Language of document : ECLI:EU:T:2012:90

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

28 de fevereiro de 2012 (*)

«Auxílios de Estado — Auxílio concedido pelas autoridades austríacas ao grupo Grazer Wechselseitige (GRAWE) no âmbito da privatização do Bank Burgenland — Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado comum e ordena a sua recuperação — Critério do investidor privado em economia de mercado — Aplicação no caso de o Estado agir como vendedor — Determinação do preço de mercado»

Nos processos apensos T‑268/08 e T‑281/08,

Land Burgenland (Áustria), representado por U. Soltész e C. Herbst, advogados,

recorrente no processo T‑268/08,

República da Áustria, representada por G. Hesse, C. Pesendorfer, E. Riedl, M. Fruhmann e J. Bauer, na qualidade de agentes,

recorrente no processo,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por V. Kreuschitz, N. Khan e K. Gross, e em seguida por Kreuschitz, Khan e T. Maxian Rusche, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão 2008/719/CE da Comissão, de 30 de abril de 2008, relativa ao auxílio estatal C 36/06 (ex NN 77/06) concedido pela Áustria em proveito da privatização do Bank Burgenland (JO L 239, p. 32),

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, N. Wahl (relator) e S. Soldevila Fragoso, juízes,

secretário: T. Weiler, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 18 de maio de 2011,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

 Hypo Bank Burgenland AG e Ausfallhaftung

1        Até à sua privatização, a Hypo Bank Burgenland AG (a seguir «BB)» era um banco regional sob a forma de uma sociedade por ações de direito austríaco com sede em Eisenstadt (Áustria). As suas atividades, que inicialmente consistiam, a título principal, em conceder empréstimos hipotecários e em emitir obrigações fundiárias e municipais, pouco a pouco alargaram‑se a todos os tipos de serviços bancários e financeiros. Em 2005, o BB tinha um balanço total de 3,3 mil milhões de euros e era detida a 100% pelo Land Burgenland.

2        Em conformidade com o § 4 da Landes‑Hypothekenbank Burgenland‑Gesetz (lei austríaca relativa aos bancos de créditos hipotecários do Land Burgenland, LGBl n.° 58/1991), na versão resultante da Lei LGBl n.° 63/1998, o Land Burgenland era garante, na aceção do § 1356 da Allgemeines Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil austríaco), em caso de cessação de pagamentos de BB, da totalidade dos seus compromissos. Em aplicação destas disposições, os credores do Banco beneficiam de direitos em relação ao garante, que não está, todavia, obrigado a agir quando os ativos do banco não são suficientes para cobrir os créditos.

3        Este regime de garantia de responsabilidade subsidiária destinada às instituições públicas de crédito (denominada «Ausfallhaftung»), em particular a do Land em favor do BB e das suas antecessoras, existe de modo praticamente inalterado desde 1928. Não cobria um período nem um montante específicos. Em conformidade com o regime legal da garantia (Gewährträgerhaftung), que entrou em vigor em 29 de junho de 1991, o Land Burgenland obtinha uma provisão para oferecer essa garantia legal. Por força de um acordo celebrado entre a Comissão das Comunidades Europeias e a República da Áustria, com base no qual a Decisão C (2003) 1329 final da Comissão, de 30 de abril de 2003, relativa ao auxílio E 8/02, foi adotada (JO C 175, p. 8), a Ausfallhaftung devia ser revogada até 1 de abril de 2007. Para todas as obrigações existentes em 2 de abril de 2003, a Ausfallhaftung continuava em princípio, válida até ao seu termo. Durante o período compreendido entre 2 de abril de 2003 e 1 de abril de 2007, a Ausfallhaftung podia, no que respeita às novas obrigações, ser mantida, desde que estas se vencessem até 30 de setembro de 2017.

 Auxílios à restruturação do BB autorizados pela Comissão em 2004

4        Na sequência de uma fraude ligada aos créditos concedidos à Howe Bau AG e detetada por ocasião da verificação das contas anuais para o exercício de 1999, defrontou‑se com graves dificuldades financeiras. O Land Burgenland concluiu, assim, em 20 de junho de 2000, um acordo de garantia no montante de 171 milhões de euros, acrescidos de juros de 5%, a fim de cobrir os créditos irrecuperáveis ao BB que provocaram um sobre‑endividamento desta sociedade. Por outro lado, a fim de cobrir os créditos duvidosos suplementares detetados por ocasião de um controlo aprofundado, foi celebrado um acordo‑quadro, em 23 de outubro de 2000, com o credor principal do BB, a saber, o Bank Austria Creditanstalt AG. Este acordo previa a renúncia, por parte do Bank Austria Creditanstalt, ao reembolso dos empréstimos em favor do BB, a celebração de um acordo sobre os lucros futuros entre estas duas partes e uma garantia do Land Burgenland no montante de 189 milhões de euros.

5        Por carta de 18 de junho de 2002, seguida de informações complementares em 3 de julho e 9 de setembro de 2002, a República da Áustria notificou à Comissão as garantias concedidas pelo Land Burgenland e apresentou‑lhe um plano de restruturação do BB.

6        Por carta de 26 de junho de 2003, a Comissão comunicou às autoridades austríacas a sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE a respeito dos auxílios descritos.

7        Por carta de 19 de dezembro de 2003, as autoridades austríacas informaram que tinham intenção, no âmbito da privatização do BB, alterar os auxílios em causa.

8        Por carta de 21 de janeiro de 2003, a Comissão comunicou à República da Áustria a sua decisão de alargar o procedimento formal iniciado ao abrigo do artigo 88.°, n.° 2, CE as alterações previstas dos auxílios à restruturação do BB.

9        Em 7 de maio de 2004, a Comissão adotou a Decisão 2005/691/CE Decisão da Comissão, de 7 de maio de 2004, relativa ao auxílio estatal n.° C 44/2003 (ex NN 158/2001) que a Áustria tenciona conceder a favor do BB) (JO 2005, L 263, p. 8) (a seguir «decisão de 2004»). No essencial, a Comissão considerou que os dois acordos de garantia do Land Burgenland em favor do BB constituíam auxílios de Estado, em especial porque estas medidas foram tomadas em condições que não eram aceitáveis para um investidor privado e, deste modo, conferiram ao BB uma vantagem artificial relativamente aos seus concorrentes. Além disso, as referidas medidas e os seus efeitos nos concorrentes atuais e potenciais de outros Estados‑Membros falseiam ou ameaçam falsear a concorrência e afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. No entanto, a Comissão concluiu que as medidas de restruturação controvertidas eram compatíveis com o mercado comum, em conformidade com o artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE, em conjugação com as orientações comunitárias dos auxílios estatais de emergência e à restruturação concedidos a empresas em dificuldade (JO 1999, C 288, p. 2). No âmbito do seu exame da viabilidade a longo prazo da empresa beneficiária do auxílio, a Comissão sublinhou que tinha baseado a sua apreciação nas informações fornecidas pelas autoridades austríacas, nomeadamente sobre o calendário de conclusão da privatização prevista do BB.

 Medida controvertida, tomada no âmbito da privatização do BB

10      Após duas tentativas infrutíferas, em 2003 e em 2005, o Land Burgenland lançou um terceiro processo de privatização do BB, cuja execução tenha sido confiada ao banco de investimento HSBC Trinkaus & Burkhardt KGaA de Düsseldorf (Alemanha), em colaboração com o HSBC Plc de Londres (Reino Unido) (a seguir, conjuntamente, «HSBC»). Este procedimento começou em outubro de 2005, através da publicação de um concurso na imprensa.

11      Entre os 14 proponentes que manifestaram formalmente o seu interesse em apresentar uma proposta, apenas três de entre eles apresentaram no prazo exigido propostas indicativas completas, que ascendiam respetivamente a 65, 100 e 140 milhões de euros, e participaram na segunda fase do concurso, no termo da qual uma proposta vinculativa, devia ser apresentada, o mais tardar, até 6 de fevereiro de 2006. Dois proponentes, a saber, a sociedade de seguros austríaca Grazer Wechselseitige Versicherung AG juntamente com a GW Beteiligungserwerbs‑ und ‑Verwaltungs‑GmbH (a seguir «GRAWE») e um consórcio austro‑ucraniano que associava as empresas austríacas Slav AG e Slav Finanzbeteiligung GmbH e as sociedades por ações ucranianas Ukrpodshipnik e Ilyich (a seguir «consórcio»), apresentaram propostas vinculativas. Estas propostas foram posteriormente objeto de exame individual e de negociações contratuais que foram concluídas em 4 de março de 2006.

12      Em 5 de março de 2006, o Land Burgenland procedeu à atribuição do BB à GRAWE, embora o preço de compra que tinha proposto (100,3 milhões de euros) tenha sido nitidamente inferior ao proposto pelo consórcio (155 milhões de euros). Esta decisão baseava‑se nomeadamente numa recomendação por escrito da HSBC de 4 de março de 2006, que foi completada por esclarecimentos verbais destinados aos membros do Governo do Land Burgenland no próprio dia da decisão. A recomendação da HSBC enunciava que, em substância, se, atendendo ao preço de compra proposto, a decisão devia favorecer o consórcio, foi recomendado que o BB fosse cedida à GRAWE tendo em conta os outros critérios de seleção, a saber, a garantia do pagamento do preço, o prosseguimento da gestão do BB evitando o recurso à Ausfallhaftung, os aumentos de capital e a segurança das transações.

13      A venda do BB, que foi formalmente aprovada pelas autoridades do Burgenland em 7 de março de 2006, foi concluída em 12 de maio de 2006. Antes de ter sido concluída essa venda, o BB emitiu, no âmbito da Ausfallhaftung, dois títulos num montante de 700 milhões de euros, dos quais 350 milhões foram subscritos por uma filial da GRAWE. Por último, devido à privatização, o período transitório de aplicação da Ausfallhaftung referido no n.° 3, supra, terminou prematuramente no dia da conclusão dessa venda.

 Procedimento administrativo

14      Em 4 de abril de 2006, o consórcio apresentou à Comissão uma denúncia segundo a qual a República da Áustria violou as regras relativas aos auxílios de Estado quando da privatização do BB. O denunciante alegava, nomeadamente, que o processo de concurso, que não tinha sido equitativo, transparente e não discriminatório a seu respeito, não se saldou pela cessão do BB ao que mais ofereceu (a saber, o consórcio), mas à GRAWE.

15      Por cartas de 15 de maio e 1 de junho de 2006, as autoridades austríacas responderam a um pedido de informações da Comissão de 12 de abril de 2006. Seguidamente, em 27 de junho de 2006, foi organizado um encontro entre representantes da República da Áustria e da Comissão, e, em 17 de julho de 2006, a Comissão enviou um segundo pedido de informações, ao qual as autoridades austríacas responderam em 18 de setembro de 2006. O consórcio, por sua vez, comunicou informações suplementares à Comissão em 21 de abril e 2 de junho de 2006.

16      Por carta de 21 de dezembro de 2006, a Comissão informou as autoridades austríacas da sua decisão, no que se refere à cessão do BB à GRAWE, de dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. Esta decisão foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 8 de fevereiro de 2007 (JO C 28, p. 8).

17      Em 1 de março de 2007, a República da Áustria transmitiu à Comissão as suas observações sobre a decisão de dar início ao procedimento. Por outro lado, a Comissão recebeu um certo número de observações e de informações de terceiros interessados, entre os quais figuravam GRAWE e o consórcio, nas quais as autoridades austríacas se manifestaram. Além disso, várias reuniões tiveram lugar entre os representantes da República da Áustria e a Comissão. Por último, por várias vezes as autoridades austríacas enviaram à Comissão observações e documentos suplementares.

18      Em 30 de abril de 2008, a Comissão aprovou a Decisão 2008/719/CE Decisão da Comissão, de 30 de abril de 2008, relativa ao auxílio estatal C 56/06 (ex NN 77/06) concedido pela Áustria a favor da privatização do BB (JO L 239, p. 32) (a seguir «decisão impugnada»).

 Decisão impugnada

19      Na decisão impugnada, a Comissão recorda, nomeadamente, que, para apreciar se uma medida tomada no âmbito de uma tendo em conta as regras relativas aos auxílios de Estado, se baseia em vários princípios por ela fixados no XXIII relatório sobre a política de concorrência, de 1993 (n.os 402 e segs.), bem como na sua prática anterior. Ora, as condições recordadas nesse relatório para poder considerar que não há auxílio de Estado na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE não foram respeitadas no caso vertente.

20      Pronunciando‑se sobre a questão de saber se a cessão do BB à GRAWE constitui um auxílio de Estado, a Comissão salienta, antes de mais, que os recursos do Land Burgenland (que é um dos nove Bundesländer da Áustria) devem ser considerados meios «concedidos pelos Estados ou através de recursos estatais». Além disso, a Comissão declara que a GRAWE opera a nível internacional, pelo que uma eventual vantagem concedida através de recursos públicos criaria entraves à concorrência no setor bancário e teria efeitos no comércio intracomunitário. Quanto à questão de saber se a GRAWE beneficiou de uma vantagem seletiva, a Comissão sublinha que se deve determinar se o Land Burgenland se comportou como qualquer vendedor que opera numa economia de mercado (private vendor test).

21      Quanto a este último aspeto, recordando que o Land Burgenland tinha recebido uma proposta do consórcio cujo valor nominal ultrapassava em 54,7 milhões de euros a proposta da GRAWE, a Comissão refere que um operador económico que opera em economia de mercado pode, todavia, escolher a proposta mais baixa, em duas hipóteses.

22      A primeira refere‑se à situação em que é claro que a cessão ao mais que oferece não é realizável, o que implica, no presente caso, examinar, em primeiro lugar, a segurança da transação através da solidez económica do consórcio e, em segundo lugar, a probabilidade que o referido consórcio não obtenha, afinal, a autorização exigida pela Finanzmarktaufsicht (autoridade austríaca de vigilância dos mercados financeiros, a seguir «FMA»). Ora, na opinião da Comissão, não só não havia nenhuma razão para duvidar do facto de o preço de compra de 155 milhões de euros proposto pelo consórcio podia ser financiada, mas nada indica nem prova que a FMA proibiu a cessão do BB ao consórcio.

23      A segunda hipótese abrange o caso em que se justifica a tomada em consideração de outros fatores que não sejam o preço, dado que os únicos fatores a tomar em consideração são os que um investidor que opera numa economia de mercado teria tido em conta, o que, segundo a Comissão, exclui os riscos que resultam de uma obrigação de pagamento de uma garantia, que deve ser qualificada de auxílio de Estado eventualmente em vigor, como a Ausfallhaftung, único fator que as autoridades austríacas invocaram. A Comissão precisa a este respeito que resulta designadamente da jurisprudência que, quando é avaliada a forma como um investidor que opera numa economia de mercado tivesse atuado, o papel do Estado enquanto vendedor de uma empresa, por um lado, e as obrigações que lhe incumbem como poder público, por outro, não devem ser confundidos. Ora, nenhum investidor que opera numa economia de mercado teria aceite uma garantia que não respeitou o princípio do investidor que opera numa economia de mercado e a decisão sobre a supressão da Ausfallhaftung confirma que esta última não faz parte das condições do mercado.

24      Atendendo a todas estas considerações, a Comissão considerou que a autoridade austríaca competente não se comportou como um vendedor que opera numa economia de mercado. A vantagem económica concedida à GRAWE corresponde pelo menos à diferença entre a proposta do consórcio e o preço de aquisição real.

25      A Comissão acrescenta, para examinar os argumentos apresentados pela República da Áustria quanto à importância da Ausfallhaftung, que, mesmo que o Land Burgenland pudesse ter tomado em consideração esta garantia como critério de avaliação das propostas, a proposta da GRAWE não era a melhor.

26      Por último, a Comissão considerou que o auxílio de Estado que consiste na cessão do BB à GRAWE não podia ser declarado compatível com o mercado comum.

27      O dispositivo da decisão impugnada tem a seguinte redação:

«Artigo 1.°

O auxílio estatal a favor da GRAWE, concedido ilegalmente pela Áustria em violação do disposto no n.° 3 do artigo 88.° [CE], é incompatível com o mercado comum. O auxílio corresponde à diferença entre as duas propostas finais apresentadas no âmbito do concurso público após os ajustamentos necessários, em conformidade com os parâmetros estabelecidos nos [considerandos] 167 a 174 da presente decisão.

Artigo 2.°

1.      Áustria recuperará o auxílio referido no artigo 1.° junto do beneficiário.

2.      Os montantes a recuperar vencerão juros a partir da data em que o auxílio foi colocado à disposição do beneficiário até à data da sua recuperação efetiva.

3.      Os juros serão calculados numa base composta, em conformidade com o disposto no Regulamento (CE) n.° 794/2004.

Artigo 3.°

1.      A recuperação do auxílio referido no artigo 1.° será imediata e efetiva.

A Áustria assegurará a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da sua notificação.

Artigo 4.°

No prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, a Áustria fornecerá as seguintes informações à Comissão:

a)      O montante total (capital e juros a título da recuperação) a recuperar junto do beneficiário, estabelecido de acordo com os parâmetros definidos na presente decisão, juntamente com uma explicação pormenorizada do método utilizado para calcular este montante e a avaliação do património por um perito independente;

b)      Uma descrição pormenorizada das medidas já adotadas e previstas para dar cumprimento à presente decisão;

c)      Documentos que demonstrem que o beneficiário foi intimado a reembolsar o auxílio.

2.      A Áustria notificará à Comissão a evolução das medidas nacionais adotadas para aplicar a presente decisão até este ao reembolso do auxílio referido no artigo 1.° A pedido da Comissão, a Áustria transmitir‑lhe‑á de imediato informações sobre as medidas tomadas ou previstas para dar cumprimento à presente decisão. A Áustria fornecerá igualmente informações pormenorizadas sobre os montantes dos auxílios e dos juros já reembolsados pelo beneficiário.

Artigo 5.°

A República da Áustria é a destinatária da presente decisão.»

 Tramitação processual e pedidos das partes

28      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral, em 11 e 15 de julho de 2008, registadas respetivamente sob as referências T‑268/08 e T‑281/08, o Land Burgenland, por um lado, e a República da Áustria, por outro, interpuseram os presentes recursos.

29      Por despacho do presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral de 20 de abril de 2009, ouvidas as partes, os processos T‑268/08 e T‑281/08 foram apensos para efeitos da fase escrita, da fase oral e do acórdão, em conformidade com o artigo 50.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

30      Tendo a composição das Secções do Tribunal sido alterada, o juiz‑relator foi afetado à Sexta Secção, à qual o presente processo foi, consequentemente, atribuído.

31      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral.

32      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas feitas pelo Tribunal na audiência de 18 de maio de 2011.

33      Uma vez que um dos membros da Secção se encontrava impedido, o presidente do Tribunal Geral designou‑se, em aplicação do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, para completar a Secção.

34      Por despacho de 18 de novembro de 2011, o Tribunal Geral (Sexta Secção), na sua nova composição, reabriu a fase oral do processo e as partes foram informadas de que seriam ouvidas por ocasião de nova audiência.

35      Por cartas, respetivamente, de 9 e 15 de novembro de 2011, a Comissão e os recorrentes informaram o Tribunal Geral de que renunciavam a ser novamente ouvidos.

36      Por conseguinte, o presidente o presidente do Tribunal decidiu encerrar a fase oral.

37      No processo T‑268/08, o Land Burgenland conclui pedindo que o Tribunal de digne:

¾        anular a decisão impugnada;

¾        condenar a Comissão nas despesas.

38      No processo T‑281/08, a República da Áustria conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        anular a decisão impugnada;

¾        condenar a Comissão nas despesas.

39      Nos processos T‑268/08 e T‑281/08, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal de digne:

¾        negar provimento aos recursos;

¾        condenar os recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

40      Em apoio dos seus recursos, os recorrentes invocam formalmente nove fundamentos.

41      Estes fundamentos dizem respeito respetivamente a:

¾        uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE na determinação do preço de mercado do BB medida em que a Comissão exigiu, sem razão, a aplicação de um processo de concurso com vista à privatização controvertida;

¾        uma violação da prática decisória anterior no que diz respeito à aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE;

¾        uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que a Comissão recusou ter em conta o desfecho incerto e uma eventual longa duração do procedimento de autorização na FMA em caso de cessão do BB ao consórcio;

¾        uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que o Land Burgenland podia ter em conta os riscos ligados à Ausfallhaftung para efeitos da comparação das propostas apresentadas, respetivamente, pela GRAWE e pelo consórcio;

¾        uma aplicação errada do princípio do vendedor privado em economia de mercado no âmbito do exame subsidiário dos riscos financeiros ligados à Ausfallhaftung;

¾        uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, devido a violação das regras que regulam o ónus da prova no âmbito do processo de concurso em causa;

¾        uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que a proposta do consórcio não podia servir para determinar o preço de mercado do BB;

¾        uma apreciação errada da emissão de títulos suplementares no quadro da Ausfallhaftung;

¾        uma aplicação errada sob vários aspetos do artigo 87.°, n.° 1, CE, no que respeita à determinação do elemento de auxílio.

42      O Tribunal entende que é oportuno começar por examinar o primeiro, segundo, sexto e sétimo fundamentos invocados pelas recorrentes, fundamentos que dizem respeito, todos eles, ao âmbito geral de exame da operação controvertida.

43      Antes de abordar o exame propriamente dito da argumentação das partes, há que proceder a um certo número de observações preliminares sobre o conceito de auxílio de Estado, na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, bem como sobre a natureza e o alcance da fiscalização jurisdicional que o juiz da União Europeia é levado a efetuar no caso vertente.

 Observações preliminares sobre o conceito de auxílio de Estado, na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, e quanto à natureza e ao alcance da fiscalização jurisdicional

44      O artigo 87.°, n.° 1, CE dispõe que «[s]alvo disposição em contrário do presente Tratado, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções».

45      Resulta de jurisprudência assente que a qualificação de auxílio, na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, requer que todas as condições referidas nessa disposição estejam preenchidas. Em primeiro lugar, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais. Em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem ao seu beneficiário favorecendo certas empresas ou certas produções. Em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C‑280/00, Colet., p. I‑7747, n.os 74 e 75, e acórdão do Tribunal Geral de 22 de fevereiro de 2006, Le Levant 001 e o./Comissão, T‑34/02, Colet., p. II‑267, n.° 110).

46      No caso vertente, deve ser reconhecido que apenas o requisito relativo à existência de uma vantagem é visado pelas recorrentes. Verifica‑se, com efeito, que os fundamentos invocados em apoio do presente recurso visam, no essencial, demonstrar que foi erradamente que a Comissão concluiu pela existência de uma vantagem em proveito da GRAWE, vantagem que corresponde à diferença entre a proposta apresentada por esta última e aquela apresentada pelo consórcio.

47      A este respeito, importa recordar que, em conformidade com jurisprudência consolidada, o fornecimento de bens ou serviços em condições preferenciais é suscetível de constituir um auxílio de Estado na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de fevereiro de 1988, Van der Kooy e o./Comissão, 67/85, 68/85 e 70/85, Colet., p. 219, n.os 28 e 29; de 20 de novembro de 2003, GEMO, C‑126/01, Colet., p. I‑13769, n.° 29; do Tribunal Geral de 16 de setembro de 2004, Valmont/Comissão, T‑274/01, Colet., p. II‑3145, n.° 44, e de 1 de julho de 2010, Itália/Comissão, T‑53/08, Colet., p. II‑3187, n.° 79).

48      Aplicado à hipótese de uma venda de um bem por uma entidade pública a uma entidade privada, este princípio implica que seja determinado se, nomeadamente, o preço da cessão desse bem equivale ao preço de mercado por corresponder ao que poderia ter sido obtido pelo adquirente em condições normais de mercado (v., neste sentido, acórdão Valmont/Comissão, n.° 47 supra, n.° 45 e jurisprudência referida). Nesta perspetiva, a Comissão entende que a se impõe a aplicação do critério do operador privado numa economia de mercado a fim de verificar se o preço pago pelo presumido beneficiário do auxílio corresponde ao preço que um operador privado, atuando em condições de concorrência normais, poderia ter fixado (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, Colet., p. I‑7763, n.° 68, e de 16 de dezembro de 2010, Seydaland Vereinigte Agrarbetriebe, C‑239/09, Colet., p. I‑13083, n.° 34 e jurisprudência referida). Aplicação concreta do referido critério implica, em princípio, uma apreciação económica complexa (acórdão Comissão/Scott, já referido, n.° 68).

49      Quanto ao alcance e à natureza da fiscalização jurisdicional, em primeiro lugar, há que recordar que o conceito de auxílio de Estado, tal como é definido pelo Tratado, é um conceito jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos. Por esta razão, o juiz da União deve, em princípio e tendo em conta tanto os elementos concretos do litígio submetido à sua apreciação como o caráter técnico ou complexo das apreciações feitas pela Comissão, exercer uma fiscalização exaustiva no que diz respeito à questão de saber se uma medida cai no âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE (acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de maio de 2000, França/Ladbroke e Comissão, C‑83/98 P, Colet., p. I‑3271, n.° 25, e de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, Colet., p. I‑10515, n.° 111). O juiz da União deve, designadamente, verificar não só a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também verificar se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de fundamentar as conclusões que deles são retiradas (v. acórdão Comissão/Scottt, n.° 48, supra, n.° 65 e jurisprudência referida).

50      Todavia, não compete ao juiz da União, no âmbito dessa fiscalização, substituir pela sua a apreciação económica da Comissão. Com efeito, a fiscalização que os órgãos jurisdicionais da União exercem sobre as apreciações económicas complexas feitas pela Comissão é uma fiscalização restrita, que se limita necessariamente à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exatidão material dos factos, bem como da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder (v. acórdão Comissão/Scott, já referido no n.° 48 supra, n.° 66 e jurisprudência referida, e acórdão do Tribunal Geral de 17 de dezembro de 2008, Ryanair/Comissão (T‑196/04, Colet., p. II‑3643, n.° 41).

51      Em segundo lugar, há que precisar que a legalidade de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que tomou essa decisão (acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de julho de 1986, Bélgica/Comissão, 234/84, Colet., p. 2263, n.° 16, e de 14 de setembro de 2004, Espanha/Comissão, C‑276/02, Colet., p. I‑8091, n.° 31; acórdão Valmont/Comissão, n.° 47 supra, n.° 38). Daí resulta, em particular, que, uma vez que o conceito de auxílio de Estado corresponde a uma situação objetiva que é apreciada à data em que a Comissão adota a sua decisão, as apreciações levadas a cabo nesta data é que devem ser tidas em conta para proceder à fiscalização jurisdicional (acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, Colet., p. I‑4777, n.° 144).

 Quanto ao primeiro, segundo, sexto e sétimo fundamentos

 Argumentos das partes

52      Com o seu primeiro fundamento, os recorrentes alegam, no essencial, que foi erradamente que a Comissão concluiu, referindo‑se ao XXIII relatório sobre a política de concorrência, que a privatização de uma empresa pública devia ser feita através de um processo de concurso aberto, transparente e incondicional e que um preço de mercado determinado unicamente em função de uma peritagem não era válida. A inexistência de processo de adjudicação regular para efeitos de uma privatização não implica que se esteja perante um auxílio de Estado, mas unicamente que é necessário averiguar, de forma individualizada, se a venda em causa não contém eventuais elementos de auxílio, verificação que só pode ser feita com base numa peritagem Por outras palavras, o XXIII relatório sobre a política de concorrência limita‑se a atenuar o ónus da prova da inexistência de auxílio de Estado, no que respeita às privatizações realizadas no âmbito de um processo de concurso. Supondo que a interpretação do referido relatório defendida pela Comissão deve ser acolhida, não é menos verdade que esse relatório, que contém apenas uma descrição das atividades da Direção‑Geral da Concorrência e dos objetivos políticos considerados prioritários para um determinado período, é destituído de qualquer efeito jurídico vinculativo.

53      Concretamente, a venda do BB à GRAWE realizou‑se efetivamente ao preço de mercado. Tal decorre claramente das peritagens independentes, da avaliação indicativa do BB realizada pelo HSBC no início da terceira operação de privatização e das propostas dos proponentes na segunda tentativa de privatização (v. considerando 68 da decisão impugnada). As avaliações em causa, incluindo a efetuada pelo consórcio, consideraram que o valor do BB se situava entre 44,4 e 75 milhões de euros. Como decorre da prática decisória da Comissão e da sua comunicação 97/C 209/03 no que respeita a auxílios estatais no âmbito da venda de terrenos e imóveis públicos (JO 1997, C 209, p. 3), que foi invocada por analogia, essas avaliações independentes que devem ser consideradas válidas para a determinação do valor do bem que é objeto de uma venda.

54      Ao não se basear nas avaliações independentes que lhe tinham sido propostas (v. considerando 68 da decisão impugnada) ou não pedir uma nova peritagem independente, a Comissão, que tem o dever de obter, no âmbito do procedimento formal de investigação, todos os pareceres necessários para ter uma informação completa sobre todos os dados do processo, não procedeu a um exame diligente e imparcial dos documentos postos à sua disposição a fim de determinar de modo preciso a existência e, sendo caso disso, o montante do auxílio.

55      Por último, os recorrentes consideram que a obrigação de recorrer a um processo de adjudicação, nos termos em que a Comissão a concebe, está em contradição com o critério do vendedor privado em economia de mercado. Sublinham que, no quadro das vendas efetuadas por privados, o recurso a um processo de concurso formalista é inexistente ou, pelo menos, é insignificante e cede o mais frequentemente o lugar a negociações com concorrentes escolhidos. Por outro lado, na sua prática decisória, a Comissão concedeu às autoridades estatais uma margem de manobra considerável no que respeita à organização do processo de concurso. Por conseguinte, não existe nenhuma prova empírica de que as propostas apresentadas no âmbito de um processo de adjudicação, constituem um «melhor valor aproximado» (v. considerando 112 da decisão impugnada) do que uma avaliação por um perito. Além disso, uma vez que as empresas privadas não recorrem geralmente a processos de concurso, a obrigação de recorrer a um processo de adjudicação exigido pela Comissão criaria uma desigualdade de tratamento em prejuízo das empresas públicas, em violação do artigo 295.° CE e 86.° CE.

56      Através do segundo fundamento, os recorrentes alegam que a decisão impugnada está em contradição com a prática decisória anterior da Comissão e, por isso, desrespeita o princípio da igualdade de tratamento. Até agora, nos casos em que não tinha havido concurso no quadro de uma operação de privatização, ou o concurso tinha sido irregular, a Comissão sempre se limitou a peritagens para determinar o preço de mercado. Sublinha, além disso, tanto quanto era do seu conhecimento, a Comissão declarou a presença de um elemento de auxílio no âmbito de uma operação de privatização uma única vez, a saber, no processo que deu lugar à Decisão 2008/717/CE da Comissão, de 27 de fevereiro de 2008, relativa ao auxílio de Estado C 46/07 (ex NN 56/07) concedido pela Roménia a favor da Automobile Craiova (antiga Daewoo România) (JO L 239, p. 12), processo no qual a Comissão, contrariamente ao que se verificou no caso presente, declarou o valor do mercado com base numa avaliação da empresa privatizada.

57      Através do seu sexto fundamento, os recorrentes sustentam, em substância, que, ao exigir às autoridades austríacas que provem que o consórcio não preenchia os critérios de adjudicação do BB nomeadamente quanto à segurança da transação e a evitar recorrer à Ausfallhaftung (v., nomeadamente, considerandos 129, 132, 133, 144 e 156 da decisão impugnada), a Comissão não respeitou o ónus da prova e as obrigações de informação que incumbem aos proponentes no quadro de um processo de concurso. Com efeito, a prova de que um proponente preenche os critérios de atribuição deve ser apresentada pelo próprio proponente no âmbito do processo de concurso e não a posteriori pela Comissão. No caso vertente, o consórcio não apresentou, dentro do prazo, as provas da sua solvabilidade e do refinanciamento do BB, e isso não obstante ter sido devidamente avisado da sua obrigação a esse respeito. Uma vez que podem criar uma discriminação em relação aos restantes proponentes, as provas apresentadas a posteriori devem ser declaradas inadmissíveis. Os recorrentes indicam igualmente que, na falta de tais provas, o Land Burgenland podia legitimamente ter dúvidas quanto à solvabilidade do consórcio.

58      Por último, no âmbito do seu sétimo fundamento, os recorrentes sustentam, no essencial, que, uma vez que se considerou que o processo de concurso padece de irregularidades, na medida em que se baseava em critérios de seleção ilegais como a tomada em consideração da Ausfallhaftung (v. considerandos 134 e seguintes e 141 e seguintes da decisão impugnada), a proposta de compra do consórcio não pode servir para determinar o preço de mercado do BB (v. considerandos 110 a 114 da decisão impugnada). Resulta, de resto, da prática decisória da Comissão que ela recusou ter em conta os resultados de um processo de adjudicação irregular na determinação do elemento de auxílio. No caso vertente, é inegável que o maior risco que o Land Burgenland correu sob o ângulo da mobilização da Ausfallhaftung levou o consórcio a aumentar excessivamente sua proposta em forma de compensação equiparável a um «prémio de risco». O caráter excessivo ou fantasista da proposta de compra apresentada pelo consórcio é concretamente confirmado pelo montante das outras propostas apresentadas (v. considerando 66 da decisão impugnada), bem como pelas avaliações independentes (v. considerando 68 da decisão impugnada), de que a Comissão deveria ter tido em conta.

59      A Comissão contesta todas as objeções suscitadas pelas recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

60      O exame do primeiro fundamento requer, no essencial, que sejam decididas duas questões: a primeira visa determinar se a Comissão, ao basear‑se no XXIII relatório sobre a política de concorrência, tinha efetivamente exigido que o preço de mercado do BB só pudesse ser determinado através de um processo de concurso. Através da segunda questão pretende saber‑se se a Comissão podia, sem cometer um erro manifesto de apreciação, excluir, no caso vertente, o recurso às peritagens apresentadas no procedimento de investigação da medida controvertida e que os recorrentes invocam com vista à avaliação do referido preço de mercado.

61      Resulta de uma leitura de conjunto da decisão impugnada que foi erradamente que os recorrentes afirmam que a Comissão «parte do princípio de que uma privatização deve ser efetuada no quadro de um concurso público aberto, transparente e incondicional». A Comissão, com efeito, limitou‑se, na sua apreciação, a mencionar o facto de que «se baseia, para a apreciação, tendo em conta a regulamentação relativa aos auxílios de Estado, de uma medida tomada no âmbito de uma privatização, em vários princípios por ela fixados no 23.° relatório sobre a política de concorrência [...], bem como na sua prática posterior».

62      O n.° 403 do XXII relatório sobre a política de concorrência está assim redigido:

«Para além da transparência, é conveniente relembrar os princípios gerais que a Comissão aplica às privatizações e que foram definidos ao longo dos anos, com base na análise de casos individuais.

Importa recordar que, por força do artigo 222.° [CE], o direito comunitário em nada prejudica o regime da propriedade das empresas. Os auxílios que favorecem as privatizações não beneficiam, portanto, necessariamente, enquanto tais, de uma derrogação ao princípio fundamental da incompatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado comum, enunciado no artigo 92.°, n.° 1.

Quando a privatização é efetuada através da venda de ações em bolsa, é geralmente presumido que essa venda se faz nas condições do mercado e que a operação não contém nenhum elemento de auxílio. Pode acontecer que, antes da emissão das ações, as dívidas fossem anuladas ou reduzidas, sem que haja presunção de auxílio enquanto o produto da emissão for superior à redução da dívida.

Se a privatização de uma sociedade se fizer não através da emissão de ações em bolsa, mas por venda por ajuste direto (isto é, através de venda da totalidade ou de partes da sociedade a outras sociedades), deverão ser observadas as condições seguintes para que se possa presumir, sem qualquer outro exame, que a operação não contém nenhum elemento de auxílio:

¾        Há que lançar um concurso aberto, transparente e incondicional, sem que a participação nesse concurso seja subordinada ao cumprimento de outros atos, como a aquisição de outros ativos diferentes dos que são objeto do concurso público ou a prossecução de certas atividades;

¾        A sociedade deve ser vendida ao mais que ofereça;

¾        Os candidatos adquirentes devem dispor do tempo e da informação necessários para proceder a uma avaliação adequada dos elementos de ativo, a fim de ter uma base para formular a sua proposta.

As privatizações efetuadas através da emissão de ações ou mediante concurso nas condições acima descritas não devem ser previamente notificadas à Comissão com vista a um exame das suas implicações em matéria de auxílios, mas os Estados‑Membros podem notificá‑los caso pretendam garantir a segurança jurídica suplementar de uma autorização formal. Noutros casos, as vendas por ajuste direto devem ser examinadas a fim de determinar as eventuais implicações em matéria de auxílios, o que significa que devem ser notificadas. É o que se verifica, nomeadamente, nos seguintes casos:

¾        Vendas após negociações com um só candidato adquirente ou com vários candidatos selecionados;

¾        Vendas precedidas da anulação de dívidas pelo Estado, por outras empresas públicas ou por qualquer outro organismo público;

¾        Vendas precedidas da conversão de dívidas em capital social ou de aumento de capital;

¾        Vendas efetuadas em condições que não são habituais nas operações comparáveis celebradas entre particulares.

Não pode em caso nenhum existir discriminação baseada na nacionalidade dos candidatos à aquisição de ações ou elementos do ativo em causa.

Qualquer venda celebrada em condições que não podem ser consideradas condições comerciais normais deve ser precedida de uma avaliação efetuada por consultores independentes. As privatizações em setores sensíveis (fibras sintéticas, têxteis, indústria automóvel, etc.) devem ser objeto de uma notificação prévia à Comissão.»

63      Como os próprios recorrentes admitem, as orientações enunciadas nesse relatório têm unicamente em vista precisar os casos em que se presume que as medidas de privatização previstas pelos Estados‑Membros não contêm nenhum elemento de auxílio e que, por isso, não é necessário notificá‑los, salvo se as autoridades nacionais pretendem assegurar a segurança jurídica da transação.

64      Também não resulta destas orientações que a Comissão exija em todas as hipóteses que seja lançado um concurso aberto, transparente e incondicional. As orientações limitam‑se a indicar que, caso se recorra a esse processo, devem estar preenchidos um certo número de requisitos para que se possa presumir que a privatização em causa satisfaz as disposições do direito da União em matéria de auxílios de Estado.

65      Do mesmo modo, o referido relatório não fornece nenhum elemento pertinente para o presente processo quanto à admissibilidade eventual das peritagens apresentadas com vista à fixação do preço de mercado da entidade cuja privatização está prevista. A este respeito, a simples afirmação feita no que respeita às peritagens é que «[q]ualquer venda celebrada em condições que não podem ser consideradas condições comerciais normais deve ser precedida de uma avaliação efetuada por peritos independentes». Ora, esta última hipótese é precisamente visada no caso em apreço, uma vez que a Comissão tinha expressamente excluído, no âmbito do processo de concurso com vista à privatização do BB, que se tratava de uma venda celebrada em condições comerciais especiais (v., neste sentido, considerandos 111 e 112 da decisão impugnada).

66      Resulta de todas estas considerações que não está minimamente comprovada a afirmação dos recorrentes segundo a qual a Comissão, sem ter em conta o princípio da igualdade entre os operadores privados e entidades públicas, concluiu, baseando‑se no XXIII relatório sobre a política de concorrência, que apenas um processo de concurso permitia determinar o preço de mercado no caso de uma cessão de uma empresa com vista à sua privatização.

67      Por todas estas razões, não há que pronunciar‑se sobre o alcance jurídico do XXIII relatório sobre a política de concorrência, que, como anteriormente foi referido, tinha apenas por objeto recordar aos Estados‑Membros, numa preocupação de transparência e de clarificação, as orientações gerais seguidas pela Comissão com vista ao exame das medidas adotadas no quadro das privatizações de empresas.

68      Falta, portanto, determinar, no quadro do primeiro fundamento, se foi sem cometer nenhum erro manifesto de apreciação que a Comissão recusou ter em conta as diferentes peritagens que os recorrentes invocaram no presente caso para determinar o preço de mercado do BB.

69      A este respeito, deve recordar‑se que o preço de mercado de uma empresa, que geralmente está dependente do jogo da proposta e da procura, corresponde ao preço mais elevado que um investidor privado agindo em condições normais de concorrência está disposto a pagar por esta (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de abril de 2004, Alemanha/Comissão, C‑277/00, Colet., p. I‑3925, n.° 80 e jurisprudência referida no n.° 48, supra, n.° 48).

70      Quando uma autoridade pública tenciona vender uma empresa que lhe pertence e lança, para esse efeito, um concurso aberto, transparente e incondicional, pode, pois, presumir‑se que o preço de mercado corresponde à proposta mais alta, entendendo‑se que se deve demonstrar, em primeiro lugar, que essa proposta tem valor de compromisso e que é credível e, em segundo lugar, que a tomada em consideração de outros fatores económicos diferentes do preço não é justificada, como os riscos fora de balanço existentes entre as propostas. Por conseguinte, a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir que o elemento de auxílio pode ser calculado a partir do preço de mercado, que em princípio depende, ele próprio, das propostas concretamente apresentadas no âmbito de um concurso.

71      Nestas condições, não se pode acusar a Comissão de não ter tomado em consideração as peritagens independentes, mencionadas no considerando 68 da decisão impugnada, que corroboram a ideia defendida pelos recorrentes segundo a qual o preço proposto pela GRAWE para a aquisição do BB é conforme ao preço de mercado.

72      Com efeito, o recurso a estas peritagens para a determinação do preço de mercado do BB só teria sentido na hipótese de não ter sido lançado, com vista à venda desta, nenhum processo de concurso ou eventualmente na hipótese de se concluir que o processo de concurso lançado não foi transparente nem incondicional A esse propósito, é incontestável que as propostas validamente e efetivamente apresentadas no âmbito do processo de concurso lançado com vista à privatização de uma determinada empresa, constituem, em princípio, um melhor valor aproximado do preço de mercado da referida entidade do que peritagens independentes. Com efeito, essas peritagens, independentemente do método e dos parâmetros utilizados para a sua elaboração, assentam num exame prospetivo e conduzem, portanto, a uma avaliação do preço de mercado da empresa em causa de um valor menor do que o decorrente de propostas concreta e validamente apresentadas no âmbito de um concurso regularmente instituído.

73      Pelas mesmas razões, a Comissão não pode ser acusada de não ter considerado necessária a realização de um estudo ex post por um perito independente, nem, ao mesmo tempo, de ter cumprido o seu dever de exame diligente e imparcial das medidas sobre as quais tem de se pronunciar. Como decorre claramente dos considerandos 112 e 113 da decisão impugnada, a Comissão partiu da conclusão de que, perante propostas de compra vinculativas do BB, as peritagens independentes, fosse qual fosse o seu autor, a sua data de elaboração ou o método de análise escolhido, eram, enquanto tal, desprovidas de pertinência para determinar se o preço pago pela GRAWE pela aquisição do BB correspondia ao preço de mercado. Por outro lado, os recorrentes não demonstraram que a Comissão não tomou em consideração todas as informações e avaliações que lhe foram apresentadas, em especial pelas autoridades austríacas no decurso do procedimento administrativo.

74      Por conseguinte, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

75      Através do segundo fundamento, que está estreitamente ligado ao primeiro, os recorrentes pretendem demonstrar que a decisão impugnada se afasta da prática decisória até então seguida pela Comissão na medida em que foi a primeira vez que a Comissão exigiu a um Estado‑Membro que pretende privatizar uma empresa que lhe pertence que organiza um processo de adjudicação aberto, transparente e incondicional.

76      Quanto a este aspeto, o Tribunal recorda que o conceito de auxílio de Estado, tem caráter jurídico e deve ser entendido à luz de elementos objetivos (v. acórdão Valmont/Comissão, n.° 47 supra, n.° 37 e jurisprudência referida). A qualificação de uma medida como auxílio de Estado não pode, portanto, depender de uma apreciação subjetiva da Comissão, devendo ser determinada independentemente de qualquer prática administrativa anterior da Comissão, admitindo‑a demonstrada (v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de setembro de 2003, Freistaat Sachsen e o./Comissão, C‑57/00 P e C‑61/00 P, Colet., p. I‑9975, n.os 52 e 53, e acórdão do Tribunal Geral de 15 de junho de 2005, Regione autonoma della Sardegna/Comissão, T‑171/02, Colet., p. II‑2123, n.° 177).

77      Nestas condições, os recorrentes não podem alegar uma violação do princípio da igualdade de tratamento, ao invocar a prática decisória anterior. Estando a Comissão a proceder a uma análise individualizada das circunstâncias próprias de cada processo, não está vinculada por decisões anteriores.

78      De qualquer modo, os recorrentes, que procedem por afirmações gerais, indicando que até então a Comissão tem sempre «salvo» as privatizações, não indicaram em que medida as circunstâncias que deram origem às decisões que citam e as considerações jurídicas que lhes estão subjacentes são comparáveis às do caso vertente. Em especial, não foi demonstrado que uma dessas decisões visava uma situação em que, à semelhança da presente caso, se concluiu que o preço de mercado do bem ou da entidade a ceder tinha sido validamente fixado através de um concurso aberto, transparente e incondicional.

79      Resulta destas considerações que o segundo fundamento não pode, em qualquer caso, ser acolhido.

80      Quanto ao sexto fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter violado o ónus da prova e as obrigações de informação que impendem sobre os proponentes no âmbito de um processo de concurso lançado com vista à privatização da empresa, afigura‑se desde já que, com a sua argumentação, os recorrentes fazem uma confusão entre, por um lado, as obrigações de informação que incumbem aos proponentes no âmbito de qualquer processo de concurso e, por outro, a exigência de exame diligente e imparcial imposto à Comissão a respeito das medidas de auxílio presumidas.

81      No que respeita às obrigações de informação que incumbem aos proponentes no âmbito de um processo de adjudicação, os recorrentes alegam, em substância, que o consórcio deveria ter fornecido a prova de que tinha solvabilidade e que a FMA se pronunciou a favor de uma cessão do BB a este.

82      Ora, como a Comissão observou com razão, o consórcio não estava precisamente em condições de fornecer a menor indicação sobre o resultado favorável ou não do procedimento de autorização na FMA na hipótese de o Land Burgenland ter decidido optar pela proposta do referido consórcio. De resto, uma vez que o montante da proposta de aquisição apresentada pelo consórcio era claramente superior ao da proposta apresentada pela GRAWE e que, portanto, a existência de uma vantagem a favor desta última não podia ser excluída, cabia precisamente às autoridades competentes fornecer indícios sérios de que o exame efetuado pela FMA teria levado a proibir a cessão do BB ao consórcio, o que estas não fizeram.

83      Quanto à prova da capacidade e da solvabilidade financeiras do consórcio, verifica‑se que nenhuma das partes no procedimento formal de investigação pôs em causa a capacidade deste para reunir os fundos necessários para pagar o preço de compra proposto. Além disso, resulta dos autos que, em princípio, a prova da capacidade financeira de um proponente para pagar o preço de compra proposto é apreciada numa fase precoce do processo de adjudicação, a saber, na fase da «devida diligência» que, segundo os recorrentes implica um exame dos balanços e dos recursos pessoais e materiais dos proponentes cuja proposta foi considerada firme e admissível. Ora, importa constatar que a proposta do consórcio só foi afastada na fase final das negociações conduzidas no quadro desse processo, uma vez que, como é mencionado no considerando 53 da decisão impugnada, «a Áustria refere ter suposto que o consórcio, conforme anunciado nas negociações, é um parceiro de negócios economicamente forte».

84      Os outros aspetos invocados pelos recorrentes, relativos à capacidade do consórcio para dominar os problemas de liquidez eventuais em caso de aquisição do BB (v. considerandos 78 e 79 da decisão impugnada relativos ao «refinanciamento do BB após a sua cessão»), para além de não serem pertinentes caso a Ausfallhaftung devesse ser considerada, hipótese que será examinada em seguida (v. n.os 149 e segs., infra), não são, de qualquer modo, procedentes. Com efeito, resulta igualmente da decisão impugnada que o consórcio nunca excluiu o próprio princípio de um risco de saída de depósitos e de rescisão das linhas interbancárias (mesmo que o tivesse calculado a um nível mais baixo do que a Comissão) e que prestou, a título de garantia, declarações de intenção provenientes de diversos bancos (v. considerando 78 da decisão impugnada). Em tais circunstâncias, não se pode sustentar que o consórcio não tinha fornecido nenhuma garantia da solvabilidade..

85      Além disso, refira‑se que, em resposta a uma pergunta feita pelo Tribunal na audiência a fim de saber se, e em que medida, os recorrentes punham em causa a capacidade económica do consórcio para liquidar o preço de compra do BB de 155 milhões de euros, estes confirmaram que não tinham de posto de modo nenhum em causa o facto de que o consórcio tinha condições para pagar esse preço.

86      Tendo em conta todas estas considerações, há que julgar improcedente o sexto fundamento.

87      Por fim, no que diz respeito ao sétimo fundamento, relativo ao facto de a proposta do consórcio não poder servir para determinar o preço de mercado, importa recordar que, como resulta da análise do primeiro fundamento (v. designadamente n.° 70, supra), quando uma autoridade pública tem intenção de vender uma empresa que lhe pertencia e que, para esse efeito, lança um concurso aberto, transparente e incondicional, pode presumir‑se que o preço de mercado corresponde à proposta mais alta, sendo certo que deve ser demonstrado, em primeiro lugar, que essa proposta tem valor de compromisso e que é credível e, em segundo lugar, que a tomada em consideração de outros fatores económicos diferentes do preço não é justificada, como os riscos fora de balanço existentes entre as propostas.

88      Por conseguinte, a Comissão não comete nenhum erro manifesto de apreciação ao concluir que o elemento de auxílio pode ser calculado a partir do preço de mercado, que depende, ele próprio, das propostas concretamente apresentadas no âmbito do concurso.

89      Por outro lado, na perspetiva do vendedor privado em economia de mercado, as razões subjetivas ou de ordem estratégica que conduzem um proponente a apresentar uma proposta de um certo montante não são determinantes. O vendedor privado em economia de mercado optará, em princípio, pela proposta de compra mais elevada, e isto independentemente das razões que levaram os potenciais compradores a apresentar propostas de um certo montante. Por conseguinte, deve ser afastada a alegação dos recorrentes segundo a qual é exorbitante o montante da proposta apresentada pelo consórcio.

90      Quanto à argumentação dos recorrentes segundo a qual a Comissão não se podia basear nos resultados de um processo de adjudicação que ela própria tinha considerado irregular, basta recordar que, embora, na fase da abertura do procedimento formal de investigação, tinha manifestado dúvidas sobre a regularidade do concurso, em particular, na perspetiva do respeito da igualdade de tratamento entre proponentes (v., a este propósito, considerando 42 da decisão impugnada), a Comissão chegou à conclusão de que as lacunas que viciam as condições do concurso não tinham influenciado o montante das propostas concretamente apresentadas e que, por conseguinte, a proposta nominal mais elevada constituía um bom valor aproximado do preço de mercado (v. considerando 143 da decisão impugnada).

91      Além disso, no prolongamento das considerações expostas no âmbito do segundo fundamento, deve concluir‑se que a referência à alegada prática decisória constante da Comissão também não fundamenta o ponto de vista defendido pelas recorrentes. Designadamente quanto aos processos que deram lugar à Decisão 2000/513/CE da Comissão, de 8 de setembro de 1999, relativo aos auxílios concedidos pela França à empresa Stardust Marine (JO 2000, L 206, p. 6), e à decisão 2000/628/CE da Comissão, de 11 de abril de 2000, relativa aos auxílios concedidos pela Espanha à Centrale del Latte di Roma (JO L 265, p. 15), a que os recorrentes se referem, basta verificar que visavam situações em que precisamente não tinha sido lançado um concurso aberto, transparente e incondicional.

92      Consequentemente, o sétimo fundamento deve ser igualmente julgado improcedente.

 . Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que a Comissão recusou ter em conta o desfecho incerto e uma eventual duração longa do procedimento de autorização na FMA em caso de cessão do BB ao consórcio

 Argumentos das partes

93      Os recorrentes acusam a Comissão de ter, no quadro da aplicação do critério do vendedor privado em economia de mercado, feito um exame incompleto da segurança da transação. Acusam, no essencial, a Comissão de não ter tido suficientemente em conta, quando da avaliação e da comparação das propostas de aquisição do BB, o desfecho incerto e a duração possível do procedimento de autorização na FMA em caso de venda, ao consórcio. Ora, um vendedor privado teria optado, precisamente por estas razões, pela proposta da GRAWE, proposta que, embora de montante inferior ao da proposta apresentada pelo consórcio, expirava em 31 de março de 2006 e que, atendendo às peritagens referidas no considerando 68 da decisão impugnada e à experiência resultante das anteriores tentativas de privatização do BB, era particularmente interessante.

94      Segundo os recorrentes, a afirmação da Comissão de que a duração do processo de exame efetuado pela autoridade de supervisão não pode justificar a exclusão de um proponente de um processo de concurso, dado que isso permitiria discriminações de concorrentes estrangeiros (v. considerando 130 da decisão impugnada), ignora que há que distinguir entre o papel do Estado enquanto vendedor privado e aquele que ele exerce soberanamente na sua qualidade de autoridade de regulação dos mercados financeiros. A este respeito, tendo em conta a independência da FMA e das regras a que esta última está sujeita, as autoridades austríacas não estão em condições de obter qualquer informação sobre o resultado do procedimento de autorização. Além disso, a alegação da Comissão refere‑se a uma questão que não diz respeito ao direito dos auxílios de Estado (mas sim à liberdade de estabelecimento e à livre circulação de capitais) e viola a repartição de competências entre o Estado federal e os Länder.

95      As recorrentes acrescentam que, no caso vertente, a maneira de agir do Land Burgenland, que consistiu num primeiro momento, em escolher o adquirente, para, num segundo momento, solicitar as autorizações necessárias, não só seria conforme com o critério do vendedor privado, mas igualmente reconhecida na prática decisória da Comissão.

96      Os recorrentes alegam que, como resulta nomeadamente de uma carta do consultor do HSBC datada de 3 de março de 2008 e transmitida à Comissão em 5 de março de 2008, existiam no caso vertente vários indícios que militam contra o caráter autorizável da venda do BB ao consórcio.

97      Sublinham, antes de mais, que os membros do consórcio não dispunham de nenhuma notação de uma agência de notação internacionalmente reconhecida, quando na verdade se trata, como a Comissão refere em várias das suas comunicações e decisões, de uma condição indispensável para poder exercer atividades nos mercados bancários e de capitais europeus.

98      Os recorrentes consideram, em seguida, que, na falta de uma análise de solvabilidade apresentada pelo consórcio, os recorrentes invocaram a prática das agências de notação segundo a qual, em princípio, não pode ser atribuída a uma empresa, uma notação mais vantajosa do que a do Estado em que está estabelecida, concretamente na Ucrânia, que beneficia de uma notação máxima de «BB» («sub investment grade»).

99      Os recorrentes referem‑se, por outro lado, aos vícios que inquinam o plano de negócios (business plan) apresentado pelo consórcio (v. carta das autoridades austríacas de 1 de março de 2007, à falta de experiência deste no mercado bancário europeu e ao desejo do referido consórcio de levar a cabo uma nova política comercial par o BB que, a prazo e como resulta dos comentários do HSBC, poderia conduzir a uma perda substancial dos seus fundos próprios e, portanto, a uma interferência do Land Burgenland ao abrigo da Ausfallhaftung. os recorrentes adiantam que estes aspetos eram necessariamente tomadas em consideração pelo FMA, que, em aplicação dos critérios enunciados no § 5, n.° 1, ponto 3, da Bankwesengesetz (BWG, Lei federal relativa ao sistema bancário), tinha de avaliar se o consórcio oferecia uma garantia de gestão economicamente sólido e prudente do BB depois da aquisição desta última, o que a Comissão não examinou, em violação do dever de fundamentação previsto no artigo 253.° CE.

100    As estimativas pessimistas quanto à autorização da FMA em caso de cessão do BB ao consórcio são igualmente comprovadas pelas informações relativas às deficiências estruturais e funcionais do setor bancário ucraniano, como as mesmas resultam nomeadamente dos relatórios periódicos do Fundo Monetário Internacional. Esses relatórios foram expressamente mencionados pelas autoridades austríacas no decurso do procedimento formal e são, de qualquer forma, acessíveis ao público. Na réplica que apresentaram, os recorrentes referem que a evolução recente do setor bancário ucraniano veio confirmar as preocupações que tinham manifestado à época dos factos.

101    Segundo os recorrentes, há igualmente que ter em conta o facto de o cumprimento pela FMA da sua obrigação de controlo ter sido mais dificultado ainda no caso de uma aquisição do BB pelo consórcio em razão da falta de colaboração que se institucionalizou entre a FMA e as autoridades ucranianas, nomeadamente através de um Protocolo de acordo celebrado com o banco nacional ucraniano.

102    Além disso, os recorrentes referem que o Land Burgenland não se baseou apenas nas suas próprias avaliações, mas que entrou em contacto de modo informal com a FMA a fim de se assegurar da fiabilidade das suas previsões acerca da probabilidade de que esta autoridade concederia uma autorização ao consórcio. Segundo as informações fornecidas pela FMA, o desfecho do procedimento de autorização da aquisição do BB pelo consórcio teria sido totalmente aberto, mas certamente que este processo conduziria num primeiro momento, à proibição no caso de uma aquisição do BB pelo consórcio. Ora, o caráter incerto e a duração mais longa desta aquisição não eram aceitáveis para o Land Burgenland, na sua qualidade de vendedor privado. Em consequência disso, como a República da Áustria indicou por carta de 1 de junho de 2006, o Land Burgenland tinha partido do princípio de que «a FMA não ia autorizar, e provavelmente não podia autorizar, a aquisição do banco pelo consórcio». As conclusões constantes do despacho de medidas provisórias do Landesgericht Eisenstadt (Tribunal regional de Eisenstadt, Áustria) de 26 de maio de 2006, confirmam esta situação de facto. os recorrentes precisaram que resultava das discussões que as autoridades competentes tiveram com a FMA que se podia esperar uma decisão de autorização dentro de algumas semanas em caso de cessão do BB à GRAWE. A FMA teria, ao invés, dado a entender que, no caso de uma cessão do BB ao consórcio, este procedimento duraria provavelmente seis meses ou, no pior dos casos, um ano. Não há qualquer dúvida de que o procedimento de autorização na FMA teria sido, em caso de venda ao consórcio, consideravelmente mais longo e o seu desfecho muito mais incerto.

103    Por último, os recorrentes sublinham que a Comissão aplicou erradamente o critério do vendedor privado ao exigir, no que diz respeito à cessão do BB à GRAWE, a prova de que a venda ao consórcio não teria sido manifestamente possível ou que a FMA teria certamente proibido a venda ao consórcio. Como o consultor do HSBC claramente explicou nas suas observações de maio de 2006, um vendedor privado razoável teria procurado maximizar o valor esperado do preço de compra, definido como a proposta cujas probabilidades de obtenção são as mais importantes Ora, dado que o valor esperado do preço de compra proposto pela GRAWE era nitidamente superior ao do consórcio, a decisão do Land Burgenland em favor da GRAWE foi justificada tendo em conta o facto de que o preço de compra nominal inferior proposto pela GRAWE era em larga medida compensado pela segurança acrescida da transação. Dito de outro modo, a Comissão não incluiu na sua análise a probabilidade, que é de 50%, de que a venda ao consórcio não seja autorizada pela FMA.

104    Na réplica, os recorrentes sublinham que a Comissão se contradiz quanto à margem de precisão de que dispunha o Land Burgenland no que diz respeito ao resultado do processo na FMA: Embora reconhecendo que o resultado desse processo não podia ser calculado com precisão antecipadamente, a Comissão exige, noutras passagens dos seus documentos, que a recusa de autorização da aquisição do BB o mais que proponha seja manifesta.

105    A Comissão contesta todas as objeções levantadas pelas recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

106    O presente fundamento refere‑se à problemática, evocada no considerando 121, in fine, da decisão impugnada, da autorização que deve ser concedida pela autoridade competente dos mercados financeiros no âmbito do processo de privatização, a saber, a FMA. os recorrentes sustentam, com efeito, que o desfecho incerto e o caráter longo do procedimento de autorização caso o BB tivesse sido vendida ao consórcio justificaram que o BB fosse, em definitivo, cedida à GRAWE, ainda que a proposta apresentada por esta última fosse de montante inferior.

107    A este respeito, as partes estão de acordo quanto ao facto, mencionado no considerando 120 da decisão impugnada, de que um vendedor que opera segundo os princípios da economia de mercado, pode escolher a proposta mais baixa se for claro que a cessão ao que mais oferecer não for realizável. Importa mais precisamente sublinhar que, contrariamente ao que as recorrentes deixaram supor, a Comissão reconheceu claramente, no considerando 125 da decisão impugnada, o facto de que um vendedor em economia de mercado não teria optado por um comprador que, com toda a probabilidade, não teria recebido as autorizações necessárias junto das autoridades competentes.

108    Compete assim ao Tribunal determinar se a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir que os elementos apresentados pelas recorrentes para demonstrar, em primeiro lugar, que a autorização pela FMA à cessão do BB ao consórcio padecia de incerteza e, em segundo lugar, que o procedimento de autorização na FMA no caso de uma cessão do BB ao consórcio é mais longo, não justificavam, tendo em conta o critério do operador privado em economia de mercado, que tivesse sido decidido ceder o BB à GRAWE.

109    Em primeiro lugar, no que respeita ao teor propriamente dito do procedimento de autorização, resulta dos autos que, por força do § 20, n.° 3, da BWG, aplicável à época dos factos, a aquisição de uma participação qualificada num estabelecimento de crédito austríaco está sujeita a declaração e a autorização.

110    O exame da aquisição de uma participação qualificada é efetuado segundo o critério da aptidão e de honorabilidade («Fit & Proper»), que está definido no § 5, n.° 1, da BWG. Como resulta nomeadamente dos considerandos 125 e 126 da decisão impugnada, não contestados pelas partes, a FMA só pode, ao abrigo do § 20 da BWG, submeter o adquirente de um banco a critérios de qualificação e de experiência se as partes na negociação tiverem celebrado um acordo de venda vinculativo. Daqui resulta que uma avaliação concomitante de vários adquirentes potenciais não pode, na prática, ser efetuada pela FMA. Esta autoridade confirmou além disso à Comissão que só iniciava o exame da aquisição de uma participação qualificada se as duas partes na transação tivessem uma intenção específica e abertamente manifestada de aquisição e venda. No presente caso, o Land Burgenland devia, assim, definitivamente optar por uma das propostas de compra do BB antes de o procedimento de autorização da aquisição poder ser iniciado na FMA. Além disso, segundo as informações prestadas pelas próprias autoridades austríacas, a FMA está, enquanto autoridade administrativa independente, sujeita a obrigações de confidencialidade e de imparcialidade. A FMA não pode, portanto, fazer prognósticos a priori sobre o desfecho de um procedimento de autorização iniciado.

111    Por outro lado, as partes estão de acordo quanto ao facto de que a FMA pode proibir a aquisição no prazo de três meses após a declaração, sob pena de a aquisição se considerar autorizada. Se a FMA considerar que necessita, para o seu exame, de mais tempo do que os três meses que lhe são fixados, deve começar por proibir a aquisição antes de terminar o prazo de três meses. Esta proibição não prejudica, porém, a decisão definitiva da FMA sobre a aquisição da participação qualificada.

112    Relativamente, em segundo lugar, aos argumentos expressamente invocados pelas recorrentes, que consistem no essencial, em primeiro lugar, em considerações gerais relativas à atitude de reserva, ou mesmo hostil que as autoridades de supervisão tiveram ou deveriam, em geral, ter relativamente aos operadores provenientes da Ucrânia, em segundo lugar, às indicações sobre a situação dos membros do consórcio e, em terceiro lugar, às indicações fornecidas pela própria FMA.

113    No que respeita, em primeiro lugar, às considerações gerais relativas à atitude muito reservada que as autoridades de supervisão efetivamente tiveram, como atesta o exemplo da decisão do Bundesanstalt für Finanzdienstleistungsaufsicht (organismo federal de controlo dos serviços financeiros alemão), que, no termo de um exame que durou treze meses, recusou a aquisição da Nordfinanz Bank AG por um grupo ucraniano, ou ainda a recusa em 1994 de atribuir uma concessão bancária ao antecessor de um dos membros do consórcio (SLAV), ou deveriam ter tido, em geral (atendendo em particular à harmonização a nível Europeu das normas processuais e dos critérios de avaliação aplicáveis à avaliação prudente da aquisição e dos aumentos de participação nas entidades do setor financeiro) a pessoas singulares ou coletivas com sede na Ucrânia, não são, para efeitos do presente processo, nem pertinentes nem convincentes quanto ao mérito.

114    Desde logo, estes elementos são insuscetíveis de fornecer a menor indicação sobre o desfecho concreto que teria tido o procedimento de autorização na FMA no caso de o Land Burgenland ter decidido ceder o BB ao consórcio. No caso vertente, não se tratava de determinar se as entidades do setor bancário ucraniano estão sujeitas a obrigações e a controlos de qualidade suficiente, isto é, equivalente à das obrigações e dos controlos efetuados nos Estados‑Membros da União. Como a Comissão referiu claramente, sem que as recorrentes tenham contestado este ponto, o exame efetuado pela FMA sobre a aquisição de participações nos estabelecimentos bancários visa determinar se os adquirentes apresentam, tendo em conta os critérios de qualificações e a experiência referidos no § 20 da BWG, as garantias de fiabilidade com vista a uma gestão sólida e transparente do estabelecimento de crédito em causa.

115    Por outro lado, há que concluir que um certo número de considerações adiantadas no caso vertente, nomeadamente na réplica, respeitam aos desenvolvimentos novas práticas na sequência da crise financeira que se verificou a nível mundial. Ora, como resulta da jurisprudência referida no n.° 51, supra, a legalidade de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que adotou tal decisão.

116    Não há, por conseguinte, que ter em conta desenvolvimentos que se verificaram posteriormente à adoção dessa decisão, que, por definição, não chegaram ao conhecimento da Comissão. Assim, devem ser rejeitados por inadmissíveis os argumentos baseados, em primeiro lugar, na prudência de que devem, na sequência da crise financeira, fazer prova doravante os órgãos de fiscalização e às autoridades de regulação financeira e, em segundo lugar, as modificações eventuais do direito aplicável que deles resultaram.

117    Em seguida, a argumentação desenvolvida pelas recorrentes omite o facto de que o desejo manifestado pelo consórcio de adquirir o BB podia ser analisado como uma vontade de fundar um estabelecimento de crédito na Áustria. A este respeito, embora a integração de um dos membros do consórcio, isto é, a Ative Bank, tenha sido abordada pelas recorrentes, em contrapartida, não foi provado que esta só estava prevista na sequência de uma eventual cessão do BB ao consórcio. Este elemento também não era daqueles que deviam ser tidos em conta na fase do processo de exame na FMA.

118    Além disso, estas considerações gerais omitem o facto de a FMA dever, como as recorrentes sublinham nas petições respetivas, analisar qualquer pedido de aquisição de participações num estabelecimento financeiro sem qualquer julgamento antecipado. O facto de alguns dos membros do consórcio terem estado originariamente estabelecidos na Ucrânia, não pode, por si só, ter explicado que a FMA reservasse um desfecho negativo ao procedimento de autorização.

119    Em segundo lugar, no que respeita aos indícios apresentados pelas recorrentes em relação com o consórcio, a saber, a inexistência de notação por uma agência internacionalmente reconhecida, as pretensas lacunas que viciam o seu plano de negócios, a sua inexperiência ou ainda a política comercial que tencionava levar a cabo na BB, os mesmos também não são pertinentes no âmbito da avaliação das possibilidades de sucesso do procedimento de autorização na FMA.

120    Antes de mais, os recorrentes não indicaram se e em que medida é que estes elementos foram tidos em consideração pela FMA na sua avaliação.

121    Seguidamente, e como a Comissão sublinhou, com a sua argumentação relativa às pretensas lacunas que viciam o plano de negócios do consórcio, a sua inexperiência ou ainda a política comercial que o referido consórcio tinha a intenção de levar a cabo na BB, os recorrentes manifestam, na realidade, preocupações sobre o futuro comercial do BB, concretamente da entidade a vender, e que são, em princípio, alheias às que animam um vendedor em economia de mercado.

122    Em terceiro lugar, as recorrentes sustentam, no essencial, que decorre dos contactos informais com a FMA que, em caso de venda à GRAWE, era possível contar com uma decisão de autorização dentro de algumas semanas após a venda do BB, ao passo que havia que contar com um procedimento de autorização com a duração de seis meses, ou até mesmo de um ano, no caso de venda ao consórcio. Estas informações, fornecidas numa reunião de 31 de janeiro de 2006, foram confirmadas em 2 de março de 2006. Tendo portanto sido informado de que o desfecho do procedimento de autorização era totalmente aberto, o Land Burgenland «partiu do princípio de que a FMA não autorizaria e não poderia provavelmente autorizar a aquisição do banco pelo consórcio», razão pela qual decidiu ceder o BB à GRAWE.

123    Ora, como a Comissão salientou no considerando 127 da decisão impugnada, ao referir, de forma informal, que o desfecho do procedimento de autorização era aberto, a FMA não antecipou qualquer juízo acerca do caráter negativo ou não desse desfecho. A Comissão não se equivocou sobre o sentido das informações fornecidas pelas autoridades austríacas.

124    No que se refere, em terceiro lugar, à tomada em consideração da duração provável do procedimento de autorização na FMA, importa, a título preliminar, recordar que a Comissão considerou que a duração provavelmente mais longa do procedimento na FMA não era suscetível de constituir um obstáculo à venda do BB ao consórcio.

125    A este respeito, a Comissão fundamentou a sua posição nos termos seguintes (v. considerando 130 da decisão impugnada):

«A duração do processo da FMA (menos de três meses para GRAWE, mas até um ano para o consórcio) também não basta por si só para excluir o consórcio enquanto adquirente. A Áustria adiantou que o BB sofreu de uma incerteza contínua, que poderia ter colocado o banco em dificuldades. A Comissão não pode aceitar este argumento, seja de um ponto de vista teórica ou no que respeita ao caso presente. Em teoria, isso equivaleria a uma discriminação contra todos os proponentes exteriores à União Europeia e potencialmente também dos outros Estados‑Membros, dado que o mesmo argumento se poderia aplicar a qualquer proponente de que nesse momento a FMA não tivesse conhecimento, ou seja, a qualquer empresa não austríaca. No que respeita ao caso vertente, a Comissão constata que o BB não se encontrava em dificuldade no momento da cessão. Uma vez que a cessão era pretendida já desde 2003, a razão pela qual era importante atuar rapidamente não é suficientemente manifesta. Do mesmo modo, o argumento apresentado neste contexto, segundo o qual a proposta de GRAWE era limitada no tempo, não pode ser acolhido, pois, caso contrário, isso abriria a porta a inúmeras possibilidades de influenciar de forma discriminatória o processo de concurso.»

126    Há que observar que a Comissão aderiu à avaliação das autoridades austríacas, segundo a qual, em caso de aquisição de BB pelo consórcio, era necessário prever um procedimento de autorização com duração que pode ir até um ano (mesmo que uma duração de seis meses que lhe parecesse mais provável), ao passo que, em caso de aquisição do BB pela GRAWE, essa duração foi de três meses (v. considerando 130 da decisão impugnada).

127    Em contrapartida, a Comissão recusou‑se a considerar que essa circunstância era suscetível de excluir o consórcio, por duas razões: a primeira, de natureza teórica, relativa ao risco de consagrar uma discriminação contra todos os proponentes não austríacos; a segunda, ligada ao caso vertente, relativa à conclusão de que o BB não se encontrava em dificuldade no momento da cessão e que não havia, portanto, nenhuma urgência especial em ceder o BB à GRAWE.

128    Ora, como os recorrentes sublinharam, o primeiro motivo de exclusão da tomada em conta da duração do procedimento de autorização na FMA, a saber, o risco de criar uma discriminação relativamente a proponentes estabelecidos noutros países, omite a distinção fundamental que deve ser feita, no âmbito da determinação da existência de uma vantagem na aceção do artigo 87.°, n.° 1, CE, entre as obrigações que o Estado deve assumir enquanto empresa que exerce uma atividade económica e as obrigações que lhe podem incumbir enquanto poder público (v., neste sentido, acórdão Ryanair/Comissão, n.° 50 supra, n.° 84).

129    No caso vertente, se o Estado atuar na qualidade de operador privado em economia de mercado no âmbito da decisão de vender a BB, opera no âmbito das suas prerrogativas de poder público, quando atua na qualidade de autoridade encarregada da avaliação prudente das aquisições e dos aumentos de participação nas entidades do setor financeiro. O Land Burgenland também não pode ser censurado pelo facto de a FMA ter indicado que, no que respeita à GRAWE, que era já conhecida dessa autoridade, uma decisão de autorização podia ser tomada dentro de algumas semanas, ao passo que, no que respeita ao consórcio, que era desconhecido da FMA — o que implicava uma investigação mais aprofundada —, o procedimento de autorização, com vista à privatização do BB levaria provavelmente vários meses.

130    Por conseguinte, foi erradamente que a Comissão invocou, em apoio da sua recusa de considerar que a duração provavelmente mais longa do procedimento de autorização na FMA em caso de venda do BB ao consórcio poderia obstar a essa venda, a existência de um risco de desigualdade de tratamento dos proponentes. Há efetivamente contradição entre, por um lado, o facto de examinar a atitude do Land Burgenland tendo em conta o critério do operador privado em economia de mercado e, por outro, a de lhe opor o risco de uma violação do princípio da não discriminação em razão da diferença de duração do procedimento de autorização em caso de cessão do BB à GRAWE e em caso de cessão ao consórcio.

131    Este erro no entanto só é suscetível de invalidar a decisão impugnada nos casos em que a Comissão não adiantou nenhum outro motivo válido em apoio da sua posição. Com efeito, segundo jurisprudência consolidada, um motivo errado não pode justificar a anulação do ato se existirem outros motivos que sejam suficientes para o justificar (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de abril de 2011, Grécia/Comissão, C‑321/09 P, não publicado na Coletânea, n.° 61 e jurisprudência referida).

132    Ora, quanto ao segundo fundamento invocado pela Comissão neste contexto, relativo ao caso em apreço e segundo o qual não havia especial urgência que justificasse ceder o BB à GRAWE e não ao consórcio, o mesmo não pode suscitar qualquer crítica. É certo que resulta da exposição dos factos que as diligências efetuadas pelo Land Burgenland tendo em vista uma venda do BB datavam de 2003 e que, como defendem os recorrentes, é precisamente devido ao facto de o processo de privatização do BB ter sido particularmente longo e dispendioso que o Land Burgenland não queria perder uma ocasião suplementar de ceder a BB. Do mesmo modo, não se pode excluir que, atendendo às dúvidas que tinha quanto ao desfecho do procedimento de autorização na FMA, o Land Burgenland tenha preferido ceder o BB à GRAWE, cuja proposta era de duração limitada. No entanto, era ainda necessário que o Land Burgenland apresentasse elementos concretos para provar que a duração do processo na FMA em caso de cessão do BB ao consórcio teria comprometido fortemente as possibilidades de privatização, prova essa que precisamente não foi apresentada.

133    Decorre destas considerações que foi sem cometer nenhum erro manifesto de apreciação que a Comissão concluiu que nem o desfecho incerto da duração provavelmente mais longa do procedimento na FMA — caso tivesse sido decidido ceder o BB ao consórcio — não justificou que o consórcio fosse excluído enquanto adquirente.

134    No que respeita, em quarto lugar, à argumentação dos recorrentes de que a Comissão tinha demonstrado excessiva severidade no que diz respeito à aplicação do critério do investidor privado em economia de mercado, ao exigir, no caso em apreço, que devia ser «evidente que a cessão ao que mais oferecesse não era realizável» (v. considerando 120 da decisão), também não pode ser acolhida.

135    Com efeito, de uma leitura de conjunto da secção dos fundamentos da decisão impugnada relativa à segurança da transação ressalta claramente que a formulação utilizada resulta de um abuso da linguagem, uma vez que a Comissão teve o cuidado de examinar atentamente os argumentos que as autoridades austríacas tinham apresentado para demonstrar o caráter incerto e a duração provável do procedimento de autorização na FMA. Assim, a Comissão admitiu claramente que era «incontestável que um vendedor que opera numa economia de mercado não se decidiria a favor de um adquirente que, com toda a probabilidade, não obteria, a autorização necessária da FMA (ou de qualquer outra autoridade que participasse no processo)» (considerando 125 da decisão impugnada).

136    Assim, a Comissão não negou ao Land Burgenland uma «margem de previsão» no caso vertente. Ela concluiu simplesmente que nada provava nem indicava que a FMA proibiu a cessão ao consórcio (v. considerando 133 da decisão impugnada).

137    Além disso, os recorrentes não demonstraram de que modo chegaram à conclusão de que havia uma probabilidade de 50% de que a venda do BB ao consórcio não fosse realizada (e a contrario de 50% de que o fosse).

138    Por último, no que diz respeitoà obrigação de fundamentação relativa à tomada em consideração do procedimento de autorização na FMA, importa recordar que, segundo jurisprudência assente, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de modo claro e inequívoco, o raciocínio da instituição, autora do ato, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida tomada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o ato diga direta ou individualmente respeito possam ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato preenche as exigências do artigo 230.° CE deve ser apreciada tendo em conta não só o seu teor mas também o seu contexto e o conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. acórdão Chronopost e La Poste/UFEX e o., já referido no n.° 51 supra, n.° 88 e jurisprudência referida).

139    No caso em apreço, não pode deixar de observar‑se que os recorrentes, tendo em conta os argumentos circunstanciados expostos nos considerandos 131 a 133 da decisão impugnada, estava em condições de entender o raciocínio que levou a Comissão a concluir que um vendedor que opera numa economia de mercado não teria excluído que o consórcio fosse o adquirente do BB com base nas consequências do procedimento de autorização na FMA. Além disso, como resulta do exame do presente fundamento, o Tribunal Geral, tendo em conta essas mesmas conclusões, tem possibilidade de exercer a sua fiscalização sobre este raciocínio.

140    Atendendo às considerações precedentes, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, na medida em que o Land Burgenland tinha o direito de ter em conta os riscos financeiros ligados à Ausfallhaftung

 Argumentos das partes

141    As recorrentes consideram que, contrariamente ao que afirma a Comissão, um vendedor privado teria necessariamente em conta os riscos decorrentes da Ausfallhaftung. A distinção que a Comissão fez entre os vendedores públicos e os vendedores privados é particularmente artificial e formalista, porque não oferece uma imagem realista do comportamento dos operadores económicos no mercado.

142    Em primeiro lugar, alegam que, embora se faça efetivamente referência, nos processos Gröditzer Stahlwerke (acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de janeiro de 2003, Alemanha/Comissão, C‑334/99, Colet., p. I‑1139, n.os 136 e segs.), Stardust Marine (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, Colet., p. I‑4397) e BP Chemicals (acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 1998, BP Chemicals/Comissão, T‑11/95, Colet., p. II‑3235), à questão de saber se o Estado tinha contraído obrigações enquanto acionista ou enquanto poder público, os factos em causa nesses processos são claramente distintos dos referidos no presente caso.

143    No presente caso, o Land Burgenland não interveio junto do BB enquanto poder público e não concedeu a Ausfallhaftung no âmbito das suas prerrogativas de poder público. os recorrentes sublinham, em particular, que esta garantia assenta numa disposição do direito privado austríaco, a saber, o § 1356 da Allgemeines Bürgerliches Gesetzbuch relativo à Ausfallbürgschaft (caução, em caso de não pagamento. A Ausfallhaftung corresponde a uma «declaração de patronato de direito civil», diferente das garantias estatais que foram concedidas pelos Länder alemães (Anstaltslast e Gewährträgerhaftung), através da qual o Land Burgenland melhora a situação económica do banco e que não é mais do que o reflexo dos interesses do Land enquanto proprietário. Esta análise corresponde, de resto, à jurisprudência do Oberste Gerichtshof (Tribunal Supremo, Áustria), que, num acórdão de 4 de abril de 2006, declarou que «o Ausfallhaftung preenche a função de substituição de fundos próprios» e «constitui, devido a esse facto, um instrumento de financiamento dos fundos próprios». O facto de o Land Burgenland se ter comprometido a título da Ausfallhaftung no âmbito de uma lei resulta da necessidade de oferecer publicidade suficiente à autorização em causa.

144    Em segundo lugar, os recorrentes afirmam que a Comissão reconheceu que a Ausfallhaftung concedida a favor dos bancos austríacos era um auxílio de Estado existente e, portanto, legal até ao termo do prazo de transição. Os seus efeitos deveriam ter sido tidos em conta no âmbito da apreciação da medida de privatização controvertida. A abordagem da Comissão a este respeito é contraditória e compromete as possibilidades de um Land privatizar um banco quando este não puder minimizar, ao mesmo tempo, o risco de dever intervir a título da Ausfallhaftung.

145    Em terceiro lugar, os recorrentes consideram que a Comissão não expôs de forma coerente na decisão impugnada o facto de não te tomado em consideração a Ausfallhaftung. A Comissão não pode recusar‑se a apreciar as consequências da Ausfallhaftung na fase do exame da decisão de ceder o BB à GRAWE e ao mesmo tempo ter em conta o montante que deve ser pago a título dessa garantia no cálculo do elemento de auxílio (v. considerando 170 da decisão impugnada).

146    Em quarto lugar, os recorrentes consideram que a interpretação da Comissão constitui um entrave à privatização e que está em contradição com a decisão de 2004, a qual tinha subordinado a concessão de ajudas à restruturação à privatização do BB.

147    Em quinto e último lugar, os recorrentes sublinham que o Land Burgenland reduziu fortemente os efeitos de distorção da concorrência da Ausfallhaftung ao tomar a decisão de vender o BB à GRAWE, ou seja, uma empresa que beneficia de uma notação sólida e que apresenta um perfil de risco mínimo. Por outro lado, o Land Burgenland pretendeu inscrever a sua ação no âmbito das medidas úteis que tinham sido acordadas no que respeita aos auxílios à restruturação previstas pela decisão de 2004.

148    A Comissão contesta todos estes argumentos.

 Apreciação do Tribunal Geral

149    A Comissão descreveu, na decisão impugnada (v., em especial, nota de pé de página n.° 9, no considerando 21), a Ausfallhaftung como um regime de garantia legal, que comporta a obrigação de as autoridades estatais, nomeadamente regionais, intervir em caso de insolvabilidade ou de liquidação do estabelecimento de crédito em causa. Em conformidade com essa garantia, os credores dos estabelecimentos de crédito podem exercer um direito direto face à autoridade pública responsável na hipótese de o estabelecimento de crédito se encontrar numa situação de liquidação ou de insolvabilidade e de os ativos do referido estabelecimento não serem suficientes para os satisfazer. Esta descrição da Ausfallhaftung não foi formalmente contestada pelas recorrentes.

150    Resulta da proposta de medidas úteis da Comissão, relativas à Ausfallhaftung que a República da Áustria se comprometeu a suprimir esta garantia no termo de um período transitório. Concretamente e como resulta do n.° 3 do presente acórdão, as obrigações existentes à data de 2 de abril de 2003 são abrangidas pela Ausfallhaftung até à data do seu vencimento. Durante o período transitório, que se prolongava até 1 de abril de 2007, a menos que os estabelecimentos financeiros visados fossem privatizados numa data anterior, a Ausfallhaftung foi mantida para as novas obrigações cuja data de vencimento se situe antes de 30 de setembro de 2017.

151    Daí resulta que, mesmo o BB fosse privatizada, o Land Burgenland deveria continuar a ser garante desta relativamente, por um lado, às obrigações subscritas antes de 2 de abril de 2003 (e independentemente da data de vencimento dessas obrigações) e, por outro lado, às obrigações assumidas durante o período transitório (que expira na data da privatização) cujo vencimento se verifique antes de 30 de setembro de 2017.

152    É nesta perspetiva que os recorrentes sustentam que a Comissão devia necessariamente ter tido em conta, na sua apreciação das propostas de compra, a Ausfallhaftung, que, no momento da venda, cobria quase 3,1 mil milhões de euros do passivo do BB. O Land Burgenland, podendo ter de se constituir garante dos prejuízos que o BB viesse a sofrer mesmo após a sua privatização, estava no direito de se assegurar de que o adquirente apresentava garantias de seriedade e de solvabilidade suficientes, que iam além da sua simples capacidade de pagar o preço de compra, a fim de impedir qualquer risco de liquidação ou de recuperação do BB. Em definitivo, as autoridades austríacas sustentaram que a cessão do banco à GRAWE a um preço claramente inferior ao proposto pelo consórcio era totalmente justificada por um menor risco de ter de cumprir a obrigação de garantia por força da Ausfallhaftung.

153    Ora, na opinião da Comissão, a Ausfallhaftung, que tinha anteriormente sido qualificada de auxílio existente, não podia ser tomada em consideração quando se trata, como no caso vertente, de examinar uma transação feita à luz do princípio do operador privado em economia de mercado. A razão evocada reside no facto de que, por definição, esta garantia, que foi qualificada de auxílio, não é daquelas que concederia um vendedor privado. Assim, a Comissão rejeitou, na decisão impugnada, a tomada em conta da Ausfallhaftung nos termos seguintes:

«(135) A Comissão considera que o Land de Burgenland não deveria ter em conta a Ausfallhaftung. Se esta fosse tomada em consideração, como indicado na decisão de abertura, o papel do Burgenland enquanto doador de auxílios de Estado e, na qualidade de vendedor do banco, seriam confundidos.

[…]

(137) [...] O ponto de vista da Áustria não é alicerçado por nenhum precedente, segundo o qual um investidor que atua numa economia de mercado teria em conta uma garantia considerada um auxílio estatal: por hipótese, nenhum investidor que opera numa economia de mercado teria aceite uma garantia que não respeitou o princípio do investidor que opera numa economia de mercado, e a decisão sobre a supressão da Ausfallhaftung confirma que a Ausfallhaftung não faz parte das condições do mercado. O Tribunal de Justiça decidiu que as garantias classificadas como auxílios ilegais não devem ser tomadas em consideração no cálculo do custo da liquidação a prever. Isto não significa, todavia, inversamente que um auxílio existente possa ser tido em consideração. A Comissão considera que o facto de se tratar de um auxílio ilegal ou existente não é pertinente. Enquanto a medida for de classificar entre os auxílios de Estado, nenhum vendedor que opere numa economia de mercado a ela teria direito e não teria, portanto, em conta essa medida.»

154    Esta tomada de posição da Comissão deve ser aprovada.

155    Com efeito, resulta da jurisprudência que, na aplicação do critério do investidor privado, há que fazer uma distinção entre as obrigações que o Estado deve assumir enquanto proprietário acionista de uma sociedade e as obrigações que lhe podem incumbir enquanto poder público (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de setembro de 1994, Espanha/Comissão, C‑278/92 a C‑280/92, Colet., p. I‑4103, n.° 22).

156    Assim, no processo que deu origem ao acórdão de 28 de janeiro de 2003, Alemanha/Comissão, referido no n.° 142, supra (n.os 133 a 141), o Tribunal de Justiça excluiu que diversos empréstimos e garantias, que um investidor privado jamais teria concedido nas mesmas condições e que deviam ser qualificadas de auxílios de Estado ilegais, possam ser tomados em consideração no âmbito do exame da questão de saber se a liquidação da Gröditzer Stahlwerke era mais onerosa do que a sua privatização a preços negativos.

157    É erradamente que os recorrentes sustentam que este processo não é pertinente por dizer respeito a um auxílio de Estado ilegal e não a um auxílio existente. Com efeito, o que é determinante no âmbito da aplicação do critério do operador privado é saber se as medidas em causa são aquelas que um operador privado em economia de mercado, que espera realizar lucros a prazo mais ou menos longo, teria podido conceder. Assim, independentemente da qualificação dos compromissos controvertidos que poderia ter sido acolhida, a questão fundamental que se coloca é a de saber se os referidos compromissos são os que poderiam ter sido subscritos por um operador privado em economia de mercado.

158    Por conseguinte, mesmo admitindo, sem ter em conta o caráter obrigatório da decisão C (2003) final 1329, que seja permitido às autoridades austríacas de contestar, no quadro do presente processo, a qualificação de auxílio de Estado da Ausfallhaftung que foi dada nessa mesma decisão, há que concluir que, atendendo às características acima descritas do regime instituído pela Ausfallhaftung, esta não foi subscrita nas condições normais do mercado, e não pode, portanto, ser tomada em consideração para a apreciação do comportamento das referidas autoridades à luz do critério do investidor privado em economia de mercado.

159    Atendendo a todas estas considerações, não se pode censurar à Comissão o facto de ter afastado a tomada em consideração da Ausfallhaftung no âmbito da avaliação das propostas apresentadas, respetivamente, pelo consórcio e pela GRAWE para efeitos da aquisição do BB.

160    Daí resulta que o quarto fundamento deve ser afastado.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo à aplicação errada do princípio do vendedor privado em economia de mercado no âmbito do exame subsidiário dos riscos ligados à Ausfallhaftung

161    Com o presente fundamento, os recorrentes alegam, em substância, que o exame, a título subsidiário, dos riscos financeiros que o Land Burgenland correu se tivesse sido decidido vender o BB ao consórcio é errado. Salientam, nomeadamente, que a apreciação da amplitude das perdas de liquidez consecutivas à execução da Ausfallhaftung se baseia em hipóteses erradas e está insuficientemente fundamentada. Por outro lado, foi erradamente que a Comissão não teve em conta, no cenário de liquidação do BB, por uma auditoria independente, na qual o Land Burgenland só podia confiar.

162    Importa recordar que a Comissão, a título exaustivo, examinou os argumentos das recorrentes em conjugação com a tomada em consideração da Ausfallhaftung (v. considerandos 144 a 157 da decisão impugnada). No termo deste exame, a Comissão chegou à conclusão de que a proposta de GRAWE, apesar do ponto de vista da República da Áustria ser seguido e de a Ausfallhaftung tomada em consideração, não constituía a melhor proposta.

163    Ora, uma vez que há que confirmar a argumentação principal exposta pela Comissão, a saber, a que leva a concluir que a Ausfallhaftung não podia ser tida em conta na avaliação das propostas de compra do BB (v. quarto fundamento), não há que apreciar o mérito do presente fundamento, que é unicamente dirigido contra a argumentação apresentada a título subsidiário e que, por definição, não é suscetível de pôr em causa a solução definitivamente acolhida pela Comissão. Com efeito, segundo jurisprudência consolidada, um fundamento errado não pode justificar a anulação do ato que está viciado se revestir caráter exaustivo e existirem outros motivos que sejam suficientes para o justificar (v. acórdão Grécia/Comissão, já referido no n.° 131 supra, n.° 61 e jurisprudência referida).

164    O presente fundamento deve, por conseguinte, ser declarado inoperante.

 Quanto ao oitavo fundamento, relativo a uma apreciação errada da emissão de títulos no quadro da Ausfallhaftung

 Argumentos das partes

165    As recorrentes sustentam que foi sem razão que a Comissão concluiu que, devido à emissão, na véspera do encerramento da venda, de títulos de empréstimos adicionais no montante de 380 milhões de euros a favor da GRAWE, esta última beneficiou de uma vantagem. A Comissão ignorou nomeadamente que, como resulta de vários testemunhos e do calendário das emissões de títulos comunicado pelas autoridades austríacas, as novas emissões de títulos foram anunciadas às duas proponentes e que estas beneficiaram dessas emissões na mesma medida. Além disso, a Comissão não comparou a vantagem respetiva que os dois proponentes poderiam retirar das emissões dos novos títulos, atendendo ao perfil de risco e à sua classificação diferente. Alegam designadamente que, dado que a GRAWE dispunha de uma muito boa notação, a vantagem ligada à Ausfallhaftung foi, no que lhes diz respeito, muito reduzida. O consórcio, por seu lado, beneficiou dela massivamente, o que compensou em larga medida o preço de compra. A Comissão não teve de modo nenhum essa vantagem em conta, quando da comparação das duas propostas de preços de compra, o que constitui um erro manifesto no âmbito da determinação dos factos.

166    Além disso, os recorrentes consideram que, mesmo que se admita que a emissão de títulos de empréstimos adicionais no montante de 380 milhões de euros apenas foi prometida à GRAWE, a vantagem que daí resultou para esta última é diminuta, tendo em conta o seu excelente perfil de risco.

167    A Comissão contesta todas estas objeções.

 Apreciação do Tribunal Geral

168    Importa recordar que a Comissão concluiu, no considerando 171 da decisão impugnada, o seguinte:

«A emissão de títulos suplementares de um montante de 380 milhões de euros no âmbito da garantia do Estado não foi mencionada na process letter nem no projeto de contrato com a GRAWE. A Comissão considera que este acordo teve um papel considerável no processo de venda e deveria constar do projeto de contrato com o consórcio. Além disso, o consórcio confirmou que a emissão de títulos suplementares não tinha sido tomada em consideração na sua proposta. A Comissão entende que a vantagem GRAWE, devido à sua melhor situação de refinanciamento resultante da disponibilização de 380 milhões de euros adicionais, requer, portanto, um ajustamento, sob a forma de um aumento da diferença entre a proposta do consórcio e o preço de aquisição real. O cálculo assenta nos juros que o BB paga para os títulos suplementares de um montante de 380 milhões de euros, em comparação com os custos de refinanciamento do BB após o encerramento.»

169    São essas conclusões que são visadas pelas recorrentes no âmbito do presente fundamento. Alegam, em substância, que o ajustamento no sentido da majoração do valor total da vantagem recebida pela GRAWE devido à emissão de títulos adicionais no montante de 380 milhões de euros omite o facto de essa emissão de títulos também ter igualmente beneficiado ao consórcio.

170    Ora, se, como resulta dos considerandos 148 e 171 da decisão impugnada, a Comissão não se recusou a integrar essa emissão de títulos suplementares no cenário de liquidação, examinado a título subsidiário, proposto pelas autoridades austríacas em caso de cessão ao consórcio, limitou‑se, na avaliação do valor da vantagem concedida a GRAWE, a indicar que, concretamente, a proposta apresentada pelo consórcio não tinha em conta a emissão de títulos suplementares. Neste contexto, a Comissão teve em conta o facto de que, por um lado, a emissão de títulos suplementares de um valor de 380 milhões de euros não foi mencionado nem na carta de processo nem no projeto de contrato com o consórcio e, por outro, que este último confirmou que não teve efetivamente em consideração essa emissão.

171    A argumentação dos recorrentes segundo a qual, mesmo supondo que a emissão de títulos suplementares apenas tivesse sido proposta à GRAWE, esta não beneficiou de qualquer vantagem adicional, atendendo à sua notação financeira mais elevada e ao seu perfil de risco mais favorável do que os que beneficiaria o consórcio, não assenta em nenhuma explicação convincente e deve, só por isso, ser julgada improcedente.

172    Mesmo admitindo que as recorrentes pretendem, na realidade, fazer referência, no presente fundamento, aos riscos financeiros que corre o Land Burgenland a título da Ausfallhaftung, há que recordar que, como resulta do exame do quarto fundamento (v. n.° 158, supra), essa garantia não é um elemento que deve ser tido em consideração na qualificação da medida controvertida à luz do critério do investidor privado em economia de mercado. Além disso e como a Comissão sublinhou, não era importante, no quadro da avaliação do montante do auxílio, determinar qual teria sido a vantagem hipotética de que o BB teria aproveitado no caso de ter sido adquirida pelo consórcio, mas sim saber qual era a vantagem que foi concretamente e objetivamente concedida à GRAWE.

173    Por conseguinte, há que afastar o oitavo fundamento.

 Quanto ao nono fundamento, baseado numa aplicação errada, sob vários aspetos, do artigo 87.°, n.° 1, CE, no que respeita à determinação do elemento de auxílio

 Argumentos das partes

174    As recorrentes acusam a Comissão o facto de ter concluído pela existência de um auxílio de Estado sem demonstrar com certeza que a GRAWE tinha sido beneficiada. Isso constitui uma aplicação errada do artigo 87.°, n.° 1, CE, uma vez que a Comissão não faz uma distinção suficiente entre a existência de um auxílio e a importância do elemento de auxílio. Acusam igualmente a Comissão de não ter tido em conta, no considerando 156 da decisão impugnada, o risco de não pagamento do prémio pelo consórcio para efeitos de comparar a sua proposta com a da GRAWE, o que constitui um erro manifesto na determinação dos factos. Por último, os recorrentes acusam a Comissão de, no considerando 174, segunda frase, da decisão impugnada, ter exigido a tomada em consideração da vantagem que podia ser retirada do reporte fiscal dos prejuízos, sendo certo que as vantagens fiscais da transação para o consórcio não foram examinadas.

175    A Comissão contesta a procedência dos argumentos dos recorrentes.

 Apreciação do Tribunal Geral

176    Com a sua argumentação, os recorrentes acusam a Comissão de ter concluído pela existência de uma vantagem sem sequer se assegurar de que os ajustamentos evocados nos considerandos 167 a 174 da decisão impugnada, que visam ter em conta as diferenças entre as duas propostas apresentadas e da vantagem suplementar que GRAWE retirou da emissão de títulos suplementares de cerca de 380 milhões de euros, levam a concluir pela existência de um auxílio negativo.

177    Ora, se está excluído o raciocínio subsidiário exposto relativamente ao cenário de liquidação e se se tiver em conta o facto de que foi sem cometer nenhum erro manifesto de apreciação que a Comissão considerou que apenas devia ser tido em conta a vantagem suplementar que a GRAWE tinha extraído da emissão complementar de títulos no montante de 380 milhões de euros (v. n.os 168 a 171 supra), os recorrentes não lograram demonstrar que os referidos ajustamentos conduziriam a neutralizar o benefício financeiro que GRAWE obteve através da privatização do BB.

178    Com efeito, o montante de partida do auxílio a recuperar resulta em princípio da tributação de 54,7 milhões de euros entre a proposta de preços do consórcio e o preço de compra efetivamente pago pela GRAWE, montante que deve ser ajustado em função das diferenças dos parâmetros que respetivamente a GRAWE e o consórcio tiveram concretamente em conta na apresentação das suas propostas de aquisição do BB. Todavia, a decisão impugnada prevê apenas dois tipos de ajustamentos no sentido da redução, a saber, o de um montante de 2,1 milhões de euros, que resulta da diferença no montante da penalização de reembolso antecipado (v. considerando 168 da decisão impugnada) e aquele, de montante a definir, que corresponde à transferência para o Land Burgenland de quatro sociedades imobiliárias (v. considerandos 18 e 172 da decisão impugnada).

179    Em conclusão, o nono fundamento é improcedente e deve ser afastado.

180    Resulta do exposto que os presentes recursos devem ser julgados improcedentes.

 Quanto às despesas

181    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a República da Áustria e o Land Burgenland sido vencidos, há que condená‑los nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      É negado provimento aos recursos.

2)      A República da Áustria e o Land Burgenland são condenados nas despesas.

Jaeger

Wahl

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de fevereiro de 2012.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.