Language of document : ECLI:EU:C:2001:135

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

8 de Março de 2001 (1)

«Livre circulação de mercadorias - Artigos 30.° e 36.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 28.° CE e 30.° CE) - Livre prestação de serviços - Artigos 56.° e 59.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 46.° CE e 49.° CE) - Legislação sueca sobre a publicidade às bebidas alcoólicas - Modalidades de venda - Medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa - Justificação decorrente da protecção da saúde»

No processo C-405/98,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), pelo Stockholms tingsrätt (Suécia), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Konsumentombudsmannen (KO)

e

Gourmet International Products AB (GIP),

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30.°, 36.°, 56.° e 59.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 28.° CE, 30.° CE, 46.° CE e 49.° CE),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: C. Gulmann, presidente de secção, V. Skouris, J.-P. Puissochet (relator), R. Schintgen e F. Macken, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,


secretário: H. von Holstein, secretário-adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

-    em representação do Konsumentombudsmannen (KO), por M. Åbyhammar, ställföreträdande konsumentombudsman,

-    em representação da Gourmet International Products AB (GIP), por U. Djurberg, advogado,

-    em representação do Governo sueco, por A. Kruse, na qualidade de agente,

-    em representação do Governo francês, por K. Rispal-Bellanger e R. Loosli-Surrans, na qualidade de agentes,

-    em representação do Governo finlandês, por T. Pynnä, na qualidade de agente,

-    em representação do Governo norueguês, por H. Seland, na qualidade de agente,

-    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por L. Ström e K. Banks, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Gourmet International, dos Governos sueco, francês e finlandês e da Comissão na audiência de 19 de Outubro de 2000,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 14 de Dezembro de 2000,

profere o presente

Acórdão

1.
    Por decisão de 18 de Setembro de 1998, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 16 de Novembro de 1998, o Stockholms tingsrätt submeteu, nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 30.°, 36.°, 56.° e 59.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 28.° CE, 30.° CE, 46.° CE e 49.° CE).

2.
    Estas questões foram suscitadas no âmbito de um pedido apresentado pelo Konsumentombudsmann (Provedor sueco encarregado da defesa dos consumidores, a seguir «KO») com o objectivo de a Gourmet International Products AB (a seguir «GIP») ser proibida de inserir anúncios publicitários a bebidas alcoólicas em publicações periódicas.

Legislação nacional

3.
    Entrada em vigor em 1 de Julho de 1979, a lagen (1978:763) med vissa bestämmelser om marknadsföring av alcoholdrycker (lei sueca que estabelece disposições sobre a comercialização de bebidas alcoólicas), alterada (a seguir «alkoholreklamlagen»), é, nos termos do artigo 1.°, aplicável à promoção, pelos industriais e comerciantes, de bebidas alcoólicas, dirigida aos consumidores. Por força da alkohollagen (1994:1738) (lei sueca sobre o álcool), consideram-se bebidas alcoólicas as bebidas que contenham um volume de álcool superior a 2,25%. Nessas bebidas incluem-se as bebidas espirituosas, o vinho, a «cerveja forte» (com um volume alcoólico superior a 3,5%) e a «cerveja» (cujo volume alcoólico está compreendido entre 2,5% e 3,5%).

4.
    Nos termos do artigo 2.° da alkoholreklamlagen:

«Atentos os riscos que o consumo de álcool representa para a saúde, importa ser especialmente moderado na promoção das bebidas alcoólicas. Em especial, a publicidade ou as outras medidas de promoção não podem ser ostensivas, porta a porta, nem incentivar o consumo de álcool.

Para efeitos da promoção das bebidas alcoólicas, fica proibida a utilização de anúncios comerciais na rádio ou na televisão. Esta proibição aplica-se igualmente às emissões difundidas por satélite e sujeitas à lei (1996:844) sobre a rádio e a televisão.

Para efeitos da promoção das bebidas espirituosas, do vinho ou da cerveja forte, fica proibida a utilização de anúncios comerciais nas publicações periódicas ou noutras publicações sujeitas à regulamentação sueca sobre a liberdade de imprensa e que, atento o plano de publicação, são equiparáveis a periódicos. No entanto, esta proibição não se aplica às publicações distribuídas apenas nos locais de venda dessas bebidas. Lei (1996:851).»

5.
    Da decisão de reenvio resulta que, em virtude do objecto da alkoholreklamlagen, que é o de limitar as possibilidade de promoção das bebidas alcoólicas junto dos consumidores, a proibição dos anúncios comerciais nas publicações periódicas não se aplica aos anúncios difundidos na imprensa especializada, entendendo-se por tal a que tem por destinatário, fundamentalmente, os profissionais, ou seja, em especial, os industriais e os restauradores.

6.
    Daqui também se infere que a publicidade na via pública e o envio directo de material publicitário aos particulares, entre outros, devem considerar-se contrários à obrigação de moderação imposta pela alkoholreklamlagen.

O litígio no processo principal

7.
    A GIP edita uma revista intitulada «Gourmet». No n.° 4 (Agosto/Outubro de 1997) da edição destinada aos assinantes incluía três páginas de publicidade a bebidas alcoólicas, uma a vinho tinto e duas a whisky. Essas páginas não faziam parte da edição vendida ao público em geral. Nos termos da decisão de reenvio, 90% dos 9 300 assinantes da revista são profissionais, industriais ou comerciantes, e 10% são particulares.

8.
    O KO solicitou ao Stockholms tingsrätt que proíba a GIP, sob pena de coima, de contribuir para a comercialização de bebidas alcoólicas junto dos consumidores através desses anúncios, que violam o artigo 2.° do alkoholreklamlagen.

9.
    A GIP pediu que esse pedido fosse julgado improcedente, alegando, designadamente, que o recurso contra si interposto se baseava numa legislação contrária ao direito comunitário.

10.
    Aquando do exame do recurso, o tingsrätt interrogou-se, em especial, sobre se disposições nacionais que proíbem de forma absoluta determinados anúncios comerciais podiam considerar-se como tendo um efeito equivalente a restrições quantitativas na acepção do artigo 30.° do Tratado e, eventualmente, lícitas, atento o seu objecto, ao abrigo do artigo 36.° do Tratado. Também se interrogou sobre a compatibilidade dessas disposições nacionais com a liberdade de prestação de serviços.

11.
    Parecendo-lhe necessária uma interpretação das disposições pertinentes do Tratado, o Stockholms tingsrätt decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)    Os artigos 30.° ou 59.° do Tratado de Roma devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que contém uma proibição geral de publicidade de bebidas alcoólicas, como a proibição contida no artigo 2.° da alkoholreklamlagen?

2)    No caso de resposta afirmativa: pode tal proibição ser então justificada e proporcional com vista à protecção da saúde e da vida das pessoas?»

12.
    Tendo o KO interposto recurso da decisão de reenvio para o Marknadsdomstolen (Suécia), este negou-lhe provimento por decisão de 11 de Março de 1999.

Quanto à livre circulação de mercadorias

13.
    Através das suas questões prejudiciais, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta em substância, em primeiro lugar, se as disposições do Tratado relativas à livre circulação de mercadorias obstam a uma proibição dos anúncios publicitários a bebidas alcoólicas, como a prevista no artigo 2.° da alkoholreklamlagen.

14.
    O KO e os governos intervenientes admitem que a proibição da publicidade na Suécia afecta, nesse país, as vendas de bebidas alcoólicas, incluindo as importadas de outros Estados-Membros, pois o objecto da legislação sueca é precisamente reduzir o consumo de álcool.

15.
    Todavia, recordando que o Tribunal de Justiça declarou, no n.° 16 do seu acórdão de 24 de Novembro de 1993, Keck e Mithouard (C-267/91 e C-268/91, Colect., p. I-6097), que a aplicação de disposições nacionais que limitam ou proíbem determinadas modalidades de venda não é susceptível de entravar o comércio intracomunitário, desde que se apliquem a todos os operadores interessados que exerçam a sua actividade no território nacional e desde que afectem da mesma forma, tanto juridicamente como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos provenientes de outros Estados-Membros, o KO e os governos intervenientes consideram que a proibição da publicidade em causa no processo principal não constitui um entrave ao comércio entre os Estados-Membros pois satisfaz os critérios fixados pelo Tribunal de Justiça nesse acórdão.

16.
    A GIP considera que uma proibição absoluta, como a em causa no processo principal, não satisfaz esses critérios. Em especial, era passível de afectar mais gravemente as mercadorias importadas do que as produzidas no Estado-Membro em causa.

17.
    Embora considerando que o juízo, em função das circunstâncias de facto, sobre a existência ou não de um entrave ao comércio intracomunitário cabe ao órgão jurisdicional nacional, a Comissão manifesta dúvidas análogas a propósito da aplicação, ao caso em apreço, dos critérios referidos no n.° 15 do presente acórdão.

18.
    Importa recordar que, nos termos do n.° 17 do acórdão Keck e Mithouard, já referido, para escaparem ao âmbito do artigo 30.° do Tratado, as disposições nacionais que limitam ou proíbem determinadas modalidades de venda não devem ser susceptíveis de impedir o acesso dos produtos provenientes de outro Estado-Membro ao mercado ou de o dificultar mais do que já dificulta o dos produtos nacionais.

19.
    O Tribunal de Justiça também considerou, no n.° 42 do acórdão de 9 de Julho de 1997, De Agostini e TV-Shop (C-34/95 e C-36/95, Colect., p. I-3843), que não se podia excluir que uma proibição total, num Estado-Membro, de um modo de promoção de um produto, que aí é licitamente vendido, tenha um impacto mais importante nos produtos provenientes de outros Estados-Membros.

20.
    Ora, acontece que uma proibição da publicidade como a em causa no processo principal não só proíbe uma forma de promoção de um produto, como na verdade também proíbe os produtores e importadores de difundirem qualquer mensagem publicitária que tenha por destinatário os consumidores, com algumas excepções que são desprezíveis.

21.
    Sem que seja mesmo necessário levar a termo uma análise precisa das circunstâncias de facto que caracterizam a situação sueca, que cabe ao órgão jurisdicional nacional efectuar, o Tribunal de Justiça está em condições de declarar que, relativamente a produtos, como as bebidas alcoólicas, cujo consumo está ligado a práticas sociais tradicionais e a hábitos e usos locais, a proibição de toda a publicidade destinada aos consumidores, através de anúncios na imprensa, na rádio e na televisão, do envio directo de material não solicitado ou colagem de cartazes na via pública, é susceptível de tornar mais difícil o acesso ao mercado dos produtos originários de outros Estados-Membros do que o dos produtos nacionais, com os quais o consumidor está, espontaneamente, mais familiarizado.

22.
    As indicações dadas pelo KO e pelo Governo sueco quanto à progressão relativa, na Suécia, do consumo de vinho e de whisky, sobretudo importados, relativamente a outros produtos como o vodca, principalmente de origem sueca, não invalidam esta conclusão. Com efeito, por um lado, não se pode excluir que caso não existisse a legislação em causa no processo principal a evolução referida teria sido mais importante; por outro, essas indicações só tomam em consideração uma parte das bebidas alcoólicas e deixam de lado o consumo de cerveja.

23.
    Cabe sublinhar, além disso, que, embora possam ser distribuídas nos locais de venda publicações contendo anúncios publicitários, a Systembolaget AB, sociedade anónima inteiramente detida pelo Estado sueco, que possui o monopólio da venda a retalho na Suécia, na verdade só difunde nos seus pontos de venda a sua própria revista.

24.
    Por último, a legislação sueca não proíbe a «publicidade redactorial», ou seja, a valorização, em artigos que integram o conteúdo editorial da publicação, de produtos relativamente aos quais a inserção de anúncios comerciais directos está proibida. A Comissão observa, justamente, que, por diversas razões, designadamente de ordemcultural, os produtores nacionais têm um melhor acesso a esse processo publicitário do que os seus concorrentes estabelecidos noutros Estados-Membros. Esta circunstância é adequada a agravar o desequilíbrio inerente à proibição absoluta da publicidade directa.

25.
    Assim, deve considerar-se que uma proibição da publicidade como a em causa no processo principal afecta mais a comercialização dos produtos originários de outros Estados-Membros do que a dos produtos nacionais e constitui, por conseguinte, um entrave ao comércio entre os Estados-Membros, que integra o âmbito do artigo 30.° do Tratado.

26.
    Todavia, este entrave pode justificar-se com fundamento na protecção da saúde pública, que constitui uma razão de interesse geral reconhecida pelo artigo 36.° do Tratado.

27.
    A este propósito, é certo que uma regulamentação que limita as possibilidades de publicidade de bebidas alcoólicas e procura, assim, lutar contra o alcoolismo, responde a preocupações de saúde pública (acórdãos de 10 de Julho de 1980, Comissão/França, 152/78, Recueil, p. 2299, n.° 17, e de 25 de Julho de 1991, Aragonesa de Publicidade Exterior e Publivía, C-1/90 e C-176/90, Colect., p. I-4151, n.° 15).

28.
    Para que as preocupações de saúde pública possam justificar um entrave como o causado pela proibição da publicidade em causa no processo principal, é além disso necessário que a medida considerada seja proporcional ao objectivo a alcançar e não constitua nem um meio de discriminação arbitrário nem uma restrição dissimulada ao comércio entre os Estados-Membros.

29.
    O KO e os governos intervenientes alegam que a proibição da publicidade em causa no processo principal pode beneficiar da derrogação prevista no artigo 36.° do Tratado. O KO e o Governo sueco sublinham, em especial, que esta proibição não é absoluta e não impede o público de se informar, se o desejar, designadamente nos restaurantes, na Internet, num «contexto redactorial» ou solicitando ao produtor ou ao importador o envio de material publicitário. Além disso, o Governo sueco recorda que o Tribunal de Justiça reconheceu que, no estádio actual do direito comunitário, os Estados-Membros são livres, dentro dos limites definidos pelo Tratado, para decidir o nível a que pretendem assegurar a protecção da saúde pública e o modo como esse nível deve ser alcançado (acórdão Aragonesa de Publicidade Exterior e Publivía, já referido, n.° 16). O Governo sueco afirma que a legislação em causa no processo principal constitui um componente indispensável da sua política em matéria de álcool.

30.
    A GIP sustenta que a proibição absoluta da publicidade que resulta da legislação em causa no processo principal é desproporcionada, pois a protecção pretendida podia ser obtida através de medidas de proibição mais limitadas, que abrangessem, por exemplo, determinados locais públicos ou a imprensa destinada às criança e aos adolescentes. Com efeito, importava atender ao facto de que a política sueca em matéria dealcoolismo já está garantida através do monopólio da venda a retalho, da proibição de venda a pessoas com menos de 20 anos e das campanhas de informação.

31.
    A Comissão considera que é ao órgão jurisdicional de reenvio que compete apreciar o carácter proporcional ou não da proibição da publicidade em causa no processo principal. Contudo, também indica que a referida proibição parece pouco eficaz, designadamente devido à existência da publicidade «redactorial» e da abundância da publicidade indirecta existente na Internet, e que, possivelmente, para proteger o interesse em causa bastariam exigências quanto à forma da publicidade, como a obrigação de moderação que já existia na lei sueca.

32.
    Cabe sublinhar, por um lado, que nenhum elemento apresentado ao Tribunal de Justiça permite considerar que as razões de saúde pública invocadas pelas autoridades suecas foram invocadas com outro fim e utilizadas de forma a criar discriminações em relação a mercadorias originárias de outros Estados-Membros ou a proteger indirectamente certas produções nacionais (acórdãos de 14 de Dezembro de 1979, Henn e Darby, 34/79, Recueil, p. 3795, n.° 21, e Aragonesa Publicidade Exterior e Publivía, já referido, n.° 20).

33.
    Relativamente, por outro lado, à apreciação a efectuar quanto à proporcionalidade da proibição da publicidade em causa no processo principal e, em especial, quanto à questão de saber se o objectivo pretendido podia ser alcançado através de proibições ou limitações menos graves ou susceptíveis de afectar menos o comércio intracomunitário, há que referir que pressupõe uma análise das circunstâncias de direito e de facto que caracterizam a situação do Estado-Membro em causa, que o órgão jurisdicional de reenvio está em melhores condições de efectuar do que o Tribunal de Justiça.

34.
    Assim, há que declarar que, relativamente à livre circulação de mercadorias, os artigos 30.° e 36.° do Tratado não se opõem a uma proibição dos anúncios publicitários a bebidas alcoólicas, como a constante do artigo 2.° do alkoholreklamlagen, salvo se se revelar que, nas circunstâncias de direito e de facto que caracterizam a situação no Estado-Membro em causa, a protecção da saúde pública contra os efeitos nefastos do álcool pode ser garantida através de medidas que afectem menos o comércio intracomunitário.

Quanto à livre prestação de serviços

35.
    Através das suas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, em segundo lugar, se as disposições do Tratado relativas à livre prestação de serviços se opõe a uma proibição dos anúncios publicitários a bebidas alcoólicas como a constante do artigo 2.° da alkoholreklamlagen.

36.
    O KO, a GIP, o Governo sueco e a Comissão estão de acordo quanto ao facto de a disponibilização de espaços publicitários poder constituir uma prestação de serviços transfronteiriça que integra o âmbito do artigo 59.° do Tratado. Os outros governosintervenientes entendem, pelo contrário, que o artigo 59.° não é aplicável no processo principal.

37.
    A este propósito, tal como o Tribunal de Justiça já por diversas vezes declarou, o direito à livre prestação de serviços pode ser invocado por uma empresa relativamente ao Estado em que está estabelecida, quando os serviços são prestados a destinatários estabelecidos noutro Estado-Membro (v., designadamente, acórdãos de 17 de Maio de 1994, Corsica Ferries, C-18/93, Colect., p. I-1783, n.° 30, e de 10 de Maio de 1995, Alpine Investments, C-384/93, Colect., p. I-1141, n.° 30).

38.
    É o que se passa, designadamente, quando, como no processo principal, a legislação de um Estado-Membro restringe o direito que as sociedades de imprensa estabelecidas no território desse Estado-Membro têm de oferecer aos anunciadores potenciais estabelecidos noutros Estados-Membros espaços publicitários nas suas publicações.

39.
    Com efeito, uma medida como a proibição da publicidade em causa no processo principal, ainda que destituída de natureza discriminatória, afecta especificamente a oferta transfronteiriça de espaços publicitários, atento o carácter internacional do mercado da publicidade na categoria dos produtos abrangidos pela proibição, e constitui, por esse motivo, uma restrição à livre prestação de serviços na acepção do artigo 59.° do Tratado (v., neste sentido, acórdão Alpine Investments, já referido, n.° 35).

40.
    Todavia, esta restrição pode justificar-se com base na protecção da saúde pública, que constitui um fundamento de interesse geral reconhecido pelo artigo 56.° do Tratado, aplicável em sede de livre prestação de serviços nos termos do artigo 66.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 55.° CE).

41.
    Tal como se referiu no n.° 33 do presente acórdão a propósito dos entraves à livre circulação de mercadorias, é ao órgão jurisdicional de reenvio que cabe apreciar se, nas circunstâncias de direito e de facto que caracterizam a situação no Estado-Membro em causa, a proibição da publicidade em causa no processo principal satisfaz a condição de proporcionalidade necessária para que se possa justificar a derrogação à livre prestação de serviços.

42.
    Assim, há que responder que, no que toca à livre prestação de serviços, os artigos 56.° e 59.° do Tratado não se opõem a uma proibição dos anúncios publicitários a bebidas alcoólicas, como a constante do artigo 2.° do alkoholreklamlagen, salvo se se revelar que, nas circunstâncias de direito e de facto que caracterizam a situação no Estado-Membro em causa, a protecção da saúde pública contra os efeitos nefastos do álcool pode ser garantida através de medidas que afectem menos o comércio intracomunitário.

Quanto às despesas

43.
    As despesas efectuadas pelos Governos sueco, francês, finlandês e norueguês, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Stockholms tingsrätt, por decisão de 18 de Setembro de 1998, declara:

Os artigos 30.° e 36.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 28.° CE e 30.° CE), por um lado, e 56.° e 59.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 46.° CE e 49.° CE), por outro, não se opõem a uma proibição dos anúncios publicitários a bebidas alcoólicas, como a constante do artigo 2.° da lagen (1978:763) med vissa bestämmelser om marknadsföring av alcoholdrycker (lei sueca que estabelece disposições sobre a comercialização de bebidas alcoólicas), alterada, salvo se se revelar que, nas circunstâncias de direito e de facto que caracterizam a situação no Estado-Membro em causa, a protecção da saúde pública contra os efeitos nefastos do álcool pode ser garantida através de medidas que afectem menos o comércio intracomunitário.

Gulmann
Skouris
Puissochet

            Schintgen                        Macken

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Março de 2001.

O secretário

O presidente da Sexta Secção

R. Grass

C. Gulmann


1: Língua do processo: sueco.