Language of document : ECLI:EU:C:2011:761

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

22 de Novembro de 2011 (*)

«Organização do tempo de trabalho – Directiva 2003/88/CE – Direito a férias anuais remuneradas – Extinção do direito a férias anuais remuneradas não gozadas por motivo de doença após o decurso de um prazo previsto pela regulamentação nacional»

No processo C‑214/10,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Landesarbeitsgericht Hamm (Alemanha), por decisão de 15 de Abril de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 4 de Maio de 2010, no processo

KHS AG

contra

Winfried Schulte,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, J.-C. Bonichot e U. Lõhmus, presidentes de secção, A. Rosas, E. Levits (relator), A. Ó Caoimh, L. Bay Larsen e A. Arabadjiev, juízes,

advogado-geral: V. Trstenjak,

secretário: B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 3 de Maio de 2011,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da KHS AG, por P. Brasse, Rechtsanwalt,

–        em representação de W. Schulte, por H.-J. Teuber, Rechtsanwalt,

–        em representação do Governo alemão, por T. Henze, C. Blaschke e J. Möller, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo dinamarquês, por V. Pasternak Jørgensen e S. Juul Jørgensen, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por F. Erlbacher e M. van Beek, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 7 de Julho de 2011,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 7.° da Directiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro de 2003, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho (JO L 299, p. 9).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a KHS AG a W. Schulte, seu antigo empregado, a propósito do pedido apresentado por este no sentido de beneficiar de uma retribuição financeira por férias anuais remuneradas não gozadas, em relação aos anos de 2006 a 2008, devido às consequências de um enfarte.

 Quadro jurídico

 Convenção n.° 132 da Organização Internacional do Trabalho

3        Nos termos do artigo 9.°, n.° 1, da Convenção n.° 132 da Organização Internacional do Trabalho, de 24 de Junho de 1970, sobre as férias anuais remuneradas (revista):

«A parte [in]interrupta das férias pagas anuais mencionadas no parágrafo 2 do artigo 8.° da presente Convenção deverá ser concedida e gozada no prazo de um ano, o máximo, e o resto das férias pagas anuais num prazo de dezoito meses, o máximo, a contar do fim do ano que conferir o direito às férias.»

4        A referida convenção foi assinada por catorze Estados‑Membros da União Europeia, entre os quais a República Federal da Alemanha.

 Regulamentação da União

5        Nos termos do sexto considerando da Directiva 2003/88:

«Deve ter-se em conta os princípios da Organização Internacional do Trabalho em matéria de organização do tempo de trabalho, incluindo os relativos ao trabalho nocturno.»

6        O artigo 1.° da Directiva 2003/88 dispõe:

«Objectivo e âmbito de aplicação

1.      A presente directiva estabelece prescrições mínimas de segurança e de saúde em matéria de organização do tempo de trabalho.

2.      A presente directiva aplica-se:

a)      Aos períodos mínimos [...] de descanso anual [...]

[...]»

7        O artigo 7.° desta directiva tem a seguinte redacção:

«Férias anuais

1.      Os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para que todos os trabalhadores beneficiem de férias anuais remuneradas de pelo menos quatro semanas, de acordo com as condições de obtenção e de concessão previstas nas legislações e/ou práticas nacionais.

2.      O período mínimo de férias anuais remuneradas não pode ser substituído por retribuição financeira, excepto nos casos de cessação da relação de trabalho.»

8        O artigo 17.° da Directiva 2003/88 dispõe que os Estados‑Membros podem derrogar certas disposições desta directiva. Não é admitida nenhuma derrogação ao artigo 7.° da referida directiva.

 Legislação nacional

9        A Lei federal relativa às férias (Bundesurlaubsgesetz), de 8 de Janeiro de 1963, na sua versão de 7 de Maio de 2002 (a seguir «BUrlG»), prevê, no seu § 1, intitulado «Direito a férias»:

«Todos os trabalhadores têm direito, em cada ano civil, a férias remuneradas.»

10      O § 3 da BUrlG, intitulado «Duração das férias», dispõe, no seu n.° 1:

«As férias serão de, pelo menos, 24 dias úteis por ano.»

11      O § 7 da BUrlG, intitulado «Aquisição, reporte e remuneração das férias», prevê, nos seus n.os 3 e 4:

«3.      As férias devem ser concedidas e gozadas durante o ano civil em curso. Só podem ser gozadas no ano civil seguinte quando tal se justifique por motivos imperiosos da conveniência do serviço ou do trabalhador. Caso não sejam gozadas, as férias devem ser concedidas e gozadas nos primeiros três meses do ano civil seguinte.

4)      Caso as férias não possam ser concedidas total ou parcialmente, devido à cessação da relação de trabalho, devem ser substituídas por uma remuneração compensatória.»

12      O § 13 da BUrlG prevê que as convenções colectivas podem derrogar certas disposições desta lei, entre as quais o § 7, n.° 3, segundo período, desde que essas derrogações não sejam desfavoráveis aos trabalhadores.

13      A Convenção Colectiva de Trabalho Unitária para a Indústria Metalúrgica e Electrónica da Renânia do Norte-Vestefália (Einheitlicher Manteltarifvertrag für die Metall- und Elektroindustrie Nordrhein-Westfalens), de 18 de Dezembro de 2003 (a seguir «EMTV»), prevê, no seu § 11, intitulado «Princípios da concessão de férias»:

«1)      Os trabalhadores/estagiários têm direito a férias remuneradas em cada ano, nos termos das disposições seguintes. O ano de referência das férias corresponde ao ano civil.

O direito a férias extingue‑se três meses após o decurso do ano civil, a menos que tenha sido reclamado sem êxito ou que as férias não possam ter sido gozadas por motivos de serviço.

Se as férias não tiverem sido gozadas por doença, o direito a férias extingue‑se 12 meses após o decurso do período de tempo referido no segundo parágrafo.

[…]

3)      Só é permitido compensar as férias após a cessação da relação de trabalho/estágio.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

14      W. Schulte trabalhou, desde Abril de 1964, como serralheiro para a KHS AG ou para a empresa que sucedeu a esta. O seu contrato de trabalho era regulado pela EMTV. O direito a férias anuais remuneradas garantido pela EMTV era de 30 dias por ano.

15      No mês de Janeiro de 2002, W. Schulte sofreu um enfarte, na sequência do qual ficou gravemente incapacitado e foi declarado inapto para o trabalho. A partir do mês de Outubro de 2003, passou a receber uma pensão por invalidez total. Esta situação manteve‑se até 31 de Agosto de 2008, data em que a relação de trabalho de W. Schulte cessou.

16      Em Março de 2009, W. Schulte apresentou no Arbeitsgericht Dortmund um pedido de pagamento da compensação correspondente às férias anuais remuneradas não gozadas, relativas aos períodos de referência correspondentes aos anos civis de 2006, 2007 e 2008.

17      O Arbeitsgericht Dortmund deferiu o pedido em relação a estes três períodos, na medida em que a compensação reclamada por W. Schulte tinha por objecto as férias anuais remuneradas mínimas de 20 dias por ano, ao abrigo do direito da União, aos quais acresciam, ao abrigo do direito alemão, 5 dias por ano a que tem direito enquanto pessoa gravemente deficiente.

18      No recurso que interpôs da decisão proferida por aquele órgão jurisdicional, a KHS AG sustenta que os direitos às férias anuais remuneradas de W. Schulte, relativos aos anos de 2006 e 2007, se extinguiram, uma vez que expirou o período de reporte previsto no § 11, n.° 1, terceiro parágrafo, da EMTV.

19      O Landesarbeitsgericht Hamm salienta que, ao abrigo da legislação nacional e da EMTV, os direitos às férias anuais remuneradas relativos aos anos de 2007 e 2008 ainda existiam no momento da cessação do contrato de trabalho e que só o direito às férias anuais remuneradas relativo a 2006 tinha sido perdido por ter expirado o período de reporte de quinze meses no total.

20      No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio não exclui que a perda, em aplicação da legislação nacional, do direito a férias anuais remuneradas relativo ao ano de 2006 possa ser contrária ao artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88.

21      Nestas circunstâncias, o Landesarbeitsgericht Hamm decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88 [...] ser interpretado no sentido de que se opõe a disposições e/ou práticas nacionais segundo as quais o direito ao período mínimo de férias anuais remuneradas se extingue após o decurso do período de referência e/ou do período de reporte, mesmo no caso de o trabalhador sofrer de uma incapacidade para o trabalho prolongada (tendo esta incapacidade para o trabalho prolongada por consequência poder o trabalhador [cumular] direitos a períodos mínimos de férias remuneradas em vários anos se a possibilidade de [cumular] esses direitos não estiver limitada no tempo)?

2)      Em caso de resposta negativa a esta questão, deve o reporte destes direitos ser possível durante um período mínimo de dezoito meses?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

22      Através da primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a disposições ou práticas nacionais, como as convenções colectivas, que limitam, através de um período de reporte de quinze meses no termo do qual o direito a férias anuais remuneradas se extingue, a cumulação dos direitos a essas férias de um trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos.

23      A este respeito, importa recordar, em primeiro lugar, que, segundo jurisprudência assente, o direito a férias anuais remuneradas de cada trabalhador deve ser considerado um princípio do direito social da União Europeia que se reveste de particular importância, que não pode ser derrogado e cuja aplicação pelas autoridades nacionais competentes só pode ser efectuada dentro dos limites expressamente previstos pela própria Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho (JO L 307, p. 18), codificada pela Directiva 2003/88 (v. acórdãos de 26 de Junho de 2001, BECTU, C‑173/99, Colect., p. I‑4881, n.° 43; de 18 de Março de 2004, Merino Gómez, C‑342/01, Colect., p. I‑2605, n.° 29; de 16 de Março de 2006, Robinson‑Steele e o., C‑131/04 e C‑257/04, Colect., p. I‑2531, n.° 48; e de 20 de Janeiro de 2009, Schultz‑Hoff e o., C‑350/06 e C-520/06, Colect., p. I-179, n.° 22).

24      Em seguida, o Tribunal de Justiça já teve a ocasião de examinar a implementação e as modalidades de aplicação deste princípio do direito a férias anuais remuneradas, pelas autoridades nacionais competentes, no que respeita a trabalhadores privados do benefício de períodos de férias anuais pagas, em razão de baixas por doença que não excedem a duração dos períodos de referência aplicáveis segundo o direito nacional em causa (acórdão Schultz-Hoff e o., já referido, n.° 19).

25      Ao proceder a essa análise, o Tribunal salientou que uma disposição nacional que prevê um período de reporte de férias anuais não gozadas até ao final do período de referência prossegue, em princípio, a finalidade de conferir ao trabalhador impedido de gozar as suas férias anuais uma possibilidade adicional de gozar essas férias. A fixação desse período faz parte das condições de exercício e de implementação do direito a férias anuais remuneradas, pelo que, em princípio, é da competência dos Estados‑Membros (v. acórdão Schultz‑Hoff e o., já referido, n.° 42).

26      O Tribunal concluiu assim que o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88 não se opõe, em princípio, a uma legislação nacional que fixa as modalidades de exercício do direito a férias anuais remuneradas expressamente conferido por essa directiva, incluindo a perda de tal direito no final de um período de referência ou de um período de reporte. No entanto, o Tribunal submeteu esta declaração de princípio à condição de o trabalhador que perdeu o direito a férias anuais remuneradas ter tido efectivamente a possibilidade de exercer o direito que a directiva lhe confere (v. acórdão Schultz-Hoff e o., já referido, n.° 43).

27      Ora, impõe‑se observar que um trabalhador que, como o recorrente no processo principal, no que respeita ao ano de 2006, esteve de baixa por doença durante todo o período de referência e para além do período de reporte previsto no direito nacional, fica privado de qualquer período que confira a possibilidade de gozar as suas férias anuais remuneradas.

28      Embora resulte efectivamente da jurisprudência referida que uma disposição nacional que fixa um período de reporte não pode prever a extinção do direito do trabalhador a férias anuais remuneradas, sem este ter realmente tido a possibilidade de exercer esse direito, tal conclusão deve porém ser matizada em circunstâncias específicas como as do processo principal.

29      Com efeito, se assim não fosse, um trabalhador, como o recorrente no processo principal, incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos, teria o direito de acumular, ilimitadamente, todos os direitos a férias anuais remuneradas, adquiridos durante o período em que esteve ausente do trabalho.

30      Ora, um direito a uma cumulação ilimitada de direitos a férias anuais remuneradas, adquiridos durante o referido período de incapacidade para o trabalho, deixaria de corresponder à própria finalidade do direito a férias anuais remuneradas.

31      Na verdade, há que recordar que o direito a férias anuais remuneradas, consagrado no artigo 31.°, n.° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e no artigo 7.° da Directiva 2003/88, tem uma dupla finalidade, isto é, permitir ao trabalhador descansar da execução das tarefas que lhe incumbem nos termos do seu contrato de trabalho, por um lado, e dispor de um período de descontracção e de lazer, por outro (v. acórdão Schultz-Hoff e o., já referido, n.° 25).

32      A este respeito, é verdade que o Tribunal de Justiça sublinhou que, embora o efeito positivo das férias anuais remuneradas, para a segurança e a saúde do trabalhador, se produza plenamente se as férias forem gozadas no ano previsto para o efeito, isto é, o ano em curso, esse tempo de descanso não perde o seu interesse se for gozado num período posterior (acórdãos de 6 de Abril de 2006, Federatie Nederlandse Vakbeweging, C‑124/05, Colect., p. I‑3423, n.° 30, e Schultz-Hoff e o., já referido, n.° 30).

33      No entanto, há que reconhecer que o direito a férias anuais remuneradas adquirido por um trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos só pode responder às duas vertentes da sua finalidade, enunciadas no n.° 30 do presente acórdão, na medida em que o reporte não ultrapasse um certo limite temporal. Na verdade, para lá desse limite, as férias anuais perdem o seu efeito positivo para o trabalhador, enquanto tempo de descanso, mantendo apenas a sua qualidade de período de descontracção e de lazer.

34      Consequentemente, tendo em conta a própria finalidade do direito a férias anuais remuneradas, directamente conferido pelo direito da União a cada trabalhador, um trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários anos consecutivos, impedido pelo direito nacional de gozar as suas férias anuais remuneradas durante o referido período, não pode ter o direito de cumular ilimitadamente direitos a férias anuais remuneradas, adquiridos ao longo desse período.

35      Relativamente ao período de reporte para lá do qual o direito a férias anuais remuneradas se pode extinguir em caso de cumulação de direitos a férias anuais remuneradas durante um período de incapacidade para o trabalho, importa apreciar, à luz do artigo 7.° da Directiva 2003/88 e tendo em conta as considerações que precedem, se um período de reporte do direito às férias anuais remuneradas, fixado em quinze meses pelas disposições ou pelas práticas nacionais, como as convenções colectivas, pode razoavelmente ser qualificado de período para lá do qual as férias anuais remuneradas perdem o seu efeito positivo para o trabalhador, enquanto tempo de descanso.

36      Neste contexto, há que ter em conta os elementos seguintes.

37      O direito a férias anuais remuneradas não só se reveste de particular importância enquanto princípio do direito social da União, tal como foi salientado no n.° 23 do presente acórdão, como está expressamente consagrado no artigo 31.°, n.° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, à qual o artigo 6.°, n.° 1, TUE reconhece o mesmo valor jurídico que os Tratados.

38      Daqui resulta que, a fim de respeitar esse direito, cujo objectivo é a protecção do trabalhador, qualquer período de reporte deve ter em conta as circunstâncias específicas nas quais se encontra o trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos. Assim, o referido período deve designadamente garantir ao trabalhador a possibilidade de dispor, caso o necessite, de períodos de descanso susceptíveis de ser escalonados, que sejam previsíveis e que estejam disponíveis a mais longo prazo. Qualquer período de reporte deve ultrapassar substancialmente a duração do período de referência em relação ao qual tenha sido concedido.

39      Este mesmo período deve igualmente proteger o empregador contra um risco de cumulação significativo de períodos de ausência do trabalhador e contra as dificuldades que tais períodos de ausência poderiam implicar para a organização do trabalho.

40      Neste caso, o período de reporte fixado pelo § 11, n.° 1, terceiro parágrafo, da EMTV é de quinze meses, ou seja, uma duração superior à do período de referência com o qual está relacionado, o que distingue o presente processo do processo em que foi proferido o acórdão Schultz-Hoff e o., já referido, no qual o período de reporte era de seis meses.

41      Neste particular, importa salientar, além disso, que, nos termos do artigo 9.°, n.° 1, da Convenção n.° 132 da Organização Internacional do Trabalho, de 24 de Junho de 1970, sobre as Férias Anuais Remuneradas (revista), a parte ininterrupta das férias anuais remuneradas deverá ser concedida e gozada no prazo de um ano, no máximo, e o resto das férias anuais remuneradas, num prazo de dezoito meses, no máximo, a contar do fim do ano que conferir o direito às férias. Esta regra pode ser entendida no sentido de que se baseia na consideração segundo a qual, no termo dos prazos que estabelece, a finalidade dos direitos a férias já não poderá ser integralmente alcançada.

42      Por conseguinte, tendo em conta que, nos termos do seu sexto considerando, a Directiva 2003/88 teve em conta os princípios da Organização Internacional do Trabalho em matéria de organização do tempo de trabalho, o cálculo do período de reporte deveria ter em consideração a finalidade do direito a férias anuais remuneradas, estabelecida no artigo 9.°, n.° 1, da referida convenção.

43      Atendendo às considerações que precedem, pode razoavelmente conceber‑se que um período de reporte de quinze meses do direito a férias anuais remuneradas, como o que está em causa no processo principal, não contraria a finalidade do referido direito, na medida em que garante a manutenção do seu efeito positivo para o trabalhador, enquanto tempo de descanso.

44      Consequentemente, há que responder à primeira questão submetida que o artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a disposições ou práticas nacionais, como as convenções colectivas, que limitam, através de um período de reporte de quinze meses, no termo do qual o direito a férias anuais remuneradas se extingue, a cumulação dos direitos a essas férias de um trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos.

 Quanto à segunda questão

45      Atendendo à resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

 Quanto às despesas

46      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

O artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro de 2003, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a disposições ou práticas nacionais, como as convenções colectivas, que limitam, através de um período de reporte de quinze meses, no termo do qual o direito a férias anuais remuneradas se extingue, a cumulação dos direitos a essas férias de um trabalhador incapacitado para o trabalho durante vários períodos de referência consecutivos.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.