Language of document : ECLI:EU:T:2017:128

DESPACHO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

28 de fevereiro de 2017 (*)

«Recurso de anulação — Declaração UE‑Turquia de 18 de março de 2016 — Comunicado de imprensa — Conceito de ‘acordo internacional’ — Identificação do autor do ato — Alcance do ato — Sessão do Conselho Europeu — Reunião dos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União Europeia que decorreu nas instalações do Conselho da União Europeia — Qualidade dos representantes dos Estados‑Membros da União por ocasião de um encontro com o representante de um Estado terceiro — Artigo 263.°, primeiro parágrafo, TFUE — Incompetência»

No processo T‑192/16,

NF, residente na ilha de Lesbos (Grécia), representado por B. Burns, solicitor, P. O’Shea e I. Whelan, barristers,

recorrente,

contra

Conselho Europeu, representado por K. Pleśniak, Á. de Elera‑San Miguel Hurtado e S. Boelaert, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto um pedido nos termos do artigo 263.° TFUE destinado a obter a anulação de um acordo que teria sido pretensamente celebrado entre o Conselho Europeu e a República da Turquia em 18 de março de 2016, intitulado «Declaração UE‑Turquia, 18 de março de 2016»,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada),

composto por: I. Pelikánová, presidente, V. Valančius, P. Nihoul, J. Svenningsen (relator) e U. Öberg, juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Despacho

 Antecedentes do litígio

 Sobre os encontros entre os dirigentes europeu e turco anteriores a 18 de março de 2016

1        Em 15 de outubro de 2015, a República da Turquia e a União Europeia convencionaram um plano de ação comum intitulado «EU‑Turkey joint action plan» (a seguir «plano de ação comum») destinado a reforçar a sua cooperação, em matéria de apoio aos cidadãos sírios que beneficiam de proteção internacional temporária e em matéria de gestão migratória, para dar resposta à crise criada pela situação na Síria.

2        O plano de ação comum ambicionava dar resposta à situação de crise na Síria de três maneiras, a saber: em primeiro lugar, tratando, de raiz, as causas que conduzam a um êxodo massivo de sírios; em segundo lugar, dando apoio aos sírios que beneficiam de proteção internacional temporária e às respetivas comunidades de acolhimento na Turquia; e, em terceiro lugar, reforçando a cooperação em matéria de prevenção dos fluxos de migração ilegais em direção à União.

3        Em 29 de novembro de 2015, os Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União encontraram‑se com o seu homólogo turco (a seguir «primeira reunião dos Chefes de Estado ou de Governo»). Ao termo desse encontro, decidiram ativar o plano de ação comum e, designadamente, intensificar a sua cooperação ativa no que respeita aos migrantes que não necessitassem de proteção internacional, impedindo‑os de se deslocarem para a Turquia e para a União, assegurando a aplicação das disposições bilaterais que tinham sido estabelecidas em matéria de readmissão e remetendo rapidamente para os seus países de origem os migrantes que não necessitassem de proteção internacional.

4        Em 8 de março de 2016, uma declaração dos Chefes de Estado ou de Governo da União, publicada pelos serviços conjuntos do Conselho Europeu e do Conselho da União Europeia, indicava que os Chefes de Estado ou de Governo da União se tinham encontrado com o Primeiro‑Ministro turco a propósito das relações entre a União e a República da Turquia e que tinham sido alcançados progressos na execução do plano de ação comum. Este encontro decorreu em 7 de março de 2016 (a seguir a «segunda reunião dos Chefes de Estado ou de Governo»). Esta declaração precisava:

«Os Chefes de Estado ou de Governo acordaram na necessidade de iniciativas resolutas para encerrar as rotas do tráfico de seres humanos, desmantelar o modelo de negócio dos passadores, proteger [as] fronteiras externas [da União] e pôr termo à crise migratória na Europa. […]. Acolheram com grande satisfação as propostas adicionais apresentadas hoje pela [República da] Turquia para fazer face ao problema da migração, tendo acordado em trabalhar com base nos princípios [seguintes]:

–        fazer regressar todos os novos migrantes irregulares que chegam às ilhas gregas provenientes da Turquia ficando todos os custos a cargo da [União];

–        reinstalar, por cada sírio readmitido pela Turquia proveniente das ilhas gregas, outro sírio proveniente da Turquia nos Estados‑Membros da [União], no quadro dos compromissos existentes;

–        […]

O presidente do Conselho Europeu dará seguimento a estas propostas e acertará os pormenores com a [República da Turquia] antes do Conselho Europeu de março. […]

O presente documento não estabelece quaisquer novos compromissos para os Estados‑Membros no que diz respeito à recolocação e à reinstalação.

[…]»

5        Na sua comunicação COM(2016) 166 final ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu e ao Conselho, de 16 de março de 2016, intitulada «N[ovas iniciativas operacionais na cooperação entre a UE e a Turquia no domínio da migração]» (a seguir «comunicação de 16 de março de 2016»), a Comissão Europeia indicou que, em 7 de março de 2016, os «Chefes de Estado ou de Governo [da União tinham acolhido] com satisfação as propostas adicionais feitas pela [República da] Turquia e [tinham acordado] em trabalhar […] com base num conjunto de seis princípios», que «[o] presidente do Conselho Europeu [tinha sido] convidado a aprofundar estas propostas, e a definir as respetivas modalidades com a Turquia antes do Conselho Europeu de março» e que «a presente comunicação defin[ia] o modo como os seis princípios devem avançar, para concretizar o pleno potencial de cooperação entre a [União] e a [República da] Turquia, no respeito do direito europeu e do direito internacional».

6        Na comunicação de 16 de março de 2016, a Comissão indicava designadamente que «[o] regresso de todos os novos migrantes em situação irregular e dos requerentes de asilo da Grécia para a Turquia [era] […] essencial para pôr cobro à tendência de os refugiados e migrantes pagarem aos traficantes e arriscarem as suas vidas» e que, «tendo em conta a dimensão dos fluxos existentes atualmente entre a Turquia e a Grécia, a organização desses regressos deve ser considerada uma medida temporária e excecional, [que era] necessária para pôr termo ao sofrimento humano e restabelecer a ordem pública e que dev[ia] ser apoiada com o quadro operacional pertinente». Segundo esta comunicação, tinham sido registados progressos no que respeitava àreadmissão, pela República da Turquia, de migrantes em situação irregular e dos requerentes de asilo que não necessitassem de proteção internacional ao abrigo do acordo bilateral de readmissão entre a República Helénica e a República da Turquia, o qual devia ser substituído, a partir de 1 de junho de 2016, pelo Acordo entre a União Europeia e a República da Turquia relativo à readmissão das pessoas em situação irregular (JO 2014, L 134, p. 3).

7        A Comissão concluía, na comunicação de 16 de março de 2016, que «[a]s disposições para o regresso de todos os novos migrantes irregulares e requerentes de asilo que atravessam o mar Egeu entre a Turquia […] [era] uma medida temporária e extraordinária, [que] dev[ia] começar logo que possível», e que, nesta perspetiva, a referida comunicação «defin[ia] um quadro que irá garantir que o processo é executado em conformidade com o direito internacional e o direito europeu, que exclui a aplicação de uma política de regresso ‘geral’ [, e] [indicava] igualmente as medidas, legislativas e logísticas, que dev[iam] ser tomadas com caráter de urgência para o lançamento do processo».

 Sobre a reunião de 18 de março de 2016 e sobre a declaração UETurquia

8        Em 18 de março de 2016, sob a forma do comunicado de imprensa n.° 144/16, foi publicada no sítio Internet do Conselho uma declaração destinada a dar a conhecer os resultados da «terceira reunião desde novembro de 2015 dedicada ao estreitar de relações entre a UE e a Turquia e a dar resposta à crise migratória» (a seguir «reunião de 18 de março de 2016») entre «os membros do Conselho Europeu» e «o seu homólogo turco» (a seguir «declaração UE‑Turquia»).

9        A declaração UE‑Turquia expunha que, «volta[ndo] a confirmar o seu empenhamento na implementação do seu plano de ação conjunto, ativado em 29 de novembro de 2015[, a [República da] Turquia e a [União] reconhec[ia]m a necessidade de envidar esforços renovados, rápidos e determinados». Esta declaração prossegu[ia] nos seguintes termos:

«A fim de desmantelar o modelo de negócio dos passadores e dar aos migrantes uma alternativa que não implique arriscar a vida, a UE e a [República da] Turquia decidiram hoje pôr termo à migração irregular da Turquia para a [União]. Para atingir este objetivo, acordaram nos seguintes pontos de ação adicionais:

1)      Todos os novos migrantes irregulares que cheguem às ilhas gregas provenientes Turquia a partir de 20 de março de 2016 serão devolvidos a este último país. Tal será feito em plena conformidade com o direito da [União] e o direito internacional, excluindo‑se assim qualquer tipo de expulsão coletiva. Todos os migrantes receberão proteção em conformidade com as normas internacionais pertinentes e no respeito do princípio da não repulsão. Tratar‑se‑á de uma medida temporária e extraordinária, necessária para pôr fim ao sofrimento das pessoas e restabelecer a ordem pública. Os migrantes que chegam às ilhas gregas serão devidamente registados e todos os pedidos de asilo serão tratados individualmente pelas autoridades gregas em conformidade com a Diretiva «Procedimentos de asilo», em cooperação com o ACNUR. Os migrantes que não pedirem asilo ou cujos pedidos tenham sido considerados infundados ou não admissíveis, nos termos da referida diretiva, serão devolvidos à Turquia. A [República da] Turquia e a [República Helénica], apoiadas pelas instituições e agências da [União], tomarão as medidas necessárias e chegarão a acordo sobre as disposições bilaterais necessárias, incluindo a presença, a partir de 20 de março de 2016, de funcionários turcos nas ilhas gregas e de funcionários gregos na Turquia, a fim de assegurar a ligação e facilitar, deste modo, o bom funcionamento dessas disposições. Os custos das operações de regresso dos migrantes irregulares serão assumidos pela UE.

2)      Por cada sírio devolvido à Turquia a partir das ilhas gregas, outro sírio proveniente [República da] Turquia será reinstalado na [União], tendo em conta os critérios de vulnerabilidade das Nações Unidas. Com o apoio da Comissão, das agências da [União], dos outros Estados‑Membros e também do ACNUR, será criado um mecanismo para assegurar a implementação deste princípio a partir do mesmo dia em que se der início aos regressos. Será dada prioridade aos migrantes que não tenham anteriormente entrado ou tentado entrar de forma irregular na [União]. Do lado da UE, o processo de reinstalação no âmbito deste mecanismo realizar‑se‑á, em primeiro lugar, honrando os compromissos assumidos pelos Estados‑Membros nas conclusões dos representantes dos governos dos Estados‑Membros reunidos no Conselho de 20 de julho de 2015, no âmbito dos quais restam 18 000 lugares para efeitos de reinstalação. Quaisquer necessidades adicionais de reinstalação serão satisfeitas através de um acordo voluntário semelhante, até ao número máximo de 54 000 pessoas adicionais. […]»

 Quanto à situação do recorrente

10      O recorrente, NF, tem nacionalidade paquistanesa. Explica ter fugido da República Islâmica do Paquistão por receio de perseguição e de ofensas graves à sua pessoa. Com efeito, afirma ter sido alvo de tentativas de assassinato com as quais se pretendia evitar que, enquanto filho único, herdasse bens dos seus progenitores.

11      Segundo declarou, o recorrente entrou na Grécia de barco, vindo da Turquia, em 19 de março de 2016. Em 11 de abril de 2016, ou por volta dessa data, apresentou um pedido de asilo às autoridades gregas. Ficou a seguir retido num centro de retenção até 18 de abril de 2016, data em que fugiu para a ilha de Lesbos (Grécia).

12      O recorrente explica que apenas apresentou o seu pedido de asilo devido a pressões sobre ele exercidas pelas autoridades gregas para que apresentasse esse pedido. No entanto, nunca quis ou teve intenção de apresentar esse pedido na Grécia devido à lentidão do tratamento dos pedidos de asilo e às deficiências sistemáticas na aplicação do sistema de asilo europeu quer a nível da administração deste Estado‑Membro quer ao nível do seu sistema jurisdicional. Tais deficiências foram designadamente constatadas pelas jurisdições europeias no acórdão de 21 de dezembro de 2011, N. S. e o. (C‑411/10 e C‑493/10, EU:C:2011:865), e no acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, de 21 de janeiro de 2011, M.S.S. c. Bélgica e Grécia (CE:ECHR:2011:0121JUD003069609).

13      Por último, a apresentação, pelo recorrente, do seu pedido de asilo na Grécia apenas lhe serviu para evitar a sua repulsão para a Turquia onde, se for caso disso, corre o risco de ser colocado em retenção ou de ser expulso para o Paquistão.

 Processo e pedidos das partes

14      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de abril de 2016, o recorrente apresentou o presente recurso, no qual, considerando que a declaração UE‑Turquia era um ato atribuível ao Conselho Europeu que materializa um acordo internacional celebrado em 18 de março de 2016 entre a União e a República da Turquia, que qualifica nos seus articulados como «acordo controvertido», conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o «acordo [celebrado] entre o Conselho Europeu e a [República da] Turquia, datado de 18 de março de 2016 [e] intitulado ‘Declaração UE‑Turquia, 18 de março de 2016’» (a seguir «ato impugnado»);

–        condenar o Conselho Europeu nas despesas.

 Quanto à tramitação acelerada e remessa do processo à Primeira Secção alargada

15      Por requerimento separado apresentado juntamente com a petição de recurso, o recorrente, ao abrigo do artigo 152.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, pediu ao Tribunal Geral que se pronunciasse segundo a tramitação acelerada.

16      Em 10 de junho de 2016, o Conselho Europeu apresentou observações sobre o pedido de tramitação acelerada, concluindo, em substância, que as condições de aplicação desta tramitação não se encontravam preenchidas. Por requerimento separado da mesma data, esta instituição pediu, a título principal, a remessa do presente processo à Grande Secção, em aplicação do artigo 28.°, n.os 1 e 2, do Regulamento de Processo. A título subsidiário, esta instituição pediu, ao abrigo do artigo 28, n.° 5, desse Regulamento de Processo, a remessa do processo a uma formação composta por, pelo menos, cinco juízes.

17      Por carta de 20 de junho de 2016, a Secretaria do Tribunal Geral acusou receção do pedido de remessa do presente processo à Grande Secção e informou as partes quanto à remessa deste, em aplicação do artigo 28.°, n.° 5, do Regulamento de Processo, a uma formação alargada composta por cinco juízes, concretamente, a Sétima Secção alargada.

18      Por decisão de 22 de junho de 2016, o Tribunal Geral decidiu dar deferimento ao pedido de tramitação acelerada.

 Quanto à exceção suscitada pelo Conselho Europeu e aos pedidos de intervenção

19      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de julho de 2016, o Conselho, ao abrigo do artigo 130.° do Regulamento de Processo, suscitou uma exceção intitulada «Exceção de inadmissibilidade».

20      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de julho de 2016, NQ, NR, NS, NT, NU e NV pediram para intervir em apoio dos pedidos do recorrente.

21      Por requerimentos apresentados em 20 e 22 de julho de 2016, o Reino da Bélgica e a República Helénica pediram para intervir em apoio dos pedidos do Conselho Europeu.

22      Por requerimento apresentado em 3 de agosto de 2016, a Comissão pediu para intervir em apoio dos pedidos do «Conselho da União Europeia». Por carta de retificação de 11 de agosto de 2016, a Comissão comunicou querer intervir em apoio dos pedidos do «Conselho Europeu».

23      Na exceção que suscitou, o Conselho Europeu pede formalmente ao Tribunal Geral:

–        que rejeite o recurso por ser «manifestamente inadmissível»;

–        que condene o recorrente nas despesas.

24      Em 3 de agosto de 2016, o recorrente apresentou as suas observações sobre a exceção suscitada pelo Conselho Europeu nas quais pede ao Tribunal Geral:

–        que rejeite a referida exceção;

–        que declare o recurso admissível;

–        que condene o Conselho Europeu nas despesas por ele efetuadas no âmbito do processo incidental.

25      Através de carta da Secretaria de 3 de outubro de 2016, as partes foram informadas da designação de um novo juiz-relator e da reatribuição do presente processo à Primeira Secção alargada, à qual este juiz pertence.

 Quanto às respostas às medidas de organização do processo

26      Por cartas da Secretaria de 3 de novembro de 2016, o Conselho Europeu foi convidado a dar deferimento a medidas de organização do processo adotadas pelo Tribunal Geral ao abrigo do artigo 89.°, n.° 3, alíneas a) e d), e do artigo 90.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, ao passo que o Conselho e a Comissão foram, por sua vez, convidados pelo Tribunal Geral, nos termos do artigo 24.°, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 89.°, n.° 3, alínea c), do referido regulamento, a responder a algumas perguntas e a fornecer alguns documentos. Neste contexto, estas instituições foram designadamente convidadas a informar o Tribunal Geral se a reunião de 18 de março de 2016 tinha dado lugar a um acordo escrito e, sendo o caso, a comunicar‑lhe qualquer documento que permitisse determinar a identidade das partes que tivessem acordado «pontos de ação adicionais» mencionados na declaração UE‑Turquia.

27      Nas suas respostas às perguntas do Tribunal Geral fornecidas em 18 de novembro de 2016, o Conselho Europeu explicou, designadamente, que, tanto quanto fosse do seu conhecimento, nenhum acordo ou tratado, na aceção do artigo 218.° TFUE ou do artigo 2.°, n.° 1, alínea a), da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de maio de 1969, tinha sido celebrado entre a União e a República da Turquia. A declaração UE‑Turquia, conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16, mais não foi do que «o fruto de um diálogo internacional entre os Estados‑Membros e a [República da] Turquia e, tendo em conta o seu conteúdo e a intenção dos seus autores, não [se destinava] a produzir efeitos jurídicos vinculativos nem a constituir um acordo ou um tratado».

28      O Conselho Europeu apresentou igualmente um certo número de documentos relativos à reunião de 18 de março de 2016 que constituía, segundo esta instituição, uma reunião dos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União com o representante da República da Turquia e não uma sessão do Conselho Europeu em que tivesse participado este Estado terceiro.

29      Na sua resposta de 18 de novembro de 2016, a Comissão indicou, designadamente, ao Tribunal Geral que era claro, em razão do vocabulário utilizado na declaração UE‑Turquia, designadamente o uso, na versão inglesa desta, do termo «will», que não se tratava de um acordo juridicamente vinculativo, mas de um acordo político a que tinham chegado os «membros do Conselho Europeu [, isto é] os Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros, o Presidente do Conselho Europeu e o Presidente da Comissão», o qual fora integralmente transcrito no corpo do comunicado de imprensa n.° 144/16 relativo à reunião de 18 de março de 2016 e que expõe a declaração UE‑Turquia.

30      Na sua resposta de 2 de dezembro de 2016, o Conselho explicou, designadamente, que não era o autor da declaração UE‑Turquia e que não tinha sido de modo nenhum envolvido no diálogo estruturado que tinha existido entre os representantes dos Estados‑Membros e a República da Turquia ou nas atividades do presidente do Conselho Europeu que culminaram nessa declaração. O trabalho preparatório que foi realizado no Comité dos Representantes Permanentes (Coreper) apenas tinha por objeto a preparação das reuniões do Conselho Europeu, algumas das quais diziam respeito à gestão da crise migratória. Em contrapartida, o Conselho afirma que não preparou a cimeira de 18 de março de 2016 entre os membros do Conselho Europeu, que são os Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União, e o Primeiro-Ministro turco.

31      O Conselho afirmou, além disso, que partilhava plenamente da posição desenvolvida pelo Conselho Europeu na exceção por ele formulada ao abrigo do artigo 130.° do Regulamento de Processo. Em especial, alegou, a este respeito, que, do seu conhecimento, nenhum acordo nem tratado tinha sido concluído entre a União e a República da Turquia relativo à crise migratória.

32      Nas suas observações apresentadas em 19 de dezembro de 2016, o recorrente contestou a posição do Conselho Europeu, do Conselho e da Comissão segundo a qual, por um lado, nenhum acordo foi celebrado com a República da Turquia na reunião de 18 de março de 2016 e, por outro, o resultado das discussões com este Estado terceiro deveria ser qualificado de acordo político. O recorrente considera designadamente que, tendo em conta a linguagem utilizada no que ele qualifica de «acordo controvertido», o uso do termo inglês «agree» (que significaria «decidido») permite declarar que se trata de um acordo destinado a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros. Além disso, a ausência da expressão «Estados‑Membros» indica que o «acordo controvertido» não poderia ter sido celebrado pelos Estados‑Membros da União.

 Questão de direito

33      Por força do artigo 130.° do Regulamento de Processo, quando, por requerimento separado, o demandado pedir ao Tribunal Geral que se pronuncie sobre a inadmissibilidade ou sobre a incompetência sem dar início à discussão do mérito da causa, este deve conhecer do pedido o mais rapidamente possível, se for o caso, após ter aberto a fase oral do processo.

34      No caso vertente, o Tribunal Geral considera‑se suficientemente esclarecido pelos documentos dos autos e decide pronunciar‑se sem que seja necessário propor à Conferência Plenária a remessa do presente processo à Grande Secção nem abrir a fase oral.

35      No âmbito da exceção que suscita, o Conselho Europeu suscita, a título principal, a exceção de incompetência do Tribunal Geral para se pronunciar sobre o presente recurso.

36      Entendendo‑se que as regras de competência das jurisdições da União previstas pelo Tratado FUE bem como pelo Estatuto do Tribunal de Justiça e pelo respetivo anexo fazem parte do direito primário da União, assumem um lugar central na ordem jurídica da União e que, por conseguinte, o respeito das mesmas constitui uma exigência fundamental nesta ordem jurídica (acórdão de 10 de setembro de 2015, Réexamen Missir Mamachi di Lusignano/Comissão, C‑417/14 RX‑II, EU:C:2015:588, n.° 57), o Tribunal Geral deve apreciar esta questão em primeiro lugar.

37      Em apoio da exceção de incompetência que suscita, o Conselho Europeu alega que nem ele próprio nem nenhuma das entidades referidas no artigo 263.°, primeiro parágrafo, TFUE é o autor da declaração UE‑Turquia, conforme difundida pelo Conselho através do comunicado de imprensa n.° 144/16, pelo que não pode ser regularmente designado como recorrido no caso vertente.

38      Com efeito, segundo o Conselho Europeu, a declaração UE‑Turquia emana dos participantes numa cimeira internacional, realizada, concretamente, em 18 de março de 2016, à margem e posteriormente à sessão do Conselho Europeu. Por conseguinte, esta declaração deve ser atribuída aos membros do Conselho Europeu, que são os Estados‑Membros da União, e ao seu «homólogo turco», uma vez que foram estes que se reuniram no quadro de uma reunião distinta da do Conselho Europeu. Esta reunião distinta seguiu-se às duas primeiras reuniões dos Chefes de Estado ou de Governo, do mesmo tipo, que se tinham realizado em 29 de novembro de 2015 e em 7 de março de 2016 e que tinham dado lugar à publicação quer de uma declaração comum, como a que está em causa no caso vertente referida no comunicado de imprensa n.° 144/16, quer de um plano de ação comum. O Conselho Europeu considera que a declaração UE‑Turquia não pode, portanto, ser qualificada de ato por ele adotado.

39      O recorrente opõe‑se a esta análise invocando que aquilo que ele qualifica de «acordo controvertido» enquanto ato impugnado, tendo em conta o seu conteúdo e todas as circunstâncias que envolvem a sua adoção, deve ser considerado um ato do Conselho Europeu, porque, no caso vertente, contrariamente ao que esta instituição afirma, os Estados‑Membros da União agiram coletivamente no interior da referida instituição e não exerceram competências nacionais fora do quadro institucional da União. Por outro lado, o recorrente afirma que o Conselho Europeu e a Comissão participaram ativamente na preparação e na negociação deste «acordo controvertido», como disso é testemunho, a este respeito, o conteúdo da comunicação de 16 de março de 2016, e que o referido «acordo controvertido» reveste, na realidade, a natureza de um tratado internacional.

40      O recorrente contesta que o Conselho Europeu possa, por um lado, afirmar que os membros desta instituição agiram, no caso vertente, na qualidade de representantes dos seus Governos ou Estados e, por outro lado, afirmar que os Estados‑Membros puderam assim agir em nome da União, vinculando‑a a um Estado terceiro por aquilo que o mesmo qualifica de «acordo controvertido», o qual, além do mais, é contrário às normas previstas no direito derivado da União aplicável em matéria de asilo.

41      De qualquer modo, há que fazer referência aos termos utilizados na declaração UE‑Turquia, conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16, designadamente a circunstância de que esta, por um lado, faz referência ao facto de que a «UE» e a República da Turquia «acordaram» sobre certos pontos de ação adicionais, «decidiram» e «voltaram a confirmar» certos aspetos e, por outro, enuncia obrigações específicas aceites por cada uma das partes, o que corrobora, em seu entender, a existência de um acordo juridicamente vinculativo. Por outro lado, no que diz respeito às explicações da Comissão relativas à existência de um quadro jurídico legislativo e regulamentar que já permite o financiamento das operações de regresso, o que constituía um ponto de ação adicional referido pela declaração UE‑Turquia, o recorrente considera que isso sugere que o que qualifica de «acordo controvertido» foi celebrado num contexto que permite a sua aplicação, o que reforça a capacidade do referido «acordo controvertido» para produzir efeitos jurídicos.

 Considerações preliminares

42      A título preliminar, recorde‑se que são suscetíveis do recurso de anulação previsto no artigo 263.° TFUE todas as disposições adotadas pelas instituições, órgãos e organismos da União, independentemente da natureza ou da forma destas, desde que as mesmas visem produzir efeitos jurídicos (acórdãos de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.° 42, e de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.os 38 e 39; v., igualmente, acórdão de 28 abril de 2015, Comissão/Conselho, C‑28/12, EU:C:2015:282, n.os 14 e 15 e jurisprudência referida). A este propósito, a circunstância de a existência de um ato destinado a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros ter sido revelada através de um comunicado de imprensa ou de esse ato ter tomado a forma de uma declaração não obsta à possibilidade de declarar a existência desse ato nem, portanto, à competência do juiz da União para fiscalizar a legalidade desse ato ao abrigo do artigo 263.° TFUE, desde que o mesmo emane de uma instituição, de um órgão ou de um organismo da União (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.° 14).

43      No que diz respeito ao Conselho Europeu, o Tratado de Lisboa elevou esta entidade à categoria de instituição da União. Deste modo, contrariamente ao que tinha sido anteriormente declarado pelo juiz da União (despachos de 13 de janeiro de 1995, Roujansky/Conselho, C‑253/94 P, EU:C:1995:4, n.° 11, e de 13 de janeiro de 1995, Bonnamy/Conselho, C‑264/94 P, EU:C:1995:5, n.° 11), os atos adotados por esta instituição, que, nos termos do artigo 15.° TUE, não exerce função legislativa e é composta pelos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros bem como pelo seu presidente e pelo presidente da Comissão, já não podem escapar per se à fiscalização da legalidade prevista nos termos do artigo 263.° TFUE (v., neste sentido, acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle, C‑370/12, EU:C:2012:756, n.os 30 a 37).

44      Assim sendo, resulta do artigo 263.° TFUE que, de um modo geral, o juiz da União não tem competência para se pronunciar sobre a legalidade de um ato adotado por uma autoridade nacional (acórdãos de 3 de dezembro de 1992, Oleificio Borelli/Comissão, C‑97/91, EU:C:1992:491, n.° 9, e de 15 de dezembro de 1999, Kesko/Comissão, T‑22/97, EU:T:1999:327, n.° 83), nem de um ato adotado pelos representantes de autoridades nacionais de vários Estados‑Membros que atuem no quadro de um comité previsto por um regulamento da União (v., neste sentido, acórdão de 17 de setembro de 2014, Liivimaa Lihaveis, C‑562/12, EU:C:2014:2229, n.° 51). Do mesmo modo, os atos adotados pelos representantes dos Estados‑Membros, reunidos fisicamente no recinto de uma das instituições da União e agindo, não na qualidade de membros do Conselho ou de membros do Conselho Europeu, mas na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União, não estão sujeitos à fiscalização da legalidade exercida pelo juiz da União (acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.° 12).

45      No entanto, não basta, a este respeito, que um ato seja qualificado por uma instituição posta em causa enquanto recorrida num recurso de uma «decisão dos Estados‑Membros» da União, para que esse ato escape à fiscalização da legalidade instituída pelo artigo 263.° TFUE, neste caso, dos atos do Conselho Europeu. Com efeito, para isso, é ainda necessário que o ato em questão, tendo em conta o seu conteúdo e o conjunto das circunstâncias em que foi adotado, não constitua na realidade uma decisão do Conselho Europeu (v. acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.° 14).

 Quanto aos autores do ato impugnado

46      Feitas estas precisões, o Tribunal Geral declara que, no caso vertente, o ato impugnado está formalmente descrito na petição como sendo o «acordo celebrado entre o Conselho Europeu e a [República da] Turquia datado de 18 de março de 2016 intitulado ‘Declaração UE‑Turquia, 18 de março de 2016’», isto é, um ato que se enquadra no direito internacional convencional. No entanto, no que diz respeito à fiscalização da legalidade, pelo juiz da União, dos atos de direito internacional convencional, essa fiscalização apenas pode incidir sobre o ato através do qual uma instituição pretendeu celebrar o pretenso acordo internacional em causa, e não sobre este último enquanto tal (v., neste sentido, acórdão de 3 de setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, EU:C:2008:461, n.° 286). Os pedidos do recorrente devem, portanto, ser interpretados no sentido de se destinarem, em substância, a obter a anulação de um ato através do qual o Conselho Europeu quis celebrar, por conta da União, um acordo com a República da Turquia, em 18 de março de 2016 (v., neste sentido, acórdão de 9 de agosto de 1994, França/Comissão, C‑327/91, EU:C:1994:305, n.° 17), e cujo conteúdo se encontra exposto na declaração UE‑Turquia conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16.

47      Consequentemente, cabe ao Tribunal Geral apreciar se a declaração UE‑Turquia, conforme difundida através deste comunicado de imprensa, revela a existência de um ato imputável à instituição que foi posta em causa no caso vertente, isto é, o Conselho Europeu, e se, através deste ato, esta instituição celebrou um acordo internacional, que o recorrente qualifica de «acordo controvertido», adotado em violação do artigo 218.° TFUE e que corresponda ao ato impugnado.

48      Na medida em que, para os efeitos do artigo 21.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, o ato impugnado foi materializado pelo recorrente através da apresentação do comunicado de imprensa n.° 114/16, importa apreciar o contexto em que foi adotada a declaração UE‑Turquia, conforme difundida pelo comunicado de imprensa, bem como o conteúdo desta declaração, para determinar se pode constituir ou revelar a existência de um ato imputável ao Conselho Europeu e, deste modo, estar sujeita à fiscalização da legalidade prevista no artigo 263 TFUE (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.° 14), concretamente um ato que corresponda ao ato impugnado e com o qual foi celebrado o que o recorrente qualifica de «acordo controvertido».

49      Como menciona a declaração UE‑Turquia, a reunião de 18 de março de 2016 era a terceira reunião realizada depois de novembro de 2015. Ora, no que diz respeito às duas anteriores reuniões, que se realizaram, respetivamente, em 29 de novembro de 2015 e 7 de março de 2016, os representantes dos Estados‑Membros participaram nestas reuniões na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União e não enquanto membros do Conselho Europeu.

50      Com efeito, no que diz respeito à primeira reunião dos Chefes de Estado ou de Governo, dela emanou um comunicado de imprensa intitulado «Reunião dos Chefes de Estado ou de Governo da [União] com a [República da] Turquia, 29 [de novembro de] 2015 — Declaração UE‑Turquia», no qual se indicava que eram os «dirigentes da União Europeia» que tinham reunido com o seu «homólogo turco».

51      No que diz respeito à segunda reunião dos Chefes de Estado ou de Governo, dela emanou um comunicado de imprensa, intitulado «Declaração dos Chefes de Estado ou de Governo da [União]», no qual se indicava que eram os «Chefes de Estado ou de Governo da [União]» que se tinham reunido com o Primeiro-Ministro turco e que «[tinham acordado] […] com base nos princípios [que eram] […] enunciados [nas propostas adicionais apresentadas em 7 de março de 2016 pela República da Turquia]: fazer regressar todos os novos migrantes irregulares que chegam às ilhas gregas provenientes da [República da] Turquia ficando todos os custos a cargo da [União]; reinstalar, por cada sírio readmitido pela [República da] Turquia proveniente das ilhas gregas, outro sírio proveniente da Turquia nos Estados‑Membros da [União], no quadro dos compromissos existentes;».

52      Neste contexto, foi emitida a comunicação da Comissão de 16 de março de 2016, a qual não pode ser equiparada a uma proposta na aceção do artigo 294.°, n.° 2, TFUE (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.os 17 e 18). Esta indica que a «nova fase da cooperação UE‑Turquia para fazer face à crise migratória exigirá esforços concertados da República Helénica e da República da Turquia, com o apoio da Comissão, agências da U[nião] e organizações parceiras» e que «[s]erá também necessário o apoio dos Estados‑Membros, tanto em termos de disponibilização de pessoal como da vontade de apresentar compromissos de reinstalação».

53      A declaração UE‑Turquia, conforme difundida no termo da reunião de 18 de março de 2016 através do comunicado de imprensa n.° 144/16, apresenta‑se, porém, diferentemente em relação às anteriores declarações difundidas no termo da primeira e segunda reuniões dos Chefes de Estado ou de Governo.

54      Com efeito, o comunicado de imprensa n.° 144/16 relativo à terceira reunião de 18 de março de 2016 indica, em primeiro lugar, que a declaração UE‑Turquia é o resultado de uma reunião entre os «membros do Conselho Europeu» e «o seu homólogo turco»; em segundo lugar, que são os «membros do Conselho Europeu» que reuniram com o seu homólogo turco; e, em terceiro lugar, que são «a EU e a [República da] Turquia» que acordaram pontos de ação adicionais expostos nessa declaração. Importa, portanto, determinar se o uso destes termos implica, como sustenta o recorrente, que foi na qualidade de membros da instituição «Conselho Europeu» que os representantes des Estados‑Membros participaram na reunião de 18 de março de 2016 ou que foi na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União que participaram nesta reunião.

55      A este propósito, o Tribunal Geral salienta que, embora o comunicado de imprensa n.° 144/16 através do qual foi difundida a declaração UE‑Turquia contenha, na sua versão web fornecida pelo recorrente em anexo à petição, a menção «Negócios estrangeiros e relações internacionais», a qual se refere, em princípio, aos trabalhos do Conselho Europeu, da versão em formato PDF deste comunicado, fornecida pelo Conselho Europeu, constam, por sua vez, os termos «Cimeira internacional», que remetem, em princípio, para as reuniões dos Chefes de Estado ou de Governo des Estados‑Membros da União com representantes de Estados terceiros. Consequentemente, nenhuma conclusão pode ser extraída quanto à presença destas menções.

56      Seguidamente, no que diz respeito ao conteúdo da declaração UE‑Turquia, o uso da expressão «membros do Conselho Europeu» e a indicação segundo a qual a União é que tinha acordado pontos de ação adicionais com a [República da] Turquia poderiam, é certo, dar a entender que os representantes dos Estados‑Membros da União tinham agido, na reunião de 18 de março de 2016, na qualidade de membros da instituição «Conselho Europeu» e tinham, apesar de esta instituição não ter competência legislativa, como referido expressamente no artigo 15.°, n.° 1, UE, decidido celebrar juridicamente um acordo com este Estado terceiro à margem do processo previsto no artigo 218.° TFUE.

57      No entanto, na sua resposta de 18 de novembro de 2016, o Conselho Europeu explica que a expressão «membros do Conselho Europeu» que figura na declaração UE‑Turquia deve ser entendida como uma referência feita aos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União, visto serem estes que compõem o Conselho Europeu. Por outro lado, a referência, na supracitada declaração, ao facto de «a UE e a [República da] Turquia» terem chegado a acordo sobre certos pontos de ação adicionais encontra explicação na necessidade de simplificação dos termos utilizados pelo grande público no quadro de um comunicado de imprensa.

58      Ora, segundo esta instituição, o termo «UE», neste contexto jornalístico, deve ser entendido no sentido de que se refere aos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União. A este propósito, o Conselho Europeu insistiu na forma utilizada para difusão da declaração UE‑Turquia em causa no caso vertente, a saber, a de um comunicado de imprensa que, por sua natureza, persegue um objetivo meramente informativo e não tem nenhum valor jurídico. Com efeito, o recorrido sublinha que este suporte informativo é produzido pelo Secretariado Geral do Conselho e tem como destinatário o público em geral. Isso explicaria, por um lado, a aposição, em certos documentos difundidos na Internet, como a versão web do comunicado de imprensa n.° 144/16 relativo à declaração UE‑Turquia fornecida pelo recorrente, de um cabeçalho duplo «Conselho Europeu/Conselho da União Europeia», e, por outro, o facto de que certos documentos são por vezes descarregados por inadvertência em rubricas inadequadas do site Internet partilhado por estas duas instituições e o presidente do Conselho Europeu.

59      Atendendo ao público‑alvo de tal suporte informativo, o comunicado de imprensa no qual a declaração UE‑Turquia tinha sido difundida utiliza deliberadamente formulações simplificadas, termos da linguagem corrente e abreviaturas. No entanto, esta simplificação dos termos não pode ser utilizada para proceder a apreciações jurídicas e normativas e, em especial, não pode alterar o conteúdo ou a natureza jurídica do processo a que se refere, a saber, uma cimeira internacional como indica a versão PDF do comunicado de imprensa relativo à declaração UE‑Turquia.

60      Deste modo, segundo o Conselho Europeu, a utilização inadequada da expressão «membros do Conselho Europeu» e do termo «UE» num comunicado de imprensa, como o comunicado n.° 144/16 em que está exposta a declaração UE‑Turquia, de maneira nenhuma pode afetar o estatuto jurídico e o papel dos representantes dos Estados‑Membros aquando da reunião com o seu homólogo turco, concretamente na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo, e não pode vincular a União seja de que modo for. A declaração UE‑Turquia, conforme difundida pelo comunicado de imprensa n.° 144/16, na realidade, mais não é do que um compromisso político dos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União para com o seu homólogo turco.

61      Tendo em conta estas explicações do Conselho Europeu e tendo em conta a ambivalência da expressão «membros do Conselho Europeu» e do termo «UE» que figuram na declaração UE‑Turquia, conforme difundida pelo comunicado de imprensa n.° 144/16, importa fazer referência aos documentos relativos à reunião de 18 de março de 2016 para determinar o seu alcance.

62      Ora, a este propósito, o Tribunal Geral constata que os documentos oficiais relativos à reunião de 18 de março de 2016, apresentados pelo Conselho Europeu a pedido do Tribunal Geral, demonstram que dois eventos distintos, a sessão desta instituição e uma cimeira internacional, foram organizados paralelamente segundo vias distintas no plano jurídico, protocolar e organizativo, o que corrobora a natureza jurídica distinta destes dois eventos.

63      Com efeito, por um lado, nas respostas às perguntas do Tribunal Geral, fornecidas em 18 de novembro de 2016, o Conselho Europeu explica, apresentando os diferentes suportes de imprensa por ele difundidos, que a sessão do Conselho Europeu devia inicialmente realizar‑se ao longo de dois dias, mas que, tendo em conta os acontecimentos migratórios que se verificaram, tinha decidido dedicar a esta sessão apenas um dia, ou seja, o dia 17 de março de 2016, e substituir o segundo dia de sessão do Conselho Europeu, inicialmente prevista, isto é, 18 de março de 2016, por uma reunião entre os Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União e o seu homólogo turco, reunião essa que, por razões de custos, de segurança e de eficácia, tinha decorrido no mesmo edifício que o que fora utilizado para as reuniões do Conselho Europeu e as do Conselho.

64      Por outro lado, resulta em especial do convite dirigido em 9 de março de 2016 pelo presidente do Conselho Europeu aos diferentes Estados‑Membros da União que os «membros do Conselho Europeu» estavam convidados para uma sessão do Conselho Europeu em 17 de março de 2016, cujos trabalhos deveriam decorrer entre as 16h45 e as 19h30 e aos quais se seguiria um jantar, ao passo que, para o dia 18 de março de 2016, estava prevista a chegada dos «Chefes de Estado ou de Governo da U[nião] e do Chefe de Governo da [República da] Turquia» das 9h15 às 9h45, seguida de um «pequeno almoço de trabalho para os Chefes de Estado ou de Governo da U[nião] e do Chefe de Governo da Turquia» às 10 horas. Uma nota de 11 de março de 2016, dirigida pelo Secretariado‑Geral do Conselho à missão da República da Turquia junto da União, descreve, nos mesmos termos, o desenrolar da reunião de 18 de março de 2016 e convida o Primeiro‑Ministro turco para uma reunião com os Chefes de Estado ou de Governo da União e não com os membros do Conselho Europeu.

65       Por outro lado, uma nota de 18 de março de 2016 da Direção do Pessoal do Protocolo e das Reuniões da Direção-Geral «Administração» do Conselho, intitulada «Programa de trabalho do Serviço do Protocolo», indica por seu lado, no que respeita à reunião de 18 de março de 2016, que a chegada dos «membros do Conselho Europeu, do Primeiro-Ministro da República da Turquia e do Alto Representante da União para os negócios estrangeiros e a política de segurança» se faria sem ordem protocolar entre as 12h e as 12h45 e que um «almoço de trabalho aos membros do Conselho Europeu e do Alto Representante» seria oferecido a partir das 13 horas sem menção da presença do Primeiro-Ministro turco. Em contrapartida, esta nota apresentada pelo serviço encarregado do protocolo convidava os participantes para uma «sessão de trabalho dos Chefes de Estado ou de Governo e do alto‑representante da U[nião] com o Primeiro-Ministro da Turquia» que teria lugar a partir das 15 horas, corroborando o facto de que era nesta última qualidade, e não na qualidade de membros do Conselho Europeu, que os representantes dos Estados‑Membros da União eram chamados a encontrar‑se com o seu homólogo turco.

66      Estes documentos transmitidos oficialmente aos Estados‑Membros da União e à República da Turquia demonstram, assim, que, não obstante os termos lamentavelmente ambíguos da declaração UE‑Turquia, conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16, foi na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo dos referidos Estados‑Membros que os representantes desses Estados‑Membros encontraram o Primeiro-Ministro turco em 18 de março de 2016 no recinto das instalações partilhadas pelo Conselho Europeu e pelo Conselho, ou seja, no edifício Justus Lipsius.

67      A este propósito, a circunstância de que o presidente do Conselho Europeu e o da Comissão, não convidados formalmente, tenham igualmente estado presentes nesse encontro não pode permitir considerar que, devido à presença de todos estes membros do Conselho Europeu, a reunião de 18 de março de 2016 decorreu entre o Conselho Europeu e o Primeiro-Ministro turco.

68      Com efeito, remetendo para vários documentos apresentados pelo seu presidente, o Conselho Europeu informou que, na prática, os Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União confiavam àquele uma missão de representação e de coordenação das negociações com a República da Turquia, em seu nome, o que explicava a presença deste na reunião de 18 de março de 2016. Do mesmo modo, a presença do presidente da Comissão nessa reunião explica‑se pelo facto de esta reunião se inscrever na continuidade do diálogo político com a República da Turquia iniciado pela Comissão, em outubro de 2015, a convite dos Chefes de Estado ou de Governo da União feito em 23 de setembro de 2015. Ora, como acertadamente o Conselho Europeu sublinha, estes documentos referem‑se, explicitamente e por várias vezes, no que diz respeito aos trabalhos de 18 de março de 2016, a uma reunião dos Chefes de Estado ou de Governo da União com o seu homólogo turco e não a uma sessão do Conselho Europeu. É, designadamente, o caso da declaração n.° 151/16 do presidente do Conselho Europeu, comunicada imediatamente após a reunião de 18 de março de 2016, intitulada «Declarações do presidente Donald Tusk após a reunião dos Chefes de Estado ou de Governo da U[nião] com a Turquia».

69      Nestas condições, o Tribunal Geral considera que a expressão «membros do Conselho Europeu» e o termo «UE», que figuram na declaração UE‑Turquia, conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16, devem ser entendidos como referências aos Chefes de Estado ou de Governo da União que, como nas primeira e segunda reuniões dos Chefes de Estado ou de Governo, de 29 de novembro de 2015 e 7 de março de 2016, se reuniram com o seu homólogo turco e acordaram em tomar medidas operacionais com vista a restabelecer a ordem pública, essencialmente no território grego, e que correspondem às já evocadas ou enunciadas anteriormente nas declarações publicadas sob a forma de comunicados de imprensa na sequência das primeira e segunda reuniões dos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União com o seu homólogo turco. Isso é corroborado pelo facto de a declaração adotada na sequência da segunda reunião dos Chefes de Estado ou de Governo, realizada em 29 de novembro de 2015, utilizar igualmente e invariavelmente o termo «UE» e a expressão «dirigentes Europeus» para designar os representantes dos Estados‑Membros da União, agindo na qualidade de Chefes de Estado ou de Governo dos referidos Estados‑Membros, nessa reunião de 29 de novembro de 2015, análoga à de 18 de março de 2016.

70      Resulta do contexto global que precede a publicação, no sítio Internet do Conselho, do comunicado de imprensa n.° 144/16 que expõe a declaração UE‑Turquia que, no que dizia respeito à gestão da crise migratória, o Conselho Europeu, enquanto instituição, não adotou a decisão de celebrar um acordo com o Governo turco em nome da União e também não assumiu compromissos em nome da União na aceção do artigo 218.° TFUE. Consequentemente, o Conselho Europeu não adotou nenhum ato que corresponda ao ato impugnado, conforme descrito pelo recorrente e cujo conteúdo tivesse sido exposto neste comunicado de imprensa.

71       Resulta das considerações precedentes que, independentemente da questão de saber se constitui, como sustentam o Conselho Europeu, o Conselho e a Comissão, uma declaração de natureza política ou, pelo contrário, como sustenta o recorrente, um ato suscetível de produzir efeitos jurídicos vinculativos, a declaração UE‑Turquia, conforme difundida através do comunicado de imprensa n.° 144/16, não pode ser considerada um ato adotado pelo Conselho Europeu, nem de resto por outra instituição, um órgão ou um organismo da União, ou como revelando a existência desse ato e que corresponda ao ato impugnado.

72      Acresce que, tendo em conta a referência, na declaração UE‑Turquia, ao facto de que a «UE e a [República da] Turquia tinham acordado pontos de ação adicionais», o Tribunal Geral considera que, mesmo admitindo que um acordo internacional possa ter sido informalmente concluído na reunião de 18 de março de 2016, o que, no caso vertente, é desmentido pelo Conselho Europeu, o Conselho e a Comissão, tal acordo teria sido concluído pelos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros da União e pelo Primeiro-Ministro turco.

73      Ora, no âmbito de um recurso interposto ao abrigo do artigo 263.° TFUE, o Tribunal Geral não tem competência para se pronunciar sobre a legalidade de um acordo internacional celebrado pelos Estados‑Membros (acórdão de 5 de maio de 2015, Espanha/Parlamento e Conselho, C‑146/13, EU:C:2015:298, n.° 101).

74      Por conseguinte, deve ser acolhida a exceção de incompetência suscitada pelo Conselho Europeu, recordando‑se que o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia não tem por objetivo modificar o sistema da fiscalização jurisdicional previsto pelos Tratados (acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho, C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.° 97).

75      Tendo a exceção de incompetência sido acolhida e devendo, por conseguinte, o recurso ser rejeitado, não há que conhecer dos pedidos de intervenção apresentados por NQ, NR, NS, NT, NU e NV, bem como pelo Reino da Bélgica, a República Helénica e a Comissão.

 Quanto às despesas

76      Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No entanto, por força do artigo 135.°, n.° 1, do mesmo regulamento, quando a equidade o exigir, o Tribunal Geral pode decidir que uma parte vencida suporte, além das suas próprias despesas, apenas uma fração das despesas da outra parte, ou mesmo que não deva ser condenada a este título.

77      Tendo em conta as circunstâncias do presente processo, designadamente a formulação ambígua do comunicado de imprensa n.° 144/16, o Tribunal Geral considera equitativo decidir que cada parte deve suportar as suas próprias despesas.

78      Em aplicação do artigo 144.°, n.° 10, do Regulamento de Processo, caso seja posto termo à instância no processo principal antes de ser proferida uma decisão sobre o pedido de intervenção, o requerente da intervenção e as partes principais suportam as suas próprias despesas relativas ao pedido de intervenção. Consequentemente, NF, o Conselho Europeu, NQ, NR, NS, NT, NU e NV, bem como o Reino da Bélgica, a República Helénica e a Comissão deverão suportar as suas próprias despesas relativas aos pedidos de intervenção.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção alargada)

decide:

1)      O recurso é rejeitado por falta de competência do Tribunal Geral para dele conhecer.

2)      Não há que conhecer dos pedidos de intervenção apresentados por NQ, NR, NS, NT, NU e NV, bem como pelo Reino da Bélgica, a República Helénica e a Comissão Europeia.

3)      NF e o Conselho Europeu suportarão as suas próprias despesas.

4)      NQ, NR, NS, NT, NU e NV, bem como o Reino da Bélgica, a República Helénica e a Comissão suportarão as suas próprias despesas.

Feito no Luxemburgo, em 28 de fevereiro de 2017.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      I. Pelikánová


*      Língua do processo: inglês.