Language of document : ECLI:EU:C:2014:2394

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 20 de novembro de 2014 (1)

Processo C‑507/13

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte

contra

Parlamento Europeu

e

Conselho da União Europeia

«Supervisão das instituições de crédito e das empresas de investimento – Recurso de anulação – Diretiva 2013/36/UE – Artigo 94.°, n.° 1, alínea g) e n.° 2, e artigo 162.°, n.os 1 e 3 – Fixação de rácios entre as componentes fixa e variável da remuneração paga aos trabalhadores de instituições de crédito e de empresas de investimento cuja atividade profissional tenha um impacto significativo no perfil de risco da instituição – Regulamento n.° 575/2013 – Artigo 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), e 521.°, n.° 2 – Divulgação de certas informações respeitantes à remuneração – Escolha da base jurídica – Princípios da proporcionalidade, da subsidiariedade e da segurança jurídica – Ultra vires – Proteção dos dados pessoais – Direito internacional consuetudinário – Efeito extraterritorial do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva 2013/36/UE»





I –    Introdução

1.        No presente processo, o Reino Unido pede a anulação de algumas disposições de determinados atos legislativos do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia, ao abrigo do artigo 263.° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (a seguir «TFUE»). O recurso de anulação tem por objeto o «Pacote CRD IV», que entrou em vigor em 17 de julho de 2013. O pacote consiste numa nova Diretiva Requisitos de Capital, a Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (2) (a seguir «Diretiva CRD IV»), e num novo Regulamento Requisitos de Capital, o Regulamento (UE) n.° 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.° 648/2012 (3) (a seguir «Regulamento CR»).

2.        O Reino Unido impugna os artigos 94.°, n.° 1, alínea g) e n.° 2, e 162.°, n.os 1 e 3, da Diretiva CRD IV e os artigos 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), e 521.°, n.° 2, do Regulamento CR.

3.        No essencial, o Reino Unido contesta a Diretiva CRD IV na medida em que contém, no artigo 94.°, n.° 1, alínea g), disposições que indexam à remuneração fixa a remuneração variável de certas pessoas cuja atividade profissional tem um impacto significativo no perfil de risco das instituições de crédito e empresas de investimento (4) (a seguir «instituições financeiras») para as quais trabalham. Na minha opinião, para resolver as questões jurídicas em apreço, este sistema deveria ser descrito como «rácio fixo máximo para a remuneração variável» e não como «limitação dos bónus dos banqueiros» (5). Como demonstrarei na análise que se segue, este aspeto é crucial para apreciar a legalidade do rácio (expresso em percentagem) que é o objeto principal da impugnação do Reino Unido.

4.        O artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea i), da Diretiva CRD IV dispõe que a componente variável da remuneração não pode exceder 100% da componente fixa da remuneração total para cada indivíduo, e estabelece mais algumas regras, nomeadamente uma opção que permite aos Estados‑Membros autorizar os acionistas a aumentar o rácio até ao limite máximo de 200%, sob certas condições, e a autorização dos Estados‑Membros para estabelecerem uma percentagem máxima mais baixa [artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea ii), da Diretiva CRD IV].

5.        No que respeita ao Regulamento CR, o Reino Unido impugna o seu artigo 450.°, n.° 1, alíneas d) e i), que prevê, respetivamente, a divulgação obrigatória pelas instituições financeiras dos rácios entre remunerações fixas e variáveis estabelecidos em conformidade com o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV e o número de indivíduos com remuneração igual ou superior a determinado limite. O Reino Unido impugna ainda a validade do artigo 450.°, n.° 1, alínea j), que impõe às instituições financeiras a obrigação de divulgarem, a pedido do Estado‑Membro ou da autoridade competente, informações sobre a remuneração total de cada um dos membros do órgão de administração ou da direção de topo.

6.        O recurso do Reino Unido assenta em seis fundamentos. Segundo o primeiro fundamento, a base jurídica de cada uma das medidas impugnadas, com exceção do artigo 162.°, n.os 1 e 3, da Diretiva CRD IV e do artigo 521.°, n.° 2, do Regulamento CR, é incorreta. Com o segundo fundamento contesta a validade do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV e do artigo 450.°, n.° 1, alíneas i) e j), do Regulamento CR à luz do princípio da proporcionalidade e/ou da subsidiariedade, ao passo que o terceiro fundamento se baseia no princípio da segurança jurídica e respeita exclusivamente à impugnação do artigo 162.°, n.° 3, da Diretiva CRD IV. Nos termos do quarto fundamento, alega que a atribuição de poderes à Autoridade Bancária Europeia (a seguir «EBA») ao abrigo do artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV é ultra vires. No quinto fundamento, o Reino Unido sustenta que o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR viola o direito à privacidade e os princípios jurídicos que regulam a proteção de dados pessoais. Segundo o sexto fundamento, na medida em que o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV deve ser aplicado a trabalhadores de instituições financeiras fora do EEE, viola o princípio do direito internacional consuetudinário que proíbe a extraterritorialidade.

7.        O Parlamento Europeu e o Conselho, apoiados pela Comissão na qualidade de interveniente, contestam veementemente todos os fundamentos supramencionados.

8.        Os argumentos apresentados pelo Reino Unido têm vários graus de importância, sendo certo que o primeiro deles expõe as razões mais convincentes para questionar a validade das medidas impugnadas. Por este motivo, abordarei primeiro os cinco fundamentos menos relevantes, começando pelo sexto e terminando no segundo, e deixarei o primeiro fundamento para o fim.

II – Processo no Tribunal de Justiça

9.        Por petição que apresentada no Tribunal de Justiça em 20 de setembro de 2013, o Reino Unido interpôs um recurso contra o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia ao abrigo do artigo 263.° TFUE, pedindo ao Tribunal de Justiça que anule os artigos 94.°, n.° 1, alínea g) e n.° 2, e 162.°, n.os 1 e 3, da Diretiva CRD IV, e os artigos 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), e 521.°, n.° 2, do Regulamento CR, e condene os recorridos nas despesas.

10.      Nas suas contestações, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia alegam que o Tribunal de Justiça deve negar provimento ao recurso na sua totalidade quanto ao mérito e condenar o Reino Unido nas despesas. O Reino Unido apresentou réplica para responder às instituições recorridas, que, por sua vez, apresentaram tréplicas.

11.      A Comissão Europeia interveio em apoio do Parlamento e do Conselho. O Reino Unido apresentou observações sobre o articulado de intervenção da Comissão.

12.      O Reino Unido, o Parlamento, o Conselho e a Comissão participaram na audiência que teve lugar em 8 de setembro de 2014.

III – Observações preliminares

A –    Antecedentes da Diretiva CRD IV e do Regulamento CR

13.      A crise financeira mundial, associada ao colapso do banco de investimento Lehman Brothers em setembro de 2008, revelou as fragilidades do regime jurídico da UE aplicável às instituições financeiras. Para restabelecer a estabilidade financeira, a União Europeia e os seus Estados‑Membros adotaram um vasto leque de medidas inéditas para responder a necessidades a curto prazo e, a desenvolvimentos a longo prazo. Entre as medidas adotadas a curto prazo conta‑se a aprovação de auxílios às instituições financeiras de montante superior a 5 000 mil milhões de euros até outubro de 2012 (6). A longo prazo, foi igualmente realizada uma reforma do quadro regulamentar das instituições financeiras. Esta reforma visava implementar um quadro abrangente e sensível ao risco relativamente aos requisitos de capital aplicáveis às instituições financeiras, bem como promover a eficácia da sua gestão do risco.

14.      Antes desta reforma, o denominado «pacote CRD I» de 2006 consistiu na reformulação da Diretiva 2000/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de março de 2000, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (7) e da Diretiva 93/6/CEE do Conselho, de 15 de março de 1993, relativa à adequação dos fundos próprios das empresas de investimento e das instituições de crédito (8). Essa reformulação foi concretizada através da adoção da Diretiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (reformulação) (9) e da Diretiva 2006/49/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa à adequação dos fundos próprios das empresas de investimento e das instituições de crédito (reformulação) (10).

15.      Contudo, durante os primeiros anos da crise financeira, foram introduzidas duas importantes alterações ao pacote CRD I. Em primeiro lugar, em 2009, foi adotada uma nova diretiva (conhecida como «Diretiva CRD II») (11), para melhorar a gestão de grandes riscos, a qualidade dos fundos próprios dos bancos, a gestão do risco de liquidez e gestão do risco em relação a produtos titularizados. Eram estes os domínios que o legislador da UE considerava relevantes para as causas da crise. Em 2010, a União adotou uma outra diretiva, denominada «Diretiva CRD III» (12), com vista a reforçar as regras sobre os fundos dos bancos e as remunerações no setor bancário. Estas duas medidas foram aprovadas com base no artigo 53.° TFUE.

16.      A Diretiva CRD III, adotou princípios em matéria de remuneração para ajustar os incentivos com o interesse a longo prazo das instituições financeiras (13). A necessidade destas medidas foi explicada no considerando 4 da Diretiva CRD III por referência à premissa de que «a assunção excessiva e imprudente de riscos pode comprometer a solidez das instituições de crédito ou das empresas de investimento e destabilizar o sistema bancário».

17.      A Diretiva CRD III impunha certos princípios em matéria de políticas de remuneração. Exigia, em especial, o estabelecimento de um justo equilíbrio entre componentes fixas e variáveis da remuneração total, representando a componente fixa uma parte suficientemente elevada da remuneração total por forma a permitir a aplicação de uma política plenamente flexível em matéria de componentes variáveis da remuneração, incluindo a possibilidade de não pagar qualquer componente variável. Contudo, o rácio específico entre a componente fixa e variável da remuneração podia ser determinado pelas próprias instituições financeiras, no quadro estabelecido pelas disposições da Diretiva CRD III sobre remuneração.

18.      Em 2011, a Comissão apresentou novas propostas legislativas tendo em vista implementar normas regulamentares globais desenvolvidas pelo Comité de Supervisão Bancária de Basileia. Estas propostas deram lugar à Diretiva CRD IV adotada ao abrigo do artigo 53.° TFUE, e do Regulamento CR, adotado nos termos do artigo 114.° TFUE. Estas medidas são globalmente designadas por «pacote CRD IV».

19.      A proposta inicial da Comissão continha uma série de disposições relacionadas com a remuneração do responsável pela assunção de riscos significativos, se, em especial, com a componente variável dessa remuneração. Durante a sua preparação, a Comissão publicou um Livro Verde sobre o governo das sociedades nas instituições financeiras e as políticas de remuneração, (14) que deu início a um extenso processo de consulta das partes interessadas. Esta consulta incluía a questão da necessidade de adotar medidas complementares relativas à estrutura e à governança das políticas de remuneração nos serviços financeiros.

20.      No processo legislativo subsequente, o Parlamento Europeu propôs uma série de alterações à proposta da Comissão. Num relatório publicado em 30 de maio de 2012 (15), o Parlamento propôs limitar a componente variável da remuneração a uma vez a componente fixa da remuneração total. Em negociações posteriores, os colegisladores decidiram aumentar a componente variável admissível para o dobro da componente fixa da remuneração total, na condição de esse aumento ser aprovado por um determinado número de acionistas (16).

21.      É a adoção deste rácio fixo máximo para a remuneração variável que o Reino Unido contesta, antes de mais, no presente processo. Assim, o recurso do Reino Unido diz respeito a uma alteração originalmente proposta pelo Parlamento Europeu e que, na sua opinião, fixa o nível de remuneração das pessoas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação (17).

B –    Relação entre a remuneração variável e a gestão do risco das instituições de crédito

22.      Segundo o articulado de intervenção da Comissão, os problemas específicos associados às políticas de remuneração no setor financeiro só se manifestaram depois da crise financeira. A conceção dos planos de remuneração, que incluíam frequentemente o pagamento de bónus de valor extremamente elevado em comparação com as componentes fixas dos salários foi, na opinião da Comissão, um dos principais motores da crise. A Comissão alega que a existência de incentivos inadequados levou os trabalhadores a agravar o risco a curto prazo, uma vez que os trabalhadores beneficiavam desses incentivos participavam nos lucros do banco a curto prazo, mas não suportavam os custos em caso de perdas. Na pior das hipóteses, os prejuízos eram suportados, em última análise, pelos contribuintes. Consequentemente, a assimetria entre os beneficiários de eventuais lucros e os que suportavam eventuais prejuízos poderá ter incentivado a assunção de riscos excessivos nos casos em que os lucros davam lugar ao pagamento de bónus aos trabalhadores que assumiam os riscos. No seu articulado de intervenção, a Comissão refere ainda que, deste modo, a estrutura da remuneração tornou‑se um elemento crucial da agenda legislativa da UE para o período pós‑crise (18).

23.      Parece existir consenso entre o Reino Unido, por um lado, e o Parlamento, o Conselho e a Comissão, por outro, quanto à necessidade de combater uma assunção de riscos excessivos suscetível de destabilizar os mercados financeiros e as instituições financeiras. Aquilo a que o Reino Unido se opõe é à fixação de uma percentagem máxima para o rácio entre a remuneração variável e a remuneração fixa dos responsáveis pela assunção de riscos significativos, que é imposta em medidas da UE juridicamente vinculativas.

IV – Análise

24.      Como referido supra, os fundamentos do recurso serão analisados por ordem inversa. Por conseguinte, começarei pelo sexto fundamento.

A –    Sexto fundamento relativo à violação do direito internacional consuetudinário

25.      O artigo 94.° da Diretiva CRD IV tem por epígrafe «Elementos variáveis da remuneração». O artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea i) estabelece que as instituições devem fixar rácios adequados entre as componentes fixa e variável da remuneração total, não podendo a componente variável exceder 100% da componente fixa da remuneração total para cada indivíduo. Além disso, nos termos do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea ii), da Diretiva CRD IV, os Estados‑Membros podem estabelecer uma percentagem máxima mais baixa ou autorizar os acionistas, proprietários ou sócios da instituição a aprovar um nível máximo mais elevado para o rácio entre as componentes fixa e variável da remuneração, desde que o nível da componente variável não exceda 200% da componente fixa da remuneração total para cada indivíduo.

26.      O Reino Unido formulou o seu sexto fundamento do seguinte modo: «violação do princípio consagrado no direito internacional consuetudinário que proíbe a extraterritorialidade». O Reino Unido alega que, em termos gerais, o princípio da territorialidade consagrado no direito internacional consuetudinário estabelece que, na falta de um nexo suficientemente forte, um Estado não deve procurar regular a conduta de cidadãos de outro Estado. No presente caso, o Reino Unido considera que o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV viola aquele princípio quando é aplicado a instituições a nível do «grupo, da empresa‑mãe e das filiais» estabelecidas fora da UE, uma vez que, na sua opinião, esse é o efeito do artigo 92.°, n.° 1, da Diretiva CRD IV, lido em conjugação com o seu artigo 109.°, n.° 2, embora nenhuma destas disposições seja impugnada no recurso.

27.      Nos termos do artigo 92.°, n.° 1, da Diretiva CRD IV, a aplicação do artigo 94.°, entre outros, é assegurada pelas autoridades competentes para as instituições a nível do grupo, da empresa‑mãe e das filiais, incluindo as que se encontrem estabelecidas em centros financeiros offshore. O artigo 109.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV estabelece designadamente que as autoridades competentes devem assegurar que as empresas‑mãe e filiais abrangidas pela referida diretiva, apliquem as disposições, processos e mecanismos referidos na secção II do capítulo II da diretiva nas suas filiais não abrangidas pela diretiva. As referidas disposições, processos e mecanismos devem igualmente ser coerentes e bem integrados e essas filiais também devem estar em condições de fornecer todos os dados e informações relevantes para efeitos de supervisão.

28.      O Reino Unido afirma que estas disposições violam o princípio consuetudinário de direito internacional público relativo à territorialidade. Segundo o Reino Unido, «é reconhecido que o princípio da soberania compreende a competência exclusiva de um Estado para adotar legislação destinada a regular os comportamentos no seu próprio território e não apenas para fiscalizar o cumprimento dessa legislação» (19).

29.      Antes de analisar o mérito deste fundamento, recordo que, no seu acórdão Air Transport Association of America e o., C‑366/10, o Tribunal de Justiça declarou que «[…] uma vez que um princípio de direito internacional consuetudinário não reveste o mesmo grau de precisão que uma disposição de um acordo internacional, a fiscalização jurisdicional deve, necessariamente, limitar‑se à questão de saber se as instituições da União, ao adotarem o ato em causa, cometeram erros manifestos de apreciação quanto às condições de aplicação desses princípios)» (20). (Itálico meu)

30.      O sexto fundamento suscita duas questões distintas e de natureza totalmente diferente. A primeira diz respeito à questão de saber se a validade de uma disposição pode ser afetada pelo facto de ser potencialmente aplicável a sujeitos e/ou atos fora da União Europeia devido ao impacto de outras disposições da legislação da UE cuja anulação não é pedida pelo recorrente. Isto porque, como referido supra, citam no seu recurso, o Reino Unido limita‑se a impugnar o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV, sem pedir a anulação do artigo 92.°, n.° 1 ou do artigo 109.°, n.° 2, da diretiva

31.      A segunda questão prende‑se com a pretensa existência de um princípio do direito internacional que proíbe a extraterritorialidade nos termos descritos pelo Reino Unido e se esse princípio foi manifestamente visado pelo legislador da UE.

1.      Consequências da não impugnação dos artigos 92.°, n.° 1 e 109.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV

32.      No que respeita à primeira questão, importa recordar que, ao abrigo do sexto fundamento, o Reino Unido limitou a sua impugnação ao artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV. Entendo que, isso significa que o sexto fundamento deve ser julgado improcedente. Com efeito, é difícil imaginar sequer a impugnação desta disposição relativamente à sua aplicabilidade no interior da UE com fundamento no direito internacional. Daqui resulta que o sexto fundamento não pode afetar a validade do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV no que diz respeito ao seu principal âmbito de aplicação.

33.      Com efeito, a alegada ilegalidade do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV face ao direito internacional público resulta, segundo o Reino Unido, dos artigos 92.°, n.° 1 e 109.°, n.° 2, da referida diretiva. Por conseguinte, considero que o recorrente deveria ter pedido a sua anulação na medida em que podiam conferir um efeito extraterritorial ilícito ao artigo 94.°, n.° 1, alínea g), e não a anulação desta última disposição.

34.      Por uma questão de exaustividade, gostaria de acrescentar que, no meu entender, o argumento do Conselho baseado no facto de, nos termos do disposto no artigo 92.°, n.° 1, da Diretiva CRD IV, a aplicação dos artigos 92.°, n.° 2, 93.° e 95.° dever ser assegurada pelas «autoridades competentes» para as instituições a nível do grupo, da empresa‑mãe e das filiais, incluindo as que se encontrem estabelecidas em centros financeiros offshore, não é convincente. Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, ponto 40), do Regulamento CR, entende‑se por «autoridade competente» «uma autoridade pública ou um organismo oficialmente reconhecido pelo direito nacional habilitado, por força do direito nacional, a supervisionar as instituições no contexto do sistema de supervisão vigente nesse Estado‑Membro» (21). Segundo o Conselho, não é de modo algum claro como é que uma autoridade competente pode violar «o princípio consuetudinário de direito internacional público» atuando simplesmente no âmbito das competências que lhe foram atribuídas pela legislação prudencial nacional pertinente.

35.      É verdade que os Estados‑Membros definem as suas autoridades competentes para efeitos da Diretiva CRD IV e do Regulamento CR. No entanto, as referidas autoridades estão obrigadas, por força do direito da UE, a exercer um controlo prudencial sobre as instituições financeiras da UE numa base consolidada que inclui, para efeitos de políticas de remuneração, nos termos dos artigos 92.° e 109.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV, as empresas do grupo estabelecidas fora da UE. Consequentemente, os Estados‑Membros têm a obrigação, nos termos do direito da UE, de conferir às suas autoridades competentes poderes suficientes para o efeito.

2.      O direito internacional consagra um princípio que proíbe a extraterritorialidade nos moldes em que é invocado pelo Reino Unido e este princípio foi manifestamente violado?

36.      Quanto a esta segunda questão, considero que uma medida legislativa da UE não pode ser inválida pelo simples facto de produzir efeitos nos comportamentos adotados num território situado fora da UE. O recurso do Reino Unido não faz referência a nenhum acórdão do Tribunal de Justiça que apoie esta tese, nem parece que tal precedente exista. Pelo contrário, há muito tempo que é pacífico que um comportamento adotado fora na UE com impacto a nível interno pode ser regulado pelo direito da União (22).

37.      Além disso, este aspeto do sexto fundamento não tem em conta o acórdão Lotus do Tribunal Permanente de Justiça Internacional (23), no qual este declarou que o direito internacional consuetudinário não contém uma proibição geral de extensão da competência legislativa de um Estado (ou competência normativa) para além do seu próprio território. Neste ponto, as conclusões do advogado‑geral M. Darmon no processo Pasta de Papel (24) permanecem atuais. Nessa ocasião, o advogado‑geral referiu que «ainda que, por outras razões, se possa colocar a questão: ‘o Lotus ainda navega?’», é possível invocar aquele acórdão para determinar a competência normativa de um Estado ou de outro sujeito comparável, ou seja, a competência para submeter factos e comportamentos à sua legislação, por oposição à competência de execução dos seus poderes, sob qualquer forma, no território de outro Estado (25).

38.      Na minha opinião, se o Reino Unido alegasse que o direito internacional admite apenas a competência legislativa territorial, estaria simplesmente errado. Por outro lado, se aceitasse, como parece ser o caso, o princípio da personalidade e até mesmo a teoria dos efeitos como fundamento alternativo da competência, não demonstrou que o direito internacional exige algo mais concreto em termos de «conexão suficiente» (26), e que a disposição controvertida da Diretiva CRD não preenche este requisito.

39.      No meu entender, o acórdão Lotus estabeleceu uma espécie de norma sobre o ónus da prova, que implica que, na falta de uma norma de direito internacional em contrário, a conexão invocada por um Estado para justificar a sua competência normativa é suficiente. Contudo, o direito internacional impõe necessariamente alguns limites à declaração de competência pelos Estados, pelo que qualquer pretensão de competência universal tem de assentar numa norma positiva de direito internacional (27). As disposições pertinentes da Diretiva CRD IV não visam estabelecer essa competência universal, mas apenas sujeitar as sociedades estrangeiras de instituições financeiras da UE ao quadro regulamentar da União.

40.      Por último, a jurisprudência em matéria de direito internacional invocada pelo Reino Unido não corrobora os seus argumentos. A decisão arbitral Island of Palmas (28), incidia sobre a questão de saber se o território objeto do litígio pertencia aos Países Baixos ou aos Estados Unidos. Era totalmente irrelevante para a questão de competência que alegadamente se coloca no presente caso. Esta conclusão também é válida para a referência que o Reino Unido faz ao processo Pescas Anglo‑Norueguesas (29), que dizia respeito à delimitação de uma zona de pesca norueguesa. Igualmente irrelevante é o processo Nottebohm (30), no qual o Tribunal Internacional de Justiça definiu os critérios da cidadania efetiva para efeitos de proteção diplomática. O acórdão Mandado de Detenção (31) tem sido interpretado como uma confirmação tácita do acórdão Lotus, embora, contrariamente às conclusões pessoais dos juízes, não analisasse os diversos critérios de atribuição da competência, incidindo essencialmente sobre a questão da imunidade face a ações judiciais. Do mesmo modo, conforme referiu o advogado‑geral M. Damon no processo Pasta de Papel (32), a posição assumida no acórdão Lotus foi retomada e aperfeiçoada por Sir Gerald Fizmaurice nas suas conclusões pessoais no processo Barcelona Traction nos moldes descritos no n.° 39 supra.

41.      Por último, o Reino Unido invoca a violação do artigo 3.°, n.° 5, TUE como fundamento para a anulação do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV. O artigo 3.°, n.° 5, TUE enuncia a obrigação da União de contribuir, designadamente, para a «rigorosa observância e o desenvolvimento do direito internacional». No entanto, na ausência do princípio de direito internacional que proíbe a extraterritorialidade nos moldes descritos pelo Reino Unido, não pode existir violação do artigo 3.°, n.° 5, TUE.

3.      Conclusão sobre o sexto fundamento

42.      Por todas estas razões, não tenho qualquer dúvida de que o Reino Unido não demonstrou que, ao adotarem o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV, o Conselho e o Parlamento cometeram erros manifestos de apreciação no que respeita a um princípio de direito internacional público. Por conseguinte, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

B –    Quinto fundamento relativo à compatibilidade do artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR com o direito ao respeito pela vida privada e o regime da UE de proteção de dados

43.      O artigo 450.° do Regulamento CR tem por epígrafe «Política de remuneração». O artigo 450.°, n.° 1 dispõe que as instituições financeiras «divulgam pelo menos as informações a seguir indicadas relativamente às respetivas políticas e práticas de remuneração aplicáveis às categorias de pessoal cujas atividades profissionais tenham um impacto significativo no respetivo perfil de risco:» Seguidamente especifica: na alínea d) «[o]s rácios entre remunerações fixas e variáveis estabelecidos nos termos do artigo 94.°, n.° 1, alínea g)» da Diretiva CRD IV; na alínea i) «[o] número de indivíduos com uma remuneração igual ou superior a 1 milhão de EUR por exercício financeiro, repartido por escalões de remuneração de 500 000 EUR para as remunerações entre 1 milhão e 5 milhões de EUR, e repartido por escalões de remuneração de 1 milhão de EUR para as remunerações iguais ou superiores a 5 milhões de EUR»; na alínea j) «[a] pedido do Estado‑Membro ou da autoridade competente, a remuneração total de cada um dos membros do órgão de administração ou da direção de topo».

44.      O Reino Unido alega que o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR viola os artigos 7.° e 8.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), que consagram respetivamente o direito ao respeito pela vida privada e familiar e o direito à proteção dos dados pessoais e a Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (33). O artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR permite que o Estado‑Membro ou as autoridades competentes exijam a divulgação de informações sobre remuneração mais pormenorizadas do que as exigidas pelo artigo 450.°, n.º 1, alínea i), do referido regulamento, sob a forma da remuneração total de cada membro do órgão de administração ou da direção de topo. Nem o Conselho nem o Parlamento contestam a qualificação da divulgação de informações sobre remuneração nos termos da disposição controvertida como uma operação de tratamento de dados pessoais, como tal abrangida pela legislação da UE em matéria de proteção de dados.

45.      No meu entender, o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR, lido em conjugação com o considerando 99, cumpre os princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça no acórdão Volker und Markus Schecke e Eifert (34). O considerando 99 do Regulamento CR dispõe que tanto a Diretiva 95/46 como o Regulamento (CE) n.° 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2000, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos da Comunidade e à livre circulação desses dados (35) «deverão ser aplicáveis na íntegra ao tratamento de dados pessoais para efeitos do presente regulamento.»

46.      No acórdão Volker und Markus Schecke e Eifert, o Tribunal de Justiça declarou que as instituições não tinham procedido a uma ponderação equilibrada entre os objetivos da disposição controvertida naquele caso e os direitos que os artigos 7.° e 8.° da Carta reconhecem às pessoas singulares no que respeita à privacidade e à proteção de dados (36).

47.      No caso em apreço, é pertinente o facto de a disposição controvertida não ser aplicável a todos os denominados responsáveis pela assunção de riscos significativos mas apenas aos membros dos órgãos de administração ou da direção de topo, e não implicar uma divulgação automática de dados pessoais protegidos. Com efeito, o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR não impõe uma obrigação automática de exigir essa divulgação. Confere apenas a faculdade aos Estados‑Membros ou às autoridades competentes de o fazerem. Como referido supra, o considerando 99 do regulamento obriga os Estados‑Membros a respeitarem a legislação da UE em matéria de proteção de dados quando apreciam qualquer pedido de informação dessa natureza. A isto acrescentaria os artigos 7.° e 8.° da Carta, dado que um pedido de informações adicionais nos termos do artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR consistiria na aplicação do direito da UE na aceção do artigo 51.° da Carta (37). Por conseguinte, considero que, contrariamente às preocupações expressas pelo Reino Unido, o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR não impõe uma prevalência automática do objetivo da transparência sobre a proteção de dados, que seria contrária à jurisprudência do Tribunal de Justiça supramencionada.

48.      Além disso, nos termos do artigo 450.°, n.° 2, do Regulamento CR, as instituições financeiras devem cumprir os requisitos estabelecidos naquele artigo sem prejuízo da Diretiva 95/46. Por conseguinte, não restam dúvidas de que os Estados‑Membros e as autoridades competentes não podem exigir a divulgação de informações em violação do direito da UE relativo à proteção de dados.

49.      É verdade que, tendo o Estado‑Membro ou a autoridade competente requerido a divulgação das informações, essa exigência representa para a instituição financeira em causa uma obrigação legal como previsto no artigo 7.°, alínea c), da Diretiva 95/46, pelo que o tratamento dos dados em questão seria legítimo. Contudo, a instituição financeira pode naturalmente contestar a legalidade de qualquer decisão que imponha essa divulgação perante a autoridade judicial competente, tal como qualquer outra decisão nacional que aplique o direito da UE e afete direitos fundamentais das pessoas.

50.      Por estes motivos, considero que o quinto fundamento também deve ser julgado improcedente.

C –    Quarto fundamento relativo à qualificação da atribuição de poderes à EBA e à Comissão ao abrigo da Diretiva CRD IV como ultra vires

51.      O quarto fundamento encontra‑se formulado em termos algo ambíguos, na medida em que se mistura, de forma incoerente, uma objeção aos poderes conferidos à EBA ao abrigo do artigo 94.°, n.° 2 e uma objeção aos conferidos à Comissão. Uma vez que esta última incide apenas sobre o «alcance» dos poderes conferidos à Comissão, não se baseando nem na doutrina Meroni (38), nem no incumprimento dos parâmetros estabelecidos pelas disposições pertinentes do Tratado aplicáveis (isto é, os artigos 290.° e 291.° TFUE), na minha opinião só a impugnação dos poderes da EBA está formulada em termos suficientemente precisos para permitir a apreciação da sua legalidade. 

52.      O artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV estabelece que a EBA «elabora projetos de normas técnicas de regulamentação no que diz respeito à especificação das classes de instrumentos que satisfazem as condições previstas no n.° 1, alínea l), subalínea ii), bem como no que se refere aos critérios qualitativos e quantitativos adequados para identificar as categorias de pessoal cuja atividade profissional tem um impacto significativo sobre o perfil de risco das instituições a que se refere o artigo 92.°, n.° 2.» Essa disposição acrescenta que a EBA deve apresentar esses projetos de normas técnicas de regulamentação à Comissão até 31 de março de 2014, e que é delegado na Comissão o poder de adotar as normas técnicas de regulamentação a que se refere o primeiro parágrafo, nos termos dos artigos 10.° a 14.° do Regulamento (UE) n.° 1093/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia), altera a Decisão n.° 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/78/CE da Comissão (39) (a seguir «Regulamento EBA»).

53.      O Reino Unido alega que a atribuição destes poderes deve respeitar o disposto no artigo 10.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento EBA, e os princípios gerais que regulam a atribuição de poderes à Comissão. O artigo 10.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento EBA dispõe que «[a]s normas técnicas de regulamentação têm um caráter técnico, não implicam decisões estratégicas ou escolhas políticas e o seu conteúdo é delimitado pelos atos legislativos nos quais se baseiam».

54.      O Reino Unido alega que o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV deve ser anulado dado que, em primeiro lugar, as tarefas que foram confiadas à EBA excedem o âmbito dos poderes que lhe foram conferidos ao abrigo do Regulamento EBA, especialmente porque implicam «decisões estratégicas ou escolhas políticas» em violação do artigo 10.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento EBA.

55.      Em segundo lugar, o Reino Unido alega que, uma vez que a EBA foi instituída ao abrigo do artigo 114.° TFUE, não é lícito exigir‑lhe o tratamento de questões abrangidas pelo artigo 114.°, n.° 2, TFUE. Esta disposição exclui do âmbito de aplicação do artigo 114.°, n.° 1, TFUE, nomeadamente, disposições «relativas aos direitos e interesses dos trabalhadores assalariados» Por outras palavras, o artigo 114.°, n.° 1, TFUE não pode constituir a base jurídica de medidas desta natureza.

56.      Começo por salientar que o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV, lido em conjugação com o artigo 10.°, n.° 1, do Regulamento EBA, confere à Comissão o poder de adotar um ato delegado na aceção do artigo 290.°, n.° 1, TFUE. O ato delegado através do qual é adotada uma norma de regulamentação tem de se basear num projeto de norma técnica de regulamentação elaborado pela EBA. Porém, o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV não confere à EBA o poder de adotar decisões vinculativas. Recordo ainda que, quando o legislador da UE confere à Comissão, num ato legislativo, um poder delegado, esta é chamada a adotar medidas que complementam ou alteram elementos não essenciais desse ato (40).

57.      Quanto à primeira linha de argumentação relativa ao Regulamento EBA, é difícil entender como é que o legislador da UE poderia ter agido ultra vires ao adotar uma disposição (neste caso, o artigo 10.° do Regulamento EBA) de acordo com o processo legislativo ordinário e, seguidamente, de acordo com o mesmo processo, adotar uma segunda disposição (neste caso, o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV), mesmo que o conteúdo ou o âmbito da primeira disposição seja mais restrito do que o da segunda. O facto de estas disposições terem por objetivo atribuir uma certa tarefa a uma agência da UE não altera nada.

58.      Na minha opinião, o Regulamento EBA não pode invalidar nenhuma disposição da Diretiva CRD IV porque esta pode afastar o primeiro. Para este efeito, seria irrelevante que a Diretiva CRD IV conferisse à EBA o poder de adotar decisões estratégicas ou políticas vinculativas. Neste último caso, a atribuição de poderes seria indubitavelmente inconstitucional nos termos da doutrina Meroni, mas não por força do artigo 10.° do Regulamento EBA (41).

59.      Em termos mais gerais, um potencial conflito entre as disposições de dois atos legislativos do mesmo nível da hierarquia de normas como o alegado entre o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV e o artigo 10.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento EBA não gera nem implica falta de competência do legislador ou qualquer outro fundamento de anulação na aceção do artigo 263.°, TFUE, mesmo que revele a existência de deficiências no processo legislativo. Por conseguinte, numa situação como esta, nenhuma das disposições controvertidas pode ser anulada com aquele fundamento. Contudo, a determinação de qual delas prevalece sobre a outra dependerá da aplicação de princípios como o da lex posterior ou o da lex specidis, a menos que seja possível interpretá‑las de forma a eliminar o potencial conflito. Por outras palavras, nenhuma das disposições pode ser qualificada como lex superior em relação à outra.

60.      Esta conclusão é válida mesmo nos casos em que o legislador não tenha tido a intenção de afastar a primeira disposição ao adotar a segunda, o que como explicaram o Parlamento, o Conselho e a Comissão, se verifica no caso em apreço, tendo devidamente em conta o facto de que, nos termos do artigo 94.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da Diretiva CRD IV, é delegado na Comissão o poder de adotar as normas técnicas de regulamentação em causa, em conformidade com os artigos 10.° a 14.° do Regulamento EBA.

61.      Assim sendo, o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV apenas confere poderes à Comissão para complementar os elementos não essenciais de atos legislativos. A Diretiva CRD IV estabelece os elementos essenciais das normas técnicas de regulamentação em causa, dispondo que é aplicável a certas categorias de pessoal das instituições financeiras, ou seja, os denominados responsáveis pela assunção de riscos significativos na aceção definida, em pormenor, no seu artigo 92.°, n.° 2.

62.      De facto, o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV confere à Comissão o poder de adotar, com base num projeto elaborado pela EBA, normas técnicas de regulamentação «no que se refere aos critérios qualitativos e quantitativos adequados para identificar as categorias de pessoal cuja atividade profissional tem um impacto significativo sobre o perfil de risco das instituições a que se refere o artigo 92.°, n.° 2». Consequentemente, a diretiva visa a adoção «de regras que se inserem no âmbito regulamentar definido pelo ato legislativo de base.» (42) Assim, as opções estratégicas e políticas são feitas no ato legislativo de base e não em normas elaboradas pela EBA e adotadas pela Comissão.

63.      No que se refere à segunda linha de argumentação do Reino Unido nos termos da qual os poderes conferidos à EBA são ilegais porque podem afetar os direitos e interesses dos trabalhadores assalariados, conforme previsto no artigo 114.°, n.° 2, TFUE, tendo a agência sido criada com base no artigo 114.°, n.° 1, TFUE, considero que as funções de uma agência da UE podem ter uma base jurídica diferente da disposição que serviu de base ao ato legislativo que criou a agência. As funções de uma agência da UE podem, por exemplo, ter por base, em parte, disposições relativas às quatro liberdades, ao passo que a sua criação inicial assenta em disposições de harmonização do mercado interno ou no artigo 352.° TFUE (43). Ao recorrer a uma determinada base jurídica para criar uma agência da UE, o legislador não está impedido por essa razão de lhe confiar outras funções por referência a uma base jurídica diferente. Se esta é a base jurídica adequada dependerá do conteúdo das novas funções e competências conferidas à agência em causa e a base jurídica sobre a qual a agência foi criada originalmente será irrelevante.

64.      Além disso, devo salientar que aquilo que a EBA está habilitada a fazer é elaborar projetos de medidas que só assumirão a forma de lei se forem adotados pela Comissão. Por definição, os projetos legislativos não podem corresponder a medidas «relativas aos direitos e interesses dos trabalhadores assalariados [...] que tenham por objeto o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno» na aceção do artigo 114.°, n.os 1 e 2, TFUE. Os efeitos jurídicos destes projetos de medidas estão confinados ao processo interno de tomada de decisão da Comissão, podendo esta decidir aprová‑los, rejeitá‑los ou alterá‑los, consoante o caso. Assim, os projetos de medidas elaborados pela EBA, ou por qualquer outra agência da EU nesta matéria, só em si mesmos, incapazes de harmonizar quaisquer disposições nacionais ou afetar os direitos e obrigações das pessoas.

65.      Por estes motivos, o quarto fundamento também deve ser julgado improcedente.

D –    Terceiro fundamento relativo à violação do princípio da segurança jurídica

66.      O artigo 162.°, n.° 1, da Diretiva CRD IV estabelece, designadamente, que os Estados‑Membros devem adotar e publicar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à diretiva até 31 de dezembro de 2013, e que devem aplicá‑las a partir dessa data.

67.      O artigo 162.°, n.° 3, da Diretiva CRD IV estabelece que as «disposições legais, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento ao artigo 94.°, n.° 1, alínea g), devem exigir que as instituições apliquem os princípios nele estabelecidos à remuneração concedida por serviços prestados ou por desempenho a partir do ano de 2014, devida com base em contratos celebrados antes ou depois de 31 de dezembro de 2013».

68.      O artigo 521.°, n.° 1, do Regulamento CR dispõe que o regulamento entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia, estabelecendo o artigo 521.°, n.° 2 que o regulamento é aplicável a partir de 1 de janeiro de 2014.

69.      Segundo o Reino Unido, o artigo 162.°, n.os 1 e 3, da Diretiva CRD IV, e o artigo 521.°, n.° 2, do Regulamento CR violam o princípio da segurança jurídica.

70.      Além disso, o Reino Unido sustenta que as medidas delegadas necessárias para determinar questões como, por exemplo, a aplicação das novas regras na prática, a taxa de desconto aplicável a bónus diferidos e os critérios de identificação dos responsáveis pela assunção de riscos significativos, não tinham sido oportunamente adotadas. Tal ficou a dever‑se ao facto de a EBA não estar obrigada a apresentar projetos de normas técnicas de regulamentação à Comissão antes de 31 de março de 2014 (v. artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV). Deste modo, a Comissão só pôde adotar as normas técnicas de regulamentação depois de receber a proposta da EBA. Com efeito, a Comissão só adotou as normas técnicas de regulamentação em 4 de março de 2014.

71.      O Reino Unido alega que aplicação adequada do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV e do artigo 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), do Regulamento CR depende da prévia identificação dos responsáveis pela assunção de riscos significativos. Por conseguinte, o Reino Unido pede a anulação do artigo 162.°, n.os 1 e 3, da Diretiva CRD IV e do artigo 521.°, n.° 2, do Regulamento CR, dado que as instituições da UE deveriam ter fixado uma data diferente para a implementação do conjunto de medidas que compunham o pacote CRD IV a fim de respeitarem o princípio da segurança jurídica.

72.      O terceiro fundamento com o título «as disposições controvertidas violam o princípio da segurança jurídica» parece estar dividido em três partes.

73.      Em primeiro lugar, o Reino Unido alega que o artigo 162.°, n.° 3, da Diretiva CRD IV viola o princípio da segurança jurídica devido aos seus «efeitos retroativos». Segundo o Reino Unido, tal deve‑se ao facto de o artigo 162.°, n.° 1 exigir que os Estados‑Membros apliquem a Diretiva CRD IV a partir de 1 de janeiro de 2014, o que afetará a remuneração a atribuir com base «em contratos celebrados antes daquela data».

74.      No meu entender, o argumento de que a Diretiva CRD IV tem efeitos retroativos não tem qualquer fundamento. Segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, consideram‑se retroativas as medidas que produzam efeitos a partir de uma data anterior à sua publicação (44). Além disso, o Tribunal de Justiça declarou expressamente que não pode considerar‑se que a aplicação de uma disposição de direito da UE «a um contrato de trabalho celebrado antes [da entrada em vigor] afeta uma situação adquirida antes dessa data» (45).

75.      Acresce que, em conformidade com o artigo 162.°, n.° 3, da Diretiva CRD IV, o artigo 94.°, n.° 1, alínea g) só é aplicável à remuneração concedida por serviços prestados ou por desempenho a partir do ano de 2014. Deste modo, a Diretiva CRD IV não afeta direitos adquiridos que estejam associados a serviços ou desempenho anteriores ou, por outras palavras, direitos adquiridos e o desempenho anteriores à entrada em vigor da Diretiva CRD IV. O direito efetivo do trabalhador a receber a remuneração só nasce, na melhor das hipóteses, no momento em que presta os serviços ou demonstra determinado desempenho merecedor de um bónus e não quando é celebrado um acordo nesse sentido.

76.      É verdade que, a jurisprudência do Tribunal de Justiça, confere uma certa proteção a confiança legítima dos operadores económicos que já celebraram contratos afetados por legislação da UE com efeitos imediatos, mas, neste contexto, são raros os casos suscetíveis de gerar confiança legítima.

77.      Embora o «princípio da proteção da confiança legítima seja um dos princípios fundamentais de direito da UE e possa ser invocado por qualquer operador económico que, em virtude de garantias concretas que lhe tenham sido dadas por uma instituição, tenha expectativas fundadas» (46), o Tribunal de Justiça tem entendido sistematicamente que «os operadores económicos não podem invocar uma confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser modificada no quadro do poder de apreciação das instituições comunitárias» (47). Com base nos antecedentes da Diretiva CRD IV descritos supra na secção intitulada «Observações preliminares», qualquer «operador normalmente avisado e diligente» (48) teria podido prever a possibilidade de a UE aprovar novas regras sobre o rácio entre a remuneração fixa e variável dos trabalhadores das instituições financeiras.

78.      Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, se uma instituição da UE tivesse gerado junto das instituições financeiras uma «expectativa fundada» de que não seria estabelecido um rácio fixo, esta parte da Diretiva CRD IV poderia ser impugnada com fundamento na violação do princípio da proteção da confiança legítima (49). Porém, não é esse o caso.

79.      Isto leva‑me ao segundo ponto do recurso do Reino Unido, ou seja, a questão de saber se a confiança legítima dos operadores económicos afetados foi respeitada, em conformidade com a jurisprudência que o Tribunal de Justiça consagrou à «retroatividade». Dito isto, não creio que seja necessário que o Tribunal de Justiça analise este ponto do recurso do Reino Unido, dado que as medidas impugnadas não são retroativas. Por conseguinte, as observações que se seguem apenas serão relevantes se o Tribunal de Justiça decidir que as medidas impugnadas devem ser efetivamente consideradas retroativas.

80.      No seu recurso, o Reino Unido alega que o rácio fixo estabelecido pela Diretiva CRD IV viola o princípio da segurança jurídica, dado que as medidas delegadas necessárias para determinar questões como, por exemplo, a aplicação das novas regras na prática, a taxa de desconto aplicável a bónus diferidos e os critérios de identificação dos responsáveis pela assunção de riscos significativos só deveriam ser adotadas vários meses depois de o «limite» específico sobre a remuneração variável ter sido aplicado a nível nacional. Como referido supra, a adoção dessas medidas deveria ocorrer em 1 de janeiro de 2014, mas segundo o artigo 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV, a EBA não estava obrigada para apresentar os projetos de normas técnicas de regulamentação antes de 31 de março de 2014. Estas normas foram adotadas pela Comissão em 4 de março de 2014. A objeção do Reino Unido abrange também as disposições sobre o voto dos acionistas e o rácio facultativo de 200% estabelecido ao abrigo do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea ii), da Diretiva CRD IV. Assim, o Reino Unido alega que as instituições da UE deveriam ter promulgado legislação adicional que diferisse a data de aplicação das medidas impugnadas até que todas as disposições do pacote CRD IV estivessem prontas para serem implementadas no seu conjunto.

81.      Em apoio da existência de uma obrigação de «adotar legislação de execução suficientemente precisa e inequívoca», o Reino Unido invoca o artigo 17.° da Carta da UE, o artigo 1.° do Protocolo A n.° 1 da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e os acórdãos Hentrich c. França (50), Spacek c. República Checa (51)e Teleos e o. C‑419/04 (52).

82.      O Tribunal de Justiça reiterou recentemente que «o princípio da segurança jurídica, que tem por corolário o princípio da proteção da confiança legítima, exige que qualquer lei que dê origem a consequências desfavoráveis para particulares seja clara e precisa e que a sua aplicação seja previsível para os destinatários» (53).

83.      Quanto à inexistência de normas técnicas de regulamentação até 4 de março de 2014, considero que o artigo 92.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV enuncia, de forma autónoma e detalhada, quais os trabalhadores das instituições abrangidos pelas disposições sobre remuneração (54).

84.      Conforme o Conselho salienta na sua contestação, a Diretiva CRD III já tinha definido os elementos constitutivos necessários para estabelecer um rácio entre as componentes fixa e variável da remuneração. Entre estes elementos figurava o âmbito de aplicação pessoal da política de remuneração da UE, que, segundo o anexo I da Diretiva CRD III, abrangia «os órgãos de direção, os responsáveis pela assunção de riscos e funções de controlo e todos os empregados cuja remuneração total os coloque no mesmo escalão de remuneração que os membros dos órgãos de direção e os responsáveis pela assunção de riscos, cujas atividades têm um impacto significativo no respetivo perfil de risco». Esta disposição entrou em vigor em 15 de dezembro de 2010 e devia ser transposta pelos Estados‑Membros para o direito interno até ao final de 2011. Assim, as instituições financeiras aplicam o conceito de responsável pela assunção de riscos significativos previsto no direito da UE desde 2011.

85.      Consequentemente, a Diretiva CRD IV utiliza as regras (na minha opinião, suficientemente específicas) sobre remuneração variável que estão vigor há alguns anos. Além disso, chamo a atenção para o facto de as medidas impugnadas da Diretiva CRD IV terem sido publicadas em junho de 2013, terem entrado em vigor em julho de 2013 e serem aplicáveis a partir de 31 de dezembro de 2013. Por conseguinte, é legítimo presumir que as novas regras sobre remuneração variável foram devidamente tidas em conta nas negociações contratuais respeitantes ao ano de 2014 que tiveram lugar entre as instituições financeiras e o pessoal a quem as referidas regras são aplicáveis.

86.      Porém, mais importante ainda no palno do direito da UE os critérios qualitativos e quantitativos do artigo 92.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV não poderiam ter sido alterados pelas normas técnicas de regulamentação que vieram a ser adotadas pela Comissão em 4 de março de 2014. Por conseguinte, é evidente que a segurança jurídica nunca esteve em risco.

87.      Em qualquer caso, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma medida da UE pode ter efeito retroativo desde que a finalidade a atingir o exija e a confiança legítima dos interessados seja devidamente respeitada (55).

88.      As medidas impugnadas têm por finalidade criar um conjunto homogéneo de regras aplicável à remuneração variável concedida aos responsáveis pela assunção de riscos significativos por serviços prestados ao longo de 2014. Assim, o objetivo legítimo do artigo 162.°, n.° 3, da Diretiva CRD IV é garantir que as medidas nele previstas sejam aplicadas a partir da mesma data em toda a UE.

89.      Além disso, a confiança legítima das instituições financeiras e dos indivíduos interessados foi devidamente respeitada. Os interessados foram primeiro informados de que estava prevista a adoção de nova legislação sobre remuneração através do Livro Verde (56) e da proposta inicial relativa ao pacote CRD IV (57). Quando, em 30 de maio de 2012, o Parlamento Europeu publicou as suas alterações propondo um rácio máximo fixo de 100% para a componente variável da remuneração (58), uma iniciativa deste tipo não poderia ter violado a confiança legítima dos interessados. Em dezembro de 2012, o compromisso entre o Parlamento Europeu e o Conselho relativamente à remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos e que propunha estabelecer o rácio máximo em 200% do salário fixo, mereceu uma grande atenção mediática. Acresce que, com a publicação da Diretiva CRD IV no Jornal Oficial em 27 de junho de 2013, qualquer pessoa tinha acesso a regras suficientemente claras sobre a remuneração variável, deixando muito tempo para se prepararem para a sua entrada em vigor no início de 2014.

90.      Por estas razões, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

E –    Segundo fundamento relativo à violação dos princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade e impugnação do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV e do artigo 450.°, alíneas i) e j), do Regulamento CR

91.      Embora este fundamento esteja formulado e tenha sido defendido em termos algo complexos, é possível dividi‑lo em dois grandes temas, a saber: (i) violação dos princípios da proporcionalidade (59) e da subsidiariedade (60) devido à adoção de um rácio fixo máximo obrigatório de 100% entre a remuneração fixa e a remuneração variável, e (ii) a proporcionalidade das obrigações de divulgação. Abordarei estes temas separadamente (61).

1.      Rácio fixo máximo para a remuneração variável

92.      Segundo o Reino Unido, as medidas impugnadas não cumprem o princípio da proporcionalidade, dado que não são adequadas à prossecução do objetivo de política pública pretendido. Também não são necessárias para atingir o objetivo de interesse público da legislação nela previsto, uma vez que as restantes disposições (não impugnadas) da Diretiva CRD IV e do Regulamento CR asseguram uma supervisão prudencial suficiente das instituições de crédito nesta área, sem que seja necessário impor «limites aos bónus». Além disso, o Reino Unido alega que a proporcionalidade das medidas alteradas não foi demonstrada pelo legislador. Na sua opinião, isto contraria as orientações do Acordo Interinstitucional «Legislar melhor» (62). O Reino Unido considera que, mesmo tendo em conta a margem de apreciação de que as instituições da UE dispõem quando legislam para preservar a estabilidade financeira, as medidas impugnadas são manifestamente desproporcionadas e, além disso, violam o princípio da subsidiariedade, uma vez que ainda não foi justificada a necessidade de as adotar para corrigir distorções da concorrência na liberdade de estabelecimento (63).

93.      Recordo que existe um princípio constitucional de direito da UE segundo o qual, no âmbito do processo legislativo ordinário da União Europeia, os colegisladores têm competência para introduzir alterações a qualquer proposta legislativa, desde que não ultrapassem o âmbito do ato tal como definido na proposta original da Comissão (64). Foi o que se passou com a alteração ao artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV, que introduziu uma regra mais exigente do que a que figurava na proposta da Comissão. Contudo, o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV não se desviou do seu âmbito de aplicação e dos seus objetivos, na medida em que pretende regulamentar as componentes variáveis da remuneração, a fim de combater a assunção de riscos excessivos por parte dos órgãos de administração/direção e dos trabalhadores das instituições financeiras. Esta matéria tinha sido já abordada na Diretiva CRD III.

94.      Conforme recorda acertadamente o Conselho, os colegisladores podem adotar medidas que não estavam previstas na proposta legislativa inicial, sem estarem necessariamente obrigados a realizar novamente uma avaliação de impacto completa. Com efeito, as avaliações de impacto realizadas pela Comissão não vinculam nem o Conselho nem o Parlamento, podendo qualquer um deles introduzir alterações a uma proposta da Comissão (65).

95.      O Tribunal de Justiça declarou que «o amplo poder de apreciação do legislador da União, que implica uma fiscalização jurisdicional limitada do seu exercício, não se aplica exclusivamente à natureza e ao alcance das disposições a adotar, mas também, em certa medida, ao apuramento dos dados de base» (66). O Tribunal de Justiça indicou que embora tendo um alcance limitado, esta fiscalização jurisdicional exige que as instituições comunitárias que adotaram o ato em causa «estejam em condições de demonstrar no Tribunal de Justiça que o ato foi adotado mediante um exercício efetivo do seu poder de apreciação, o qual pressupõe a tomada em consideração de todos os elementos e circunstâncias pertinentes da situação que esse ato pretendeu regular» (67). No exercício do seu poder de apreciação, as instituições podem tomar em consideração, entre outras, as informações fornecidas em documentos no domínio público, «grupos de trabalho» organizados pelo Parlamento e documentos científicos utilizados pelos Estados‑Membros em reuniões do Conselho, não estando limitadas aos documentos oficiais do Conselho (68).

96.      Importa recordar que, quando tenha sido conferido um amplo poder de apreciação que implique opções de natureza política e económica, a parte que pede a declaração de invalidade tem de demonstrar que a medida em causa é manifestamente inadequada (69) tendo em conta o objetivo prosseguido pelas instituições. Contudo, isto exige a tomada em consideração de todos os elementos e circunstâncias incluindo os «dados de base» (70). O poder de apreciação do legislador da União pode também revelar‑se limitado no domínio dos direitos fundamentais «em função de um certo número de elementos, entre os quais figuram, designadamente, o domínio em questão, a natureza do direito em causa garantido pela Carta, a natureza e a gravidade de ingerência, bem como a finalidade da mesma» (71).

97.      Na minha opinião, as contestações do Parlamento e do Conselho, e a intervenção da Comissão, ilustram claramente que a questão da regulamentação da componente variável da remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos foi objeto de um extenso debate desde o início da crise financeira, tanto nos meios académicos como nos círculos políticos. Durante o processo de adoção da Diretiva CRD IV e, concretamente, do seu artigo 94.°, n.° 2, alínea g), existia uma vasta informação no domínio público, bem como grupos de trabalho organizados pelo Parlamento e documentos debatidos pelos Estados‑Membros em reuniões do Conselho. Estes revelam as incertezas empíricas relacionadas com a remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos e refletem diferentes políticas e possíveis estratégias regulamentares.

98.      Dito isto, o material ao dispor dos decisores políticos demonstrava claramente que a restrição a priori dos incentivos à assunção de riscos excessivos por parte dos órgãos de administração/direção e dos trabalhadores das instituições financeiras resultaria provavelmente numa redução dessa assunção de riscos e, consequentemente, de qualquer risco para a estabilidade dos mercados financeiros daí decorrente. Nestas circunstâncias, considero que a questão de saber onde e por quem os limites concretos a essas iniciativas seriam estabelecidos está associada ao grau de regulamentação considerado adequado, o que envolvia claramente escolhas económicas e políticas. Contudo, as medidas legislativas em causa só podem ser anuladas se essas escolhas tiverem sido manifestamente inadequadas.

99.      Pelo exposto, não considero útil nem necessário que o Tribunal de Justiça proceda a uma apreciação exaustiva dos numerosos pormenores da argumentação do Reino Unido sobre esta questão. Com efeito, esses pormenores demonstram simplesmente que a questão era controversa e que o Parlamento Europeu chegou à conclusão de que era conveniente adotar uma regulamentação mais profunda da componente variável da remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos antes das outras instituições.

100. No meu entender, só dois outros pontos relacionados com este fundamento merecem ser analisados. Em primeiro lugar, nos termos do artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea ii), segundo travessão, da Diretiva CRD IV os membros do pessoal diretamente afetado pelos níveis máximos superiores visados da remuneração variável previsto nessa disposição, não podem votar enquanto acionistas, proprietários ou membros da instituição quando uma instituição financeira decidir exercer a opção de aumentar o nível da componente variável da remuneração para 200% da componente fixa. Considero que, neste caso, estamos perante uma restrição normal e justificada do poder de decisão das empresas, que tem por objetivo prevenir conflitos de interesses no contexto de uma boa gestão do risco da instituição financeira em causa.

101. Em segundo lugar, no que respeita ao princípio da subsidiariedade, recordo que o rácio fixo máximo aplicável à componente variável da remuneração previsto no artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CDR IV constitui uma medida obrigatória de harmonização mínima dentro do mercado interno, deixando aos Estados‑Membros margem de manobra para adotarem regras nacionais mais exigentes. Os Estados‑Membros podem estabelecer uma percentagem máxima inferior a 100% da componente fixa.

102. Como o Conselho observou na sua contestação e tréplica, os Estados‑Membros e as instituições financeiras tinham conceções diferentes deste rácio, a ideia de instituir um rácio máximo ou de limitar a remuneração variável já era objeto de debate público vários anos antes da adoção das medidas impugnadas. No entanto, a liberdade de estabelecimento e a livre prestação de serviços neste setor assentam no princípio do controlo pelo país de origem. Na minha opinião, isto significa que existia o risco de uma concorrência regulamentar por baixo e de a autorregulamentação pelas instituições financeiras não ser suficiente para criar as políticas de remuneração necessárias para prevenir a assunção de riscos excessivos. Além disso, é evidente que a adoção de medidas a nível nacional não teria sido um instrumento mais adequado para alcançar o objetivo de criar um quadro regulamentar uniforme para a gestão do risco de elementos relevantes das políticas de remuneração das instituições financeiras.

103. Por último, recordo que as propostas de alteração apresentadas pelo Parlamento Europeu foram objeto de análise e debate aprofundados no seio das instâncias preparatórias do Conselho. Além disso, o Conselho reuniu‑se em 5 de março de 2013 especificamente para discutir as questões relacionadas com os limites à remuneração variável. Consequentemente, subscrevo a posição defendida pelo Parlamento e pelo Conselho de que o legislador da UE cumpriu todos os requisitos processuais relativos à análise da conformidade da proposta com os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade. Sem prejuízo do cumprimento dos requisitos processuais aplicáveis, o legislador possui um amplo poder de apreciação quando avalia se uma medida da União respeita os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade (72).

2.      A proporcionalidade da obrigação de divulgação estabelecida no artigo 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), do Regulamento CR

104. Antes de analisar a legalidade destas disposições por referência ao princípio da proporcionalidade, é importante clarificar o que estas exigem efetivamente. Na verdade, o artigo 450.°, n.° 1, alínea i), do Regulamento CR exige meramente a identificação do número de indivíduos com uma remuneração superior a determinados valores e a repartição desse número por escalões de remuneração. Esta disposição não implica necessariamente a identificação da remuneração de pessoas individuais.

105. Assim, tal como observou o Conselho na sua contestação, nem a alínea i) nem a alínea j) do artigo 450.°, n.° 1, do Regulamento CR exigem a divulgação dos dados relativos a todos os responsáveis pela assunção de riscos significativos. A alínea i) exige apenas que seja publicado o número de indivíduos que beneficiam de certas categorias de remuneração, a passo que a alínea j) visa unicamente os membros do órgão de administração ou da direção de topo. Além disso, acrescento que isto é feito sem que seja revelada a identidade do trabalhador individual ou sua remuneração. Isto também significa que esta disposição não afeta os direitos ou interesses dos trabalhadores assalariados na aceção do artigo 114.°, n.° 2, TFUE, dado que, tal como acontece com o artigo 450.°, n.° 1, alíneas i) e j), tem por destinatários as instituições financeiras e não o trabalhador individual (73).

106. No que respeita às obrigações de publicação que resultam diretamente do artigo 450.°, n.° 1, alíneas d) e i), considero que não implicam a divulgação de salários individuais, mas apenas de salários agregados. Essas obrigações estão dentro da margem de apreciação do legislador e não são problemáticas do ponto de vista da proteção de dados (74).

107. Além disso, conforme o Conselho observou na sua contestação, o artigo 450.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento CR limita‑se a permitir que os Estados‑Membros exijam a divulgação de informações mais detalhadas sobre remuneração do que as exigidas pela alínea i), sob a forma da remuneração total de cada um dos membros do órgão da administração ou da direção de topo. Não impõe, de modo algum, sobre o Estado‑Membro uma obrigação nesse sentido, tal como o artigo 450.°, n.° 1, alínea j) não impõe uma obrigação geral de publicação. Conforme expliquei no contexto do quinto fundamento, na sua decisão de exigir a divulgação de determinadas informações, os Estados‑Membros estarão vinculados pela Carta e pelo direito da UE relativo à proteção de dados.

108. Para concluir a minha análise do segundo fundamento, uma vez que o recorrente não fez prova de qualquer violação dos princípios da proporcionalidade ou da subsidiariedade, o segundo fundamento também deve ser julgado improcedente.

F –    Primeiro fundamento relativo às bases jurídicas das medidas impugnadas

109. Relativamente à objeção do Reino Unido quanto à escolha do artigo 53.°, n.° 1, TFUE como base do artigo 94.°, n.° 1, alínea g) e n.° 2, da Diretiva CRD IV, observo, antes demais, que o Tribunal de Justiça já declarou que as medidas destinadas a promover o desenvolvimento harmonioso das atividades das instituições de crédito em toda a UE mediante a supressão de todas as restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços, reforçando simultaneamente a estabilidade do sistema bancário e a proteção dos aforradores, podem ter por base o artigo 53.°, n.° 1, TFUE (75).

110. Uma vez que, por um lado, a componente variável da remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos pode incentivar a assunção de riscos excessivos por parte das instituições financeiras e, por outro, estas últimas operam no mercado interno ao abrigo de uma autorização única concedida em conformidade com o princípio do controlo pelo país de origem consagrado no direito da UE (76), considero que a UE pode, com base no artigo 53.°, n.° 1, TFUE, fixar para cada categoria de indivíduos um rácio obrigatório entre a componente fixa e a componente variável da sua remuneração. Uma vez que este elemento da remuneração tem um impacto direto sobre o perfil de risco das instituições financeiras, pode afetar a estabilidade destas instituições e, consequentemente, a estabilidade dos mercados financeiros da UE. Por outras palavras, as medidas da Diretiva CRD IV impugnadas pelo Reino Unido estão relacionadas com as condições de acesso à atividade das instituições financeiras e ao seu exercício no mercado interno.

111. Contudo, segundo o Reino Unido, estas disposições deveriam ter sido adotadas com base no artigo 153.°, n.° 5, TFUE. O Reino Unido acrescenta que uma vez que o artigo 153.°, n.° 5, TFUE impede a adoção de medidas relativas à «remuneração», não se pode recorrer ao artigo 153.° como base jurídica no Tratado para o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), e n.° 2, da Diretiva CRD IV.

112. O artigo 153.°, n.° 5, TFUE deve ser interpretado no sentido de que a fixação dos níveis de remuneração está abrangida pela autonomia contratual dos parceiros sociais a nível nacional, pelo que, nesta matéria, são competentes os Estados‑Membros (77). Por conseguinte, considero que é fundamental determinar se o artigo 153.°, n.° 5, TFUE, uma disposição que tem de ser objeto de uma interpretação literal (78), é aplicável quando a medida impugnada não prossegue um objetivo de política social, como no presente caso. Este aspeto é importante porque o artigo 153.°, n.° 5, TFUE só derroga «o disposto no presente artigo» e o artigo 153.° diz unicamente respeito à política social da UE, uma matéria definida no artigo 151.° TFUE, onde é feita referência à Carta Social Europeia de 1961 e à Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, de 1989.

113. É evidente que a imposição de limites à remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos não pretende conceder a estes trabalhadores qualquer tipo de proteção social. Os considerandos 62 e 65 da Diretiva CRD IV mostram que a Diretiva visa evitar incentivar a assunção de riscos excessivos por parte daqueles trabalhadores, não só com o objetivo de limitar a exposição de cada instituição financeira a esses riscos como também de assegurar, de um modo geral, a estabilidade dos mercados financeiros da UE. O considerando 62 refere, designadamente, que as políticas de remuneração «que incentivam comportamentos de assunção de riscos excessivos podem comprometer uma gestão sã e eficaz dos riscos» das instituições financeiras. Por seu turno, o considerando 65 dispõe que «para evitar a tomada de riscos excessivos, deverá ser estabelecido um rácio máximo entre as componentes fixa e variável da remuneração total».

114. Todavia, na minha opinião, mesmo tendo sido realizada esta análise, o fundamento invocado pelo Reino Unido não pode ser julgado improcedente pelo simples facto de as medidas impugnadas não prosseguirem um objetivo de política social. Isto porque o Tribunal de Justiça considerou que a «determinação do nível da remuneração e dos diversos elementos constitutivos da remuneração se subtrai à competência do legislador da União» e cabe aos Estados‑Membros (79). Assim, não é possível recorrer ao artigo 53.°, n.° 1, TFUE como base jurídica da Diretiva CRD IV para contornar a restrição imposta pelo artigo 153.°, n.° 5, TFUE.

115. Estou também ciente do facto de que, segundo a jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, as componentes variáveis da remuneração fazem parte da remuneração total (80). Consequentemente, este aspeto deve ser tomado em consideração antes de se chegar a uma conclusão definitiva sobre o papel que o artigo 153.°, n.° 5, TFUE desempenha na resolução do presente litígio. Assim, é necessário determinar se o legislador da UE fixou efetivamente a remuneração dos responsáveis pela assunção de riscos significativos na aceção do artigo 153.°, n.° 5, TFUE.

116. O Tribunal de Justiça sustentou que o artigo 153.°, n.° 5, TFUE corresponde à regra de que «a determinação do nível dos diferentes elementos constitutivos da remuneração de um trabalhador [...] cabe incontestavelmente às instâncias competentes nos vários Estados‑Membros (81), e que a exceção prevista no artigo 153.°, n.° 5 «deve, consequentemente, ser entendida no sentido de que visa as medidas que, tal como uma uniformização do todo ou de parte dos elementos constitutivos dos salários e/ou do seu nível nos Estados‑Membros, ou ainda a instituição de um salário mínimo comunitário, implicariam uma ingerência direta do direito comunitário na determinação das remunerações no seio da Comunidade» (82).

117. É indiscutível que a proibição prevista no artigo 153.°, n.° 5, TFUE só é aplicável à determinação do «nível» de remuneração (83). Como o Reino Unido refere na sua petição, nas suas conclusões apresentadas no processo Impact, a advogada‑geral J. Kokott indicou que a UE não teria competência, por exemplo, para «introduzir um limite máximo para os aumentos salariais ou regular o montante da remuneração das horas extraordinárias ou o suplemento devido pelo trabalho por turnos, noturno ou prestado em dias feriados» (84). Além disso, o artigo 153.°, n.° 5, TFUE visa impedir a unificação pelo legislador da UE, em toda a União, dos níveis salariais aplicáveis nos vários Estados‑Membros, dado que tal nivelamento constituiria uma profunda intervenção na concorrência entre as empresas que atuam no mercado interno (85). Nenhuma destas matérias é afetada pelo artigo 94.°, n.° 1, alínea g) e n.° 2, da Diretiva CRD IV.

118. No entanto, como o Conselho refere na sua contestação que as regras estabelecidas pelos artigos 92.° a 94.° da Diretiva CRD IV podem, na melhor das hipóteses, ser encaradas como possuindo um nexo com a remuneração, acrescentando que o montante da componente fixa é estabelecido no âmbito das negociações salariais entre o pessoal e a instituição financeira. Como salientado nas contestações do Conselho e do Parlamento, o Reino Unido alegou que a resposta ao pacote CRD IV será provavelmente um aumento do montante da remuneração fixa para manter o elevado nível global da remuneração total. Assim como o Conselho observou na sua contestação, este ajustamento não será possível se a União Europeia tiver legislado sobre um elemento constitutivo da remuneração e, como o Parlamento refere na tréplica, um rácio não basta enquanto tal para determinar o que quer que seja. Por conseguinte, o rácio, enquanto tal, não pode ser considerado um elemento constitutivo da remuneração.

119. Conforme referi supra, e contrariamente aos argumentos expostos pelo Reino Unido na sua petição, o artigo 94.°, n.° 1, alínea g) não impõe um «limite» à remuneração variável. É o que resulta claramente do facto de não ser imposto qualquer limite ao montante da remuneração fixa que os indivíduos podem auferir, pelo que o rácio de 100% estabelecido no artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea i), da Diretiva CRD IV pode ser aplicado a qualquer importância que uma instituição financeira esteja disposta a pagar a título de remuneração fixa. O facto de o rácio aplicável à remuneração variável não ter qualquer efeito «limitador» é confirmado pelo disposto no artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea ii), da Diretiva CRD IV, que, em qualquer caso, prevê um mecanismo para aumentar o rácio para 200% e, simultaneamente, permite que os Estados‑Membros fixem o rácio máximo num nível inferior a 100%.

120. Por conseguinte, considero que o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV e o limite à remuneração variável nele previsto não têm um impacto direto no nível de remuneração das pessoas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação. A referida disposição limita‑se a estabelecer um rácio entre a componente fixa e a componente variável sem afetar o nível da remuneração per se. Esse nível depende da componente fixa da remuneração acordada entre a entidade patronal e o trabalhador quando adicionada à componente variável. Uma vez que a componente fixa não está sujeita a qualquer limite legal, também não existe limite para o nível total da remuneração (86).

121. Em conclusão, considero que o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), da Diretiva CRD IV não impõe nenhum limite relativamente ao nível da remuneração. Estabelece apenas uma estrutura de remuneração sob a forma de um rácio entre a componente fixa e a componente variável da remuneração a fim de evitar a assunção de riscos excessivos. Tal constitui um objetivo legítimo para garantir que a liberdade de estabelecimento das instituições financeiras e a livre prestação de serviços financeiros com base numa autorização única e no princípio do controlo pelo país de origem possam funcionar, com total segurança, no mercado interno da UE (87). Além disso, o Tribunal de Justiça confirmou a compatibilidade com o direito da UE das medidas que têm apenas um nexo indireto com o nível da remuneração (88).

122. No que respeita à escolha do artigo 114.° TFUE como base jurídica do artigo 450.°, n.° 1, alíneas d), i) e j), do Regulamento CR, o Reino Unido alega que o recurso ao artigo 114.°, n.° 1, TFUE está excluído por força da exceção prevista no artigo 114.°, n.° 2, TFUE.

123. Tendo em conta a análise que fiz do quinto fundamento, tenho dificuldade em perceber como é que as obrigações de divulgação previstas no artigo 450.°, n.° 1, do Regulamento CR dificilmente podem ser consideradas disposições relevantes para os «direitos e interesses dos trabalhadores assalariados» na aceção do artigo 114.°, n.° 2, TFUE, uma vez que a referida disposição vincula apenas as instituições financeiras e não os seus trabalhadores, que continuam protegidos pela Carta e pelo direito da UE relativo à proteção de dados. Além disso, a interpretação do artigo 114.°, n.° 2, TFUE, defendida pelo Reino Unido, impediria que qualquer ação da União ao abrigo do artigo 114.° TFUE tivesse uma incidência no domínio do trabalho. Tal contrariaria o disposto no artigo 114.°, n.os 4 e 5, TFUE, que permite a regulamentação de questões relacionadas com o ambiente de trabalho com base no artigo 114.° TFUE.

124. Por estes motivos, o primeiro fundamento da anulação deve também ser julgado improcedente.

V –    Quanto às despesas

125. Uma vez que, segundo a solução que proponho, o Reino Unido é a parte vencida e o Conselho e o Parlamento Europeu pediram a sua condenação nas despesas, o Reino Unido deve ser condenado nas despesas, em conformidade com o artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo. Por outro lado, a Comissão, na qualidade de interveniente, deve suportar as suas próprias despesas, em conformidade com o artigo 140.°, n.° 1, do Regulamento de Processo.

VI – Conclusão

126. À luz das observações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça negue provimento ao recurso, condene a Comissão a suportar as suas próprias despesas e condene o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte nas despesas do Conselho e do Parlamento Europeu.


1 – Língua original: inglês.


2 – JO L 176, p. 338.


3 – JO L 176, p. 1.


4 – Nas presentes conclusões, será utilizado o termo «responsáveis pela assunção de riscos significativos» para descrever este tipo de trabalhadores. Porém, chamo a atenção para o facto de a legislação não ser totalmente uniforme no termo escolhido para os identificar (v. artigos 92.°, n.° 2, e 94.°, n.° 2, da Diretiva CRD IV e artigo 450.°, n.° 1, do Regulamento CR).


5 – É este o termo que tem sido utilizado nos órgãos de comunicação social para descrever o sistema. Observo que a Diretiva CRD IV não é o primeiro texto em que o legislador da União tentou regulamentar os bónus e os suplementos de salários. V., por exemplo, artigo 10.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 561/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, relativo à harmonização de determinada disposição em matéria social no domínio dos transportes rodoviários, que altera os Regulamentos (CEE) n.° 3821/85 e (CEE) n.° 2135/98 do Conselho e revoga o Regulamento (CEE) n.° 3820/85 do Conselho (JO L 102, p. 1).


6 – V. COM(2012) 778 final, ponto 3.1. Entre 2008 e 2011, o montante global de auxílios utilizados em termos de garantias, medidas de recapitalização, medidas de apoio a ativos depreciados e injeções de liquidez ascendeu a 1 600 mil milhões de euros, o que corresponde a 12,8% do PIB da UE.


7 – JO L 126, p. 1.


8 – JO L 141, p. 1.


9 – JO L 177, p. 1.


10 – JO L 177, p. 201.


11 – Diretiva 2009/111/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, que altera as Diretivas 2006/48/CE, 2006/49/CE e 2007/64/CE no que diz respeito aos bancos em relação de grupo com instituições centrais, a determinados elementos relativos aos fundos próprios, a grandes riscos, a disposições relativas à supervisão e à gestão de crises (JO 2009, L 302 p. 97).


12 – Diretiva 2010/76/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que altera as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE no que diz respeito aos requisitos de fundos próprios para a carteira de negociação e para retitularizações, bem como à análise das políticas de remuneração pelas autoridades de supervisão (JO 2010, L 329 p. 3).


13 – Segundo o considerando (3) da Diretiva CRD III, «[a] fim de ter em conta o efeito potencialmente nocivo de estruturas de remuneração inadequadamente concebidas para uma gestão sã dos riscos e de controlo de comportamentos de assunção de riscos por parte de indivíduos, os requisitos da Diretiva 2006/48/CE deverão ser complementados impondo expressamente às instituições de crédito e às empresas de investimento o estabelecimento e manutenção, no que diz respeito às categorias de pessoal cujas atividades profissionais tenham um impacto significativo no respetivo perfil de risco, de políticas e práticas de remuneração consentâneas com uma gestão de riscos eficaz. Estas categorias de pessoal deverão compreender, pelo menos, a direção e os responsáveis pela assunção de riscos e pelas funções de controlo, bem como todos os empregados cuja remuneração total, incluindo as provisões para benefícios discricionários de pensão, os coloque no mesmo escalão de remuneração que os membros da direção e os responsáveis pela assunção de riscos.»


14 – COM(2010) 284 final, em especial, ponto 5.7 intitulado «Remuneração».


15 – V. artigo 90.°, n.° 1, alínea f), no Relatório sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento e que altera a Diretiva 2002/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à supervisão complementar de instituições de crédito, empresas de seguros e empresas de investimento de um conglomerado financeiro (A 7‑0170/2012), de 30 de maio de 2012.


16 – V. a ordem do dia provisória da 3227.ª reunião do Conselho, de março de 2013 (6864/13) e o resumo do debate no Conselho de 5 de março de 2012, publicado posteriormente.


17 – As únicas disposições da Diretiva CRD IV relacionadas com remuneração que o Reino Unido impugna são o artigo 94.°, n.° 1, alínea g) e o artigo 94.°, n.° 2. Embora o artigo 94.°, n.° 1, alínea g), subalínea iii), esteja abrangido pelo pedido do recorrente, não é discutido em pormenor no recurso.


18 – V., também, Relatório Liikanen do Grupo de Peritos de Alto Nível sobre a reforma estrutural do setor bancário da UE, Bruxelas, 2 de outubro de 2012, ponto 4.2.5.


19 – O Reino Unido remete aqui para Jennings, R., e Watts, A. (eds) Oppenheim’s International Law, 9.ª ed, Longman, Harlow, vol. 1, «Peace», a p. 456; porém, na minha opinião, os autores não subscrevem a tese de que o efeito da competência legislativa dos Estados se deve limitar aos comportamentos verificados no seu próprio território. Pelo contrário, na nota 2 daquela página, os autores remetem para o acórdão Lotus no qual o Tribunal Permanente de Justiça Internacional declarou que o direito internacional deixa geralmente aos Estados um «elevado grau de discricionariedade» na aplicação das suas leis limitado em certos casos por normas de proibição.


20 – Acórdão Air Transport Association of America e o., C‑366/10, EU:C:2011:864, n.° 110.


21 – V., também, artigo 3.°, n.° 36, da Diretiva CRD IV, nos termos do qual entende‑se por «autoridade competente» «uma autoridade competente na aceção do artigo 4.°, n.° 1, ponto 40), do Regulamento (UE) n.° 575/2013».


22 – V. acórdãos Imperial Chemical Industries/Comissão, 48/69, EU:C:1972:70 e Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, C‑89/85, C‑104/85, C‑114/85, C‑116/85, C‑117/85 e C‑125/85 a C‑129/85, EU:C:1988:447.


23 – Acórdão do Tribunal Permanente de Justiça Internacional (TPJI) de 7 de setembro de 1927, Lotus (França/Turquia), C. P. J. I. Recueil 1927, série A, n.° 10, p. 25.


24 – Conclusões apresentadas no processo Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, 89/85, 104/85, 114/85, 116/85, 117/85 e 125/85 a 129/85, EU:C:1988:258, n.os 27 a 30.


25 – Segundo a doutrina, os elementos essenciais do dictum do TPJI no acórdão Lotus ainda são válidos. V., por exemplo, acórdão do TIJ no processo relativo ao mandado de detenção de 11 de abril de 2000 (Rep. Dem. Congo c. Bélg.), acórdão de 14 de fevereiro de 2002, Coletânea TPJI 2002, p. 3; Parecer autónomo do Presidente Guillaume, n.os 13 a 16; Parecer consultivo do TIJ sobre a legalidade da ameaça das armas nucleares, Coletânea 1996, p. 226, Declaração do Presidente Bedajaoui, n.os 13 a 15. Sobre o debate da questão, v. Juillard, P., L’application extraterritoriale de la loi économique in Bazex, M. et al (eds), L’application extraterritoriale du droit economique (1986) e Koziel, T., «Extraterritorial Application of EU Environmental Law‑Implications of the ECJ’s Judgment in Air Transport Association of America», The Columbia Journal of European Law 19(2012) F1; Pazartis, P., «Judicial Activism and Judicial Self‑Restraint: the PCIJ’s Lotus Case» Legacies of the Permanent Court of International Justice, in Tams, C. J., e Fitzmaurice M., Martinus Nijhoff, Leiden, 2013, p. 319.


26 – Aparentemente existe consenso entre vários autores quanto ao facto de o direito internacional contemporâneo se ter afastado da presunção estabelecida no acórdão Lotus relativamente à liberdade dos Estados de decidirem sobre a aplicabilidade da sua legislação dentro dos limites estabelecidos pelas normas imperativas de direito internacional, passando a exigir a existência de uma relação ou conexão «suficiente» entre um Estado e o comportamento extraterritorial de nacionais de países terceiros para que o primeiro possa exercer a sua competência normativa. Para um contributo influente, v. Mann, F. A., The Doctrine of Jurisdiction in International Law, Recueil des Cours 1964:1, vol. 111.


27 – Sobre a competência universal, v. O’Keefe, R., «Universal Jurisdiction Clarifying the Basic Concept», Journal of International Criminal Justice 2 (2004) p. 735.


28 – Processo Island of Palmas (ou Miangas), Estados Unidos/Países Baixos, decisão de 4 de abril de 1928 (II RIAA 829).


29 – Acórdão do TIJ no processo Pescas Anglo‑Norueguesas (Reino Unido c. Noruega), Coletânea 1951, p. 116.


30 – Acórdão do TIJ no processo Nottebohm (Listenstaine c. Guatemala), Coletânea 1955, p. 4.


31 – Acórdão do TIJ no processo relativo ao mandado de detenção de 11 de abril de 2000 (República Democrática do Congo c. Bélgica), Coletânea 2002, p. 1.


32 – Conclusões apresentadas no processo Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, EU:C:1988:258, n.° 24.


33 – JO L 281, p. 31.


34 – C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662.


35 – JO L 8, p. 1.


36 – Acórdão Volker und Markus Schecke e Eifert, EU:C:2010:662, n.° 86.


37 – Acórdão NS, C‑411/10 e C‑493/10, EU:C:2011:865.


38 – Acórdão Meroni/Alta Autoridade, 10/56, EU:C:1958:8.


39 – JO L 331, p. 12.


40 – Acórdão Comissão/Parlamento e Conselho, C‑427/12, EU:C:2014:170, n.° 38.


41 – Acórdão Meroni/Alta Autoridade, EU:C:1958:8, pp. 171 a 172.


42 – Acórdão Comissão/Parlamento e Conselho, C‑427/12, EU:C:2014:170, n.° 38.


43 – V. debate deste tópico nas minhas conclusões apresentadas no processo Reino Unido/Conselho e Parlamento, C‑270/12, EU:C:2013:562.


44 – Acórdãos Racke, 98/78, EU:C:1979:14 n.° 20 e Países Baixos/Conselho, C‑110/97, EU:C:2001:620, n.° 151.


45 – Acórdão Pokrzeptowicz‑Meyer, C‑162/00, EU:C:2002:57, n.° 52. V., também, acórdãos Saldanha e MTS, C‑122/96, EU:C:1997:458, n.° 14, e Elektrownia Pątnów II, C‑441/08, EU:C:2009:698, n.° 32. V., ainda, acórdão Gemeinde Altrip e o., C‑72/12, EU:C:2013:712, no qual o Tribunal de Justiça declara, no n.° 22 que, «em princípio, uma norma jurídica nova é aplicável a partir da entrada em vigor do ato que a instaura. Embora não seja aplicável às situações jurídicas nascidas e definitivamente fixadas na vigência da lei anterior, aplica‑se aos efeitos futuros destas, bem como às situações jurídicas novas. Só assim não será, e com a ressalva do princípio da não retroatividade dos atos jurídicos, se a norma nova for acompanhada de disposições especiais que determinam as suas regras de aplicação no tempo». Citando os acórdãos Monsanto Technology, C‑428/08, EU:C:2010:402, n.° 66 e acórdão Stichting Natuur en Milieu e o., C‑266/09, EU:C:2010:779, n.° 32.


46 – V., nomeadamente, acórdão Kone e o./Comissão, C‑510/11 P, EU:C:2013:696, n.° 76 e jurisprudência aí referida.


47 – V., nomeadamente, acórdão Accrington Beef e o., C‑241/95, EU:C:1996:496, n.° 33.


48 – Ibidem, n.° 36.


49 – V., neste sentido, acórdão Grécia/Comissão, C‑86/03, EU:C:2005:769, n.° 71. Um exemplo típico foi aquele que se verificou quando a UE não tomou medidas relativas às mercadorias em trânsito afetadas por alterações introduzidas com efeito imediato no direito aduaneiro da União. V., nomeadamente, acórdão Sofrimport/Comissão, C‑152/88, EU:C:1990:259.


50 – Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 22 de setembro de 1994, n.° 42, série A n.° 296‑A.


51 – Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (n.° 26449/95), n.° 54, de 9 de novembro de 1999.


52 – Acórdão Teleos e o., C‑409/04, EU:C:2007:548.


53 – Acórdão Test Claimants in the Franked Investment Income Group Litigation, C‑362/12, EU:C:2013:834, n.° 44.


54 – Esta disposição menciona, por exemplo, a direção de topo, os responsáveis pela assunção de riscos e pelas funções de controlo e todos os elementos do pessoal cuja remuneração total os coloque no mesmo escalão de remuneração que a direção de topo e os responsáveis pela assunção de riscos cujas atividades profissionais têm um impacto significativo no respetivo perfil de risco. V., também, Anexo I da Diretiva CRD III, referida no n.° 84 infra.


55 – Acórdãos Racke, EU:C:1979:14, n.° 20, e Países Baixos/Conselho, EU:C:2001:620, n.° 151.


56 – V. COM (2010) 0284 final, ponto 5.7., intitulado «Remuneração».


57 – V., nomeadamente, o considerando 71 da Proposta de regulamento na COM (2011) 0452 final, bem como os considerandos (49) (61) e os artigos 74.°, 88.° a 91.° da Proposta de diretiva na COM (2011) 0453 final.


58 – V. relatório A7‑0170/2012.


59 – Artigo 5.°, n.os 1 e 4, TFUE.


60 – Artigo 5.°, n.os 1 e 3, TFUE.


61 – Nas suas observações escritas o Reino Unido faz uma referência à compatibilidade das obrigações de divulgação com o princípio da subsidiariedade. Contudo, uma vez não desenvolve esta parte nas observações limitarei a minha análise das obrigações de publicação à sua conformidade com o princípio de proporcionalidade.


62 – JO 2003 C 321, p. 1.


63 – O Reino Unido invoca, nesta matéria, o acórdão Luxemburgo/Parlamento e Conselho, C‑176/09, EU:C:2011:290.


64 – Acórdãos Eurotunnel e o., C‑408/95, EU:C:1997:532, n.os 37 a 39, e Comissão/Conselho, 355/87, EU:C:1989:220, n.os 42 a 44.


65 – Acórdão Afton Chemical, C‑343/09, EU:C:2010:419, n.os 30 e 57.


66 – Ibidem, n.° 33.


67 – Ibidem, n.° 34.


68 – V., neste sentido, ibidem, n.os 35 a 41.


69 – Acórdãos Vodafone e o., C‑58/08, EU:C:2010:321, n.° 52, e Comissão/conselho, C‑117/10, EU:C:2013:786, n.° 113.


70 – Acórdão Espanha/Conselho, C‑310/04, EU:C:2006:521, n.os 121 a 123.


71 – V. acórdão Digital Rights Ireland, C‑293/12 e C‑594/12, EU:C:2014:238, n.° 47, e jurisprudência aí referida.


72 – V. acórdãos Reino Unido/Conselho, C‑84/94, EU:C:1996:431, n.° 58; e British American Tobacco (Investments) e Imperial Tobacco, C‑491/01, EU:C:2002:741, n.° 123.


73 – Voltarei infra na análise do primeiro fundamento sobre a preocupação do Reino Univo relativa ao artigo 114.°, n.° 2, TFUE.


74 – Estas informações agregadas não são análogas às informações detalhadas sobre a remuneração de indivíduos identificados e a sua compatibilidade com a legislação da UE sobre proteção de dados foi já analisada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Österreichischer Rundfunk e o. (C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, EU:C:2003:294) e Satakunnan Markkinapörssi e Satamedia (C‑73/07, EU:C:2008:727).


75 – Acórdão Alemanha/Parlamento e Conselho, C‑233/94, EU:C:1997:231, n.os 13 e 15.


76 – Nos termos dos artigos 33.° e 34.°, da Diretiva CRD IV, as instituições financeiras autorizadas podem exercer as suas atividades nos territórios de outros Estados‑Membros com base na autorização que lhes foi concedida no Estado‑Membro de origem.


77 – Acórdãos Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.os 40 e 46, e Impact, C‑268/06, EU:C:2008:223, n.° 123; e Bruno e Pettini, C‑395/08 e C‑396/08, EU:C:2010:28, n.° 36.


78 – Acórdãos Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:3, n.° 39 e Impact, C‑268/06, EU:C:2008:2, n.° 171.


79 – V., nomeadamente, acórdão Bruno e Pettini, C‑395/08 e C‑396/08, EU:C:2010:329, n.° 39. V., também, acórdão Impact, EU:C:2008:223, n.° 129.


80 – Acórdão Lock, C‑539/12, EU:C:2014:351 n.os 29 a 33 e jurisprudência aí referida.


81 – Acórdão Del Cerro Alonso, EU:C:2007:509, n.° 46.


82 – Acórdão Impact, EU:C:2008:223, n.° 124.


83 – Acórdãos Bruno e Pettini, EU:C:2010:28, n.os 36 e 37, Del Cerro Alonso, EU:C:2007:507, n.os 40, 44 a 46 e Impact, EU:C:2008:223, n.os 123 a 124; e conclusões da advogada‑geral J. Kokott apresentadas no processo Impact, C‑268/06, EU:C:2008:2, n.° 173.


84 – Conclusões da advogada‑geral J. Kokott apresentadas no processo Impact, EU:C:2008:2, n.° 174.


85 – Ibidem, n.os 172 a 173


86 – Esta conclusão não é posta em causa pelas alegadas consequências factuais da introdução de um rácio fixo, ou seja, o aumento das componentes fixas da remuneração ou a diminuição da remuneração total dos responsáveis pela assunção de riscos significativos.


87 – V. nota 76 supra.


88 – É o caso, por exemplo, das medidas da UE relacionadas com antidiscriminação, os trabalhadores destacados e a duração do trabalho. No contexto da jurisprudência do Tribunal de Justiça, v., nomeadamente, o acórdão Del Cerro Alonso, EU:C:2007:509, em que o Tribunal de Justiça referiu, no n.° 41, que a exceção relativa às remunerações «não pode ser alargada a toda e qualquer questão que apresente um nexo com a remuneração, sob pena de esvaziar de uma boa parte da sua substância certos domínios visados pelo artigo 137.°, n.° 1, CE», e Impact, EU:C:2008:223, no qual o Tribunal de Justiça declarou, no n.° 125, que a referida exceção «não pode ser alargada a todas as questões que apresentem um nexo com a remuneração, sob pena de esvaziar de boa parte da sua substância certos domínios visados pelo artigo 137.°, n.° 1, CE» no qual cita o acórdão Del Cerro Alonso, EU:C:2007:509, n.° 41.