Language of document : ECLI:EU:T:2012:110

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

7 de março de 2012 (*)

«Auxílios de Estado ― Imposto ambiental sobre os granulados no Reino Unido ― Decisão da Comissão de não levantar objeções ― Vantagem ― Caráter seletivo»

No processo T‑210/02 RENV,

British Aggregates Association, com sede em Lanark (Reino Unido), representada por C. Pouncey, J. Coombes, solicitors, e L. Van den Hende, advogado,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por M. Afonso, J. Flett e B. Martenczuk, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado inicialmente por T. Harris, e em seguida por S. Ossowski, na qualidade de agentes, assistidos por M. Hall e G. Facenna, barristers,

interveniente,

que tem por objeto um pedido de anulação parcial da decisão da Comissão C (2002) 1478 final, de 24 de abril de 2002, relativa ao processo de auxílio de Estado N 863/01 ― Reino Unido/Imposto sobre os granulados,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada),

composto por: J. Azizi (relator), presidente, I. Labucka, S. Frimodt Nielsen, J. Schwarcz e D. Gratsias, juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 16 de maio de 2011,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Os factos na origem do litígio estão expostos nos n.os 1 a 25 do acórdão do Tribunal Geral de 13 de setembro de 2006, British Aggregates/Comissão (T‑210/02, Colet., p. II‑2789, a seguir «acórdão anulado» ou «acórdão do Tribunal»), nos seguintes termos:

«1      A British Aggregates Association é uma associação que representa pequenas empresas independentes que exploram pedreiras no Reino Unido. Tem 55 membros que exploram mais de 100 pedreiras.

2      Os granulados são materiais granulosos, quimicamente inertes, usados no setor da construção civil e das obras públicas. Podem ser utilizados enquanto tais, por exemplo, como entulho ou balastro, ou misturados com ligantes como o cimento (o que permite obter betão) ou o betume. Determinados materiais naturalmente granulosos, como a areia e a gravilha, podem obter‑se por peneiração. Outros materiais, como a rocha dura, têm que ser triturados antes da peneiração. Os granulados utilizados para diversas finalidades devem reunir as especificações correspondentes e as propriedades físicas do material de origem determinam se ele é adequado para a utilização pretendida. Assim, as especificações para entulho são menos exigentes do que as especificações para subcamadas das calçadas, que por sua vez são menos exigentes dos que as especificações para superfícies de uso intensivo como as camadas de desgaste das calçadas ou os balastros das vias férreas. Uma maior variedade de materiais pode ser utilizada como granulados para finalidades em que as exigências são mínimas, enquanto os materiais sujeitos a maiores exigências são menos numerosos.

Finance Act 2001

3      As sections 16 a 49 da segunda parte do Finance Act 2001 (Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2001, a seguir ‘lei’) e os seus anexos 4 a 10 criam um Aggregates Levy (imposto sobre os granulados, a seguir ‘AGL’ ou ‘imposto’) no Reino Unido.

4      As disposições que preveem a aplicação do AGL entraram em vigor em 1 de abril de 2002, nos termos do regulamento de execução da lei.

5      A lei foi alterada pelas sections 129 a 133 e pelo anexo 38 do Finance Act 2002 (Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2002). As disposições assim alteradas preveem isenções para os resíduos (spoils) resultantes da extração de certos minerais, designadamente, a ardósia, o xisto, o ball clay e o caulino. Por outro lado, concedem um período transitório para a aplicação do imposto na Irlanda do Norte.

6      O AGL é aplicado à razão de 1,60 libras esterlinas (GBP) por tonelada de granulados objeto de uma exploração comercial [section 16(4) da lei].

7      A section 16(2) da lei, na versão alterada, dispõe que o AGL é devido quando granulados sujeitos ao imposto sejam objeto de uma exploração comercial no Reino Unido a partir da data de entrada em vigor da lei. Assim, a lei tanto é aplicável aos granulados importados como aos extraídos no Reino Unido.

8      A section 13(2)(a) do regulamento de execução concede ao explorador um desagravamento fiscal quando os granulados sujeitos a impostos forem exportados ou transportados para fora do Reino Unido sem receberem qualquer outro tratamento.

9      A section 17(1) da lei, na versão alterada, dispõe:

‘Para efeitos da presente secção, 'granulados' designa (sem prejuízo do disposto na section 18 infra) a rocha, a gravilha ou a areia, bem como todos os materiais provisoriamente nelas incorporados ou com elas naturalmente misturados.’

10      A section 17(2) da lei dispõe que um granulado não é objeto de tributação em quatro casos: se estiver expressamente isento; se tiver sido previamente utilizado para finalidades de construção; se já tiver sido sujeito a um imposto sobre os granulados ou se, à data da entrada em vigor da lei, não se encontrar no seu local de origem.

11      A section 17(3) e (4) da lei, na versão alterada, prevê determinados casos de isenção do imposto.

12      Por outro lado, a section 18(1) (2) e (3) da lei, na versão alterada, designa os processos isentos de imposto e os materiais abrangidos por essa isenção.

Processo administrativo e contencioso no tribunal nacional

13      Por carta de 24 de setembro de 2001, foi apresentada uma [primeira] denúncia na Comissão […] por duas empresas sem nenhuma ligação com a recorrente, que solicitaram que a sua identidade não fosse revelada ao Estado‑Membro em causa, nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.° CE] (JO L 83, p. 1). As denunciantes consideravam, no essencial, que a exclusão de certos materiais do âmbito de aplicação do AGL, a isenção das exportações e as derrogações relativas à Irlanda do Norte constituíam auxílios de Estado.

14      Por ofício de 20 de dezembro de 2001, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte notificou a Comissão do regime de auxílio de Estado intitulado ‘Introdução faseada do imposto sobre os granulados na Irlanda do Norte’.

15      Por ofício de 6 de fevereiro de 2002, a Comissão comunicou um resumo da primeira denúncia a esse Estado‑Membro e convidou‑o, por um lado, a apresentar as suas observações sobre essa denúncia e, por outro, a prestar informações complementares sobre o AGL, o que esse Estado‑Membro fez por ofício de 19 de fevereiro de 2002.

16      Em 11 de fevereiro de 2002, a recorrente interpôs recurso contra o AGL na High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Reino Unido). Invocava, nomeadamente, a violação das normas comunitárias em matéria de auxílios de Estado. Por decisão de 19 de abril de 2002, a High Court of Justice negou provimento ao recurso, tendo autorizado a recorrente a interpor recurso para a Court of Appeal (England & Wales) (Reino Unido). Uma vez que a recorrente interpôs efetivamente recurso, a Court of Appeal ordenou a suspensão da instância, tendo em conta a interposição do presente recurso no Tribunal Geral.

17      Entretanto, por carta de 15 de abril de 2002, a recorrente tinha apresentado uma denúncia contra o AGL na Comissão […]. Alegava, no essencial, que a exclusão de certos materiais do âmbito de aplicação do AGL e a isenção das exportações constituíam auxílios de Estado. Quanto às derrogações relativas à Irlanda do Norte, notificadas pelas autoridades do Reino Unido, seriam incompatíveis com o mercado comum.

Decisão impugnada

18      Em 24 de abril de 2002, a Comissão adotou a decisão de não levantar objeções ao AGL [decisão impugnada].

19      Em 2 de maio de 2002, a decisão impugnada foi comunicada à recorrente pelas autoridades do Reino Unido. Foi‑lhe formalmente notificada pela Comissão por ofício de 27 de junho de 2002.

20      Na sua decisão ([n.°] 43), a Comissão refere que o imposto não contém elementos de auxílio de Estado, na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que o seu âmbito de aplicação se justifica pela lógica e pela natureza do regime fiscal. Por outro lado, considera que a isenção concedida à Irlanda do Norte, que lhe foi notificada, é compatível com o mercado comum.

21      Na descrição do âmbito de aplicação do AGL, a Comissão salienta, no essencial, que esse imposto será cobrado sobre os granulados virgens, ‘definidos como granulados produzidos à base de resíduos naturais de minerais que foram objeto de uma primeira extração’, e compostos ‘de fragmentos de rochas, de areias e de gravilhas que podem ser utilizados em estado bruto ou após tratamento mecânico como a trituração, a lavagem e a calibragem’ ([n.os] 8 e 9). Quanto aos materiais excluídos e aos objetivos prosseguidos, refere nos ([n.os] 11 a 13 da decisão impugnada:

‘O AGL não será cobrado sobre materiais que sejam subprodutos ou resíduos de outros processos. Segundo as autoridades [do Reino Unido], entre esses materiais encontram‑se os resíduos de xisto e de caulino, os estéreis, as cinzas, a escória retirada dos altos‑fornos e os resíduos de vidro e de borracha. Do mesmo modo, o imposto também não será cobrado sobre os granulados reciclados, categoria em que se incluem as rochas, areias e gravilhas que tenham sido objeto de pelo menos uma primeira utilização (geralmente no setor da construção civil e das obras públicas).

Segundo as autoridades [do Reino Unido], a exclusão desses materiais do âmbito de aplicação do AGL destina‑se a incentivar a sua utilização como materiais de construção e a reduzir a extração excessiva de granulados virgens, incentivando assim uma gestão racional dos recursos.

As projeções iniciais das autoridades [do Reino Unido] contam com a possibilidade de o AGL permitir reduzir o volume da procura de granulados virgens em 20 milhões de toneladas por ano em média, sendo a procura anual no Reino Unido da ordem dos 230 a 250 milhões de toneladas.’

22      No que diz respeito à apreciação relativa ao âmbito de aplicação do AGL, a decisão impugnada enuncia nos ([n.os] 29 e 31:

‘A Comissão observa que o AGL só incidirá sobre a exploração comercial de rochas, areias e gravilhas utilizadas como granulados. Não incidirá sobre esses materiais se forem utilizados para outros fins. O AGL só será cobrado sobre os granulados virgens. Não será cobrado sobre granulados extraídos como subprodutos ou resíduos de outros processos (granulados secundários), nem sobre os granulados reciclados. Consequentemente, a Comissão considera que o AGL só diz respeito a determinados setores de atividade e a determinadas empresas. Por conseguinte, observa que há que apreciar se o âmbito de aplicação do AGL se justifica pela lógica e pela estrutura do sistema fiscal.

[N]o âmbito do exercício da liberdade de determinar o seu regime fiscal nacional, o Reino Unido concebeu o AGL de modo a maximizar o recurso a granulados reciclados ou a outros produtos de substituição relativamente aos granulados virgens e a promover uma utilização racional dos granulados virgens, recurso natural não renovável. As agressões ambientais representadas pela extração de granulados que o Reino Unido pretende limitar através do AGL incluem a poluição sonora, as poeiras, as agressões à biodiversidade e as degradações paisagísticas.’

23      A Comissão conclui daí, no [n.°] 32, que ‘o AGL é um imposto específico, cujo âmbito de aplicação é muito restrito, definido pelo Estado‑Membro em função das características próprias do setor de atividade em causa’ e que ‘[a] estrutura e o alcance do imposto refletem a nítida distinção entre a extração de granulados virgens, que tem consequências indesejáveis para o ambiente, e a produção de granulados secundários ou reciclados, que representa uma contribuição importante para o tratamento das rochas, gravilhas e areias resultantes de escavações, de outros trabalhos ou de tratamentos efetuados legalmente com objetivos diversos’.

24      Relativamente à isenção dos granulados exportados sem terem sofrido qualquer transformação no território do Reino Unido, a decisão impugnada enuncia, no [n.°] 33:

‘[…] essa solução justifica‑se pelo facto de os granulados poderem ser isentos no Reino Unido se forem utilizados em processos de fabrico isentos (por exemplo, o fabrico do vidro, de plásticos, de papel, de fertilizantes e de pesticidas). Uma vez que as autoridades [do Reino Unido] não podem fiscalizar a utilização dos granulados fora do seu território, a isenção das exportações impõe‑se para efeitos de segurança jurídica dos exportadores de granulados e para evitar um tratamento iníquo das exportações de granulados que de outro modo poderiam beneficiar de uma isenção no interior do Reino Unido.’

25      A Comissão conclui, no [n.°] 34:

‘[F]az parte da natureza e da estrutura geral desse imposto que o mesmo não seja aplicável aos granulados secundários nem aos granulados reciclados. A aplicação de um imposto sobre a extração de granulados virgens contribuirá para a diminuição da extração de granulados primários, da utilização de recursos não renováveis e das consequências danosas para o ambiente. A Comissão é, por conseguinte, de opinião que as vantagens que podem resultar para certas empresas da definição do âmbito de aplicação do AGL se justificam pela natureza e pela estrutura geral do sistema fiscal.’»

 Tramitações processuais controvertidas e pedidos das partes

2        Por requerimento entregue na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de julho de 2002, a recorrente, British Aggregates Association, interpôs recurso de anulação parcial da decisão da Comissão C (2002) 1478 final, de 24 de abril de 2002, relativa ao processo de auxílio de Estado N 863/01 ­― Reino Unido /Imposto sobre os granulados (a seguir «decisão impugnada»).

3        Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral de 28 de novembro de 2002, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte foi admitido a intervir em apoio dos pedidos da Comissão das Comunidades Europeias.

4        Como fundamento do seu recurso, a recorrente invoca, em primeiro lugar, a violação do artigo 87.°, n.° 1, CE, em segundo lugar, a falta de fundamentação na aceção do artigo 253.° CE, em terceiro lugar, a violação pela Comissão da sua obrigação de dar início ao procedimento formal de investigação na aceção do artigo 88.°, n.° 2, CE e, em quarto lugar, a inobservância por essa instituição das suas obrigações ao longo da investigação preliminar na aceção do artigo 88.°, n.° 3, CE.

5        A Comissão contestou a admissibilidade do recurso, sustentando que a decisão impugnada não dizia individualmente respeito à recorrente, na aceção do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE.

6        Através do acórdão anulado, acima referido no n.° 1, o Tribunal declarou o recurso admissível, pelos motivos que figuram nos seus n.os 45 a 68. Por outro lado, julgou improcedentes o primeiro e segundo fundamentos, examinados conjuntamente, e em seguida o terceiro e quarto fundamentos, pelos motivos enunciados, respetivamente, nos n.os 104 a 156, 163 a 173 e 177 a 180 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1. O Tribunal Geral negou, portanto, provimento ao recurso na íntegra.

7        Por requerimento apresentado em 27 de novembro de 2006, a recorrente interpôs para o Tribunal de Justiça um recurso de anulação do acórdão do Tribunal Geral, acima referido no n.° 1, e da decisão impugnada, salvo no que respeita à isenção da Irlanda do Norte. A Comissão interpôs recurso subordinado pedindo ao Tribunal de Justiça que anulasse o referido acórdão e declarasse o recurso em primeira instância inadmissível. O Reino Unido concluiu pela negação de provimento ao recurso para o Tribunal de Justiça.

8        Por acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão (C‑487/06 P, Colet., p. I‑10505, a seguir «acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça»), o Tribunal de Justiça anulou o acórdão do Tribunal Geral, acima referido no n.° 1, e remeteu o processo a este último.

9        O Tribunal de Justiça confirmou na íntegra a apreciação do Tribunal Geral quanto à admissibilidade do recurso (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 24 a 58).

10      Quanto ao mérito, o Tribunal de Justiça declarou a existência de dois erros de direito por parte do Tribunal Geral.

11      Segundo o Tribunal de Justiça, por um lado, nos n.os 115, 117, 120, 121, e 128 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1, o Tribunal Geral ignorou o conceito de auxílio, em especial o critério da seletividade da vantagem, que não distingue consoante as causas ou os objetivos das intervenções estatais, mas define‑as em função dos seus efeitos. Por conseguinte, o Tribunal Geral não podia ter tido em conta o objetivo ambiental prosseguido para justificar a exclusão do âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE de medidas que continham uma vantagem seletiva (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 82 a 92).

12      Por outro lado, o Tribunal de Justiça considerou que, em especial nos n.os 118, 134, 139, 154 e 171 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1, ao declarar que a Comissão gozava de poder de apreciação na aplicação do artigo 88.°, n.° 3, CE, o Tribunal Geral errou quanto ao grau de fiscalização jurisdicional a exercer relativamente ao conceito de auxílio, o qual apresentava um caráter jurídico e devia ser interpretado com base em elementos objetivos. Por esta razão, segundo o Tribunal de Justiça, o juiz da União Europeia deve, em princípio, exercer uma total fiscalização no que respeita à questão de saber se uma medida está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. Este princípio aplica‑se igualmente às decisões adotadas pela Comissão no termo do procedimento preliminar de exame na aceção do artigo 88.°, n.° 3, CE, uma vez que a Comissão está obrigada, sem dispor de margem de apreciação, a dar início ao procedimento formal de investigação a título do n.° 2 deste artigo sempre que o exame preliminar não lhe permita ultrapassar todas as dificuldades de apreciação. Segundo o Tribunal de Justiça, este erro de direito enferma toda a análise de mérito da decisão impugnada, efetuada pelo Tribunal Geral (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 109 a 115).

13      O Tribunal de Justiça acolheu igualmente uma alegação que visa o n.° 112 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1. No referido n.° 112, o Tribunal Geral entendeu, no essencial, que a Comissão havia considerado em toda a decisão impugnada, especialmente no ponto 29 da respetiva fundamentação, que os termos «granulados primários» designavam essencialmente os granulados «sujeitos aos AGL», quando os termos «granulados secundários» se referiam essencialmente aos granulados «isentos» enumerados na lei. Daí o Tribunal Geral deduziu, nomeadamente, que a Comissão se tinha limitado a afirmar, no referido ponto, que o «AGL não será aplicável aos produtos derivados ou aos resíduos da primeira extração quando estão isentos pela […] lei». Segundo o Tribunal de Justiça, ao fazê‑lo, o Tribunal Geral cometeu um erro de interpretação e substituiu pela sua própria interpretação a que decorre diretamente da decisão impugnada, apesar de nenhum elemento material o justificar (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 140 a 145, em especial n.° 144, e n.° 151).

14      Além disso, o Tribunal de Justiça acolheu uma alegação que visava o n.° 150 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1, relativa ao respeito do dever de fundamentação a título do artigo 253.° CE. Segundo o Tribunal de Justiça, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou nesse número, não se pode considerar que a fundamentação baseada no artigo 91.° CE tem a ver com os fundamentos expostos na decisão impugnada, relativos à falta de fundamentação das autoridades do Reino Unido acerca da utilização de materiais enquanto granulados fora do território desse Estado‑Membro, mas representa, na realidade, uma fundamentação diferente, aduzida após a adoção dessa decisão. Por conseguinte, segundo o Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral violou o artigo 253.° CE ao ter em consideração essa fundamentação a título dos fundamentos enunciados na decisão impugnada (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 172 a 179, em especial n.° 178).

15      Por último, o Tribunal de Justiça rejeitou os fundamentos do recurso que lhe foi submetido relativos a erros de direito respeitantes, por um lado, ao conceito de início do procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 185 a 189) e, por outro, a insuficiência de fundamentação da decisão impugnada (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 192 a 194).

16      O Tribunal de Justiça acabou por decidir anular o acórdão do Tribunal Geral, acima referido no n.° 1, remeter a este último o processo em razão dos erros de direito mencionados nos n.os 11 e 12 supra e reservar para final a decisão sobre as despesas (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 195, 197 e 198).

17      Na sequência da remessa do presente processo, as partes foram convidadas a apresentar as suas observações sobre as consequências a retirar do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, para efeitos da decisão do litígio. Nos termos do artigo 119.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a recorrente, a Comissão e o Reino Unido apresentaram as suas observações.

18      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        anular a decisão impugnada, salvo na parte em que respeita à isenção da Irlanda do Norte;

¾        condenar a Comissão nas despesas, incluindo as despesas efetuadas no quadro do recurso para o Tribunal de Justiça.

19      A Comissão, apoiada pelo Reino Unido, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas.

20      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção alargada) decidiu dar início à fase oral do processo.

21      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal, na audiência de 16 de maio de 2011.

22      Na audiência, o Tribunal convidou a Comissão e o Reino Unido, no quadro de uma medida de organização do processo tomada ao abrigo do artigo 64.° do Regulamento de Processo, a submeterem‑lhe no prazo de três semanas todos os documentos ou referências aos documentos já constantes do dossier administrativo, respeitantes a certos elementos factuais do procedimento administrativo aberto na sequência da notificação da Aggregates Levy (imposto sobre os granulados, a seguir «AGL» ou «imposto») relativamente à extração de granulados «virgens» destinados à exploração comercial. Desta forma, o Tribunal deixou a fase oral aberta, facto que registou na ata da audiência.

23      Por requerimento separado entrado na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de maio de 2011, a recorrente pediu ao Tribunal para ordenar à Comissão e ao Reino Unido, no quadro de medidas de organização do processo tomadas ao abrigo do artigo 64.° do Regulamento de Processo, que apresentassem informações adicionais, respeitantes a certos factos contestados na audiência. A Comissão e o Reino Unido submeteram as suas observações sobre este pedido em 13 e 14 de julho de 2011.

24      Por requerimentos separados entrados na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de junho de 2011, a Comissão e o Reino Unido satisfizeram, respetivamente, o pedido de apresentação de documentos do Tribunal. A recorrente apresentou as suas observações acerca desses documentos em 18 de julho de 2011 e a fase oral do processo foi encerrada.

 Questão de direito

1.     Observações preliminares

25      Uma vez que o Tribunal de Justiça confirmou definitivamente a apreciação do Tribunal Geral no acórdão anulado, acima referido no n.° 1, quanto à admissibilidade do recurso (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 24 a 58), o que as partes reconheceram, cabe declarar o presente recurso admissível e limitar a apreciação do Tribunal à legalidade da decisão impugnada.

26      Para este efeito, na sequência da remessa do presente processo em razão dos erros de direito constatados nos n.os 82 a 92 e 109 a 115 do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, respeitantes à inobservância, pelo Tribunal Geral, do conceito de auxílio e do grau de fiscalização jurisdicional da decisão impugnada (v. n.os 10 a 12 e 16 supra), o Tribunal é obrigado a reexaminar todos os factos pertinentes objeto do presente litígio e a qualificá‑los novamente à luz da proibição prevista no artigo 87.°, n.° 1, CE.

27      Por conseguinte, o Tribunal Geral considera necessário examinar o primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 87.°, n.° 1, CE.

2.     Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 87.°, n.° 1, CE

 Resumo das observações das partes após a remessa

28      A recorrente sustenta, no essencial, que a decisão impugnada ignora o conceito de auxílio, em especial o caráter seletivo das vantagens decorrentes do AGL. Nem a Comissão nem o Reino Unido tinham demonstrado que, à luz do objetivo ambiental prosseguido pelo AGL, o tratamento diferenciado de certos granulados e/ou materiais era suscetível de ser justificado pela natureza, pela economia geral ou pela lógica ambiental da lei. A incoerência do âmbito de aplicação do AGL dava assim lugar a vantagens seletivas proibidas pelo artigo 87.°, n.° 1, CE. Segundo a recorrente, esta incoerência é corroborada, nomeadamente, pela isenção do imposto de certos materiais, como a ardósia, a argila e o xisto, quando os mesmos constituem «granulados» na aceção da lei e os granulados de materiais substituíveis são sujeitos ao imposto. Todavia, na inexistência de uma definição clara do conceito de «granulados», essa isenção não pode ser justificada pelo argumento de que o AGL visa encorajar um direcionamento da procura de granulados «virgens» para materiais mais respeitadores do ambiente, em especial promover a utilização de granulados recicláveis e de outros produtos de substituição assim como a utilização eficaz dos referidos granulados virgens, recurso não renovável (n.° 31 da decisão impugnada).

29      Quanto à isenção das exportações, a recorrente convida o Tribunal a criticar o raciocínio que figura no n.° 33 da decisão impugnada, segundo o qual as autoridades do Reino Unido não estão em condições de controlar as exportações de granulados, o que comporta um risco de desigualdade de tratamento dos granulados exportados. Com efeito, 90% dos granulados exportados e isentos provêm de uma única carreira de granito, situada em Glensanda, na Escócia, da qual nenhum produto pode ser utilizado em processos isentos no Reino Unido. Assim, a verdadeira justificação para esta isenção, alheia à natureza e à economia geral de um imposto ambiental, é preservar a competitividade. A isenção das exportações confere, portanto, uma vantagem seletiva na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

30      A Comissão contrapõe que, para efeitos do artigo 87.°, n.° 1, CE, o Tribunal «deve começar por apreciar a existência de uma medida (ou de um ‘sistema’) que não comporte elementos de auxílio de Estado nem tenha em conta o objetivo ambiental ou a natureza ou a economia geral do sistema».

31      Com efeito, segundo a Comissão, numa primeira fase, importa referir que um encargo fiscal excecional que onera um setor limitado não constitui um auxílio de Estado, sem que seja necessário apreciar os objetivos do imposto ou a natureza e a economia geral do sistema. No caso vertente, os granulados estão sujeitos ao imposto, ao passo que outros materiais diferentes dos granulados ou que não são utilizados como tais não estão. Numa segundo fase, importa referir que o sistema prevê exceções para os produtos reciclados e para os substitutos dos granulados virgens, nomeadamente os entulhos, mesmo utilizados como granulados, e que estas derrogações têm a ver com a natureza ou a economia geral do sistema e contribuem efetivamente para reduzir mais a extração dos granulados virgens. Todavia, a recorrente persiste no seu erro inicial de passar o objetivo ambiental, respeitante à natureza ou à economia geral do sistema, da segunda para a primeira fase deste raciocínio. Contrariamente ao que o Tribunal declarou no acórdão anulado, acima referido no n.° 1, esse raciocínio vale para qualquer imposto que constitua um encargo fiscal excecional aplicado a um setor limitado, quaisquer que sejam os seus objetivos. O acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, detetou corretamente este erro, confirmando assim a decisão impugnada e a posição da Comissão.

32      A Comissão contesta o argumento segundo o qual o AGL não segue uma lógica coerente uma vez que outros setores com uma incidência comparável no ambiente não estão sujeitos ao imposto (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 82, 86 e 87). Um encargo fiscal excecional aplicado a um setor limitado ― a saber, os granulados ― não comporta elementos de auxílio de Estado a favor de todos os restantes setores não tributados. Estes outros setores não foram sujeitos ao imposto porque ou não eram granulados (carvão, lenhite, argila, caulino, ball clay, ardósia e xisto; acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.° 129) ou não eram utilizados como granulados (calcário destinado à produção de cimento e de areia para fabrico de vidro) (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 90 a 92 e 128, primeiro período). No acórdão anulado, acima referido no n.° 1, o Tribunal Geral rejeitou corretamente este argumento da recorrente e entendeu que cabia, em princípio, ao Estado‑Membro determinar os bens e os serviços que decide tributar, sem que daí resulte um auxílio de Estado a favor de outros setores com uma incidência comparável no ambiente (n.os 114 a 116, 128 e 129 do acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra).

33      Contudo, o Tribunal acrescentou um aspeto não decorrente da fundamentação da decisão impugnada e não invocado pela Comissão no decurso da instância por ser incompatível com a jurisprudência assente (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 84, 85 e 87), a saber, o objetivo ambiental (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 115 e 128). Com efeito, o Tribunal interpretou erradamente a fundamentação da decisão impugnada no sentido de que se limitava aos impostos ambientais, quando essa fundamentação se aplica a qualquer imposto independentemente do seu objetivo. O Tribunal de Justiça detetou acertadamente este erro (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 86 e 87). A fim de corrigi‑lo, devia eliminar desta parte do seu raciocínio o objetivo ambiental, para chegar à conclusão de que um encargo fiscal excecional aplicado a um setor limitado não comporta elementos de auxílio de Estado a favor de outros setores não tributados e que não existe auxílio de Estado a favor dos materiais diferentes dos granulados e dos granulados destinados a utilizações excluídas do âmbito de aplicação do AGL. A este respeito, a Comissão precisa que o acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, rejeita expressamente as diferentes alegações da recorrente quanto ao facto de que certos granulados são sujeitos ao imposto ao passo que certos materiais diferentes dos granulados ou não utilizados como tais não o são.

34      A Comissão sustenta que o n.° 88 do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, confirma esta apreciação ao salientar que a inclusão no acórdão anulado, acima referido no n.° 1, do objetivo ambiental é manifestamente contrária à exclusão de outros setores prejudiciais para o ambiente, como o do carvão, e à invocação de outros objetivos para justificar a não sujeição ao imposto destes outros setores, como a vontade de preservar a competitividade internacional. A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou acertadamente que esta contradição não pode ser eliminada invocando fundamentos baseados na natureza ou na economia geral do sistema, porquanto «não é o objetivo que conta, mas os efeitos» (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 84, 85 e 87).

35      Quanto à distinção efetuada pelo Tribunal Geral, nos n.os 120 e 121 do acórdão anulado, acima referido no n.° 1, entre o caso vertente e aquele que esteve na origem do acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de novembro de 2001, Adria‑Wien Pipeline e Wietersdorfer & Peggauer Zementwerke (C‑143/99, Colet., p. I‑8365, a seguir «acórdão Adria‑Wien Pipeline»), a Comissão recorda que o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 87.°, n.° 1, CE define as intervenções estatais em função dos seus efeitos, e portanto independentemente das técnicas utilizadas (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 89). No que respeita aos efeitos, a Comissão recorda que o AGL é um imposto específico que incide num setor limitado, a saber, os granulados (n.° 32 da decisão impugnada). Esta característica de encargo fiscal excecional que incide num setor limitado justifica que se conclua que este imposto não é, em si mesmo ― e independentemente do seu objetivo ―, um auxílio de Estado a favor dos materiais diferentes dos granulados ou dos granulados que não são utilizados enquanto tais (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 90 a 92). Segundo a Comissão, esta característica constitui, além disso, o «ponto de referência neutro», ou o «sistema», ou a «normalidade» ― que «não contém, em sim mesmo, elementos de auxílio de Estado nem é aplicado tendo em conta o objetivo do imposto ou baseando‑se nele ou […] a natureza ou a economia geral do sistema» ―, que permite determinar se outras isenções do imposto têm ou a não a ver com a natureza ou a economia geral do sistema. Ora, na situação que deu origem ao acórdão Adria‑Wien Pipeline, já referido, faltava um setor limitado desses como «ponto de referência», tendo a medida em causa produzido efeitos numa grande parte da economia geral, o que justificou uma abordagem diferente.

36      A Comissão convida, assim, o Tribunal Geral a reexaminar, no respeito do padrão exigido pela fiscalização jurisdicional, primeiro, a identificação do setor dos granulados (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 75, 90, 91, 110, 138 e 139, e acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 96 a 101). No caso vertente, a Comissão baseou a sua análise no âmbito de aplicação do imposto tal como determinado pelo Reino Unido. Os materiais diferentes dos granulados, como o carvão, a lenhite, a argila, o caulino, o ball clay, a ardósia e o xisto, e os granulados que não são utilizados enquanto tais, nomeadamente o calcário destinado à produção de cimento e de areia para fabrico de vidro, não podem ser sujeitos ao imposto porque não fazem parte do setor os granulados. Por conseguinte, não é exato sustentar, como faz a recorrente, que os materiais em causa são todos granulados. O acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8 (n.° 130), confirma igualmente que certos materiais não estão sujeitos ao imposto por não serem granulados. Segundo, este reexame deve debruçar‑se sobre a sujeição dos granulados a elevadas especificações técnicas, como os cascalhos vermelhos para as ciclovias, o revestimento o revestimento das estradas e o balastro para vias férreas, com o fundamento de que são granulados, independentemente do facto de existirem ou não substitutos destes materiais (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 85, 90 a 92, 135 e 136, e acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 125, 126, 130 e 131). Terceiro, o Tribunal deve reexaminar a sujeição do calcário e da areia «secundários» com o fundamento de serem utilizados como granulados, independentemente da sua qualificação ou não como produtos «secundários» de certas carreiras (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 86, 90 a 92 e 137, e acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 146 a 151). Quarto, esse reexame deve debruçar‑se sobre a não tributação de produtos diferentes dos granulados e dos entulhos, como a ardósia, o xisto, a argila, o caulino, o ball clay, o carvão e a lenhite, mesmo quando são utilizados como granulados, com o fundamento de que o incentivo ao emprego de substitutos dos granulados virgens faz parte da natureza e da economia geral do sistema (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 83, 94 a 98 e 130 a 132, e acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 152 a 154 e 160 a 162). Por último, relativamente à isenção das exportações, a Comissão convida o Tribunal Geral a reexaminar se esta isenção se justifica pelos motivos expostos nos n.os 22 e 33 da decisão impugnada.

37      O Reino Unido contesta em especial o argumento da recorrente segundo o qual os conceitos essenciais do AGL nunca foram claramente definidos e segundo o qual lhes tem sido atribuído um conteúdo diferente consoante as circunstâncias.

38      Assim, a expressão «granulado primário» é a mais frequentemente utilizada pelos exploradores de carreiras para designar o granulado primário ou principal aí produzido. Esses exploradores produzem muitas vezes uma gama de granulados diferentes, que variam segundo a sua propriedade física, a sua especificação técnica e a sua adequação a certas aplicações. Assim, os granulados de especificação elevada podem ser utilizados para a realização de alcatrão ou de betão, ao passo que os granulados de especificação mais reduzida podem convir para serem utilizados em entulho ou em balastro. Geralmente, considera‑se que os granulados primários têm o valor mais elevado, por serem objeto de uma procura importante e terem um teor suficientemente forte que os torna apropriados numa grande gama de aplicações. A viabilidade económica da extração depende significativamente da geologia do local e, em certa medida, da facilidade com que é possível encaminhar até ao local o material necessário para refinar a matéria‑prima e maximizar as suas qualidades desejadas.

39      Em contrapartida, a expressão «granulado secundário» é mais frequentemente utilizada pelos exploradores de carreira para designar os granulados que constituem produtos derivados da produção de granulados primários, que implica frequentemente um tratamento físico, como a trituração, a peneiração, a moagem e o esmagamento. Em cada fase deste tratamento, os granulados derivados criados não têm um teor tão forte como o dos granulados primários e distinguem‑se, portanto, destes últimos. Os granulados secundários podem ser objeto de um tratamento suplementar em várias fases a fim de alcançarem o seu potencial máximo como granulados. Assim, é produzida uma gama de produtos de teor diverso e de qualidade ou de valor cada vez mais limitados, até que reste apenas um material granular muito fino, a saber, as «partículas finas», cuja utilização é limitada e para os quais a procura é reduzida. Por conseguinte, não se trata necessariamente de produtos derivados ou de resíduos. Pelo contrário, a maioria dos granulados secundários tem um valor e uma qualidade particularmente elevados e são procurados, pelo que, na maior parte dos casos, apenas as «partículas finas» podem ser qualificadas de resíduos. Por conseguinte, o teor do granulado secundário, mais reduzido que o do granulado primário, constitui o aspeto essencial que permite distinguir estes dois tipos de granulados. A expressão «granulado secundário» é também por vezes usada para designar os produtos derivados de um certo número de processos de extração e de fabrico cujo objetivo não é produzir granulados, mas que conduzem inevitavelmente à produção desses materiais, como os resíduos da extração mineira, a extração de caulino, a produção de ardósia, as cinzas de centrais elétricas e as escórias de altos‑fornos. Estes processos devem, assim, ser distinguidos da exploração de granulados.

40      O Reino Unido sublinha que deseja reduzir a eliminação desses produtos derivados enquanto resíduos e procura, portanto, encorajar a sua utilização como solução de substituição viável à exploração de granulados enquanto tais. Embora o AGL não defina esses materiais como «granulados secundários», esta designação é correntemente usada nos setores em causa. A terminologia empregue no setor da exploração das carreiras é, porém, suscetível de induzir em erro na medida em que os materiais tributados e isentos são frequentemente designados, de forma errada, respetivamente, como granulados primários e secundários, quando a categoria dos granulados tributados compreende granulados quer primários quer secundários. Além disso, os termos «granulados virgens» referem‑se aos granulados primários e secundários que não foram utilizados anteriormente por terem sido objeto de extração recente. Os granulados reciclados não são, portanto, granulados virgens.

41      O Reino Unido contesta o argumento da recorrente segundo o qual a Comissão e o Reino Unido não demonstraram uma lógica ambiental coerente do AGL ou não demonstraram que a sua natureza e a sua economia geral são suscetíveis de justificar o seu âmbito de aplicação. É dado assente que a extração de granulados produz numerosos impactos ambientais negativos, incluindo perturbações sonoras, poeiras, mal‑estar visual, danos causados à biodiversidade e prejuízos para a qualidade de vida. O AGL visa integrar esses custos ambientais no preço dos granulados para assim reduzir a exploração de granulados virgens, encorajar a sua utilização eficaz, a utilização de outros materiais reciclados, bem como a de materiais que, de outro modo, são eliminados como resíduos. Embora o AGL seja diretamente cobrado junto dos produtores de granulados, o encargo do imposto é suportado, em definitivo, pelos utilizadores finais de granulados, repercutindo os produtores o custo do imposto nos seus clientes através da fixação dos seus preços. Neste sentido, o AGL é um imposto direto que incide nos consumidores finais de granulados virgens.

42      O Reino Unido contesta a existência de incoerências na economia geral do AGL que estão na origem de vantagens seletivas a favor de certos setores ou produtos isentos. O Tribunal não deve reexaminar, detalhadamente, os argumentos da recorrente quanto à natureza, à lógica e ao âmbito de aplicação do AGL, uma vez que o Tribunal de Justiça os rejeitou em grande parte à luz das apreciações factuais soberanas do Tribunal Geral (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 94 a 101). Além disso, a natureza e a lógica do AGL, bem como os princípios ambientais que o justificam, são simples, coerentes e refletidos. Assim, a não sujeição de certos materiais, como o caulino, o ball clay, a ardósia e outros resíduos minerais e industriais, decorre da natureza e da estrutura global do AGL, o que tem como consequência que essa isenção escapa à aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE.

43      Quanto à isenção do imposto relativamente à ardósia, ao xisto e ao caulino, o Reino Unido alega que o processo de fabrico da ardósia e do caulino gera numerosos produtos derivados do granulado. Além disso, certos setores do mercado de granulados utilizaram com êxito esses produtos derivados para substituir outros granulados virgens sujeitos ao AGL. Com efeito, os processos de extração do caulino, da ardósia, do carvão e de outros materiais não têm por finalidade a produção de granulados, mas conduzem inevitavelmente à produção de materiais próprios a essa utilização. Embora tais processos de extração gerem, em certa medida, resíduos e sejam nocivos para o ambiente, não existe um meio mais eficaz de produzir materiais como a ardósia e o caulino. À luz do objetivo do AGL de proteção do ambiente, há que privilegiar, tanto quanto possível, a utilização dos produtos derivados desses processos enquanto granulados em vez da utilização de outros granulados virgens, em especial quando a única alternativa é eliminar esses produtos derivados como resíduos. Com efeito, atualmente, um volume importante de materiais derivados desses processos é vendido como granulados não sujeitos ao AGL, quando antes da criação do imposto a maioria dos referidos materiais teria sido depositada em aterros. Quanto à isenção de materiais destinados a outras utilizações apenas como granulados, como a areia silicosa para o fabrico de vidro, ela é aplicável quando duas condições principais estão cumulativamente preenchidas, a saber, por um lado, o facto de não existir nenhum material de substituição viável e, por outro, o facto de o material não ser utilizado como granulado.

44      Segundo o Reino Unido, no essencial, os argumentos da recorrente quanto à conformidade ou não do AGL com o princípio do poluidor‑pagador, ao impacto da extração de diversos materiais no ambiente, à definição pela Comissão do «setor dos granulados» e à alegada verdadeira lógica subjacente às isenções de certos materiais, a saber, a preservação da competitividade internacional, foram rejeitados pelo Tribunal de Justiça (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 99 a 101, 128 a 132, 149, 150, 161 e 162) e devem ser afastados. Em qualquer dos casos, esses argumentos são manifestamente errados atendendo à natureza e à lógica do AGL tal como acima expostas (acórdão do Tribunal, referido no n.° 1 supra, n.os 129, 133, 134, 138 e 153). Além disso, a recorrente confunde os termos «granulados primários», «granulados secundários» e «granulados virgens» e atribui‑lhes um significado não sustentado por uma definição jurídica prevista pela lei.

 Quanto às condições de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE

 Quanto aos critérios que regulam o caráter seletivo da vantagem

45      Com o seu primeiro fundamento, a recorrente critica a Comissão, no essencial, de ter ignorado o conceito de auxílio, em especial os critérios da vantagem e do seu caráter seletivo, na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, e de ter cometido erros na aplicação deste conceito.

46      Quanto ao critério de vantagem, foi reconhecido por jurisprudência assente que o conceito de auxílio é mais geral que o de subvenção, pois abrange não apenas prestações positivas, como as próprias subvenções, mas também as intervenções de Estado que, de diversas formas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, pelo que, não sendo subvenções na aceção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 8 de maio de 2003, Itália e SIM 2 Multimedia/Comissão, C‑328/99 e C‑399/00, Colet., p. I‑4035, n.° 35; de 10 de janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o., C‑222/04, Colet., p. I‑289, n.° 131; e de 15 de junho de 2006, Air Liquide Industries Belgium, C‑393/04 e C‑41/05, Colet., p. I‑5293, n.° 29 e jurisprudência referida). Relativamente ao domínio fiscal, o Tribunal de Justiça precisou que uma medida através da qual as autoridades públicas atribuem a certas empresas isenções fiscais que colocam os beneficiários numa situação financeira mais favorável do que a dos outros contribuintes constitui um auxílio de Estado na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE. Do mesmo modo, uma medida que concede a determinadas empresas uma redução de imposto ou um diferimento do pagamento do imposto normalmente devido pode constituir um auxílio de Estado (v., neste sentido, acórdão Cassa di Risparmio di Firenze e o., já referido, n.° 132).

47      Quanto ao critério de seletividade da vantagem, importa examinar se, no quadro de determinado regime jurídico, uma medida estatal é suscetível de favorecer «certas empresas ou certas produções» na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE relativamente a outras empresas que se encontrem numa situação factual e jurídica comparável à luz do objetivo prosseguido pela medida em causa (acórdão Adria‑Wien Pipeline, referido no n.° 35 supra, n.° 41; v., igualmente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 3 de março de 2005, Heiser, C‑172/03, Colet., p. I‑1627, n.° 40; de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, Colet., p. I‑5479, n.° 119; de 6 de setembro de 2006, Portugal/Comissão, C‑88/03, Colet., p. I‑7115, n.° 54; e de 11 de setembro de 2008, UGT‑Rioja e o., C‑428/06 a C‑434/06, Colet., p. I‑6747, n.° 46).

48      Todavia, não preenche esta condição de seletividade uma medida que, embora constitutiva de uma vantagem para o seu beneficiário, se justifique pela natureza ou pela economia geral do sistema em que se inscreve (v., neste sentido, acórdão Adria‑Wien Pipeline, referido no n.° 35 supra, n.° 42, e Portugal/Comissão, referido no n.° 47 supra, n.° 52). O Tribunal de Justiça precisou que o Estado‑Membro em causa pode demonstrar que tal medida resulta diretamente dos princípios fundadores ou diretores do seu sistema fiscal e que, a esse respeito, se deve fazer uma distinção entre, por um lado, os objetivos de um dado regime fiscal, que lhe são exteriores, e, por outro, os mecanismos inerentes ao próprio sistema fiscal, que são necessários para a realização de tais objetivos (acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 47 supra, n.° 81). Com efeito, as isenções fiscais que resultem de um objetivo alheio ao sistema fiscal no qual se inscrevem não podem eludir as exigências que resultam do artigo 87.°, n.° 1, CE.

49      Por outro lado, a fim de apreciar o caráter seletivo da vantagem concedida pela medida em causa, a determinação do quadro de referência reveste importância acrescida no caso das medidas fiscais, dado que a própria existência de uma vantagem só pode ser demonstrada em relação a uma tributação dita «normal» (v., neste sentido, acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 47 supra, n.° 56, e acórdão do Tribunal Geral de 1 de julho de 2004, Salzgitter/Comissão, T‑308/00, Colet., p. II‑1933, n.° 81). Assim, a qualificação de uma medida fiscal nacional de «seletiva» pressupõe, num primeiro momento, a identificação e o exame prévio do regime fiscal comum ou «normal» aplicável no Estado‑Membro em causa. É em relação a este regime fiscal comum ou «normal» que se deve, num segundo momento, apreciar e estabelecer o eventual caráter seletivo da vantagem concedida pela medida fiscal em causa, na medida em que introduz diferenciações entre operadores económicos que se encontram, à luz do objetivo prosseguido pelo sistema fiscal do Estado‑Membro em causa, numa situação factual e jurídica comparável.

50      Por conseguinte, num primeiro momento, há que identificar os critérios que determinam a tributação «normal» prevista pelo AGL.

 Quanto à tributação «normal» prevista pelo AGL

51      No caso vertente, as partes reconhecem que o quadro de referência, relativamente ao qual a tributação normal e a existência de eventuais vantagens seletivas devem ser determinadas, é constituído pelo AGL enquanto tal, que instaurou um regime fiscal específico aplicável ao setor dos granulados no Reino Unido.

52      Todavia, contrariamente ao que alega a Comissão (v. n.os 31 a 33 supra), mesmo admitindo que possa ser descrito como um «encargo fiscal excecional limitado a um setor económico circunscrito», este regime não escapa por esse simples motivo à proibição prevista no artigo 87.°, n.° 1, CE (v., neste sentido, acórdão Heiser, referido no n.° 47 supra, n.° 42), uma vez que é suscetível de operar, dentro desse mesmo setor, diferenciações que permitem preencher os critérios de vantagem e de seletividade na aceção da jurisprudência acima referida no n.° 47. Além disso, em conformidade com o caráter jurídico do conceito de auxílio, que deve ser interpretado com base em elementos objetivos (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 111), a finalidade de uma medida estatal, tal como, no caso vertente, o objetivo ambiental ou o caráter de imposto ecológico de um regime fiscal específico ou setorial, não basta para fazer escapar esta medida, liminarmente, à qualificação de auxílio de Estado na aceção desta disposição (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 84), devendo a referida medida ser apreciada em função dos seus efeitos e abstraindo das suas causas ou dos seus objetivos (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 85 a 88). Portanto, o conceito de auxílio na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE exige que se examine se um regime fiscal específico ou setorial comporta diferenciações que tenham por efeito favorecer «certas empresas ou certas produções» dentro do setor visado por esse regime, o que pressupõe começar por determinar a tributação «normal» em que assenta (v. n.° 49 supra).

53      Como resulta, nomeadamente, das observações escritas do Reino Unido (v. n.os 37 a 43 supra) e das respostas às partes a questões orais do Tribunal Geral na audiência, o princípio da tributação «normal» em que assenta o AGL é o da exploração comercial, no Reino Unido, de um material tributado enquanto «granulado» [section 16(1) e (2) e section 17(1) do Finance Act 2001 (Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2001, a seguir «lei»)], sem que a lei preveja uma definição precisa do «granulado» ou critérios gerais de tributação que precisem este termo, nomeadamente em função das propriedades psicoquímicas, da composição, da dimensão ou do valor comercial dos materiais em causa.

54      A este respeito, importa observar que as designações de granulados «virgens», «primários» ou «secundários», reiteradamente utilizadas tanto na decisão impugnada como pelas partes no decurso da instância, não são determinantes, uma vez que o enunciado das disposições do AGL não faz essa distinção. Com efeito, como o Reino Unido reconheceu na audiência, por um lado, o regime normal de tributação do AGL não se define à luz de um conceito genérico de granulado; por outro lado, a lei exclui do âmbito de aplicação do AGL granulados obtidos a partir de certos materiais (section 17 da lei), independentemente da sua condição física, ou de certos processos de extração ou de produção («Exempt processes» ao abrigo da section 18 da lei), ou com o único fundamento de que se destinam à exportação [section 16(2) da lei]. O AGL contém, assim, uma lista de granulados provenientes de materiais ou de processos de extração ou de produção que estão isentos de imposto, qualquer que seja a sua eventual pertença a uma das alegadas categorias de granulados [section 17(2) a (4) e section 18(1) a (3) da lei].

55      Daqui resulta que o princípio da tributação normal que subjaz ao AGL apenas se baseia no conceito de exploração comercial no Reino Unido de um material tributado como «granulado».

56      Ora, na decisão impugnada, a Comissão não teve manifestamente em conta este princípio da tributação normal para determinar o caráter seletivo de eventuais vantagens geradas pelo AGL. Assim, a descrição do âmbito de aplicação do AGL que figura, em especial, no segundo e terceiro períodos do n.° 29 da decisão impugnada não corresponde a esta definição de tributação normal. Com efeito, segundo estas passagens da decisão impugnada, no essencial, o imposto apenas será cobrado sobre os granulados «virgens» e não «sobre os granulados extraídos como subprodutos ou resíduos de outros processos (granulados secundários) nem sobre os granulados reciclados». O AGL não prevê, porém, qualquer regra geral de tributação desta natureza, que distingue em função dessas diferentes categorias de granulados («virgens», «secundários» e «reciclados»).

57      Esta constatação não é posta em causa pelo n.° 144 do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, que não visa a determinação do princípio da tributação normal subjacente ao AGL e, por maioria de razão, não declara que a decisão impugnada assenta numa definição correta deste princípio. Com efeito, o Tribunal de Justiça limita‑se aí a considerar que o Tribunal Geral não podia interpretar o n.° 29 da decisão impugnada no sentido de que enuncia que o conceito de «granulados primários» designava essencialmente os granulados sujeitos ao AGL e que o de «granulados secundários» se referia essencialmente aos «granulados isentos enumerados de modo preciso na lei» (acórdão anulado, referido no n.° 1 supra, n.° 112). Ora, admitindo que, neste contexto, o emprego dos conceitos de granulados «primários» e/ou «secundários» seja pertinente, o princípio da tributação normal subjacente ao AGL, tal como acima recordado no n.° 55, não exclui de modo algum que um granulado «secundário» constitua igualmente um granulado «virgem» ou que esteja, em princípio, sujeito ao AGL precisamente porque preenche a função de «granulado». Assim, contrariamente ao que sublinha, de forma categórica, o n.° 29 da decisão impugnada, o simples facto de os «granulados secundários» deverem supostamente designar «os granulados extraídos enquanto subprodutos ou resíduos de outros processos» não tem necessariamente como efeito que os referidos granulados estejam isentos do imposto. O mesmo se pode dizer dos materiais «reciclados» sempre que constituam «granulados» na aceção do AGL (v. n.° 55 supra).

58      Esta apreciação é confirmada pelas explicações plausíveis fornecidas pelo Reino Unido acima expostas nos n.os 37 a 40, que, como a Comissão reconheceu em resposta a uma medida de organização do processo do Tribunal Geral, correspondem à explicação fornecida no n.° 19 da notificação do AGL, na qual, à semelhança da lei, os conceitos de granulados «primários» e/ou «secundários» também não figuram. No essencial, resulta dessas explicações que, por um lado, a terminologia utilizada na decisão impugnada para designar as diferentes categorias de granulados não corresponde à utilizada pelo AGL, mas sobretudo à que é praticada no setor da exploração de carreiras, e que, por outro, existe uma sobreposição significativa entre o conceito de granulados «secundários» ― ao qual se opõe o de granulados «primários» ― e o conceito de granulados «virgens». Com efeito, segundo o Reino Unido, o conceito de granulados «virgens» engloba tanto os granulados «primários» como os granulados «secundários», ao passo que os granulados «reciclados» não são esses granulados «virgens». A razão desta sobreposição é que os granulados «secundários» designam frequentemente os granulados que constituem produtos derivados ou subprodutos da produção de granulados «primários», isto é, da primeira extração de certos materiais do subsolo para efeitos da obtenção de granulados na aceção do AGL. A diferença principal entre os granulados «primários» e os granulados «secundários» reside na sua composição respetiva que determina a sua utilização industrial específica. Por conseguinte, tanto os granulados «primários» como os granulados «secundários» são suscetíveis de constituir granulados «virgens» na medida em que foram objeto de uma extração recente e em que não foram utilizados (como granulados) anteriormente. Na audiência, o caráter pertinente desta precisão fornecida pelo Reino Unido foi igualmente reconhecido pelas outras partes.

59      Daqui resulta que, ao invés do que foi exposto no n.° 29 da decisão impugnada, o AGL não prevê a isenção generalizada dos granulados «secundários», que é aplicável a todos os materiais abrangidos pelo conceito de «granulado», mas limita‑se a associar a qualificação de granulado isento seja a materiais precisos, identificados nomeadamente pela lei, seja a um processo específico de extração ou de produção de um desses materiais, seja a granulados exportados.

60      Consequentemente, como sustenta a recorrente (acórdão anulado, referido no n.° 1 supra, n.° 79), ao limitar‑se a descrever, erradamente, no n.° 29 da decisão impugnada, o âmbito de aplicação do AGL, a Comissão faz uma má interpretação do princípio da tributação normal subjacente à lei, o que era suscetível de viciar a legalidade da sua apreciação das isenções do imposto à luz do conceito de auxílio e, em particular, do seu caráter eventualmente seletivo na aceção da jurisprudência acima referida nos n.os 47 a 49.

61      Por conseguinte, importa examinar se e em que medida, no caso vertente, esse erro da Comissão viciou a sua apreciação, na decisão impugnada, dos outros critérios que regulam a seletividade da vantagem na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE. A este respeito, há que apreciar se a Comissão podia afastar a existência de vantagens decorrentes de diferenciações fiscais efetuadas pelo AGL, com o simples fundamento de que «o âmbito de aplicação do AGL» se justificava pela sua lógica e pela sua economia geral (v. n.os 29, 34 e 43 da decisão impugnada).

 Quanto à existência de diferenciações fiscais efetuadas pelo AGL

¾       Quanto aos critérios que regulam a comparabilidade das situações em causa

62      Cumpre recordar que, para apreciar o caráter seletivo das vantagens conferidas por um regime fiscal, cabe examinar se as medidas fundadas no referido regime são suscetíveis de favorecer «certas empresas ou certas produções» na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE relativamente a outras empresas numa situação factual ou jurídica comparável à luz do objetivo prosseguido pela medida em causa (acórdão Adria‑Wien Pipeline, referido no n.° 35 supra, n.° 41).

63      Como as partes foram unânimes em reconhecer, nomeadamente na audiência, o AGL assenta num objetivo principal de proteção do ambiente, apesar de este objetivo não decorrer diretamente da sua letra.

64      Esse objetivo consiste essencialmente em promover, no setor da construção, o recurso a granulados que constituem subprodutos ou resíduos provenientes de certos processos (granulados igualmente ditos «secundários»), ou a granulados reciclados, para dessa forma reduzir o recurso aos granulados extraídos nas carreiras (granulados igualmente ditos «primários»), recursos naturais não renováveis, e, portanto, limitar as agressões ao ambiente que estão associadas a esse processo de extração (a seguir «objetivo de direcionamento da procura» ou «objetivo ambiental do AGL»). A este respeito, a recorrente limita‑se a afirmar, no essencial, que, tendo em conta a incoerência do âmbito de aplicação da lei, esse objetivo não pode ser alcançado de maneira sistemática e que o AGL favorece os granulados provenientes de certos materiais relativamente aos granulados provenientes de outros materiais que se encontram, porém, numa situação comparável à luz desse mesmo objetivo. Importa precisar que, à semelhança do princípio da tributação normal que regula o AGL, tal como acima descrita nos n.os 53 a 55, esta definição geral do objetivo ambiental do AGL ― não explicitada desta maneira no próprio texto da lei ― não distingue entre as diferentes categorias de materiais suscetíveis de gerar os referidos granulados.

65      Ora, impõe‑se referir que a fundamentação que figura na decisão impugnada se baseia nesta definição do objetivo ambiental do AGL (v. n.os 5, 29, 31, 32 e 35 da referida decisão; v., igualmente, acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 150 e 161).

66      De resto, no caso vertente, não há que decidir da questão de saber se o AGL é igualmente orientado pelo princípio do poluidor‑pagador, que não resulta da letra das disposições pertinentes do AGL nem da fundamentação da decisão impugnada (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.os 128 a 131). Este princípio pressupõe que, em princípio, o imposto se aplica a qualquer atividade de extração de minerais a fim de internalizar os custos ambientais gerados. Ora, a recorrente admitiu na audiência que não era esse o caso. Em todo o caso, se implicasse a sujeição ao imposto de todos os minerais extraídos do subsolo, independentemente de se destinarem ou não à exploração comercial como granulados, uma finalidade suplementar dessa natureza comportaria o risco não apenas de pôr em causa o princípio da tributação normal, tal como acima descrita nos n.os 53 a 55, mas também de prejudicar a prossecução coerente e eficaz do objetivo de direcionamento da procura.

67      Por conseguinte, deve verificar‑se se o AGL prevê um tratamento fiscal mais favorável de certas empresas ou produções relativamente ao de outras empresas ou produções (a seguir «diferenciação fiscal») que, à luz do objetivo ambiental do AGL acima referido nos n.os 63 e 64, se encontrem numa situação factual e jurídica comparável.

68      Com efeito, ao invés do que a Comissão defende após a remessa do presente processo ao Tribunal Geral (v. n.os 30 a 33 supra), no quadro da apreciação da comparabilidade das situações em causa, nem a Comissão nem o Tribunal podem ignorar esse objetivo ambiental do AGL (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 87; acórdão Adria‑Wien Pipeline, referido no n.° 35 supra, n.° 41; e n.° 49 supra), uma vez que os elementos que caracterizam situações diferentes e, portanto, o seu caráter comparável devem ser determinados e apreciados à luz do objeto e do objetivo do ato que institui a distinção em causa, bem como dos princípios e objetivos do domínio a que pertence o ato em causa (v., neste sentido e por analogia, acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o., C‑127/07, Colet., p. I‑9895, n.° 26, e de 12 de maio de 2011, Luxemburgo/Parlamento e Conselho, C‑176/09, Colet., p. I‑3727, n.° 32).

69      No quadro do seu primeiro fundamento, a recorrente sustenta, nomeadamente, que, atendendo ao objetivo ambiental do AGL, a exclusão do seu âmbito de aplicação de vários materiais tem como consequência uma diferenciação fiscal não justificada em detrimento de certos outros materiais (acórdão anulado, referido no n.° 1 supra, n.os 81 a 86).

70      Por conseguinte, importa examinar se resulta dos documentos dos autos que, à luz do objetivo ambiental do AGL, esses materiais isentos se encontram numa situação factual e jurídica comparável à de outros materiais que estão sujeitos ao imposto.

¾       Quanto à comparabilidade das situações dos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica (ball clay) e de xisto com as situações de outros granulados

71      No que respeita, nomeadamente, aos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto, que estão isentos do imposto ao abrigo do artigo 17.°, n.os 3 e 4, e do artigo 18.°, n.° 3, do AGL, impõe‑se referir que a recorrente alega, acertadamente, que qualquer que seja a sua qualificação na prática comercial, a saber, de granulados «virgens», «primários» ou «secundários», os referidos granulados preenchem, em princípio, o critério da tributação normal nos termos do AGL, na medida em que constituam «granulados» na aceção da lei. Esta afirmação de princípio não foi contestada pela Comissão nem pelo Reino Unido, que se limitaram a afirmar que estes materiais não são normalmente explorados para efeitos da sua utilização como granulados.

72      Todavia, na medida em que sejam utilizados e explorados comercialmente enquanto tais, por exemplo, na construção de edifícios ou de estradas, os referidos materiais encontram‑se numa situação comparável, senão idêntica, à de outros granulados de substituição tributados. A este respeito, nem a Comissão nem o Reino Unido conseguiram pôr em causa o argumento da recorrente segundo o qual, nesse caso, existe, pelo menos, uma relação potencial de concorrência ou de substituibilidade entre esses diferentes granulados para efeitos da sua utilização ou da sua exploração comercial. Assim, deve rejeitar‑se o argumento da Comissão e do Reino Unido de que os materiais, como a ardósia, a argila plástica, o caulino e o xisto, estão excluídos do âmbito de aplicação do AGL porque não fazem parte do «setor dos granulados», não são «geralmente» ou «tradicionalmente» utilizados enquanto tais nem extraídos para esse fim, ou não têm uma «relação significativa de concorrência com o setor tributado» (v. n.os 32 e 36 supra), dependendo a inserção dos referidos materiais no âmbito de aplicação do imposto, nos termos da regra de tributação normal aplicável, apenas da sua exploração efetiva e verificada como granulados. Além disso, a Comissão e o Reino Unido não contestaram o argumento da recorrente de que existem, no território desse Estado‑Membro, várias carreiras que produzem granulados (primários) de xisto e de ardósia.

73      Por outro lado, é dado assente que a extração de materiais não tributados, nomeadamente a ardósia e a argila, agride pelo menos tanto, senão mais, o ambiente como a extração de outros materiais tributados, que pode produzir entulhos, resíduos ou outros subprodutos suscetíveis de serem utilizados como granulados (v. n.° 41 supra). Assim, as partes sublinharam o caráter muito ineficaz da extração da ardósia, da argila plástica e do caulino, bem como a existência de stocks importantes de entulhos e de resíduos dos referidos materiais que degradam a paisagem, e, portanto, o impacto particularmente prejudicial do processo de extração em causa no ambiente, razão pela qual o legislador do Reino Unido isentou do imposto esses materiais a fim de promover a sua utilização ou a sua reciclagem como granulados (v. n.° 43 supra). Por conseguinte, os granulados destes diferentes materiais encontram‑se, a priori, numa situação pelo menos comparável à luz do objetivo ambiental do AGL.

74      A este respeito, cabe precisar que a Comissão e o Reino Unido não conseguiram demonstrar de forma suficiente em que consiste o caráter particularmente prejudicial da extração de materiais não tributados para o ambiente, que distinga a sua situação da situação dos materiais isentos, nem os fundamentos da decisão impugnada, a carta do Reino Unido de 19 de fevereiro de 2002 em anexo à resposta escrita da Comissão de 2 de dezembro de 2005 a questões escritas do Tribunal ou as respostas das referidas partes às questões orais colocadas pelo Tribunal na audiência fornecem uma explicação cabal a este respeito.

¾       Quanto à diferenciação fiscal entre situações comparáveis

75      Decorre das considerações precedentes que o facto de isentar do imposto os granulados de certos materiais, como a ardósia, a argila plástica, o caulino e o xisto, e de sujeitar a esse imposto os granulados de outros materiais, quando, à luz do objetivo ambiental do AGL, estes diferentes granulados se encontram numa situação comparável quanto à sua utilização como «granulados», é constitutivo de uma diferenciação fiscal suscetível de dar lugar à existência de vantagens seletivas na aceção da jurisprudência acima referida no n.° 47.

76      Mesmo admitindo a pertinência da diferenciação entre granulados «primários» e «secundários», que não resulta, porém, da letra da lei (v. n.° 54 supra), os produtores de granulados tributados substituíveis aos granulados dos materiais isentos são duplamente desfavorecidos. Com efeito, não só os granulados tributados estão sujeitos ao AGL como sofrem, pelo menos numa medida mais importante que os materiais isentos, as consequências económicas do efeito da reorientação da procura para granulados «secundários» isentos que é provocada pela tributação apenas dos granulados sujeitos ao imposto.

77      Os argumentos aduzidos pela Comissão e pelo Reino Unido não são suscetíveis de infirmar esta apreciação.

78      Pelo contrário, na sequência de uma pergunta precisa do Tribunal colocada na audiência, a Comissão e o Reino Unido não se explicaram quanto à questão de saber se a isenção dos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto cria necessariamente, no setor da construção, uma procura mais importante destes granulados, ou até uma incitação económica a extrair mais granulados («primários») desses materiais isentos. Ora, este redirecionamento da procura para os granulados («primários») dos materiais isentos reforça os efeitos económicos desiguais que a diferenciação fiscal produz, por si só, na exploração dos granulados substituíveis tributados. Além disso, a referida reorientação comporta o risco de prejudicar o objetivo ambiental do AGL, que consiste precisamente em desencorajar e tornar mais eficaz a extração de granulados («primários») de certos materiais, sobretudo dos materiais isentos, e em garantir que os stocks de entulhos e de resíduos dos referidos materiais sejam lançados em aterros.

79      Por conseguinte, deve considerar‑se que a isenção geral dos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto está na origem de uma diferenciação fiscal em detrimento de granulados substituíveis provenientes de outros materiais sujeitos ao AGL. A este respeito, de resto, o Reino Unido reconheceu na audiência que existiam diferenças de tratamento relativamente ao AGL, ao mesmo tempo que afirmou que essas diferenças eram suscetíveis de ser justificadas pela natureza e pela economia geral do sistema de tributação instaurado.

80      Por outro lado, esta apreciação também não é posta em causa pela circunstância de, nos n.os 158 a 163 do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, o Tribunal de Justiça não ter criticado o n.° 130 do acórdão anulado, referido no n.° 1 supra. Com efeito, naqueles números, o Tribunal de Justiça respondeu a uma alegação muito circunscrita da recorrente, relativa nomeadamente a uma substituição ilegal de fundamentos alegadamente levada a cabo pelo Tribunal Geral a respeito da justificação da isenção de certos materiais, tais como o xisto e a ardósia de má qualidade, a argila e os resíduos de caulino e de argila plástica, mesmo quando utilizados como granulados após a sua extração, à luz dos objetivos ambientais prosseguidos. Assim, o Tribunal de Justiça limitou‑se a considerar, apenas nesse contexto, que a conclusão do Tribunal Geral de que esses materiais tinham sido «até [então] pouco utilizados como granulados devido [aos] elevados custos de transporte» não enfermava de um erro de direito, uma vez que «o incentivo à utilização dos materiais virgens pouco utilizados até ao presente como granulados […] é coerente com o objetivo de racionalização da utilização dos granulados» e que, portanto, «o incentivo a usar os referidos materiais também não abala a natureza e a estrutura geral ambiental do AGL» (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 161; v., igualmente, conclusões do advogado‑geral P. Mengozzi no processo que deu origem a esse acórdão, Colet., p. I‑10521, n.os 120 a 122). Todavia, o Tribunal de Justiça não se pronunciou, nesse mesmo contexto, sobre a questão de saber se a reorientação da procura a favor dos granulados provenientes destes materiais era suscetível de constituir uma diferenciação fiscal em detrimento dos granulados provenientes de materiais tributados.

81      Nestas condições, a argumentação principal da recorrente segundo a qual o AGL está na origem de uma diferenciação fiscal entre, por um lado, os materiais isentos do imposto e, por outro, os granulados substituíveis provenientes de materiais tributados deve ser acolhida, sem que seja necessário apreciar as outras alegações e os outros argumentos invocados pela recorrente a este respeito.

82      Todavia, esta diferenciação fiscal apenas dá lugar a vantagens seletivas a favor de certas empresas ou produções na condição de não poder ser justificada pela natureza e pela economia do sistema fiscal estabelecido pelo AGL (v. n.° 48 supra).

 Quanto à justificação através da natureza e da economia geral do AGL

83      Importa examinar se a Comissão tinha fundamentos para considerar que as vantagens fiscais constatadas em proveito de certos produtores ou de certos materiais se justificavam pela natureza ou pela economia geral do AGL, que constitui o único quadro de referência pertinente no caso vertente (v. n.os 5, 29, 31 e 32 da decisão impugnada; v., igualmente, n.° 51 supra).

84      Importa igualmente recordar que, para efeitos desta apreciação, deve ser estabelecida uma distinção entre, por um lado, os objetivos de um dado regime fiscal, que lhe são exteriores, e, por outro, os mecanismos inerentes ao próprio sistema fiscal, que são necessários para a realização de tais objetivos, podendo esses objetivos e mecanismos, enquanto princípios fundadores ou diretores do sistema fiscal em causa, sustentar essa justificação, o que incumbe ao Estado‑Membro demonstrar (v., neste sentido, acórdão Portugal/Comissão, referido no n.° 47 supra, n.os 80 e 81).

85      Como foi acima exposto nos n.os 63 e 64, o objetivo ambiental do AGL visa essencialmente promover um direcionamento da procura, no setor da construção, de granulados ditos «primários» para os granulados ditos «secundários», que são subprodutos ou resíduos de outros processos, bem como para os granulados «reciclados», sem que esta definição geral distinga entre diferentes materiais suscetíveis de gerar esses granulados. Os critérios que determinam o caráter «normal» da tributação prevista pelo AGL (v. n.os 53 e 54 supra) e esse objetivo constituem, assim, os princípios fundadores ou diretores da lei, à luz dos quais a eventual justificação de uma diferenciação fiscal deve ser apreciada.

86      Ora, tendo em conta os elementos fornecidos pela recorrente, a Comissão e o Reino Unido não conseguiram demonstrar que a diferenciação fiscal associada à isenção dos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto se justifica pelo princípio da tributação «normal» em que assenta o AGL ou à luz do objetivo ambiental do AGL.

87      Por um lado, esta diferenciação fiscal derroga claramente a lógica da tributação normal do AGL, uma vez que os granulados dos materiais isentos constituem todos, pelo menos potencialmente, «granulados» sujeitos à exploração comercial na aceção da lei.

88      Por outro lado, esta diferenciação fiscal é suscetível de prejudicar o objetivo ambiental do AGL a dois títulos.

89      Em primeiro lugar, salvo prova em contrário que não foi apresentada até à data nem pela Comissão nem pelo Reino Unido, a isenção dos granulados de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto comporta o risco de criar, no setor da construção, uma procura mais importante em granulados «primários» desse tipo em vez de granulados «secundários» ― a saber, subprodutos ou resíduos de certos processos, incluindo os provenientes de outros materiais substituíveis, mas tributados ― e portanto de intensificar a extração dos referidos granulados «primários», o que é contrário ao objetivo ambiental do AGL, que visa encorajar a utilização apenas de certos granulados «secundários» e evitar o seu depósito em aterros e armazenamento (v. n.° 78 supra). A este respeito, excetuando a afirmação geral de que esses materiais não constituem «tradicionalmente» ou «geralmente» granulados, a Comissão e o Reino Unido não puderam pôr em causa o argumento da recorrente segundo o qual existem, no território desse Estado‑Membro, diversas carreiras que produzem granulados («primários») de xisto e de ardósia suscetíveis de aproveitar desta isenção da forma descrita acima.

90      Em segundo lugar, nesta medida, deixa de ser garantido um redirecionamento eficaz e coerente dessa procura para a utilização de granulados «secundários» de todas as categorias de materiais, a saber, os subprodutos e os resíduos de certos processos, ou de granulados «reciclados», para assim evitar o depósito em aterros destes granulados «secundários» e encorajar uma extração mais eficaz de todos os granulados «primários», e não apenas dos provenientes de certos materiais isentos. Ora, esse resultado é manifestamente incompatível com o objetivo ambiental do AGL tal como invocado pelo Reino Unido. Além disso, nestas condições, o efeito potencialmente benéfico para o ambiente, à luz deste mesmo objetivo, que consiste em esgotar, num primeiro momento, os stocks existentes de granulados «secundários» de argila, de ardósia, de caulino, de argila plástica e de xisto, não é suficiente para justificar a diferenciação fiscal constatada, uma vez que, por não ser limitado no tempo, esse efeito comporta o risco, salvo prova em contrário não produzida, no caso vertente pelo Reino Unido, de criar problemas análogos de armazenamento de resíduos de granulados provenientes de outros materiais sujeitos ao imposto, cuja procura passa a ser desviada, o que é igualmente contrário ao objetivo ambiental do AGL.

91      Por conseguinte, à luz de todas as considerações precedentes, que indicam a existência de vantagens seletivas na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, a Comissão não podia concluir, nos n.os 34 e 43 da decisão impugnada, que «as vantagens que podem nascer em benefício de certas empresas em razão da definição do âmbito de aplicação do AGL se justificam pela natureza e [pela] economia geral do regime fiscal» em causa.

92      Assim, Comissão ignorou, no caso vertente, o conceito de auxílio nos termos do artigo 87.°, n.° 1, CE, pelo que se deve acolher o primeiro fundamento na medida em que diz respeito à existência de uma diferenciação fiscal levada a cabo pelo AGL, na falta de uma justificação a este respeito pela natureza e pela economia do sistema fiscal em causa.

93      Por último, o Tribunal considera necessário apreciar a alegação relativa a uma inobservância do conceito de auxílio no que respeita à apreciação da isenção das exportações de granulados pela Comissão, alegação que se refere a um aspeto da decisão impugnada não abordado pela alegação acolhida no número precedente.

 Quanto à isenção das exportações de granulados

94      Como resulta da section 16(2) da lei, o âmbito de aplicação territorial do AGL está limitado ao território do Reino Unido, com a consequência de todas as comercializações de granulados fora deste território, a saber, todas as transações económicas relacionadas com a sua exportação, estarem isentas do imposto [v., igualmente, section 13(2)(a) do regulamento de execução da lei]. A este respeito, importa recordar que a recorrente convida o Tribunal a criticar o raciocínio que figura no n.° 33 da decisão impugnada, segundo o qual as autoridades do Reino Unido não estão em condições de controlar as exportações de granulados, o que comporta um risco de desigualdade de tratamento dos granulados exportados (v. n.° 29 supra).

95      Para determinar se a isenção das exportações comporta uma vantagem seletiva a favor de certas empresas ou produções, há que apreciar, em conformidade com o princípio acima enunciado no n.° 47, num primeiro momento, se os granulados exportados e os granulados comercializados no território do Reino Unido se encontram em situações comparáveis, se não idênticas.

96      A este respeito, cumpre recordar que, no quadro do seu exame que figura nos n.os 174 a 178 do acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, acima referido no n.° 8, o Tribunal de Justiça concluiu pela existência de um erro de direito do Tribunal Geral na aplicação do artigo 253.° CE quanto à interpretação do alcance da fundamentação exposta no n.° 33 da decisão impugnada (acórdão anulado, referido no n.° 1 supra, n.° 150). O Tribunal de Justiça precisou, nomeadamente, que esta fundamentação da decisão «[se refere], assim, à desigualdade de tratamento que resulta, se os granulados exportados não forem isentos, do facto de os granulados que são comercializados no Reino Unido serem isentos quando utilizados para determinadas finalidades, ao passo que os granulados utilizados para as mesmas finalidades no Estado de importação são sujeitos ao AGL, devido à falta de meios de fiscalização das autoridades [do Reino Unido] sobre a utilização dos granulados fora do território [desse Estado‑Membro]» (acórdão proferido em sede de recurso para o Tribunal de Justiça, referido no n.° 8 supra, n.° 176).

97      Como a Comissão indicou no n.° 33 da decisão impugnada, tendo em conta o objeto do AGL, que apenas visa tributar os materiais explorados como granulados, há que concluir que os materiais comercializados no Reino Unido e os exportados para o estrangeiro se encontram efetivamente em situações distintas porquanto, na sequência de uma exportação, a aplicação do critério de tributação determinante, a saber, a exploração comercial como granulados, já não pode, em princípio, ser verificada pelas autoridades [do Reino Unido]. Com efeito, estas autoridades não poderão ou poderão apenas dificilmente determinar se um material exportado é suscetível de ser utilizado e explorado como granulado, o será realmente ou será utilizado para outros fins, o que depende igualmente das especificações regulamentares aplicáveis nos países de destino. A este respeito, não colhe o argumento da recorrente segundo o qual é particularmente fácil às autoridades do Reino Unido identificar as propriedades físico‑químicas dos materiais destinados à exportação para assim determinar se são próprios ou impróprios para serem utilizados em processos que permitam beneficiar de uma isenção ao abrigo do AGL. Mesmo admitindo que é esse o caso, como foi acima sublinhado nos n.os 53 e 54, a qualificação de «granulado» ou de material isento não depende precisamente destas propriedades, mas, nomeadamente, de uma exclusão casuística de certos materiais nominalmente identificados ou provenientes de certos processos do âmbito de aplicação do AGL. Além disso, o facto de os materiais exportados e os materiais comercializados no Reino Unido não se encontrarem numa situação comparável é confirmado à luz do objetivo ambiental do AGL (v. n.° 63 supra), uma vez que, no caso da exportação, o legislador e as autoridades do Reino Unido não podem reorientar, através de uma tributação diferenciada, a procura de granulados em conformidade com este objetivo.

98      Por último, o argumento da recorrente segundo o qual 90% dos granulados exportados e assim isentos provêm de uma carreira de granito, situada em Glensanda, na Escócia, e não podem ser utilizados nos processos isentos no Reino Unido não está demonstrado. Todavia, mesmo admitindo que é verdadeiro, o referido argumento não basta para pôr em causa as considerações acima expostas no n.° 97. Com efeito, mesmo que esses materiais fossem sujeitos ao imposto no caso da sua exploração comercial como granulados no Reino Unido, esse argumento não seria suscetível de demonstrar que as autoridades do Reino Unido podem verificar que, nos países de destino, os materiais exportados se encontram numa situação de direito e de facto em que, se tivessem sido objeto da mesma exploração no Reino Unido, teriam sido sujeitos ao AGL.

99      Por conseguinte, na falta de comparabilidade das situações em causa, a recorrente não demonstrou que a isenção das exportações dá lugar a diferenciações fiscais suscetíveis de constituírem vantagens seletivas na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE. Não é, pois, necessário examinar se essa isenção é suscetível de encorajar a exploração de granulados «primários» e, como tal, de produzir consequências contrárias ao objetivo ambiental do AGL que possam ser justificadas pela sua natureza e pela sua economia.

100    Portanto, tendo em conta as considerações precedentes, a recorrente não demonstrou que o n.° 33 da decisão impugnada enferma de um erro na medida em que declara, por um lado, a impossibilidade de controlo pelas autoridades do Reino Unido do «emprego de granulados fora do seu território» e, por outro, a necessidade de «evitar um tratamento desigual das exportações de granulados».

101    Por conseguinte, esta alegação deve ser rejeitada. Todavia, tal não põe em causa a ilegalidade do dispositivo da decisão impugnada, como resulta do seu n.° 43, nos termos do qual a Comissão não levanta objeções ao AGL no seu conjunto, com o fundamento de que o seu «âmbito de aplicação se justifica pela lógica e [pela] natureza do regime fiscal» em causa.

102    Tendo em conta os erros cometidos pela Comissão na aplicação do conceito de auxílio, tal como acima constatados nos n.os 51 a 92, há que anular a decisão impugnada, salvo no que respeita à isenção da Irlanda do Norte, que não é objeto do presente litígio, por violação do artigo 87.°, n.° 1, CE, sem que seja necessário apreciar o segundo, terceiro e quarto fundamentos.

 Quanto às despesas

103    No acórdão proferido em sede do recurso que lhe foi submetido, o Tribunal de Justiça reservou para final a decisão quanto às despesas. Compete, pois, ao Tribunal Geral decidir, no presente acórdão, sobre a totalidade das despesas inerentes aos diferentes processos, de acordo com o artigo 121.° do Regulamento de Processo.

104    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas efetuadas no Tribunal de Justiça e no Tribunal Geral, em conformidade com o pedido da recorrente.

105    Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as respetivas despesas. Por conseguinte, o Reino Unido suportará as suas próprias despesas efetuadas no Tribunal de Justiça e no Tribunal Geral.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

decide:

1)      A decisão da Comissão C (2002) 1478 final, de 24 de abril de 2002, relativa ao processo de auxílio de Estado N 863/01 ― Reino Unido/Imposto sobre os granulados, é anulada, salvo no que respeita à isenção da Irlanda do Norte.

2)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas, bem como as efetuadas pela British Aggregates Association no Tribunal de Justiça e no Tribunal Geral.

3)      O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte suportará as suas próprias despesas efetuadas no Tribunal de Justiça e no Tribunal Geral.

Azizi

Labucka

Frimodt Nielsen

Schwarcz

 

      Gratsias

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de março de 2012.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio

Tramitações processuais controvertidas e pedidos das partes

Questão de direito

1.  Observações preliminares

2.  Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 87.°, n.° 1, CE

Resumo das observações das partes após a remessa

Quanto às condições de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE

Quanto aos critérios que regulam o caráter seletivo da vantagem

Quanto à tributação «normal» prevista pelo AGL

Quanto à existência de diferenciações fiscais efetuadas pelo AGL

―  Quanto aos critιrios que regulam a comparabilidade das situaηυes em causa

―  Quanto ΰ comparabilidade das situaηυes dos granulados de argila, de ardσsia, de caulino, de argila plαstica (ball clay) e de xisto com as situaηυes de outros granulados

―  Quanto ΰ diferenciaηγo fiscal entre situaηυes comparαveis

Quanto à justificação através da natureza e da economia geral do AGL

Quanto à isenção das exportações de granulados

Quanto às despesas


* Língua do processo: inglês.