Language of document : ECLI:EU:C:2018:51

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 31 de janeiro de 2018 (1)

Processo C679/16

A

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia)]

«Reenvio prejudicial — Artigos 20.o e 21.o TFUE — Cidadania da União — Livre circulação de pessoas — Segurança social — Regulamento (CE) n.o 883/2004 — Assistência social — Prestações por doença — Serviços às pessoas portadoras de deficiência — Obrigação, ou não, de um município de um Estado‑Membro prestar a um dos seus residentes a assistência pessoal prevista na legislação nacional durante os estudos superiores que este efetue noutro Estado‑Membro»






I.      Introdução

1.        No presente processo, o Tribunal de Justiça é, em substância, interrogado pelo Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia) sobre a interpretação do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (2), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 988/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009 (3) (a seguir «Regulamento n.o 883/2004»), e dos artigos 20.o e 21.o TFUE.

2.        No essencial, trata‑se, por um lado, de saber se a assistência pessoal concedida a uma pessoa portadora de deficiência grave está abrangida pela qualificação de «prestações por doença» na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004, ou se, pelo contrário, não está abrangida pelo âmbito de aplicação deste artigo. Por outro lado, e nesta segunda hipótese, o órgão jurisdicional de reenvio questiona se os artigos 20.o e 21.o TFUE se opõem a que a autoridade competente finlandesa recuse conceder essa assistência a uma pessoa portadora de deficiência grave, residente na Finlândia, em virtude do prosseguimento dos estudos superiores noutro Estado‑Membro, no caso em apreço na Estónia.

II.    Quadro jurídico

A.      Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

3.        O artigo 19.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi aprovada em nome da Comunidade Europeia através da Decisão 2010/48/CE do Conselho, de 26 de novembro de 2009 (4), prevê o seguinte:

«Os Estados Partes na presente Convenção […] tomam medidas eficazes e apropriadas para facilitar o pleno gozo, por parte das pessoas com deficiência, do seu direito e a sua total inclusão e participação na comunidade, assegurando nomeadamente que:

[…]

b)      As pessoas com deficiência têm acesso a uma variedade de serviços domiciliários, residenciais e outros serviços de apoio da comunidade, incluindo a assistência pessoal necessária para apoiar a vida e inclusão na comunidade e prevenir o isolamento ou segregação da comunidade;

[…]»

4.        Em 11 de maio de 2016, a República da Finlândia ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o seu Protocolo facultativo. Esta Convenção e o seu Protocolo facultativo entraram em vigor na Finlândia em 10 de junho de 2016.

B.      Regulamento n.o 883/2004

5.        O artigo 1.o, alíneas j), k), l), do Regulamento n.o 883/2004 prevê as seguintes definições:

«j)      “Residência”, o lugar em que a pessoa reside habitualmente;

k)      “Estada”, residência temporária;

l)      “Legislação”, em relação a cada Estado‑Membro, as leis, os regulamentos, as disposições legais e outras medidas de aplicação respeitantes aos ramos de segurança social referidos no n.o 1 do artigo 3.o

[…]»

6.        O artigo 3.o do Regulamento n.o 883/2004, com a epígrafe «Âmbito de aplicação material», dispõe:

«1.      O presente regulamento aplica‑se a todas as legislações relativas aos ramos da segurança social que digam respeito a:

a)      Prestações por doença;

[…]

2.      Salvo disposição em contrário no anexo XI, o presente regulamento aplica‑se aos regimes de segurança social, gerais e especiais, contributivos e não contributivos, assim como aos regimes relativos às obrigações do empregador ou do armador.

3.      O presente regulamento aplica‑se igualmente às prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo abrangidas pelo artigo 70.o

[…]

5.      O presente regulamento não se aplica:

a)      À assistência social e médica;

[…]»

7.        O artigo 9.o do Regulamento n.o 883/2004, com a epígrafe «Declarações dos Estados‑Membros sobre o âmbito do presente regulamento», prevê, designadamente, que os Estados‑Membros notifiquem, anualmente, por escrito à Comissão Europeia das leis e regimes referidos no artigo 3.o

8.        O artigo 70.o do Regulamento n.o 883/2004 tem a seguinte redação:

«1.      O presente artigo aplica‑se às prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo concedidas nos termos de uma legislação que, devido ao seu âmbito de aplicação pessoal, aos seus objetivos e/ou condições de aquisição de direito, tenha características tanto de legislação de segurança social referida no n.o 1 do artigo 3.o, como de legislação de assistência social.

2.      Para efeitos do presente capítulo, a expressão “prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo” designa as prestações:

a)      Que se destinem a:

i)      abranger a título complementar, supletivo ou acessório os riscos correspondentes aos ramos de segurança social referidos no n.o 1 do artigo 3.o, e que garantam aos interessados um rendimento mínimo de subsistência tendo em conta a situação económica e social no Estado‑Membro em causa, ou

ii)      apenas a garantir proteção específica dos deficientes, estando essas prestações em estreita relação com a situação social dessas pessoas no Estado‑Membro em causa;

e

b)      Cujo financiamento derive exclusivamente de uma tributação obrigatória destinada a cobrir a despesa pública geral, e cujas condições de concessão e de cálculo não dependam de qualquer contribuição por parte do beneficiário. No entanto, as prestações concedidas como complemento de uma prestação de caráter contributivo não são consideradas prestações de caráter contributivo só por esse motivo;

e

c)      Que sejam inscritas no anexo X.

3.      O artigo 7.o e os outros capítulos do título III não se aplicam às prestações referidas no n.o 2 do presente artigo.

4.      As prestações referidas no n.o 2 são concedidas exclusivamente no Estado‑Membro da residência do interessado e de acordo com a respetiva legislação. Essas prestações são concedidas pela instituição do lugar de residência e a seu cargo.»

C.      Direito finlandês

1.      Lei relativa à assistência social

9.        O § 13, n.o 1, da sosiaalihuoltolaki [Lei relativa à assistência social (17.9.1982/710)] dispõe:

«§ 13

No âmbito das suas tarefas em matéria de assistência social, o município deve ocupar‑se, em conformidade com o conteúdo e o alcance previstos na legislação:

1)      da organização dos serviços sociais para os habitantes;

[…]»

10.      O § 14, n.o 1, da Lei relativa à assistência social prevê o seguinte:

«Considera‑se residente no município, na aceção da presente lei, qualquer pessoa que tenha o seu domicílio no município na aceção da väestökirjalaki [Lei relativa aos registos do estado civil (141/69)].

[…]»

2.      Lei relativa às prestações e medidas de apoio a pessoas portadoras de deficiência

11.      Os § 1 e 3, o § 8, segundo parágrafo, e os § 8c e 8d da laki vammaisuuden perusteella järjestettävistä palveluista ja tukitoimista [Lei relativa às prestações e medidas de apoio a pessoas portadoras de deficiência (3.4.1987/380)], a seguir «Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência», determinam o seguinte:

«§ 1

Objetivo da lei

A presente lei tem como objetivo apoiar as possibilidades de as pessoas com deficiência poderem viver com outras como membros da sociedade e manter‑se ativas, bem como evitar ou eliminar as dificuldades e impedimentos causados por uma deficiência.

[…]

§ 3

Responsabilidade relativamente à organização das prestações e medidas de apoio

Compete ao município providenciar para que as prestações de serviços e as medidas de apoio a pessoas portadoras de deficiência sejam organizadas de modo que cubram qualitativa e quantitativamente as necessidades do município.

Na organização das prestações de serviços e das medidas de apoio nos termos desta lei deve ter‑se em conta a necessidade individual de assistência dos utentes (19.12.2008/981).

§ 8

Prestações para pessoas portadoras de deficiência

[…]

Compete ao município fornecer às pessoas portadoras de deficiência grave serviços de transporte razoáveis com serviço de acompanhamento, atividades de dia, assistência pessoal e um alojamento com assistência, quando estas pessoas, em virtude da sua deficiência ou doença, necessitem de prestações de serviços indispensáveis para realizarem as atividades vitais habituais. O município não tem, porém, a obrigação especial de fornecer um alojamento com assistência ou assistência pessoal se os cuidados necessários para a pessoa portadora de deficiência grave não puderem ser garantidos no âmbito dos cuidados de proximidade (19.2.2010/134).

§ 8c (19.12.2008/981)

Assistência pessoal

Entende‑se por “assistência pessoal”, nos termos desta lei, a disponibilização de auxílio indispensável a pessoas portadoras de deficiência grave em casa ou fora de casa:

1)      nas tarefas da vida quotidiana;

2)      no trabalho ou nos estudos superiores;

3)      nas ocupações dos tempos livres;

4)      na participação na vida em sociedade, ou

5)      na manutenção das relações sociais.

O objetivo da assistência pessoal é ajudar as pessoas portadoras de deficiência grave a tomar as suas próprias decisões no exercício das atividades referidas no n.o 1. A organização da assistência pessoal pressupõe que a pessoa portadora de deficiência grave disponha de recursos para determinar o conteúdo e as modalidades de implementação da assistência.

Para a organização da assistência pessoal, consideram‑se pessoas portadoras de deficiência grave as que, em virtude de deficiência ou de doença prolongada ou em agravamento, têm necessidade indispensável e repetida do auxílio de outra pessoa para realizar as atividades referidas no n.o 1, sem que esta necessidade seja devida principalmente às doenças e incapacidades associadas à idade.

A assistência pessoal é prestada para as tarefas da vida diária e para o trabalho e os estudos superiores na medida em que seja indispensável à pessoa portadora de deficiência grave.

Para as atividades abrangidas pelo n.o 1, pontos 3) a 5), atrás referidas, a assistência pessoal deve ser prestada durante, pelo menos, 30 horas por mês, se um número de horas inferior não permitir garantir a assistência indispensável para a pessoa com uma deficiência grave.

§ 8d (19.12.2008/981)

Modalidades de prestação de assistência pessoal

Na decisão relativa às modalidades da prestação e na organização da assistência pessoal, o município toma em conta as opiniões e desejos da pessoa portadora de deficiência grave, bem como a necessidade de assistência individual definida num plano de prestações e as circunstâncias da vida no seu conjunto.

O município pode organizar a assistência pessoal, de modo que:

1)      sejam reembolsadas às pessoas portadoras de deficiência grave as despesas realizadas com a contratação de uma pessoa que lhes presta assistência, incluindo as contribuições e prestações legalmente previstas a cargo do empregador, bem como outras despesas necessárias e razoáveis feitas pela pessoa que presta assistência;

2)      sejam fornecidos às pessoas portadoras de deficiência grave cupões de prestações de serviços de valor adequado ao abrigo da Sosiaali ja terveydenhuollon palvelusetelistä annettu laki [Lei relativa aos cupões de prestações de serviços de assistência social e de saúde (569/2009)] para aquisição de prestações de assistência; ou (30.12.2014/1309)

3)      sejam fornecidas às pessoas portadoras de deficiência grave prestações de assistência de prestadores de serviços públicos ou privados ou prestações realizadas pelo próprio município ou em conjunto com outro ou outros municípios mediante acordo.

No caso previsto no n.o 2, ponto 1, supra, a pessoa portadora de deficiência grave deve, se for caso disso, ser orientada e apoiada no âmbito de questões relativas à contratação do auxiliar.

O auxiliar pessoal referido no n.o 2, ponto 1, supra, não pode ser um familiar ou outra pessoa próxima da pessoa portadora de deficiência grave, a menos que exista um motivo particularmente importante para considerar que tal é do interesse da pessoa com deficiência.»

III. Factos do litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

12.      A, recorrente no processo principal, nasceu em 1992 e reside no município de Espoo, na Finlândia. É portador de uma deficiência grave que se manifesta através de paralisia cerebral, de importantes dificuldades de movimento e de movimentos convulsivos. Tem franca e evidente necessidade de auxílio, desde logo nas suas atividades diárias. Deste modo, beneficiou de colocação à disposição pela cidade de Espoo de um auxiliar individual no contexto da prossecução dos seus estudos secundários na Finlândia.

13.      Em agosto de 2013, A. pediu à cidade de Espoo, ao abrigo da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, que lhe fosse disponibilizada assistência pessoal traduzida em cerca de cinco horas semanais de trabalhos domésticos, nomeadamente para fazer as compras, a lavagem da roupa e a limpeza da casa. Resulta dos autos do processo principal que, na data da apresentação do pedido, A. estava a mudar‑se para Taline, na Estónia, para aí efetuar um ciclo de três anos de estudos de Direito a tempo completo, o que implicava que passasse três ou quatro dias na capital estónia, com a intenção de regressar ao fim de semana a Espoo.

14.      Por decisão de 12 de novembro de 2013, confirmada na sequência de um recurso gracioso por decisão de 4 de fevereiro de 2014, o pedido de assistência pessoal de A. foi rejeitado com fundamento de que a sua estada no estrangeiro devia ser considerada como não ocasional, ainda que o seu município de residência não tivesse mudado. Segundo a cidade de Espoo, esta não estaria obrigada a organizar serviços e medidas de apoio no estrangeiro, uma vez que a natureza da estada no estrangeiro seria semelhante ao conceito de «residência habitual». Por outro lado, aquela cidade também considerou que a assistência pessoal apenas pode ser organizada no estrangeiro durante viagens de férias ou deslocações profissionais. Pelo contrário, não é concedido nenhum subsídio quando o município de residência da pessoa muda em virtude da permanência no estrangeiro ou se a pessoa vive duradoura ou habitualmente no estrangeiro.

15.      Por sentença de 27 de junho de 2014, o Helsingin hallinto‑oikeus (Tribunal Administrativo de Helsínquia, Finlândia) confirmou, no essencial, este raciocínio no âmbito do recurso interposto por A.

16.      Chamado a pronunciar‑se em sede de recurso desta decisão, o Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo) considera, no entanto, que é necessária uma decisão prejudicial do Tribunal de Justiça para resolver o caso.

17.      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, por força da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, a assistência pessoal é um serviço que decorre da obrigação particular do município e relativamente ao qual a pessoa portadora de deficiência grave dispõe de um direito subjetivo. A assistência pessoal deve ser concedida a uma pessoa que seja portadora de deficiência grave na aceção da referida lei se for indispensável tendo em conta a necessidade individual da pessoa em causa. De qualquer forma, se é facto assente que, na aceção do direito nacional, o município de residência de A. continua a ser Espoo, ainda que este prossiga os estudos na capital estónia, o órgão jurisdicional de reenvio observa que nem a redação da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência nem os seus trabalhos preparatórios podem apoiar a tese segundo a qual o município teria uma obrigação de conceder a assistência solicitada no contexto de uma estada no estrangeiro.

18.      O Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo) considera, então, que apenas a interpretação do direito da União poderia conduzir a dar provimento ao recurso. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, desde logo, quanto à questão de saber se, tendo em conta as suas características, a assistência pessoal instituída pela Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência deve ser qualificada como prestação por doença, caso em que estaria abrangida pelo âmbito de aplicação material do Regulamento n.o 883/2004, ou se se trata de uma prestação relativa à assistência social, caso em que escaparia ao âmbito de aplicação do referido regulamento. Subscrevendo mais esta segunda hipótese, o órgão jurisdicional de reenvio questiona, de seguida, se as disposições do Tratado TFUE relativas à cidadania da União se opõem à recusa de concessão da assistência pessoal solicitada no processo principal.

19.      O Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu, assim, suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça, a título prejudicial, as seguintes questões:

«1.      Uma prestação como a assistência pessoal prevista na Lei relativa às prestações [a pessoas portadoras de deficiência] constitui uma “prestação por doença” na aceção do artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004?

2.      Em caso de resposta negativa à primeira questão:

—      O facto de a concessão no estrangeiro de uma prestação como a assistência pessoal prevista na Lei relativa às prestações a [pessoas portadoras de deficiência] não estar especialmente regulada e de as condições de concessão da prestação serem interpretadas no sentido de que a assistência pessoal não é concedida noutro Estado‑Membro, no qual o interessado realiza estudos superiores com a duração de três anos para completar um curso superior, constitui uma restrição ao direito de um cidadão da União, nos termos dos artigos 20.o e 21.o TFUE, circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros?

—      Para a apreciação do litígio é relevante o facto de uma prestação como a assistência pessoal na Finlândia poder ser concedida a uma pessoa num município diferente do da residência, por exemplo quando essa pessoa faz estudos superiores noutro município da Finlândia?

—      À luz do direito da União, os direitos que decorrem do artigo 19.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência são relevantes para a apreciação do litígio?

3.      No caso de o Tribunal de Justiça, na resposta à segunda questão, declarar que uma interpretação do direito nacional como a que foi efetuada no presente processo constitui uma restrição à livre circulação: pode essa restrição, apesar disso, ser justificada por razões imperiosas de interesse geral que resultem da obrigação imposta ao município de supervisionar a prestação da assistência pessoal, da possibilidade que tem o município de escolher as modalidades da prestação da assistência e da manutenção da coerência e da eficácia do regime da assistência pessoal previsto na Lei relativa às prestações a [pessoas portadoras de deficiência]?»

20.      Estas questões foram objeto de observações escritas por parte dos Governos finlandês, checo e sueco, bem como da Comissão Europeia. Tendo em conta as observações apresentadas, o Tribunal de Justiça considerou estar suficientemente informado e decidiu não realizar uma audiência de alegações, em conformidade com o artigo 76.o, n.o 2, do seu Regulamento de Processo.

IV.    Análise

21.      Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio questiona se uma assistência pessoal, como a prevista na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, deve ser qualificada como prestação por doença, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004, caso em que estaria abrangida pelo âmbito de aplicação deste regulamento, ou se, pelo contrário, se trata de uma prestação relativa à «assistência social», na aceção do artigo 3.o, n.o 5, do referido regulamento, que estaria, por conseguinte, expressamente excluída do âmbito de aplicação do regime de coordenação das legislações nacionais em matéria de segurança social previsto neste ato.

22.      Nesta segunda hipótese ‐ que é a privilegiada pelo órgão jurisdicional de reenvio ‐ o Tribunal de Justiça é, em substância, convidado a responder à questão de saber se os artigos 20.o e 21.o TFUE, que consagram o estatuto de cidadão da União e o direito deste de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros, se opõem à recusa por um município de um Estado‑Membro de conceder a assistência pessoal solicitada por um residente portador de deficiência grave deste município por este residente permanecer temporariamente noutro Estado‑Membro com vista a prosseguir os seus estudos superiores.

23.      Analisarei à vez estas questões, permitindo‑me, desde já, indicar que, pelos motivos que serão expostos abaixo, considero que a assistência pessoal em questão não está abrangida, como sugere o órgão jurisdicional de reenvio, pela qualificação de «prestações por doença», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004, e que a recusa pelo município finlandês de conceder a um residente com uma deficiência grave, como A, é contrária aos artigos 20.o e 21.o TFUE.

A.      Quanto à qualificação da assistência pessoal ao abrigo do artigo 3.o do Regulamento n.o 883/2004

24.      O sistema instituído pelo Regulamento n.o 883/2004 (bem como pelos atos que o precederam) (5) assenta na distinção entre, por um lado, as prestações de segurança social, enumeradas no artigo 3.o, n.o 1, deste, que estão abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, e, por outro, designadamente, as prestações relativas à «assistência social», na aceção do artigo 3.o, n.o 5, do referido regulamento, que não estão abrangidas pelo seu âmbito de aplicação.

25.      A linha de demarcação entre a segurança social e a assistência social não é simples de traçar. Com efeito, o Regulamento n.o 883/2004 não fornece qualquer definição geral destes domínios, nem remete, para este efeito, para as legislações dos Estados‑Membros. Por outro lado, o facto de um Estado‑Membro ter omitido declarar, em conformidade com o artigo 9.o do Regulamento n.o 883/2004, que um dado regime nacional está abrangido pelo âmbito de aplicação deste regulamento não tem por efeito excluir esse regime, ipso facto, do âmbito de aplicação material do referido regulamento (6).

26.      Confrontado muito cedo com esta problemática, o Tribunal de Justiça delineou duas condições que permitem, regra geral, distinguir as prestações que estão abrangidas pela segurança social daquelas que pertencem ao âmbito de aplicação da assistência social. É assim que, segundo a jurisprudência consolidada, uma prestação pode ser considerada uma prestação de segurança social na medida em que:

–        seja concedida, sem se proceder a qualquer apreciação individual e discricionária das necessidades pessoais, aos beneficiários com base numa situação legalmente definida e

–        se relacione com um dos riscos enumerados expressamente no artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004 (7).

27.      Tendo em conta o caráter cumulativo das duas condições acima enumeradas, a não satisfação de uma delas tem como consequência que a prestação em causa não será abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 883/2004.

28.      Sucede por vezes que um regime de prestações possa incluir características que o aproximam da segurança social, embora assemelhando‑se em alguns dos seus aspetos à assistência social, o que pode complicar a análise das duas condições mencionadas no n.o 26 das presentes conclusões.

29.      No que diz respeito à diversidade que caracteriza algumas legislações nacionais, o Tribunal de Justiça sublinhou, por diversas vezes, que se pode parecer desejável, do ponto de vista da aplicação do regulamento, estabelecer uma distinção clara entre os regimes legislativos referentes, respetivamente, à segurança social e à assistência, não se poderá excluir a possibilidade de, devido ao seu âmbito de aplicação pessoal, aos seus objetivos e às suas modalidades de aplicação, certas legislações se assemelharem simultaneamente a uma e a outra das duas categorias enunciadas, escapando assim a qualquer classificação global (8).

30.      É certo que os artigos 4.o, n.o 2‑A, e 10.o‑A do Regulamento n.o 1408/71 ‐ inseridos no texto deste pelo Regulamento n.o 1247/92 do Conselho, de 30 de abril de 1992 (9) ‐, e, agora, os artigos 3.o, n.o 3, e 70.o do Regulamento n.o 883/2004 foram, parcialmente, tidos em conta no caso concreto. Com efeito, no que respeita a este último regulamento, o seu artigo 70.o estabelece as disposições gerais relativas às «prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo», aplicáveis às legislações que, pelo âmbito de aplicação subjetivo, pelos seus objetivos e/ou as suas condições de elegibilidade, possuem as características tanto da legislação em matéria de segurança social, como de assistência social. Caem no âmbito de aplicação desta disposição, designadamente, as prestações destinadas «apenas a garantir proteção específica dos deficientes, estando essas prestações em estreita relação com a situação social dessas pessoas no Estado‑Membro em causa», o que justifica que, por força do artigo 70.o, n.o 4, do Regulamento n.o 883/2004, sejam concedidas exclusivamente no Estado‑Membro de residência do beneficiário e em conformidade com a legislação deste Estado‑Membro.

31.      Ainda que o conceito de «prestação de segurança social», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004, e o conceito de «prestação especial de caráter não contributivo», na aceção dos artigos 3.o, n.o 3, e 70.o do referido regulamento, se excluam mutuamente (10), não é menos verdade que a aplicação destes últimos artigos pressupõe que as prestações em questão estão abrangidas pelo âmbito de aplicação material do referido regulamento, isto é, que sejam qualificadas como prestações especiais pecuniárias de caráter não contributivo, figurando, em princípio, na lista das legislações, enumeradas por cada Estado‑Membro, prevista no anexo X deste mesmo regulamento. Ora, no caso da República da Finlândia, a Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência não consta da lista do anexo X do Regulamento n.o 883/2004. A omissão, aparentemente intencional, do órgão jurisdicional de reenvio de questionar o Tribunal de Justiça quanto à interpretação dos artigos 3.o, n.o 3, e 70.o deste regulamento e a ausência de observações por parte das partes interessadas sobre este ponto parecem explicar‑se por esse facto (11).

32.      Dito isto, fora do âmbito de aplicação dos artigos 3.o, n.o 2, e 70.o do Regulamento n.o 883/2004 e, por conseguinte, quanto à delimitação entre os n.os 1 e 5 do artigo 3.o do presente regulamento, a condição que tem mais peso no exame realizado pelo Tribunal de Justiça é a que se refere aos riscos enumerados no artigo 3.o, n.o 1, do referido regulamento. Com efeito, mesmo que uma legislação nacional confira aos beneficiários uma posição legalmente definida que dê direito a uma dada prestação, independentemente de qualquer apreciação individual e discricionária das necessidades do interessado, sendo a enumeração do artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004 exaustiva, uma prestação que não se refira à assunção de um dos riscos indicados no referido artigo deve estar excluída, em qualquer caso, do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 883/2004 (12).

33.      Embora a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à identificação das duas condições enumeradas no n.o 26 das presentes conclusões esteja, assim, bem assente, a aplicação dessas mesmas condições aos casos submetidos ao Tribunal de Justiça revela‑se mais controversa.

34.      Com efeito, no que respeita à primeira condição imposta pelo Tribunal de Justiça, o seu rigor podia legitimamente deixar pensar que a mínima margem de apreciação individual e discricionária das necessidades do interessado, atribuída à administração nacional competente, conduziria a afastar a qualificação como prestação de segurança social. De forma algo contraditória em meu entender, o Tribunal de Justiça considerou, no entanto, preenchida esta condição, não obstante o facto de que uma prestação pecuniária só poderia ser concedida tendo em conta o património do requerente, os seus rendimentos, o número de menores a seu cargo e as suas idades, na medida em que estes critérios eram objetivos e legalmente definidos, sem que a autoridade competente pudesse «ter em conta outras circunstâncias pessoais» (13). Mais recentemente, em contrapartida, tratando‑se de prestações pecuniárias destinadas a compensar as consequências sociais de uma deficiência grave, o Tribunal de Justiça decidiu, no âmbito de uma ação por incumprimento intentada pela Comissão contra a República Eslovaca, que, embora as peritagens médica e social, bem como uma peritagem dita complexa, no âmbito da qual a proposta quanto ao tipo de prestação pecuniária a conceder a título da compensação tinha sido emitida, tivessem sido efetuadas com base em critérios objetivos e legalmente definidos, a Comissão não tinha demonstrado que esses critérios davam direito às prestações em causa sem que a autoridade competente dispusesse de margem de apreciação quanto à sua concessão (14).

35.      Quanto à aplicação da segunda condição, apesar da chamada de atenção para o caráter exaustivo dos riscos ou prestações expressamente enumerados no artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004, o Tribunal de Justiça admitiu, não obstante o seu silêncio quanto ao risco de dependência (15), que as prestações relativas a esse risco podiam ser equiparadas a «prestações de doença», na aceção do referido artigo e, portanto, estar abrangidas pelo âmbito de aplicação da legislação da União em matéria de coordenação dos regimes nacionais de segurança social (16). Essa equiparação do risco de dependência ao risco de doença está, porém, sujeito a determinadas condições, a fim de não alargar indevidamente o âmbito de aplicação do Regulamento n.o 883/2004, tendo em conta a falta de disposição, neste último, que vise especificamente o referido risco. Foi assim que o Tribunal de Justiça decidiu que as prestações destinadas a cobrir o risco de dependência devem não só satisfazer a primeira condição mencionada no n.o 26 das presentes conclusões, mas sobretudo visar «melhorar o estado de saúde e a vida das pessoas dependentes», tendo «essencialmente como objetivo completar as prestações de seguro de doença» (17). As prestações relativas ao risco de dependência, que, como esta última, são, regra geral, de longa duração, têm, quando muito, um caráter complementar em relação às prestações de doença «clássicas», não se destinando, em princípio, a ser pagas durante um curto período, estando abrangidas, stricto sensu, pelo artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004 (18).

36.      É à luz destas considerações que importa verificar se as duas condições enunciadas no n.o 26 das presentes conclusões estão preenchidas no processo principal, uma vez que, como bem salienta o órgão jurisdicional de reenvio, em conformidade com a jurisprudência, o facto de a República da Finlândia não ter declarado a Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência como abrangida pelo artigo 3.o do Regulamento n.o 883/2004, não significa que esta lei não esteja abrangida pelo âmbito de aplicação material desse ato da União.

1.      Quanto à condição relativa à concessão de uma prestação com base numa situação legalmente definida, independentemente de qualquer apreciação individual e discricionária das necessidades pessoais

37.      O órgão jurisdicional de reenvio parece estar hesitante quanto ao preenchimento dessa primeira condição. Com efeito, embora o órgão jurisdicional de reenvio saliente que as necessidades individuais das pessoas com deficiência grave são tomadas em conta para a concessão da assistência pessoal prevista na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, o que aproximaria mais esta prestação da assistência social, esta lei confere aos seus beneficiários um «direito subjetivo» à concessão da assistência pessoal com fundamento em condições legalmente fixadas, independentemente do nível de rendimentos do beneficiário.

38.      Os Governos finlandês e sueco consideram que, tendo em conta a tomada em consideração das necessidades individuais do beneficiário e da margem de apreciação concedida ao município quanto às modalidades de prestação da assistência pessoal, bem como ao seu volume, a situação em causa pode ser equiparada à referente à prestação que deu origem ao Acórdão de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia (C‑433/13, EU:C:2015:602). Pelo contrário, a Comissão e, em menor medida, o Governo checo, consideram que a primeira condição se encontra preenchida.

39.      Tendo em conta as indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, inclino‑me a partilhar a posição defendida por estas duas últimas partes interessadas.

40.      É certo que é inegável que a tomada em conta da necessidade individual do interessado é mencionada diversas vezes na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, em particular nos seus § 8c e 8d.

41.      No entanto, está assente que a assistência pessoal deve ser fornecida pelo município se a pessoa residir no seu território e corresponder à condição de pessoa portadora de deficiência grave, independentemente do rendimento dessa pessoa.

42.      Conforme foi referido, no essencial, pelo Governo checo, a margem de apreciação conferida pelo § 8d da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência ao município de residência do beneficiário não diz respeito à aquisição do direito à assistência pessoal, mas sim às modalidades segundo as quais essa assistência é concedida e ao seu volume. É precisamente sob este ângulo que o presente processo difere da situação que deu origem ao Acórdão de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia (C‑433/13, EU:C:2015:602, n.os 79 e 80). Com efeito, no âmbito desse processo, o Tribunal de Justiça considerou, por um lado, que a Comissão não tinha demonstrado que os critérios da lei eslovaca relativos às diferentes peritagens médico‑sociais «d[avam] direito às prestações controvertidas sem que a autoridade competente disponha de uma margem de apreciação quanto à sua concessão» e, por outro, que a referida lei previa que «o direito a um subsídio a título de compensação e ao seu pagamento nasce de uma decisão válida da autoridade competente quanto ao reconhecimento desse direito», corroborando a tese do Governo eslovaco segundo a qual «a Administração dispõe de uma margem de apreciação aquando da concessão das prestações controvertidas» (19). Tendo em conta estas hesitações por parte do órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça poderia, assim, utilmente recordar que, para excluir o preenchimento da primeira condição mencionada no n.o 26 das presentes conclusões, a apreciação discricionária das necessidades individuais do beneficiário deve antes de mais dizer respeito à aquisição do direito à prestação em causa (20).

43.      Por conseguinte, há que considerar que a primeira condição referida no n.o 26 das presentes conclusões se encontra preenchida.

2.      Quanto à condição relativa à concessão de uma prestação relacionada com um dos riscos expressamente enumerados no artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004

44.      Quanto à segunda condição, trata‑se de determinar se a assistência pessoal em causa no processo principal constitui ou deve ser equiparada a uma «prestação por doença», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004.

45.      Como já referi, o Tribunal de Justiça declarou, em várias ocasiões, que prestações que visam melhorar o estado de saúde e a vida das pessoas dependentes têm essencialmente como objetivo completar as prestações de seguro de doença e devem, portanto, ser consideradas «prestações de doença» na aceção desse artigo (21).

46.      Conforme os Governos finlandês e sueco afirmaram nas suas observações escritas, a assistência pessoal prevista na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência não pode ser considerada, em meu entender, como destinada a melhorar nem o estado ligado à deficiência nem a saúde do beneficiário. Com efeito, desde logo, o § 1 da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência enuncia que a mesma «tem como objetivo apoiar as possibilidades de as pessoas com deficiências poderem viver com outras como membros da sociedade e manter‑se ativas, bem como evitar ou eliminar as dificuldades e impedimentos causados por uma deficiência». Em seguida, como refere o § 8c da Lei relativa às prestações a deficientes, o objetivo da assistência pessoal é ajudar as pessoas portadoras de deficiência grave a tomar as suas próprias decisões no exercício das atividades que este parágrafo enumera, a saber, as atividades quotidianas, o trabalho e os estudos superiores, as ocupações dos tempos livre, a participação na vida em sociedade ou a manutenção das relações sociais. Por último, como observa o Governo finlandês, os trabalhos preparatórios da Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência confirmam que as necessidades de assistência relativas a cuidados, tratamentos ou supervisão estão expressamente excluídos do âmbito de aplicação da assistência pessoal.

47.      A finalidade da assistência pessoal não tem, assim, natureza médica, contrariamente ao subsídio finlandês de assistência a crianças (portadoras de deficiência) (lapsen hoitotu), que foi objeto do processo que deu origem ao Acórdão de 18 de outubro de 2007, Comissão/Parlamento e Conselho (C‑299/05, EU:C:2007:608, n.os 57 a 59), e que o Tribunal de Justiça considerou uma prestação por doença, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 1408/71 [atualmente, artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004]. Com efeito, este subsídio tinha por objetivo permitir aos pais de crianças portadoras de deficiência assegurar os cuidados, a vigilância e, eventualmente, a sua reeducação.

48.      Importa, assim, nesta fase, verificar se uma assistência pessoal que visa melhorar não o estado de saúde das pessoas portadoras de deficiência grave, mas apenas, admito, «a vida das pessoas dependentes», na aceção da jurisprudência referida no n.o 45 das presentes conclusões, pode ser equiparada a uma «prestação por doença», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004.

49.      Como já referi, o risco de dependência não está expressamente abrangido pelo artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004.

50.      Na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça equiparou a prestações por doença prestações concedidas ao abrigo de regimes de seguro de dependência, na medida em que tais prestações se destinavam a melhorar o estado de saúde e a vida das pessoas dependentes. Nesses processos, tratava‑se, independentemente do modo de financiamento dos referidos regimes, da assunção de despesas decorrentes do estado de dependência da pessoa, relativas, pelo menos de modo concomitante, aos cuidados proporcionados à pessoa e a melhorar a vida quotidiana dessa pessoa, assegurando‑lhe, por exemplo, a cobertura de equipamentos ou a assistência por terceiros (22). Esta orientação não foi infirmada pelo Acórdão de 1 de fevereiro de 2017, Tolley (C‑430/15, EU:C:2017:74), que a Comissão invoca, sustentando que o Tribunal de Justiça insistiu, no n.o 53 desse acórdão, que a sua única finalidade consiste em melhorar a qualidade de vida das pessoas dependentes da componente «dependência» do subsídio de subsistência para as pessoas portadoras de deficiência em causa nesse processo. Com efeito, por um lado, a componente «dependência» do referido subsídio tinha por objetivo fazer face às despesas suplementares decorrentes de determinados tipos de cuidados ou da incapacidade ou da quase incapacidade de locomoção (23), o que explica, em meu entender, a sua associação às «prestações por doença». Por outro lado, as questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio consistiam, antes de mais, em saber se a componente «dependência» do referido subsídio devia ser considerada abrangida pela qualificação de «prestações por doença» em vez de prestações destinadas a cobrir os riscos de invalidez ou velhice, riscos, eles próprios, abrangidos pelo Regulamento n.o 883/2004.

51.      Em todo o caso, considero que o Tribunal de Justiça deve abster‑se de equiparar a uma prestação por doença as prestações, tal como a assistência pessoal em causa no presente processo, que visam exclusivamente melhorar a vida quotidiana das pessoas com deficiência grave, sem incluir, pelo menos, a assunção de cuidados ou de equipamentos para melhorar o estado de saúde dessas pessoas. Se o Tribunal de Justiça decidir por esta via, terá de incluir, enquanto tal, o risco de dependência na lista exaustiva do artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2004 e, por conseguinte, no seu âmbito de aplicação, o que o legislador da União, não obstante as múltiplas alterações que foram introduzidas ao longo dos anos à legislação da União em matéria de coordenação dos regimes nacionais de segurança social, se recusou a fazer. Não posso incentivar o Tribunal de Justiça a seguir essa orientação, sob pena de desvirtuar o próprio conceito de «prestações por doença», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004.

52.      Por conseguinte, considero que uma assistência pessoal, que consiste em assumir os custos decorrentes das atividades quotidianas, tais como fazer as compras, a lavagem da roupa e os trabalhos de limpeza de uma pessoa portadora de deficiência grave, com o objetivo de permitir a esta, economicamente inativa, prosseguir estudos superiores não pode ser equiparada a uma «prestação por doença», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 883/2004.

53.      Nestas circunstâncias, não importa, contrariamente ao que o Governo checo e ao que a Comissão sugeriram, pronunciar‑se sobre a questão de saber se a assistência pessoal prevista na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência deve ser qualificada como «prestações por doença» «pecuniárias» ou «em espécie», na aceção do Regulamento n.o 883/2004, uma vez que esta assistência não está abrangida, em meu entender, pelo âmbito de aplicação do referido regulamento.

54.      Importa, assim, nesta fase, analisar a segunda e terceira questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, colocadas precisamente para a hipótese de a assistência pessoal não estar abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 883/2004.

B.      Quanto à restrição à livre circulação dos cidadãos da União

55.      Através da segunda e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 20.o e 21.o TFUE, na parte em que consagram o direito dos cidadãos da União de circular e permanecer livremente no território de outros Estados‑Membros, se opõem a que seja recusado a um residente finlandês, como o recorrente no processo principal, pelo seu município de residência, uma assistência pessoal, como a prevista na Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência, com fundamento na sua estada noutro Estado‑Membro para aí prosseguir os seus estudos superiores.

56.      Estas questões assentam num duplo postulado.

57.      Por um lado, está assente que o recorrente no processo principal mantém a sua residência na Finlândia, na aceção da kotikuntalaki (11.3.1994/201) (Lei relativa ao município de residência de 11 de março de 1994, a seguir «Lei relativa ao município de residência»), e que a estada semanal que é obrigado a passar na Estónia para os seus estudos apenas é temporária, tendo o órgão jurisdicional de reenvio declarado que o demandante no processo principal devia regressar ao seu município de residência cada fim de semana.

58.      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio constatou que o fundamento de prosseguimento de estudos, contrariamente aos relativos a viagens de negócios e de férias, não figura entre os motivos que foram admitidos como autorizando o interessado a beneficiar da assistência pessoal no estrangeiro. É certo que, tal como no órgão jurisdicional de reenvio, o Governo finlandês contestou esta interpretação do direito nacional nas suas observações escritas, alegando que a Lei relativa às prestações a pessoas portadoras de deficiência não impede que um município faça uso do seu poder de apreciação ao conceder a assistência pessoal num caso como o do processo principal. No entanto, independentemente do caráter fundado desta observação, em conformidade com a repartição de competências que resultam do artigo 267.o TFUE, não compete ao Tribunal de Justiça imiscuir‑se na interpretação do direito nacional adotada pelo órgão jurisdicional de reenvio, sendo este exclusivamente responsável por isso (24).

59.      Feitas estas precisões, importa recordar que, enquanto cidadão finlandês, o recorrente no processo principal goza do estatuto de cidadão da União nos termos do artigo 20.o, n.o 1, TFUE e pode, assim, invocar, incluindo em relação ao seu Estado‑Membro de origem, direitos relativos a este estatuto (25).

60.      Este estatuto tende a ser o estatuto fundamental dos nacionais dos Estados‑Membros quando estes se encontram numa situação abrangida pelo âmbito de aplicação ratione materiae do Tratado FUE (26).

61.      Entre as situações abrangidas pelo domínio de aplicação do direito da União figuram, evidentemente, as relativas ao exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado FUE, nomeadamente as que se enquadram no exercício da liberdade de circular e de permanecer no território dos Estados‑Membros, tal como conferida pelo artigo 21.o TFUE (27).

62.      Resulta, também, de jurisprudência constante que uma legislação nacional que coloca determinados cidadãos nacionais numa situação de desvantagem pelo simples facto de estes terem exercido a sua liberdade de circulação e de permanecer noutro Estado‑Membro constitui uma restrição às liberdades reconhecidas pelo artigo 21.o, n.o 1, TFUE a qualquer cidadão da União (28).

63.      Vários processos em que o Tribunal de Justiça recordou a jurisprudência que acaba de ser referida diziam respeito a auxílios à formação ou aos estudos cuja concessão estava condicionada à satisfação de um critério mínimo de residência no território do Estado‑Membro que os concedia, critério que os estudantes em causa não preenchiam (29).

64.      No que respeita a esta corrente jurisprudencial, o presente processo possui duas particularidades. Por um lado, a assistência pessoal não é exclusivamente concedida para o prosseguimento de estudos, mas sim para a inserção social e económica das pessoas portadoras de deficiência grave, com vista a que estas possam tomar as suas «próprias decisões», incluindo o prosseguimento de estudos (30). Por outro lado, a assistência pessoal foi recusada ao recorrente no processo principal pelo município de Espoo com fundamento no facto de o prosseguimento dos seus estudos superiores em Taline o levar a permanecer de forma habitual na Estónia. Ora, como já referi, o órgão jurisdicional de reenvio infirmou esta abordagem, constatando que o recorrente no processo principal conserva a sua residência no município de Espoo, na aceção da Lei relativa ao município de residência, o que, além disso, o Governo finlandês admitiu nas suas observações escritas.

65.      Afigura‑se, portanto, que a assistência pessoal foi exclusivamente recusada pelo facto de os estudos superiores aos quais se propôs o recorrente no processo principal —, o qual preenchia, aliás, todas as outras condições para beneficiar dessa assistência ‐, se desenvolverem num Estado‑Membro diferente da Finlândia.

66.      Como reconheceram os Governos finlandês e sueco, essa recusa constitui uma restrição à liberdade de circular e de permanecer noutro Estado‑Membro, reconhecida pelo artigo 21.o, n.o 1, TFUE a qualquer cidadão da União. Com efeito, como o Tribunal de Justiça já declarou, as facilidades concedidas pelo Tratado em matéria de livre circulação dos cidadãos da União não poderiam produzir a plenitude dos seus efeitos se um nacional de um Estado‑Membro pudesse ser dissuadido de as exercer em virtude de obstáculos colocados à sua permanência noutro Estado‑Membro por uma legislação do seu Estado de origem que o penalizasse pelo simples facto de as ter exercido (31).

67.      Essa restrição a uma das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado só pode ser justificada à luz do direito da União se se basear em considerações objetivas de interesse geral independentes da nacionalidade das pessoas em causa e se for proporcional ao objetivo legitimamente prosseguido pelo direito nacional (32).

68.      A este respeito, remetendo para os n.os 89 e 90 do Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500), o órgão jurisdicional de reenvio menciona, no seu pedido, dois fundamentos de justificação possíveis. Em primeiro lugar, a restrição pode ser admitida pela obrigação, atribuída ao município, de supervisionar a organização da assistência pessoal. Em segundo lugar, limitar a concessão da assistência pessoal ao território finlandês é suscetível de preservar a coerência e a eficácia do regime de assistência pessoal, incluindo quanto às possibilidades de o município escolher as modalidades adequadas da organização e de prestação dessa assistência.

69.      Embora nem o Governo checo nem a Comissão tenham tomado posição quanto a esta questão e que o Governo finlandês considere que não existem motivos de interesse geral aptos a justificar a restrição em causa no processo principal, o Governo sueco considera que as obrigações de vigilância que incumbem ao município e o equilíbrio financeiro do sistema de segurança social justificam que a concessão da assistência pessoal seja limitada ao território finlandês.

70.      Quanto a mim, observo, desde já, uma certa confusão nos objetivos de interesse geral expostos pelo órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, remetendo para os n.os 89 e 90 do Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500), o órgão jurisdicional de reenvio parece considerar que estes objetivos são os que consistem em assegurar a existência de uma ligação real entre o requerente da assistência e o Estado‑Membro competente e em garantir o equilíbrio financeiro do sistema nacional de segurança social, ao passo que menciona explicitamente a coerência e a eficácia do regime da assistência pessoal, fundamento de justificação que se lhe afigura frequentemente invocado pelos Estados‑Membros no âmbito da aplicação dos seus sistemas fiscais, mas que não resulta de modo nenhum do acórdão que menciona.

71.      Assim sendo, o Tribunal de Justiça reconheceu, com efeito, nos n.os 89 e 90 do Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500) que os objetivos prosseguidos por uma legislação nacional que visa estabelecer uma ligação real entre o requerente da prestação de incapacidade de curta duração para jovens deficientes e o Estado‑Membro competente, bem como preservar o equilíbrio financeiro do sistema nacional de segurança social, constituem, em princípio, objetivos legítimos suscetíveis de justificar restrições aos direitos de livre circulação e de permanência previstos no artigo 21.o, n.o 1, TFUE.

72.      Nesse processo, o Tribunal de Justiça chegou à conclusão de que as condições de presença do requerente no território nacional (no Reino Unido), tanto antes do seu pedido como no momento da sua apresentação, não podiam ser justificadas pelos dois objetivos anteriormente indicados (33). Com efeito, em especial, o Tribunal de Justiça considerou que, embora o requerente da prestação de incapacidade residisse num EstadoMembro diferente do Reino Unido (no caso concreto, Espanha), a existência de um «elo de ligação real e suficiente» com o território do Reino Unido podia ser comprovada por outros fatores que não a presença do requerente no território desse Estado‑Membro anteriormente ao pedido, tais como as relações de proximidade que o requerente mantinha com o sistema de segurança social deste Estado‑Membro, bem como o contexto familiar (34). Por outro lado, o Tribunal de Justiça considerou que essa apreciação era válida à luz do objetivo que visa garantir o equilíbrio financeiro do sistema nacional de segurança social, uma vez que o elo de ligação real e suficiente entre o requerente e o Estado‑Membro competente permitia a este assegurar que a carga económica associada ao pagamento da prestação em causa no processo principal não se tornasse desproporcionada (35).

73.      Em meu entender, a conclusão a que chegou o Tribunal de Justiça neste acórdão é, por maioria de razão, aplicável no processo principal. Com efeito, repito, está assente que A mantém a sua residência permanente no município junto do qual apresentou o seu pedido de assistência pessoal e que aí regressa semanalmente durante os seus estudos na Estónia. Por conseguinte, a meu ver, não se pode validamente sustentar que este município possa deparar‑se com dificuldades especiais na supervisão do cumprimento das condições e das modalidades de organização e de concessão desta assistência. De resto, o órgão jurisdicional de reenvio não forneceu qualquer informação quanto à natureza dos obstáculos que afetariam o controlo pelo município do cumprimento das condições de utilização da assistência pessoal mais numa situação como a do processo principal do que numa situação, admitida pela legislação finlandesa, em que uma assistência pessoal idêntica é utilizada no estrangeiro por um residente finlandês durante viagens de negócios ou de férias (36).

74.      Por outro lado, observo que o Governo finlandês esclareceu que nenhum elemento permite considerar que a concessão de uma assistência pessoal, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, possa ameaçar o equilíbrio do sistema nacional de segurança social. Sem indicação concreta adicional por parte do órgão jurisdicional de reenvio que indicie a existência de tal ameaça, importa, na minha opinião, registar essa constatação.

75.      Por conseguinte, considero que, em circunstâncias como as do processo principal, nenhum dos objetivos evidenciados pelo órgão jurisdicional de reenvio permite justificar a restrição à liberdade de circulação e de residência de um cidadão da União como A.

76.      Nestas circunstâncias, não importa pronunciar‑se quanto à interpretação, também solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio, do artigo 19.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, por esta não ser suscetível de alterar a resposta que proponho que seja dada às segunda e terceira questões prejudiciais.

V.      Conclusão

77.      Pelo conjunto das considerações precedentes, proponho que se responda ao pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia) do seguinte modo:

1)      Uma prestação como a assistência pessoal em causa no processo principal não está abrangida pela qualificação de “prestações por doença”, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social.

2)      Os artigos 20.o e 21.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que um município de um Estado‑Membro recuse a concessão de uma assistência pessoal, como a que está em causa no processo principal, com fundamento no facto de o requerente, portador de deficiência grave e que reside no território desse município, pretender prosseguir os seus estudos superiores, com vista à obtenção de um diploma, noutro Estado‑Membro.


1      Língua original: francês.


2      JO 2004, L 166, p. 1.


3      JO 2009, L 284, p. 43.


4      Decisão do Conselho de 26 de novembro de 2009, relativa à celebração, pela Comunidade Europeia, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (JO 2010, L 23, p. 35.).


5      A saber, tanto o Regulamento n.o 3 do Conselho, de 3 de dezembro de 1958, relativo à segurança social dos trabalhadores migrantes (JO 1958, p. 561), como o Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97, de 2 de dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1).


6      V., designadamente, por analogia com o artigo 5.o do Regulamento n.o 1408/71, Acórdão de 11 de julho de 1996, Otte (C‑25/95, EU:C:1996:295, n.o 20 e jurisprudência referida).


7      V., designadamente, Acórdãos de 27 de março de 1985, Hoeckx (249/83, EU:C:1985:139, n.os 12 a 14); de 16 de julho de 1992, Hughes (C‑78/91, EU:C:1992:331, n.o 15); de 7 de novembro de 2002, Maaheimo (C‑333/00, EU:C:2002:641, n.os 22 e 24); de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.o 38); de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia (C‑433/13, EU:C:2015:602, n.o 71); e de 21 de junho de 2017, Martinez Silva (C‑449/16, EU:C:2017:485, n.o 20).


8      V., neste sentido, sob a égide do Regulamento n.o 3, Acórdão de 22 de junho de 1972, Frilli (1/72, EU:C:1972:56, n.o 13); e, sob a égide do Regulamento n.o 1408/71, Acórdãos de 28 de maio de 1974, Callemeyn (187/73, EU:C:1974:57, n.o 6); de 27 de março de 1985, Hoeckx (249/83, EU:C:1985:139, n.o 12); e de 27 de março de 1985, Scrivner e Cole (122/84, EU:C:1985:145, n.o 19).


9      Regulamento (CEE) n.o 1247/92 do Conselho, de 30 de abril de 1992, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1408/71, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros das suas famílias que se desloquem no interior da Comunidade (JO 1992, L 136, p. 1.)


10      V. Acórdãos de 21 de fevereiro de 2006, Hosse (C‑286/03, EU:C:2006:125, n.o 36), e de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia (C‑433/13, EU:C:2015:602, n.o 45).


11      De um modo geral, o Tribunal de Justiça recusa alargar ou alterar o objeto do pedido de decisão prejudicial quando, de forma deliberada, não lhe são submetidas questões de interpretação do direito da União: v., a este respeito, as minhas Conclusões no processo Fonnship e Svenska Transportarbetareförbundet (C‑83/13, EU:C:2014:201, n.os 19 a 24).


12      V., neste sentido, Acórdãos de 27 de março de 1985, Hoeckx (249/83, EU:C:1985:139, n.o 12); de 27 de março de 1985, Scrivner e Cole (122/84, EU:C:1985:145, n.o 19); de 11 de julho de 1996, Otte (C‑25/95, EU:C:1996:295, n.o 22); de 5 de março de 1998, Molenaar (C‑160/96, EU:C:1998:84, n.o 20); e de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.o 41).


13      V. Acórdão de 16 de julho de 1992, Hughes (C‑78/91, EU:C:1992:331, n.o 17) (sublinhado nosso). V., também, artigos órdão de 2 de agosto de 1993, Acciardi (C‑66/92, EU:C:1993:341, n.o 15).


14      V. Acórdão de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia (C‑433/13, EU:C:2015:602, n.os 78 e 79).


15      O Tribunal de Justiça define o risco de dependência como designando, no essencial, a situação em que, em razão de uma autonomia reduzida, uma pessoa esteja dependente da assistência de outrem para realizar gestos essenciais da vida quotidiana: v. Acórdãos de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.os 39 e 40); e de 12 de julho de 2012, Comissão/Alemanha (C‑562/10, EU:C:2012:442, n.o 44).


16      V., no âmbito do artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1408/71, Acórdãos de 5 de março de 1998, Molenaar (C‑160/96, EU:C:1998:84, n.os 23 a 25); de 8 de março de 2001, Jauch (C‑215/99, EU:C:2001:139, n.o 28); de 8 de julho de 2004, Gaumain‑Cerri e Barth (C‑502/01 e C‑31/02, EU:C:2004:413, n.o 19); de 21 de fevereiro de 2006, Hosse (C‑286/03, EU:C:2006:125, n.os 38 a 44); de 18 de outubro de 2007, Comissão/Parlamento e Conselho (C‑299/05, EU:C:2007:608, n.os 10, 61 e 70); de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.os 40 a 45); de 12 de julho de 2012, Comissão/Alemanha (C‑562/10, EU:C:2012:442, n.o 45); e de 1 de fevereiro de 2017, Tolley (C‑430/15, EU:C:2017:74, n.o 46).


17      V., designadamente, Acórdãos de 5 de março de 1998, Molenaar (C‑160/96, EU:C:1998:84, n.o 24); de 18 de outubro de 2007, Comissão/Parlamento e Conselho (C‑299/05, EU:C:2007:608, n.o 61); de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.o 45); e de 1 de fevereiro de 2017, Tolley (C‑430/15, EU:C:2017:74, n.o 46).


18      V., neste sentido, Acórdão de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.os 47 e 48).


19      Sublinhado nosso.


20      Por conseguinte, não é necessário que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre o argumento apresentado pela Comissão, assente no Acórdão de 5 de maio de 1983, Piscitello (139/82, EU:C:1983:126), segundo o qual o facto de o recorrente no processo principal ter beneficiado de um direito de recurso no presente processo seria um indício de que a assistência pessoal constitui não uma assistência social, mas uma prestação de segurança social que lhe confere uma posição legalmente definida. Se é verdade que, nas suas Conclusões apresentadas nesse processo (139/82, não publicadas, EU:C:1983:67, n.o 5), o advogado‑geral G. F. Mancini se tinha, a título complementar, apoiado nessa circunstância, o Tribunal de Justiça não lhe fez qualquer referência no seu acórdão. Por outro lado, o exercício de um poder discricionário aquando da concessão de uma ajuda social não faz com que a administração escape à fiscalização jurisdicional, mais ainda no atual estado de desenvolvimento do direito da União. Além disso, tendo em conta a porosidade entre segurança social e assistência social, esta última está a tornar‑se cada vez mais um direito nos Estados‑Membros, à semelhança do Reino da Bélgica que consagra o «direito» à integração social: v., a este respeito, Paolillo, M., «Entre assurance et assistance: “L’articulation entre la sécurité sociale et l’aide sociale au sens large”», Annales de Droit de Louvain, 2012, n.o 4, p. 438.


21      V., designadamente, Acórdãos de 5 de março de 1998, Molenaar (C‑160/96, EU:C:1998:84, n.o 24), e de 30 de junho de 2011, da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.o 45).


22      V., designadamente, Acórdãos de 5 de março de 1998, Molenaar (C‑160/96, EU:C:1998:84, n.o 23); de 8 de julho de 2004, Gaumain‑Cerri e Barth (C‑502/01 e C‑31/02, EU:C:2004:413, n.os 3, 21 e 26); e de 12 de julho de 2012, Comissão/Alemanha (C‑562/10, EU:C:2012:442, n.os 40 e 46).


23      V. Acórdão de 1 de fevereiro de 2017, Tolley (C‑430/15, EU:C:2017:74, n.o 15).


24      V., neste sentido, Acórdão de 14 de junho de 2017, Online Games e o. (C‑685/15, EU:C:2017:452, n.o 45 e jurisprudência referida).


25      V., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 20 e jurisprudência referida).


26      V., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 21 e jurisprudência referida).


27      V., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 22 e jurisprudência referida).


28      V. Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 25 e jurisprudência referida).


29      V., designadamente, as situações factuais que deram origem aos Acórdãos de 18 de julho de 2013, Prinz e Seeberger (C‑523/11 e C‑585/11, EU:C:2013:524); de 24 de outubro de 2013, Elrick (C‑275/12, EU:C:2013:684); e de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118).


30      A este respeito, não é impossível que o recorrente no processo principal, que tenciona estudar estudos jurídicos, não tenha, afinal, alternativa à escolha de estudar fora da Finlândia. Com efeito, apenas existem atualmente três faculdades de direito nesse Estado‑Membro (Helsínquia, Turku e Rovaniemi), cujo acesso está subordinado à aprovação num concurso de entrada particularmente difícil. Além disso, com exceção da cidade de Helsínquia, que se encontra a alguns quilómetros do município de Espoo, Turku e Rovaniemi situam‑se, respetivamente, a 150 km e 830 km de Espoo, ou seja, a uma distância bastante superior à que separa esta da cidade de Taline, que é servida por numerosas ligações marítimas diárias a partir de Helsínquia, designadamente.


31      V. Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 26 e jurisprudência referida).


32      V., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.o 34 e jurisprudência referida).


33      V. Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500, n.os 104 e 109).


34      V. Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500, n.os 97 a 102).


35      V. Acórdão de 21 de julho de 2011, Stewart (C‑503/09, EU:C:2011:500, n.o 103).


36      Pergunto‑me mesmo se, tendo em conta o facto, mencionado pelo órgão jurisdicional de reenvio, de a assistência pessoal poder continuar a ser concedida se o interessado prosseguir estudos superiores noutros municípios finlandeses diferentes do seu município de residência, as possibilidades de controlo por este da utilização da assistência não são mais simples numa situação em que o recorrente no processo principal prossegue os seus estudos em Taline, regressando cada fim de semana a Espoo, mais do que se tivesse sido admitido na faculdade de direito de Rovaniemi, a uma distância de cerca de 900 km do seu município de residência.