Language of document : ECLI:EU:C:2007:361

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

M. POIARES MADURO

apresentadas em 21 de Junho de 2007 1(1)

Processo C‑273/04

República da Polónia

contra

Conselho da União Europeia

«Política agrícola comum – Reforma – Alargamento da União Europeia»





1.        A petição apresentada no Tribunal de Justiça constitui o primeiro recurso directo interposto pela República da Polónia. Suscita diversas questões jurídicas inéditas de relevância, que justificam a sua apreciação pela Grande Secção. Inserindo‑se no prolongamento das difíceis negociações de adesão dedicadas à parte agrícola e da reforma da política agrícola comum (a seguir «PAC»), convida o Tribunal de Justiça a precisar o alcance do poder de adaptação das disposições dos acordos de adesão de que gozam as instituições comunitárias. Deve igualmente levar o Tribunal de Justiça a determinar o alcance da protecção jurisdicional de que beneficiam os futuros Estados‑Membros contra os actos adoptados entre a assinatura e a entrada em vigor dos instrumentos de adesão.

I –    Quadro jurídico e matéria de facto do recurso

2.        O presente recurso tem por objecto a anulação do artigo 1.°, n.° 5, da Decisão 2004/281/CE do Conselho, de 22 de Março de 2004, que, na sequência da reforma da política agrícola comum, adapta o Acto relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (2).

3.        A decisão controvertida foi adoptada de acordo com o artigo 2.°, n.° 3, do Tratado entre o Reino da Bélgica, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha, a República Helénica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a Irlanda, a República Italiana, o Grão‑Ducado do Luxemburgo, o Reino dos Países Baixos, a República da Áustria, a República Portuguesa, a República da Finlândia, o Reino da Suécia, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte (Estados‑Membros da União Europeia) e a República Checa, a República da Estónia, a República de Chipre, a República da Letónia, a República da Lituânia, a República da Hungria, a República de Malta, a República da Polónia, a República da Eslovénia, a República Eslovaca relativo à adesão à União Europeia da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca (3), que dispõe que, «[s]em prejuízo do disposto no n.° 2, as Instituições da União podem adoptar antes da adesão as medidas previstas […] nos artigos 21.° e 23.° […]. Essas medidas só entram em vigor sob reserva e à data da entrada em vigor do presente Tratado». Foi adoptada com base no artigo 23.° do Acto relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (4), segundo o qual «[o] Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão e após consulta ao Parlamento Europeu, pode proceder às adaptações das disposições constantes do presente Acto relativas à [PAC] que se revelem necessárias em consequência de alterações da regulamentação comunitária. Essas adaptações devem ser efectuadas antes da data da adesão».

4.        A recorrente queixa‑se de que o artigo 1.°, n.° 5, da decisão controvertida (a seguir «disposição impugnada») estendeu o mecanismo dos pagamentos directos de acordo com um calendário (também designado por mecanismo de «phasing in»), nos novos Estados‑Membros, aos novos pagamentos directos, ampliando assim as derrogações do princípio do pagamento integral. Esta extensão do sistema dos pagamentos parciais conduz a uma diminuição considerável dos pagamentos aos agricultores polacos comparativamente com a hipótese do pagamento do montante integral.

5.        Esta petição não é mais do que a manifestação contenciosa de uma contestação do mecanismo dos pagamentos directos de acordo com um calendário, expressa pela República da Polónia desde as negociações de adesão. Durante as mesmas, este Estado reclamou por várias vezes que fosse integralmente garantido à agricultura polaca o acesso aos pagamentos directos a partir da data de adesão. Em vão. Num documento de reflexão de 30 de Janeiro de 2002 (5), a Comissão tinha preconizado a introdução progressiva dos pagamentos directos nos novos Estados‑Membros ao longo de um período transitório, por diversas razões ligadas essencialmente à necessidade de prosseguir a reestruturação em curso no sector agrícola desses Estados, à situação do rendimento dos agricultores, bem como à exigência de evitar desequilíbrios relativamente a outros sectores económicos ou a criação de situações de rendimentos especulativos. Seguindo essa recomendação, a posição dos quinze Estados‑Membros relativamente à República da Polónia durante as negociações de adesão, adoptada numa posição comum da União Europeia com data de 31 de Outubro de 2002 (6), foi a de não aceder ao pedido da Polónia de que os pagamentos directos fossem concedidos aos seus agricultores após a adesão, na mesma medida em que são concedidos aos agricultores da União, e de introduzir progressivamente os referidos pagamentos na Polónia durante um período transitório. As discussões sobre esta questão continuaram até à conferência de adesão que se realizou à margem do Conselho Europeu de Copenhaga de 12 e 13 de Dezembro de 2002, cujas conclusões indicam que a questão da introdução progressiva dos pagamentos directos nos novos Estados‑Membros foi resolvida segundo os termos estabelecidos na posição comum de 31 de Outubro de 2002. Quando, a seguir à reforma da PAC, realizada após a assinatura do tratado de adesão, a Comissão apresentou, em 27 de Outubro de 2003, a proposta da decisão controvertida, o Governo polaco não pôde, não obstante a oposição expressa em todas as etapas do processo legislativo, impedir a adopção da mesma.

6.        Para uma boa compreensão da importância jurídica do litígio, há que recordar brevemente o quadro legislativo em que se insere.

7.        Os pagamentos directamente concedidos aos agricultores no âmbito dos regimes de apoio ao seu rendimento tinham sido inicialmente regulamentados pelo Regulamento (CE) n.° 1259/1999 do Conselho, de 17 de Maio de 1999, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum (7), figurando a lista desses regimes de ajudas directas no anexo desse regulamento. Em conformidade com o artigo 20.° do acto de adesão que dispõe que «[o]s actos enumerados no Anexo II do presente Acto devem ser adaptados nos termos desse anexo», o mecanismo dos pagamentos directos de acordo com um calendário nos novos Estados‑Membros foi previsto no Anexo II, capítulo 6, A, ponto 27, do referido acto, que inseriu o artigo 1.°‑A no Regulamento n.° 1259/1999. Nos termos desse artigo 1.°‑A, o mecanismo dos pagamentos directos de acordo com um calendário visa os pagamentos directos «ao abrigo dos regimes de apoio referidos no artigo 1.°». O artigo 1.° do Regulamento n.° 1259/1999, por seu turno, dá uma definição desses pagamentos directos e, para uma enumeração destes, remete para o anexo do referido regulamento (8).

8.        Por conseguinte, em 29 de Setembro de 2003, o Conselho, através do Regulamento (CE) n.° 1782/2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001 (9), revogou o Regulamento n.° 1259/1999 a partir de 1 de Maio de 2004. Resulta do seu artigo 1.° e do seu Anexo I que o referido Regulamento n.° 1782/2003 acrescenta, aos dois já existentes, regimes de apoio directo aos agricultores que produzem frutos de casca rija e culturas energéticas e prevê pagamentos suplementares no âmbito do regime de apoio directo ao sector leiteiro.

9.        Através da decisão controvertida, o Conselho, no seu artigo 1.°, ponto 5), substituiu as disposições que alteravam o Regulamento n.° 1259/1999, que figuravam no Anexo II, capítulo 6, A, ponto 27, do acto de adesão, por disposições que alteram o Regulamento n.° 1782/2003, a fim de ter em conta adaptações introduzidas na PAC pela adopção deste regulamento, que ocorreu após a assinatura dos instrumentos de adesão. A partir de então, o referido ponto 27 passa a incluir um artigo 143.°‑A no Regulamento n.° 1782/2003, o qual prevê a introdução, nos novos Estados‑Membros, de «pagamentos directos» de acordo com um calendário, ou seja, não apenas de pagamentos que já figuravam no Anexo I desse regulamento mas também dos que serão ulteriormente inseridos no referido anexo.

10.      Segundo a República da Polónia, a disposição impugnada estende de forma ilegal o sistema dos pagamentos parciais. Este já não se aplica unicamente aos instrumentos de apoio que estavam taxativamente enumerados no anexo do Regulamento n.° 1259/1999. A partir de então, passa a dizer respeito, de maneira geral, aos «pagamentos directos», ou seja, igualmente aos novos pagamentos directos. Estes englobam os que foram instituídos pelo Regulamento n.° 1782/2003, a saber, os pagamentos nos sectores dos frutos de casca rija e das culturas energéticas e os pagamentos suplementares no sector do leite. Englobam igualmente os pagamentos directos que serão ulteriormente instituídos e, consequentemente, inseridos no Anexo I do Regulamento n.° 1782/2003.

11.      Foi por esta razão que a recorrente interpôs o presente recurso de anulação, que apoia essencialmente em três fundamentos. Mas, antes de abordar os fundamentos do pedido, deve, em primeiro lugar, apreciar‑se a sua admissibilidade.

II – Quanto à admissibilidade

12.      Neste processo, o Conselho suscitou, em 23 de Setembro de 2004, uma questão prévia de inadmissibilidade da petição, com base no artigo 91.° do Regulamento de Processo, argumentando que esta era manifestamente inadmissível por ser intempestiva. O Tribunal de Justiça decidiu reservar para final a decisão sobre esta questão.

13.      A admissibilidade do recurso interposto pela República da Polónia é incontestavelmente problemática. Se se seguir a jurisprudência do Tribunal de Justiça que, normalmente, é particularmente cuidadosa no que se refere ao respeito dos prazos processuais e, mais amplamente, das condições de admissibilidade, a caducidade parece impor‑se. É o que recordarei em primeiro lugar. Mas os princípios que estão na base da ordem jurídica da União, em particular o princípio da protecção jurisdicional efectiva e o alcance que a jurisprudência lhe foi progressivamente reconhecendo, devem, no meu entender, in fine, impor uma outra solução. Em segundo lugar, farei uma exposição das vias possíveis de aceitação da admissibilidade da petição.

A –    Interpretação estrita das condições de admissibilidade

1.      Contagem do prazo de recurso

14.      A decisão controvertida foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 30 de Março de 2004. A República da Polónia apresentou o seu recurso em 28 de Junho de 2004. Ora, nos termos do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE, os recursos «devem ser interpostos no prazo de dois meses a contar […] da publicação do acto […] ou, na falta desta, do dia em que o recorrente tenha tomado conhecimento do acto». Assim, por força das regras tradicionais de contagem dos prazos, o direito de a recorrente interpor o recurso caducou.

15.      Conforme resulta do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE e é confirmado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (10), o critério da data de tomada de conhecimento do acto apresenta um carácter subsidiário relativamente ao da data de publicação. A data a ter em conta para a determinação do ponto de partida do prazo de recurso é, assim, a do dia da publicação do acto, mesmo que, no presente caso, a recorrente tenha tido conhecimento do conteúdo da decisão controvertida antes da data de publicação da mesma, como revela o facto de ela se lhe ter oposto em todas as etapas do processo legislativo que terminou com a adopção da referida decisão através do envio de numerosas comunicações e observações ao Conselho e à Comissão.

16.      Ora, a decisão controvertida foi publicada no JO L 93, de 30 de Março de 2004. E existe uma presunção de que a data de publicação corresponde à data que figura em cada número do Jornal Oficial (11).

17.      Contudo, no presente caso, a recorrente sustentou, por um lado, que a edição do Jornal Oficial de 30 de Março de 2004 não estava disponível, nessa data, nas línguas oficiais dos dez novos Estados‑Membros, quando o artigo 8.° da decisão controvertida dispõe que esta última é estabelecida nas nove línguas oficiais dos Estados aderentes; por outro lado, de qualquer forma, a edição polaca do referido Jornal Oficial só foi transmitida às autoridades públicas polacas bem mais tarde, ou seja, em 27 de Julho de 2005. Na medida em que a publicação nas línguas oficiais dos novos Estados‑Membros só foi efectuada muito depois do dia 30 de Março de 2004, a recorrente deduziu mesmo deste facto que o Conselho antedatara deliberadamente o número do Jornal Oficial em que a decisão contestada foi publicada.

18.      Estes argumentos não podem ser acolhidos. É certo que constitui jurisprudência assente que a publicação de um acto legislativo só se considera completa se o número do Jornal Oficial no qual ela foi efectuada estiver disponível em todas as línguas oficiais (12). Também é certo que, caso se prove que a data em que o referido número estava efectivamente disponível não corresponde à data que nele figura, só se deve ter em conta a data da publicação efectiva, pois «um princípio fundamental na ordem jurídica comunitária exige que um acto emanado das autoridades públicas não seja oponível aos cidadãos antes de existir a possibilidade de estes dele tomarem conhecimento» (13). Assim, no processo que conduziu ao acórdão Alemanha/Conselho (14), o acto impugnado tinha sido objecto de publicação no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 23 de Dezembro de 1994, mas esse Jornal Oficial só ficou disponível a partir de 13 de Fevereiro de 1995. Assim, foi esta última data que se teve em consideração como ponto de partida do prazo de recurso. Por último, é certo que se fosse demonstrado que o número do Jornal Oficial em que a decisão controvertida foi publicada foi deliberadamente antedatado, essa decisão deveria ser anulada por violação do princípio da segurança jurídica (15).

19.      Contudo, resulta de uma parte das informações fornecidas pelo director‑geral do Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça (16), que o JO L 93, de 30 de Março de 2004, estava, de facto, disponível em todas as línguas dos novos Estados‑Membros desde essa data. É certo que a recorrente contestou a veracidade desta informação, mas essa resposta não pode ser posta em causa sem elementos sérios e esses elementos não foram apresentados ao Tribunal de Justiça. E o facto de esse número do Jornal Oficial só ter podido ser consultado em polaco no sítio Eur‑Lex da Internet, em 15 de Dezembro de 2004, é irrelevante, na medida em que a única forma de publicação dos textos legislativos que faz fé é a versão impressa. Por outro lado, é pacífico que se considera efectuada a publicação e, portanto, considera‑se que o Jornal Oficial está disponível no dia em que o exemplar do Jornal Oficial que reproduz o acto está efectivamente disponível em todas as línguas da Comunidade no Serviço das Publicações no Luxemburgo. A razão disto deve‑se a que «importa que a data em que um regulamento deve ser considerado publicado não varie consoante a disponibilidade do Jornal Oficial das Comunidades [Europeias] no território de cada Estado‑Membro» e que «[a] unidade e a aplicação uniforme do direito comunitário exigem […] que a entrada em vigor de um regulamento tenha lugar, salvo disposição expressa em sentido contrário, na mesma data em todos os Estados‑Membros, sem considerar os atrasos que se venham a produzir, apesar dos esforços para garantir a difusão expedita do Jornal Oficial no conjunto da Comunidade» (17). De resto, a dilação de quinze dias do dies a quo estabelecida no artigo 81.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça assim como o prazo de distância de dez dias têm precisamente por objectivo tomar em conta, através de períodos fixos de dilação, os imponderáveis da distribuição do Jornal Oficial, a fim de permitir a todos os recorrentes explorar plenamente o prazo de dois meses posto à sua disposição pelo Tratado CE (18).

20.      No presente caso, o ponto de partida do prazo de recurso deve ser assim fixado no dia 30 de Março de 2004. Por isso, a contagem do prazo efectua‑se da seguinte forma. Por força do artigo 80.°, alínea a), do Regulamento de Processo, «se um prazo fixado em dias, semanas, meses ou anos começar a correr a partir do momento em que ocorre um evento ou em que se pratica um acto, na sua contagem não se inclui o dia em que esse evento ou esse acto têm lugar». Além disso, o dies a quo do prazo de recurso de dois meses previsto no artigo 230.°, quinto parágrafo, CE foi adiado, de acordo com o artigo 81.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça (19), do dia 30 de Março de 2004 para o dia 14 de Abril de 2004 à meia‑noite. Além disso, o artigo 80.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento de Processo (20) dispõe que um prazo fixado em meses termina no fim do dia que, no último mês, tem o mesmo número que o dies a quo. Assim, esse prazo de recurso terminou no fim do dia 14 de Junho de 2004. Tendo em conta o prazo fixo de dilação de dez dias em razão da distância, que deve ser acrescentado aos prazos processuais por força do artigo 81.°, n.° 2, do Regulamento de Processo (21), o prazo total atribuído para a interposição do recurso venceu‑se na quinta‑feira, dia 24 de Junho de 2004, à meia‑noite, não figurando este dies a quem na lista dos dias feriados legais estabelecida no artigo 1.° do anexo do Regulamento de Processo.

21.      A petição foi registada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 28 de Junho de 2004, donde resulta que o presente recurso foi interposto tardiamente.

2.      Argumentos adiantados pela recorrente para sustentar a fixação do ponto de partida do prazo de recurso na data de adesão

22.      A recorrente, apoiada pelos Estados intervenientes, sustenta que o dies a quo deve ser fixado na data de entrada em vigor do tratado de adesão, ou seja, no dia 1 de Maio de 2004. Para o efeito, apresenta vários argumentos. Pode decidir‑se já quanto aos dois primeiros.

23.      A República da Polónia alega, em primeiro lugar, que as medidas previstas no artigo 23.° do acto de adesão produzem efeitos e adquirem carácter obrigatório no dia e sob a reserva da entrada em vigor do tratado de adesão. O que é exacto e é, de resto, recordado no artigo 9.° da decisão impugnada (22). Contudo, isto não significa que as medidas previstas no referido artigo 23.° não sejam oponíveis desde a sua publicação. Com efeito, não se deve confundir, por um lado, a oponibilidade de um acto, que está ligada à realização de todas as formalidades de publicidade necessárias e faz correr o prazo de recurso, e, por outro, a produção de efeitos jurídicos, a entrada em vigor, que pode ser retardada. O facto de o artigo 254.°, primeiro parágrafo, CE fixar a data de entrada em vigor dos actos de direito derivado que devem ser obrigatoriamente publicados, na falta de outra data expressamente determinada, no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação nunca foi entendido no sentido de impedir que o prazo de recurso corresse a partir do dia da publicação.

24.      Para justificar a fixação do dies a quo do prazo de recurso em 1 de Maio de 2004, a República da Polónia invoca igualmente os artigos 58.° do acto de adesão (23), bem como os artigos 8.° (24) e 9.° da decisão controvertida. Nos termos destas disposições, os textos dos actos das instituições adoptados antes da adesão, incluindo o da decisão em causa, são estabelecidos nas nove línguas dos novos Estados‑Membros e fazem fé, nessas línguas, a partir e sob reserva da entrada em vigor do tratado de adesão. Segundo a recorrente, daqui resulta que a versão polaca da medida impugnada só se torna autêntica a partir de 1 de Maio de 2004 e, consequentemente, considera‑se que a edição do Jornal Oficial que a reproduz só está disponível a partir dessa data. Mais uma vez, este raciocínio não convence. O facto de ser precisado que os textos da decisão impugnada nas vinte e uma línguas «faz[em] igualmente fé» significa simplesmente que a referida decisão deve ser estabelecida em todas as versões linguísticas oficiais e que nenhuma dessas versões se sobrepõe a outra. Pressupondo que se tenha de considerar que só a entrada em vigor do tratado de adesão é que confere valor autêntico às diferentes versões linguísticas, isso seria válido, de qualquer forma, para os textos em todas as vinte e uma línguas, as dos antigos e as dos novos Estados‑Membros.

25.      Mais fortes são as objecções à caducidade do prazo que a recorrente e os Estados intervenientes retiram dos princípios da comunidade de direito, do direito a uma protecção jurisdicional efectiva e da não discriminação. Para justificar que o prazo de interposição de um recurso de anulação de um acto adoptado nos termos do artigo 23.° do acto de adesão só corre a partir de 1 de Maio de 2004 para os novos Estados‑Membros, alegam em particular que, na data da publicação do acto, a recorrente ainda não era membro da União e não tinha, por isso, legitimidade para interpor um recurso de anulação. Por conseguinte, admitir que o prazo de recurso começa a correr a partir da publicação do acto permitiria à instituição autora do referido acto subtrair‑se à fiscalização da legalidade de uma medida adoptada com base no artigo 23.° do acto de adesão, ao adoptá‑la e ao publicá‑la pelo menos dois meses antes de os Estados aderentes adquirirem a qualidade de membros. Ora, o princípio da comunidade de direito implica a instituição de um sistema completo e eficaz da fiscalização da legalidade dos actos comunitários e de protecção jurisdicional. No presente caso, tendo em conta a data de publicação da decisão impugnada, a República da Polónia só dispôs de um prazo de recurso truncado, o que afectou a efectividade do seu direito de recurso e a discriminou relativamente aos Estados‑Membros.

26.      Embora, como demonstrarei de seguida, os princípios da comunidade de direito e do direito a um recurso jurisdicional efectivo invocados pela recorrente devam efectivamente levar a que se admita a admissibilidade do recurso, tal não parece ser o caso do argumento relativo ao princípio da não discriminação. A República da Polónia sustenta que a fixação do ponto de partida do prazo de recurso na data da publicação da decisão controvertida teria por consequência deixar à recorrente apenas um prazo de recurso truncado, encurtado, o que originaria uma discriminação relativamente aos Estados‑Membros no exercício do seu direito a um recurso jurisdicional efectivo. Não vislumbro bem em que é que consistiria a discriminação alegada. Tanto os antigos como os novos Estados‑Membros beneficiaram do mesmo prazo de recurso a partir da data da publicação da medida impugnada. É certo que, nessa data, os futuros Estados‑Membros ainda não tinham o estatuto de recorrente privilegiado, não podendo por isso basear‑se no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE para contestar a medida. E é verdade que a aplicação das exigências impostas nessa disposição tornava problemática a admissibilidade do seu eventual recurso, contrariamente aos Estados‑Membros. Mas esta diferença de tratamento é apenas o resultado do facto de o estatuto de Estado‑Membro que confere igualdade de direitos aos novos Estados‑Membros só se adquirir a partir da entrada em vigor do tratado de adesão. Na opinião do Conselho e da Comissão, admitir a fixação do dies a quo na data da entrada em vigor do acto de adesão para os novos Estados‑Membros seria mesmo, a pretexto de os pôr em pé de igualdade com os antigos Estados‑Membros, no que diz respeito ao prazo de recurso de que dispõem enquanto recorrentes privilegiados, favorecê‑los relativamente aos antigos Estados‑Membros, no que diz respeito, desta vez, ao ponto de partida do referido prazo.

B –    As vias do reconhecimento da admissibilidade

27.      Como acabámos de ver, a aplicação estrita do artigo 230.° CE poderia levar a que se considerasse inadmissível a petição da República da Polónia. Mas há uma linha jurisprudencial desenvolvida em paralelo pelo Tribunal de Justiça que revela um entendimento mais generoso da admissibilidade dos recursos. E, a meu ver, alguns dos princípios fundamentais da ordem jurídica da União, em particular o da protecção jurisdicional efectiva, levam a que se privilegie esta última.

28.      Temos de retomar o princípio da comunidade de direito. Sabe‑se que o acórdão Os Verdes/Parlamento (25) o consagrou nos seguintes termos:

«[…] a Comunidade Económica Europeia é uma comunidade de direito, na medida em que nem os seus Estados‑Membros nem as suas instituições estão isentos da fiscalização da conformidade dos seus actos com a carta constitucional de base que é o Tratado. Especialmente por meio dos seus artigos [230.° CE] e [241.° CE], por um lado, e do artigo [234.° CE], por outro, o Tratado estabeleceu um sistema completo de vias de recurso e de procedimentos destinados a confiar ao Tribunal de Justiça a fiscalização da legalidade dos actos das instituições. As pessoas singulares e colectivas estão assim protegidas contra a aplicação de actos de alcance geral, que não podem impugnar directamente perante o Tribunal, em virtude dos requisitos especiais de admissibilidade especificados no [artigo 230.°, segundo parágrafo, CE]. Quando a execução administrativa desses actos compete às instituições comunitárias, as pessoas singulares e colectivas podem interpor recurso directo, junto do Tribunal, contra os actos de aplicação de que são destinatárias, ou que lhes digam directa e individualmente respeito, e invocar, nesse recurso, a ilegalidade do acto geral de base. Quando essa execução for da competência das instâncias nacionais, podem invocar a ilegalidade dos actos de alcance geral perante os órgãos jurisdicionais nacionais e levar estes a consultar, a esse respeito, o Tribunal, por meio de questões prejudiciais».

29.      Entendido desta forma, o conceito de comunidade de direito comporta uma dupla dimensão (26): uma dimensão normativa que implica uma obrigação de conformidade dos actos das instituições e dos Estados‑Membros com o Tratado; uma dimensão jurisdicional, que pressupõe uma protecção jurisdicional contra os actos comunitários ilegais. Sendo um dos «elementos constitutivos duma comunidade de direito» (27), o direito a um recurso jurisdicional efectivo foi, de resto, objecto de consagração jurisprudencial imediatamente após o acórdão Os Verdes/Parlamento, já referido. Inspirando‑se nas tradições constitucionais comuns dos Estados‑Membros, bem como nos artigos 6.° e 13.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, o Tribunal de Justiça elevou‑o a princípio geral do direito comunitário (28). O objectivo era evitar a criação de poderes à margem do direito e dos tribunais, e garantir, para esse efeito, uma congruência estrutural: a transferência de poderes dos Estados deve andar a par com a instituição de fiscalização e de possibilidades de recurso equivalentes. Como se sabe, esta ideia encontra expressão, hoje em dia, no artigo 6.°, n.° 1, do Tratado UE. Numa primeira fase, apenas os órgãos jurisdicionais nacionais estavam sujeitos às exigências que decorriam deste princípio (29). Mas, sempre que a ocasião se lhe apresentou, o Tribunal de Justiça foi progressivamente alargando o seu âmbito à protecção jurisdicional realizada pelos órgãos jurisdicionais comunitários. Foi assim que verificou que o Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias não tinha violado o princípio do direito a um recurso jurisdicional efectivo ao considerar que uma comunicação não podia ser objecto de recurso de anulação (30); e que considerou que o princípio geral do direito a uma protecção jurisdicional efectiva e completa justifica a concessão de medidas provisórias «a fim de evitar uma lacuna na protecção jurídica garantida pelo Tribunal de Justiça» (31).

30.      Este princípio do direito a um recurso jurisdicional efectivo é entendido no sentido de que, se não proíbe toda e qualquer limitação, proíbe, pelo menos, toda e qualquer falta de protecção jurisdicional. Esta orientação jurisprudencial foi recentemente recordada pelo Tribunal de Justiça no processo Eurojust (32). Se bem que tenha declarado inadmissível o recurso de anulação contra diversos convites para apresentação de candidaturas para o recrutamento de agentes temporários, feito pelo Eurojust, o Tribunal de Justiça observou – sem dúvida apenas por esse motivo – que daí não decorre uma violação do direito a uma protecção jurisdicional efectiva. Com efeito, os actos controvertidos não estavam totalmente subtraídos a fiscalização jurisdicional, uma vez que os principais interessados, a saber, os candidatos aos diferentes lugares que figuravam nos convites impugnados, dispunham de acesso ao juiz comunitário nas condições previstas no artigo 91.° do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e, na hipótese de um tal recurso, os Estados‑Membros podiam intervir no litígio e, se o entendessem, interpor recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância.

31.      Resulta desta compreensão do direito a uma protecção jurisdicional efectiva que, no caso de a economia de uma via de recurso levar a que os recorrentes fiquem sem possibilidades de recurso, nunca repugnou ao Tribunal de Justiça interpretar amplamente as condições de admissibilidade.

32.      Esta abordagem pode ser particularmente observada no âmbito do recurso de anulação interposto nos termos do artigo 230.° CE. O Tribunal de Justiça não hesita em interpretar amplamente os termos da sua competência, a fim de garantir o acesso ao juiz comunitário; e isto tanto no que diz respeito ao conceito de acto impugnável como aos titulares da legitimidade. Assim, no processo AETR (33), o Tribunal de Justiça alargou o âmbito do recurso de anulação, para além dos actos tipificados, a todas as medidas adoptadas pelas instituições, seja qual for a respectiva natureza ou forma, que se destinem a produzir efeitos jurídicos, indo buscar a justificação desta solução ao seu dever de assegurar o respeito do direito, ou seja, a protecção jurisdicional contra os actos comunitários ilegais. No acórdão Os Verdes/Parlamento (34) – recordemo‑lo –, apesar de o texto do Tratado não mencionar os actos desta instituição como objecto possível de um recurso de anulação, o Tribunal de Justiça consagrou a legitimidade passiva do Parlamento, baseando‑se no princípio da comunidade de direito, que implica a existência de um sistema completo de fiscalização da legalidade dos actos das instituições.

33.      A aceitação ampla do conceito de «dizer individualmente respeito», adoptada em alguns processos, parece também ter sido implicitamente motivada pela preocupação de facilitar uma protecção jurisdicional (35). Assim, no processo Piraiki‑Patraiki/Comissão (36), sem dúvida que o Tribunal de Justiça teve em conta o facto de que os recorrentes que pediam a anulação da decisão da Comissão que autorizava o Governo francês a instituir quotas de importação de algodão proveniente da Grécia eram todos exportadores de algodão gregos que teriam tido dificuldades em pôr em causa a medida nacional dirigida unicamente aos importadores; no processo Codorniu/Conselho (37), ao decidir que um indivíduo tinha legitimidade para pedir a anulação de um verdadeiro regulamento que lhe causava um prejuízo particularmente grave, o Tribunal de Justiça teve sem dúvida em consideração a circunstância de que os recorrentes não tinham outra alternativa senão transgredir este último para, nos processos de aplicação das sanções previstas na lei nacional, contestarem a sua validade (38); no processo Cofaz e o./Comissão, ao decidir que uma decisão que declarava um auxílio compatível com o mercado comum dizia individualmente respeito às empresas concorrentes (39), sem dúvida que o Tribunal de Justiça foi influenciado pelo advogado‑geral P. VerLoren van Themaat, que afirmava nas suas conclusões que, dada a falta de efeito directo do artigo 87.°, n.° 1, o direito comunitário não conferia a essas empresas «nenhuma protecção jurídica alternativa [pelos] órgãos jurisdicionais nacionais» (40). Por último, no processo Allied Corporation e o./Comissão (41), que reconheceu às empresas produtoras e exportadoras em causa o direito de pedirem a anulação dos regulamentos que instituíam um direito antidumping, o Tribunal de Justiça observou, desta vez, explicitamente, que esse direito «não implica o risco de criar duplicações em matéria de vias de recurso, dado que um recurso nos órgãos jurisdicionais nacionais só é possível após a cobrança do direito antidumping pago normalmente por um importador residente na Comunidade».

34.      Mais do que isso, o Tribunal de Justiça não hesita em ir além do texto do artigo 230.° CE e em colmatar as suas lacunas quando a existência de protecção jurisdicional depende disso. Como o advogado‑geral G. Mancini salientou, «[a] obrigação de respeitar o direito […] prevalece sobre os termos estritos da lei escrita. Sempre que a protecção dos interessados o exija, o Tribunal está disposto a corrigir ou a completar as normas que delimitam a sua competência, em nome do princípio que orienta a sua missão» (42). O acórdão Os Verdes/Parlamento, já referido, é, antes de mais, emblemático desta jurisprudência que é sobretudo fiel ao princípio da comunidade de direito donde decorre o direito a um recurso jurisdicional efectivo. Embora o texto do artigo 173.° do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 230.° CE] não mencionasse o Parlamento como recorrido num recurso, o Tribunal de Justiça deduziu do «espírito do Tratado, tal como foi consignado no artigo [220.° CE]», e do seu «sistema» o princípio da comunidade de direito que impõe a possibilidade de um recurso directo contra todas as disposições adoptadas pelas instituições, que visam produzir efeitos jurídicos relativamente a terceiros; consequentemente, consagrou a participação passiva do Parlamento no contencioso de anulação (43). Igualmente relevante neste contexto é o reconhecimento judicial da legitimação activa do Parlamento relativamente ao recurso de anulação, apesar de esta instituição não ser mencionada, no artigo 173.° do Tratado CE, na lista dos recorrentes, reconhecimento motivado pelo carácter incerto, ou mesmo ineficaz, da protecção jurisdicional das prerrogativas do Parlamento confiada às outras instituições, Estados‑Membros e particulares (44).

35.      É verdade que se poderia retorquir que o acórdão Unión de Pequeños Agricultores/Conselho (45) pôs um ponto final a esta audácia ao serviço da consagração da comunidade de direito, para dar lugar, hoje em dia, a uma política jurisprudencial mais preocupada com uma «self restraint». O Tribunal de Justiça já não se considera habilitado a ir além do texto do Tratado, quando este se revela atentatório do direito a uma protecção jurisdicional efectiva, com medo de usurpar o poder de revisão dos Tratados reservado aos Estados‑Membros. Na verdade, esta não me parece ser a leitura que se deve retirar deste acórdão (46). A recusa de o Tribunal de Justiça se afastar das condições de admissibilidade estabelecidas no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, para o recurso de anulação dos particulares explica‑se pelo facto de o respeito das referidas condições levar, é certo, a uma limitação, mas não a uma falta de protecção jurisdicional, e de, por isso, a melhoria do «sistema de fiscalização da legalidade dos actos comunitários» (47) dever permanecer na competência dos Estados‑Membros. Com efeito, o défice de protecção jurisdicional resultante da falta de legitimidade dos recorrentes para interpor um recurso de anulação foi atenuada pela obrigação imperiosa recordada aos Estados‑Membros e aos seus órgãos jurisdicionais de preverem e aplicarem um sistema de vias de recurso e de meios processuais que permita assegurar o respeito do direito a uma tutela jurisdicional efectiva (48). Esta análise parece‑me confortada pela solução recentemente expressa no processo Gestoras Pro Amnistía e o./Conselho (49), no qual o Tribunal de Justiça julgou inadmissível um recurso por responsabilidade extracontratual destinado a obter reparação do prejuízo alegadamente sofrido como consequência da inscrição numa lista de pessoas implicadas em actos de terrorismo, lista essa anexa a uma posição comum adoptada no âmbito do título VI do Tratado UE. É verdade que o Tribunal de Justiça respondeu aos recorrentes que se queixavam de uma violação do direito a uma protecção jurisdicional efectiva, remetendo para uma eventual revisão dos Tratados o cuidado de instituir um regime de responsabilidade extracontratual no âmbito do terceiro pilar. No entanto, teve o cuidado de salientar que, não obstante essa limitação das suas competências prevista no artigo 35.° UE no âmbito do título VI do Tratado UE, os recorrentes não estavam totalmente privados de protecção jurisdicional. Para esse efeito, apesar de o texto do artigo 35.° UE não prever a fiscalização jurisdicional das posições comuns, o Tribunal de Justiça reconheceu‑se competente, designadamente, para decidir sobre a interpretação ou a validade de uma posição comum que visava produzir efeitos jurídicos relativamente a terceiros. Recordou igualmente o dever que incumbe aos Estados‑Membros, designadamente, aos seus órgãos jurisdicionais, de interpretarem e aplicarem as regras internas processuais que regulam o exercício das acções e recursos, de maneira a permitir às pessoas singulares e colectivas contestarem perante os tribunais a legalidade de qualquer decisão ou de qualquer medida nacional relativa à elaboração ou à aplicação às mesmas pessoas de um acto da União e, se for esse o caso, pedir a reparação do prejuízo sofrido.

36.      É por fidelidade a esta linha jurisprudencial que conto propor ao Tribunal de Justiça que vá além do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE, para admitir a admissibilidade da petição apresentada pela República da Polónia. Nesta óptica, tenho para já que afastar três objecções.

37.      A primeira consiste, como faz o Conselho, em objectar que não se pode pedir ao Tribunal de Justiça que faça aquilo que as partes no tratado de adesão se recusaram a fazer. Podiam perfeitamente ter introduzido derrogações temporárias dos tratados institutivos. De facto, o acto de adesão previu uma série de disposições transitórias que derrogam os Tratados e o direito derivado. Em particular, foram introduzidos processos legislativos especiais e simplificados para ter em conta a adesão e a necessidade de adaptar os actos das instituições com processos mais simples que os habitualmente aplicados. Se as partes no tratado de adesão tivessem entendido que as disposições do referido tratado não podiam assegurar correctamente a protecção jurisdicional dos novos Estados‑Membros, poderiam certamente ter introduzido as disposições derrogatórias necessárias. Essas disposições poderiam ter previsto, apenas a título derrogatório, que o prazo de recurso para os novos Estados‑Membros só começava a correr a partir da data de adesão, e não da da publicação dos actos. Contudo, há que constatar que essa escolha não foi feita, uma vez que, na altura das negociações de adesão, não foi aprovada nenhuma regra particular ou outra disposição transitória que derrogasse as disposições do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE ou as do Regulamento de Processo relativas aos prazos de recurso.

38.      A meu ver, esta objecção não merece ser acolhida, já que podia ter sido suscitada em relação a todos os avanços jurisprudenciais anteriores. Parece‑me difícil interpretar o silêncio do acto de adesão como a expressão da vontade das partes de recusarem qualquer derrogação do dies a quo fixado pelo artigo 230.°, quinto parágrafo, CE. Esse silêncio traduz muito mais o facto de não terem pensado no défice de protecção jurisdicional dos novos Estados‑Membros que resulta da fixação do ponto de partida do prazo de recurso na data da sua publicação, para os actos adoptados entre a assinatura e a entrada em vigor do tratado de adesão. De qualquer forma, deve recordar‑se que o facto de os constituintes não terem considerado útil alterar o texto do artigo 173.° do Tratado CE, apesar de uma proposta nesse sentido feita pela Comissão no decurso das negociações do Acto Único Europeu, não impediu o Tribunal de Justiça de conferir ao Parlamento a legitimidade activa e passiva relativamente ao recurso de anulação.

39.      A segunda objecção, suscitada em particular pelo Conselho, consiste em sustentar que, a priori, nada se opunha a que a República da Polónia interpusesse um recurso de anulação desde a data de publicação da decisão controvertida. É certo que, para esse efeito, não se podia basear no artigo 230.°, segundo parágrafo, CE. Mas era‑lhe possível invocar o quarto parágrafo dessa disposição.

40.      Este caso é seguramente inédito na jurisprudência (50). Contudo, as soluções relativas à determinação das partes intervenientes nos termos do artigo 40.° do Estatuto do Tribunal de Justiça dão‑nos uma primeira indicação (51). Deste artigo resulta que um Estado terceiro pode ser admitido a intervir, tal como o artigo 40.°, segundo parágrafo, do referido estatuto habilita «qualquer pessoa» a fazê‑lo (52), e que não pode reivindicar o benefício da exclusão, previsto nessa disposição, da intervenção de qualquer pessoa, diferente dos Estados‑Membros e das instituições da Comunidade, nas causas entre Estados‑Membros, entre instituições das Comunidades, ou entre Estados‑Membros, por um lado, e instituições das Comunidades, por outro (53). Por outras palavras, embora um Estado terceiro não possa reclamar o estatuto processual reservado aos Estados‑Membros pelo sistema comunitário, beneficia da legitimidade processual que este último reconhece às pessoas colectivas.

41.      Esta contribuição que resulta da aplicação do artigo 40.° do Estatuto do Tribunal de Justiça é confirmada pelas soluções relativas ao direito de interpor recurso de anulação dos países e territórios ultramarinos, das regiões e das comunidades autónomas. Donde resulta que «[o] objectivo do artigo 173.°, quarto parágrafo, do Tratado é conceder uma protecção jurisdicional adequada a todas as pessoas singulares ou colectivas a quem os actos das instituições comunitárias digam directa e individualmente respeito. Assim a legitimidade processual deve ser reconhecida em função deste único objectivo e o recurso de anulação deve, portanto, ser acessível a todos os que preencham as condições objectivas previstas, ou seja, ter a personalidade jurídica exigida e o acto impugnado dizer[‑lhes] directa e individualmente respeito. Esta solução impõe‑se igualmente quando o recorrente é uma entidade pública que satisfaz esses critérios» (54). Por conseguinte, quando uma região goza de personalidade jurídica por força do seu direito interno, ela deve, a esse título, ser considerada uma pessoa colectiva na acepção do artigo 230.° , quarto parágrafo, CE (55) e pode, em princípio, interpor um recurso de anulação (56). O mesmo se diga da República da Polónia, que o seu direito interno dota de personalidade jurídica e ao qual o direito internacional reconhece, como a qualquer Estado, a personalidade internacional. Assim, este Estado tinha, desde a data da publicação da medida controvertida, a legitimidade para sujeitar à apreciação crítica do Tribunal de Justiça um acto que o prejudicava. Evidentemente, a possibilidade de que dispunha para interpor um recurso de anulação com base no artigo 230.°, quarto parágrafo, CE não era ilimitada. Estava subordinada a condições objectivas de admissibilidade destinadas a verificar a existência de um interesse próprio em contestar a decisão impugnada e, assim, a evitar a transformação do recurso de anulação interposto pessoas singulares ou colectivas numa espécie de actio popularis (57). Estas condições prendem‑se, designadamente, com a demonstração de um nexo directo e individual que o ligue ao acto posto em causa de que não é o destinatário. A este respeito, o facto de a República da Polónia ser designada pelo nome no acto de adesão, que é aplicado pela medida controvertida, não pode dispensá‑la de demonstrar um nexo directo e individual. O Tribunal de Justiça já decidiu que o facto de um país ou território ultramarino (a seguir «PTU») ser mencionado na quarta parte e no anexo IV do Tratado CE não o dispensava do cuidado de demonstrar que a medida adoptada em aplicação do Tratado lhe dizia directa e individualmente respeito (58). E, de facto, a exigência de um nexo individual poderia, no presente caso, opor‑se à admissibilidade do recurso interposto pela República da Polónia.

42.      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, «[p]ara determinar o carácter geral ou não de um acto, há que apreciar a sua natureza e os efeitos jurídicos que visa produzir ou que efectivamente produz» (59). No presente caso, a disposição impugnada tem por objecto substituir as disposições do Anexo II do acto de adesão, que alteram o Regulamento n.° 1259/1999, por disposições que alteram o Regulamento n.° 1782/2003, a fim de ter em conta as alterações introduzidas na PAC através da adopção deste regulamento, ocorrida após a assinatura dos instrumentos de adesão. Nesta óptica, a disposição impugnada estende o mecanismo dos pagamentos directos de acordo com um calendário nos novos Estados‑Membros aos novos pagamentos directos. Assim, «aplica[‑se] a situações objectivamente determinadas e produz efeitos jurídicos relativamente a categorias de pessoas encaradas de modo geral e abstracto» (60), a saber, todos os agricultores dos novos Estados‑Membros que cultivam produtos agrícolas que são objecto de novos pagamentos directos. Logo, é uma medida de alcance geral. O facto de a República da Polónia ser expressamente mencionada na disposição impugnada não pode pôr em causa o seu alcance geral, dado que os outros novos Estados‑Membros também o são e que a mesma é aplicável indistintamente a todos os novos Estados‑Membros e a todos os agricultores neles instalados (61). Sabe‑se, contudo, que o carácter normativo do acto impugnado não constitui um obstáculo ao recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou colectiva, quando este diz directa e individualmente respeito à mesma (62).

43.      A este respeito, a demonstração de um nexo individual entre a recorrente e a medida contestada está subordinada de forma imutável (63) à satisfação do «critério Plaumann», segundo o qual um acto de alcance geral só pode dizer respeito a pessoas singulares ou colectivas se «as atingir em razão de determinadas qualidades que lhes são específicas ou de uma situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e, por isso, as individualiza de modo análogo ao do destinatário» (64). Assim, a questão relevante é a de determinar se a República da Polónia é atingida pela disposição impugnada devido a certas qualidades que lhe são específicas ou a uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outra pessoa. Igualmente quanto a este aspecto, a jurisprudência relativa à legitimidade dos países e territórios ultramarinos, das regiões e das comunidades autónomas para interporem recurso de anulação dá‑nos ensinamentos preciosos. Lendo‑a, conclui‑se que a individualização de uma colectividade territorial recorrente não pode resultar das repercussões socioeconómicas desfavoráveis do acto impugnado nas empresas instaladas no seu território. Assim, o Tribunal de Justiça declarou que «o interesse geral que um PTU, enquanto entidade competente para as questões de ordem económica e social no seu território, pode ter em obter um resultado favorável para a prosperidade económica deste último não basta, por si só, para considerar que [as decisões] lhe dizem individualmente respeito» (65). Mesmo a obrigação de ter em conta as repercussões negativas que a medida que ele pretende adoptar pode ter na economia da colectividade em causa e nas empresas interessadas, imposta ao autor do acto pela norma de habilitação, não pode bastar para provar que o acto diz individualmente respeito à colectividade. Foi assim que o Tribunal de Justiça decidiu a propósito das Antilhas Neerlandesas, numa hipótese em que as medidas de protecção, cuja anulação era pedida pelos PTU, tinham sido adoptadas com base numa disposição que obrigava o seu autor a ter em conta as consequências socioeconómicas que elas podiam ter para os PTU em causa (66).

44.      Esta jurisprudência não está certamente isenta de críticas (67). Contudo, não me parece que esta seja a melhor altura para discutir e decidir da oportunidade de a pôr em causa. Alterar, no presente processo, a jurisprudência relativa à existência de afectação individual de certas colectividades territoriais levaria a atenuar a apreciação das exigências de admissibilidade para se opor à admissibilidade do presente recurso, pelo facto de a recorrente ter legitimidade desde a publicação da decisão controvertida e, não tendo agido dentro do prazo, o seu direito a interpor o recurso ter caducado. Isto seria o mesmo que recusar administrar um tratamento médico a um doente, a pretexto de se ter acabado de descobrir uma forma de prevenir a doença.

45.      A terceira objecção, suscitada também em particular pelo Conselho, consiste em considerar que a circunstância de, no presente caso, a recorrente ter adquirido a qualidade de recorrente privilegiada associada ao estatuto de Estado‑Membro, apenas em 1 de Maio de 2004, data da entrada em vigor do tratado de adesão, e, assim, a legitimidade, não a privava de modo nenhum do direito de recurso, mesmo que o prazo do recurso tivesse começado a correr a partir da data de publicação da decisão controvertida. Com efeito, tendo a República da Polónia adquirido a qualidade de Estado‑Membro em 1 de Maio de 2004 e beneficiando, assim, a partir dessa data, do estatuto de recorrente privilegiado, ainda dispunha, até ao termo do prazo de recurso, em 24 de Junho de 2004, de 55 dias para interpor um recurso de anulação, sem sequer ter de demonstrar interesse em agir. Este prazo teria sido largamente suficiente para preparar a sua petição, tanto mais que a República da Polónia conhecia o teor da decisão controvertida muito antes da sua publicação, dado que esteve associada aos trabalhos do Conselho e das suas instâncias preparatórias e se opôs, de resto, em todas as etapas do processo legislativo que conduziu à adopção da referida decisão. Além disso, sabia que ia adquirir a qualidade de Estado‑Membro em tempo útil. Logo, é legítimo perguntar se é necessário, no presente caso, subtrairmo‑nos ao texto do Tratado CE em nome do princípio do direito a uma protecção jurisdicional efectiva.

46.      Em todo o caso, pode contrapor‑se que os prazos de recurso foram instituídos com o objectivo de assegurar a clareza e a segurança das situações jurídicas e de evitar qualquer discriminação ou tratamento arbitrário na administração da justiça (68). O Tribunal de Justiça, salienta, por isso, reiteradamente, que, a fim de cumprir as exigências para que foi prevista, a regulamentação comunitária relativa aos prazos processuais deve ser de «aplicação estrita» (69) e deve ser «rigorosamente respeitada» (70). A mesma só pode ser derrogada «em circunstâncias verdadeiramente excepcionais, de caso fortuito ou de força maior, em conformidade com o artigo [45.°], segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça» (71). Sobretudo, ao argumento segundo o qual a fixação do ponto de partida do prazo de recurso na data da publicação da decisão controvertida prejudica o direito do recorrente a um recurso jurisdicional efectivo pode opor‑se que o direito a uma protecção jurisdicional efectiva «não é de modo algum afectado pela aplicação estrita das regulamentações comunitárias respeitantes aos prazos judiciais que […] corresponde à exigência de segurança jurídica» (72).

47.      Esta última objecção não deixa de impressionar. De facto, pode considerar‑se que, no presente caso, o respeito do dies a quo fixado no Tratado CE não leva a que se recuse à recorrente o acesso ao juiz comunitário em violação do direito a um recurso jurisdicional efectivo. Contudo, esta solução violaria a segurança jurídica que as regras relativas à contagem de um prazo de recurso visam precisamente salvaguardar e que justifica o empenho que o Tribunal de Justiça põe normalmente na sua observância. De facto, como é que se deve determinar o prazo que, a partir da aquisição da legitimidade pela recorrente, ou seja, a partir de 1 de Maio de 2004, seria suficiente para lhe permitir preparar e apresentar o seu recurso? Admitindo que 55 dias são suficientes, poder‑se‑ia dizer o mesmo de 40, 30, 10 ou 5 dias? Uma decisão de inadmissibilidade da petição da República da Polónia, devido ao facto de esta ainda poder, em 55 dias, fazer uso efectivo do seu direito de recurso, criaria uma insegurança jurídica susceptível de alimentar contestações permanentes. É certo que, para prevenir estas contestações, poder‑se‑ia decidir, como o Conselho afirma, que um dia para além de 1 de Maio de 2004 é, de qualquer forma, suficiente, dado que os recorrentes têm todo o tempo, desde a publicação do acto controvertido, para elaborar o seu recurso, tê‑lo pronto e apresentá‑lo na Secretaria do Tribunal de Justiça no momento pretendido. Mas esta solução não resolveria o caso dos actos adoptados mais de dois meses antes da entrada em vigor do tratado de adesão. Como a recorrente e os Estados intervenientes observaram com justeza, a fixação do dies a quo na data de publicação dos actos controvertidos deixaria às instituições o caminho livre para, com base no acto de adesão, adoptarem actos mais de dois meses antes da entrada em vigor do tratado de adesão e, assim, privarem os futuros Estados‑Membros de qualquer possibilidade de recurso. Ora, não me parece ser do interesse de uma boa administração da justiça proferir um acórdão que, decerto, resolveria o presente caso, mas seria susceptível de alimentar processos contenciosos posteriores. Sobretudo, não me parece admissível que a efectividade, ou mesmo a existência, do direito fundamental a uma protecção jurisdicional dos Estados candidatos à adesão resulte da escolha arbitrária da data de publicação do acto controvertido feita pelas instituições comunitárias.

48.      Assim, parece‑me oportuno fixar o dies a quo do prazo de recurso na data de entrada em vigor do tratado de adesão. Esta é a única solução susceptível de preservar a segurança jurídica, objecto das regras relativas aos prazos de recurso, e de garantir a todos os futuros Estados‑Membros uma protecção jurisdicional efectiva dos seus direitos contra actos comunitários adoptados entre a assinatura do tratado de adesão e a sua entrada em vigor. Há que recordar que o direito a uma protecção jurisdicional efectiva dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito comunitário impõe que se afastem as modalidades processuais das acções judiciais susceptíveis de tornarem impossível ou excessivamente difícil, na prática, a protecção dos referidos direitos (73).

49.      É certo que, para contestar esta solução, se poderia sustentar que se os futuros Estados‑Membros considerassem os seus direitos prejudicados por um acto adoptado pelas instituições entre a assinatura e a entrada em vigor do tratado de adesão, tinham sempre a possibilidade de recusar a sua ratificação ou a sua aplicação. Mas, além de a conformidade dessa atitude ser discutível à luz do direito internacional e, consequentemente, susceptível de pôr em causa a sua responsabilidade internacional, um meio de reacção deste tipo revela‑se de tal forma desproporcionado que o seu uso e, por conseguinte, a sua eficácia se tornam totalmente ilusórias: não se matam pardais a tiro de canhão.

50.      Assim, a via jurisdicional revela‑se como a única adequada à salvaguarda dos seus direitos, dado que, com efeito, o direito comunitário confere direitos aos Estados candidatos à adesão. Uma vez assinado o tratado de adesão, mudam de estatuto. Deixam de poder ser considerados simples pessoas colectivas, aparecendo antes como futuros Estados‑Membros. O acordo entre Estados‑Membros e Estados candidatos, que a assinatura dos instrumentos de adesão consagra, estabelece a favor destes um conjunto de direitos e de obrigações. E é esse equilíbrio entre direitos e obrigações, ou seja, os seus interesses de futuros Estados‑Membros, que eles devem poder defender contra os actos adoptados durante o período que decorre entre a data de assinatura do tratado de adesão e a da produção de efeitos da referida adesão. De qualquer forma, para esse efeito, os futuros Estados‑Membros beneficiam do estatuto de observador no seio do Conselho, cujo exercício lhes confere o direito de serem informados e consultados e também lhes dá a possibilidade, durante o processo de adopção dos referidos actos, de invocarem, se necessário, os seus interesses (74). Mas, como a República da Polónia alega, apoiada quanto a este aspecto pela República da Lituânia, esse estatuto de observador não lhes garante uma defesa eficaz dos seus interesses, na medida em que não lhe está associado nenhum direito de voto no seio do Conselho. Assim, a legítima defesa dos seus interesses impõe que se reconheça aos futuros Estados‑Membros o acesso ao juiz comunitário. Qualquer outra solução só poderia conduzir ao paradoxo segundo o qual, num caso como o presente, em que uma decisão afecta manifestamente os interesses dos futuros Estados‑Membros, estes, que estão privados do direito de voto, não teriam legitimidade para interpor um recurso de anulação, ao passo que esse recurso seria admissível se fosse interposto pelos antigos Estados‑Membros, que detêm esse direito de voto, independentemente de nele terem um interesse.

51.      A necessidade de assegurar o respeito pela solidariedade entre Estados‑Membros também impõe que se permita aos futuros Estados‑Membros submeterem à apreciação crítica do Tribunal de Justiça os actos adoptados entre a assinatura e a entrada em vigor do tratado de adesão, mediante a fixação do ponto de partida do prazo de recurso na data de produção de efeitos do referido tratado. Com efeito, mais uma vez, o estatuto de observador é insuficiente para garantir que as considerações de solidariedade entre os Estados‑Membros sejam correctamente tidas em conta no âmbito do processo de adopção dos referidos actos. Ora, o dever de solidariedade constitui um princípio (75) que, através da sua adesão à Comunidade, os Estados‑Membros aceitaram (76). Se, como o Tribunal de Justiça já decidiu (77), o mesmo proíbe a um Estado‑Membro romper unilateralmente, de acordo com a concepção que faz do seu interesse nacional, o equilíbrio entre as vantagens e os encargos que decorrem da sua pertença à Comunidade, proíbe igualmente, sem dúvida, aos antigos Estados‑Membros no seio do Conselho romperem arbitrariamente o equilíbrio entre vantagens e encargos criado pelos instrumentos de adesão a favor dos futuros Estados‑Membros.

52.      Por último, a efectividade do princípio da boa fé também milita a favor da fixação do dies a quo na data de entrada em vigor do tratado de adesão. Conforme resulta do artigo 18.° da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de Maio de 1969, que constitui a sua codificação, esse princípio de direito internacional consuetudinário impõe, designadamente, que«[u]m Estado deve abster‑se de actos que privem um tratado do seu objecto ou do seu fim:

a)      Quando assinou o tratado ou trocou os instrumentos constitutivos do tratado sob reserva de ratificação, aceitação ou aprovação, enquanto não manifestar a sua intenção de não se tornar parte no tratado».

Ora, como é sabido, o princípio da boa fé vincula as instituições da Comunidade e tem por corolário, na ordem jurídica comunitária, o princípio da protecção da confiança legítima (78). Por conseguinte, deve ser possível aos futuros Estados‑Membros convidar o Tribunal de Justiça a verificar se, através da adopção de actos durante o período compreendido entre a assinatura e a produção de efeitos dos acordos de adesão, as instituições comunitárias violaram o princípio da boa fé por efeito de uma alteração do equilíbrio entre direitos e obrigações fixado pelos referidos acordos e, assim, privaram estes últimos do seu objecto e da sua finalidade.

53.      Evidentemente que não é relativamente a todos os actos comunitários adoptados desde o início que se deve estabelecer para os novos Estados‑Membros o início do prazo de recurso de anulação a partir da data de produção de efeitos do tratado de adesão. Temos de concordar com o Conselho em que uma derrogação desta amplitude do dies a quo fixado pelo Tratado CE violaria de forma intolerável a segurança jurídica que o carácter definitivo dos actos e a caducidade decorrentes do esgotamento dos prazos de recurso tendem a garantir e que não pode ser justificada pelas considerações que advogam no sentido de não se escolher a data de publicação prevista no texto do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE. Por isso mesmo, nem a recorrente nem os Estados que intervieram em apoio dos seus pedidos o reivindicaram. Pelo contrário, esta derrogação deveria incontestavelmente valer para os actos que, como o contestado no presente caso, fossem adoptados entre a data de assinatura e a da entrada em vigor do tratado de adesão e adoptados com base neste. Em meu entender, deve igualmente valer para todos os actos comunitários adoptados no intervalo que separa essas duas datas, ou seja, não apenas os adoptados com base no acto de adesão mas também os adoptados nos termos dos Tratados, na medida em que, pelo menos, como desenvolverei adiante, esses actos afectem o equilíbrio entre direitos e obrigações fixado pelo tratado de adesão a favor dos futuros Estados‑Membros. É certo que estes últimos, através do acordo que assinam com os antigos Estados‑Membros, aceitam o acervo constituído pela totalidade da legislação comunitária adoptada desde o início. É certo também que, no intervalo de tempo entre a assinatura da entrada em vigor do tratado de adesão, as instituições comunitárias devem poder continuar a legislar. Contudo, estas não devem poder alterar o equilíbrio entre direitos e obrigações que resulta do acervo, tal qual ele existe no momento da assinatura dos instrumentos de adesão, para os futuros Estados‑Membros, sem que estes tenham a possibilidade de defender os seus interesses através do acesso ao juiz comunitário. O facto de a protecção dos interesses dos futuros Estados‑Membros também dever ser assegurada relativamente aos actos adoptados com base nos Tratados, no intervalo de tempo que separa a assinatura da produção de efeitos do tratado de adesão, já é, de resto, revelado pelo estatuto de observador que lhes é reconhecido, pois os direitos de informação e de consulta que lhes estão associados destinam‑se, antes de mais, a ser exercidos no âmbito do processo de adopção dos referidos actos (79).

54.      Para decidir que o prazo de recurso só corre para os futuros Estados‑Membros a partir da entrada em vigor do tratado de adesão relativamente aos actos comunitários adoptados entre a data de assinatura e a data em que o referido tratado produz efeitos, parece‑me que o Tribunal de Justiça pode seguir duas vias.

55.      A primeira consistiria em realizar a apreciação praeter legem, saindo do âmbito do artigo 230.° CE. Esta via já foi seguida no acórdão de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho, já referido. Recordo que, num primeiro tempo, o Tribunal de Justiça tinha recusado reconhecer ao Parlamento a legitimidade para interpor um recurso de anulação tanto com base no artigo 173.°, primeiro parágrafo, do Tratado CE como com base no segundo parágrafo dessa disposição (80), porque o «estado da legislação aplicável» (81) não o permitia, dado que o Parlamento não tinha personalidade jurídica nem era mencionado na lista dos recorrentes privilegiados. Dois anos mais tarde, considerou que devia colmatar esta «lacuna da regulamentação processual» e baseou‑se no «interesse fundamental que se prende com […] o respeito do equilíbrio institucional definido pelos tratados constitutivos das Comunidades Europeias», do qual as prerrogativas do Parlamento fazem parte, para consagrar a favor desta instituição o direito ao recurso de anulação, «na condição de que esse recurso se dirija apenas à salvaguarda das suas prerrogativas e tenha apenas por base fundamentos retirados da violação daquelas» (82). Por outras palavras, o Tribunal de Justiça mostrou‑se sensível à necessidade de uma protecção jurisdicional das prerrogativas do Parlamento, elemento do equilíbrio institucional (83). Dando seguimento a este precedente jurisprudencial, o Tribunal de Justiça, partindo da constatação de que os Estados candidatos devem poder defender os seus direitos de futuros Estados‑Membros que resultam do equilíbrio entre vantagens e encargos acordado quando da assinatura dos instrumentos de adesão, poderia reconhecer‑lhes legitimidade para interporem recurso de anulação com base no direito a uma protecção jurisdicional efectiva dos direitos decorrentes do direito comunitário.

56.      Nesta hipótese, o seu direito de recurso não poderia ser ilimitado. Sob pena de o privar do seu fundamento, o mesmo só poderia ser exercido na medida necessária à salvaguarda dos seus direitos. Semelhante restrição teria como consequência evidente uma limitação da admissibilidade das suas petições aos actos que afectam de forma desfavorável o equilíbrio entre vantagens e encargos acordado quando da assinatura dos instrumentos de adesão. Talvez também se devesse traduzir numa limitação do leque dos fundamentos de anulação invocáveis. Apenas seriam admissíveis em apoio do seu recurso os fundamentos de legalidade que, de uma forma ou de outra, revelassem que os seus direitos de futuros Estados‑Membros tinham sido prejudicados. Por exemplo, os futuros Estados‑Membros não poderiam submeter um acto à apreciação crítica do Tribunal de Justiça, pelo facto de este ter sido adoptado em violação das prerrogativas do Parlamento. É certo que nem sempre seria fácil de fazer a distinção entre os fundamentos de anulação susceptíveis de serem alegados e os fundamentos de anulação inadmissíveis. Mas esta dificuldade não me parece maior do que a que o Tribunal de Justiça teve de ultrapassar para identificar, no âmbito da jurisprudência de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho, já referido, dentre os fundamentos de legalidade invocados pelo Parlamento, os que se prendiam com a violação das prerrogativas do Parlamento, que eram os únicos admissíveis (84).

57.      Poderia objectar‑se que reconhecer um direito de recurso limitado aos futuros Estados‑Membros com base no direito a uma protecção jurisdicional efectiva dos direitos decorrentes do direito comunitário não justifica, a priori, que se faça uma derrogação do dies a quo fixado pelo Tratado CE. Os futuros Estados‑Membros teriam legitimidade desde a data de publicação do acto controvertido e teriam assim dois meses para o fazer a partir dessa data, sob pena de afectar sem necessidade a segurança jurídica. Assim, no presente caso, a República da Polónia estaria numa situação de caducidade, ainda que a sua legitimidade tivesse esse fundamento. Mas, na realidade, os futuros Estados‑Membros só podem ser prejudicados nos seus direitos por actos adoptados após a assinatura do tratado de adesão e, por conseguinte, adquirir a legitimidade para impugnar os referidos actos, sob reserva e a partir do momento em que estes lhes sejam aplicáveis, ou seja, sob reserva e a partir da entrada em vigor do tratado de adesão.

58.      No presente caso, a disposição impugnada pela República da Polónia prejudica manifestamente os direitos desta última, uma vez que se traduz, pelo menos durante um período transitório, numa diminuição dos pagamentos directos feitos aos agricultores polacos. E os fundamentos aduzidos em apoio da petição deste Estado, quer se trate da incompetência do Conselho, da violação do princípio da não discriminação ou da violação do princípio da boa fé, destinam‑se todos, no essencial, a contestar a legalidade da própria extensão do sistema de pagamentos parciais às novas ajudas directas que devem ser pagas aos agricultores dos novos Estados‑Membros. E, assim, a sua petição e todos os fundamentos que a apoiam parecem‑me admissíveis.

59.      A segunda via acessível ao Tribunal de Justiça consistiria antes em proceder à apreciação secundum legem e em desenvolver uma interpretação construtiva do artigo 230.° CE, que privilegiaria o espírito desta disposição em detrimento do seu texto. Tratar‑se‑ia de partir do objecto do artigo 230.° CE, que é oferecer um direito de recurso a todos os litigantes em causa, ou seja, às instituições e aos Estados‑Membros, cujo interesse em agir se presume, ou às pessoas colectivas que são destinatárias do acto impugnado ou a quem este diz directa e individualmente respeito, directamente filiado no direito a uma protecção jurisdicional efectiva. É certo que esta legitimidade está confinada a um prazo de dois meses a partir da notificação ou da publicação desse acto. Mas o artigo 230.° CE parte do pressuposto de que, no momento da ocorrência do acontecimento que constitui o dies a quo, o acto impugnado diz respeito ao litigante; ou então não lhe diz respeito e, nesse caso, não tem legitimidade para interpor um recurso de anulação. Por outras palavras, o ponto de partida do prazo de recurso é fixado pelo texto do artigo 230.°, quinto parágrafo, CE, na data de notificação ou de publicação do acto impugnado, porque se considera que, nessa data, a situação do recorrente relativamente ao referido acto e, consequentemente, a sua legitimidade para interpor um recurso de anulação podem ser determinadas de forma certa e definitiva. Pelo contrário, no presente caso, estamos perante uma hipótese em que um futuro Estado‑Membro só eventualmente pode ser afectado por um acto comunitário adoptado após a assinatura dos instrumentos de adesão, na condição e a partir da produção de efeitos do tratado de adesão, que determina a aplicabilidade do referido acto a esse Estado. Só nessa data é que é possível determinar se o acto que esse Estado contesta lhe diz respeito. Assim, o futuro Estado‑Membro deve poder pedir a anulação dos actos comunitários adoptados durante o período compreendido entre a assinatura e a entrada em vigor do tratado de adesão, num prazo de dois meses a contar da produção de efeitos do referido tratado. E, como se verifica que, nesta última data, ele adquire a qualidade de Estado‑Membro e, assim, a de recorrente privilegiado, deve poder contestar os actos sem ter de demonstrar interesse em agir e apoiar a sua petição com qualquer fundamento de anulação.

60.      Poderão considerar‑se demasiado extensas as possibilidades de contestação contenciosa que seriam assim reconhecidas aos futuros Estados‑Membros. Também partilho desta opinião. Assim, inclino‑me antes para a primeira possibilidade.

III – Quanto ao mérito

61.      A recorrente sustenta que, através da disposição impugnada, o Conselho estendeu abusivamente o alcance do mecanismo de «phasing in», ultrapassando o âmbito de uma simples adaptação das condições de adesão, para efectuar uma verdadeira alteração das mesmas. Ao fazê‑lo, o Conselho proferiu a decisão, incorrendo em três vícios: incompetência por ter ultrapassado o âmbito do artigo 23.° do acto de adesão, base legal da referida decisão; violação do princípio da igualdade através da criação de uma descriminação não prevista no acto de adesão; violação do princípio da boa fé, uma vez que o compromisso resultante das negociações de adesão foi posto em causa de forma unilateral.

62.      A questão central, que determina a procedência do recurso e a sorte que se deve reservar aos três fundamentos de anulação é, como se pode ver, a de saber se, ao alargar o sistema de pagamentos parciais aos novos pagamentos directos, a disposição impugnada permaneceu nos limites da habilitação conferida ao Conselho pelo artigo 23.° do acto de adesão, limitando‑se a uma simples adaptação das disposições do referido acto, ou se efectuou uma alteração das condições de adesão definidas por este.

63.      Para responder a esta questão, há que determinar se, no acto de adesão, já tinha sido previsto que o mecanismo de «phasing in» era aplicável a todos os pagamentos directos. Por outras palavras, o artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999, introduzido neste regulamento pelo anexo II, capítulo 6, A, ponto 27, do acto de adesão, que institui o mecanismo dos pagamentos directos concedidos de acordo com um calendário «ao abrigo dos regimes de apoio referidos no artigo 1.°», aplica‑se a todos os pagamento directos, tal como são definidos no artigo 1.° do referido regulamento? Se fosse esse o caso, a alteração de formulação efectuada pela disposição impugnada, segundo a qual o mecanismo de «phasing in» se aplica a partir de então aos «pagamentos directos», destinar‑se‑ia simplesmente a ter em conta a instituição, pelo Regulamento n.° 1782/2003, de pagamentos directos para os frutos de casca rija e as culturas energéticas, bem como de pagamentos suplementares no sector do leite, e permaneceria, assim, dentro dos limites do conceito de «adaptações […] que se revelem necessárias em consequência de alterações da regulamentação comunitária», na acepção do artigo 23.° do acto de adesão. Se, pelo contrário, o sistema de pagamentos parciais introduzido pelo artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999 estivesse limitado ratione materiae aos instrumentos de apoio taxativamente enumerados no anexo desse regulamento, para o qual remete o artigo 1.° do mesmo, a alteração de formulação resultante da disposição impugnada traduziria uma verdadeira extensão do sistema de pagamentos parciais, não prevista inicialmente pelo acto de adesão, e teria assim por consequência uma verdadeira alteração das condições de adesão.

64.      Com efeito, é incontestável que o conceito de «adaptações […] que se revelem necessárias», na acepção do artigo 23.° do acto de adesão, só cobre medidas que não afectem, em caso algum, o âmbito de aplicação da disposição do acto de adesão que elas têm por objectivo adaptar nem alterem substancialmente o seu conteúdo. Este é o ensinamento que resulta da jurisprudência comunitária. O Tribunal de Justiça já decidiu que as disposições de adaptação previstas nos actos de adesão só autorizam, em princípio, as adaptações destinadas a tornar os actos comunitários anteriores aplicáveis nos novos Estados‑Membros, com exclusão de qualquer outra alteração (85). Analisando esta jurisprudência, o advogado‑geral L. A. Geelhoed deduziu dela, com razão, que o conceito de «adaptações» não podia ser interpretado «no sentido de abranger alterações substantivas aos actos comunitários ou medidas que permitem derrogações a esses actos» (86). É certo que, nesses processos, estavam em causa disposições que previam a adaptação dos actos comunitários que não tinham sido adaptados pelo próprio acto de adesão (87). Mas esta acepção muito restrita do conceito de «adaptações» foi dada de forma global, seja qual for a disposição do acto de adesão que constitua a base da adaptação adoptada e deve, portanto, por maioria de razão, ser considerada quando, como no presente caso, se trata de adaptar disposições do próprio acto de adesão, para ter em conta uma alteração das regras comunitárias a que estas disposições diziam respeito.

65.      Muito mais que isso, se as disposições do acto de adesão que as medidas em causa visam adaptar constituem derrogações das regras comunitárias normalmente aplicáveis, a fortiori, aquelas medidas não podem estender o âmbito de aplicação destas, tanto mais que as derrogações que constam dos actos de adesão devem ser limitadas ao estritamente necessário e interpretadas estritamente (88). Ora, no presente caso, o artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999, previsto no anexo II, capítulo 6, A, ponto 27, do acto de adesão, que a disposição impugnada visa substituir, constitui uma derrogação temporária do princípio do pagamento integral das ajudas directas. A referida disposição impugnada, portanto, só pode retomar o sistema dos pagamentos parciais instituído pelo referido artigo 1.°‑A no âmbito da regulamentação das ajudas directas inicialmente prevista pelo Regulamento n.° 1259/1999 para o aplicar no âmbito da regulamentação prevista no Regulamento n.° 1782/2003 que o substitui, sem aumentar o seu alcance (89). Do mesmo modo, mutatis mutandis, o Tribunal de Justiça censurou as medidas de adaptação adoptadas com base no artigo 57.° do acto de adesão que visavam conceder à República da Estónia e à República da Eslovénia um período transitório antes da abertura dos seus mercados de electricidade, prevista e regulada por uma directiva e um regulamento comunitários, porque «derrogações provisórias à aplicação de disposições de um acto comunitário, que apenas têm por objecto e finalidade adiar temporariamente a aplicação efectiva do acto comunitário em causa relativamente a um novo Estado‑Membro, não podem, em princípio, ser qualificadas de ‘adaptações’ na acepção do artigo 57.° do referido acto» (90).

66.      As partes em litígio têm, de resto, perfeita consciência de que a resolução do presente recurso depende do alcance do mecanismo das ajudas directas de acordo com um calendário, visto que estão em oposição quanto a este aspecto.

67.      Segundo a República da Polónia, o artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999 estava materialmente limitado aos instrumentos de apoio enumerados de forma exaustiva no anexo do referido regulamento. Em apoio desta interpretação, recorda que o acto de adesão «é baseado no princípio da aplicação imediata e integral das disposições do direito comunitário aos novos Estados‑Membros» (91). Daqui resultam as seguintes regras de interpretação (92): as derrogações previstas nos actos de adesão devem ser previstas expressamente; devem ser objecto de interpretação estrita; e, destinando‑se a facilitar a adaptação dos novos Estados‑Membros às regras comunitárias, devem ser interpretadas de forma a tornar mais fácil a realização das finalidades dos tratados institutivos e a aplicação integral das suas regras.

68.      Embora estas premissas jurisprudenciais invocadas pela recorrente sejam exactas, elas não têm por consequência a interpretação do artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999 que ela defende. Pelo contrário, resulta de uma interpretação literal, sistemática e teleológica que, como o Conselho e a Comissão sustentam, o sistema dos pagamentos parciais das ajudas directas introduzido no artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999 pelo acto de adesão era aplicável a todos os pagamentos directos, e não a um número limitado de ajudas directas enumeradas no anexo desse mesmo regulamento.

69.      Em primeiro lugar, resulta da própria letra do artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999 que o mecanismo de introdução das ajudas directas de acordo com um calendário se aplicava de modo geral aos «pagamentos directos [concedidos] ao abrigo dos regimes de apoio referidos no artigo 1.°». O próprio artigo 1.° do regulamento dava uma definição geral das ajudas directas como sendo as ajudas «concedid[a]s directamente aos agricultores a título dos regimes de apoio da [PAC], que são financiados, no todo ou em parte, pela secção Garantia do FEOGA». Qualquer ajuda agrícola que corresponda a esta definição, seja ela existente ou a instituir no futuro, devia, assim, ser considerada um pagamento directo para efeitos da aplicação do Regulamento n.° 1259/1999 (93). O artigo 1.°, segundo parágrafo, deste regulamento enuncia, é certo, que «[o]s regimes de apoio são enunciados no anexo». Mas, como a Comissão alega com razão, se os autores do tratado de adesão tivessem efectivamente tido a intenção de restringir o grupo de produtos sujeitos ao mecanismo de «phasing in», ter‑se‑iam simplesmente limitado a fazer referência aos regimes de apoio referidos no anexo do Regulamento n.° 1259/1999. Além disso, como a interpretação sistemática confirmará, esse anexo tinha apenas carácter declaratório.

70.      Esta interpretação literal é confirmada pela intenção dos autores do tratado de adesão. Com efeito, resulta dos trabalhos preparatórios da conferência de adesão que a intenção das instituições e dos antigos Estados‑Membros era impor o mecanismo de «phasing in», nos novos Estados‑Membros, para todos os pagamentos directos. No seu documento de reflexão de 30 de Janeiro de 2002 (94), a Comissão tinha, assim, preconizado a introdução progressiva dos «pagamentos directos», sem nunca acompanhar este vocábulo geral de precisões que seriam susceptíveis de restringir o seu alcance. Depois, numa posição comum da União Europeia de 31 de Outubro de 2002, que fixou a posição de negociação dos quinze Estados‑Membros relativamente à Polónia, exprimiu‑se a vontade de introduzir progressivamente os «pagamentos directos» neste Estado, durante um período transitório, sem que esta formulação geral fosse acompanhada de precisões susceptíveis de reduzir o seu alcance (95). É verdade que a recorrente retorque que a sua aceitação do sistema dos pagamentos parciais foi particularmente difícil e, por isso, ocorreu unicamente em consideração do facto de se tratar de um mecanismo excepcional, material e temporalmente limitado. Mas, de forma particularmente enquadrada, ocorreu precisamente a firme oposição que a República da Polónia constantemente manifestou, as conclusões do Conselho Europeu de Copenhaga de 12 e 13 de Dezembro de 2002, que relatam o resultado das negociações de adesão, indicam que a questão da introdução progressiva dos pagamentos directos nos novos Estados‑Membros foi resolvida segundo os termos estabelecidos na posição comum de 31 de Outubro de 2002. Assim, é evidente que a posição polaca a esse respeito não foi acolhida e nem sequer deu lugar a um compromisso que consistisse em limitar o alcance do mecanismo de «phasing in».

71.      Sobretudo, o facto de o mecanismo das ajudas de acordo com um calendário ter sido acordado para todos os pagamentos directos que correspondessem à definição geral dada pelo artigo 1.° do Regulamento n.° 1259/1999, revestindo a lista das ajudas directas que figuram em anexo apenas carácter declaratório, resulta também de uma leitura sistemática da referida disposição. Observe‑se, antes de mais, que, por força do artigo 1.° do Regulamento n.° 1259/1999, só são expressamente excluídos do âmbito de aplicação do referido regulamento os pagamentos directos «previstos no Regulamento (CE) n.° 1257/1999». Consequentemente, há que reconhecer que se o Regulamento n.° 1259/1999 só se destinasse a ser aplicado aos instrumentos de apoio directo enumerados no seu anexo, teria sido pouco lógico excluir do seu âmbito de aplicação aquilo que não estava nele incluído. Se, por outro lado, se alargar o contexto normativo, a competência de execução conferida à Comissão pelo artigo 11.°, n.° 4, segundo travessão, do Regulamento n.° 1259/1999, para adoptar, no respeito pelo procedimento do comité de gestão, «as alterações do anexo que se revelarem necessárias, tendo em conta os critérios definidos no artigo 1.°», não pode habilitá‑la a alterar o âmbito de aplicação desse regulamento, pois trata‑se de «um elemento essencial» que faz parte da competência legislativa exclusiva do Conselho (96). Não há, assim, qualquer dúvida de que o âmbito de aplicação do Regulamento n.° 1259/1999 estava delimitado pela definição geral dos pagamentos directos que resultava do artigo 1.° desse regulamento ou, para retomar os próprios termos dessa disposição, pelos «critérios» que nele eram enunciados, estando a Comissão unicamente habilitada a alterar o anexo do referido regulamento para dele fazer constar os pagamentos directos, instituídos ou alterados pelo legislador comunitário, que correspondiam a essa definição. Estava mesmo obrigada a fazê‑lo e, de resto, em Janeiro de 2004, antes da adesão, alterou efectivamente o referido anexo para nele incluir não apenas pagamentos directos criados após a adopção deste regulamento mas também outros pagamentos que, apesar de corresponderem à definição do artigo 1.° do Regulamento n.° 1259/1999, tinham sido esquecidos quando da redacção do anexo (97).

72.      Por último, se fizermos uma interpretação teleológica do artigo 1.°‑A do Regulamento n.° 1259/1999, a finalidade que justifica a implementação do sistema dos pagamentos directos de acordo com um calendário abona no sentido do alcance geral do mesmo. A preocupação de não tornar mais lenta a necessária reestruturação do sector agrícola dos novos Estados‑Membros e de não criar disparidades consideráveis de rendimentos e distorções sociais através da concessão de ajudas desproporcionadas relativamente ao nível dos rendimentos dos agricultores e da população em geral era válida para todo o sector agrícola, portanto, para todas as ajudas directas existentes ou futuras. Além disso, se o mecanismo das ajudas de acordo com um calendário só se aplicasse a algumas culturas – aquelas para as quais já se tinham instituído pagamentos directos – existiria o risco de os agricultores polacos as abandonarem para se consagrarem às culturas para as quais podiam obter 100% dos pagamentos directos.

73.      Assim, como se vê, o princípio da aplicação do mecanismo de «phasing in» a todas as ajudas directas tinha sido acordado quando das negociações de adesão e previsto expressamente pelo acto de adesão que introduziu o artigo 1.°‑A no Regulamento n.° 1259/1999. Por conseguinte, os fundamentos de anulação alegados pela recorrente contra a disposição impugnada não podem ser acolhidos.

74.      Quanto ao fundamento da incompetência, a aplicabilidade geral do sistema dos pagamentos parciais já tinha sido prevista pelo acto de adesão que tinha introduzido o artigo 1.°‑A no Regulamento n.° 1259/1999. Consequentemente, o facto de, por força da disposição impugnada, no Regulamento n.° 1782/2003 se prever expressamente a sua aplicação a todos os «pagamentos directos», designadamente às novas ajudas directas instauradas pelo referido regulamento, não constitui uma alteração mas uma simples adaptação do acto de adesão, que não põe em causa «o carácter fundamental dos resultados das negociações, [nem] os princípios em que assentam» (98). Esta adaptação tornou‑se necessária devido à alteração das regras da PAC, que o Regulamento n.° 1782/2003 realizou ao substituir o Regulamento n.° 1259/1999. Em resultado deste facto, as disposições do anexo II do acto de adesão que alteravam o Regulamento n.° 1259/1999 tornaram‑se obsoletas. Consequentemente, a decisão controvertida situa‑se seguramente dentro dos limites da habilitação conferida ao Conselho pelo artigo 23.° do acto de adesão.

75.      No que diz respeito ao fundamento relativo à violação do princípio da não discriminação, a argumentação da recorrente consiste, no essencial, em sustentar que a derrogação do princípio da igualdade de tratamento intrínseco ao mecanismo de «phasing in» foi arbitrariamente estendida para além dos limites traçados pelo acto de adesão. Contudo, como verificámos, a disposição controvertida não conferiu ao referido mecanismo um alcance mais vasto. Se existe violação do princípio da não discriminação em razão da nacionalidade, estabelecido no artigo 12.° do Tratado CE, e do princípio da não discriminação entre produtores da Comunidade, enunciado no artigo 34.°, n.° 2, CE, ela resulta, em todo o caso, do próprio acto de adesão, ou seja, de uma disposição que tem valor de direito primário, gozando, enquanto tal, de imunidade contenciosa (99). Além disso, é duvidoso que se verifique um desvio ao princípio da igualdade resultante do acto de adesão. Segundo jurisprudência assente, o princípio fundamental da igualdade só garante uma igualdade relativa, proibindo, salvo se houver uma justificação objectiva, o tratamento diferente de situações semelhantes ou o tratamento idêntico de situações diferentes (100). Ora, não foi contestado que a situação da agricultura nos novos Estados‑Membros era radicalmente diferente, justificando uma aplicação progressiva das ajudas comunitárias, em particular das relativas aos regimes de apoio directo, e isto com o objectivo de não perturbar a necessária reestruturação em curso no sector agrícola desses Estados.

76.      Por último, no que diz respeito à alegada violação do princípio da boa fé, é verdade que este princípio de direito internacional tem valor jurídico na ordem jurídica comunitária (101) e, como recorda o artigo 18.° da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 23 de Maio de 1969, que o codifica, proíbe a um Estado‑Membro adoptar actos que privem um tratado que tenha assinado do seu objecto ou do seu fim. Todavia, na medida em que o princípio da aplicação do mecanismo de «phasing in» aos pagamentos directos foi inscrito no acto de adesão, a disposição impugnada não alarga o seu alcance e, contrariamente ao que a recorrente pretende, não se pode considerar que põe em causa o compromisso resultante das negociações de adesão.

IV – Conclusão

77.      À luz das considerações expostas, sugiro ao Tribunal de Justiça que julgue a petição admissível e que negue provimento ao recurso.


1 – Língua original: português.


2 – JO L 93, p. 1, a seguir «decisão controvertida».


3 – Assinado em 16 de Abril de 2003 e entrado em vigor em 1 de Maio de 2004 (JO 2003, L 236, p. 17, a seguir «tratado de adesão»).


4 – JO 2003, L 236, p. 33, a seguir «acto de adesão».


5 – L’élargissement et l’agriculture: l’intégration réussie des nouveaux États membres dans la PAC, SEC (2002), 95 final.


6 – Posição comum de 31 de Outubro de 2002, CONF‑PL 81/02.


7 – JO L 160, p. 113.


8 – O artigo 1.° do Regulamento n.° 1259/1999 tem a seguinte redacção:


«O presente regulamento é aplicável aos pagamentos concedidos directamente aos agricultores a título dos regimes de apoio da [PAC], que são financiados, no todo ou em parte, pela secção Garantia do FEOGA, com excepção dos previstos no Regulamento (CE) n.° 1257/1999.


Os regimes de apoio são enunciados no anexo.»


9 – JO L 270, p. 1.


10 – V., designadamente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 1998, Comissão/Conselho (C‑309/95, Colect., p. I‑655); de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho (C‑122/95, Colect., p. I‑973, n.os 34 a 39); e do Tribunal de Primeira Instância de 28 de Janeiro de 1999, BAI/Comissão (T‑14/96, Colect., p. II‑139, n.os 32 a 36).


11 – V. acórdãos de 25 de Janeiro de 1979, Racke (98/78, Colect., p. 53, n.° 15), e Decker (99/78, Recueil, p. 101, n.° 3, Colect., p. 77).


12 – Idem.


13 – Idem.


14 – Já referido. Para outros exemplos, v. acórdãos de 9 de Janeiro de 1990, SAFA (C‑337/88, Colect., p. I‑1, n.° 12), e do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Janeiro de 1997, Opel Austria/Conselho (T‑115/94, Colect., p. II‑39, n.° 127).


15 – V. acórdão Opel Austria/Conselho, já referido (n.os 128 a 134).


16 – V. despacho de 15 de Novembro de 2006, Polónia/Conselho (C‑273/04, não publicado na Colectânea).


17 – Acórdãos, já referidos, Racke (n.° 16) e Decker (n.° 4). O sublinhado é meu.


18 – V., neste sentido, conclusões do advogado‑geral G. Reischl, de 16 de Março de 1977, no processo Société pour l’exportation des sucres/Comissão (acórdão de 31 de Março de 1977, 88/76, Colect., p. 249, Recueil, pp. 709, 731), e de 31 de Janeiro de 1980, no processo Könecke/Comissão (acórdão de 5 de Março de 1980, 76/79, Recueil, pp. 665, 683).


19 – O artigo 81.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, na sua versão em vigor no momento da interposição do recurso, tinha a seguinte redacção:


«Os prazos para a interposição de recursos contra actos de uma Instituição começam a correr no dia seguinte ao do recebimento da notificação do acto ou, tratando‑se de acto publicado, no décimo quinto dia a seguir à sua publicação no Jornal Oficial das Comunidades Europeias


20 – Cuja redacção é a seguinte:


«um prazo fixado em semanas, meses ou anos termina no fim do dia que, na última semana, mês ou ano tenha a mesma denominação ou o mesmo número que o dia em que ocorreu o evento ou em que se praticou o acto a partir dos quais se deve contar o prazo. Se, num prazo fixado em meses ou anos, o dia determinado para o seu termo não existir no último mês, o prazo termina no fim do seu último dia».


21 – Após a alteração dessa disposição do Regulamento de Processo introduzida em 28 de Novembro de 2000 (JO L 322, p. 1).


22 – O artigo 9.° da decisão controvertida tem a seguinte redacção:


«A presente decisão produz efeitos a 1 de Maio de 2004, sob reserva da entrada em vigor do Tratado de Adesão à União Europeia da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca.»


23 – O artigo 58.° do acto de adesão dispõe:


«Os textos dos actos das Instituições e do Banco Central Europeu adoptados antes da adesão e que tenham sido estabelecidos pelo Conselho, pela Comissão ou pelo Banco Central Europeu nas línguas checa, eslovaca, eslovena, estónia, húngara, letã, lituana, maltesa e polaca fazem fé, a partir da adesão, nas mesmas condições que os textos redigidos nas onze línguas actuais. Esses textos devem ser publicados no Jornal Oficial da União Europeia, sempre que os textos nas línguas actuais também o tenham sido.»


24 – O artigo 8.° da decisão controvertida prevê:


«A presente decisão é redigida nas línguas alemã, checa, dinamarquesa, eslovaca, eslovena, espanhola, estónia, finlandesa, francesa, grega, húngara, inglesa, italiana, irlandesa, letã, lituana, maltesa, neerlandesa, polaca, portuguesa, e sueca, fazendo igualmente fé os 21 textos.»


25 – Acórdão de 23 de Abril de 1986 (294/83, Colect., p. 1339, n.° 23).


26 – V. Simon, D. – «La Communauté de droit», Réalités et perspectives du droit communautaire des droits fondamentaux, Bruylant, Bruxelles, 2000, p. 85.


27 – Acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Maio de 2002, Jégo‑Quéré/Comissão (T‑177/01, Colect., p. II‑2365, n.° 41).


28 – V. acórdão de 15 de Maio de 1986, Johnston (222/84, Colect., p. 1651, n.° 18).


29 – V. acórdão de 13 de Março de 2007, Unibet (C‑432/05, Colect., p. I‑0000).


30 – V. acórdão de 18 de Março de 1997, Guérin Automobiles/Comissão (C‑282/95 P, Colect., p. I‑1503, n.os 33 a 40).


31 – Despachos de 3 de Maio de 1996, Alemanha/Comissão (C‑399/95 R, Colect., p. I‑2441, n.° 46), e de 23 de Fevereiro de 2001, Áustria/Conselho (C‑445/00 R, Colect., p. I‑1461, n.° 111).


32 – Acórdão de 15 de Março de 2005, Espanha/Eurojust (C‑160/03, Colect., p. I‑2077).


33 – Acórdão de 31 de Março de 1971, Comissão/Conselho, dito «AETR» (22/70, Colect., p. 69, n.os 40 e 41).


34 – Já referido (n.os 23 a 25).


35 – V. Lenaerts, K. – «The legal protection of private parties under the EC Treaty: a coherent and complete system of judicial review?», Mélanges en l’honneur de Giuseppe Federico Mancini, ed. Dott. A. Giuffre, Milão, 1998, pp. 591, 608 a 613.


36 – Acórdão de 17 de Janeiro de 1985 (11/82, Recueil, p. 207).


37 – Acórdão de 18 de Maio de 1994 (C‑309/89, Colect., p. I‑1853).


38 – V. Moitinho de Almeida, J. C. – «Le recours en annulation des particuliers: nouvelles réflexions sur l’expression ‘la concernent... individuellement’», Mél. Ulrich Everling, Nomos Verlagsgesellschaft, Baden‑Baden, 1995, pp. 849, 868.


39 – Acórdão de 28 de Janeiro de 1986 (169/84, Colect., p. 391).


40 – Conclusões de 16 de Outubro de 1985, Colect. 1986, p. 403.


41 – Acórdão de 21 de Fevereiro de 1984 (239/82 e 275/82, Recueil, p. 1005, n.° 13).


42 – Conclusões no processo os Verdes/Parlamento, já referido (Colect. 1986, p. 1350).


43 – Acórdão os Verdes/Parlamento, já referido (n.os 23 a 25).


44 – Acórdão de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho (C‑70/88, Colect., p. I‑2041).


45 – Acórdão de 25 de Julho de 2002 (C‑50/00 P, Colect., p. I‑6677).


46 – V. as minhas conclusões de 21 de Outubro de 2004 no processo Comissão/max.mobil (acórdão de 22 de Fevereiro de 2005, C‑141/02 P, Colect., p. I‑1283, n.° 48 das conclusões e, em particular, a respectiva nota 50).


47 – Acórdão Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, já referido (n.° 45).


48 – Ibidem (n.os 41 e 42).


49 – Acórdão de 27 de Fevereiro de 2007 (C‑354/04 P, Colect., p. I‑0000).


50 – V., contudo, o processo pendente no Tribunal de Primeira Instância, Confederação Suíça/Comissão, T‑319/05.


51 – Cuja redacção é a seguinte:


«Os Estados‑Membros e as instituições das Comunidades podem intervir nas causas submetidas ao Tribunal.


O mesmo direito é reconhecido a qualquer pessoa que demonstre interesse na resolução da causa submetida ao Tribunal, excepto se se tratar de causas entre Estados‑Membros, entre instituições das Comunidades, ou entre Estados‑Membros, de um lado, e instituições das Comunidades, do outro.


[...]»


52 – V. despacho de 23 de Fevereiro de 1983, Chris International Foods/Comissão (91/82 R e 200/82 R, Recueil, p. 417). Observe‑se que o facto de uma decisão que a Comissão tinha dirigido ao Reino da Suécia, Estado terceiro na altura dos factos, ter sido considerada impugnável enquanto «decisão dirigida a outra pessoa», na acepção do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, também incita a que se considere que o termo «pessoa», quando é empregue pelo contencioso comunitário, pode visar igualmente um Estado terceiro (v. acórdão de 29 de Junho de 1994, Fiskano/Comissão, C‑135/92, Colect., p. I‑2885).


53 – V. despacho do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Julho de 2006, Confederação Suíça/Comissão (T‑319/05, Colect., p. II‑2073).


54 – Acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Junho de 1999, Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia/Comissão (T‑288/97, Colect., p. II‑1871, n.° 41).


55 – V., por exemplo, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Abril de 1998, Vlaams Gewest/Comissão (T‑214/95, Colect., p. II‑717, n.° 28).


56 – V., por exemplo, acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Novembro de 2001, Nederlandse Antillen/Conselho (C‑452/98, Colect., p. I‑8973, n.° 51); de 10 de Abril de 2003, Comissão/Nederlandse Antillen (C‑142/00 P, Colect., p. I‑3483, n.° 59); e do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Dezembro de 1999, Freistaat Sachsen e o./Comissão (T‑132/96 e T‑143/96, Colect., p. II‑3663, n.° 81); bem como despacho do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Julho de 2004, Região Autónoma dos Açores/Conselho (T‑37/04 R, Colect., p. II‑2153, n.° 112).


57 – V., neste sentido, acórdão Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia/Comissão, já referido (n.° 49).


58 – V. acórdão Nederlandse Antillen/Conselho, já referido (n.os 47 a 50).


59 – Acórdãos de 6 de Outubro de 1982, Alusuisse Italia/Conselho e Comissão (307/81, Recueil, p. 3463, n.° 8), e Nederlandse Antillen/Conselho, já referido (n.° 52).


60 – Para retomar a fórmula reiteradamente recordada pela jurisprudência para caracterizar um acto normativo: v., por exemplo, acórdão de 17 de Junho de 1980, Calpak er Società Emiliana Lavorazione Frutta/Comissão (789/79 e 790/79, Recueil, p. 1949, n.° 9); despacho de 20 de Maio de 1987, Champlor e o./Comissão (233/86 a 235/86, Colect., p. 2251, n.° 9); e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Junho de 1996, Kahn Scheepvaart/Comissão (T‑398/94, Colect., p. II‑477, n.° 39).


61 – V., neste sentido, acórdão Comissão/Nederlandse Antillen, já referido (n.° 6), e despacho Região Autónoma dos Açores/Conselho, já referido (n.° 113).


62 – V. acórdão Codorniu/Conselho, já referido (n.° 19).


63 – Conhece‑se a firmeza com a qual o Tribunal de Justiça, no acórdão Unión de Pequeños Agricultores/Conselho (já referido, n.os 36 e 37), recordou que, sem a satisfação das condições impostas pelo acórdão Plaumann/Comissão (acórdão de 15 de Julho de 1963, 25/62, Colect. 1962‑1964, p. 279), não pode haver individualização.


64 – Acórdão Plaumann/Comissão, já referido, p. 284.


65 – Acórdãos, já referidos, Nederlandse Antillen/Conselho (n.° 64) e Comissão/Nederlandse Antillen (n.° 69). Encontram‑se fórmulas análogas, no que se refere a recursos interpostos por regiões, designadamente, nos despachos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Junho de 1998, Communidad Autónoma de Cantabria/Conselho (T‑238/97, Colect., p. II‑2271); de 23 de Outubro de 1998, Regione Puglia/Comissão e Espanha (T‑609/97, Colect., p. II‑4051); e Região Autónoma dos Açores/Comissão, já referido (n.° 118).


66 – V. acórdãos, já referidos, Nederlandse Antillen/Conselho (n.os 66 a 72) e Comissão/Nederlandse Antillen (n.os 71 a 76).


67 – V. a crítica a esta jurisprudência, emitida por Wakefield, J. – «The plight of the regions in a multi‑layered Europe», ELR, 2005, p. 406.


68 – V., designadamente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1985, Cockerill‑Sambre (42/85, Recueil, p. 3749, n.° 10), e de 15 de Janeiro de 1987, Misset/Conselho (152/85, Colect., p. 223, n.° 11); despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Fevereiro de 1992, França/Comissão (C‑59/91, Colect., p. I‑525, n.° 8); acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Janeiro de 1997, Coen (C‑246/95, Colect., p. I‑403, n.° 21); despacho do Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2004, Forum des migrants/Comissão (C‑369/03 P, Colect., p. I‑1981, n.° 16); acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1997, Mutual Aid Administration Services/Comissão (T‑121/96 e T‑151/96, Colect., p. II‑1355, n.° 38); e despacho do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Janeiro de 2001, Confindustria e o./Comissão (T‑126/00, Colect., p. II‑85, n.° 21).


69 – Acórdão Misset/Conselho, já referido (n.° 11), bem como despachos, já referidos, França/Comissão (n.° 8) e Confindustria e o./Comissão (n.° 21).


70 – Acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Junho de 1998, Svenska Journalistförbundet/Conselho (T‑174/95, Colect., p. II‑2289, n.° 50).


71 – Despacho Forum des migrants/Comissão, já referido (n.° 16); v., igualmente, despacho França/Comissão, já referido (n.° 8).


72 – Despacho de 17 de Maio de 2002, Alemanha/Parlamento e Conselho (C‑406/01, Colect., p. I‑4561, n.° 20).


73 – V. acórdão Unibet, já referido (n.° 43).


74 – V., neste sentido, acórdãos de 16 de Fevereiro de 1982, Halyvourgiki e Helleniki Halyvourgia/Comissão (39/81, 43/81, 85/81 e 88/81, Recueil, p. 593, n.° 10); bem como de 28 de Novembro de 2006, Parlamento/Conselho (C‑413/04, Colect., p. I‑11221, n.os 66 a 68) e Parlamento/Conselho (C‑414/04, Colect., p. I‑11279, n.os 43 a 45).


75 – V. acórdãos, já referidos, Parlamento/Conselho (C‑413/04, n.° 68) e Parlamento/Conselho (C‑414/04, n.° 45).


76 – V., neste sentido, acórdãos de 7 de Fevereiro de 1973, Comissão/Itália (39/72, Colect., p. 39, n.° 24), e de 7 de Fevereiro de 1979, Comissão/Reino Unido (128/78, Colect., p. 187, n.° 12).


77 – Idem.


78 –      V. acórdãos Opel Austria/Conselho, já referido (n.os 90 e 91); do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Maio de 2001, Kaufring e o./Comissão (T‑186/97, T‑187/97, T‑190/97 a T‑192/97, T‑210/97, T‑211/97, T‑216/97 a T‑218/97, T‑279/97, T‑280/97, T‑293/97 e T‑147/99, Colect., p. II‑1337, n.° 237); e de 17 de Janeiro de 2007, Grécia/Comissão (T‑231/04, Colect., p. II‑0000, n.os 86 e 87).


79 – V. acórdãos, já referidos, Parlamento/Conselho (C‑413/04, n.os 66 a 68) e Parlamento/Conselho (C‑414/04, n.os 43 a 45).


80 – V. acórdão de 27 de Setembro de 1988, Parlamento/Conselho (302/87, Colect., p. 5615).


81 – Ibidem (n.° 28).


82 – Acórdão de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho, já referido.


83 – Isto resulta em particular do n.os 22, 24 e 25 do acórdão de 22 de Maio de 1990, Parlamento/Conselho, já referido, que têm a seguinte redacção:


«22 O respeito do equilíbrio institucional implica que cada uma das instituições exerça as suas competências com respeito pelas das outras. Exige ainda que qualquer desrespeito a esta regra que venha a ter lugar possa ser sancionado.



[…]



24 No exercício desta missão, o Tribunal não poderia, decerto, contar o Parlamento entre as instituições que, com base no artigo 173.° do Tratado CEE ou no artigo 146.° do Tratado CEEA, podem interpor recurso, sem terem que demonstrar a existência de interesse em agir.



25 Incumbe‑lhe, em todo o caso, assegurar a plena aplicação das disposições dos tratados relativas ao equilíbrio institucional, e actuar de forma a que, tal como as outras instituições, o Parlamento não possa ser atingido nas suas prerrogativas sem dispor de um recurso jurisdicional, entre os que são previstos pelos tratados, que possa ser exercido de maneira certa e eficaz.»


84 – Para algumas ilustrações desta jurisprudência, v. acórdãos de 16 de Julho de 1992, Parlamento/Conselho (C‑65/90, Colect., p. I‑4593); de 30 de Junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, Colect., p. I‑3685, n.° 32); de 1 de Junho de 1994, Parlamento/Conselho (C‑388/92, Colect., p. I‑2067); de 13 de Julho de 1995, Parlamento/Comissão (C‑156/93, Colect., p. I‑2019); de 7 de Março de 1996, Parlamento/Conselho (C‑360/93, Colect., p. I‑1195); de 18 de Junho de 1996, Parlamento/Conselho (C‑303/94, Colect., p. I‑2943, n.os 17 a 20); e de 10 de Junho de 1997, Parlamento/Conselho (C‑392/95, Colect., p. I‑3213).


85 – V. acórdão de 2 de Outubro de 1997, Parlamento/Conselho (C‑259/95, Colect., p. I‑5303, n.os 14 e 19), bem como acórdãos, já referidos, Parlamento/Conselho (C‑413/04, n.os 31 a 38) e Parlamento/Conselho (C‑414/04, n.os 29 a 36).


86 – V. conclusões de 1 de Junho de 2006, no processo Parlamento/Conselho (C‑414/04, n.° 46).


87 – Tratava‑se, nos acórdãos Parlamento/Conselho (C‑413/04) e Parlamento/Conselho (C‑414/04), já referidos, do artigo 57.° do acto de adesão e, no acórdão Parlamento/Conselho (C‑259/95), já referido, de uma disposição semelhante contida no artigo 169.° do Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, e JO 1995, L 1, p. 1).


88 – V. acórdãos de 29 de Março de 1979, Comissão/Reino Unido (231/78, Recueil, p. 1447); de 25 de Fevereiro de 1988, Comissão/Grécia (194/85 e 241/85, Colect., p. 1037); de 14 de Dezembro de 1989, Agegate (C‑3/87, Colect., p. 4459, n.° 39); e de 3 de Dezembro de 1998, KappAhl (C‑233/97, Colect., p. I‑8069, n.° 18).


89 – V., neste sentido, mutatis mutandis, acórdão, já referido, Parlamento/Conselho (C‑413/04, n.os 39 a 52).


90 – Acórdãos, já referidos, Parlamento/Conselho (C‑413/04, n.° 38) e Parlamento/Conselho (C‑414/04, n.° 36).


91 – V. acórdãos de 9 de Dezembro de 1982, Metallurgiki Halyps/Comissão (258/81, Recueil, p. 4261, n.° 8), e KappAhl, já referido (n.° 15).


92 – Recordadas pelo advogado‑geral G. Cosmas nas suas conclusões, de 9 de Julho de 1998, no processo KappAhl (Colect. 1998, pp. I‑8069, I‑8071, n.° 37 e jurisprudência aí referida).


93 – O facto de o Regulamento n.° 1259/1999 também se destinar a ser aplicado a todos os pagamento directos resulta igualmente do seu preâmbulo (v. primeiro considerando: «Considerando que devem ser estabelecidas algumas condições comuns para os pagamentos directos efectuados a título dos vários regimes de apoio ao rendimento no âmbito da [PAC]»).


94 – Op. cit. (n.° 4. 3).


95 – Ponto 10a.


96 – V., quanto a este conceito de «elemento essencial», que só pode ser fixado pelo legislador comunitário, acórdãos de 17 de Dezembro de 1970, Köster (25/70, Colect. 1969‑1970, p. 659, n.° 6), e de 27 de Outubro de 1992, Alemanha/Comissão (C‑240/90, Colect., p. I‑5383, n.° 37).


97 – V. Regulamento (CE) n.° 41/2004 da Comissão, de 9 de Janeiro de 2004, que altera e rectifica o anexo do Regulamento n.° 1259/1999 (JO L 6, p. 19).


98 – Como recorda o preâmbulo da decisão controvertida, já referida (v. terceiro considerando).


99 – V. acórdão de 28 de Abril de 1988, LAISA e CPC España/Conselho (31/86 e 35/86, Colect., p. 2285, n.os 6 a 18). A possibilidade de uma certa fiscalização jurisdicional das disposições de direito primário ainda não está totalmente afastada (Bieber, R. – «Les limites matérielles et formelles à la révision des traités établissant la Communauté européenne», RMC 1993, p. 343; Da Cruz Vilaça, J. L., e Piçarra, N. – «Y a‑t‑il des limites matérielles à la révision des traités instituant les Communautés européennes?», CDE, 1993, p. 3), mas aqui não é necessário recorrer a ela.


100 – V. acórdão de 17 de Julho de 1963, Itália/Comissão (13/63, Colect. 1962‑1964, pp. 305, 314). V., de seguida, por exemplo, acórdão de 20 de Setembro de 1988, Espanha/Conselho (203/86, Colect., p. 4563, n.° 25).


101 – V. acórdãos, já referidos, Opel Austria/Conselho (n.os 90 e 91), Kaufring e o./Comissão (n.° 237) e Grécia/Comissão (n.os 86 e 87).