Language of document : ECLI:EU:C:2016:320

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 3 de maio de 2016 (1)

Processo C‑560/14

M

contra

Minister for Justice and Equality Ireland and the Attorney General

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Supreme Court (Irlanda)]

«Reenvio prejudicial — Espaço de liberdade, segurança e justiça — Diretiva 2004/83/CE — Normas mínimas relativas às condições de concessão do estatuto de refugiado ou do estatuto conferido pela proteção subsidiária — Proteção subsidiária — Regularidade do procedimento nacional seguido no tratamento de um pedido de proteção subsidiária na sequência do indeferimento de um pedido de concessão do estatuto de refugiado — Direito de ser ouvido — Alcance — Necessidade de uma audição oral — Direito de indicar e de inquirir testemunhas em contraditório»





1.        O presente processo oferece ao Tribunal de Justiça a oportunidade de esclarecer mais aprofundadamente o alcance do direito de ser ouvido, no direito da União (2), especialmente no respeitante ao reconhecimento de concessão de proteção subsidiária, nos termos da Diretiva 2004/83 (3).

2.        O pedido de decisão prejudicial apresentado ao Tribunal de Justiça pela Supreme Court da Irlanda surgiu no âmbito do recurso, que foi submetido à apreciação desta, contra a decisão que a High Court proferiu, na sequência da prolação, pelo Tribunal de Justiça, do acórdão no processo M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744). A questão prejudicial da Supreme Court insere‑se no quadro do sistema irlandês de reconhecimento de proteção internacional em vigor à época dos factos do processo, o qual já deu origem a diversas questões prejudiciais submetidas ao Tribunal de Justiça (4). A particularidade da regulamentação irlandesa, atualmente objeto de duas reformas (5), residia na escolha de criar um sistema «dualista», caracterizado pela existência de dois procedimentos específicos e distintos para o tratamento dos pedidos de asilo, por um lado, e dos pedidos de reconhecimento de proteção subsidiária, por outro.

3.        No acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), o Tribunal de Justiça sublinhou a importância de, num sistema deste tipo, o direito de ser ouvido (6) ser plenamente garantido no âmbito de cada um desses dois procedimentos, tendo em conta o caráter fundamental de que o mesmo se reveste. Resulta, contudo, dos autos do presente processo, que o acórdão M.M. foi objeto de interpretações divergentes das partes, no que se refere ao alcance exato que o Tribunal de Justiça reconheceu a esse direito. Mais concretamente, as partes discordam quanto a saber se resulta ou não do referido acórdão que, num sistema deste tipo, para que o direito de ser ouvido seja plenamente garantido no procedimento de concessão de proteção subsidiária, é necessário que seja concedida ao requerente uma audição oral, perante a administração que se pronunciará sobre o seu pedido, na qual se possam indicar testemunhas, quando já teve lugar uma audição oral no âmbito do procedimento anterior relativo ao seu pedido de asilo. Esta é, no essencial, a questão que o Tribunal de Justiça é chamado a responder no presente processo.

I –    Quadro jurídico

A –    Direito da União

4.        De acordo com o seu artigo 1.o, a Diretiva 2004/83 tem por objetivo estabelecer normas mínimas relativas, por um lado, aos requisitos que os nacionais de países terceiros ou os apátridas têm de cumprir para poderem beneficiar de proteção internacional e, por outro, ao conteúdo da proteção concedida.

5.        De acordo com o artigo 2.o, alínea e), da Diretiva 2004/83, uma pessoa é elegível para proteção subsidiária se existirem motivos significativos para acreditar que, caso volte para o seu país de origem, correria um risco real de sofrer ofensa grave na aceção do artigo 15.o da mesma diretiva. Nos termos deste último artigo são ofensas graves a pena de morte ou a execução [alínea a)], ou a tortura ou a pena ou tratamento desumano ou degradante do requerente [alínea b)], ou ainda, a ameaça grave contra a vida ou a integridade física de um civil, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno [alínea c)].

6.        O artigo 4.o da Diretiva 2004/83, incluído no seu capítulo II, por seu turno intitulado «[a]preciação do pedido de proteção internacional» fornece indicações sobre o modo como deve ser efetuada a apreciação dos factos e circunstâncias subjacentes a esses pedidos. Designadamente, o mesmo prevê, na segunda frase do seu n.o 1, que incumbe ao Estado‑Membro apreciar, em cooperação com o requerente, os elementos pertinentes do pedido de proteção internacional. O n.o 3 desse artigo dispõe, igualmente, que a apreciação do pedido de proteção internacional deve ser efetuada a título individual e ter em conta toda uma série de elementos aí indicados, incluindo, nomeadamente, nos termos da alínea c), desse número, a situação e as circunstâncias pessoais do requerente, por forma a apreciar, com base na sua situação pessoal, se os atos a que foi ou possa vir a ser exposto podem ser considerados perseguição ou ofensa grave.

7.        A Diretiva 2005/85 (7) estabelece normas mínimas para o procedimento de apreciação dos pedidos de concessão do estatuto de refugiado. O artigo 3.o, dessa diretiva define o âmbito de aplicação da mesma e dispõe, no seu n.o 1, que esta é aplicável a todos os pedidos de asilo. Contudo, nos termos do n.o 3 do mesmo artigo, «[q]uando os Estados‑Membros aplicarem ou introduzirem um procedimento no âmbito do qual os pedidos de asilo sejam apreciados como pedidos com base na Convenção de Genebra e como pedidos de outros tipos de proteção internacional concedida nas circunstâncias definidas no artigo 15.o da Diretiva 2004/83/CE, devem aplicar a presente diretiva ao longo de todo esse procedimento». O n.o 4, do mesmo artigo, dispõe que «[a]lém disso, os Estados‑Membros podem decidir aplicar a presente diretiva aos procedimentos de apreciação de pedidos de qualquer tipo de proteção internacional».

8.        O artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 2005/85, intitulado «Entrevista pessoal» dispõe que «[a]ntes de o órgão de decisão se pronunciar, deve ser concedida aos requerentes de asilo uma entrevista pessoal sobre o seu pedido, a qual deve ser conduzida por uma pessoa competente para o fazer, nos termos do direito nacional». Todavia, em conformidade com os n.os 2 e 3, do mesmo artigo esta entrevista pessoal pode ser omitida numa série de casos aí indicados (8).

B –    Direito nacional

9.        Tal como foi já referido, na Irlanda, na vigência da regulamentação aplicável aos factos no caso em apreço, os pedidos de asilo e os de concessão de proteção internacional eram objeto de procedimentos específicos e distintos que se desenrolavam um a seguir ao outro.

10.      O procedimento de concessão de proteção subsidiária era regulado pelo European Communities (Eligibility for Protection) Regulations 2006, adotado pelo Minister for Justice, Equality and Law Reform (a seguir «Minister») em 9 de outubro de 2006, e que tem por objeto, nomeadamente, a transposição da Diretiva 2004/83.

11.      O referido regulamento não continha nenhuma disposição que previsse que o requerente da proteção subsidiária devesse ser ouvido numa entrevista pessoal no âmbito da instrução do seu pedido. O regime do procedimento para o tratamento dos pedidos de proteção subsidiária foi, entretanto, objeto de duas reformas (9), as quais não são, todavia, rationae temporis, relevantes no presente processo.

II – Matéria de facto, processo nacional e questão prejudicial

12.      A tramitação dos procedimentos relativos aos pedidos de asilo e de proteção subsidiária de M perante as autoridades irlandesas está pormenorizadamente exposto nos n.os 39 a 46 do acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), para os quais expressamente se remete. Na medida do necessário para efeitos do presente processo, limito‑me a recordar que M, cidadão ruandês, de etnia tutsi, entrou, inicialmente, na Irlanda em 2006 com um visto de estudante e que, após esse visto ter expirado, em 2008, apresentou um pedido de concessão do estatuto de refugiado. No âmbito do procedimento relativo a este pedido, M foi ouvido no decurso de uma entrevista pessoal, que teve lugar no Office of the Refugee Application Commissioner. M interpôs recurso contra a decisão desfavorável deste último organismo para o Refugee Appeal Tribunal, o qual, na sequência de um processo que foi conduzido exclusivamente por escrito, indeferiu definitivamente o pedido de asilo de M, considerando pouco credíveis as suas afirmações a respeito do risco de perseguição que correria, caso voltasse para o Ruanda.

13.      M apresentou ao Minister, em dezembro de 2008, um pedido de concessão de proteção subsidiária, que também foi indeferido. Na sua decisão de indeferimento, adotada sem que tivesse sido concedida qualquer audição oral a M, no que diz respeito ao seu pedido de proteção subsidiária, o Minister concluiu que o mesmo não tinha feito prova da existência de motivos fundados para crer que, caso voltasse para o Ruanda, correria um risco de ofensa grave na aceção do artigo 15.o da Diretiva 2004/83. Resulta dos autos que, para justificar essa decisão, o Minister se limitou, em grande medida, a fazer referência aos motivos anteriormente invocados para o indeferimento do pedido de asilo de M.

14.      M impugnou a decisão do Minister na High Court, a qual, no âmbito do processo de recurso, submeteu ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial. Tal questão visava, essencialmente, perguntar ao Tribunal de Justiça se, num caso como o de M, em que um requerente pede a concessão de proteção subsidiária na sequência de uma recusa de concessão do estatuto de refugiado, a exigência de cooperação, prevista no artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2004/83, obriga as autoridades de um Estado‑Membro, quando pretendam adotar uma decisão desfavorável, a fornecer ao requerente os resultados da sua avaliação, antes desta decisão, de modo a permitir‑lhe reagir aos aspetos da proposta de decisão que apontam para uma resposta negativa.

15.      No acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), depois de ter respondido em sentido negativo à questão prejudicial que lhe foi submetida pela High Court (10), o Tribunal de Justiça, nos n.os 75 e segs., sublinhou especificamente a exigência de que sejam respeitados, no âmbito de cada um dos dois procedimentos ‐ ou seja, o de asilo e o relativo à proteção subsidiária —, os direitos fundamentais do requerente e, em especial, o seu direito de ser ouvido, no sentido de ter a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil, as suas próprias observações antes da adoção de qualquer decisão que recuse o benefício da proteção pedida. Mais concretamente, no n.o 95, segundo travessão, deste acórdão, o Tribunal de Justiça afirmou que, num sistema dualista como o irlandês, «a circunstância de o interessado já ter sido utilmente ouvido no momento da instrução do seu pedido de concessão do estatuto de refugiado não implica que essa formalidade possa ser dispensada no âmbito do procedimento relativo ao pedido de proteção subsidiária».

16.      Na sequência da prolação do acórdão do Tribunal de Justiça, a High Court proferiu a sua própria decisão, em 23 de janeiro de 2013 (11). Entendeu que, ao contrário do que M defendeu, o Tribunal de Justiça, no acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), não tinha tido a intenção de declarar que, num sistema «dualista» como o irlandês, o direito da União prevê, em regra, o direito do requerente a uma audição oral pessoal no âmbito de um procedimento relativo a um pedido de proteção subsidiária, ainda que em muitos casos esse direito possa existir. No entanto, a High Court anulou a decisão do Minister considerando que, no caso em apreço, o mesmo não respeitara o direito de M de ser ouvido no procedimento relativo ao pedido de proteção subsidiária. Com efeito, a High Court considerou, por um lado, que o Minister se tinha baseado inteiramente em constatações negativas, efetuadas no âmbito da apreciação do pedido de asilo, no que se refere à credibilidade das alegações de M relativas à ofensa que sofreria caso voltasse para o Ruanda e, por outro, que o mesmo não tinha efetuado uma avaliação separada e independente das afirmações feitas por M como fundamento do seu pedido (12).

17.      O Minister, a Irlanda e o Attorney General interpuseram recurso da decisão da High Court no órgão jurisdicional de reenvio, alegando que este tribunal interpretou erradamente o acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744). M, por seu lado, interpôs um recurso subordinado no qual alega que, contrariamente ao que a High Court considerou, resultaria do referido acórdão do Tribunal de Justiça que ele tem direito a uma entrevista pessoal no procedimento relativo ao seu pedido de proteção subsidiária.

18.      O órgão jurisdicional de reenvio assinala a necessidade de orientações quanto à correta aplicação dos princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça no n.o 85 e segs. do acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), num caso como o que está em apreço, em que existem procedimentos separados de apreciação de pedidos de asilo e de proteção subsidiária.

19.      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O ‘direito de ser ouvido’, estabelecido pelo direito da União Europeia, exige que um pedido de proteção subsidiária apresentado nos termos da Diretiva 2004/83/CE, seja objeto de uma audiência de alegações, que inclua o direito de [indicar] ou de [inquirir] testemunhas [em contraditório], quando esse pedido seja feito em circunstâncias em que os Estados‑Membros em causa prevejam dois procedimentos autónomos, um para apreciar os pedidos de concessão do estatuto de refugiado e outro para os pedidos de proteção subsidiária, respetivamente?»

III – Tramitação processual no Tribunal de Justiça

20.      O despacho de reenvio deu entrada na secretaria em 5 de dezembro de 2014. Apresentaram observações M, os Governos irlandês, francês e checo, bem como a Comissão Europeia. Na audiência, que teve lugar em 18 de fevereiro de 2016, intervieram M, o Governo irlandês e a Comissão.

IV – Análise jurídica

21.      Com a sua questão prejudicial o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, no direito da União, o direito de ser ouvido em todos os procedimentos deve ser interpretado no sentido de que, quando um pedido de concessão do estatuto de proteção subsidiária for apresentado num Estado‑Membro que preveja dois procedimentos autónomos, um subsequente ao outro, para apreciar os pedidos de asilo e de proteção subsidiária, respetivamente, esse direito exige, necessariamente, que, no procedimento relativo ao seu pedido de proteção subsidiária, seja concedida ao requerente uma audição oral, na qual este tem o direito de indicar e de inquirir testemunhas em contraditório.

22.      Como já foi referido, o presente pedido de decisão prejudicial surge na sequência do acórdão do Tribunal de Justiça no processo M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), cuja interpretação é decisiva para efeitos da solução do litígio pendente no órgão jurisdicional de reenvio. As partes no processo principal, bem como os intervenientes no presente processo, defendem posições opostas quanto à forma como este acórdão deve ser interpretado.

23.      Por um lado, M alega que, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça tinha reconhecido a necessidade de, numa situação como a que está em causa no processo principal, ser concedida ao requerente a proteção subsidiária numa audição oral, de modo a que possa considerar‑se respeitado o seu direito de ser ouvido. A Comissão também considera que, num caso desta natureza, o respeito do direito de ser ouvido exige a realização de uma audiência de alegações. Por outro lado, o Governo irlandês, cuja posição é apoiada pelos Governos francês e checo, defende a posição oposta e considera que, num caso desta natureza, para que o direito de ser ouvido seja respeitado, basta que o requerente tenha tido oportunidade de se pronunciar de forma exaustiva, ainda que apenas por escrito, sobre todos os motivos que serviram de base ao seu pedido de proteção subsidiária.

24.      Na medida em que, tal como no processo M.M., o presente reenvio prejudicial levanta igualmente, em termos gerais, a questão do alcance do direito de ser ouvido, no direito da União, numa situação específica como a que está em causa no processo principal (13), parece‑me útil, a fim de dar resposta à questão prejudicial, passar em revista brevemente os princípios enunciados pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência recente relativa a este direito.

A –    Princípios jurisprudenciais em matéria de direito de ser ouvido, no direito da União

25.      Segundo jurisprudência constante, o respeito dos direitos de defesa constitui um princípio fundamental do direito da União, do qual o direito de ser ouvido em todos os procedimentos é parte integrante (14).

26.      O direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de ser tomada a seu respeito uma medida individual que a afete desfavoravelmente já se encontra expressamente consagrado no n.o 2, alínea a), do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, enquanto expressão concreta do direito a uma boa administração (15).

27.      Como tive a oportunidade de referir ainda recentemente (16), a questão da aplicabilidade do artigo 41.o da Carta aos Estados‑Membros quando dão execução ao direito da União (17) continua a ser objeto de controvérsia na jurisprudência. De acordo com uma primeira corrente jurisprudencial, que subscrevo (18), este artigo é uma disposição de aplicação geral que é aplicável não só às instituições, aos órgãos e aos organismos da União, mas também aos Estados‑Membros quando estes adotam medidas em execução do direito da União (19). Outra corrente jurisprudencial baseia‑se no teor literal da disposição, que se dirige, de forma explícita, unicamente às instituições, órgãos e organismos da União, e não aos Estados‑Membros. De acordo com esta corrente, daí resultaria que o direito de ser ouvido de uma pessoa que é parte num procedimento perante a administração de um Estado‑Membro, no qual esta aplica o direito da União não encontra o seu fundamento no artigo 41.o da Carta, mas no princípio geral do direito da União do respeito pelos direitos de defesa (20).

28.      No presente processo, contudo, esta questão, embora tenha uma certa importância no que respeita à definição exata da base jurídica em que assenta o direito de ser ouvido de M, na realidade, como a Comissão referiu na audiência, não tem qualquer efeito prático, dado que a necessidade de as autoridades irlandesas respeitarem este direito é incontestável, independentemente do facto de o mesmo se basear no artigo 41.o da Carta ou num princípio geral do direito da União.

29.      Quanto ao conteúdo do direito de ser ouvido, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que este direito garante que qualquer pessoa tenha a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses (21). O referido direito implica igualmente que a Administração preste toda a atenção necessária às observações assim submetidas pelo interessado, examinando, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto e fundamentando a sua decisão de forma circunstanciada (22).

30.      Foi referido que o direito de ser ouvido tem uma dupla função: por um lado, permitir a instrução do processo e um apuramento dos factos tão precisos quanto possível e, por outro, assegurar uma proteção efetiva do interessado. O mesmo visa, em especial, assegurar que qualquer decisão que afete desfavoravelmente uma pessoa seja adotada com pleno conhecimento de causa (23) e tem, designadamente, por objetivo permitir que a autoridade competente possa corrigir um erro ou o interessado invocar determinados elementos relativos à sua situação pessoal que militam no sentido de que a decisão seja tomada ou não seja tomada ou possua determinado conteúdo (24).

31.      Sempre que as Administrações dos Estados‑Membros tomem decisões abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito da União, incumbe‑lhes a obrigação de respeitar os direitos de defesa, e, consequentemente, o direito de ser ouvido, dos destinatários de decisões que afetem sensivelmente os seus interesses, mesmo quando a regulamentação aplicável não preveja expressamente essa formalidade (25).

32.      Resulta da jurisprudência que, quando as condições em que deve ser assegurado o respeito dos direitos de defesa, no âmbito de um procedimento específico, não sejam fixadas pelo direito da União, a fixação dessas condições é regida pelo direito nacional, desde que as medidas adotadas neste sentido sejam equivalentes àquelas de que beneficiam os particulares em situações de direito nacional comparáveis (princípio da equivalência) e não tornem, na prática, impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos de defesa conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (26). Essas exigências de equivalência e de efetividade exprimem a obrigação geral de os Estados‑Membros assegurarem o respeito dos direitos de defesa conferidos aos cidadãos pelo direito da União, nomeadamente no que diz respeito à definição das regras processuais (27).

33.      Todavia, os direitos fundamentais, como o respeito dos direitos de defesa, não constituem prerrogativas absolutas, mas podem comportar restrições, na condição de estas corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela medida em causa e não constituírem, à luz da finalidade prosseguida, uma intervenção desmedida e intolerável que viole a própria substância dos direitos assim garantidos (28).

34.      Além disso, a existência de uma violação dos direitos de defesa deve ser apreciada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto e, nomeadamente, da natureza do ato em causa, do contexto em que foi adotado e das normas jurídicas que regem a matéria em causa (29). Mais especificamente, o Tribunal de Justiça declarou, de forma explícita, que as modalidades segundo as quais o interessado deve poder exercer o seu direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão que o afete devem ser apreciadas à luz do objetivo da regulamentação em causa (30).

35.      Das considerações precedentes decorre que é no contexto global da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao respeito dos direitos de defesa, descrita nos números anteriores, bem como do sistema e dos objetivos da regulamentação da União em causa, que os Estados‑Membros, no âmbito da sua autonomia processual, devem determinar as condições e as modalidades para assegurar o respeito do direito de serem ouvidos os destinatários de decisões que afetam sensivelmente os seus interesses (31), sempre no respeito dos princípios da equivalência e da efetividade mencionados no n.o 32, supra.

B –    Quanto ao alcance do direito de ser ouvido no âmbito do procedimento relativo à concessão do estatuto de proteção subsidiária

36.      No processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, o direito da União não estabelece regras precisas que determinem as condições e as modalidades para assegurar, no procedimento administrativo, o respeito do direito de ser ouvido do nacional de um país terceiro que apresente pedido de proteção subsidiária.

37.      Mais concretamente, num quadro jurídico como o que está em causa no processo principal, as referidas condições e modalidades não estão estabelecidas nem na Diretiva 2004/83, que não prevê regras processuais aplicáveis à apreciação de um pedido de proteção internacional (32), nem na Diretiva 2005/85, que, nos termos do seu artigo 3.o, não é aplicável aos pedidos de proteção subsidiária, salvo no caso de um Estado‑Membro instituir um procedimento único para o tratamento dos dois pedidos de proteção internacional (asilo e proteção subsidiária) (33), o que, como se viu, não era o caso da regulamentação em vigor na Irlanda à época dos factos do processo (34).

38.      Decorre da constatação da não aplicabilidade da Diretiva 2005/85 que a questão da eventual existência de um direito a uma audição oral no procedimento relativo ao pedido de proteção subsidiária de M não pode, em caso algum, ser apreciada com base no artigo 12.o da Diretiva 2005/85. Esta disposição não pode ser aplicada ao caso em apreço, nem sequer por analogia. Como corretamente referiu a Irlanda, a sua aplicação, ainda que de forma indireta, teria, de facto, como consequência, por um lado, tornar, no essencial, ineficaz a escolha do legislador de um Estado‑Membro que optou, durante o período de vigência da Diretiva 2005/85, por submeter os pedidos de asilo e de proteção subsidiária a regimes processuais distintos e, por outro, privar as disposições do artigo 3.o, n.os 3 e 4, da mesma diretiva, de efeito útil, impondo, essencialmente, a aplicação desse diploma também aos casos em que o mesmo não é aplicável.

39.      Na falta de regras específicas estabelecidas pelo direito da União, resulta da jurisprudência citada no n.o 32 que os Estados‑Membros continuam a ser competentes, em conformidade com o princípio da autonomia processual, para regular os requisitos e as modalidades processuais relativas ao respeito do direito de ser ouvido no procedimento em matéria de exame de um pedido de proteção subsidiária, garantindo o respeito dos direitos fundamentais e dos princípios da equivalência e da efetividade (35).

40.      Mais concretamente, decorre da necessidade de garantir a plena efetividade das disposições do direito da União relativas à proteção subsidiária que as regras processuais nacionais devem regular a tramitação do procedimento relativo aos pedidos de obtenção dessa proteção de modo a garantir aos requerentes um acesso efetivo aos direitos que lhes são conferidos pela Diretiva 2004/83 (36). No que se refere, especificamente, ao caso em apreço, tal implica que as regras nacionais devem prever requisitos e modalidades processuais para o exercício do direito de ser ouvido no procedimento suscetíveis de garantir aos interessados o acesso efetivo aos direitos decorrentes do estatuto de proteção subsidiária.

41.      Neste contexto, resulta da jurisprudência referida nos n.os 34 e 35 das presentes conclusões que o alcance do direito de ser ouvido, bem como os requisitos e as modalidades processuais necessárias para o respeito do mesmo, devem ser apreciados tendo em conta a natureza e os objetivos do procedimento em causa, ou seja, no caso em apreço, aquele que visa a concessão do estatuto de proteção subsidiária, como previsto na Diretiva 2004/83.

42.      Ora, a regulamentação relativa à proteção subsidiária, tal como prevista na Diretiva 2004/83, tem expressamente o objetivo de proporcionar um «estatuto adequado» a qualquer pessoa que, ainda que não preencha as condições ser considerada refugiado, necessite, contudo, de proteção internacional (37). A proteção subsidiária constitui, portanto, uma forma de proteção complementar e suplementar relativamente à prevista para os refugiados (38), que é concedida se forem satisfeitos requisitos diferentes dos que estão previstos para a concessão do direito de asilo e que confere direitos que revestem natureza diferente daqueles que são conferidos pelo estatuto de refugiado (39).

43.      À luz desse objetivo, o procedimento relativo à apreciação do pedido de proteção subsidiária caracteriza‑se pelo facto de que a situação pessoal específica do requerente desempenha um papel fundamental para efeitos de apreciação do pedido, o que se reflete, aliás, nas disposições da diretiva.

44.      Na realidade, por um lado, no que se refere aos tipos de ofensas graves previstos no artigo 15.o da Diretiva 2004/83, cujo risco de ocorrência justifica a concessão de proteção subsidiária (40), como resulta da jurisprudência, todos pressupõem que se tome em consideração a situação individual específica do requerente. Com efeito, o Tribunal de Justiça precisou que as disposições das alíneas a) e b), desse artigo cobrem situações em que o requerente da proteção subsidiária está especificamente exposto ao risco de uma ofensa deste tipo particular. Quanto à disposição da alínea c), do mesmo artigo embora abarque um risco de ofensa mais geral, o Tribunal de Justiça sublinhou todavia que, também neste último caso, a situação pessoal específica do requerente pode desempenhar um papel fundamental na decisão final. Com efeito, o Tribunal de Justiça indicou que quanto mais o requerente puder eventualmente demonstrar que é especificamente afetado em razão de elementos próprios da sua situação pessoal, menos elevado será o grau de violência indiscriminada requerido para poder beneficiar da proteção subsidiária (41).

45.      Por outro lado, resulta, de resto, expressamente do disposto no artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2004/83 que, na apreciação do pedido de proteção internacional, e, por conseguinte, também no relativo à proteção subsidiária, deve ser tida em conta a situação individual e pessoal do requerente, por forma a apreciar, com base nas suas circunstâncias pessoais, se os atos a que foi ou possa vir a ser exposto podem ser considerados ofensa grave.

46.      Além disso, foi justamente assinalado que o procedimento relativo à concessão do estatuto de proteção subsidiária, tal como o procedimento para concessão do estatuto de refugiado, é caracterizado por uma situação humana e material difícil em que está em causa a preservação dos direitos essenciais do interessado, para quem a decisão a proferir reveste uma importância vital. Este procedimento distingue‑se, portanto, pela posição eminentemente central do interessado, o qual não só dá início ao procedimento, como é, também, o único a poder expor, de forma concreta, a sua história pessoal que pode levar à concessão desse estatuto, bem como o contexto em que a mesma se desenrolou (42).

47.      Foi, aliás, precisamente devido à especificidade dos objetivos e da natureza do procedimento para a concessão de proteção subsidiária e dos aspetos que o distinguem relativamente ao procedimento para a concessão do estatuto de refugiado que o Tribunal de Justiça, no acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), conferiu importante destaque ao caráter fundamental que reveste o direito do interessado de ser ouvido no âmbito desse procedimento, bem como à exigência de que o referido direito seja plenamente garantido nesse quadro, mesmo num sistema dualista como o que está em causa no processo principal (43).

48.      Das considerações precedentes decorre que, tendo em conta a natureza específica e os objetivos do procedimento destinado a verificar a existência das condições para concessão do estatuto de proteção subsidiária, a efetividade do acesso aos direitos conferidos por esse estatuto pressupõe que sejam dadas ao interessado condições para exercer, de forma especialmente efetiva, o direito de ser ouvido nesse procedimento. Na realidade, somente se o requerente tiver a possibilidade efetiva de dar a conhecer, de maneira útil e eficaz, a sua história pessoal e o contexto em que a mesma se desenrola, expondo à administração competente, de forma exaustiva e adequada, todos os factos e os elementos para justificar o seu pedido, é que o mesmo poderá dispor de um acesso efetivo aos direitos que lhe são conferidos por esse estatuto, conforme previsto na Diretiva 2004/83.

49.      A este respeito, sublinho também que a exigência de garantir, de forma especial, a efetividade do exercício do direito de ser ouvido, a que acabei de fazer referência, se aplica tanto ao procedimento relativo à concessão do estatuto de proteção subsidiária como ao relativo ao estatuto de refugiado. De facto, apesar de, tal como foi referido, serem diferentes os requisitos que devem ser cumpridos para a concessão dos dois estatutos, ambos os procedimentos apresentam as características identificadas nos n.os 43 a 46, supra, nomeadamente, o papel central da pessoa do requerente e a importância vital dos seus interesses em jogo, bem como a importância da situação individual específica do requerente para a adoção da decisão final. Isto é, aliás, confirmado pelo facto de a referida disposição do artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2004/83 se aplicar aos dois estatutos.

50.      Por outro lado, decorre do facto de os dois estatutos serem reconhecidos com base em critérios diferentes, bem como da exigência resultante do referido artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da Diretiva 2004/83 que a situação individual e pessoal do requerente seja apreciada, de forma específica e separada, no que se refere aos dois diferentes critérios (ou seja, por um lado, o risco de perseguição ou, por outro, o risco de ofensa grave), que, nos dois procedimentos, o direito de ser ouvido constitui uma garantia processual que se refere a elementos diferentes.

C –    Quanto à questão da necessidade de uma audição oral do requerente da proteção subsidiária para o respeito do direito de ser ouvido num sistema «dualista» de concessão de proteção internacional

51.      Coloca‑se, nesta altura, a questão, fundamental no processo principal, de saber se a referida exigência de garantia da efetividade do direito de ser ouvido no procedimento relativo à concessão de proteção subsidiária apenas pode ser satisfeita mediante uma audição pessoal do interessado, ou se, pelo contrário, como o Governo irlandês alega, num sistema dualista de concessão de proteção internacional, pode ser suficiente para esse efeito a possibilidade de apresentar observações por escrito, quando essa audição já tiver tido lugar no âmbito do procedimento anterior relativo à concessão do estatuto de refugiado.

52.      A este respeito, observo, em primeiro lugar, que, ao contrário do que M parece considerar, não resulta do acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744) que o Tribunal de Justiça tenha declarado que, no procedimento para concessão do estatuto de proteção subsidiária, é sempre e absolutamente necessária uma audição oral do interessado.

53.      Em especial, esta interpretação não resulta da afirmação feita pelo Tribunal de Justiça no último parágrafo do n.o 95, segundo travessão, desse acórdão, reproduzida literalmente no n.o 15 das presentes conclusões. Tal afirmação deve ser enquadrada no contexto do acórdão. Em especial, a mesma constitui, na minha opinião, uma resposta ao argumento apresentado ao Tribunal de Justiça e descrito por este no n.o 90 do mesmo acórdão segundo o qual, num sistema «dualista», no caso de a audição do interessado já ter tido lugar no âmbito da instrução do pedido de asilo, «não é necessário proceder a uma nova audição deste último para efeitos da apreciação do pedido de proteção subsidiária, porque esta formalidade seria, de certa forma, uma repetição da formalidade de que o estrangeiro já beneficiou num contexto amplamente comparável».

54.      À luz do atrás exposto, bem como do n.o 91 do mesmo acórdão, considero que o Tribunal de Justiça pretendeu dizer que, num sistema «dualista», o facto de, no procedimento relativo ao pedido de asilo, já ter tido lugar uma audição oral do interessado não implica, ou seja, não tem como consequência (acrescentaria, necessária), que a audição pessoal não deva ter lugar no procedimento relativo à proteção subsidiária, uma vez que o direito de ser ouvido deve também, em qualquer caso, ser plenamente garantido, neste último procedimento.

55.      Por conseguinte, na minha opinião, o acórdão M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744) deve ser entendido não tanto no sentido de uma afirmação da necessidade absoluta de uma audição oral no procedimento relativo à concessão de proteção subsidiária, mas antes como uma firme referência à exigência de que o direito de ser ouvido seja plenamente respeitado neste procedimento, mesmo num sistema «dualista». Uma interpretação deste tipo está, aliás, em conformidade com o regime previsto em matéria de asilo, no qual pode haver exceções à faculdade de efetuar uma audição pessoal (44).

56.      Ainda que estas considerações não militem a favor do reconhecimento de um direito absoluto a uma audição pessoal em todos os casos no procedimento relativo à proteção subsidiária, a exigência de garantia específica da efetividade do direito de ser ouvido neste tipo de procedimentos, tendo em conta a sua natureza específica e os seus objetivos, leva‑me a concluir que, ao contrário do que a Irlanda defende, a audição pessoal do requerente deveria, de qualquer forma, constituir a regra e não a exceção e que, portanto, esta apenas pode ser omitida em casos excecionais, e isto mesmo num sistema «dualista».

57.      Neste contexto, conforme referido no n.o 30, supra, a função do direito de ser ouvido no âmbito do procedimento relativo à concessão de proteção subsidiária é permitir que a administração competente promova a tomada de posição do interessado sobre os factos em que se baseia o seu pedido, de modo a assegurar a sua proteção efetiva, por um lado, e uma decisão, por parte dessa administração, com pleno conhecimento de causa, por outro.

58.      Assim, a audição pessoal constitui a expressão máxima do direito de ser ouvido. Para o requerente, a mesma constitui a única oportunidade para expor pessoalmente a sua história e para dialogar diretamente com a pessoa mais qualificada para ter em conta a sua situação pessoal (45). Nessa ocasião, este pode apresentar eventuais elementos novos em apoio do seu pedido que não tinha integrado na sua argumentação, bem como, e sobretudo, explicar ele próprio as dúvidas que tenham eventualmente surgido ou os elementos que, eventualmente, tenham sido considerados contraditórios.

59.      Para a autoridade nacional competente, esta entrevista permite examinar concretamente elementos, também de natureza subjetiva, e, por conseguinte, dificilmente detetáveis por escrito, que podiam não ser relevantes para a concessão do estatuto de refugiado e que, pelo contrário, o podem ser para a concessão do estatuto de proteção subsidiária.

60.      Num procedimento como o relativo à concessão de proteção subsidiária, no qual a pessoa do interessado tem um papel central e no qual é frequentemente impossível fornecer provas documentais, a audição pessoal é um momento que reveste uma importância fundamental para este efeito, bem como para avaliar a personalidade do indivíduo e a credibilidade dos elementos invocados no seu pedido.

61.      Entendo que as considerações precedentes também se aplicam, num sistema dualista, como o que estava em vigor na Irlanda à época dos factos do processo, numa situação em que o pedido de concessão do estatuto de proteção subsidiária se baseia num quadro factual análogo àquele em que se baseava o pedido de asilo que foi indeferido.

62.      Com efeito, como o Tribunal de Justiça salientou no acórdão M.M., quando um Estado‑Membro tenha optado por instituir dois procedimentos distintos e sucessivos para a apreciação do pedido de asilo e do pedido de proteção subsidiária, o direito do interessado de ser ouvido deve ser plenamente garantido no âmbito de cada um desses dois procedimentos (46).

63.      Daí resulta que o facto de o direito de ser ouvido ter sido plenamente respeitado no procedimento anterior relativo ao pedido de asilo não implica que a exigência específica de garantia do exercício efetivo deste direito, referida no n.o 48, supra, seja reduzida no procedimento distinto sucessivo, relativo à concessão de proteção subsidiária. Além disso, como referido no n.o 50, supra, o direito de ser ouvido nos dois procedimentos está relacionado com critérios diferentes e constitui, por conseguinte, uma garantia processual que abrange contextos diferentes (47).

64.      Decorre do que precede que, neste sistema dualista ‐ cuja adoção é resultado de uma livre escolha do Estado‑Membro em causa ‐ a conclusão a que a administração chegou no primeiro procedimento não pode ser automaticamente transposta para o segundo procedimento. Com efeito, não é possível «transferir» o respeito do direito de ser ouvido de um procedimento para o outro. Num contexto como o da proteção internacional, tendo em conta o caráter fundamental que reveste o direito de ser ouvido, estas considerações são ainda mais importantes nos casos de conclusões desfavoráveis sobre a credibilidade, que são suscetíveis de ter uma influência decisiva na decisão final.

65.      Importa ainda salientar a este respeito que, embora o direito da União não preveja disposições específicas sobre como a credibilidade de um requerente de proteção internacional deve ser apreciada de forma que compete ao sistema jurídico interno de cada Estado‑Membro definir o regime processual aplicável para a avaliação dessa credibilidade (48), a autonomia processual dos Estados‑Membros está sujeita ao limite do princípio da efetividade, que consiste, como se viu, na necessidade de garantir o acesso efetivo aos direitos conferidos pela regulamentação relativa à proteção subsidiária, a qual, por seu turno, pressupõe um exercício especialmente efetivo do direito de ser ouvido (49).

66.      Uma interpretação do direito de ser ouvido que reconheça o papel fundamental da audição oral no quadro do procedimento de concessão de proteção internacional é, de resto, coerente com as recentes escolhas do legislador da União nesta matéria, o qual, por um lado, na Diretiva 2013/32, reduziu drasticamente as hipóteses em que é possível omitir a entrevista pessoal no âmbito do procedimento, agora único, relativo aos pedidos de proteção internacional (50) e, por outro, no Regulamento n.o 604/2013 (Dublim III) (51), introduziu a obrigação de os Estados‑Membros realizarem uma entrevista pessoal no quadro do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional.

67.      Por último, no que se refere à questão relativa a um eventual direito de indicar e de inquirir testemunhas em contraditório no quadro do procedimento, observo que não resulta da configuração do direito de ser ouvido, que decorre da jurisprudência referida nos n.os 29 e segs. das presentes conclusões, que o mesmo inclua necessariamente tal direito. Aliás, isso não invalida que um Estado‑Membro, no âmbito da faculdade que lhe assiste de aprovar ou manter em vigor disposições mais favoráveis nessa matéria (52), possa prever o direito de indicar e de inquirir testemunhas em contraditório no quadro do procedimento.

V –    Conclusão

68.      Pelas razões acima expostas, proponho, pois, que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial submetida pela Supreme Court nos seguintes termos:

Quando um pedido de concessão do estatuto de proteção subsidiária, nos termos da Diretiva 2004/83/CE do Conselho, de 29 de abril de 2004, que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de proteção internacional, bem como relativas ao respetivo estatuto, e relativas ao conteúdo da proteção concedida, for apresentado num Estado‑Membro que preveja dois procedimentos autónomos, um subsequente ao outro, para apreciar os pedidos de asilo e de proteção subsidiária, respetivamente, o direito de ser ouvido em todos os procedimentos, como existe no direito da União, deve ser interpretado no sentido de que esse direito exige, em princípio, uma audição pessoal do requerente que apenas pode ser omitida em casos excecionais. Neste contexto, o direito de ser ouvido em todos os procedimentos não inclui, em contrapartida, um direito de indicar e de inquirir testemunhas em contraditório.


1 —      Língua original: italiano.


2 —      O Tribunal de Justiça teve recentemente ocasião de se ocupar, por várias vezes, de questões relativas ao direito de ser ouvido no procedimento. Para além do acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), na esteira do qual se insere o presente reenvio prejudicial, v., inter alia, os acórdãos de 10 de setembro de 2013, G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533), de 3 de julho de 2014, Kamino International Logistics (C‑129/13 e C‑130/13, EU:C:2014:2041), de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431). Por último, em matéria de direito de ser ouvido, v., também, acórdão de 17 de março de 2016, Bensada Benallal (C‑161/15, EU:C:2016:175).


3 —      Diretiva 2004/83/CE do Conselho, de 29 de abril de 2004, que estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de proteção internacional, bem como relativas ao respetivo estatuto, e relativas ao conteúdo da proteção concedida (JO 2004, L 304, p. 12). A Diretiva 2004/83 foi revogada pela Diretiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9).


4 —      O Tribunal de Justiça já teve ocasião de se ocupar deste procedimento em três processos, especificamente nos acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), de 31 de janeiro de 2013, HID e BA (C‑175/11, EU:C:2013:45) e de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302). O referido procedimento está igualmente em causa no processo pendente C‑429/15, Danqua.


5 —      V. nota 9, infra.


6 —      A tradução em italiano do conceito francês de «droit d’être entendu» («right to be heard», em inglês, «Recht auf Anhörung», em alemão, «Derecho a ser oído», em espanhol) não parece ser unívoca. Na versão italiana da jurisprudência do Tribunal de Justiça, é utilizada, por vezes, a expressão «diritto al contraddittorio» (v., a título de exemplo, acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M., C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 82, 85 ou 87), outras vezes é utilizada a expressão «diritto di essere sentiti» (v., por exemplo, acórdãos de 10 de setembro de 2013, G. e R. C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533, n.os 27, 28 ou 32, ou de 17 de março de 2016, Bensada Benallal C‑161/15, EU:C:2016:175, n.os 21 ou 35) e, outras vezes ainda, a expressão «diritto di essere ascoltato» [v., por exemplo, acórdão de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.os 1, 28 ou 30); esta expressão corresponde à que é utilizada no artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e corresponde literalmente às já referidas expressões nas versões francesa, inglesa, alemã e espanhola]. O direito em questão, relacionado com os brocardos latinos «audi alteram partem» ou «audiatur et altera pars», é um direito processual, expressão mais geral do direito de defesa que, no direito da União, tem o conteúdo indicado no n.o 29 das presentes conclusões. Do ponto de vista linguístico, a expressão «diritto al contraddittorio», é mais correntemente utilizada na linguagem jurídica nacional italiana, nomeadamente no que diz respeito a processos de natureza judicial. Literalmente, a mesma sublinha o elemento do contraditório, no sentido da necessidade de o interessado ter a possibilidade de responder a eventuais argumentos contrários ou desfavoráveis invocados no decurso do processo, para que esse direito seja respeitado. As expressões «diritto di essere sentito» e «diritto di essere ascoltato» colocam, por outro lado, maior ênfase na necessidade de poder apresentar o seu próprio ponto de vista no decurso do processo. A referência a ser ouvido («sentiti» ou «ascoltati») parece, contudo, implicar, de alguma forma, um elemento de oralidade. Assim, tendo em conta que se trata da expressão utilizada no direito primário e que a mesma corresponde mais, do ponto de vista literal, às outras versões linguísticas, nas presentes conclusões utilizarei, para fazer referência ao direito em questão, a expressão «diritto di essere ascoltato».


7 —      Diretiva 2005/85/CE do Conselho, de 1 de dezembro de 2005, relativa a normas mínimas aplicáveis ao procedimento de concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados‑Membros (JO 2005, L 326, p. 13). Esta diretiva foi revogada pela Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60). Esta última diretiva definiu procedimentos comuns para a concessão e retirada da proteção internacional (o estatuto de refugiado e a proteção concedida às pessoas que não sejam refugiados, mas que estariam em sério perigo, caso voltassem para o seu país de origem). Como o seu considerando 58 indica, a Irlanda não está vinculada à mesma, em conformidade com os artigos 1.o e 2.o e o artigo 4.o‑A, n.o 1, do Protocolo n.o 21 relativo à posição do Reino Unido e da Irlanda em relação ao espaço de liberdade, segurança e justiça, anexo ao TUE e ao TFUE.


8 —      Mais concretamente, nos termos do n.o 2, desse artigo, a entrevista pessoal pode ser omitida quando o órgão de decisão puder pronunciar‑se favoravelmente com base nos elementos de prova disponíveis [alínea a)]; ou a autoridade competente já tiver tido uma reunião com o requerente para o ajudar a preencher o seu pedido ou fornecer as informações essenciais relativas ao pedido [alínea b)]; ou o órgão de decisão, com base numa análise completa das informações prestadas pelo requerente, considerar que o pedido é infundado, nos casos em que se reúnam as circunstâncias mencionadas nas alíneas a), c), g), h) e j) do n.o 4 do artigo 23.o [alínea c)]. Nos termos do n.o 3 do mesmo artigo, a entrevista pessoal pode igualmente ser omitida quando não for razoável efetuá‑la, concretamente quando a autoridade competente considerar que o requerente é inapto ou incapaz para o efeito devido a circunstâncias duradouras, alheias à sua vontade.


9 —      A primeira reforma, adotada em 2013, manteve o sistema «dualista», mas previa a necessidade de uma entrevista pessoal com o requerente, também no procedimento de tratamento de um pedido de proteção subsidiária [v. European Union (Subsidiary Protection) Regulations 2013, S.I.426 de 2013]. Decorre das alegações do Governo irlandês, apresentadas na audiência, que a segunda reforma, adotada em 2015, aboliu o sistema «dualista» e introduziu um sistema único para o tratamento dos dois pedidos.


10 —      Em especial, o Tribunal de Justiça declarou que, num sistema dualista como o irlandês, a referida exigência de cooperação não deve ser interpretada no sentido de que a autoridade nacional competente tem a obrigação de, antes de adotar a sua decisão, informar o requerente da resposta negativa que se propõe dar ao seu pedido e de lhe comunicar os argumentos com que pretende fundamentar o indeferimento, de maneira a permitir‑lhe apresentar o seu ponto de vista a este respeito. V. n.os 74 e 95, primeiro travessão, do acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744).


11 —      Acórdão da High Court de 23 de janeiro, M.M v Minister for Justice & Anor, processo 2011 8 JR, [2013] IEHC 9.


12 —      Ibid. n.o 46. Mais concretamente, no n.o 47 desse acórdão, a High Court afirmou que, para que o direito de ser ouvido possa ser considerado efetivo, na aceção que lhe foi dada pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744), é necessário que no procedimento em causa: (i) o requerente seja convidado a expor as suas próprias observações sobre qualquer conclusão desfavorável relativa à sua credibilidade, efetuada no processo referente ao seu pedido de asilo; (ii) seja concedida ao requerente uma possibilidade completamente nova de revisão de todas as questões relativas ao seu pedido de proteção subsidiária; e (iii) se proceda a uma avaliação completamente nova da credibilidade do requerente, no âmbito da qual o simples facto de o Refugee Appeals Tribunal se ter pronunciado desfavoravelmente sobre esta questão não é, por si só, suficiente nem diretamente relevante para efeitos desta nova avaliação da credibilidade.


13 —      V. acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 73).


14 —      Acórdãos de 18 de dezembro de 2008, Sopropé (C‑349/07, EU:C:2008:746, n.o 36), de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 81 e 82 e jurisprudência referida) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 30 e jurisprudência referida).


15 —      Acórdão de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 31 e jurisprudência referida).


16 —      V. n.o 28 das minhas conclusões no processo Bensada Benallal (C‑161/15, EU:C:2016:3).


17 —      Nomeadamente, quando as medidas nacionais que os mesmos adotam se inscrevem no âmbito de aplicação do direito da União. V. acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.os 18 a 21).


18 —      V. n.o 32 das conclusões que apresentei no processo Bensada Benallal (C‑161/15, EU:C:2016:3).


19 —      V. acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 84) e de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.os 49 e 50). V. de igual modo, implicitamente, acórdão de 3 de julho de 2014, Kamino International Logistics e Datema Hellmann Worldwide Logistics (C‑129/13 e C‑130/13, EU:C:2014:2041, n.o 29), que se limitou a excluir a aplicabilidade, ratione temporis, do artigo 41.o, n.o 2, da Carta, no caso que deu origem ao processo principal. Esta posição foi defendida, em diversas ocasiões, por alguns advogados‑gerais. Para além das referidas conclusões por mim apresentadas no processo Bensada Benallal (C‑161/15, EU:C:2016:3) e das apresentadas no processo CO Sociedad de Gestion y Participación e o. (C‑18/14, EU:C:2015:95, nota 48), há que referir a tomada de posição do advogado‑geral M. Wathelet no processo G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:553, n.os 49 a 53), bem como as conclusões apresentadas pelo mesmo nos processos Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2031, n.o 56) e Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2032, n.os 46 a 48).


20 —      Esta corrente jurisprudencial tem origem em diversos acórdãos recentes. V. acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Cicala (C‑482/10, EU:C:2011:868, n.o 28), de 17 de julho de 2014, Y S e o. (C‑141/12 e C‑372/12, EU:C:2014:2081, n.o 67), de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 44), e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.os 32 e 33).


21 —      Acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 87 e jurisprudência referida), e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 36).


22 —      Acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 88), e de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 48).


23 —      V. conclusões apresentadas pelo advogado‑geral Y. Bot no processo M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:253, n.os 35 e 36), bem como as conclusões apresentadas pelo advogado‑geral M. Wathelet no processo Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2032, n.o 58). A esse respeito v., também, n.o 59 do acórdão de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431).


24 —      V. acórdãos de 18 de dezembro de 2008, Sopropé (C‑349/07, EU:C:2008:746, n.o 49), de 3 de julho de 2014, Kamino International Logistics (C‑129/13 e C‑130/13, EU:C:2014:2041, n.o 38) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 37).


25 —      Acórdãos de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.os 49 e 50 e jurisprudência referida), e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.os 39 e 40).


26 —      V., neste sentido, acórdãos de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 51 e jurisprudência referida) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 41). V., também, acórdão de 17 de março de 2016, Bensada Benallal (C‑161/15, EU:C:2016:175, n.o 24 e jurisprudência referida)


27 —      V., neste sentido, acórdãos de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 52 e jurisprudência referida) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 42).


28 —      V. acórdãos de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 53) e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 43 e jurisprudência referida).


29 —      V. acórdãos de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi (C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 102 e jurisprudência aí referida), bem como de 10 de setembro de 2013, G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533 n.o 34) e de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 54).


30 —      V., neste sentido, acórdão de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida (C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 45).


31 —      V., neste sentido, acórdãos de 10 de setembro de 2013, G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533 n.o 37) e de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 55).


32 —      V. acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 72 e 73) e de 2 de dezembro de 2014, A e o. (C‑148/13, EU:C:2014:2406, n.o 47).


33 —      V. acórdãos de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 79) e de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.os 38 a 40).


34 —      A este respeito, convém referir que, por força da nova Diretiva 2013/32, a qual não é aplicável no caso em apreço (v. nota 7, supra), a instituição de um procedimento único já não é apenas uma faculdade, como era na vigência da Diretiva 2005/85, mas constitui, atualmente, uma obrigação. V., a este respeito, considerando 11 e artigo 10.o, n.o 2, da Diretiva 2013/32 e conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo N. (C‑604/12, EU:C:2013:714, n.os 55 e 56).


35 —      Neste sentido, v., também, acórdão de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.o 41). No que se refere ao limite à autonomia processual dos Estados‑Membros decorrente do princípio da equivalência, M alegou que este princípio exigiria a existência, no Estado‑Membro, de um regime processual análogo para o tratamento dos pedidos de asilo e de proteção subsidiária (v., a este respeito, o processo Danqua, C‑429/15, ainda pendente no Tribunal de Justiça). O princípio da equivalência poderia ser eventualmente invocado para sustentar que o mesmo proíbe um Estado‑Membro de estabelecer modalidades processuais menos favoráveis para os pedidos de proteção internacional baseados no direito da União relativamente aos que são baseados no direito interno (v., neste sentido, acórdãos de 5 de novembro de 2014, Mukarubega, C‑166/13, EU:C:2014:2336, n.o 51 e jurisprudência referida, e de 11 de dezembro de 2014, Boudjlida, C‑249/13, EU:C:2014:2431, n.o 41). Contudo, há que reconhecer que quer a proteção decorrente do estatuto de refugiado quer a que decorre do estatuto de proteção subsidiária resultam da aplicação da Diretiva 2004/83 [a qual, por seu turno, no que respeita ao primeiro destes estatutos, se baseia na Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados e, no que respeita ao segundo destes estatutos, se inspira noutros instrumentos internacionais relativos aos direitos do homem; v., a este respeito, as conclusões que apresentei no processo Diakite (C‑285/12, EU:C:2014:39, n.o 63)]. Ora, resulta da jurisprudência que o princípio da equivalência não é pertinente em situações que dizem respeito a pedidos que sejam, ambos, fundados no direito da União [v., neste sentido, acórdãos de 6 de outubro de 2015, Târșia (C‑69/14, EU:C:2015:662, n.o 34), e de 28 de janeiro de 2015, ÖBB Personenverkehr (C‑417/13, EU:C:2015:38, n.o 74)]. Na minha opinião, o presente reenvio prejudicial tem, portanto, por objeto não tanto a questão do respeito do princípio da equivalência, mas antes do respeito do princípio da efetividade.


36 —      V., neste sentido, acórdão de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.o 42).


37 —      V. n.o 14 das conclusões do Conselho Europeu de Tampere de 15 e 16 de outubro de 1999, bem como considerando 5 da Diretiva 2004/83. A este respeito, v., também, n.os 58 e segs. das minhas conclusões no processo Diakite (C‑285/12, EU:C:2013:500).


38 —      V. considerando 24 da Diretiva 2004/83 e acórdão de 8 de maio de 2014, N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.o s 30 a 32). No que se refere à Diretiva 2011/95, v. considerandos 6 e 33 desta diretiva, bem como o acórdão de 1 de março de 2016, Kreis Warendorf e Osso (C‑443/14 e C‑444/14, EU:C:2016:127, n.o 31).


39 —      V. acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 92). A este propósito, deve também referir‑se que, como resulta dos seus considerandos 8, 9 e 39, na nova Diretiva 2011/95, o legislador da União, alterando a abordagem inicialmente adotada na Diretiva 2004/83, pretendeu, em resposta ao convite constante do Programa de Estocolmo, instituir um estatuto uniforme para todos os beneficiários de proteção internacional e que, por conseguinte, optou por conceder aos beneficiários do estatuto conferido pela proteção subsidiária os mesmos direitos e vantagens de que gozam os refugiados, com exceção das derrogações necessárias e objetivamente justificadas (v. acórdão de 1 de março de 2016, Kreis Warendorf e Osso (C‑443/14 e C‑444/14, EU:C:2016:127, n.o 32).


40 —      V. artigo 2.o, alínea e), da Diretiva 2004/83 e acórdãos de 17 de fevereiro de 2009, Elgafaji (C‑465/07, EU:C:2009:94, n.o 31), de 30 de janeiro de 2014, Diakité (C‑285/12, EU:C:2014:39, n.o 18), e de 18 de dezembro de 2014, M’Bodj (C‑542/13, EU:C:2014:2452, n.o 30).


41 —      V. acórdão de 17 de fevereiro de 2009, Elgafaji (C‑465/07, EU:C:2009:94, n.os 32, 33 e 39). V., também, acórdão de 30 de janeiro de 2014, Diakité (C‑285/12, EU:C:2014:39, n.o 31).


42 —      Conclusões apresentadas pelo advogado‑geral Y. Bot no processo M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:253, n.o 43) e no processo N. (C‑604/12, EU:C:2013:714, n.o 49).


43 —      Acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 91 e 92).


44 —      A este respeito, embora, como assinalado nos n.os 37 e 38 das presentes conclusões, a regulamentação processual da União em matéria de asilo, em vigor à época dos factos do processo (isto é, a Diretiva 2005/85) não seja aplicável, nem sequer por analogia, no caso em apreço, foi, contudo, referido no n.o 48 que o regime relativo ao tratamento dos pedidos de asilo partilha com o da proteção subsidiária a exigência de garantia específica da efetividade do direito de ser ouvido durante o procedimento.


45 —      V., neste sentido, conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:253, n.o 83). Sobre a função da entrevista pessoal v., ainda, n.o 68 das conclusões da advogada‑geral E. Sharpston nos processos apensos A e o. (C‑148/13 a C‑150/13, EU:C:2014:2111).


46 —      Acórdão de 22 de novembro de 2012, M.M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.o 91). O sublinhado é meu.


47 —      Este é o elemento fundamental que distingue o presente processo daquele que o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão de 5 de novembro de 2014, Mukarubega (C‑166/13, EU:C:2014:2336), no qual o Tribunal recusou admitir que o direito de ser ouvido exigisse uma audição oral para adoção de uma decisão de regresso no âmbito da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98). Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que a decisão de regresso constituía o prolongamento lógico e necessário da decisão que tinha concluído pela irregularidade da permanência, antes da adoção da qual a interessada tinha sido ouvida, e que, por outras palavras, esta decisão dava, automaticamente, sequência à recusa de uma autorização de residência, sem que fosse necessário apresentar fundamentação distinta (v. n.o 72 do acórdão).


48 —      Sobre a avaliação da credibilidade no contexto da proteção internacional, v. conclusões apresentadas pela advogada‑geral E. Sharpston nos processos apensos A e o. (C‑148/13 a C‑150/13, EU:C:2014:2111, n.os 50 e segs.).


49 —      V. n.os 40 a 48, supra.


50 —      Em conformidade com o artigo 14.o da Diretiva 2013/32, atualmente a entrevista pessoal sobre os fundamentos do pedido apenas pode ser omitida em dois casos: quando o órgão de decisão puder pronunciar‑se favoravelmente no que respeita ao pedido de estatuto de refugiado com base nos elementos de prova disponíveis ou quando o órgão de decisão considerar que o requerente é inapto ou incapaz para o efeito devido a circunstâncias duradouras, alheias à sua vontade.


51 —      Regulamento (UE) n.o 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31).


52 —      V. artigo 3.o da Diretiva 2004/83 ‐ v., sobre este artigo, acórdãos de 9 de novembro de 2010, B e D (C‑57/09 e C‑101/09, EU:C:2010:661, n.o 114), e de 18 de dezembro de 2014, M’Bodj (C‑542/13, EU:C:2014:2452, n.o 42) ‐ e artigo 5.o da Diretiva 2005/85. Sobre a falta de inquisição de testemunhas em contraditório no quadro de um procedimento administrativo, embora num domínio do direito da União completamente diferente, v. n.o 200 do acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6).