinados serviços. Por conseguinte, para efeitos da regulamentação da União em matéria ferroviária, uma função essencial consiste em atividades de natureza administrativa ou quase administrativa, como a preparação e o processo de decisão ou a supervisão do cumprimento das obrigações.

55.      Em contrapartida, nos termos do anexo II, ponto 1, da Diretiva 2001/14, o conjunto dos serviços mínimos que o gestor da infraestrutura deve fornecer às empresas ferroviárias inclui, designadamente, na alínea d), a regulação da circulação dos comboios, incluindo a sinalização, a regulação, a expedição e a comunicação e transmissão de informações sobre o movimento da composição, e, na alínea e), quaisquer outras informações necessárias à implementação ou operação do serviço para o qual a capacidade foi concedida. Trata‑se, pois, de prestações de serviços que, em minha opinião, se inserem no conceito de gestão do tráfego ferroviário.

56.      Segundo o artigo 2.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14, entende‑se por «traçado», a capacidade de infraestrutura necessária para a circulação de um comboio entre dois pontos em determinado momento. Ora, a atribuição de um traçado pela sua inclusão no horário ou mediante uma decisão ad hoc nos termos do artigo 23.° da Diretiva 2001/14 constitui para a empresa de transporte ferroviário um direito de utilizar uma capacidade determinada da infraestrutura. Juridicamente, isso corresponde à atribuição de uma licença ou de uma autorização administrativa ou quase administrativa. Esta interpretação encontra apoio no artigo 13.°, n.° 2, que prevê um «direito de utilização de uma capacidade de infraestrutura específica na forma de um traçado».

57.      Como todos os direitos, os direitos na forma de traçados são também suscetíveis de serem exercidos pelo seu titular ao desenvolver as atividades abrangidas pelo âmbito de aplicação do referido direito. No que respeita aos traçados, o exercício consiste na exploração do troço em questão no momento coberto pelo traçado. Importa acrescentar que a subutilização de um traçado pode, nos termos do artigo 27.° da Diretiva 2001/14, implicar a obrigação de renunciar ao mesmo.

58.      Com base nestas reflexões, parece‑me que a gestão do tráfego consiste em prestações incluídas no âmbito da gestão da infraestrutura. Com efeito, nos termos do artigo 2.°, alínea h), da Diretiva 2001/14, a gestão da infraestrutura pode igualmente incluir a «gestão dos sistemas de controlo e de segurança da infraestrutura».

59.      Resulta das considerações precedentes que as atividades de gestão do tráfego abrangem não a adoção de decisões relativas à atribuição de traçados, mas unicamente a execução dessas decisões, seja pela adoção de horários ou pela atribuição de traçados ad hoc. A gestão do tráfego ferroviário representa uma atividade factual que visa garantir o exercício efetivo, com toda a segurança, dos direitos de utilizar capacidade na forma de traçados. Dito de outro modo, quando o gestor da rede atribui a um comboio um sinal verde, esta medida não é constitutiva de um direito ao traçado. Da mesma maneira, um sinal vermelho acionado pelo gestor da rede não equivale a uma renúncia de traçado. Importa, pois, evitar quaisquer confusões entre a existência dos direitos e o exercício dos mesmos, uma vez que os sistemas estabelecidos para efeitos da regulamentação das diferentes formas do tráfego através da concessão de direitos se situam num nível inteiramente distinto do controlo quotidiano do exercício desses direitos pelas autoridades competentes, como o policiamento, a pilotagem ou a gestão do tráfego ferroviário.

60.      Consequentemente, a gestão do tráfego não implica uma tomada de decisão na aceção da lista das funções essenciais. Ora, dado que resulta do artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 que os Estados‑Membros podem encarregar as empresas de transporte ferroviário, ou qualquer outra entidade, da gestão da infraestrutura ferroviária que não se integre nas funções essenciais, a gestão do tráfego pode ser confiada a empresas ferroviárias como a MÁV Zrt. e a GySEV Zrt.

61.      Esta conclusão baseia‑se numa interpretação literal e sistemática das Diretivas 91/440 e 2001/14. Acrescente‑se que é dificilmente concebível que o legislador tenha conscientemente deixado de mencionar uma questão tão importante como a gestão do tráfego no anexo II da Diretiva 91/440, se o seu objetivo fosse fazê‑la figurar entre as funções essenciais. Resta, no entanto, analisar se a argumentação teleológica desenvolvida pela Comissão é suscetível de comprometer esta conclusão.

62.      Segundo a Comissão, o gestor do tráfego deve estar informado sobre as decisões de repartição de capacidade para poder exercer esta gestão, pelo que, dado que a MÁV Zrt. e a GySEV Zrt são informadas, de acordo com o regulamento de exploração, de todas as decisões de atribuição de capacidade relativas aos seus concorrentes, estes operadores tornam‑se assim, no essencial, parte interessada no processo de repartição de capacidade.

63.      Este argumento não é convincente. Na realidade, a repartição de capacidade consiste quer na determinação de horários dos serviços regulares para a rede, quer na adoção de decisões individuais de atribuição de traçados ad hoc. Tanto num caso como no outro, a Diretiva 2001/14 estabelece regras pormenorizadas que impõem ao organismo de repartição gestor da infraestrutura obrigações processuais e de fundo. Não identifico o alegado nexo entre as atividades incluídas na gestão do tráfego ferroviário e as funções do organismo de repartição descritas no capítulo III da Diretiva 2001/14.

64.      No que respeita ao facto de a MÁV Zrt. e a GySEV Zrt serem necessariamente informadas de quaisquer decisões de atribuição de capacidade relativas aos seus concorrentes, é forçoso observar que tais decisões de atribuição de capacidade são geralmente incluídas nos horários de serviço regulares que, por natureza, estão acessíveis aos terceiros. No que respeita às decisões de atribuição de traçados ad hoc, parece‑me que o gestor da infraestrutura, mesmo que não estivesse encarregado da gestão do tráfego, deveria ser informado das mesmas, tendo em conta a eventualidade de obras de manutenção no troço em causa e a necessidade de ter acesso a serviços, como a utilização das conexões e das agulhas da rede.

65.      Ora, ao aceitar que a gestão da infraestrutura, com a exceção das funções essenciais, possa ser atribuída às empresas ferroviárias ou a qualquer outra entidade, o legislador da União admitiu necessariamente que, quando a manutenção da rede for entregue a uma empresa de transporte ferroviário, esta última tem necessidade das informações relativas à repartição de capacidade.

66.      Falta ainda analisar o argumento da Comissão segundo o qual gerir o tráfego implica, em caso de perturbação do serviço ou de perigo, que o gestor do tráfego tome as medidas necessárias ao restabelecimento das condições normais de circulação. Nesse caso, o gestor do tráfego não tem outra alternativa a não ser afastar‑se do horário aprovado anteriormente para reafetar os traçados e a capacidade de rede disponíveis. O facto de o referido gestor intervir localmente para restabelecer a circulação, em caso de perigo ou de perturbação, implica, segundo a Comissão, que ele tome decisões relativas à atribuição de traçados e disponha de livre arbítrio neste domínio. A supressão de um traçado é também uma intervenção que é uma função fundamental atinente à atribuição dos traçados, na aceção do anexo II da Diretiva 91/440.

67.      Este argumento parece‑me baseado numa confusão entre o estabelecimento de direitos e o seu exercício. A concessão de direitos a uma capacidade determinada na forma de traçados é uma função essencial que, na Hungria, é atribuída exclusivamente ao VPE. Como o Governo húngaro demonstrou, isso é igualmente válido no caso de perturbação da circulação ferroviária resultante de falha técnica ou acidente, referido no artigo 29.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14 (11). É o gestor da infraestrutura que deve adotar todas as disposições necessárias para assegurar o restabelecimento da situação normal, função essa que pode incluir a supressão dos traçados. Em contrapartida, a sua reatribuição incumbe ao organismo de repartição independente, no caso, o VPE.

68.      A gestão do tráfego consiste em medidas adotadas pelo gestor para que os direitos à capacidade na forma de traçados possam ser exercidos. Este tipo de decisões não pode ser equiparado a uma repartição, ou mesmo a uma atribuição de traçados. Se assim não fosse, uma empresa ferroviária, por exemplo, titular de um direito ao traçado entre as cidades A e B, das 15h às 16h, dispunha de duas atribuições de traçado, a primeira correspondente à adoção do horário de serviço pelo organismo competente e a segunda na passagem para sinal verde na estação da cidade A, às 15h, por iniciativa do gestor do tráfego. Esta análise não pode convencer.

69.      Por esta razão, as decisões do gestor do tráfego de suprimir traçados em caso de urgência e de necessidade absoluta devem ser consideradas não como reatribuições de traçados, mas como intervenções urgentes que afetam o seu exercício. Tendo em conta que, segundo a redação do mesmo, o primeiro parágrafo do artigo 29.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14 não define a entidade habilitada a decidir sobre essas intervenções urgentes, contrariamente aos casos referidos no n.° 1 ou no segundo parágrafo do n.° 2, não está excluído que se possa tratar do gestor da infraestrutura, mesmo quando se trate de uma empresa de transporte ferroviário ou das autoridades policiais ou de proteção civil.

70.      Pelas razões expostas, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue improcedente a primeira acusação da Comissão.

B —    Quanto à segunda acusação, relativa à independência da tarificação

1.      Argumentação das partes

71.      A Comissão argumenta que, por força dos artigos 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440, e 4.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14, uma entidade prestadora de serviços de transporte ferroviário não pode tomar decisões relativas à determinação das taxas, estando apenas habilitada para a cobrança das mesmas. Em conformidade com estas disposições, a determinação e a fixação das taxas devem ser asseguradas por um organismo de tarificação independente.

72.      Segundo a Comissão, a regulamentação húngara é contrária a estas duas disposições na medida em que as faturas detalhadas das taxas a pagar pela utilização da infraestrutura são estabelecidas pelos gestores da infraestrutura, a MÁV Zrt. e a GySEV Zrt, que são também empresas de transporte ferroviário.

73.      A Comissão observa que a expressão «determinação das taxas de utilização da infraestrutura» referida no artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14 deve ser entendida, por um lado, como a fixação geral das taxas, que consiste em consignar no regulamento de exploração, para cada troço, o montante da taxa por quilómetro e, por outro lado, como o cálculo concreto dos montantes devidos pelos diversos utilizadores, com base na dimensão do troço utilizado. Por força do artigo 4.°, n.° 2, da referida diretiva, a possibilidade de um gestor da infraestrutura não independente se encarregar da cobrança das taxas devia ser interpretada de forma estrita, dado tratar‑se de uma exceção à regra.

74.      A Comissão considera que uma empresa de transporte ferroviário que esteja encarregada de emitir as faturas detalhadas das taxas obtém com isso uma vantagem concorrencial na medida em que estas refletem necessariamente os serviços utilizados pelas empresas ferroviárias concorrentes, o volume destes serviços e as horas da utilização dos mesmos. Ora, o artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 invoca expressamente o princípio de acesso equitativo e não discriminatório.

75.      O Governo húngaro contesta que os gestores da infraestrutura tomem decisões relativas à determinação das taxas, na medida em que estão encarregados da faturação que compreende a cobrança de taxas, a qual não é uma função essencial na aceção da Diretiva 91/440 que deva ser realizada por um organismo independente. A faturação é apenas um meio técnico necessário à cobrança das referidas taxas.

76.      O Governo húngaro estabelece uma distinção entre a formação das taxas, a fixação efetiva destas e a sua cobrança. O primeiro destes conceitos corresponde ao estabelecimento das diferentes regras de tarificação, que é efetuado pelo Estado‑Membro ou pelo gestor da infraestrutura. A fixação destas taxas consiste em fixar as diferentes taxas individuais que uma dada empresa ferroviária deve pagar numa situação concreta, em função dos serviços que solicitou. Cabe ao VPE, enquanto organismo independente reconhecido pela Comissão, executar as tarefas associadas à formação e à fixação das taxas. A cobrança das taxas designa o ato de pagamento concreto pelo qual as taxas que foram fixadas são pagas ao gestor da infraestrutura. A faturação é apenas a tradução técnica das taxas fundadas nos cálculos do VPE e, consequentemente, não se inclui nem na formação das taxas nem na sua fixação concreta, mas na cobrança das mesmas.

77.      As autoridades húngaras põem em causa o facto de o acesso a informações obtidas a partir das faturas detalhadas ter por efeito falsear a concorrência, na medida em que o gestor da infraestrutura não tem influência material sobre a fixação das taxas de acesso à rede. Além disso, o gestor da infraestrutura conhece necessariamente estas informações através de outras fontes, como, por exemplo, o contrato celebrado com a empresa ferroviária. Mesmo no caso de o gestor da infraestrutura tomar conhecimento de informações que até aí desconhecia, não pode, em caso nenhum, divulgá‑las aos setores que asseguram o transporte ferroviário.

78.      O Governo polaco defende, à semelhança do Governo húngaro, que a faturação não consiste em determinar o montante das taxas nem em adotar uma qualquer decisão sobre as questões associadas à sua cobrança, mas antes num elemento da tarificação, na aceção do artigo 4.°, n.° 2, da Diretiva 2001/14. Com efeito, a faturação é uma atividade secundária que visa, através de operações matemáticas, determinar um resultado a partir de uma taxa previamente determinada e em função dos traçados atribuídos anteriormente e da utilização que deles foi feita.

2.      Análise da segunda acusação

79.      Importa observar antes de mais que a segunda acusação abrange a mesma problemática que a primeira acusação no processo Comissão/Espanha, já referido, relativo à independência da tarificação, mas numa perspetiva inversa. Ora, no referido processo, a acusação da Comissão é relativa à interpretação do conceito de «determinação» das taxas na perspetiva da delimitação das competências respetivas do Estado‑Membro e do gestor da infraestrutura (12). No presente processo, a questão da interpretação prende‑se com o conceito de «cobrança» ou mesmo de «pagamento», uma função que pode também ser exercida por um gestor da infraestrutura não independente das sociedades ferroviárias, diversamente da «determinação das taxas» que constitui uma função essencial. Dito de outro modo, o Tribunal de Justiça deve definir o que implica no mínimo a função essencial de «determinação das taxas» relativamente a atores não independentes, enquanto no processo Comissão/Espanha, já referido, se trata de definir o que implica, no máximo, esta mesma função essencial em relação ao Estado.

80.      A este respeito, recorde‑se que, por força do artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14, os Estados‑Membros devem estabelecer um «quadro» para a tarificação e podem igualmente estabelecer regras de tarificação específicas, respeitando a independência de gestão do gestor da infraestrutura. Cabe a este último determinar a taxa para a utilização da infraestrutura e encarregar‑se da sua cobrança. Esta última função não constitui, portanto, uma função essencial e, consequentemente, pode ser delegada a operadores não independentes. De facto, segundo o artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440, os Estados‑Membros podem encarregar as empresas de transporte ferroviário, ou qualquer outra entidade, da «cobrança» das taxas (13).

81.      Segundo o Governo húngaro, pode estabelecer‑se uma distinção entre a formação das taxas, a fixação efetiva destas e a sua cobrança. Refira‑se que a Comissão sublinha, no processo C‑483/10, Comissão/Espanha, já referido, que o termo «determinação» possui um sentido diferente do termo «liquidação», que é apenas uma etapa no processo de cobrança e deve ser considerado como abrangido pelo conceito de «cobrança».

82.      Parece‑me que a Diretiva 2001/14, através do verbo «determinar», estabelece um domínio reservado ao gestor da infraestrutura, no que respeita à tarificação. O seu limite superior, em relação ao Estado, consiste na exigência de uma margem de manobra no quadro da tarificação em relação às regras fixadas pelo Estado. O seu limite inferior — abaixo do qual começa o domínio da «cobrança» — em relação a operadores não independentes corresponde à distinção entre um cálculo mecânico com base em dados e critérios objetivos e decisões que implicam escolhas e apreciações relativas aos fatores que entram no referido cálculo. Este último limite é o que justifica a necessidade de um organismo de tarificação separado quando o gestor da infraestrutura não é independente no plano jurídico, organizativo ou decisório.

83.      Segundo o Governo húngaro, a faturação é a mera tradução técnica das taxas baseadas nos cálculos do VPE e, consequentemente, não se insere nem na função de formação das taxas, nem na da fixação concreta destas, mas na da simples cobrança das taxas (14). Parece‑me que a Comissão não nega a natureza mecânica da faturação, mas considera que o conceito de cobrança deve, enquanto exceção, ser objeto de uma interpretação estrita, pelo que a determinação das taxas inclui também o cálculo concreto dos montantes devidos pelos diversos utilizadores, com base na dimensão do troço utilizado.

84.      Parece‑me pois que o elemento determinante, do ponto de vista da Comissão, é que uma empresa ferroviária que está encarregada de emitir as faturas detalhadas das taxas obtém com isso uma vantagem concorrencial, na medida em que, deste modo, pode ter acesso a informações relativas aos serviços utilizados pelas empresas ferroviárias concorrentes, ao volume destes serviços e às horas da sua utilização.

85.      Não julgo que a análise da Comissão seja suscetível de fundar a conclusão a que a Comissão procura chegar. Parece‑me difícil imaginar um sistema de «cobrança» de taxas em que quem for responsável por ele e que, segundo a regulamentação da União, pode ser uma empresa ferroviária, não tome conhecimento dos elementos justificativos subjacentes às faturas cuja cobrança assegura. Ora, na perspetiva das informações a que a entidade responsável pela cobrança tem acesso, não há uma diferença decisiva entre uma faturação por aplicação mecânica de uma fórmula de cálculo a dados que são facultados à referida entidade, e a cobrança dos montantes objeto de faturas preparadas por um terceiro.

86.      Acresce que, como já salientei (v. n.° 64, supra), o gestor da infraestrutura está necessariamente consciente da repartição de capacidade. Com base nesta informação, noutras informações livremente acessíveis nos serviços ferroviários, e nos montantes a cobrar, pode facilmente tirar as conclusões em apreço quanto aos serviços dos concorrentes (15).

87.      Pelas razões expostas, considero que a Comissão não demonstrou que a Hungria não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.°, n.° 3, da Diretiva 91/440 no que respeita à faturação das taxas.

88.      Daqui concluo que a segunda acusação da Comissão deve ser julgada improcedente.

C —    Quanto à terceira acusação, relativa ao equilíbrio financeiro do gestor da infraestrutura e às medidas de incentivo à redução dos custos e das taxas

1.      Argumentação das partes

89.      A Comissão acusa a Hungria de não ter definido as condições que garantem o equilíbrio financeiro dos gestores da infraestrutura, contrariamente ao que exige o artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14. Salienta que o artigo 28.°, n.° 1, da Lei relativa aos caminhos de ferro dispõe que o ministro competente se compromete, mediante contrato, a financiar as despesas consideradas justificadas suportadas no âmbito da gestão da rede ferroviária nacional pela empresa ferroviária responsável pela gestão da infraestrutura. Ora, esse contrato ainda não foi outorgado.

90.      Do mesmo modo, a Comissão argumenta que a regulamentação húngara não comporta medidas de incentivo à redução dos custos e das taxas, contrariamente ao disposto no artigo 6.°, n.os 2 e 3, da Diretiva 2001/14. Reporta‑se ao referido artigo 28.°, n.° 1, da Lei relativa aos caminhos de ferro, que prevê que o contrato nela indicado deve incentivar os gestores da infraestrutura a reduzirem as suas despesas de gestão e as taxas de acesso à rede.

91.      O Governo húngaro alega, a este respeito, que está atualmente em preparação um projeto de contrato na aceção do artigo 28.°, n.° 1, da Lei relativa aos caminhos de ferro.

92.      Na sua réplica, a Comissão indica que ainda não recebeu este projeto de contrato e que, consequentemente, não tem condições para apreciar se estas novas disposições são conformes com a Diretiva 2001/14.

2.      Análise da terceira acusação

93.      No que respeita à terceira acusação, relativa ao equilíbrio financeiro do gestor da infraestrutura e às medidas de incentivo à redução dos custos e das taxas, basta observar que o Governo húngaro não contesta a referida acusação. Limita‑se a alegar que está em preparação o projeto de contrato referido no artigo 28.°, n.° 1, da Lei relativa aos caminhos de ferro, pelo qual o ministro competente se compromete a financiar as despesas efetuadas no âmbito da gestão da infraestrutura e que deve incentivar os gestores da infraestrutura a reduzirem as suas despesas de gestão e as taxas de acesso.

94.      Ora, segundo jurisprudência constante, a existência do incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro tal como esta se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado (16).

95.      Daqui concluo que a terceira acusação da Comissão deve ser julgada procedente.

D —    Quanto à quarta acusação, relativa à determinação das taxas com base nos custos diretos

1.      Argumentação das partes

96.      Na sua petição, a Comissão alega que a regulamentação húngara não é conforme com o artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14, na medida em que atualmente não inclui nenhuma disposição que assegure a aplicação do princípio dos custos diretos, contrariamente ao que exige esta disposição.

97.      Na sua contestação, o Governo húngaro defende que o VPE redigiu o Regulamento n.° 83/2007 (X.6) GKM‑PM, que estabelece o método de determinação das taxas, que entrou em vigor em 12 de dezembro de 2010, por um prazo de cinco anos a contar do exercício 2010/2011.

98.      Na réplica, a Comissão indica que o documento que aprova o método de determinação das taxas ainda não foi enviado e sustenta, pela leitura da contestação, que não lhe parece que este método cumpra os requisitos do artigo 7.° da Diretiva 2001/14.

99.      O Governo polaco salienta que a Comissão indicou no seu parecer fundamentado que os custos diretos referidos no artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14 devem ascender a 35% do custo total de manutenção da infraestrutura. Segundo o Governo polaco, esta afirmação não encontra nenhum fundamento na Diretiva 2001/14, na medida em que esta não define o conceito de custo diretamente imputável à exploração do serviço ferroviário e em que os Estados‑Membros dispõem de uma certa liberdade para estabelecer as taxas de acesso à infraestrutura.

2.      Análise da quarta acusação

100. Na medida em que a quarta acusação deva ser entendida como sendo unicamente relativa a uma violação do artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14, a comprovação do incumprimento a este respeito não suscita nenhum problema específico, dado que, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado de 8 de outubro de 2009, a legislação húngara não continha nenhum método de determinação das taxas com base nos custos diretos, uma vez que esta entrou em vigor em 12 de dezembro de 2010.

101. Concluo, pois, que a quarta acusação da Comissão deve ser julgada procedente.

V —    Quanto às despesas

102. Por força do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

103. Tendo a Comissão pedido a condenação da Hungria nas despesas, este pedido deverá ser julgado procedente se, como proponho, a ação por incumprimento for, na maior parte do requerido, julgada procedente.

104. Em conformidade com o disposto no artigo 69.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, a República Checa, a República da Letónia e a República da Polónia, que pediram para intervir no presente litígio, suportarão as suas próprias despesas.

VI — Conclusão

105. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça declare o seguinte:

«1)      A Hungria não cumpriu as obrigações que lhe incumbem

¾        por força do artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2001, relativa à repartição de capacidade da infraestrutura ferroviária e à aplicação de taxas de utilização da infraestrutura ferroviária, conforme alterada pela Diretiva 2004/49/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, ao não adotar medidas que assegurem o equilíbrio financeiro dos gestores da infraestrutura;

¾        por força do artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2001/14, conforme alterada pela Diretiva 2004/49, ao não encorajar, através de medidas de incentivo, os gestores da infraestrutura a reduzirem os custos de fornecimento da infraestrutura e o nível das taxas de acesso;

¾        por força do artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14, conforme alterada pela Diretiva 2004/49, ao não garantir que as taxas cobradas pelo pacote mínimo de acesso e o acesso pela rede às infraestruturas de serviços são iguais ao custo diretamente imputável à exploração do serviço ferroviário.

2)      A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

3)      A Hungria é condenada nas despesas.

4)      A República da Polónia, a República da Letónia e a República Checa suportam as suas próprias despesas.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      Diretiva do Conselho, de 29 de julho de 1991, relativa ao desenvolvimento dos caminhos de ferro comunitários (JO L 237, p. 25).


3 —      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2001 (JO L 75, p. 1).


4 —      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2001, relativa à repartição de capacidade da infraestrutura ferroviária, à aplicação de taxas de utilização da infraestrutura ferroviária e à certificação de segurança (JO L 75, p. 29).


5 —      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004 (JO L 164, p. 44). Note‑se que o título da Diretiva 2001/14 foi alterado pelo artigo 30.° da Diretiva 2004/49. Atualmente, intitula‑se «Diretiva 2001/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2001, relativa à repartição de capacidade da infraestrutura ferroviária e à aplicação de taxas de utilização da infraestrutura ferroviária».


6 —      Trata‑se dos processos pendentes no Tribunal de Justiça, Comissão/Espanha (C‑483/10); Comissão/Polónia (C‑512/10); Comissão/Grécia (C‑528/10); Comissão/República Checa (C‑545/10); Comissão/Áustria (C‑555/10); Comissão/Alemanha (C‑556/10); Comissão/Portugal (C‑557/10); Comissão/França (C‑625/10); Comissão/Eslovénia (C‑627/10); Comissão/Itália (C‑369/11), e Comissão/Luxemburgo (C‑412/11).


7 —      Magyar Közlöny 2005/172.


8 —      Magyar Közlöny 2007/134.


9 —      Magyar Közlöny 2007/181.


10 —      Diretiva 95/18/CE do Conselho, de 19 de junho de 1995, relativa às licenças das empresas de transporte ferroviário (JO L 143, p. 70) e Diretiva 95/19/CE do Conselho, de 19 de junho de 1995, relativa à repartição das capacidades de infraestrutura ferroviária e à cobrança de taxas de utilização da infraestrutura (JO L 143, p. 75).


11 —      As disposições nacionais pertinentes figuram no artigo 23.° do Regulamento n.° 101/2007 (XII.22) GKM e no ponto 4.8.1 do regulamento de exploração da rede 2009‑2010.


12 —      Acrescente‑se que esta questão é colocada de forma diferente no processo Comissão/República Checa, já referido.


13 —      Duvido de que as diferentes expressões utilizadas («perception» e «recouvrement»: «cobrança») nas versões francesas das Diretivas 91/440 e 2001/14 reflitam uma distinção jurídica.


14 —      O Governo indica, na sua tréplica, que a VPE fixa o montante a pagar pelos utilizadores individuais, calculado tendo em conta a distância do troço que estes pretendem utilizar, as suas características e os serviços propostos no âmbito da colocação em circulação. O gestor da infraestrutura, por sua vez, limita‑se a enviar ao utilizador uma fatura emitida com base no montante que é determinado na atribuição do traçado.


15 —      V. artigo 8.°, n.° 3, da Diretiva 2001/14 (transparência da tarificação) e anexo I da referida diretiva.


16 —      V., designadamente, acórdãos de 3 de fevereiro de 2011, Comissão/Bélgica (C‑391/10, n.° 8), e de 14 de abril de 2011, Comissão/Luxemburgo (C‑390/10, n.° 11).