Language of document : ECLI:EU:C:2010:718

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 25 de Novembro de 2010 (1)

Processo C‑434/09

Shirley McCarthy

contra

Secretary of State for the Home Department

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Supreme Court (Reino Unido)]

«Cidadania da União – Direito dos cidadãos da União de circularem livremente e residirem no território dos Estados‑Membros – Dupla nacionalidade – Artigo 21.° TFUE – Directiva 2004/38/CE – Titular – Residência legal – Reagrupamento familiar – Discriminação dos nacionais»





I –    Introdução

1.        Uma pessoa que possua a nacionalidade de dois Estados‑Membros da UE, mas que tenha residido sempre apenas num destes dois Estados, pode invocar o direito da União perante este Estado para nele obter um direito de residência para si e, em particular, para o seu cônjuge? É esta, no essencial, a questão cujo esclarecimento é solicitado no presente caso ao Tribunal de Justiça.

2.        S. McCarthy é cidadã britânica e irlandesa, mas viveu sempre apenas em Inglaterra (2). Ela própria pode, naturalmente, residir em Inglaterra. No entanto, o mesmo não se aplica ao seu marido, de nacionalidade jamaicana: nos termos das disposições internas do Reino Unido relativas à imigração, o mesmo não tem o direito de residir em Inglaterra. Para tornar possível o reagrupamento familiar com o seu marido, S. McCarthy pretende agora, apoiada na sua nacionalidade irlandesa, obter para si um direito de residência em Inglaterra, na qualidade de cidadã da União; indirectamente, tal beneficiaria também o seu marido, que poderia depois invocar um direito derivado de residência por força do direito da União.

3.        Neste contexto, o Tribunal de Justiça deverá esclarecer como deve entender‑se o conceito de «titular» na acepção da Directiva 2004/38/CE (3). Além disso, pergunta‑se ao Tribunal de Justiça quais os requisitos a que obedece a «residência legal», que é o pressuposto de base para a aquisição de um direito de residência permanente na acepção da referida directiva.

II – Quadro jurídico

4.        Além do artigo 21.° TFUE, o quadro jurídico da União é, no presente caso, determinado pela Directiva 2004/38/CE. O seu âmbito de aplicação pessoal é definido no capítulo I («Disposições Gerais»), mais precisamente no artigo 3.° da directiva, sob a epígrafe «Titulares», da seguinte forma:

«1.      A presente directiva aplica‑se a todos os cidadãos da União que se desloquem ou residam num Estado‑Membro que não aquele de que são nacionais, bem como aos membros das suas famílias, na acepção do ponto 2) do artigo 2.°, que os acompanhem ou que a eles se reúnam.

[…]»

5.        No capítulo IV da Directiva 2004/38, o artigo 16.° estabelece regras gerais relativas à aquisição do direito de residência permanente:

«1.      Os cidadãos da União que tenham residido legalmente por um período de cinco anos consecutivos no território do Estado‑Membro de acolhimento, têm direito de residência permanente no mesmo. […]

[…]»

6.        Em complemento ao artigo 16.°, importa referir o décimo sétimo considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38:

«A possibilidade de residência permanente para os cidadãos da União que tiverem optado por se instalar de forma duradoura no Estado‑Membro de acolhimento reforçaria o sentimento de cidadania da União e constitui um elemento‑chave para promover a coesão social, que é um dos objectivos fundamentais da União. Por conseguinte, há que instituir o direito de residência permanente para todos os cidadãos da União e membros das suas famílias que tenham residido no Estado‑Membro de acolhimento de acordo com as condições estabelecidas na presente directiva durante um período de cinco anos consecutivos sem se tornarem passíveis de medida de afastamento.»

7.        Por último, entre as disposições finais do capítulo VII da Directiva 2004/38/CE, importa salientar o artigo 37.°, o qual, sob a epígrafe «Disposições nacionais mais favoráveis», estabelece o seguinte:

«As disposições da presente directiva não afectam disposições legislativas, regulamentares e administrativas de um Estado‑Membro que sejam mais favoráveis às pessoas abrangidas pela presente directiva.»

III – Matéria de facto e tramitação no processo principal

8.        Shirley McCarthy tem nacionalidade britânica por ter nascido no Reino Unido. Viveu sempre em Inglaterra, onde a sua residência foi sempre legal, nos termos do direito interno.

9.        S. McCarthy recebe prestações sociais em Inglaterra. Não alega ser ou ter sido trabalhadora assalariada, trabalhadora por sua conta própria ou pessoa economicamente independente na acepção do direito da União.

10.      Em 15 de Novembro de 2002, S. McCarthy casou com o cidadão jamaicano George McCarthy. G. McCarthy não é titular de um direito de residência no Reino Unido nos termos das disposições internas relativas à imigração, nem mesmo na qualidade de cônjuge de uma pessoa com residência permanente no Reino Unido (4).

11.      S. McCarthy tem também a nacionalidade irlandesa, para além da nacionalidade britânica. Depois do seu casamento, requereu – aliás, pela primeira vez – um passaporte irlandês. O seu pedido foi deferido devido ao facto de a sua mãe ter nascido na Irlanda.

12.      Em 23 de Julho de 2004, S. McCarthy requereu, na qualidade de cidadã da União, ao Secretary of State for the Home Department (5) uma autorização de residência nos termos do direito da União. G. McCarthy também apresentou um requerimento semelhante, na qualidade de cônjuge desta cidadã da União. Os dois requerimentos foram indeferidos em 6 de Dezembro de 2004, com o fundamento de que S. McCarthy não era uma pessoa que preenchesse os requisitos legais; a este grupo de pessoas pertencem essencialmente apenas trabalhadores assalariados, trabalhadores independentes e pessoas economicamente independentes. Por conseguinte, G. McCarthy também não podia ser considerado como cônjuge de uma pessoa que preenchesse os requisitos legais.

13.      Em 13 de Dezembro de 2004, S. McCarthy recorreu da decisão de indeferimento de 6 de Dezembro de 2004. Em 7 de Setembro de 2006, o seu recurso foi remetido para o Asylum and Immigration Tribunal (6).

14.      Apesar de G. McCarthy não ter interposto recurso da decisão de indeferimento de 6 de Dezembro de 2004 que lhe dizia respeito, apresentou, em 16 de Outubro de 2006, novo pedido de título de residência na qualidade de cônjuge de S. McCarthy. Este segundo pedido também foi indeferido por decisão de 20 de Abril de 2007, da qual G. McCarthy interpôs recurso, em 4 de Maio de 2007, para o Asylum and Immigration Tribunal.

15.      O Asylum and Immigration Tribunal suspendeu a instância no recurso interposto por G. McCarthy até à decisão final do recurso interposto por S. McCarthy.

16.      Em 17 de Outubro de 2006, um juiz singular do Asylum and Immigration Tribunal negou provimento ao recurso interposto por S. McCarthy. Contudo, em 13 de Fevereiro de 2007, a High Court of Justice (England and Wales) ordenou ao Tribunal a reapreciação do recurso de S. McCarthy. Subsequentemente, o Tribunal reapreciou este recurso, em 16 de Agosto de 2007, mas confirmou a sua decisão de lhe negar provimento. O recurso de S. McCarthy para a Court of Appeal of England and Wales (Civil Division) (7) também não teve sucesso; foi‑lhe negado provimento em 11 de Junho de 2008.

17.      Na sequência de mais um recurso de S. McCarthy, o processo principal corre agora perante a Supreme Court of the United Kingdom (anteriormente House of Lords), o órgão jurisdicional de reenvio (8).

IV – Pedido de decisão prejudicial e tramitação processual no Tribunal de Justiça

18.      Por ofício de 2 de Novembro de 2009, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 5 de Novembro de 2009, o órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais (9):

«1.      Uma pessoa com dupla nacionalidade, irlandesa e britânica, que tenha residido no Reino Unido durante toda a sua vida, é ‘titular’ na acepção do artigo 3.° da Directiva 2004/38/CE?

2.      Pode considerar‑se que essa pessoa «residiu legalmente no Estado‑Membro de acolhimento» para efeitos do artigo 16.° da Directiva 2004/38/CE, em circunstâncias em que não podia satisfazer os requisitos do artigo 7.° desta Directiva?»

19.      No processo no Tribunal de Justiça, apresentaram observações escritas S. McCarthy, a Dinamarca, a Irlanda, a Estónia, os Países Baixos e o Reino Unido, assim como a Comissão Europeia. Na audiência de 28 de Outubro de 2010, participaram S. McCarthy, a Dinamarca, a Irlanda e a Comissão.

V –    Apreciação

20.      À primeira vista, pode parecer estranho uma cidadã da União invocar o direito da União perante as autoridades do seu Estado‑Membro natal para nele obter para si um direito de residência. Isto porque não há dúvida que esta cidadã da União, por força da sua nacionalidade, já tem direito de residência no Estado a que pertence, o qual não pode ser limitado (10).

21.      Contudo, resulta de uma análise mais aprofundada que no presente caso também não está tanto em causa o direito pessoal de residência de S. McCarthy em Inglaterra, mas antes o direito de residência do seu cônjuge, nacional de um Estado terceiro, eventualmente transmitido pela sua pessoa. Trata‑se, pois, em última instância, de um reagrupamento familiar que se pretende seja alcançado pela via do direito da União, já que o direito nacional do Reino Unido não o autoriza (11). O mesmo foi também várias vezes referido na audiência no Tribunal de Justiça.

22.      No entanto, levanta‑se a questão de saber se o direito da União é materialmente aplicável ao presente caso, já que S. McCarthy nunca exerceu o seu direito de livre circulação, conforme este resulta dos artigos 21.°, n.° 1, TFUE, 45.° TFUE, 49.° TFUE e 56.° TFUE (12) e é reiterado nos artigos 15.°, n.° 2, e 45.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (13). O único elemento de conexão com o direito da União é aqui a qualidade de S. McCarthy de «cidadã com dupla nacionalidade», a qual, além da nacionalidade britânica, também tem a nacionalidade irlandesa.

23.      Enquanto S. McCarthy afirma que a sua dupla nacionalidade é um elemento de conexão suficiente com o direito da União, todos os Governos que intervieram no processo e também a Comissão defendem a opinião contrária.

A –    Conceito de «titular» na acepção da Directiva 2004/38/CE (primeira questão prejudicial)

24.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende ser esclarecido sobre a interpretação do conceito de «titular» na acepção do artigo 3.° da Directiva 2004/38/CE. No essencial, importa analisar se uma pessoa que seja nacional de dois Estados‑Membros da UE, mas que tenha residido sempre apenas num desses dois Estados, pode invocar a Directiva 2004/38/CE perante esse Estado para obter um direito de residência no território do mesmo para si e, indirectamente, também para o seu cônjuge.

25.      De acordo com a redacção do artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE deve responder‑se pela negativa a esta questão. Segundo o mesmo, são titulares na acepção da directiva todos os cidadãos da União que se desloquem ou residam num Estado‑Membro que não aquele de que são nacionais. A contrario sensu, pode concluir‑se a partir do artigo 3.°, n.° 1, que a Directiva 2004/38/CE não se aplica à relação entre um cidadão da União e ao Estado‑Membro de que o mesmo é nacional e no qual ele reside desde sempre.

26.      Esta interpretação é confirmada se se analisar o contexto normativo em que se insere o artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE e se se tiver em conta o objectivo desta directiva.

27.      A Directiva 2004/38/CE tem por objectivo facilitar aos cidadãos da União a livre circulação no território dos Estados‑Membros. Assim, a directiva refere o direito de livre circulação e o de residência em conjunto (14); tem por objectivo «simplificar e reforçar o direito de livre circulação e residência de todos os cidadãos da União» (15).

28.      Quanto ao contexto normativo do artigo 3.°, n.° 1, importa notar que várias disposições da Directiva 2004/38/CE mencionam a «entrada» (16) de um cidadão da União, a sua permanência «no território de outro Estado‑Membro» (17) ou no «Estado‑Membro de acolhimento» (18). Nesse sentido, entende‑se por Estado‑Membro de acolhimento, na acepção da Directiva, «o Estado‑Membro para onde se desloca o cidadão da União a fim de aí exercer o seu direito de livre circulação e residência» (19). Como é demonstrado por todas estas disposições, a Directiva 2004/38/CE rege a situação jurídica de um cidadão da União num Estado‑Membro no qual o mesmo se encontre no exercício do seu direito de livre circulação – eventualmente desde que nasceu (20) – e cuja nacionalidade não possui.

29.      É certo que isto não impede que a Directiva 2004/38/CE também seja aplicada ao Estado de origem de um cidadão da União quando exista uma conexão com o direito da União. Assim, é jurisprudência assente que um cidadão da União que tenha exercido o seu direito de livre circulação e pretenda regressar ao seu Estado‑Membro de origem pode invocar o direito da União perante este Estado (21). Aliás, o mesmo também se aplica no caso de um cidadão da União pretender sair do seu Estado‑Membro de origem para, no exercício dos direitos de livre circulação consagrados no direito da União, se deslocar para outro Estado‑Membro (22).

30.      Uma cidadã da União como S. McCarthy, que sempre residiu num Estado‑Membro do qual é nacional e nunca exerceu o seu direito de livre circulação garantido pelo direito da União, não é abrangida pela Directiva 2004/38/CE nem nos termos da redacção do artigo 3.°, n.° 1, nem de acordo com o objectivo e o contexto normativo da referida disposição. O mesmo se aplica aos membros da família de S. McCarthy (23), uma vez que os seus direitos de entrada e de permanência – bem como, em termos mais gerais, a possibilidade de reagrupamento familiar – não se baseiam num direito próprio de livre circulação, mas derivam do direito de livre circulação da cidadã da União e se destinam à realização do mesmo (24).

31.      Em meu entender, não resulta outra coisa do direito de livre circulação dos cidadãos da União consagrado no direito primário (artigo 21.°, n.° 1, TFUE e artigo 45.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais). Com efeito, é certo que as regras de direito derivado devem ser interpretadas e aplicadas em conformidade com o direito primário – por exemplo, com as liberdades fundamentais dos Tratados (25). Porém, do meu ponto de vista, a Directiva 2004/38/CE está em conformidade com as prescrições do direito primário. Mais especificamente, não sou da opinião de que os cidadãos da União também podem invocar um direito de permanência nos termos do artigo 21.°, n.° 1, TFUE perante o Estado‑Membro da sua nacionalidade na ausência –como no caso de S. McCarthy – de todo e qualquer elemento transfronteiriço (26).

32.      Resta analisar se a circunstância de S. McCarthy possuir a nacionalidade de dois Estados‑Membros da UE – a britânica e a irlandesa – pode alterar a conclusão a que se acaba de chegar.

33.      A este respeito, importa desde logo notar que não pode, à partida, ser recusada a uma cidadã da União na situação de S. McCarthy a invocação da segunda nacionalidade– neste caso, a irlandesa – apenas com fundamento na eventual falta de efectividade desta nacionalidade. Com efeito, tudo no presente caso aponta para que a nacionalidade britânica de S. McCarthy seja muito mais efectiva, já que viveu sempre em Inglaterra e só requereu o seu passaporte irlandês antes do seu pedido de título de residência da União Europeia. No entanto, como o Tribunal de Justiça sublinhou, «não cabe a um Estado‑Membro restringir os efeitos da atribuição da nacionalidade de outro Estado‑Membro, exigindo um requisito suplementar para o reconhecimento dessa nacionalidade com vista ao exercício das liberdades fundamentais previstas pelo Tratado» (27). Por conseguinte, segundo a jurisprudência, a existência de uma dupla nacionalidade pode, em princípio, assumir importância para a análise da situação jurídica de cidadãos da União em relação aos seus Estados‑Membros de origem (28).

34.      Assim, na determinação do apelido de um cidadão da União, a dupla nacionalidade pode tornar necessárias derrogações às normas que regulam o apelido de uma pessoa de um dos seus Estados‑Membros de origem (29). Isto porque o apelido é uma parte essencial da identidade de uma pessoa. Consequentemente, cada cidadão da União deve poder confiar que o seu apelido regularmente adoptado num Estado‑Membro é reconhecido em todos os outros Estados‑Membros (30). Se houvesse dúvidas sobre a identidade do cidadão da União por o seu apelido ser diferente ou ser escrito de forma diferente de um Estado‑Membro para outro, tal poderia causar sérios inconvenientes de ordem privada ou profissional ao interessado (31).

35.      Porém, aquilo que vale para sectores como o das normas que regulam o apelido de uma pessoa não se pode necessariamente transpor para o direito de residência em questão no presente processo e para a possibilidade de reagrupamento familiar relacionado com o mesmo. Está antes em causa saber se, neste contexto, a situação de um cidadão da União, tendo em conta a sua dupla nacionalidade, também se distingue de uma forma juridicamente relevante da situação de outros cidadãos da União que só possuem a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento.

36.      Os elementos que caracterizam situações e, deste modo, o seu carácter comparável devem ser determinados e apreciados à luz do objecto e da finalidade do acto comunitário que institui a distinção em causa. Além disso, devem ser tidos em consideração os princípios e objectivos do domínio em que se enquadra a disposição em questão (32).

37.      O direito de residência dos cidadãos da União e dos membros da sua família, em causa no presente processo, tem por objectivo facilitar a livre circulação dos cidadãos da União no território dos Estados‑Membros (33). A este respeito, não resultam nenhumas especificidades da dupla nacionalidade de uma cidadã da União na situação de S. McCarthy. Do ponto de vista do direito de residência, esta encontra‑se na mesma situação de todos os outros cidadãos britânicos que sempre viveram em Inglaterra e nunca saíram do seu país de origem: S. McCarthy não exerce o seu direito de livre circulação (34).

38.      A livre circulação de uma cidadã da União como S. McCarthy não é prejudicada (35), nem esta é discriminada em relação a outros cidadãos britânicos que se encontrem numa situação semelhante. A mera circunstância de esta possuir a nacionalidade irlandesa além da britânica não obriga a que a ela e aos membros da sua família sejam aplicadas as disposições da União relativas ao direito de entrada e de residência.

39.      Importa reconhecer que, deste modo, pode acontecer que um cidadão da União que tenha exercido o seu direito de livre circulação possa, por força do direito da União, invocar para os membros da sua família nacionais de países terceiros, regras mais favoráveis relativas ao direito de entrada e de residência do que um nacional do Estado‑Membro de acolhimento que tenha vivido sempre no território do mesmo (36). Este problema é em geral referido como discriminação dos nacionais ou discriminação inversa.

40.      Contudo, de acordo com jurisprudência assente, o direito da União não fornece nenhuma solução para este problema, pois a eventual diferença de tratamento de cidadãos da União no que respeita à entrada e permanência dos membros das respectivas famílias provenientes de Estados terceiros consoante estes cidadãos da União já tenham anteriormente exercido o seu direito de livre circulação não é abrangida pelo âmbito de aplicação do direito da União (37).

41.      Na doutrina tem sido até agora ponderado se, da cidadania da União, se pode inferir uma proibição da discriminação dos nacionais (38). A advogada‑geral E. Sharpston também tomou recentemente posição neste sentido (39). Contudo, como o Tribunal de Justiça declarou diversas vezes, a cidadania da União não tem por objectivo alargar o âmbito de aplicação material do Tratado a situações internas sem qualquer conexão com o direito da União (40).

42.      É certo que não é de excluir que o Tribunal de Justiça reconsidere em dada altura a sua jurisprudência e seja levado a deduzir da cidadania da União uma proibição de discriminação dos nacionais. Não obstante, o estatuto de cidadão da União tende a ser «o estatuto fundamental dos nacionais dos Estados‑Membros que permite aos que entre estes se encontrem na mesma situação obter, independentemente da sua nacionalidade e sem prejuízo das excepções expressamente previstas a este respeito, o mesmo tratamento jurídico» (41).

43.      Contudo, não me parece que o presente caso forneça o enquadramento adequado para proceder a uma análise aprofundada da problemática da discriminação dos nacionais. Com efeito, uma cidadã da União «estática» como S. McCarthy não sofre nenhuma discriminação em comparação com cidadãos da União «móveis» (42). Com efeito, mesmo que se ignorasse que S. McCarthy nunca exerceu o seu direito de livre circulação e se lhe permitisse em princípio invocar as disposições da Directiva 2004/38/CE, a mesma também não preencheria os restantes requisitos aplicáveis aos cidadãos da União para a aquisição de direitos de residência de longo prazo.

44.      S. McCarthy não tem emprego nem dispõe de recursos suficientes para si própria e para os membros da sua família; não é «economicamente independente» e recebe prestações sociais no Reino Unido (43). Por conseguinte, não preenche os requisitos materiais impostos pelo direito da União aos cidadãos da União que queiram residir no território do Estado de acolhimento por um período superior a três meses (44). Também não existem nenhuns indícios de que S. McCarthy tenha tido, no passado, uma actividade assalariada durante um período de cinco anos ininterruptos no Reino Unido ou de que disponha de recursos suficientes para si própria e para os membros da sua família, o que seria o pressuposto fundamental (45) para a aquisição de um direito de residência. Em consequência, S. McCarthy, mesmo na qualidade de cidadã «móvel» da União, não pode beneficiar de qualquer direito de residência com base no direito da União.

45.      Em suma, perante as considerações precedentes, mantenho a minha opinião de que deve ser dada resposta negativa à primeira questão prejudicial do órgão jurisdicional de reenvio. A mesma deve ser respondida no sentido de que uma cidadã da União que seja nacional de dois Estados‑Membros mas tenha sempre vivido apenas num desses dois Estados não pode beneficiar de um direito de residência nesse Estado nos termos da Directiva 2004/38/CE.

46.      Se o Tribunal de Justiça ponderar, no presente processo, fazer evoluir o estatuto de cidadão da União (46), considero adequado que se reabra a fase oral do processo. Isto porque, até agora, os intervenientes no processo, no presente caso, só a título muito marginal – perto do final da audiência – é que foram convidados a apresentar os seus argumentos relativamente a esta problemática. Em meu entender, ainda lhes deveria ser dada oportunidade para a abordarem de uma forma mais aprofundada. Nessa altura, seria também muito provável que outros Estados‑Membros fossem levados a apresentar alegações orais perante o Tribunal de Justiça.

B –    Conceito de «residência legal» na acepção do artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE (segunda questão prejudicial)

47.      Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende obter esclarecimentos acerca do conceito de «residência legal» na acepção do artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE (47). Essencialmente, trata‑se de esclarecer se este conceito também abrange a residência de uma cidadã da União que tenha vivido sempre apenas no Estado‑Membro de acolhimento, onde o seu direito de residência durante toda a sua permanência resultou exclusivamente da circunstância de a mesma possuir precisamente a nacionalidade daquele Estado.

48.      Esta questão está, logicamente, subordinada à primeira. Se, como proponho, for dada resposta negativa à primeira questão prejudicial (48), a cidadã da União nem sequer é abrangida pelo âmbito de aplicação da Directiva 2004/38/CE e a segunda questão não tem de ser respondida. Neste sentido, pronuncio‑me a seguir sobre a segunda questão apenas a título subsidiário.

49.      O conceito de residência legal que o artigo 16.°, n.° 1, consagra como requisito para a aquisição de um direito de residência permanente não é definido de forma precisa na Directiva 2004/38/CE.

50.      Em meu entender, no acórdão Lassal, recentemente proferido, o Tribunal de Justiça, também não resolveu definitivamente este problema, mas limitou‑se a esclarecer que devem ser tidos em conta os períodos de residência «decorridos [...] em conformidade com instrumentos de direito da União anteriores [...]» (49). Tal não impede de modo algum que outros períodos de residência decorridos exclusivamente em conformidade com o direito nacional relativo a estrangeiros também sejam tidos em conta.

51.      Com efeito, o preâmbulo da Directiva 2004/38/CE indica que residência legal significa, em primeira linha, uma residência «de acordo com as condições estabelecidas na presente directiva», ou seja, uma residência a que o interessado tinha direito nos termos do direito da União (50). Porém, tendo em conta o contexto e as finalidades prosseguidas pela Directiva 2004/38/CE, as suas disposições não podem ser interpretadas de modo restritivo (51).

52.      Com o direito de residência permanente nos termos do artigo 16.° da Directiva 2004/38/CE, o legislador da União pretendeu contribuir «para promover a coesão social, que é um dos objectivos fundamentais da União» (52) e para criar «um verdadeiro instrumento de integração na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento» (53). Corresponde a esta finalidade alargar o círculo das pessoas com direito de residência permanente também aos cidadãos da União cuja autorização de residência no Estado‑Membro de acolhimento resulta exclusivamente do seu direito interno relativo a estrangeiros (54); com efeito, para apreciar o grau de integração de um cidadão da União no Estado‑Membro de acolhimento é secundário saber de onde provém o seu direito de residência.

53.      O artigo 37.° da Directiva 2004/38/CE, segundo o qual as disposições legislativas, regulamentares e administrativas de um Estado‑Membro que sejam mais favoráveis não são expressamente afectadas, mostra que pode haver casos em que um direito de residência resulte apenas do direito nacional do Estado‑Membro de acolhimento relativo a estrangeiros. Também se conhecem casos na jurisprudência em que a permanência de cidadãos da União no respectivo Estado‑Membro de acolhimento não podia basear‑se no direito da União, mas apenas no direito interno relativo a estrangeiros (55). O Tribunal de Justiça não considerou de modo algum tal residência irrelevante, antes pelo contrário, dela extraiu conclusões ao nível do direito da União (56).

54.      No entanto, pode entender‑se por residência legal na acepção do artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE apenas uma residência que se baseie em disposições do direito dos estrangeiros, mas não uma residência cuja legalidade resulta da mera circunstância de o interessado ser nacional do Estado‑Membro de acolhimento. Isto porque a Directiva 2004/38/CE tem por objectivo, conforme já foi referido (57), realizar e facilitar a livre circulação aos cidadãos da União. Não tem por finalidade promover a integração na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento de nacionais deste Estado que nunca fizeram uso do seu direito de livre circulação.

55.      Entre um direito de residência que tem origem no direito relativo aos estrangeiros e um direito de residência decorrente da circunstância de o interessado ter a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento, existem diferenças qualitativas fundamentais. Com efeito, enquanto os Estados‑Membros não podem de modo algum limitar o direito de residência dos seus próprios nacionais nos termos dos princípios de direito internacional (58), podem autorizar a permanência de estrangeiros no seu território apenas mediante determinadas condições. O mesmo também se aplica à residência de cidadãos da União provenientes de outros Estados‑Membros, devendo naturalmente ser respeitados os limites estabelecidos pelo direito da União (59).

56.      Se se autorizasse uma cidadã da União na situação de S. McCarthy, que nunca exerceu o seu direito de livre circulação, a invocar a Directiva 2004/38/CE, tal poderia, em última instância, conduzir a um direito «à la carte» (60): a cidadã da União poderia então beneficiar das vantagens da Directiva 2004/38/CE no que diz respeito ao reagrupamento familiar com o seu cônjuge sem observar as finalidades da directiva – realização e facilitação da livre circulação – e sem preencher nenhum dos requisitos da directiva – por exemplo, o da independência financeira exigida pelo artigo 7.°, n.° 1, da directiva. Como vários Governos intervenientes no processo salientaram com razão, tal não é compatível com o espírito e a finalidade das disposições do direito da União relativas à livre circulação e ao direito de residência.

57.      Por conseguinte, deve responder‑se do seguinte modo à segunda questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio:

A legalidade da residência, que, nos termos do artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE é um requisito para a aquisição de um direito de residência permanente, pode resultar do direito da União ou do direito interno do Estado‑Membro de acolhimento relativo aos estrangeiros.

No entanto, se um cidadão da União for nacional do Estado‑Membro de acolhimento e se sempre aí tiver vivido apenas com base na sua nacionalidade, sem ter exercido o seu direito de livre circulação, não se trata de «residência legal» na acepção do artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE.

C –    Observações finais

58.      De acordo com a solução que proponho, uma cidadã da União na situação de S. McCarthy não pode invocar o direito da União para obter para si e para os membros da sua família um direito de residência no Estado‑Membro em que sempre viveu e de que é nacional.

59.      Porém, conforme o Tribunal de Justiça já indicou no processo Metock (61), todos os Estados‑Membros são partes contratantes da CEDH (62). Apesar de a CEDH não garantir qualquer direito de um estrangeiro, enquanto tal, entrar num determinado país ou de nele permanecer, o facto de ser recusada a uma pessoa a entrada ou a permanência num país onde vivem os seus familiares próximos pode constituir uma violação do direito ao respeito pela vida familiar previsto no artigo 8.°, n.° 1, da CEDH (63).

60.      Nestas circunstâncias, não é inteiramente de excluir a possibilidade de o Reino Unido, por força da sua própria qualidade de membro da CEDH, ser obrigado a atribuir um direito de residência a G. McCarthy, na qualidade de cônjuge de uma cidadã britânica que vive em Inglaterra. Contudo, esta não é uma questão de direito da União, mas apenas uma questão relativa ao vínculo do Reino Unido à CEDH, cuja apreciação compete exclusivamente aos órgãos jurisdicionais nacionais e eventualmente ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

VI – Conclusão

61.      Atentas as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda ao pedido de decisão prejudicial nos seguintes termos

«Uma cidadã da União que seja nacional de dois Estados‑Membros da UE, mas que tenha sempre vivido apenas num desses dois Estados, não pode invocar qualquer direito de residência neste Estado nos termos da Directiva 2004/38/CE.»


1 – Língua original: alemão.


2 – Com as expressões «nacionalidade britânica» e residência «em Inglaterra» estou aqui, e a seguir, a orientar‑me pelas formulações com o mesmo teor constantes do pedido de decisão prejudicial.


3 – Directiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.° 1612/68 e que revoga as Directivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO L 158, p. 77, rectificada no JO 2004, L 229, p. 35, e no JO 2007, L 204, p. 28).


4 – De acordo com as informações prestadas pelo mandatário de S. McCarthy na audiência no Tribunal de Justiça, tal deve‑se ao facto de G. McCarthy ter viajado inicialmente para o Reino Unido como «visitor» (visitante).


5 – Ministro da Administração Interna do Reino Unido.


6 – Tribunal do Asilo e da Imigração.


7 – Tribunal de recurso da Inglaterra e do País de Gales (secção cível).


8 – O recurso no processo principal foi admitido em 13 de Novembro de 2008, ainda pela House of Lords. Porém, por força de uma lei de 2005 de reforma constitucional (Constitutional Reform Act 2005), as competências da House of Lords, na qualidade de órgão jurisdicional, foram transferidas, em Outubro de 2009, para a Supreme Court of the United Kingdom (Supremo Tribunal do Reino Unido), recentemente criada.


9 – Estas questões ainda foram formuladas pela House of Lords. No entanto, já foram transmitidas pelo Registrar of the Supreme Court of the United Kingdom (Secretário do Supremo Tribunal do Reino Unido). O facto de o pedido de decisão prejudicial ter o título de «Draft Reference» (minuta de pedido de decisão prejudicial) não prejudica a sua admissibilidade. Com efeito, conforme resulta do ofício anexo de 2 de Novembro de 2009, o pedido de decisão prejudicial foi oficialmente submetido ao Tribunal de Justiça pela Supreme Court.


10 – Como declarou o Tribunal de Justiça no acórdão de 4 de Dezembro de 1974, van Duyn (41/74, Colect., p. 567, n.° 22), um princípio de direito internacional opõe‑se a que «um Estado recus[e] aos seus próprios nacionais o direito de entrada ou de residência»; v. também acórdãos de 7 de Julho de 1992, Singh (C‑370/90, Colect., p. I‑4265, n.° 22), e de 11 de Dezembro de 2007, Eind (C‑291/05, Colect., p. I‑10719, n.° 31), e o artigo 3.° do Protocolo n.° 4 da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, aberto à assinatura em 16 de Setembro de 1963, em Estrasburgo, e que entrou em vigor em 2 de Maio de 1968 (ETS n.° 46).


11 – É por esse motivo que também foi suspensa a instância no recurso de G. McCarthy relativo ao seu direito de residência (v. supra, n.° 15 destas conclusões).


12 – Anteriores artigos 18.°, n.° 1, CE, 39.° CE, 43.° CE e 49.° CE.


13 – A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia foi inicialmente proclamada solenemente em 7 de Dezembro de 2000 em Nice (JO 2000, C 364, p. 1) e depois novamente em 12 de Dezembro de 2007 em Estrasburgo (JO 2007, C 303, p. 1).


14 – Artigo 1.°, alínea a), artigo 3.°, n.° 2, e artigo 5.°, n.° 4 e ainda o terceiro e o vigésimo segundo considerandos do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE.


15 – Terceiro considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE; o título da Directiva 2004/38/CE e o quinto considerando do seu preâmbulo, onde é mencionado o direito dos cidadãos da União de «circularem e residirem livremente no território dos Estados‑Membros» são semelhantes. V. também acórdão de 25 de Julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, Colect., p. I‑6241, n.° 59), acórdãos de 23 de Fevereiro de 2010, Ibrahim (C‑310/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 49) e Teixeira (C‑480/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 60), e acórdão de 7 de Outubro de 2010, Lassal (C‑162/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 30).


16 – V., por exemplo, artigos 3.°, n.° 2, 5.°, 8.°, n.° 2, 15.°, n.° 2, 27.°, n.° 3, 29.°, n.os 2 e 3, 31.°, n.° 4 e o sexto e o vigésimo segundo considerandos do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE.


17 – Artigos 6.°, n.° 1, e 7.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE; o décimo primeiro considerando desta directiva, onde é mencionado o «direito fundamental e individual de residir num outro Estado‑Membro», é semelhante.


18 – Artigos 2.°, 3.°, n.° 2, 5.°, n.° 3, 7.°, 8.°, 14.° a 18.°, 22.°, 24.°, 28.°, 29.°, 31.° e 33.°, bem como os quinto, sexto, nono, décimo, décimo quinto, décimo sexto, décimo sétimo, décimo oitavo, décimo nono, vigésimo primeiro, vigésimo terceiro e vigésimo quarto considerandos do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE.


19 – Artigo 2.°, n.° 3 da Directiva 2004/38/CE.


20 – V. artigo 3.°, n.° 1, e vigésimo quarto considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE; no mesmo sentido, acórdãos de 19 de Outubro de 2004, Zhu e Chen (C‑200/02, Colect., p. I‑9925, n.° 19) e Teixeira (já referido na nota 15, n.° 45).


21 – Acórdãos Singh (já referido na nota 10, n.os 19 e 23) e Eind (já referido na nota 10, n.os 32 a 36), assim como acórdão de 11 de Julho de 2002, Carpenter (C‑60/00, Colect., p. I‑6279, em particular n.° 46).


22 – Acórdão de 10 de Julho de 2008, Jipa (C‑33/07, Colect., p. I‑5157, em particular n.os 17 e 18).


23 – Neste sentido, desde logo, acórdão de 27 de Outubro de 1982, Morson e Jhanjan (35/82 e 36/82, Recueil, p. 3723, n.os 11 a 18).


24 – Neste sentido, acórdão Eind (já referido na nota 10, n.° 23).


25 – V., por exemplo, acórdãos de 26 de Junho de 2007, Ordre des barreaux francophones e germanophone e o. (C‑305/05, Colect., p. I‑5305, n.° 28), e de 19 de Novembro de 2009, Sturgeon e o. (C‑402/07 e C‑432/07, Colect., p. I‑10923, n.° 48).


26 – A advogada‑geral E. Sharpston defendeu uma opinião contrária nas suas conclusões de 30 de Setembro de 2010 no processo Ruiz Zambrano (C‑34/09, ainda não publicado na Colectânea, em particular n.os 91 a 97 e n.° 122, primeiro período).


27 – Acórdãos de 7 de Julho de 1992, Micheletti e o. (C‑369/90, Colect., p. I‑4239, n.° 10), de 2 de Outubro de 2003, Garcia Avello (C‑148/02, Colect., p. I‑11613, n.° 28), e Zhu e Chen (já referido na nota 20, n.° 39).


28 – Acórdão Garcia Avello (já referido na nota 27, em particular n.os 32 a 37). O acórdão Micheletti e o. (já referido na nota 27) aponta também para a relevância da dupla nacionalidade no direito da União, mas perante um Estado‑Membro cuja nacionalidade o cidadão da União em causa não possui.


29 – Acórdão Garcia Avello (já referido na nota 27, em particular n.os 36, 37 e 45).


30 – Neste sentido, acórdão de 14 de Outubro de 2008, Grunkin e Paul (C‑353/06, Colect., p. I7639, em particular n.os 23 e 31).


31 – Acórdãos Garcia Avello (já referido na nota 27, n.° 36) e Grunkin‑Paul (já referido na nota 30, n.os 23 a 28 e 32); no mesmo sentido se pronunciou já o acórdão de 30 de Março de 1993, Konstantinidis (C‑168/91, Colect., p. I‑1191, n.° 16).


32– Acórdão de 16 de Dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o. (C‑127/07, Colect., p. I‑9895, n.° 26).


33 – Acórdão Metock e o. (já referido na nota 15, n.° 82); v., também, supra, n.° 27 das presentes conclusões


34 – Nisto se distingue o presente caso do do processo Zhu e Chen (acórdão já referido na nota 20), no qual a cidadã da União Catherine Zhu não possuía a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento, mas apenas a de outro Estado‑Membro, pelo que vivia no Estado‑Membro de acolhimento, desde que nasceu, no exercício do seu direito de livre circulação nos termos do artigo 21.°, n.° 1, TFUE (anterior artigo 18.°, n.° 1, CE). O presente caso também se distingue do do processo Eind (acórdão já referido na nota 10), no qual o cidadão da União em causa possuía a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento (Países Baixos), mas regressou ao mesmo após o exercício do seu direito de livre circulação.


35 – Conforme salienta com razão a Irlanda, nada impede S. McCarthy de se estabelecer noutro Estado‑Membro, no exercício do seu direito de livre circulação, por exemplo, na Irlanda, onde o seu cônjuge também a pode acompanhar como membro da sua família.


36 – V. a este respeito acórdão Metock e o. (já referido na nota 15, n.° 76 a 78).


37 – Acórdão Metock e o. (já referido na nota 15, n.os 77 e 78); no mesmo sentido, jurisprudência assente relativa às liberdades fundamentais dos Tratados, v., por exemplo, acórdão de 1 de Abril de 2008, Gouvernement de la Communauté française e Gouvernement wallon (C‑212/06, Colect., p. I‑1683, n.° 33).


38 – Borchardt, K.‑D., «Der sozialrechtliche Gehalt der Unionsbürgerschaft», Neue Juristische Wochenschrift, 2000, p. 2057 (2059); Edward, D., «Unionsbürgerschaft – Mythos, Hoffnung oder Realität?», in: «Grundrechte in Europa» – Münsterische Juristische Vorträge, Münster, 2002, p. 35 (41); Edward, D., «European Citizenship – Myth, Hope or Reality?», in: «Problèmes d’interprétation» – à la mémoire de Constantinos N. Kakouris, Atenas/Bruxelas, 2004, p. 123 (131‑133); Spaventa, E., «Seeing the Wood despite the Trees? On the Scope of Union Citizenship and its Constitutional Effects», Common Market Law Review 45 (2008), p. 13 (em particular 30 a 39).


39 – Conclusões no processo Ruiz Zambrano (já referido na nota 26, em particular n.os 139 a 150).


40 – Acórdãos de 5 de Junho de 1997, Uecker e Jacquet (C‑64/96 e C‑65/96, Colect., p. I‑3171, n.° 23); Garcia Avello (já referido na nota 27, n.° 26); de 12 de Julho de 2005, Schempp (C‑403/03, Colect., p. I‑6421, n.° 20); Gouvernement de la Communauté française e Gouvernement wallon (já referido na nota 37, n.° 39), e de 22 de Maio de 2008, Nerkowska (C‑499/06, Colect., p. I‑3993, n.° 25).


41 – Acórdãos de 20 de Setembro de 2001, Grzelczyk (C‑184/99, Colect., p. I‑6193, n.° 31) e de 16 de Dezembro de 2008, Huber (C‑524/06, Colect., p. I‑9705, n.° 69); em termos semelhantes, acórdão de 12 de Setembro de 2006, Eman e Sevinger (C‑300/04, Colect., p. I‑8055, em particular n.os 57, 58 e 61). Quanto ao estatuto de cidadão da União como «estatuto fundamental», ver ainda os acórdãos de 17 de Setembro de 2002, Baumbast e R (C‑413/99, Colect., p. I‑7091, n.° 82), Garcia Avello (já referido na nota 27, n.° 22) e de 2 de Março de 2010, Rottmann (C‑135/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 43).


42 – Neste sentido, também as conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Ruiz Zambrano (já referido na nota 26, n.° 146), segundo as quais as situações de cidadãos da União «estáticos» e «móveis» devem ser semelhantes.


43 – V. supra (n.° 9 destas conclusões).


44 – Artigo 7.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE.


45 – Artigo 16.°, n.° 1, da Directiva 2004/38/CE; v. a este respeito, em concreto, as minhas considerações relativamente à segunda questão prejudicial (n.os 47 a 57 destas conclusões).


46 – Neste sentido, conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Ruiz Zambrano (já referido na nota 26).


47 – Os processos apensos Dias (C‑325/09), Ziolkowski (C‑424/10) e Szeja (C‑425/10) também colocam várias questões relativas à interpretação do artigo 16.° da Directiva 2004/38/CE e, em particular, ao conceito da «residência legal». Contudo, as mesmas não dizem aparentemente respeito ao caso de um cidadão da União que possui a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento.


48 – V. supra (em particular n.os 25 e 45 destas conclusões).


49 – Acórdão Lassal (já referido na nota 15, n.° 40)


50 – Décimo sétimo considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE.


51 – Acórdãos Metock (já referido na nota 15, n.os 84 e 93) e Lassal (já referido na nota 15, n.° 31).


52 – Décimo sétimo considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE.


53 – Décimo oitavo considerando do preâmbulo da Directiva 2004/38/CE; v. igualmente acórdão Lassal (já referido na nota 15, n.° 32; quanto à ideia de integração, v. também n.° 37).


54 – V. neste sentido, desde logo, as minhas conclusões de 20 de Outubro de 2009 no processo Teixeira (já referido na nota 15, n.° 119); a advogada‑geral V. Trstenjak parece ter outro entendimento (conclusões de 11 de Maio de 2010 no processo Lassal, já referido na nota 15, n.° 88, último período).


55 – Acórdão de 7 de Setembro de 2004, Trojani (C‑456/02, Colect., p. I‑7573, em particular n.os 36 e 37); em termos semelhantes, acórdão de 12 de Maio de 1998, Martínez Sala (C‑85/96, Colect., p. I‑2691, em particular n.os 14 e 15 e os n.os 60 e 61), no entanto, neste último caso, parece antes tratar‑se de uma tolerância de facto da permanência da cidadã da União.


56 – Acórdãos Martínez Sala (n.os 64 e 65) e Trojani (n.° 39), já referidos na nota 55.


57 – V. as minhas considerações a respeito da primeira questão prejudicial (em particular n.os 27 e 28 destas conclusões).


58 – V. supra (n.° 20 e nota 10 das presentes conclusões).


59 – V. em particular artigos 7.°, 8.° e 27.° a 33.° da Directiva 2004/38/CE.


60 – No mesmo sentido apontam as expressões, empregues pela Irlanda na audiência no Tribunal de Justiça, «à la carte approach» e «the best of both worlds».


61 – Acórdão já referido na nota 15, n.° 79.


62 – Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950 (ETS n.° 5).


63 – V., por exemplo, TEDH, acórdãos Moustaquim e Bélgica de 18 de Fevereiro de 1991 (série A, n.° 193, p. 18, § 36), Boultif c. Suíça de 2 de Agosto de 2001 (Recueil des arrêts et décisions, 2001‑IX, § 39), e Radovanovic c. Áustria de 22 de Abril de 2004 (queixa n.° 42703/98, § 30). O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, por seu turno, reconheceu, no que se refere à União Europeia, que o direito a viver com os familiares próximos «cria obrigações para os Estados‑Membros, que podem ser negativas, quando são obrigados a não expulsar uma pessoa, ou positivas, quando são obrigados a permitir que uma pessoa entre e resida no seu território» (acórdão de 27 de Junho de 2006, Parlamento/Conselho, «Reagrupamento familiar», C‑540/03, Colect., p. I‑5769, n.° 52).