Language of document : ECLI:EU:C:2013:431

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

27 de junho de 2013 (*)

«Redes e serviços de comunicações eletrónicas ― Diretiva 2002/20/CE ― Artigos 12.° e 13.° ― Encargos administrativos e taxas pelos direitos de utilização ― Taxa aplicável aos operadores de telefonia móvel ― Legislação nacional ― Método de cálculo da taxa ― Percentagem sobre os custos pagos pelos utilizadores»

No processo C‑71/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pela Qorti Kostituzzjonali (Malta), por decisão de 17 de janeiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de fevereiro de 2012, no processo

Vodafone Malta ltd.,

Mobisle Communications ltd.

contra

Avukat Ġenerali,

Kontrollur tad‑Dwana,

Ministru tal‑Finanzi,

Awtorita’ ta’ Malta dwar il‑Komunikazzjoni,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo as funções de juiz da Terceira Secção, E. Jarašiūnas (relator), A. Ó Caoimh e C. G. Fernlund, juízes,

advogado‑geral: N. Jääskinen,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 30 de janeiro de 2013,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação da Vodafone Malta ltd., por I. Refalo, M. Refalo, L. Hurst, J. Pavia, M. Borg, avukati, e M. Hall, QC,

¾        em representação da Mobisle Communications ltd., por F. Galea Salomone, na qualidade de agente, assistido por I. Gauci e R. Tufigno, avukati,

¾        em representação da Awtorita’ ta’ Malta dwar il‑Komunikazzjoni, por L. Cassar Pullicino e P. Micallef, avukati,

¾        em representação do Governo maltês, por P. Grech, D. Mangion e V. Buttigieg, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo espanhol, por N. Díaz Abad, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo francês, por G. de Bergues e J.‑S. Pilczer, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Hungria, por M. Z. Fehér, K. Szíjjártó e Á. Szílágyi, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Comissão Europeia, por G. Braun, K. Mifsud‑Bonnici e L. Nicolae, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 12.° e 13.°, n.° 1, da Diretiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva autorização) (JO L 108, p. 21).

2        Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe a Vodafone Malta ltd. (a seguir «Vodafone Malta») e a Mobisle Communications ltd. (a seguir «Mobisle Communications») ao Avukat Ġenerali (procurador‑geral), ao Kontrollur tad‑Dwana (fiscal aduaneiro), ao Ministru tal‑Finanzi (Ministro das Finanças) e à Awtorita’ ta’ Malta dwar il‑Komunikazzjoni (autoridade maltesa das comunicações) a respeito da cobrança de um imposto especial sobre o consumo.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Os considerandos 30 e 31 da diretiva «autorização» enunciam:

«(30) Podem ser impostos encargos administrativos aos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas, para financiar as atividades da autoridade reguladora nacional respeitantes à gestão do sistema de autorização e à concessão de direitos de utilização. Tais encargos devem limitar‑se a cobrir os custos administrativos reais dessas atividades. Para este efeito e em prol da transparência, as receitas e as despesas das autoridades reguladoras nacionais devem ser publicadas num relatório anual que contenha o montante total dos encargos recebidos e dos custos administrativos suportados Deste modo, as empresas poderão verificar o equilíbrio entre os custos administrativos e os encargos pagos.

(31)      Os regimes aplicáveis em matéria de encargos administrativos não devem dar origem a distorções de concorrência nem criar entraves à entrada no mercado. Com um regime de autorização geral deixará de ser possível atribuir custos administrativos e, por conseguinte, encargos às diferentes empresas, exceto para a concessão de direitos de utilização de números, radiofrequências e direitos de instalar recursos de passagem. Quaisquer encargos administrativos aplicáveis devem estar de acordo com os princípios de um regime de autorização geral. Como exemplo de uma alternativa justa, simples e transparente para os critérios de atribuição de encargos poder‑se‑ia recorrer a uma chave de repartição baseada no volume de negócios. Nos casos em que os encargos administrativos são muito baixos, poderia também ser adequado aplicar uma taxa uniforme ou combinar uma base de taxa uniforme com um elemento relacionado com o volume de negócios.»

4        Nos termos do artigo 1.° da diretiva «autorização», sob a epígrafe «Objetivo e âmbito de aplicação»:

«1.      A presente diretiva destina‑se a instaurar um mercado interno dos serviços e redes de comunicações eletrónicas através da harmonização e simplificação das regras e condições de autorização, a fim de facilitar a sua oferta em toda a Comunidade.  

2.      A presente diretiva aplica‑se às autorizações de oferta de serviços e redes de comunicações eletrónicas.»

5        O artigo 2.°, n.° 2, alínea a), desta diretiva contém a seguinte definição:

«‘autorização geral’: significa o quadro regulamentar estabelecido pelos Estados‑Membros que garante os direitos relacionados com a oferta de serviços ou redes de comunicações eletrónicas, e que fixa obrigações sectoriais específicas que podem ser aplicadas a todos os géneros ou a géneros específicos de serviços e redes de comunicações eletrónicas, em conformidade com a presente diretiva.»

6        O artigo 12.° da referida diretiva, sob a epígrafe «Encargos administrativos», tem a seguinte redação:

«1.      Todos os encargos administrativos impostos às empresas que ofereçam serviços ou redes ao abrigo da autorização geral ou às quais foi concedido um direito de utilização:

a)      Cobrirão, no total, apenas os custos administrativos decorrentes da gestão, controlo e aplicação do regime de autorização geral, bem como dos direitos de utilização e das obrigações específicas referidas no n.° 2 do artigo 6.°, os quais poderão incluir custos de cooperação internacional, harmonização e normalização, análise de mercados, vigilância do cumprimento e outros tipos de controlo do mercado, bem como trabalho de regulação que envolva a preparação e execução de legislação derivada e decisões administrativas, como decisões em matéria de acesso e de interligação; e

b)      Serão impostos às empresas de forma objetiva, transparente e proporcional, que minimize os custos administrativos adicionais e os encargos conexos.

2.      Caso imponham encargos administrativos, as autoridades reguladoras nacionais publicarão uma súmula anual dos seus custos administrativos e do montante total resultante da cobrança dos encargos. Em função da diferença entre o montante total dos encargos e os custos administrativos, serão feitos os devidos ajustamentos.»

7        O artigo 13.° da diretiva «autorização», sob a epígrafe «Taxas aplicáveis aos direitos de utilização e direitos de instalação de recursos», dispõe:

«Os Estados‑Membros podem autorizar a autoridade competente a impor taxas sobre os direitos de utilização das radiofrequências, ou números ou direitos de instalação de recursos em propriedade pública ou privada que reflitam a necessidade de garantir a utilização ótima desses recursos. Os Estados‑Membros garantirão que tais taxas sejam objetivamente justificadas, transparentes, não discriminatórias e proporcionais relativamente ao fim a que se destinam e terão em conta os objetivos do artigo 8.° da Diretiva 2002/21/CE (diretiva‑quadro) [JO L 108, p. 33].»

 Direito maltês

8        A Lei n.° II de 2005 ― Lei de execução das medidas orçamentais e que prevê outras medidas administrativas (Att Numeru II ta’l‑2005 ― Att biex jimplimenta diversi miżuri ta’ l‑Estmi u biex jipprovidi għal miżuri amministrativi oħra) (Gazzetta tal‑Gvern ta’ Malta n.° 17,734, de 1 de março de 2005, a seguir «Lei n.° II de 2005»), institui, no seu artigo 40.°, um imposto especial sobre o consumo de 3% sobre os serviços de telefonia móvel (assinaturas e cartões pré‑pagos) e estabelece, no seu artigo 41.°, o regulamento relativo a esses serviços.

9        O artigo 41.° da Lei n.° II de 2005, relativa a esse regulamento, tem a seguinte redação:

«Secção G

Regulamento dos serviços de telefonia móvel

1.      O presente regulamento intitula‑se ‘Regulamento dos serviços de telefonia móvel’.

2. O presente regulamento é aplicável a todas as receitas geradas pelos serviços de telefonia móvel, nos termos do Regulamento n.° 4.

3.      Os operadores de telefonia móvel devem registar‑se junto do fiscal [aduaneiro] em conformidade com a lei relativa aos impostos especiais sobre o consumo, a seguir designada ‘lei’.

4.      O imposto especial deve ser calculado com base em todos os montantes cobrados pelos operadores de telefonia móvel em contrapartida dos seus serviços, incluindo as assinaturas e os cartões pré‑pagos;  

Considerando que o termo ‘operador’ tem o mesmo significado que o mencionado no artigo 2.° da Lei (Regulamento) das comunicações eletrónicas;

Considerando também que não é devido qualquer imposto especial sobre os seguintes serviços:

a)      itinerância de entrada (‘roaming’);

b)      receitas de interconexão;

c)      donativos de natureza pecuniária transferidos do doador para o beneficiário sob a forma de serviços oferecidos pelo operador de telefonia móvel;

d)      tempo de comunicação gratuito.

5.      A pessoa, empresa, parceria ou sociedade devidamente registada junto do fiscal [aduaneiro] é responsável pelo pagamento do imposto especial, tal como definido no artigo 3.° da lei, na data de vencimento do mesmo.  

6. (1) Os registos das receitas geradas pelos serviços sujeitos ao imposto especial sobre o consumo em aplicação do presente regulamento devem ficar ao dispor do fiscal [aduaneiro] para qualquer verificação necessária.

(2)      Deve ser disponibilizada ao fiscal [aduaneiro] uma declaração periódica com a indicação pormenorizada das receitas provenientes dos serviços abrangidos pelo imposto especial por força do presente regulamento, relativamente a qualquer período definido pelo fiscal [aduaneiro].

(3)      Cada período contabilístico tem a duração de três meses, podendo uma duração superior ser prevista pelo fiscal [aduaneiro], ou ser autorizada ou imposta por qualquer outra forma, devendo ser entregue ao fiscal [aduaneiro] uma nota informativa no prazo de trinta dias após o final do período contabilístico objeto do relatório.

(4)      Quem não cumprir as disposições do presente regulamento incorre numa infração e poderá ser punido, se declarado culpado, com uma pena de multa até quinhentas liras [maltesas].»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

10      A Vodafone Malta e a Mobisle Communications são operadores no setor das telecomunicações em Malta, onde dispõem de uma autorização geral para fornecer serviços de telefonia móvel.

11      Resulta da decisão de reenvio que, em 19 de abril de 2005, a Vodafone Malta e a Mobisle Communications intentaram, na Prim’Awla tal‑Qorti Ċivili (primeira secção do tribunal cível), um processo tendo em vista a anulação dos artigos 40.° e 41.° da Lei n.° II de 2005, alegando que esses artigos, na medida em que estabelecem a cobrança de um imposto especial sobre o consumo sobre determinados serviços de telefonia móvel, são contrários aos artigos 12.° e 13.° da diretiva «autorização».

12      O tribunal de primeira instância negou provimento aos recursos da Vodafone Malta e da Mobisle Communications. Considerou, por um lado, que a cobrança do imposto especial sobre o consumo controvertido não era contrária à diretiva «autorização», pois esta só priva os Estados‑Membros da possibilidade de cobrarem outros encargos sobre os serviços fornecidos pelos operadores de telecomunicações diferentes daqueles que prevê. O tribunal da primeira instância considerou, por outro lado, que, visto o referido direito não ser calculado sobre o volume de negócios do operador, mas simplesmente sobre o preço de certos serviços de consumo fornecidos pelo operador aos utilizadores, o facto gerador do imposto especial sobre o consumo não era a autorização dada ao operador para fornecer o serviço, mas o consumo desse serviço.

13      Em 10 de dezembro de 2008, a Vodafone Malta e a Mobisle Communications recorreram dessa decisão para a Qorti Kostituzzjonali. Sustentam novamente, perante o órgão jurisdicional de reenvio, que o imposto especial sobre o consumo em causa deve ser anulado na medida em que é contrário à diretiva «autorização», não podendo os Estados‑Membros impor taxas ou encargos que não os previstos por essa diretiva e os encargos de aplicação geral.

14      Ora, segundo elas, o imposto especial sobre o consumo sobre os serviços de telefonia móvel em causa não corresponde a um encargo de aplicação geral, mas sim a um encargo de natureza específica que apenas visa os operadores de telefonia móvel.

15      As recorridas no processo principal alegam que o imposto especial sobre o consumo previsto pela Lei n.° II de 2005 é diferente e distinto dos encargos administrativos descritos nos artigos 12.° e 13.° da diretiva «autorização». Consideram tratar‑se de um encargo baseado no consumo de serviços pelo utilizador cobrado pela empresa em causa e que esse imposto especial se distingue dos encargos examinados no acórdão de 18 de setembro de 2003, Albacom e Infostrada (C‑292/01 e C‑293/01, Colet., p. I‑9449).

16      À luz do acórdão de 8 de setembro de 2005, Mobistar e Belgacom Mobile (C‑544/03 e C‑545/03, Colet., p. I‑7723), a Qorti Kostituzzjonali exprimiu dúvidas sobre o alcance da diretiva «autorização» e interroga‑se quanto à questão de saber se esta exclui ou não a imposição de um encargo diretamente sobre determinados serviços fornecidos pelos operadores de telecomunicações móveis.

17      Nestas condições, a Qorti Kostituzzjonali decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«As disposições da [d]iretiva [autorização], em especial os seus artigos 12.° e/ou 13.°, proíbem os Estados‑Membros de [impor] aos operadores de telecomunicações móveis [um encargo fiscal] que:

a)      constitui um imposto dito ‘especial sobre o consumo’, introduzido por [uma] lei nacional;

b)      é calculado [sob a forma de uma] percentagem dos pagamentos recebidos pelos operadores de telefonia móvel dos seus clientes pelos serviços prestados, com exceção dos serviços isentos por lei;

c)      é pago individualmente aos operadores de telefonia móvel pelos seus clientes e subsequentemente entregue ao fiscal aduaneiro por todos os operadores que prestam serviços de telefonia móvel, obrigação esta que impende apenas sobre estes operadores e não sobre outras empresas, incluindo as que fornecem redes de comunicações eletrónicas e outros serviços?»

 Quanto à questão prejudicial

18      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 12.° e 13.° da diretiva «autorização» devem ser interpretados no sentido de que se opõem à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, por força da qual os operadores que fornecem serviços de telefonia móvel são devedores de um imposto dito «especial sobre o consumo» correspondente a uma percentagem dos pagamentos que recebem dos utilizadores desses serviços.

19      A título preliminar, importa observar que o artigo 13.° da diretiva «autorização» tem por objeto as modalidades de aplicação de taxas aos direitos de utilização das radiofrequências, ou números ou direitos de instalação de recursos em propriedade pública ou privada. Em contrapartida, como decorre da decisão de reenvio, a cobrança de um encargo fiscal intitulado «imposto especial sobre o consumo», cuja base tributável é constituída por todos os pagamentos recebidos pelos operadores de telefonia móvel em contrapartida dos seus serviços, como o que é objeto do processo principal, está ligado ao «fornecimento de serviços de telefonia móvel». Por conseguinte, o artigo 13.° da diretiva «autorização» não é pertinente no processo principal.

20      Quanto ao artigo 12.° da diretiva «autorização», cumpre recordar que esta diretiva prevê não apenas regras relativas ao procedimento de concessão de autorizações gerais ou de direitos de utilização de radiofrequências ou de números e ao conteúdo das referidas autorizações mas também regras relativas à natureza, inclusive à grandeza, dos encargos pecuniários, ligadas aos referidos procedimentos, que os Estados‑Membros podem impor às empresas no setor dos serviços de comunicações eletrónicas (v., por analogia, acórdãos Albacom e Infostrada, já referido, n.os 35 e 36, e de 21 de julho de 2011, Telefónica de España, C‑284/10, Colet., p. I‑6991, n.° 18).

21      A este respeito, resulta da letra do artigo 12.° da diretiva «autorização» que os Estados‑Membros só podem impor às empresas que oferecem um serviço ou uma rede ao abrigo da autorização geral ou às quais tenha sido concedido um direito de utilização de radiofrequências ou dos números encargos administrativos que cubram os custos administrativos globais decorrentes da gestão, do controlo e da aplicação do regime de autorização geral, dos direitos de utilização e das obrigações específicas referidas no artigo 6.°, n.° 2, dessa diretiva.

22      Os encargos administrativos referidos no artigo 12.° da diretiva «autorização» têm, portanto, caráter remuneratório, uma vez que, por um lado, só podem ser impostos em contrapartida dos serviços administrativos prestados pelas autoridades regulamentares nacionais a favor dos operadores de comunicações eletrónicas a título, designadamente, da autorização geral ou da concessão de um direito de utilização de radiofrequências ou de números e, por outro, devem cobrir os custos administrativos gerados pelos referidos serviços.

23      Assim, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, tratando‑se mais especificamente dos encargos administrativos impostos pelos Estados‑Membros aos operadores titulares da autorização geral nos termos do artigo 12.° da diretiva «autorização», os mesmos só podem ter por objeto cobrir os custos administrativos relativos a quatro atividades administrativas, a saber, a entrega, a gestão, a fiscalização e a execução do regime de autorização geral aplicável (v., por analogia, acórdão Telefónica de España, já referido, n.° 22).

24      Resulta dos elementos anteriores que um encargo cujo facto gerador está ligado ao procedimento de autorização geral que permite aceder ao mercado dos serviços de comunicações eletrónicas faz parte do âmbito de aplicação do artigo 12.° da diretiva «autorização». Os Estados‑Membros devem assegurar que esse encargo administrativo só seja imposto para os fins descritos no artigo 12.° da diretiva «autorização» e respeite as condições aí enunciadas.

25      Em contrapartida, um encargo cujo facto gerador não está ligado ao procedimento de autorização geral que permite aceder ao mercado dos serviços de comunicações eletrónicas, mas sim à utilização dos serviços de telefonia móvel fornecidos pelos operadores, e que é suportado em definitivo pelo utilizador desses serviços não está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 12.° da diretiva «autorização».

26      Com efeito, importa observar que, nos n.os 35 e 36 do despacho de 15 de dezembro de 2010, Agricola Esposito (C‑492/09), o Tribunal de Justiça considerou que a diretiva «autorização» não se aplica a um encargo sobre a utilização de equipamentos terminais de radiocomunicação móvel terrestre pública, uma vez que o mesmo não tinha como base tributável o fornecimento de redes e de serviços de comunicações eletrónicas e que a utilização privada de um serviço de telefonia móvel por um assinante não pressupõe o fornecimento de uma rede ou de um serviço de comunicações eletrónicas na aceção desta diretiva.

27      No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que o encargo fiscal em causa no processo principal se denomina «imposto especial sobre o consumo», é aplicado não a todos os operadores de comunicações eletrónicas titulares de uma autorização geral mas apenas aos operadores que fornecem serviços de telefonia móvel e corresponde a uma percentagem dos pagamentos que esses operadores recebem dos utilizadores desses serviços. O órgão jurisdicional de reenvio indica, além disso, que «esse encargo é pago individualmente aos operadores de telefonia móvel pelos seus clientes e subsequentemente entregue ao fiscal aduaneiro por todos os operadores que prestam serviços de telefonia móvel, obrigação esta que impende apenas sobre estes operadores e não sobre outras empresas, incluindo as que fornecem redes de comunicações eletrónicas e outros».

28      Perante estes elementos, afigura‑se que o encargo fiscal em causa no processo principal se assemelha a um imposto sobre o consumo, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar. Se tal for efetivamente o caso, o referido encargo não está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 12.° da diretiva «autorização».

29      Face a todas estas considerações, há que responder à questão submetida que o artigo 12.° da diretiva «autorização» deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os operadores que oferecem serviços de telefonia móvel são devedores de um imposto dito «especial sobre o consumo» correspondente a uma percentagem dos pagamentos que recebem dos utilizadores desses serviços, desde que o facto gerador deste imposto não esteja ligado ao procedimento de autorização geral que permite aceder ao mercado dos serviços de comunicações eletrónicas, mas sim à utilização dos serviços de telefonia móvel fornecidos pelos operadores, e seja suportado em definitivo pelo utilizador desses serviços, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 Quanto às despesas

30      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

O artigo 12.° da Diretiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva autorização), deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual os operadores que oferecem serviços de telefonia móvel são devedores de um imposto dito «especial sobre o consumo» correspondente a uma percentagem dos pagamentos que recebem dos utilizadores desses serviços, desde que o facto gerador deste imposto não esteja ligado ao procedimento de autorização geral que permite aceder ao mercado dos serviços de comunicações eletrónicas, mas sim à utilização dos serviços de telefonia móvel fornecidos pelos operadores, e seja suportado em definitivo pelo utilizador desses serviços, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Assinaturas


** Língua do processo: maltês.