Language of document : ECLI:EU:C:2013:731

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 7 de novembro de 2013 (1)

Processo C‑639/11

Comissão Europeia

contra

República da Polónia

Processo C‑61/12

Comissão Europeia

contra

República de Lituânia

«Incumprimento de Estado — Artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311/CEE — Artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro 2007/46/CE — Artigos 34.° e 36.° TFUE — Livre circulação de mercadorias — Restrições — Medidas de efeito equivalente — Regulamentação de um Estado‑Membro em que a circulação é efetuada pelo lado direito da estrada, que proíbe a matrícula de automóveis de passageiros equipados para condução pela esquerda, novos ou que já foram matriculados noutro Estado‑Membro — Admissibilidade do requisito segundo o qual o dispositivo de direção deve estar situado no lado esquerdo do veículo»





I —    Introdução

1.        Tanto na Polónia como na Lituânia, a matrícula de veículos a motor cujo dispositivo de direção esteja situado do lado direito é proibida e/ou sujeita à transferência desse dispositivo para o lado esquerdo do veículo, independentemente do facto de esses veículos serem novos ou terem sido anteriormente matriculados noutros Estados‑Membros.

2.        Nos presentes processos, o Tribunal de Justiça é chamado a decidir sobre duas ações por incumprimento, nas quais a Comissão Europeia lhe pede que declare que, ao aplicarem tais disposições, a República da Polónia e a República da Lituânia, respetivamente, não cumpriram as obrigações que lhes incumbem por força do artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311/CEE respeitante aos dispositivos de direção de veículos a motor (2) e do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva 2007/46/CE, que estabelece um quadro para a homologação destes veículos (3), no caso dos automóveis de passageiros novos, bem como por força do artigo 34.° TFUE, no caso dos automóveis de passageiros que já tenham sido matriculados no território de outro Estado‑Membro.

3.        As demandadas contestam veementemente as acusações deduzidas contra si. A República da Polónia defende que as medidas nacionais controvertidas respeitam a Diretiva‑Quadro e a Diretiva 70/311, ao passo que a República da Lituânia afirma que as medidas nacionais não pertencem sequer ao âmbito de aplicação material das referidas diretivas. Apenas a República da Polónia alega que tais medidas não constituem um entrave à livre circulação de mercadorias proibido pelo artigo 34.° TFUE. Ambas consideram que, em qualquer caso, nos termos do artigo 36.° TFUE, estas medidas deviam ser consideradas justificadas por exigências imperativas de interesse geral relacionadas com a segurança rodoviária. A Comissão não contesta que este objetivo seja suscetível de legitimar um entrave deste tipo, mas considera que as regulamentações em causa não são idóneas para o atingir nem proporcionadas a esse mesmo objetivo.

4.        Embora os dois presentes processos não tenham sido formalmente apensados, a natureza comum das acusações deduzidas pela Comissão justifica a apresentação de conclusões únicas.

II — Incumprimentos alegados, regulamentações em causa, procedimentos pré‑contenciosos e tramitação processual no Tribunal de Justiça

5.        Resulta dos autos do processo C‑639/11 que, na Polónia, segundo a lei de 20 de junho de 1997, relativa à circulação rodoviária (4), no caso dos veículos novos, a matrícula é realizada com base, nomeadamente, numa certidão do certificado de homologação do veículo ou numa cópia de uma decisão de isenção de homologação (5), nos termos do artigo 72.°, n.° 1, da referida lei, e, no caso de veículos já matriculados uma primeira vez no estrangeiro, na sequência de um controlo técnico, nos termos do artigo 81.°, n.° 5, dessa mesma lei.

6.        Este controlo técnico consiste em verificar se o veículo respeita, entre outros, os requisitos definidos na referida lei, e no Regulamento do Ministério das Infraestruturas, de 31 de dezembro de 2002, relativo às condições técnicas aplicáveis aos veículos e à extensão dos seus equipamentos indispensáveis (6). Nos termos do artigo 9.°, n.° 2, do referido regulamento, «[o] volante de um veículo que tenha mais de três rodas, cuja construção permita atingir uma velocidade superior a 40 km/h, não deve estar situado do lado direito do veículo».

7.        O âmbito e as regras de realização do controlo técnico foram fixados por regulamento do mesmo ministério, de 16 de dezembro de 2003 (7). Segundo o ponto 5.1 do anexo I deste regulamento, a posição do volante do lado direito constitui um critério essencial que permite estabelecer que esse veículo não cumpre as condições técnicas nacionais. A mesma disposição figura no ponto 6.1 do anexo I do regulamento que foi adotado em 18 de setembro de 2009 por este ministério, (8) com vista a substituir o regulamento de 2003 acima referido.

8.        Tendo em conta os dados fornecidos no processo C‑61/12, o artigo 25.°, n.° 4, da lei lituana relativa à segurança rodoviária (9) dispõe que «[é] proibida a circulação na via pública de veículos motorizados destinados a circular pelo lado esquerdo da faixa de rodagem e/ou cujo volante esteja situado do lado direito, exceto se os mesmos tiverem sido matriculados na República da Lituânia antes de 1 de maio de 1993 ou se se destinarem, pela sua conceção e pelo seu equipamento, a funções especiais. Esta proibição não é aplicável temporariamente (até 90 dias por ano) aos estrangeiros chegados à República da Lituânia num veículo matriculado no estrangeiro e que não disponham de uma autorização de residência provisória ou definitiva na República da Lituânia, bem como aos nacionais lituanos cuja residência permanente esteja situada no estrangeiro, e aos veículos históricos, em conformidade com a legislação».

9.        O artigo 27.° desta mesma lei prevê que os veículos motorizados que circulam na Lituânia devem, em princípio, ser aí matriculados. No entanto, segundo o n.° 1 do referido artigo, esta obrigação de matrícula não é aplicável, de forma temporária (até 90 dias por ano), aos estrangeiros chegados num veículo matriculado no estrangeiro e que não disponham de uma autorização de residência provisória ou definitiva na Lituânia ou de um título de residência UE, bem como aos nacionais lituanos com residência permanente no estrangeiro. O n.° 2 deste artigo acrescenta que os veículos motorizados concebidos para circular pelo lado esquerdo da faixa de rodagem e/ou que disponham de volante à direita não podem ser matriculados na Lituânia, exceto se se tratar de veículos históricos e de veículos destinados a funções especiais.

10.      A decisão n.° 2B‑290, do 29 de julho de 2008, do diretor da Inspeção nacional dos transportes rodoviários do Ministério das Comunicações que fixa, nomeadamente, os requisitos técnicos relativos aos veículos a motor e seus reboques, prevê no seu Capítulo IV que «o sistema de direção de um veículo [(10)] não pode ser instalado do lado direito do habitáculo/da cabina, exceto no caso dos veículos automóveis matriculados na Lituânia antes de 1 de maio de 1993, ou dos veículos automóveis sujeitos a um regime de matrícula especial. A decisão n.° 2B‑515 deste mesmo diretor, de 23 de dezembro de 2008, define, no seu ponto 28, as regras segundo as quais é autorizada a transferência do dispositivo de direção de um veículo do lado direito para o lado esquerdo.

11.      A Comissão recebeu uma série de denúncias de pessoas residentes na Polónia ou na Lituânia que foram confrontadas com a impossibilidade de matricular automóveis de passageiros provenientes de outro Estado‑Membro, nomeadamente, do Reino Unido ou da Irlanda, pelo facto de o dispositivo de direção dos mesmos estar situado à direita. Considerou que a obrigação de transferir o referido dispositivo para a esquerda equivalia a uma proibição de matricular esses veículos em cada um daqueles Estados‑Membros. Na sua opinião, isto constitui, no que diz respeito aos veículos novos, um incumprimento do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro, e do artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311 e, no que diz respeito aos veículos anteriormente matriculados noutro Estado‑Membro, um incumprimento do artigo 34.° TFUE.

12.      Em 9 de outubro de 2009 e em 3 de novembro de 2009, respetivamente, a Comissão notificou a República da Polónia e a República da Lituânia para que pusessem termo aos referidos incumprimentos. Em 8 de dezembro de 2009, a República da Polónia e, em 5 de janeiro de 2010, a República da Lituânia contestaram as acusações da Comissão. Não estando convencida do bom fundamento dos argumentos apresentados por estes Estados‑Membros em sua defesa, enviou‑lhes, em 1 de outubro de 2010 e em 25 de novembro de 2010, respetivamente, um parecer fundamentado. Depois de examinar as respostas dadas ao referido parecer, em 30 de novembro de 2010 pela República da Polónia, e, em 19 de janeiro de 2011 pela República da Lituânia, a Comissão decidiu intentar as presentes ações por incumprimento.

13.      Mediante a sua petição apresentada em 13 de dezembro de 2011, a Comissão pediu ao Tribunal de Justiça que «declare que a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 2.°‑A da Diretiva [70/311], do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro [2007/46] e do artigo 34.° TFUE, na medida em que sujeita o registo na Polónia de veículos automóveis novos ou anteriormente registados noutros Estados‑Membros, cujo dispositivo de direção se encontra à direita à mudança do volante para o lado esquerdo».

14.      A República da Polónia pediu que a ação fosse julgada improcedente, baseando‑se numa interpretação diferente das disposições em causa, bem como a condenação da Comissão nas despesas. A República da Lituânia apresentou um articulado de intervenção em apoio dos pedidos da República da Polónia. Não foi realizada audiência.

15.      Mediante a sua petição apresentada em 6 de fevereiro de 2012, a Comissão pediu ao Tribunal de Justiça que «declare que a República da Lituânia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva [70/311], da Diretiva[‑Quadro], e do artigo 34.° [TFUE], na medida em que proíbe o registo de automóveis de passageiros cujo volante está instalado do lado direito e/ou exige, como requisito prévio ao registo, que o volante que consta do lado direito de um automóvel novo de passageiros ou de um automóvel de passageiros anteriormente registado noutro Estado‑Membro seja transferido para o lado esquerdo».

16.      A República da Lituânia pediu que a ação fosse julgada improcedente, tendo contestado a interpretação que a Comissão faz das disposições em causa, bem como a sua condenação nas despesas. Mediante os seus articulados de intervenção, a República da Estónia e a República da Polónia apoiaram os pedidos da República da Lituânia. Não foi realizada audiência.

III — Análise das duas ações por incumprimento

A —    Observações preliminares

17.      Resulta dos presentes processos que as regulamentações aplicáveis na Lituânia e na Polónia impedem a matrícula de veículos cujo dispositivo de direção esteja situado à direita. Com efeito, a República da Lituânia proíbe a circulação na via pública, e a matrícula de veículos concebidos para circular pelo lado esquerdo da faixa de rodagem e/ou que tenham volante à direita, salvo exceções taxativamente enumeradas na lei lituana relativa à segurança rodoviária (11), e impõe que o dispositivo de direção destes veículos seja previamente mudado para a esquerda (12). Por sua vez, a República da Polónia sujeita a matrícula de qualquer veículo automóvel, novo ou já matriculado uma primeira vez no estrangeiro, à apresentação de um certificado de controlo técnico e, por força de vários regulamentos do Ministério das Infraestruturas polaco (13), o resultado deste controlo não pode ser favorável relativamente aos veículos que tenham dispositivo de direção à direita, dado que estes são considerados não conformes com os requisitos técnicos nacionais.

18.      Antes de mais, deve recordar‑se que à época em que foi iniciada a harmonização comunitária das regulamentações nacionais relativas às características técnicas dos veículos a motor, a Comunidade Europeia era constituída apenas por Estados‑Membros em que a circulação era efetuada pelo lado direito da estrada. Após a adesão da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, em que a circulação rodoviária é feita pela esquerda (14), foi desenvolvida uma prática uniforme entre os Estados‑Membros que consiste em que os mesmos não recusam a matrícula dos veículos cujo dispositivo de direção está situado do mesmo lado que o sentido de circulação (15). Só depois do alargamento da União Europeia, ocorrido em 2004, é que esta uniformidade foi posta em causa por alguns dos novos Estados‑Membros, entre os quais a República da Lituânia e a República da Polónia, que, no essencial, invocaram o risco que representa para a segurança rodoviária a circulação dos veículos automóveis cujo dispositivo de direção não está adaptado ao sentido da circulação (16).

19.      Há também que salientar que as presentes ações têm por objeto incumprimentos que resultam não de uma violação da liberdade de comercializar veículos cujo dispositivo de direção esteja situado à direita, mas de uma limitação da possibilidade de matricular tais veículos na Lituânia e na Polónia, respetivamente. Com efeito, nestes Estados‑Membros, não são proibidas nem a venda nem a importação dos mesmos. Apenas é proibida a matrícula desta categoria de veículos enquanto o referido dispositivo não for mudado para o lado esquerdo, independentemente do facto de terem sido produzidos no país ou importados.

20.      Além disso, estas ações estão limitadas aos «automóveis de passageiros», tanto novos como usados, o que exclui determinadas categorias de veículos a motor, designadamente os veículos comerciais, que, contudo, estão abrangidas pelas disposições visadas pela Comissão (17). Saliento que a qualificação de «automóvel de passageiros» não é utilizada nem na Diretiva‑Quadro 2007/46 (18), nem na Diretiva 70/311 (19), mas que corresponde ao conceito de veículos incluídos na categoria M1, a saber, os «veículos destinados ao transporte de passageiros com oito lugares sentados no máximo, além do lugar do condutor» (20).

21.      A República da Lituânia recorre a esta limitação para fundamentar os seus argumentos quanto ao mérito (21). Em contrapartida, segundo a Comissão, a sua escolha formal em nada põe em causa o domínio abrangido pelas disposições em questão, mas explica‑se pelo facto de as presentes ações decorrerem das denúncias que lhe tinham sido submetidas, respeitantes precisamente a automóveis de passageiros (22) e pela razão de que um dos objetivos de um procedimento por infração é ajudar os cidadãos da União a resolverem os problemas reais com que são confrontados nos Estados‑Membros. Em meu entender, resulta da jurisprudência que a Comissão dispõe de poder discricionário, não apenas para dar início a um processo por incumprimento (23), mas também para restringir o objeto da sua ação (24). A observação ora feita tem por única consequência que o alcance do acórdão a proferir estaria limitado aos veículos automóveis pertencentes à categoria M1, sem prejuízo do que possa ser posteriormente decidido no que diz respeito de veículos de outro tipo.

22.      De entre os automóveis de passageiros cujo dispositivo de direção está situado à direita, a Comissão faz uma distinção entre, por um lado, automóveis de passageiros novos, em relação aos quais os obstáculos criados pelas regulamentações lituana e polaca relativamente à sua matrícula são contrários à Diretiva‑Quadro 2007/46 e à Diretiva 70/311, ambas relativas à homologação CE de veículos a motor novos, e por outro, os veículos de passageiros já previamente matriculados noutro Estado‑Membro, em relação aos quais esses obstáculos constituem uma violação à livre circulação de mercadorias prevista no artigo 34.° TFUE. Esta distinção é contestada pela República da Lituânia, que considera que a primeira categoria de veículos em causa deveria estar igualmente abrangida pelos artigos 34.° TFUE e 36.° TFUE, e não pelo âmbito de aplicação das referidas diretivas. Em todo o caso, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (25), na medida em que a harmonização prevista na Diretiva 2007/46 e na Diretiva 70/311 tem caráter exaustivo, as regulamentações controvertidas devem ser examinadas, primeiro, à luz das disposições das referidas diretivas, e não à luz das disposições do TFUE.

B —    Quanto à acusação relativa aos automóveis de passageiros novos

1.      Observações introdutórias relativas à harmonização dos requisitos técnicos aplicáveis aos automóveis de passageiros e o processo de homologação CE por modelo

23.      Com vista a implementar a livre circulação de mercadorias no setor automóvel, a Comunidade Económica Europeia iniciou, a partir dos anos 60, um processo ambicioso de harmonização das prescrições nacionais relativas aos requisitos técnicos e à homologação por modelo dos veículos a motor, uma vez que as diferenças existentes nesse domínio entre os Estados‑Membros dificultavam o acesso ao mercado interno e a livre circulação dentro deste mercado (26). À época, o legislador adotou para esse efeito uma metodologia que, ao contrário da «nova abordagem» (27), consistia em que todas as normas técnicas fossem diretamente incorporadas nos atos pertinentes do direito da União, neste caso, numa Diretiva‑Quadro relativa à homologação comunitária por modelo de veículos — denominada «homologação CE» —, completada por diretivas específicas (28), às quais a Diretiva‑Quadro faz referência.

24.      O desenvolvimento deste processo levou à adoção da Diretiva‑Quadro 2007/46, cujo segundo considerando realça que «[p]ara efeitos do estabelecimento e funcionamento do mercado interno da Comunidade, afigura‑se adequado substituir os regimes de homologação dos Estados‑Membros por um procedimento de homologação comunitária baseado no princípio da harmonização total» (29).

25.      O objeto da referida diretiva, conforme definido no seu artigo 1.°, é estabelecer um quadro harmonizado que contém as disposições administrativas e os requisitos técnicos gerais aplicáveis à homologação, em especial, de todos os veículos novos que sejam abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, no intuito de facilitar a respetiva matrícula, venda e entrada em circulação na Comunidade.

26.      Os requisitos técnicos nacionais, bem como a obrigação de homologação nacional por modelo de veículo são justificados pela preocupação de salvaguardar a segurança rodoviária. Esta é a razão pela qual tanto a homologação CE como os requisitos técnicos uniformes que são fixados pelo direito da União visam também assegurar um elevado nível de segurança rodoviária, como indicam os terceiro e décimo quarto considerandos da Diretiva‑Quadro (30).

27.      Assim, o objetivo das regras do direito da União aplicáveis nesta matéria é o de permitir a realização e o correto funcionamento da livre circulação de mercadorias no setor automóvel, mantendo condições imperativas que proporcionem um elevado nível de segurança rodoviária.

28.      Como indica uma comunicação interpretativa da Comissão (31), para matricular um veículo a motor num Estado‑Membro, devem ser cumpridas três etapas, no máximo: em primeiro lugar, a homologação das características técnicas do veículo, no âmbito da qual se realiza o processo de homologação comunitária por modelo de veículo prevista na Diretiva‑Quadro; em segundo lugar, um eventual controlo técnico, que permite assegurar que um veículo usado está apto para a circulação rodoviária; em terceiro lugar, a matrícula propriamente dita, que consiste numa autorização administrativa para a entrada do veículo na circulação rodoviária, o que implica a identificação do mesmo e a atribuição de um número de matrícula.

29.      Com o objetivo de simplificar, em especial, a matrícula nos Estados‑Membros, os regimes de homologação nacionais foram substituídos por um procedimento uniforme de homologação válido para cada modelo de veículo a motor. Graças a este procedimento, que assenta no princípio da harmonização total (32), todos os veículos comercializados no mercado europeu devem ser conformes às normas comuns relativas às suas características técnicas. Os veículos homologados num dos Estados‑Membros respeitando essas regras harmonizadas podem, em seguida, ser comercializados legalmente em toda a União Europeia.

30.      Mais precisamente, o artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro fixa as «Obrigações dos Estados‑Membros», de forma que estes «só devem matricular e autorizar a venda ou entrada em circulação dos veículos [...] que cumpram os requisitos da presente diretiva» e que os mesmos «não devem proibir, restringir ou impedir a matrícula, a venda, a entrada em circulação ou a circulação na estrada de veículos [...] por motivos relacionados com aspetos da sua construção e funcionamento abrangidos pela presente diretiva, se cumprirem os requisitos nela previstos». Segundo o artigo 1.°, terceiro parágrafo, da referida diretiva, «[o]s requisitos técnicos específicos relativos ao fabrico e ao funcionamento dos veículos devem ser estabelecidos em aplicação da presente diretiva em atos regulamentares, cuja lista exaustiva consta do anexo IV» (33).

31.      A Diretiva 70/311 é o segundo dos atos de direito derivado a que a Comissão faz referência nas presentes ações por incumprimento. Relativa aos dispositivos de direção de veículos a motor e seus reboques, é um dos atos regulamentares específicos que são referidos no anexo IV da Diretiva‑Quadro.

32.      O artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311 foi aditado a esta no quadro da adesão às Comunidades Europeias, designadamente, da Irlanda e do Reino Unido (34). Dispõe que «[o]s Estados‑Membros não podem recusar ou proibir a venda, a matrícula, entrada em circulação ou a utilização de veículos por motivos relacionados com os seus dispositivos de direção, se estes corresponderem às prescrições que constam do anexo [(35)]».

33.      Uma das pedras angulares do procedimento de homologação CE é o facto de cada Estado‑Membro reconhecer o controlo efetuado pelos outros Estados‑Membros. Esse processo permite a cada Estado‑Membro verificar que um modelo de veículo foi submetido aos controlos que são previstos pelas diretivas especiais e registados num certificado de homologação. Quando as autoridades competentes do Estado‑Membro ao qual foi submetido o pedido de um fabricante verificam que o modelo de veículo em causa satisfaz todos os requisitos do direito da União aplicáveis, a homologação CE que aquelas concedem relativamente ao mesmo é válida em todos os outros Estados‑Membros. Por sua vez, os fabricantes que sejam titulares de uma homologação CE para um modelo de veículo são obrigados a emitir um certificado de conformidade para todos os veículos que fabriquem, a fim de atestar que os mesmos são conformes a esse modelo. Se um veículo for acompanhado desse certificado, deve ser considerado por todos os Estados‑Membros conforme às suas próprias legislações (36). Do mesmo modo, o artigo 26.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva‑Quadro prevê que os Estados‑Membros só autorizam a matrícula, a venda ou a entrada em circulação de veículos se estes estiverem acompanhados de um certificado de conformidade válido emitido nos termos do artigo 18.° da referida diretiva.

2.      Quanto à aplicabilidade da Diretiva‑Quadro e da Diretiva 70/311

34.      A República da Lituânia defende que as regulamentações controvertidas não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação material da Diretiva‑Quadro e da Diretiva 70/311 (37). A proibição, prevista no direito nacional, de matricular veículos dotados de um dispositivo de direção situado à direita está relacionada, não com considerações técnicas, relativas ao bom funcionamento ou à fiabilidade desses dispositivos, mas com considerações de segurança rodoviária, relativas à possibilidade de condução de forma segura de tais veículos em estradas em que a circulação é efetuada pela direita. Ora, só o primeiro destes elementos está regulado, e de maneira exaustiva, pela Diretiva‑Quadro e a Diretiva 70/311, à luz, em especial, do acórdão Voigt, já referido (38).

35.      Ainda segundo a República da Lituânia, continua a ser, em grande parte, da competência e da responsabilidade dos Estados‑Membros garantirem a segurança rodoviária, definindo as condições de utilização dos veículos que correspondem às prescrições técnicas destas diretivas. Por conseguinte, as medidas nacionais controvertidas devem ser apreciadas, não do ponto de vista das referidas diretivas, mas unicamente do ponto de vista dos artigos 34.° TFUE e 36.° TFUE, independentemente de se tratar de veículos novos ou de veículos já matriculados noutro Estado‑Membro.

36.      Contudo, partilho da análise da Comissão, segundo a qual a Diretiva‑Quadro e a Diretiva 70/311, bem como todas as diretivas específicas referidas no anexo IV da primeira, definem a totalidade das prescrições técnicas relativas aos veículos a motor novos, incluindo as relativas ao dispositivo de direção, e não deixam qualquer margem de apreciação aos Estados‑Membros neste domínio. Estes requisitos técnicos garantem o nível de segurança rodoviária conforme à apreciação do legislador da União. Embora seja verdade que a determinação da posição do dispositivo de direção, enquanto tal, não é objeto de disposições vinculativas dessas diretivas, a referida posição não deixa de constituir uma das características do fabrico de um veículo que satisfazem, além disso, todas as prescrições técnicas contidas em todas essas diretivas. O acórdão Voigt, já referido, não põe em causa esta análise (39).

37.      A regulamentação lituana, na medida em que obriga a alterar a posição deste dispositivo, introduz um requisito de natureza técnica que implica uma alteração que afeta o fabrico do veículo, requisito este que é regulado pela Diretiva‑Quadro e pela Diretiva 70/311. Portanto, a referida regulamentação está abrangida pelo âmbito de aplicação destas diretivas, da mesma forma que a regulamentação polaca em causa.

3.      Quanto às disposições pertinentes da Diretiva‑Quadro

38.      Recordo que a Diretiva‑Quadro 2007/46 institui uma «harmonização total» nos domínios que abrange, prevendo cláusulas de salvaguarda com vista a garantir a segurança rodoviária, caso se verifique que um modelo de veículo, embora cumpra os requisitos aplicáveis em matéria de homologação CE, representa um risco, na opinião de um Estado‑Membro (40). No entanto, o referido Estado‑Membro deve então adotar um procedimento especial de alerta que envolva os outros Estados‑Membros e a Comissão, sem o que o efeito útil do regime uniformizado de homologação seria posto em perigo (41).

39.      As presentes ações por incumprimento baseiam‑se, em especial, no artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro 2007/46. Como a Comissão alega, por força desta disposição, em conjugação com o artigo 9.°, n.° 1, alínea a), da referida diretiva (42), as autoridades competentes de um Estado‑Membro são obrigadas a matricular um automóvel de passageiros novo se este estiver conforme com os requisitos técnicos previstos nessa diretiva e nas diretivas específicas que a mesma enumera no seu anexo IV.

40.      A redação desta disposição compreende‑se melhor à luz do contexto e dos motivos da sua adoção. Com efeito, resulta dos trabalhos preparatórios (43) que «foi inserida uma cláusula relativa à livre circulação no n.° 3 do artigo 4.°» (44) «[p]ara garantir que as disposições relativas à homologação de veículos estabelecidas nessa diretiva e nos atos regulamentares específicos não sejam comprometidas pela imposição de requisitos nacionais em matéria de construção e funcionamento aplicáveis aos veículos após a sua venda, matrícula e/ou entrada em circulação».

41.      Quanto aos artigos 18.° (45) e 26.° da Diretiva‑Quadro, bem como ao ponto 0 do seu anexo IX (46), A República da Lituânia defende que os fabricantes de automóveis deveriam especificar, no lado 1 do certificado de conformidade CE (47), qual é o sentido de circulação para o qual o veículo em causa está exclusivamente adequado, do que decorreria que, para o legislador da União, alguns veículos poderiam ser desadequados para uma utilização num determinado lado da faixa de rodagem, direito ou esquerdo, segundo os casos. Por seu lado, a República da Estónia alega que os fabricantes devem declarar que o veículo pode ser matriculado a título definitivo, sem outra homologação CE, nos Estados‑Membros cujo trânsito circula pela direita ou pela esquerda, respetivamente.

42.      Na minha opinião, o certificado de conformidade CE atesta a validade da produção do veículo objeto desse certificado, em função do tipo de veículos a que o mesmo pertence. Da descrição das características técnicas do veículo incluída nesse certificado, resulta, essencialmente, que não é necessário apresentar outros documentos técnicos para proceder à matrícula definitiva num Estado‑Membro, independentemente do sentido pelo qual a circulação é efetuada no território do mesmo.

43.      Quanto às posições 1.8 e 1.8.1 dos anexos I e III da Diretiva‑Quadro (48), a República da Polónia alega que o legislador da União teria previsto uma rubrica especial, na subposição 1.8.1, a fim de ser indicado se o veículo está adaptado para a circulação pela direita ou pela esquerda. Além disso, a posição 1.8 destes anexos indica que, para ser autorizado a circular num determinado sentido, o veículo deveria estar adequado ao sentido da circulação em causa. Por conseguinte, a referida posição dizia respeito à indicação no certificado de homologação da posição do volante. Igualmente, a República da Estónia considera que resulta destas disposições que os fabricantes devem mencionar, na lista de informações exigida para a homologação de veículo, se está previsto que o veículo em causa seja utilizado no âmbito da circulação pela esquerda ou pela direita.

44.      No entanto, adiro à posição da Comissão, segundo a qual as referidas disposições significam apenas que o veículo em causa cumpre as prescrições que permitem a sua condução com toda a segurança pelo lado da faixa de rodagem declarado, direito ou esquerdo, tais como as relativas à instalação dos dispositivos de iluminação e visão indireta, bem como os elementos do dispositivo de direção que são definidos na Diretiva 70/311. Afigura‑se‑me que o legislador da União pretendeu distinguir, e não confundir, a questão da posição do dispositivo de direção e a da adequação do veículo a um dos lados da condução.

45.      A este respeito, recordo que a nota explicativa da alínea d), relativa ao anexo IX da Diretiva‑Quadro, acima referida, enuncia que a «declaração [segundo a qual o veículo é adequado para circular à direita ou à esquerda] não restringe o direito dos Estados‑Membros de exigirem adaptações técnicas [...] quando a circulação se faz pelo lado oposto da estrada» sem contudo, definir o que deve ser entendido pela expressão que aqui sublinhei.

46.      Segundo a República da Polónia e a República da Estónia, esta menção permite a um Estado‑Membro em que a circulação é efetuada pela direita exigir que um veículo concebido para a condução à esquerda seja adaptado para a condução pela direita antes da sua matrícula, em especial, mediante a transferência do dispositivo de direção para a esquerda.

47.      Na verdade, a referida nota explicativa prevê que, se um veículo está equipado para a condução do lado esquerdo da estrada, podem ser impostas alterações para efeitos da sua matrícula num Estado‑Membro em que a circulação se faz pelo lado direito. No entanto, à luz das outras disposições, tanto da Diretiva‑Quadro como da Diretiva 70/311, e para evitar que essas disposições percam o seu efeito útil, considero que a transferência do dispositivo de direção não constitui uma das «adaptações técnicas» autorizadas pela nota acima referida.

48.      À semelhança da Comissão, considero que essas adaptações são suscetíveis de dizer unicamente respeito a intervenções que tenham um impacto mínimo, como a regulação dos faróis ou a instalação de um espelho retrovisor adicional, e não a aspetos técnicos que alterem de modo significativo a própria construção do veículo. Ora, é este último género de alterações que as regulamentações controvertidas implicam, dado que a transferência que as mesmas exigem implica não só a transferência do sistema de direção, mas também a transformação de todo o painel de instrumentos, e a transferência dos pedais do veículo e dos sistemas que estes comandam.

49.      Saliento que esta abordagem é conforme à prática de vários Estados‑Membros, em que a matrícula de veículos automóveis cujo dispositivo de direção está situado do mesmo lado que o sentido da circulação é autorizada desde que seja apresentado um certificado de conformidade CE válido (49) e/ou sob condição unicamente de adaptações técnicas de pequeno alcance, como as relativas às luzes de cruzamento, aos espelhos retrovisores exteriores, ou outras alterações da mesma natureza (50).

50.      Assim, considero que nenhuma disposição da Diretiva‑Quadro prevê a possibilidade de recusar a matrícula de um automóvel de passageiros novo por causa do lado em que está instalado o dispositivo de direção. Tal interpretação, tanto literal como contextual, das disposições desta diretiva referidas nas ações por incumprimento é apoiada pelas disposições da Diretiva 70/311, que figura entre as diretivas específicas enumeradas no anexo IV da referida Diretiva‑Quadro.

4.      Quanto às disposições pertinentes da Diretiva 70/311

51.      Segundo a República da Lituânia, a Diretiva 70/311 estabelece unicamente requisitos de fabrico, instalação e controlo do dispositivo de direção, sem definir de que lado do veículo deve estar instalado o dispositivo de direção por razões de segurança rodoviária.

52.      No que respeita, em especial, à posição 1.8 do apêndice 1 do anexo I da Diretiva 70/311 (51), a República da Polónia alega, em especial, que esta disposição introduz uma distinção entre os veículos, segundo se destinem a condução pelo lado direito ou pelo esquerdo, e que o legislador da União o redigiu partindo da hipótese de que a posição do condutor estava diretamente relacionada com o lado pelo qual é efetuada a circulação.

53.      A Comissão contrapõe, corretamente, que o facto de, por força da referida disposição, haver que indicar a posição do volante significa simplesmente que o fabrico do veículo, e nomeadamente o seu dispositivo de direção, cumpre as prescrições técnicas da Diretiva 70/311 relativas ao lado da condução, sem que o legislador da União tenha considerado útil estabelecer um vínculo formal, segundo o qual, para a condução pela direita, o dispositivo de direção deve situar‑se à esquerda, e inversamente.

54.      Por outro lado, partilho do entendimento da Comissão quando alega que o artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311 proíbe que os Estados‑Membros recusem ou proíbam a matrícula de veículos por motivos relativos unicamente à localização do seu dispositivo de direção, na hipótese de estes cumprirem, quanto ao restante, as prescrições que figuram nos anexos dessa diretiva. Dado que estes não especificam se o dispositivo de direção deve estar situado à esquerda, à direita ou ao meio, as autoridades nacionais estão portanto obrigadas a matricular um veículo automóvel, independentemente dessa posição, se o dispositivo de direção estiver, quanto ao demais, conforme com as referidas prescrições. Na minha opinião, na economia da Diretiva 70/311, esta disposição não teria objeto se se considerasse que a mesma não se destina a excluir restrições baseadas unicamente no lugar do dispositivo de direção dos veículos que estão abrangidos pelo seu âmbito de aplicação.

55.      Invocando fatores históricos, a República da Lituânia alega que tendo a Diretiva 70/311 sido adotada numa época em que a Comunidade Europeia não incluía nenhum Estado‑Membro em cujo território a circulação fosse efetuada pela esquerda, o legislador comunitário não podia, por conseguinte, resolver um problema que então não existia.

56.      Isto é ignorar que a disposição pertinente, ou seja, o artigo 2.°‑A, foi aditado à referida diretiva pelo ato relativo à adesão, entre outros, da Irlanda e do Reino Unido, como já referi. A este respeito, a Comissão invoca um relatório, de 28 de junho de 1971, do Grupo ad hoc do Conselho encarregado de examinar os relatórios da Comissão sobre as adaptações técnicas das regulamentações comunitárias no quadro das negociações com os Estados que tinham pedido a sua adesão às Comunidades (52), relatório este que é sem dúvida interessante (53), mas que me parece não ser relevante, uma vez que esse grupo não adotou nenhuma tomada de posição sobre a matéria. Em meu entender, é muito mais significativo atender ao teor do referido ato de adesão, na parte em que o mesmo alterou as diretivas relativas aos requisitos técnicos dos veículos a motor. Com efeito, da leitura desse ato resulta claramente que foram adotadas disposições especiais no que diz respeito à localização dos espelhos retrovisores (54), com vista a introduzir uma adaptação da mesma em função do sentido de circulação, pela direita ou pela esquerda, em vigor em cada Estado‑Membro, ao passo que o legislador se absteve de prever disposições equivalentes quanto à localização dos dispositivos de direção, apesar de a Diretiva 70/311 também ter sido objeto de disposições modificativas (55).

57.      Portanto, a redação e a génese da Diretiva 70/311 são reveladoras. Além disso, a abordagem teleológica das disposições das duas diretivas em causa nas ações por incumprimento permite corroborar a posição que proponho que o Tribunal de Justiça adote.

5.      Quanto aos objetivos da Diretiva‑Quadro e da Diretiva 70/311

58.      No que diz respeito à interpretação teleológica do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro e do artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311, a República da Polónia defende que a regulamentação em causa está inteiramente justificada, tendo em consideração o facto de o objetivo principal prosseguido por estas diretivas ser assegurar um elevado nível de segurança rodoviária. Isto é confirmado pelo considerando 3 (56) da Diretiva‑Quadro e pela posição 4.1.1 do anexo I da Diretiva 70/311 (57).

59.      A Comissão não contesta que as prescrições técnicas definidas nas diretivas relativas à homologação visam assegurar um elevado nível de segurança rodoviária. Contudo, alega, na minha opinião corretamente, que a harmonização total dos procedimentos de homologação de veículos estabelecida pelas Diretivas‑Quadro e pela Diretiva 70/311 foi decidida para assegurar o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno e que, segundo o legislador da União, as prescrições técnicas assim fixadas, plenamente harmonizadas, são suficientes para assegurar a segurança rodoviária. Com efeito, isto resulta dos motivos acima referidos (58) que presidiram à adoção do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro.

60.      A Comissão reconhece também que o facto de um veículo estar munido de volante à direita, quando a circulação é feita pela direita, limita a visibilidade do condutor em caso de cruzamento em estradas bidirecionais com faixa de rodagem única. No entanto, resulta dos artigos 2.°‑A da Diretiva 70/311 e 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro que o legislador da União não considerou que essas dificuldades fossem tão graves que justificassem uma regulamentação como que as que estão em causa, ao contrário do que foi expressamente adotado quanto à localização dos espelhos retrovisores, no quadro da adesão da Irlanda e do Reino Unido.

61.      A República da Lituânia manifesta surpresa pelo facto de a Comissão aceitar alterações no que diz respeito, nomeadamente, aos dispositivos de iluminação mas se opor às mesmas no que diz respeito ao dispositivo de direção.

62.      Todavia, em meu entender, isto justifica‑se pelo facto de serem toleráveis, e mesmo autorizadas ao abrigo da nota explicativa da alínea d) do anexo IX da Diretiva‑Quadro, acima referida, adaptações técnicas mínimas, ao contrário das alterações de elementos estruturais que afetem a construção ou o funcionamento de um veículo, quando este cumpre todas as condições exigidas para beneficiar de uma homologação CE.

63.      Em conclusão, proponho ao Tribunal de Justiça que considere, por um lado, que a Diretiva‑Quadro e a Diretiva 70/311 são perfeitamente aplicáveis às regulamentações controvertidas, no caso dos automóveis de passageiros novos, e, por outro, que, por esta razão, se verifica um incumprimento tanto da República da Lituânia como da República da Polónia.

64.      Caso o Tribunal de Justiça declare que as referidas diretivas não são aplicáveis em conformidade com as pretensões da República da Lituânia, haveria que declarar, em todo o caso, que, relativamente a todos os veículos visados nas presentes ações por incumprimento (59), os Estados‑Membros devem respeitar, no exercício das suas competências legislativas, as obrigações que resultam das disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de mercadorias (60).

C —    Quanto à acusação relativa aos automóveis de passageiros já matriculados noutro Estado‑Membro

1.      Quanto às posições das partes

65.      A Comissão censura a República da Lituânia, bem como a República da Polónia, por não terem cumprido as obrigações que incumbem a todos os Estados‑Membros por força das disposições de direito primário relativas à livre circulação de mercadorias, ao limitarem a matrícula no seu território dos automóveis de passageiros cujo dispositivo de direção está situado à direita. Considera que estas restrições constituem um obstáculo desproporcionado ao direito de importação desses veículos de outros Estados‑Membros da União em que foram anteriormente matriculados.

66.      Em sua defesa, a República da Polónia entende que as medidas nacionais em causa não podem ser consideradas uma restrição proibida pelo artigo 34.° TFUE. Ao contrário, a República da Lituânia reconhece que as disposições aplicáveis e a prática seguida na Lituânia constituem uma limitação da livre circulação de mercadorias, na aceção do artigo 34.° TFUE. Ambas afirmam que, em todo o caso, uma restrição desta natureza se justifica por finalidades relativas à salvaguarda da segurança rodoviária, e à proteção da vida e da saúde humanas. A Comissão não discute o caráter de interesse geral que esses objetivos revestem, mas recusa que as medidas tomadas pelos dois Estados demandados sejam totalmente necessárias e adequadas para dar resposta a estas preocupações.

2.      Quanto à existência de uma restrição à livre circulação de mercadorias, na aceção do artigo 34.° TFUE

67.      Na ausência de harmonização pelo direito da União das legislações nacionais aplicáveis, em matéria de matrícula por um Estado‑Membro de veículos importados para o seu território depois de terem sido anteriormente matriculados noutro Estado‑Membro, as medidas nacionais controvertidas devem ser examinadas à luz das disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de mercadorias. A este respeito, recordo que resulta do artigo 1.°, n.° 1, da Diretiva‑Quadro que a mesma harmoniza apenas «as disposições administrativas e os requisitos técnicos gerais aplicáveis à homologação de todos os veículos novos que sejam abrangidos pelo seu âmbito de aplicação» (61).

68.      Preciso, desde já, que considero que a proibição de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, enunciada no artigo 34.° TFUE, se aplica a disposições nacionais como as visadas nas presentes ações.

69.      Com efeito, resulta de jurisprudência constante que as regulamentações dos Estados‑Membros que sejam suscetíveis de entravar direta ou indiretamente, atual ou potencialmente, o comércio no interior da União Europeia devem ser consideradas como medidas de efeito equivalente a restrições desse tipo (62).

70.      Ora, no caso em apreço, a Comissão alega corretamente que as regulamentações lituana e polaca têm como efeito um tratamento menos favorável das mercadorias provenientes de outros Estados‑Membros, ou seja, dos veículos cujo dispositivo de direção está situado à direita que foram anteriormente matriculados fora do território nacional, na medida em que os possuidores desses veículos podem ser dissuadidos de os importar, com vista a proceder à sua matrícula na Lituânia ou na Polónia, tendo em conta a obrigação de transferir esse dispositivo para a esquerda, o que implica uma transformação importante (63).

71.      A República da Lituânia não contesta este aspeto da ação por incumprimento intentada contra si, à semelhança da República da Estónia, segundo o articulado de intervenção que esta apresentou no referido processo.

72.      Em contrapartida, a República da Polónia defende que a sua regulamentação não entrava a livre circulação de mercadorias, dado que, por um lado, a matrícula não é mais do que uma formalidade administrativa, e não uma condição para a aquisição do veículo, e, por outro, a obrigação controvertida aplica‑se a todos os veículos cujo dispositivo de direção está situado do lado direito, independentemente da sua origem, precisando que também são fabricados na Polónia alguns veículos desse tipo (64) e que podem ser comprados nesse país.

73.      Todavia, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que mesmo que, como nos presentes processos, as medidas em causa sejam indistintamente aplicáveis e, portanto, não visem apenas mercadorias provenientes de outros Estados‑Membros, este facto não impede que se considere que a proibição controvertida tem um efeito equivalente a uma restrição quantitativa, na aceção do artigo 34.° TFUE, quando uma mercadoria legalmente fabricada e comercializada noutro Estado‑Membro não é admitida sem condições limitativas no mercado do Estado‑Membro demandado (65).

74.      Ora, na minha opinião, as regulamentações objeto das presentes ações por incumprimento são suscetíveis de desfavorecer mais especificamente veículos importados dos outros Estados‑Membros depois de terem sido aí matriculados, quando os mesmos devem beneficiar da livre circulação de mercadorias. Com efeito, os potenciais compradores que residem na Lituânia ou na Polónia, sabendo que deverão suportar despesas elevadas para a transformação de um veículo equipado com volante à direita, perdem praticamente o interesse que poderiam ter em adquirir tais veículos noutro Estado‑Membro em que a sua venda seja frequente (66).

75.      A este respeito, recordo que as disposições relativas à livre circulação de mercadorias são aplicáveis tanto aos produtos originários dos Estados‑Membros, como aos produtos provenientes de países terceiros que se encontrem em livre prática nos Estados‑Membros (67). Além disso, segundo jurisprudência constante (68), um produto torna‑se nacional desde que tenha sido importado e colocado no mercado, do que resulta que os automóveis usados importados e os que são comprados no país constituem produtos similares ou concorrentes.

76.      Portanto, o tratamento que República da Lituânia e República da Polónia reservam à matrícula de veículos munidos de direção à direita, provenientes de outros Estados‑Membros, é desvantajoso em relação aos veículos usados que se encontram no seu território nacional, que são, na sua grande maioria, equipados com direção à esquerda.

77.      Em meu entender, de todas estas considerações resulta que uma regulamentação como as que estão em causa tem por efeito entravar a livre circulação de mercadorias, na aceção do artigo 34.° TFUE.

3.      Quanto à existência de uma justificação nos termos do artigo 36.° TFUE

78.      A República da Lituânia e a República da Polónia defendem‑se nas ações intentadas contra si alegando que, mesmo que o Tribunal de Justiça considerasse que o entrave existe, não deveriam contudo ser condenadas, dado que as medidas controvertidas visam preservar tanto a segurança rodoviária como a saúde e a vida humanas. A Comissão considera, pelo contrário, que os entraves verificados não podem beneficiar de uma justificação desta natureza.

a)      Quanto à admissibilidade da justificação invocada

79.      O artigo 36.° TFUE prevê expressamente que o objetivo de «proteção da saúde e da vida das pessoas» é uma das razões suscetíveis de justificar entraves à livre circulação de mercadorias, que configuram restrições quantitativas ou medidas de efeito equivalente. O Tribunal de Justiça já declarou que o referido objetivo ocupa mesmo o primeiro lugar entre os interesses que são protegidos por esta disposição de caráter derrogatório (69). Também segundo jurisprudência constante, na ausência de normas de harmonização adequadas para garantir a saúde e a vida das pessoas, compete aos Estados‑Membros decidir do nível a que pretendem assegurá‑las e o modo como esse nível pode ser alcançado, sendo precisado que a margem de apreciação assim concedida deve todavia ser exercida dentro dos limites impostos pelo Tratado (70).

80.      Por outro lado, o Tribunal de Justiça consagrou a inclusão da segurança rodoviária entre as exigências imperativas de interesse geral que, embora não sejam mencionadas no artigo 36.° TFUE, são também suscetíveis de justificar restrições à livre circulação de mercadorias intracomunitária, na ausência de uma regulamentação comum exaustiva que seja aplicável no domínio em causa (71). Embora seja verdade que, como a República da Lituânia e a República da Polónia alegam, os Estados‑Membros podem decidir do nível a que pretendem garantir a segurança rodoviária no seu território, não existindo disposições de harmonização completa ao nível da União, os mesmos devem porém ter em conta as exigências inerentes à livre circulação de mercadorias, como o Tribunal de Justiça tem várias vezes lembrado (72).

81.      No caso em apreço, a Comissão não contesta a seriedade dos riscos contra os quais a República da Lituânia e a República da Polónia afirmam querer acautelar‑se, uma vez que admite que os objetivos que estas invocam podem ser legítimos em si. No entanto, alega, acertadamente, que isso não é suficiente para o cumprimento das obrigações que resultam do direito da União.

82.      Com efeito, como o Tribunal de Justiça declarou, é certo que uma regulamentação nacional pode derrogar o princípio fundamental da livre circulação de mercadorias, em nome da proteção da vida e da saúde humanas ou da segurança rodoviária, mas apenas desde que as medidas adotadas, por um lado, sejam adequadas para preservar os interesses legítimos que invocam, e por outro, não violem o referido princípio para além do que é indispensável para atingir esse fim (73). Antes de mais, há que verificar se essas condições estão reunidas no que respeita às medidas objeto das presentes ações.

b)      Quanto à proporcionalidade dos meios utilizados

83.      Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que é aos Estados‑Membros demandados que incumbe demonstrar, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, em primeiro lugar, que a regulamentação controvertida é adequada para garantir a realização dos objetivos prosseguidos e, em segundo lugar, que não vai além do necessário para que estes objetivos sejam alcançados (74).

84.      A questão que se coloca a respeito da primeira destas condições é a de saber se as medidas adotadas pela República da Lituânia e pela República da Polónia, que consistem em sujeitar a matrícula de veículos, cujo dispositivo de direção esteja situado à direita, à transferência do mesmo para a esquerda, são efetivamente suscetíveis de garantir a segurança rodoviária e de salvaguardar a saúde e a vida das pessoas.

85.      Observo que a Comissão, depois de num primeiro momento parecer tê‑lo posto em dúvida, já não contesta verdadeiramente a realidade dos perigos contra os quais os Estados‑Membros demandados indicam pretender acautelar‑se, impondo estas exigências especiais relativamente a tais veículos. Em meu entender, é inegável que a condução dos mesmos num território em que a circulação é efetuada pela direita é mais difícil, ou mesmo mais perigosa, dado que o condutor tem um campo de visão mais reduzido do que se estivesse posicionado do lado esquerdo do veículo e, por conseguinte, mais perto do eixo central da estrada. Isto suscita problemas sobretudo durante as manobras de ultrapassagem e, em especial, em estradas bidirecionais com faixa de rodagem única, como alegam a República da Lituânia e a República da Polónia (75) e como a Comissão parece reconhecer, embora sublinhe que a posição do dispositivo de direção não é o único fator de risco de acidentes (76).

86.      Esclareço que não partilho da opinião da Comissão, segundo a qual se afigura paradoxal, ou mesmo incoerente, da parte da República da Lituânia e da República da Polónia, que estas sejam mais tolerantes relativamente a veículos deste tipo que circulem de forma temporária no seu território (77). Esta tolerância resulta expressamente da lei lituana relativa à segurança rodoviária (78). No caso da Polónia, resulta da sua contestação que a regulamentação controvertida não diz respeito aos turistas (79).

87.      A este respeito, saliento que as exceções em causa resultam de acordos de direito internacional. Com efeito, nos termos do artigo 39.°, n.° 1, em conjugação com o anexo n.° 5, ponto 1, da Convenção sobre a Circulação Rodoviária, assinada em Viena, em 8 de novembro de 1968 (80), todos os veículos automóveis em circulação internacional devem satisfazer o disposto na referida convenção, bem como os requisitos técnicos em vigor no respetivo país de matrícula quando colocados em serviço pela primeira vez. Todavia, o ponto 8 do seu anexo n.° 1 (81) prevê que «[a]s Partes Contratantes podem recusar a admissão no respetivo território, em circulação internacional, de qualquer automóvel equipado com luzes de cruzamento de feixes assimétricos se a regulação dos feixes não estiver adaptada ao sentido de trânsito nesse território». Portanto, por força das disposições desta convenção, que vinculam a República da Lituânia e a República da Polónia (82), estas são obrigadas a admitir a circulação no seu território nacional de veículos automóveis cujo dispositivo de direção esteja situado à direita que tenham sido matriculados no estrangeiro, embora possam exigir uma adaptação temporária do seu dispositivo de iluminação, mediante, por exemplo, a utilização de autocolantes corretores de cor negra.

88.      Em todo o caso, reconheço que o facto de sujeitar a matrícula a uma transferência do dispositivo de direção dos veículos concebidos para circular pela esquerda é uma medida que, pela sua natureza radical, é adequada para assegurar uma proteção eficaz dos utentes da estrada no território de Estados‑Membros onde, como na Lituânia e na Polónia, a circulação é efetuada pela direita, uma vez que a referida medida elimina os riscos próprios da circulação destes veículos em tais condições.

89.      Todavia, em meu entender, o entrave à livre circulação de mercadorias criado por uma exigência desta natureza é desproporcionado, dado que poderiam ter sido tomadas medidas menos exorbitantes do direito comum para alcançar os mesmos fins.

90.      A este respeito, a Comissão sublinha, corretamente, que as medidas em causa se aplicam de forma automática e de modo geral, designadamente, sem tomar em consideração o facto de o veículo em causa já ter sido homologado e matriculado num Estado‑Membro em que a circulação é realizada pela esquerda ou então num Estado‑Membro em que a mesma é efetuada pela direita (83). Efetivamente, as regulamentações controvertidas impõem obrigações vinculativas sem ter em conta o facto de as medidas eventualmente tomadas no Estado‑Membro onde o veículo já foi matriculado, também com vista a assegurar a segurança rodoviária, poderem ser de eficácia equivalente à das estabelecidas pelo Estado‑Membro de importação, em especial no caso em que o sentido da circulação no primeiro Estado‑Membro é o mesmo que na Lituânia e na Polónia.

91.      Além disso, a Comissão alega que existem medidas menos restritivas do que as adotadas pela República da Lituânia e pela República da Polónia, mas que, apesar disso, seriam suscetíveis de ajudar os condutores de veículos equipados com volante à direita a circularem sem riscos num tráfego cujo sentido da circulação é pela direita.

92.      Propondo diversas modalidades de substituição, a Comissão refere, em primeiro lugar, a possibilidade de ser absolutamente proibida por lei a ultrapassagem, para este tipo de veículos, em estradas com faixa de rodagem única e com duplo sentido de circulação, mas, antes de mais, afirmo que esta proposta me parece inoperante, ou mesmo perigosa (84). A Comissão sugere também que seja imposto que estes veículos sejam equipados com dispositivos que corrijam o campo de visão do condutor, a fim de lhe facilitar as manobras de ultrapassagem (85). Apesar do facto de a República da Lituânia e a República da Polónia contestarem a pertinência desta segunda abordagem, há que sublinhar que foram precisamente medidas desta natureza que foram adotadas pela maior parte dos Estados‑Membros.

93.      Com efeito, segundo os elementos de direito comparado de que disponho, as normas em vigor nos dois Estados‑Membros, o objeto das presentes ações por incumprimento, são relativamente isoladas. A matrícula dos veículos de passageiros cujo dispositivo de direção está situado do mesmo lado que o sentido da circulação, quer se trate de veículos novos ou de veículos que já foram matriculados noutro Estado‑Membro, apenas é proibida também na Letónia (86) e na Eslováquia (87), e, em menor medida, na Estónia (88).

94.      Pelo contrário, em todos os outros Estados‑Membros, a regulamentação nacional ou não contém qualquer proibição ou limitação quanto à matrícula de tais veículos (89), ou autoriza‑os expressamente, por vezes fazendo referência às exigências decorrentes do direito da União (90).

95.      Tanto quanto tenho conhecimento, as regras previstas para matrículas deste tipo nestes Estados‑Membros limitam‑se, regra geral, a condições ou adaptações de ordem essencialmente técnica, relativas sobretudo, ou mesmo exclusivamente, aos dispositivos de iluminação, para não encandear os outros utentes da estrada e ver melhor os peões na berma da estrada, ou aos espelhos retrovisores, para assegurar um maior campo de visão ao condutor (91).

96.      O facto de a abordagem mais moderada ter sido seguida na maior parte dos Estados‑Membros ilustra bem que, no domínio em causa nas duas ações, a proteção da segurança rodoviária pode ser suficientemente garantida através de medidas menos restritivas do que a que consiste em sujeitar a matrícula dos veículos equipados com dispositivo de direção à direita à transferência do mesmo para a esquerda. Do ponto de vista dos cidadãos europeus que pretendam importar um veículo desse tipo para a Lituânia ou para a Polónia, apesar de a República da Lituânia afirmar — sem disso apresentar prova formal — que a Comissão exagerou o encargo financeiro que decorre dessa operação de transferência, é evidente que é menos restritivo e menos oneroso ter simplesmente de proceder à regulação das luzes de cruzamento ou investir num espelho retrovisor adicional.

97.      É certo, como alega a República da Polónia, que para apreciar o respeito do princípio da proporcionalidade em matéria de segurança rodoviária, importa ter em conta o facto de que cada Estado‑Membro pode decidir sobre o nível e o modo como pretende garantir a proteção da mesma. Dado que esse nível é suscetível de variar de um Estado‑Membro para outro, resulta da margem de apreciação assim reconhecida aos Estados‑Membros que o simples facto de outro Estado‑Membro impor regras menos estritas do que as aplicáveis no Estado‑Membro demandado não implica necessariamente que estas últimas sejam desproporcionadas e, portanto, incompatíveis com as regras relativas à livre circulação de mercadorias (92).

98.      Contudo, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça (93), considero que os elementos de direito comparado acima expostos podem constituir, no caso em apreço, uma séria indicação do caráter excessivo das regulamentações visadas nas ações por incumprimento, dado que estes elementos são reveladores de que outras medidas menos restritivas são aplicadas sem dificuldades especiais por uma larga maioria dos Estados‑Membros da União.

99.      Considero que os Estados demandados poderiam ter adotado medidas de substituição menos atentatórias da livre circulação de mercadorias, dado que não demonstram, embora sobre eles recaia o ónus da prova a esse respeito (94), que os riscos que podem estar relacionados com os veículos em causa no seu território são particularmente diferentes dos que se verificam no território dos outros Estados‑Membros.

100. As estatísticas apresentadas pelos dois Estados demandados, na medida em que podem resultar de outros fatores de insegurança rodoviária (95), não são a este respeito comprovativas, uma vez que não permitem estabelecer que a taxa de acidentes provocados, no território nacional desses Estados, por veículos cujo dispositivo de direção está situado à direita é significativamente superior comparativamente com os acidentes do mesmo tipo ocorridos no território dos Estados‑Membros cuja regulamentação é menos exigente (96).

101. Pelo mesmo motivo de falta na produção da prova, há que afastar o argumento da República da Polónia segundo o qual esta tinha de fazer face a um afluxo massivo deste tipo de veículos que criava um perigo consideravelmente mais importante no seu território nacional e tornava necessário adotar requisitos mais rigorosos, de consequências muito mais onerosas e portanto dissuasivas, do que na maioria dos Estados‑Membros.

102. É certo que o Tribunal de Justiça já aceitou que sejam tomadas em consideração certas particularidades do Estado‑Membro em questão (97), para efeitos da apreciação da proporcionalidade da restrição em causa. No entanto, neste caso, não está demonstrado que a adoção das regulamentações controvertidas tenha sido inspirada pela particularidade dos dois Estados demandados relativa ao facto de um grande número dos seus nacionais que emigraram para a Irlanda e para o Reino Unido terem grande interesse em importar automóveis de passageiros provenientes destes últimos Estados, quando regressam ao seu país de origem, para aí se instalarem de forma permanente.

103. Assim, parece que os meios utilizados tanto pela República da Lituânia como pela República da Polónia, que consistem em sujeitar a matrícula de tais veículos à transferência do dispositivo de direção, são desproporcionados em relação aos objetivos de proteção da segurança rodoviária e de salvaguarda da saúde e da vida humanas invocados.

104. Tendo em conta estes elementos e, em especial, a falta de compatibilidade das medidas nacionais em causa com a exigência de proporcionalidade imposta pelo direito da União, considero que estes dois Estados‑Membros não cumpriram as obrigações que lhes incumbem por força dos artigos 34.° TFUE e 36.° TFUE e que as referidas medidas não podem ser mantidas.

D —    Quanto às despesas

105. Nos termos do artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão requerido a condenação nas despesas da República da Lituânia e da República da Polónia, respetivamente, caberá deferir estes pedidos, se, como proponho, as presentes ações por incumprimento foram julgadas procedentes e os referidos Estados‑Membros não vejam acolhidos os seus fundamentos de defesa.

106. Em conformidade com o artigo 140.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que requereram a intervenção nos presentes litígios suportarão as suas próprias despesas.

IV — Conclusão

107. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça declare o seguinte:

«1) Ao manterem em vigor disposições nacionais, das quais resulta que a matrícula, no seu território, de automóveis de passageiros cujo dispositivo de direção está situado do lado direito, independentemente do facto de os mesmos serem novos ou terem sido anteriormente matriculados noutro Estado‑Membro, está sujeita à transferência do dispositivo de direção destes automóveis para o lado esquerdo, a República da Polónia, no processo C‑639/11, e a República da Lituânia, no processo C‑61/12, não cumpriram as obrigações que lhes incumbem por força do artigo 2.°‑A da Diretiva 70/311/CEE do Conselho, de 8 de junho de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos dispositivos de direção de veículos a motor e seus reboques, conforme alterada pela última vez pela Diretiva 1999/7/CE da Comissão, de 26 de janeiro de 1999, e do artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva 2007/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de setembro de 2007, que estabelece um quadro para a homologação dos veículos a motor e seus reboques, e dos sistemas, componentes e unidades técnicas destinados a serem utilizados nesses veículos (Diretiva‑Quadro), bem como por força dos artigos 34.° TFUE e 36.° TFUE.

2) A República da Polónia é condenada nas despesas no processo C‑639/11 e a República da Lituânia é condenada nas despesas no processo C‑61/12.

3) A República da Lituânia suportará as suas próprias despesas no âmbito da sua intervenção no processo C‑639/11, ao passo que a República da Estónia e a República da Polónia suportarão as suas próprias despesas no âmbito da sua intervenção no processo C‑61/12.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      Diretiva do Conselho, de 8 de junho de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos dispositivos de direção de veículos a motor e seus reboques (JO L 133, p. 10; EE 13 F1 p. 221), conforme alterada em último lugar pela Diretiva da Comissão, de 26 de janeiro de 1999 (JO L 40, p. 36).


3 —      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de setembro de 2007, que estabelece um quadro para a homologação dos veículos a motor e seus reboques, e dos sistemas, componentes e unidades técnicas destinados a serem utilizados nesses veículos (Diretiva‑Quadro) (JO L 263, p. 1). Esta diretiva revogou e substituiu, com efeitos a partir de 29 de abril de 2009, a Diretiva‑Quadro 70/156 do Conselho, de 6 de fevereiro de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à homologação dos veículos a motor e seus reboques (JO L 42, p. 1; EE 13 F1 p. 174).


4 —      Dz. U. de 2005, n.° 108, posição 908, conforme alterada.


5 —      A isenção pode resultar do artigo 68.° desta lei, que prevê que o fabricante ou o importador de um veículo automóvel novo é obrigado a obter, para cada novo modelo de veículo, um certificado de homologação emitido pelo ministro responsável pelos transportes, exceto quando o fabricante ou o importador obteve um certificado de homologação emitido, segundo o procedimento de homologação comunitária, pela entidade competente de um Estado‑Membro da União Europeia.


6 —      Dz. U. de 2003, n.° 32, posição 262, conforme alterada.


7 —      Dz. U. de 2003, n.° 227, posição 2250, conforme alterada.


8 —      Dz. U. de 2009, n.° 155, posição 1232. O referido regulamento, que entrou em vigor em 22 de setembro de 2009, foi revogado, em 8 de outubro de 2012, pelo Regulamento do Ministério dos Transportes de 26 de junho de 2012 (Dz. U. de 2012, n.° 0, posição 996).


9 —      Valstybės žinios, de 31 de outubro de 2000, n.° 92‑2883. A Comissão precisa que entrou em vigor, a partir de 1 de julho de 2008, uma nova versão desta lei.


10 —      No ponto 4.18 da Decisão n.° 2B‑152 do referido diretor, de 9 de maio de 2006, que estabelece as regras de homologação por modelo dos equipamentos de direção de veículos motorizados, este sistema é definido como o «dispositivo que altera a direção da marcha do veículo, e que inclui o comando de direção, a transmissão da direção, as rodas direcionais, e a alimentação de energia, se for esse o caso».


11 —      V. n.os 8 e 9 das presentes conclusões.


12 —      V. n.° 10 das presentes conclusões.


13 —      V. n.os 6 e 7 das presentes conclusões.


14 —      Atualmente, também fazem parte do grupo dos Estados‑Membros em que a circulação se efetua por esse lado, a República de Chipre e a República de Malta.


15 —      Parece‑me que a República da Finlândia foi o último dos Estados‑Membros em causa a aderir a esta prática, dado que a regra que exigia, com algumas exceções, que o dispositivo de direção estivesse situado à esquerda só foi abolida a partir de 1 de janeiro de 2003.


16 —      Os problemas relacionados com o registo dos veículos provenientes de outros Estados‑Membros figuram entre as vinte principais preocupações em relação ao atual mercado único [v. exposição de motivos da Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que simplifica a transferência no interior do Mercado Único de veículos a motor registados noutro Estado‑Membro, de 4 de abril de 2012, COM(2012) 164 final, p. 2, e as estatísticas contidas em http://europa.eu/rapid/press‑release_MEMO‑12‑242_en.htm].


17 —      O artigo 1.° da Diretiva 70/311 identifica os veículos abrangidos pelas suas disposições através de remissão para a definição que era dada na Diretiva 70/156. No caso da Diretiva‑Quadro, os seus quarto considerando e segs. expõem as razões pelas quais o seu âmbito material foi alargado em relação às disposições anteriores, ao passo que os seus artigos 1.°, 2.° e 3.°, n.os 11 e segs., determinam a que veículos novos a mesma é aplicável. Quanto ao artigo 34.° TFUE, as suas disposições são suscetíveis de englobar qualquer tipo de veículos.


18 —      Do mesmo modo, no acórdão de 13 de julho de 2006, Voigt (C‑83/05, Colet., p. I‑6799, n.° 15), o Tribunal de Justiça declarou que a Diretiva 70/156 não continha nenhuma disposição que inclua a classificação dos veículos a motor na categoria dos «veículos de passageiros».


19 —      Ao contrário, por exemplo, do Regulamento (CE) n.° 1400/2002 da Comissão, de 31 de julho de 2002, relativo à aplicação do n.° 3 do artigo 81.° do Tratado a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no setor automóvel (JO L 203, p. 30), que define «[v]eículo de passageiros» como «o veículo a motor destinado ao transporte de passageiros e que inclua, no máximo, oito lugares para além do lugar do condutor».


20 —      Conforme definida, nomeadamente, no anexo I, nota b), ponto 1, da Diretiva 70/156.


21 —      Sustenta que a Comissão reconheceria implicitamente que a circulação de veículos dotados de um dispositivo de direção à direita representa um perigo no que diz respeito a veículos comerciais pesados, o que permitiria ao menos limitar a matrícula destes últimos veículos, por razões de segurança, sem que isso seja contrário ao direito da União.


22 —      V. n.° 11 das presentes conclusões.


23 —      V. nomeadamente, acórdãos de 14 de maio de 2002, Comissão/Alemanha (C‑383/00, Colet., p. I‑4219, n.° 19) e de 11 de junho de 2009, Comissão/França (C‑327/08, n.° 26).


24 —      O Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que, no quadro do cumprimento da missão que lhe foi confiada pelo artigo 258.° TFUE, a Comissão é livre de determinar o objeto do litígio [v. nomeadamente, acórdãos de 18 de maio de 2006, Comissão/Espanha (C‑221/04, Colet., p. I‑4515, n.os 33 e segs.), e de 19 de maio de 2009, Comissão/Itália (C‑531/06, Colet., p. I‑4103, n.° 23)].


25 —      Com efeito, qualquer medida nacional adotada num domínio que foi objeto de uma harmonização exaustiva ao nível comunitário deve, primeiro, ser examinada à luz das disposições dessa medida de harmonização, antes de o ser com base nas disposições do direito primário [v. nomeadamente, acórdãos de 5 de junho de 2008, Comissão/Polónia (C‑170/07, n.° 35); de 16 de dezembro de 2008, Gysbrechts e Santurel Inter (C‑205/07, Colet., p. I‑9947, n.° 33); e de 6 de setembro de 2012, Comissão/Bélgica (C‑150/11, n.° 47)].


26 —      V. preâmbulo da Diretiva‑Quadro 70/156.


27 —      V., em especial, Resolução do Conselho, de 7 de maio de 1985, relativa a uma nova abordagem em matéria de harmonização e de normalização (JO C 136, p. 1; EE 16 F1 p. 248).


28 —      Estas têm por objetivo definir as prescrições técnicas harmonizadas que são aplicáveis a cada um dos vários elementos ou das várias características do veículo, segundo o quarto considerando da Diretiva 70/156.


29 —      O sublinhado é meu.


30 —      Segundo o considerando 3, os referidos requisitos técnicos «deverão ter como principal objetivo assegurar um elevado nível de segurança rodoviária» e segundo o considerando 14, «[o] principal objetivo da legislação relativa à homologação de veículos consiste em garantir que os novos veículos, componentes e unidades técnicas colocados no mercado oferecem um elevado nível de segurança e de proteção do ambiente».


31 —      Ponto 3.2 da comunicação interpretativa da Comissão relativa aos procedimentos de matrícula de veículos a motor provenientes de outro Estado‑Membro (JO C 68, p. 15).


32 —      V. considerando 2 da Diretiva‑Quadro.


33 —      O sublinhado é meu.


34 —      Atos relativos à adesão às Comunidades Europeias do Reino da Dinamarca, da Irlanda, do Reino da Noruega e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte (JO L 73 de 27 de março de 1972, p. 14).


35 —      Precisando‑se que, desde então, a referida diretiva já não inclui apenas um anexo, mas quatro. V. alterações introduzidas, em último lugar, pela Diretiva 1999/7/CE da Comissão, de 26 de janeiro de 1999, que adapta ao progresso técnico a Diretiva 70/311 (JO L 40, p. 36).


36 —      V. quinto e sexto considerandos da antiga Diretiva‑Quadro 70/156.


37 —      Textos conforme alterados à data do termo do prazo de dois meses estabelecido nos pareceres fundamentados que a Comissão dirigiu, por um lado, à República da Polónia, e por outro, à República da Lituânia, ou seja, 1 de dezembro de 2010 e 25 de janeiro de 2011, respetivamente, datas que determinam, relativamente a cada um destes Estados‑Membros, o momento em que a existência do alegado incumprimento deve ser apreciada.


38 —      A República da Lituânia invoca o n.° 18 deste acórdão, já referido, no qual o Tribunal de Justiça declarou que «a Diretiva 70/156 diz [...] respeito às características técnicas de um modelo de veículo e não contém nenhuma indicação relativa às regras de circulação rodoviária que devem respeitar os condutores de veículos a motor», o que vale igualmente para a Diretiva‑Quadro 2007/46, que a substituiu a partir de 29 de abril de 2009.


39 —      Com efeito, resulta do referido acórdão (em especial, n.os 14, 17 e 20) que, no processo em causa, o Tribunal de Justiça se pronunciou unicamente sobre a questão de saber se o legislador comunitário tinha pretendido ligar à receção comunitária por modelo de veículos, instituída pela Diretiva 70/156, consequências no que diz respeito à aplicação das regras nacionais da circulação rodoviária que regem a velocidade das diferentes categorias de veículos a motor.


40 —      V. artigos 8.°, n.° 3, e 29.° da Diretiva‑Quadro 2007/46.


41 —      V., a respeito do artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 70/156, equivalente ao artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva‑Quadro, acórdão de 29 de maio de 1997, VAG Sverige (C‑329/95, Colet., p. I‑2675, n.os 18 e 19), bem como, por analogia, acórdão de 17 de abril de 2007, AGM‑COS.MET (C‑470/03, Colet., p. I‑2749, n.° 70).


42 —      Esta disposição prevê, sob o título de «Disposições específicas aplicáveis aos veículos», que «[o]s Estados‑Membros devem conceder a homologação CE a [...] [m]odelos de veículos que estejam em conformidade com as informações contidas no dossier de fabrico e que satisfaçam os requisitos técnicos exigidos nos atos regulamentares aplicáveis enumerados no anexo IV».


43 —      V. p. 10, ponto 5, da proposta alterada de diretiva, de 29 de outubro de 2004 [COM 2004 (738) final].


44 —      O sublinhado é meu.


45 —      Nos termos do artigo 18.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da referida diretiva, relativo ao «Certificado de conformidade», «[o] fabricante, na sua qualidade de titular de um certificado de homologação CE de um veículo, deve entregar um certificado de conformidade a acompanhar cada veículo completo, incompleto ou completado, fabricado em conformidade com o modelo do veículo homologado».


46 —      O referido anexo IX, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 385/2009 da Comissão, de 7 de maio de 2009, que substitui o anexo IX da Diretiva‑Quadro (JO L 118, p. 13), é relativo ao «Certificado de conformidade CE». O ponto 0 deste anexo define o duplo objetivo deste certificado, precisando que, por um lado o mesmo «é uma declaração emitida pelo fabricante do veículo ao comprador, a fim de lhe garantir que o veículo adquirido cumpre a legislação em vigor na União Europeia à data em que foi produzido», e, por outro, que «serve igualmente para as autoridades competentes dos Estados‑Membros poderem matricular os veículos sem terem de exigir ao requerente a apresentação de documentação técnica complementar».


47 —      Segundo o referido anexo IX, o lado 1 do certificado de conformidade CE contém uma menção segundo a qual «o veículo [...] pode ser matriculado a título definitivo nos Estados‑Membros cujo trânsito circula pela direita/esquerda (b) [...] (d)». A este respeito, a nota explicativa da alínea b), referente a este anexo, precisa que se deve «[i]ndicar se o veículo é adequado para circular à direita, à esquerda ou se é adequado para ambos os tipos de circulação».


48 —      O anexo I da Diretiva‑Quadro contém a «Lista completa de informações para efeitos de homologação CE de veículos». O ponto 1 deste anexo, intitulado «Designação(ões) da constituição geral do veículo», exige, no seu ponto 1.8, que seja indicado o «Lado da condução: direito/esquerdo» e, no seu ponto 1.8.1, a menção «O veículo está equipado para se deslocar no trânsito que circula pela direita/esquerda». Na parte I, pontos 1, 1.8, e 1.8.1, do anexo III, relativo à «Ficha de informações para efeitos de homologação CE de veículos», figuram disposições idênticas.


49 —      Tanto quanto tenho conhecimento, a apresentação do referido certificado é determinante, nomeadamente, na Bélgica, na República Checa, em França, em Itália, no Luxemburgo, em Malta, na Áustria e na Suécia.


50 —      Segundo as informações de que disponho, é este o caso, nomeadamente, na Bélgica, na República Checa, na Dinamarca, na Alemanha, em Espanha, em França, em Chipre, no Luxemburgo, na Hungria, nos Países Baixos, na Roménia, na Finlândia, na Suécia e no Reino Unido.


51 —      O referido apêndice contém um modelo de «Ficha de Informações [...] nos termos do anexo I da Diretiva [70/156] relativa à homologação CE de um veículo no que diz respeito ao dispositivo de direção». O ponto 1 desta ficha, relativo à «Constituição geral do veículo», inclui um ponto 1.8, com a seguinte redação: «Lado da condução: direito/esquerdo».


52 —      Nota I/117/71, de 28 de junho de 1971, do Conselho das Comunidades Europeias.


53 —      A Comissão alega que, no ponto 3 deste relatório, o referido grupo considerou que a posição do dispositivo de direção no lado direito ou no lado esquerdo do veículo constituía um problema de natureza económica e não uma prescrição técnica.


54 —      Alterações inseridas na Diretiva 71/127/CEE do Conselho, de 1 de março de 1971, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos espelhos retrovisores dos veículos a motor (JO L 68, p. 1; EE 13 F1 p. 247).


55 —      V., no ato relativo às condições de adesão e às adaptações dos Tratados (JO L 73, em especial, p. 114 e segs.), as diretivas indicadas nas posições 2 a 10 do ponto X, intitulado «Entraves técnicos», do anexo I do referido ato, em especial as posições 7 e 10.


56 —      Considerando 3 cujo teor é reproduzido na nota 30 das presentes conclusões.


57 —      O ponto 4 do referido anexo estabelece as «Disposições relativas ao fabrico» e, em especial, no seu ponto 4.1.1, que «[o] equipamento de direção deve permitir uma condução fácil e segura do veículo para velocidades menores ou iguais à sua velocidade máxima por construção».


58 —      N.° 40 das presentes conclusões.


59 —      Ou seja, neste caso, os automóveis de passageiros equipados de dispositivo de direção situado à direita, independentemente do facto de os mesmos serem novos ou terem sido anteriormente matriculados noutro Estado‑Membro.


60 —      V., nomeadamente, acórdão de 18 de novembro de 2010, Lahousse e Lavichy (C‑142/09, Colet., p. I‑11685, n.° 43).


61 —      O sublinhado é meu.


62 —      V., nomeadamente, acórdãos de 11 de julho de 1974, Dassonville (8/74, Recueil, p. 837, n.° 5, Colet., p. 423), e Comissão/Bélgica, já referido, n.° 50 e jurisprudência aí citada.


63 —      A Comissão alega que esta operação exige a substituição da quase totalidade do dispositivo de direção e de travagem, bem como de todo o painel de instrumentos.


64 —      Numa fábrica da sociedade General Motors.


65 —      Acórdãos de 20 de fevereiro de 1979, Rewe‑Zentral (120/78, Recueil, p. 649, n.° 14); de 6 de outubro de 2011, Bonnarde (C‑443/10, Colet., p. I‑9327, n.° 27, e jurisprudência aí referida), e de 18 de outubro de 2012, Elenca (C‑385/10, n.os 22 e 23, e jurisprudência aí referida).


66 —      V., por analogia, acórdãos de 10 de abril de 2008, Comissão/Portugal (C‑265/06, Colet., p. I‑2245, n.° 33); de 24 de abril de 2008, Comissão/Luxemburgo (C‑286/07, Colet., n.os 32 e 34), e Bonnarde, já referido, n.° 30.


67 —      Em conformidade com o artigo 28.°, n.° 2, TFUE.


68 —      V., nomeadamente, acórdão de 11 de dezembro de 1990, Comissão/Dinamarca (C‑47/88, Colet., p. I‑4509, n.° 17).


69 —      V., nomeadamente, acórdão de 5 de junho de 2007, Rosengren e o. (C‑170/04, Colet., p. I‑4071, n.° 39).


70 —      Acórdãos de 11 de setembro de 2008, Comissão/Alemanha (C‑141/07, Colet., p. I‑6935, n.° 51), de 1 de março de 2012, Ascafor e Asidac (C‑484/10, n.° 60, e jurisprudência aí referida), e Elenca, já referido, n.° 28.


71 —      Acórdãos de 5 de outubro de 1994, van Schaik (C‑55/93, Colet., p. I‑4837, n.° 19), bem como de 10 de fevereiro de 2009, Comissão/Itália (C‑110/05, Colet., p. I‑519, n.° 60, e jurisprudência aí referida).


72 —      V. nomeadamente, acórdão Comissão/Bélgica (C‑150/11), já referido, n.° 59 e jurisprudência aí citada.


73 —      Acórdãos, já referidos, Gysbrechts e Santurel Inter, n.° 51, e Ascafor e Asidac, n.° 58.


74 —      V., nomeadamente, acórdãos, já referidos, Comissão/Polónia, n.° 47 e jurisprudência aí citada, Comissão/Itália, n.° 62 e jurisprudência aí citada, bem como Comissão/Bélgica, n.os 54 e 60 e jurisprudência aí citada.


75 —      A República da Lituânia e a República da Polónia fazem referência a estudos especializados, segundo os quais o facto de o volante não estar situado do lado do eixo central constituiria um fator importante de aumento do risco de acidentes, devido a uma perda considerável da visibilidade necessária a uma ultrapassagem, tanto à frente do condutor, no que diz respeito à deteção dos veículos que se aproximam à sua frente em sentido inverso, como atrás, no que diz respeito à perceção do ângulo morto no qual se encontram os veículos que vêm de trás.


76 —      A Comissão recorda, corretamente, que a insegurança rodoviária resulta da combinação de diversos fatores, como o estado das infraestruturas rodoviárias, os hábitos de condução ou o estado técnico geral do veículo.


77 —      Alega que pessoas, como os turistas, que conduzem de forma ocasional um automóvel de passageiros cujo dispositivo de direção está à direita, e que, portanto, não estão habituadas ao caráter específico da circulação à direita, constituem uma ameaça mais importante para a segurança rodoviária do que as pessoas que conduzem de forma permanente uma viatura desse tipo pelo lado direito da estrada.


78 —      V. n.° 9 das presentes conclusões.


79 —      Segundo a petição da Comissão, podem também ser concedidas pelo ministro polaco das Infraestruturas exceções aos requisitos nacionais, mas estas não dizem respeito aos automóveis de passageiros, que constituem o objeto da ação por incumprimento, dado que seriam limitadas aos veículos especiais nos quais a posição do volante no lado direito é indispensável à execução adequada das funções a que se destinam (por exemplo, os veículos varredores de ruas), bem como aos veículos do pessoal do corpo diplomático.


80 —      V. Recueil des Traités des Nations Unies, vol. 1042, p. 17, bem como http://treaties.un.org/doc/Publication/MTDSG/Volume%20I/Chapter%20XI/XI‑B‑19.fr.pdf, para a versão consolidada que inclui as alterações que entraram em vigor em 3 de setembro de 1993 e em 28 de março de 2006, respetivamente.


81 —      Anexo relativo às «exceções à obrigação de admitir automóveis e seus reboques em circulação internacional».


82 —      A República da Lituânia aderiu à referida convenção em 20 de novembro de 1991, ao passo que a República da Polónia a assinou em 8 de novembro de 1968 e a ratificou em 23 de agosto de 1984.


83 —      V., por analogia, a respeito de exigências impostas por um Estado‑Membro em relação a veículos anteriormente matriculados noutros Estados‑Membros, acórdãos de 15 de março de 2007, Comissão/Finlândia (C‑54/05, Colet., p. I‑2473, n.° 42), e Comissão/Polónia, já referido (n.os 44 e segs.).


84 —      A República da Polónia afirma que esta proibição poderia ser perigosa, na medida em que esses veículos deveriam poder ultrapassar em determinadas situações de emergência ou quando um veículo lento, como uma máquina agrícola, cria um acentuado abrandamento da velocidade do tráfego e uma longa fila de veículos.


85 —      Como espelhos retrovisores de grande ângulo, câmaras, monitores ou outros sistemas que servem para a visão indireta.


86 —      V. artigo 10.°, n.° 8, alínea 1), da lei relativa à circulação rodoviária (Ceļu satiksmes likums), de 1 de outubro de 1997 e do Regulamento do Governo n.° 1080, relativo à matrícula de veículos (Transportlīdzekļu reģistrācijas noteikumi) de 30 de novembro de 2010.


87 —      V. artigos 16.°‑C, n.° 2, e 17.° da lei n.° 725/2004, relativa às condições de utilização de veículos na circulação rodoviária (Zákon č. 725/2004 Z. z., o podmienkach prevádzky vozidiel v premávke na pozemných komunikáciách a o zmene a doplnení niektorých zákonov).


88 —      V. artigos 63.°, n.os 3 e 6, 73.°, n.° 11, 80.°, n.° 3, e 83.°, n.° 5, da Lei de 17 de junho de 2010, relativa à circulação rodoviária (liiklusseadus) de 17 de junho de 2010, e pontos 301 dos anexos 1 e 2 do Regulamento n.° 42, respeitante aos requisitos técnicos relativos aos veículos e às suas caravanas e aos requisitos relativos ao equipamento (mootorsõiduki ja selle haagise tehnonõuded ning nõuded varustusele) de 13 de junho de 2011.


89 —      Esta questão não está regulada de forma expressa nas disposições de direito nacional relativas à circulação e à segurança rodoviária ou aos veículos a motor, nomeadamente, na Bulgária, na Alemanha, na Irlanda, na Grécia, na Croácia, em Itália, em Malta, na Áustria, ou na Eslovénia.


90 —      Na República Checa, em maio de 2008, foi publicado um comunicado pelo Ministério dos Transportes, segundo o qual é revogado o princípio do dispositivo de direção situado à esquerda, com vista a respeitar as exigências relacionadas, em especial, com a livre circulação de mercadorias. Do mesmo modo, na Finlândia, depois da entrada em vigor da Lei n.° 1090/2002, relativa aos veículos, em 1 de janeiro de 2003, a regra já não é que o dispositivo de direção não pode estar situado do lado direito, a não ser em alguns casos taxativamente enumerados (por exemplo, veículos para o transporte de correio), mas que o veículo deve estar conforme com os requisitos técnicos decorrentes das diretivas nesta matéria.


91 —      É este o caso, nomeadamente, na Bélgica, na República Checa, na Dinamarca, em Espanha, em França, em Chipre, no Luxemburgo, nos Países Baixos, na Roménia, na Suécia e no Reino Unido.


92 —      Acórdão Comissão/Itália, já referido, n.° 65 e jurisprudência aí citada.


93 —      V., por analogia, acórdãos de 28 de janeiro de 2010, Comissão/França (C‑333/08, Colet., p. I‑757, n.° 105), e de 9 de dezembro de 2010, Humanplasma (C‑421/09, Colet., p. I‑12869, n.° 41), nos quais o Tribunal de Justiça reconheceu, em matéria de saúde pública, que a comparação do teor da regulamentação de vários Estados‑Membros, ou seja, de todos ou quase todos os Estados‑Membros, é uma circunstância que pode ser relevante para a apreciação da justificação objetiva apresentada em relação à regulamentação de um Estado‑Membro e, nomeadamente, em relação à apreciação da proporcionalidade desta.


94 —      Além da jurisprudência relativa ao princípio da proporcionalidade, já referida na nota 74 das presentes conclusões, v. jurisprudência mais geral sobre a repartição do ónus da prova em matéria de ações por incumprimento e, em especial, acórdãos de 10 de setembro de 2009, Comissão/Grécia (C‑416/07, Colet., p. I‑7883, n.os 32 e 33) e de 18 de outubro de 2012, Comissão/Reino Unido (C‑301/10, n.os 70 a 72, e a jurisprudência aí referida).


95 —      A Comissão salienta que o facto de a percentagem de acidentes ser mais elevada na Lituânia e na Polónia do que nos outros Estados‑Membros poderia ser explicada por numerosas razões, como o estado das infraestruturas rodoviárias ou a frequência da condução em estado de embriaguez nestes países.


96 —      As estatísticas fornecidas pela República da Polónia dizem respeito à taxa de acidentes que ocorrem no território nacional ou ao número de veículos usados importados de outros Estados‑Membros, mas não fazem qualquer distinção significativa, em termos de segurança rodoviária, entre veículos em que o dispositivo de direção está situado à direita e veículos em que o referido dispositivo está situado à esquerda. A República da Lituânia alega que, segundo os dados do Eurostat, o número de pessoas mortas na estrada na Lituânia e na Polónia é 2 a 3 vezes mais elevado do que nos outros Estados‑Membros, mas sem que isso determine que os acidentes mortais provocados por veículos equipados com direção à direita sejam nitidamente mais numerosos nestes dois Estados.


97 —      Por exemplo, em matéria de saúde pública, os hábitos alimentares da população nacional [acórdão de 5 de fevereiro de 1981, Koninklijke Kaasfabriek Eyssen (53/80, Recueil, p. 409, n.os 13 e 14)].