Language of document : ECLI:EU:C:2016:552

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 13 de julho de 2016 (1)

Processos apensos C154/15, C307/15 e C308/15

Francisco Gutiérrez Naranjo

contra

Cajasur Banco, SAU (C‑154/15),

e

Ana María Palacios Martínez

contra

Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, SA (C‑307/15),

e

Banco Popular Español, SA

contra

Emilio Irles López,

Teresa Torres Andreu (C‑308/15)

[pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada, Espanha) (processo C‑154/15) e pela Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante, Espanha) (processos C‑307/15 e C‑308/15)]

«Reenvio prejudicial — Contratos celebrados com os consumidores — Cláusulas abusivas — Poderes do juiz nacional — Declaração de nulidade — Efeitos — Obrigação de restituição das quantias recebidas com fundamento numa cláusula declarada abusiva — Não retroatividade — Conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13/CEE»






Índice



I  —Quadro jurídico

A  —Diretiva 93/13

B  —Direito espanhol

1. Disposições normativas

2. Jurisprudência do Tribunal Supremo

a) Acórdão de 9 de maio de 2013

b) Acórdãos de 25 de março de 2015 e de 29 de abril de 2015

II  —Factos, litígios no processo principal e questões prejudiciais

A  —Processo C154/15

B  —Processos C307/15 e C308/15

1. Processo C307/15

2. Processo C308/15

3. Questões prejudiciais nos processos C307/15 e C308/15

III  —Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

A  —Quanto ao pedido de tramitação acelerada dos processos C307/15 e C308/15

B  —Quanto à tramitação do procedimento escrito e do procedimento oral

IV  —Análise jurídica

A  —Quanto às questões prejudiciais, consideradas conjuntamente, do processo C154/15 e quanto à primeira questão comum aos processos C307/15 e C308/15

1. Quanto ao nível de proteção conferido aos consumidores pela jurisprudência do Tribunal Supremo por comparação com o estabelecido pela Diretiva 93/13

2. Quanto ao alcance da obrigação imposta aos EstadosMembros pelo artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13

a) Uma interpretação literal pouco esclarecedora

b) Análise da jurisprudência

c) Aplicação ao caso em apreço

B  —Quanto às outras questões prejudiciais

V  —Conclusão


1.        Os órgãos jurisdicionais espanhóis contribuíram de maneira significativa para o desenvolvimento da jurisprudência respeitante à Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores , submetendo ao Tribunal de Justiça, por diversas vezes, questões prejudiciais que levaram este último a esclarecer a interpretação desta diretiva. Hoje, é o contencioso relativo às cláusulas de limitação da taxa de juro variável (cláusulas «suelo») inseridas nos contratos de mútuo celebrados com os consumidores que ocupam os tribunais espanhóis e, incidentalmente, o Tribunal de Justiça (2). Essas cláusulas preveem que a instituição bancária que concede um empréstimo hipotecário a taxa variável aplique um limite mínimo à variação da taxa de juro de tal forma que, mesmo que a taxa de juro aplicável seja inferior a um determinado limiar (ou «suelo»), o consumidor continua a pagar juros mínimos, equivalentes a esse limiar.

2.        Os presentes processos suscitam uma questão de princípio que não incide tanto sobre as cláusulas «suelo» propriamente ditas quanto sobre os efeitos que devem acompanhar a declaração do caráter abusivo dessas cláusulas. O contexto em que esta questão se levanta é específico na medida em que põe em confronto uma série de acórdãos proferidos pelo Tribunal Supremo, pelos quais este último declarou que os consumidores só podem obter o reembolso das quantias que pagaram aos organismos financeiros, com fundamento em cláusulas «suelo» a partir da data do seu primeiro acórdão que declarou a nulidade das referidas cláusulas com base no seu caráter abusivo, a saber, em 9 de maio de 2013.

I –    Quadro jurídico

A –    Diretiva 93/13

3.        Resulta do quarto considerando da Diretiva 93/13 «que compete aos Estados‑Membros providenciar para que não sejam incluídas cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores».

4.        O décimo segundo considerando da Diretiva 93/13 enuncia que, «na atual situação das legislações nacionais, apenas se poderá prever uma harmonização parcial; […] que há que deixar aos Estados‑Membros a possibilidade de, no respeito pelo Tratado CEE, assegurarem um nível de proteção mais elevado do consumidor através de disposições nacionais mais rigorosas do que as da presente diretiva».

5.        No décimo sexto considerando da Diretiva 93/13, o legislador da União precisou que «a apreciação, segundo os critérios gerais estabelecidos, do caráter abusivo das cláusulas, […] necessita de ser completada por um instrumento de avaliação global dos diversos interesses implicados; que tal consiste na exigência de boa‑fé; que, na apreciação da boa‑fé, é necessário dar especial atenção à força das posições de negociação das partes […]; que a exigência de boa‑fé pode ser satisfeita pelo profissional, tratando de forma leal e equitativa com a outra parte, cujos legítimos interesses deve ter em conta».

6.        O décimo oitavo considerando da Diretiva 93/13 afirma que «a natureza dos bens ou serviços deverá influir na apreciação do caráter abusivo das cláusulas contratuais».

7.        O vigésimo considerando da Diretiva 93/13 exige que «os contratos devem ser redigidos em termos claros e compreensíveis, […] o consumidor deve efetivamente ter a oportunidade de tomar conhecimento de todas as cláusulas e […], em caso de dúvida, deve prevalecer a interpretação mais favorável ao consumidor».

8.        O vigésimo primeiro considerando da Diretiva 93/13 prevê que «os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para evitar a presença de cláusulas abusivas em contratos celebrados entre profissionais e consumidores; […] se apesar de tudo essas cláusulas constarem dos contratos, os consumidores não serão por elas vinculados, continuando o contrato a vincular as partes nos mesmos termos, desde que possa subsistir sem as cláusulas abusivas».

9.        O vigésimo quarto considerando da Diretiva 93/13 enuncia que «as autoridades judiciárias […] devem dispor de meios adequados e eficazes para pôr termo à aplicação das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores».

10.      Nos termos do artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 93/13:

«1.      Uma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa‑fé, der origem a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato.

2.      Considera‑se que uma cláusula não foi objeto de negociação individual sempre que a mesma tenha sido redigida previamente e, consequentemente, o consumidor não tenha podido influir no seu conteúdo, em especial no âmbito de um contrato de adesão.»

11.      O artigo 4.o da Diretiva 93/13 tem a seguinte redação:

«1.      Sem prejuízo do artigo 7.o, o caráter abusivo de uma cláusula poderá ser avaliado em função da natureza dos bens ou serviços que sejam objeto do contrato e mediante consideração de todas as circunstâncias que, no momento em que aquele foi celebrado, rodearam a sua celebração, bem como de todas as outras cláusulas do contrato, ou de outro contrato de que este dependa.

2.      A avaliação do caráter abusivo das cláusulas não incide nem sobre a definição do objeto principal do contrato nem sobre a adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os bens ou serviços a fornecer em contrapartida, por outro, desde que essas cláusulas se encontrem redigidas de maneira clara e compreensível.»

12.      O artigo 5.o da Diretiva 93/13 afirma que «[n]o caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. Em caso de dúvida sobre o significado de uma cláusula, prevalecerá a interpretação mais favorável ao consumidor».

13.      O artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 dispõe que «[o]s Estados‑Membros estipularão que, nas condições fixadas pelos respetivos direitos nacionais, as cláusulas abusivas constantes de um contrato celebrado com um consumidor por um profissional não vinculem o consumidor e que o contrato continue a vincular as partes nos mesmos termos, se puder subsistir sem as cláusulas abusivas».

14.      O artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 enuncia que «[o]s Estados‑Membros providenciarão para que, no interesse dos consumidores e dos profissionais concorrentes, existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional».

15.      O artigo 8.o da Diretiva 93/13 prevê que «[o]s Estados‑Membros podem adotar ou manter, no domínio regido pela presente diretiva, disposições mais rigorosas, compatíveis com o Tratado, para garantir um nível de proteção mais elevado para o consumidor».

B –    Direito espanhol

1.      Disposições normativas

16.      Nos termos do artigo 1303.o do Código Civil, que define as consequências que decorrem da declaração de nulidade, «[d]eclarada a nulidade de uma obrigação, deve ser reciprocamente restituído por cada um dos contratantes tudo o que tiver sido prestado, com os respetivos frutos, bem como o preço acrescido de juros».

17.      Em conformidade com o artigo 83.o da Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios y otras leyes complementarias (Lei geral de proteção dos consumidores e utilizadores e outras leis complementares, a seguir «LGDCU») (3), «[a]s cláusulas abusivas são nulas de pleno direito e consideram‑se não escritas. Para tal, após audição das partes, o juiz declara a nulidade das cláusulas abusivas incluídas no contrato; no entanto, o contrato continua a vincular as partes nos mesmos termos, caso possa subsistir sem as cláusulas abusivas».

2.      Jurisprudência do Tribunal Supremo

a)      Acórdão de 9 de maio de 2013

18.      No seu acórdão de 9 de maio de 2013 (4), o Tribunal Supremo debruçou‑se, no âmbito de uma ação coletiva intentada por uma associação de consumidores contra três estabelecimentos bancários, sobre o caráter abusivo das cláusulas «suelo».

19.      O Tribunal Supremo concluiu que, uma vez que eram indissociáveis do preço ou da contrapartida, as cláusulas «suelo» enquadravam‑se no objeto principal do contrato, de forma que, em princípio, não era possível fiscalizar o caráter abusivo do seu conteúdo. No entanto, na medida em que o Tribunal de Justiça tinha permitido o exercício de uma fiscalização jurisdicional das cláusulas que definem o objeto principal do contrato, a fim de assegurar ao consumidor um nível mais elevado de proteção, o Tribunal Supremo considerou que podia proceder à análise do eventual caráter abusivo das cláusulas «suelo» com o fundamento de que o acórdão de 3 de junho de 2010, Caja de Ahorros y Monte de Piedad de Madrid (5) o habilitava a exercer uma fiscalização que não se limitava simplesmente a verificar se as cláusulas estavam redigidas com clareza. O Tribunal Supremo reconheceu que a redação do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 abrangia apenas uma fiscalização da transparência formal das cláusulas que definem o objeto principal do contrato. Todavia, em conformidade com a forma como interpretou o acórdão do Tribunal de Justiça, de 3 de junho de 2010, Caja de Ahorros y Monte de Piedad de Madrid (6), declarou que, além desse primeiro filtro de transparência, os órgãos jurisdicionais espanhóis podiam submeter essas cláusulas a uma segunda fiscalização, mais exigente que o previsto pela Diretiva 93/13, fundado no artigo 80.o, n.o 1, da LGDCU (7). Segundo o Tribunal Supremo, esta disposição estabelece um segundo filtro de transparência que consiste em analisar se o consumidor conhecia ou podia facilmente conhecer o encargo económico e jurídico que o contrato lhe impunha. Embora o Tribunal Supremo tenha declarado que as cláusulas «suelo» eram lícitas, na medida em que respondiam às exigências legais de transparência, e conformes com a primeira fiscalização de transparência, decidiu de outra forma no que se refere à segunda fiscalização (8). Consequentemente, qualificou de «abusivas» as cláusulas «solo», declarou a sua nulidade, embora mantendo a validade dos contratos em que estão incluídas e ordenou aos três estabelecimentos bancários partes nesse processo que suprimissem essas cláusulas dos contratos em vigor e deixassem de as utilizar.

20.      Pelo facto de considerar ter aplicado ex novo uma fiscalização reforçada da transparência das cláusulas controvertidas, o Tribunal Supremo, a pedido do Ministério Público, limitou no tempo os efeitos do seu acórdão. Assim, declarou que a retroatividade podia ser limitada em aplicação dos princípios da segurança jurídica, da equidade e da proibição do enriquecimento sem causa e verificou a presença dos dois critérios exigidos pelo Tribunal de Justiça quando é solicitado a limitar no tempo os efeitos dos seus próprios acórdãos, a saber, a boa‑fé dos meios interessados e o risco de perturbações económicas graves (9). Em consequência dessa análise (10), decidiu que a declaração de nulidade não afeta as situações definitivamente resolvidas por decisões judiciais transitadas em julgado nem os pagamentos efetuados antes da data de publicação do acórdão de 9 de maio de 2013.

b)      Acórdãos de 25 de março de 2015 e de 29 de abril de 2015

21.      Em 25 de março de 2015 e em 29 de abril de 2015 (11), enquanto decidia no âmbito de duas ações individuais intentadas contra um dos estabelecimentos de crédito recorridos no processo coletivo que deu origem ao acórdão de 9 de maio de 2013, o Tribunal Supremo considerou que as circunstâncias de facto eram idênticas às na origem da sua decisão de 9 de maio de 2013. Por conseguinte, confirmou o caráter abusivo das cláusulas «suelo». Além disso, considerou estar perante as mesmas considerações relativas à segurança jurídica, à boa‑fé e aos riscos de perturbações económicas graves. Nestas condições, restringiu os efeitos no tempo dos seus acórdãos de 25 de março de 2015 e de 29 de abril de 2015, limitando a obrigação de restituir as quantias pagas por força das cláusulas «suelo» às pagas depois da publicação do acórdão de 9 de maio de 2013, data a partir da qual deixou de existir a boa‑fé dos meios interessados.

II – Factos, litígios no processo principal e questões prejudiciais

A –    Processo C154/15

22.      Francisco Gutiérrez Naranjo celebrou com a Cajasur Banco, SAU, um contrato de mútuo hipotecário no qual se inseriu uma cláusula «suelo». F. Gutiérrez Naranjo intentou no Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada), por um lado, uma ação inibitória em relação a essa cláusula contratual pelo facto de se tratar de uma cláusula abusiva e, por outro, uma ação de restituição das quantias pagas, desde a assinatura do contrato de mútuo, por força da cláusula alegadamente abusiva.

23.      O Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada) recorda o sentido do acórdão proferido pelo Tribunal Supremo em 9 de maio de 2013 e invoca uma aplicação divergente deste acórdão pelos órgãos jurisdicionais comuns espanhóis, nomeadamente quanto à sua possível transposição no contexto de uma ação já não coletiva mas individual. Além disso, se se deve considerar possível não autorizar a restituição das quantias recebidas por força de uma cláusula declarada abusiva a partir da celebração do contrato que contém a referida cláusula, o Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada) interroga‑se quanto ao momento a partir do qual deve começar a restituição em questão. Também se interroga quanto à compatibilidade dessa limitação dos efeitos restitutórios da declaração de nulidade por caráter abusivo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (12), embora tenda a considerar que a limitação dos efeitos da nulidade não seja comparável com um eventual poder do juiz nacional de modular o conteúdo das cláusulas declaradas abusivas.

24.      Assim, confrontado com uma dificuldade relacionada com a interpretação do direito da União, o Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada) decidiu suspender a instância e, por decisão que deu entrada na secretaria do Tribunal de Justiça em 1 de abril de 2015, submeter a este último as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Nestes casos, a interpretação no sentido da «não vinculação» efetuada pelo artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva [93/13], é compatível com uma interpretação que determine que a declaração de nulidade da referida cláusula não impede que a mesma seja considerada aplicável até à data dessa declaração? E entender‑se‑á, assim, que embora seja declarada nula, os efeitos produzidos durante a sua vigência não serão eles próprios inválidos ou ineficazes?

2)      A eventual inibição da utilização de uma determinada cláusula (em conformidade com os artigos 6.o, n.o 1, e 7.o, n.o 1 [, da Diretiva 93/13]) quando, numa ação individual instaurada por um consumidor, se declare a respetiva nulidade, é compatível com uma limitação dos efeitos dessa nulidade? Podem os tribunais condenar o profissional na devolução das quantias pagas pelo consumidor em virtude dessa cláusula, posteriormente declarada nula ex tunc por insuficiência de informação e/ou falta de transparência?»

B –    Processos C307/15 e C308/15

1.      Processo C‑307/15

25.      Ana Maria Palacios Martínez celebrou, em 28 de julho de 2006, um contrato de mútuo hipotecário com o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, SA (a seguir «BBVA»), o qual incluía uma cláusula «suelo». Em 6 de março de 2014, A. M. Palacios Martínez intentou uma ação contra o BBVA destinada a obter a declaração de nulidade dessa cláusula com fundamento no seu caráter abusivo. Em 3 de novembro de 2014, o Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Alicante (Tribunal do Comércio n.o 1 de Alicante) declarou que a ação intentada deixara de ter objeto (13), sem prejuízo da restituição a A. M. Palacios Martínez das quantias que o BBVA recebeu em virtude da referida cláusula, a partir de 9 de maio de 2013, em conformidade com o declarado pelo Tribunal Supremo no seu acórdão de 9 de maio de 2013.

26.      A. M. Palacios Martínez interpôs recurso dessa sentença na Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante). Na sua opinião, as condições da restituição declaradas na primeira instância não eram conformes com o artigo 1303.o do Código Civil nem com o princípio, consagrado pela Diretiva 93/13, segundo o qual as cláusulas abusivas não vinculam os consumidores. Uma vez que as quantias recebidas pelo BBVA desde a data da celebração do contrato com A. M. Palacios Martínez até à data do acórdão do Tribunal Supremo foram‑no com fundamento numa cláusula contratual declarada abusiva, e porque a restituição das referidas quantias só é exigida a partir da data do referido acórdão, a cláusula abusiva vinculava então parcialmente o consumidor, embora a Diretiva 93/13 exija uma absoluta e incondicional ausência de caráter vinculativo a fim de garantir uma proteção integral do consumidor. Mesmo admitindo que os critérios de boa‑fé e de riscos de perturbações económicas graves fossem pertinentes para limitar, perante o juiz nacional, os efeitos da restituição de quantias pagas em virtude de uma cláusula declarada abusiva, A. M. Palacios Martínez contesta que a boa‑fé possa ser considerada em benefício do BBVA. Além disso, o BBVA não incorreria em nenhum risco grave se fosse condenado a restituir as quantias que A. M. Palacios Martínez lhe pagou com fundamento na cláusula «suelo» declarada abusiva. Se há algum risco económico, será bem maior aquele em que incorre a economia familiar desta consumidora.

2.      Processo C‑308/15

27.      Em 1 de junho de 2001, Emilio Irles López e Teresa Torres Andreu celebraram com o Banco Popular Español, SA (14), um contrato de mútuo hipotecário que contém uma cláusula «suelo». Em maio e em junho de 2007, o Banco Popular Español autorizou um aumento de capital e cada aumento deu lugar a uma revisão desta cláusula «suelo».

28.      E. Irles López e T. Torres Andreu intentaram uma ação no Juzgado de lo Mercantil n.o 3 de Alicante (Tribunal do Comércio n.o 3 de Alicante) destinada a obter a declaração de nulidade da cláusula «suelo» contida no contrato de 2001 e nos atos de novação posteriores. Por causa da sua falta de transparência essa cláusula devia ser, na sua opinião, considerada abusiva. Além disso, E. Irles López e T. Torres Andreu pediam que as suas prestações fossem recalculadas sem aplicação da cláusula controvertida e que o Banco fosse condenado a restituir‑lhes a diferença a partir da data da celebração do contrato.

29.      Em 10 de novembro de 2014, o Juzgado de lo Mercantil n.o 3 de Alicante (Tribunal do Comércio n.o 3 de Alicante) declarou a nulidade de pleno direito da cláusula «suelo» contida nos atos controvertidos, com fundamento no seu caráter abusivo. Também condenou o Banco Popular Español a restituir a E. Irles López e a T. Torres Andreu as quantias declaradas indevidamente recebidas com base nessa cláusula, acrescidas de juros, a contar da data da celebração do contrato.

30.      O Banco Popular Español interpôs recurso dessa sentença na Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante). Perante este tribunal de recurso, o Banco Popular Español contesta o caráter abusivo da cláusula «suelo» inserida no contrato de 2001 e alterada por duas vezes em 2007 e sustenta que forneceu informações suficientes aos seus cocontratantes. Em todo o caso, o Banco Popular Español argui o facto de o juiz de primeira instância, ao condená‑lo no reembolso retroativo das quantias pretensamente recebidas de forma indevida, se ter afastado da jurisprudência estabelecida pelo Tribunal Supremo no seu acórdão de 9 de maio de 2013. Consequentemente, a sentença de 10 de novembro de 2014 deve ser anulada.

3.      Questões prejudiciais nos processos C‑307/15 e C‑308/15

31.      A Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante) tem dúvidas quanto ao alcance da sanção das cláusulas abusivas. O artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 limita‑se a exigir que tais cláusulas não vinculem o consumidor, nas condições fixadas pelos direitos nacionais. A questão da restituição das quantias pagas com fundamento em cláusulas declaradas abusivas não é, a priori, harmonizada por esta diretiva. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio nestes dois processos pergunta‑se se seria contrário ao efeito útil, à finalidade dissuasiva e à proteção integral do consumidor, que a Diretiva 93/13 promove, interpretar o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 no sentido de que também não obriga os Estados‑Membros a organizar as condições de uma reparação aos consumidores aos quais tenham sido aplicadas essas cláusulas. Além disso, o referido órgão jurisdicional pergunta‑se se a limitação da restituição conforme decidida pelo Tribunal Supremo não é contrária à proibição dirigida ao juiz nacional, pelo Tribunal de Justiça, de rever ou de moderar o conteúdo das cláusulas declaradas abusivas. Uma vez que a jurisprudência do Tribunal de Justiça obriga os juízes nacionais a tirarem todas as consequências que decorrem, de acordo com o respetivo direito nacional, da qualificação de uma cláusula como «abusiva» (15), a questão está em saber se a ausência de caráter vinculativo das cláusulas abusivas prescrita pelo diretiva deve ser interpretada de maneira absoluta ou incondicional ou se é, pelo contrário, flexível. Por último, admitindo que os critérios previstos pelo Tribunal de Justiça para decidir limitar os efeitos retroativos dos seus próprios acórdãos são pertinentes numa situação como a analisada pelo Tribunal Supremo, a Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante) duvida que se possa estabelecer a boa‑fé dos bancos, que se encontram claramente numa posição de superioridade em relação aos consumidores. Quanto ao risco de perturbações económicas graves, o órgão jurisdicional de reenvio duvida que o Tribunal Supremo esteja verdadeiramente em presença desse risco, dado que se baseou apenas no seu caráter «notório» sem estabelecer circunstâncias qualitativas ou quantitativas específicas.

32.      Assim, confrontado com uma dificuldade relacionada com a interpretação do direito da União, a Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante) decidiu suspender a instância e, por decisões que deram entrada na secretaria do Tribunal de Justiça em 25 de junho de 2015, submeter a este último as seguintes questões prejudiciais:

«1)      É compatível com o princípio da ‘não vinculação’ do consumidor, consagrado no artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva [93/13], que os efeitos restitutórios decorrentes da declaração de nulidade, por ser abusiva, de uma cláusula de limitação da taxa de juros variável (cláusula ‘suelo’) inserida num contrato de mútuo não sejam retroativos à data da conclusão do contrato mas a uma data posterior?

2)      O critério da boa‑fé dos círculos interessados, que constitui fundamento da limitação da eficácia retroativa decorrente de uma cláusula abusiva, é um conceito autónomo do direito da União que deve ser interpretado de maneira uniforme por todos os Estados‑Membros?

3)      Em caso de resposta afirmativa, que requisitos devem ser satisfeitos para determinar a existência da boa‑fé dos círculos interessados?

4)      É, em qualquer caso, compatível com a boa‑fé dos círculos interessados o comportamento do profissional [que,] na elaboração do contrato, deu origem à falta de transparência que está na origem do caráter abusivo da cláusula?

5)      O risco de perturbações graves, que constitui fundamento da limitação da eficácia retroativa decorrente de uma cláusula abusiva, é um conceito autónomo do direito da União que deve ser interpretado de maneira uniforme por todos os Estados‑Membros?

6)      Em caso de resposta afirmativa, quais os critérios a ter em conta?

7)      Deve o risco de perturbações graves ser valorado tendo apenas em conta o risco que possa correr o profissional ou deve também ser considerado o prejuízo ocasionado aos consumidores pela falta de restituição integral das quantias pagas por força da referida cláusula ‘suelo’?

[e, unicamente para o processo C‑308/15,]

8)      É compatível com o princípio da não vinculação do consumidor às cláusulas abusivas, consagrado no artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, e com o direito à proteção jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a extensão automática da mesma limitação dos efeitos restitutórios decorrentes da nulidade de uma cláusula ‘suelo’ declarada no âmbito de um processo instaurado por uma associação de consumidores contra [três] instituições financeiras às ações individuais de declaração de nulidade de uma cláusula ‘suelo’, por ser abusiva, intentadas pelos clientes consumidores que celebraram um mútuo hipotecário com instituições financeiras diferentes?»

III – Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

A –    Quanto ao pedido de tramitação acelerada dos processos C307/15 e C308/15

33.      Nos processos C‑307/15 e C‑308/15, o órgão jurisdicional de reenvio pediu ao Tribunal de Justiça para submeter os referidos processos a tramitação acelerada, em aplicação do artigo 23.o‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 105.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Esse pedido foi indeferido por despacho do Presidente do Tribunal de Justiça proferido em 14 de agosto de 2015.

B –    Quanto à tramitação do procedimento escrito e do procedimento oral

34.      Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça, de 10 de julho de 2015, os processos C‑307/15 e C‑308/15 foram apensados para efeitos do procedimento escrito e oral e do acórdão. Nestes processos, E. Irles López, o BBVA, o Banco Popular Español, os Governos espanhol, polaco e do Reino Unido e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas.

35.      No processo C‑154/15, F. Gutiérrez Naranjo, a Cajasur Banco, os Governos checo, espanhol e do Reino Unido e a Comissão apresentaram observações escritas.

36.      Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça, de 21 de outubro de 2015 os processos C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15 foram apensados para efeitos do procedimento oral e do acórdão.

37.      Na audiência comum aos três processos atualmente apensados, que teve lugar em 26 de abril de 2016, F. Gutiérrez Naranjo, A. M. Palacios Martínez, E. Irles López, a Cajasur Banco, o Banco Popular Español, o BBVA, os Governos espanhol e do Reino Unido e a Comissão apresentaram observações orais.

IV – Análise jurídica

38.      As questões submetidas pelos órgãos jurisdicionais de reenvio articulam‑se, no essencial, à volta de três problemáticas. Trata‑se, antes de mais, de determinar se é conforme com o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 limitar os efeitos restitutórios da nulidade decorrente da qualificação das cláusulas «suelo» como abusivas. Em seguida, a Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante) pergunta ao Tribunal de Justiça, por um lado, se o Tribunal Supremo fez uma correta aplicação dos critérios da boa‑fé e dos riscos de perturbações graves na aceção do acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (16) e se, por outro lado, a articulação, tal como decorre da jurisprudência do Tribunal Supremo, entre as soluções adotadas no âmbito de ações coletivas e as adotadas no âmbito de ações individuais é conforme com o direito da União.

39.      Todavia, a análise que me apresto a fazer do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deve bastar para o Tribunal de Justiça dar uma resposta útil aos órgãos jurisdicionais de reenvio. Por conseguinte, o essencial das presentes conclusões será consagrado às questões apresentadas no processo C‑154/15 e à primeira questão comum aos processos C‑307/18 e C‑308/15.

A –    Quanto às questões prejudiciais, consideradas conjuntamente, do processo C154/15 e quanto à primeira questão comum aos processos C307/15 e C308/15

40.      A questão de princípio que anuncio no preâmbulo é, no essencial, a de saber se é conforme com o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, reconhecer a um órgão jurisdicional supremo de um Estado‑Membro, depois de ter qualificado de «abusiva» uma cláusula contratual inserida num contrato celebrado entre um consumidor e um profissional e depois de ter declarado a nulidade dessa cláusula, o poder de limitar os efeitos dessa declaração conferindo o direito à restituição das quantias pagas indevidamente pelo consumidor com fundamento na cláusula abusiva apenas a contar da data da decisão proferida pelo referido órgão jurisdicional que confirma o caráter abusivo da cláusula em causa.

41.      Para responder a esta questão, devem ser feitas algumas análises preliminares. Com efeito, uma das primeiras etapas do raciocínio é determinar em que plano se situou o Tribunal Supremo quando proferiu o seu acórdão de 9 de maio de 2013. Pretende ir além do nível de proteção que a Diretiva 93/13 confere ao consumidor, a qual, ao proceder apenas a uma harmonização mínima da matéria, autoriza efetivamente os Estados‑Membros a estabelecerem disposições mais rigorosas (17). Ora, se fosse esse o caso, a limitação dos efeitos da nulidade não poderia ser analisada à luz do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, uma vez que as medidas mais protetoras se enquadram, por natureza, num âmbito que não é harmonizado pela diretiva.

42.      Assim, para responder à questão de princípio que incide, mais uma vez, sobre o que o juiz deve ou pode fazer perante cláusulas abusivas, é preciso, no entanto, voltar previamente a considerações mais essenciais relativas à operação de qualificação, pelo Tribunal Supremo, das cláusulas «suelo» como cláusulas «abusivas». É uma questão tanto mais delicada quanto o interlocutor, nos três processos apensos, em primeiro lugar, não é o órgão jurisdicional que procede a essa qualificação e, em segundo lugar, não põe em causa o caráter abusivo das cláusulas «suelo» (18). Por conseguinte, esclareço a este respeito, para todos os efeitos úteis, que a decisão desta questão preliminar não deve ser entendida como uma tentativa de alargamento do debate prejudicial mas, pelo contrário, como o necessário e inevitável enquadramento prévio para dar uma resposta útil aos órgãos jurisdicionais de reenvio.

43.      Após ter estabelecido que o Tribunal Supremo não agiu além do nível de proteção que a Diretiva 93/13 confere ao consumidor e, assim, ter verificado a pertinência da interpretação pedida, resta‑me determinar o alcance da obrigação que o artigo 6.o, n.o 1, desta diretiva comete aos Estados‑Membros.

1.      Quanto ao nível de proteção conferido aos consumidores pela jurisprudência do Tribunal Supremo por comparação com o estabelecido pela Diretiva 93/13

44.      Na origem destes três processos encontra‑se uma série de acórdãos proferidos pelo Tribunal Supremo. Em resumo e na medida em que a minha interpretação dos referidos acórdãos esteja correta, o Tribunal Supremo declarou que as cláusulas «suelo» inseridas nos contratos de mútuo eram cláusulas relativas ao objeto principal do contrato cuja fiscalização do caráter abusivo, com fundamento na Diretiva 93/13, está, em princípio, excluída, desde que essas cláusulas estejam redigidas de maneira clara e compreensível. O Tribunal Supremo entendeu que as cláusulas «suelo» eram gramaticalmente inteligíveis e que, portanto, satisfaziam a fiscalização da transparência formal. Em contrapartida, considerou que os profissionais que tinham introduzido essas cláusulas nos contratos controvertidos não tinham fornecido informações suficientes para esclarecer o seu sentido real e que a exigência de transparência material não estava satisfeita. Concluiu pelo caráter abusivo das referidas cláusulas. Em seguida, embora, no ordenamento jurídico espanhol, o princípio fosse a nulidade ab initio das cláusulas abusivas, o Tribunal Supremo, pelas circunstância específicas que considerava estarem presentes, decidiu só atribuir efeito à declaração do caráter abusivo das cláusulas «suelo» a partir da data de publicação do primeiro acórdão proferido nesse sentido, isto é, a partir de 9 de maio de 2013.

45.      Se bem compreendo o acórdão do Tribunal Supremo, parece que este último considerou, ao introduzir uma exigência de transparência material na fiscalização da transparência das cláusulas, ter ido além do nível de proteção estabelecido pela Diretiva 93/13. Designadamente, justificou a limitação dos efeitos restitutórios da declaração de nulidade das cláusulas «suelo» pelo caráter inovador do seu acórdão. Devo confessar não estar totalmente convencido de que assim seja, como demonstra um exame atento da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

46.      Assim, no acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (19), o Tribunal de Justiça era questionado sobre se o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 devia ser interpretado no sentido de que a exigência de que uma cláusula contratual deve ser redigida de forma clara e compreensível deve ser entendida como impondo não só que a cláusula em causa seja gramaticalmente clara e compreensível para o consumidor, mas também que as razões económicas que subjazem à aplicação da cláusula contratual sejam claras e compreensíveis para esse mesmo consumidor. O Tribunal de Justiça concluiu que essa exigência de redação clara e compreensível também figurava igualmente no artigo 5.o da Diretiva 93/13 e no seu vigésimo considerando nos termos do qual o consumidor deve ter efetivamente a oportunidade de tomar conhecimento de todas as cláusulas do contrato (20). Segundo o Tribunal de Justiça, a referida exigência «aplica‑se em quaisquer circunstâncias, incluindo quando uma cláusula está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 e escapa, portanto, à apreciação do seu caráter abusivo referida no artigo 3.o, n.o 1, desta diretiva» (21). O Tribunal de Justiça também declarou que a exigência de transparência que figura no artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 «tem o mesmo alcance que a referida no artigo 5.o desta diretiva» (22). Ora, relativamente a este artigo 5.o, o Tribunal de Justiça recorda o alcance do seu acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (23) no qual declarou que a informação, antes da celebração de um contrato, sobre as condições contratuais e as consequências da referida celebração é de importância fundamental para um consumidor, uma vez que é, nomeadamente, com base nesta informação que o consumidor decide vincular‑se contratualmente a um profissional (24). Por conseguinte, «[a] exigência de transparência […] não pode pois ficar reduzida apenas ao caráter compreensível das mesmas nos planos formal e gramatical» (25) e deve ser entendida de maneira extensiva, tendo em conta o sistema de proteção instituído pela Diretiva 93/13 que assenta na ideia de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade face ao profissional, no que respeita designadamente ao nível de informação (26).

47.      O Tribunal de Justiça concluiu que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que «a exigência de que uma cláusula contratual deve ser redigida de maneira clara e compreensível deve ser entendida como impondo não só que a cláusula em questão seja gramaticalmente inteligível para o consumidor mas igualmente que o contrato exponha com transparência o funcionamento concreto do mecanismo […] de modo a que o consumidor tenha condições para avaliar, com fundamento em critérios precisos e inteligíveis, as consequências económicas que daí decorrem para ele» (27). Portanto, o Tribunal de Justiça declarou que, no caso concreto que lhe era então submetido, «incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, face ao conjunto de elementos factuais pertinentes, entre os quais a publicidade e a informação facultadas pelo mutuante no âmbito da negociação de um contrato de mútuo, um consumidor médio […] podia não só conhecer a existência da diferença, geralmente observada no mercado dos valores mobiliários, entre a taxa de câmbio de venda e a taxa de câmbio de compra de uma divisa estrangeira mas igualmente avaliar as consequências económicas, potencialmente significativas, para ele, da aplicação [da cláusula controvertida] para o cálculo dos reembolsos de que será, em definitivo, devedor e, portanto, o custo total do seu empréstimo» (28).

48.      No acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (29), proferido posteriormente, o Tribunal de Justiça era convidado a esclarecer em que medida é que a forma como foram redigidas determinadas cláusulas de um contrato de crédito e a falta de menção de determinadas informações, tanto na data da celebração do contrato como ao longo da sua execução, podia levar o juiz de reenvio a concluir pelo caráter abusivo de determinadas cláusulas do referido contrato. Depois de ter recordado o conteúdo do vigésimo primeiro considerando e do artigo 5.o da Diretiva 93/13, o Tribunal de Justiça precisou que «[e]ssa obrigação de formulação [clara e compreensível] é tanto mais importante quanto um órgão jurisdicional nacional deve apreciar o caráter abusivo de uma cláusula redigida em sua violação, mesmo que essa cláusula possa ser analisada no sentido de que é abrangida pela exclusão prevista no artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13. Com efeito, importa recordar que as cláusulas visadas por esta disposição, embora incluídas no domínio regulado por esta diretiva, escapam somente à avaliação do seu caráter abusivo, na medida em que o órgão jurisdicional nacional considere, após uma apreciação do caso concreto, que foram redigidas pelo profissional de maneira clara e compreensível» (30). Ora, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (31) que é dada uma importância fundamental à informação fornecida ao consumidor antes da celebração do contrato. Portanto, «compete ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se um consumidor médio […] pode avaliar a partir das modalidades de cálculo dos juros anuais que lhe são comunicadas, as consequências económicas da sua aplicação para o cálculo das prestações de que esse consumidor será em definitivo devedor e, desse modo, o custo total de seu empréstimo» (32). Segundo o Tribunal de Justiça, «a falta de menção das informações relativas às condições de reembolso do crédito em causa e das modalidades de alteração dessas condições negociadas de crédito são elementos decisivos para um órgão jurisdicional nacional no âmbito da análise da questão de saber se uma cláusula de um contrato de mútuo, relativa ao custo deste, na qual não consta tal menção, está redigida de maneira clara e compreensível na aceção do artigo 4.o da Diretiva [93/13]» (33). Se o órgão jurisdicional nacional considerar que não é o caso, deve apreciar o seu caráter abusivo (34).

49.      É certo que os acórdãos de 30 de abril de 2014, Kasler e Káslerné Rábai (35), e de 9 de julho de 2015, Bucura (36), foram proferidos depois do acórdão do Tribunal Supremo de 9 de maio de 2013. Todavia, não constituem nada mais que a continuação lógica de toda uma série de acórdãos anteriores, entre os quais o acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (37), ao qual o Tribunal Supremo se referiu abundantemente no seu acórdão de 9 de maio de 2013 e que já evidenciava a relação entre a exigência de transparência prevista no artigo 5.o da Diretiva 93/13 e a importância fundamental da informação prévia à celebração do contrato para assegurar o consentimento esclarecido do consumidor (38).

50.      Além disso, ainda no acórdão RWE Vertrieb (39), é recordado que, «de acordo com jurisprudência assente, a interpretação que o Tribunal de Justiça faz de uma norma de direito da União, no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.o TFUE, esclarece e precisa o significado e o alcance dessa norma, tal como deve ser ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor. Donde se conclui que a norma assim interpretada pode e deve ser aplicada pelo juiz a relações jurídicas nascidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão que se pronuncie sobre o pedido de interpretação, se se encontrarem também reunidas as condições que permitem submeter aos órgãos jurisdicionais competentes um litígio relativo à aplicação da referida norma» (40). Só por si, o acórdão RWE Vertrieb (41) já continha as bases dos acórdãos Kásler e Káslerné Rábai (42) e Bucura (43). Por conseguinte, ao qualificar as cláusulas «suelo» de cláusulas abusivas, designadamente, por falta de informação prévia suficiente, o Tribunal Supremo não agiu além do direito da União, ao oferecer ao consumidor um nível de proteção mais elevado em relação ao que resulta da Diretiva 93/13, mas, pelo contrário, aplicou prescrições contidas nesta última (44).

51.      Estabelecido isto, devo agora proceder à análise do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13.

2.      Quanto ao alcance da obrigação imposta aos Estados‑Membros pelo artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13

52.      Depois de ter concluído que a redação do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 não é desprovida de uma certa ambiguidade, irei debruçar‑me sobre a jurisprudência do Tribunal de Justiça para identificar os grandes princípios que orientam a sua interpretação da Diretiva 93/13, em geral, e do artigo 6.o, n.o 1, da mesma diretiva, em especial. Por último, aplicarei aos presentes casos concretos as conclusões intercalares a que tiver chegado.

a)      Uma interpretação literal pouco esclarecedora

53.      Perante cláusulas abusivas, a Diretiva 93/13 impõe aos Estados‑Membros, por um lado, que prevejam que estas «nas condições fixadas pelos respetivos direitos nacionais, […] não vinculem o consumidor» (artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13) e que, por outro, «[providenciem] para que, no interesse dos consumidores e dos profissionais concorrentes, existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional» (artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13).

54.      É forçoso concluir que o legislador da União não foi mais longe na definição da sanção das cláusulas abusivas e, nomeadamente, das condições em que a inexistência de efeito vinculativo das mesmas, exigida nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, deve ser organizada pelos Estados‑Membros. A utilização do presente do indicativo («não vinculem») não deixa transparecer nada quanto à eventual intenção do referido legislador de atribuir à inexistência de efeito vinculativo uma dimensão retroativa (45). Esse mesmo legislador optou claramente por não utilizar um vocábulo jurídico mais preciso como seria, por exemplo, uma referência expressa à nulidade, à anulação ou à resolução. A expressão utilizada é perfeitamente neutra (46), como já salientava o advogado‑geral Trstenjak nas suas conclusões apresentadas no processo Invitel (47).

55.      Essa neutralidade explica‑se naturalmente pela remissão expressa que é feita para os direitos nacionais (48). Basta deixar uma ampla margem de manobra aos Estados‑Membros para esclarecerem, nas condições que quiserem, a inexistência de caráter vinculativo das cláusulas abusivas? Para esclarecer o alcance deste artigo e uma vez que a sua redação se revela insuficiente para o efeito, é necessário voltar à jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à Diretiva 93/13, em geral, e ao artigo 6.o, n.o 1, desta diretiva, em especial.

b)      Análise da jurisprudência

56.      O Tribunal de Justiça salientou, por diversas vezes, a função que a Diretiva 93/13 ocupa na ordem jurídica da União.

57.      Limitar‑me‑ei a recordar que o sistema de proteção implementado pela Diretiva 93/13 assenta na ideia de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade relativamente ao profissional no que se refere quer ao poder de negociação quer ao nível de informação, situação esta que o leva a aderir às condições redigidas previamente pelo profissional, sem poder influenciar o conteúdo destas (49). Atendendo a essa situação de inferioridade, o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 é uma disposição imperativa que tende a substituir o equilíbrio formal que o contrato estabelece entre os direitos e obrigações dos contratantes por um equilíbrio real, suscetível de restabelecer a igualdade entre estes últimos (50). Foi assim que o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que o tribunal nacional deve apreciar oficiosamente o caráter abusivo de uma cláusula contratual abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva e, deste modo, suprir o desequilíbrio que existe entre o consumidor e o profissional (51). Assim, para assegurar a proteção pretendida pela Diretiva 93/13, a situação de desequilíbrio entre o consumidor e o profissional só pode ser compensada por uma intervenção positiva, exterior às partes do contrato (52).

58.      Além disso, o Tribunal de Justiça não deixou de recordar que a Diretiva 93/13 constitui, na sua totalidade, uma medida indispensável para o cumprimento das missões confiadas à União e, em particular, para aumentar o nível e a qualidade de vida em todo o seu território (53). É atendendo à natureza e à importância do interesse público em que assenta a proteção garantida aos consumidores que a Diretiva 93/13 impõe aos Estados‑Membros que prevejam os meios adequados e eficazes «para pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional» (54).

59.      A fim de determinar com mais precisão as consequências a retirar da declaração do caráter abusivo da cláusula contratual, o Tribunal de Justiça declarou que se deve atender quer à letra do artigo 6.o, n.o 1, quer aos objetivos e à sistemática geral da Diretiva 93/13 (55). No que diz respeito à letra deste artigo 6.o, o Tribunal de Justiça declarou, «por um lado, que o primeiro membro de frase desta disposição, embora reconhecendo aos Estados‑Membros uma determinada margem de autonomia no que se refere às definições dos regimes jurídicos aplicáveis às cláusulas abusivas, impõe expressamente que se preveja que as ditas cláusulas ‘não vinculem’ [o consumidor]» (56). Por conseguinte, os órgãos jurisdicionais nacionais devem «retirar todas as consequências daí decorrentes de acordo com o direito nacional, de forma a que o consumidor não fique vinculado» (57). Segundo as próprias palavras do Tribunal de Justiça, «[d]ecorre assim da redação do n.o 1 [do] artigo 6.o [da Diretiva 93/13] que os tribunais nacionais apenas estão obrigados a afastar a aplicação de uma cláusula contratual abusiva de modo a que não produza efeitos vinculativos relativamente ao consumidor» (58).

60.      As cláusulas abusivas «não vincul[am]», na aceção do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, quando o juiz nacional afasta a sua aplicação (59) devido ao caráter dissuasivo da «pura e simples não aplicação» (60). O Tribunal de Justiça considera, para este efeito, que uma cláusula abusiva não pode ser modificada pelo juiz nacional mas deve, pelo contrário, não ser aplicada (61). A eficácia da sanção das cláusulas abusivas é assim apreciada em relação ao objetivo de pôr termo à utilização (62). Todavia, a prossecução desse objetivo pode ser abandonada perante a vontade expressa do consumidor de continuar vinculado por uma cláusula contratual apesar do seu caráter abusivo (63).

61.      O Tribunal de Justiça não foi mais longe no seu esclarecimento quanto à forma como a inexistência de caráter vinculativo deve ser pensada nos ordenamentos jurídicos nacionais. Provavelmente, não lhe compete fazê‑lo, uma vez que, precisamente, as modalidades dessa organização devem ser decididas pelos próprios Estados‑Membros. Por conseguinte, é lógico que, na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça pareça ter considerado a nulidade das cláusulas abusivas não como a única via para responder à exigência colocada pelo artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 mas como uma possibilidade entre outras. É o que resulta, nomeadamente, do seu acórdão de 26 de abril de 2012, Invitel (64) nos termos do qual declarou que uma legislação nacional que prevê que a declaração de nulidade, por parte de um órgão jurisdicional, de uma cláusula abusiva se aplica a todos os consumidores que tenham celebrado um contrato com um profissional que utiliza essa cláusula cumpria as exigências do artigo 6.o, n.o 1, conjugado com o artigo 7.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 93/13 (65) e que «a aplicação de uma sanção de nulidade de uma cláusula abusiva […] garante que estes consumidores não estão vinculados pela referida cláusula, sem excluir, no entanto, outros tipos de sanções adequadas e eficazes previstas pelas legislações nacionais» (66). O Tribunal de Justiça decidiu novamente, algum tempo mais tarde, que, uma legislação nacional «que dispõe que as cláusulas declaradas abusivas são nulas, satisfaz as exigências do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13» (67).

c)      Aplicação ao caso em apreço

62.      Quais os ensinamentos a tirar desta abundante jurisprudência?

63.      Segundo a leitura que faço dela, não me parece que tenha estabelecido uma relação sistemática ou automática entre o artigo 6.o, n.o 1, da referida diretiva e a nulidade das cláusulas abusivas. Por outras palavras, a nulidade não parece representar, para o Tribunal de Justiça, a resposta jurídica exclusiva à exigência de inexistência de caráter vinculativo das cláusulas abusivas. É o que decorre de uma outra fórmula que se encontra, por exemplo, no seu acórdão de 21 de janeiro de 2015, Unicaja Banco e Caixabank, onde o Tribunal de Justiça refere que «o tribunal nacional [deve poder] tirar todas as consequências do eventual caráter abusivo relativamente à Diretiva 93/13 da cláusula […], procedendo, se for caso disso, à sua anulação» (68).

64.      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não veio colmatar, de maneira perentória, a imprecisão do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13. Não foi mais longe nessa neutralidade de fachada — e talvez não o pudesse fazer. Com efeito, se o Tribunal de Justiça tivesse de decidir hoje que este artigo deve ser interpretado no sentido de que, perante uma cláusula abusiva, o juiz nacional deve declarar a nulidade das referidas cláusulas e conferir um direito correlativo à restituição in integrum, isto é, a partir do momento da celebração do contrato, esvaziaria de qualquer efeito útil a remissão expressa feita por esta disposição para os direitos nacionais e, nesse caso, dificilmente escaparia à censura da harmonização pretoriana (69).

65.      Em seguida, saliento que o estado do direito nacional é efetivamente conforme ao que a Diretiva 93/13 exige. Com efeito, resulta claramente dos autos que a sanção de princípio, no ordenamento jurídico espanhol, das cláusulas abusivas é a nulidade, a qual estabelece um direito à restituição integral (70). Trata‑se aí do nível máximo da sanção civil que elimina todos os efeitos da cláusula abusiva. Todavia, o que levanta problema nos três processos é o facto de o órgão jurisdicional supremo ter recorrido a uma modalidade processual que lhe permite limitar no tempo os efeitos dos seus acórdãos. A utilização dessa possibilidade teve como resultado, relativamente à sanção das cláusulas «suelo», a seguinte situação.

66.      A partir de 9 de maio de 2013, as cláusulas «suelo» devem desaparecer do ordenamento jurídico espanhol. Devem ser eliminadas dos contratos em vigor e os profissionais deixam de as poder inserir em novos contratos, uma vez que qualquer profissional que introduza tais cláusulas a partir dessa data será condenado quer na eliminação das referidas cláusulas quer no reembolso das quantias pagas com fundamento nas mesmas. Por outras palavras, os plenos efeitos da nulidade — a sanção de princípio — são garantidos a partir de 9 de maio de 2013.

67.      No que se refere ao período anterior, embora as cláusulas «suelo» sejam declaradas abusivas e, portanto nulas, os profissionais não estão sujeitos a uma obrigação de restituição das quantias pagas com fundamento nas mesmas por circunstâncias excecionais que o órgão jurisdicional supremo considera estarem presentes, essencialmente ligadas à dimensão endémica do problema.

68.      Uma vez que o direito da União não harmoniza as sanções aplicáveis em caso de reconhecimento do caráter abusivo de uma cláusula (71) nem as condições em que um órgão jurisdicional supremo decide limitar os efeitos dos seus acórdãos, a presente situação enquadra‑se no ordenamento jurídico interno dos Estados‑Membros por força do princípio da autonomia processual. No entanto, essas modalidades não devem ser menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência) nem ser concebidas de forma a tornarem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (72).

69.      Em primeiro lugar, no que diz respeito ao princípio da equivalência, este exige que a norma nacional em causa se aplique indiferentemente às ações baseadas em violação do direito da União e às baseadas em violação do direito interno com um objeto e uma causa semelhantes (73). Salvo eventuais verificações ulteriores dos órgãos jurisdicionais de reenvio, resulta dos autos, e nomeadamente das observações escritas do Governo espanhol, que o Tribunal Supremo não reserva a possibilidade de limitar no tempo os efeitos dos seus acórdãos apenas nos litígios que apliquem o direito da União e que já utilizou essa possibilidade em conflitos puramente internos (74). Considerada de um ponto de vista objetivo, a possibilidade de o Tribunal Supremo limitar no tempo os efeitos dos seus acórdãos não parece capaz de suscitar dúvidas quanto à sua conformidade com o princípio da equivalência.

70.      Em segundo lugar, no que respeita ao princípio da efetividade, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que, cada caso em que se coloque a questão de saber se uma disposição processual nacional torna impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União deve ser analisado tendo em conta o lugar que essa disposição (75) ocupa no processo, visto como um todo, a tramitação deste e as suas particularidades perante as várias instâncias nacionais e que nesta perspetiva, há que tomar em consideração, se necessário, os princípios que estão na base do sistema jurisdicional nacional, como, designadamente, o princípio da segurança jurídica (76). Portanto, a incidência da limitação no tempo dos efeitos do acórdão do Tribunal Supremo sobre a efetividade da Diretiva 93/13 deve ser, por um lado, apreciada, à luz do objetivo que esta prossegue, sem deixar de ter em conta, por outro lado, princípios do ordenamento jurídico nacional que determinaram a decisão de limitar os referidos efeitos.

71.      Face ao objetivo prosseguido pela Diretiva 93/13, como foi recordado aquando da análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a sanção das cláusulas abusivas por força dos artigos 6.o e 7.o da Diretiva 93/13 deve ter um efeito dissuasivo em relação ao profissional e procurar restaurar um equilíbrio real entre este último e o consumidor. Como recordei mais acima, a partir de 9 de maio de 2013, os profissionais deixam de poder utilizar as cláusulas «suelo» (77) e estas cláusulas devem desaparecer dos contratos em vigor. O efeito dissuasivo é plenamente assegurado, uma vez que qualquer profissional que, depois de 9 de maio de 2013, introduza tais cláusulas nos seus contratos será condenado à eliminação das referidas cláusulas e à restituição das quantias pagas com fundamento nos mesmos. Por conseguinte, o comportamento dos profissionais alterar‑se‑á necessariamente a partir de 9 de maio de 2013 e a efetividade da diretiva fica, pro futuro, plenamente assegurada.

72.      Resta analisar a situação anterior a 9 de maio de 2013. As cláusulas «suelo» são sempre consideradas abusivas e feridas de nulidade, mas essa nulidade só produzirá os seus efeitos a partir da data do acórdão do órgão jurisdicional supremo que a declara. Para justificar essa relação no tempo, o Tribunal Supremo baseou‑se num conjunto de argumentos (78), entre os quais a preservação da segurança jurídica atendendo ao caráter inovador da sua decisão — avaliação que, no entanto, não subscrevo (79) — e as circunstâncias excecionais em presença. Sobre esta questão, o Tribunal Supremo insistiu, nomeadamente, na dimensão endémica do recurso a cláusulas «suelo» e, em seguida, ponderou, por um lado, a proteção devida aos consumidores, designadamente, por força da Diretiva 93/13 e, por outro, os desafios macroeconómicos para o sistema bancário de um Estado‑Membro já fragilizado.

73.      Na condição de que se mantenha absolutamente excecional, tal diligência também parece admissível à luz do princípio da efetividade. O Tribunal de Justiça já admitiu que a proteção do consumidor não é absoluta (80). Sobretudo, não parece evidente que, para restabelecer o equilíbrio entre o consumidor e o profissional, seja necessário ou mesmo possível (81), em cada caso, restituir todas as quantias pagas com fundamento numa cláusula «suelo». Atingir o equilíbrio tão desejado pela diretiva não é favorecer o consumidor. Em função da data de celebração dos contratos de mútuo, a falta de efeito totalmente retroativo não teve necessariamente o resultado de não restaurar o equilíbrio. Esta conclusão é, na minha opinião, corroborada por duas considerações essenciais na avaliação feita pelo Tribunal Supremo, a saber que, em primeiro lugar, o consumidor vinculado por um contrato de mútuo que integra uma cláusula «suelo» podia facilmente pôr termo ao seu contrato e mudar de estabelecimento bancário e, em segundo lugar, a aplicação da cláusula «suelo» não teve como consequência uma alteração substancial do montante das mensalidades devidas pelos consumidores.

74.      Relativamente à necessária tomada em conta dos princípios do ordenamento jurídico nacional que determinaram a decisão de limitar no tempo os efeitos do acórdão do Tribunal Supremo, a segurança jurídica que este último invoca — menos em razão do caráter inovador da sua decisão, recordo‑o, que da multiplicidade de situações jurídicas potencialmente afetadas suscetíveis de pôr em causa a estabilidade de um setor económico — é uma preocupação partilhada pela ordem jurídica da União.

75.      Assim, nestas condições, nem a efetividade dos direitos reconhecidos pela Diretiva 93/13 nem os objetivos prosseguidos por esta última me parecem atingidos pela decisão do Tribunal Supremo de limitar os efeitos no tempo da declaração de nulidade das cláusulas abusivas.

76.      Resulta do que antecede que o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, lido à luz dos princípios da equivalência e da efetividade, deve ser interpretado no sentido de que, nas circunstâncias específicas dos litígios no processo principal, não se opõe a uma decisão de um órgão jurisdicional supremo pela qual este último declara o caráter abusivo das cláusulas «suelo», determina a cessação da sua utilização e a sua eliminação dos contratos em vigor e declara a sua nulidade, embora limite, por circunstâncias excecionais, os efeitos, nomeadamente restitutórios, dessa nulidade à data do seu primeiro acórdão proferido nesse sentido.

B –    Quanto às outras questões prejudiciais

77.      Considero que a resposta que sugiro que o Tribunal de Justiça dê às questões apresentadas no processo C‑154/15 e à primeira questão comum aos processos C‑307/15 e C‑308/15 é suficiente para que os órgãos jurisdicionais de reenvio possam decidir os litígios nos processos principais. Portanto, não me parece útil responder às outras questões suscitadas.

78.      Quero, no entanto, formular algumas observações conclusivas para eliminar qualquer ambiguidade, tendo em conta implicações sistémicas destes processos.

79.      Reitero que a solução proposta se circunscreve às circunstâncias específicas dos referidos processos e que tal limitação, que emana de um órgão jurisdicional supremo, deve permanecer excecional.

80.      Além disso, a solução que proponho não deve, de forma alguma, ser entendida como uma validação da tese de que os órgãos jurisdicionais nacionais podem ou devem aplicar os critérios utilizados pelo próprio Tribunal de Justiça quando lhe é pedido para limitar os efeitos dos seus próprios acórdãos. As regras que regulam as condições em que um órgão jurisdicional supremo de um Estado‑Membro pode limitar os efeitos dos seus próprios acórdãos enquadram‑se, à primeira vista, na autonomia processual dos Estados‑Membros no limite dos princípios da equivalência e da efetividade do direito da União. É a razão pela qual uma análise mais aprofundada dos critérios da boa‑fé e dos riscos de perturbações graves, na aceção da jurisprudência RWE Vertrieb (82) à qual o Tribunal Supremo se referiu por diversas vezes, não me parece, em todo o caso, pertinente. Em contrapartida, é importante recordar que o Tribunal de Justiça permanece essencialmente competente, em nome do primado e da aplicação uniforme do direito da União, para apreciar a conformidade com o direito da União das condições definidas a nível nacional relativas à limitação no tempo dos efeitos dos acórdãos dos órgãos jurisdicionais supremos proferidos na sua função de juiz de direito comum do direito da União.

81.      Por último, resulta da redação da oitava questão prejudicial submetida no processo C‑308/15 que o órgão jurisdicional de reenvio parte do postulado de que havia uma obrigação de estender a limitação dos efeitos restitutórios decorrentes da nulidade de uma cláusula «suelo», conforme decidida no âmbito de uma ação coletiva no Tribunal Supremo, às ações individuais intentadas contra profissionais que não eram demandados no Tribunal Supremo no âmbito dessa ação coletiva. O Governo espanhol, tanto nas suas observações escritas como na audiência, afirmou que essa regra que preconiza uma extensão automática era desconhecida do ordenamento jurídico espanhol (83). Embora seja verdade que a jurisprudência do Tribunal Supremo opera como um complemento do ordenamento jurídico espanhol (84), isso não prejudica a possibilidade de qualquer órgão jurisdicional chamado a pronunciar‑se numa ação destinada a obter declaração do caráter abusivo de uma cláusula solo fazer a sua própria análise das circunstâncias e apreciar se, no caso concreto que lhe é submetido, essas circunstâncias são idênticas, o que deveria levá‑lo, sendo caso disso, a aplicar a jurisprudência do Tribunal Supremo. Nestas condições, a oitava questão prejudicial suscitada no âmbito do processo C‑308/15 não carece de desenvolvimentos adicionais por parte do Tribunal de Justiça. Em todo o caso, uma vez que a solução adotada pelo Tribunal Supremo não me parece incompatível com o direito da União, a sua aplicação, pelos órgãos jurisdicionais, é de natureza a preservar o princípio da igualdade e o da economia dos processos. 

V –    Conclusão

82.      Tendo em conta as considerações que precedem, sugiro ao Tribunal de Justiça que responda nos seguintes termos às questões prejudiciais submetidas pelo Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Granada (Tribunal do Comércio n.o 1 de Granada) e pela Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante):

O artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, lido à luz dos princípios da equivalência e da efetividade, deve ser interpretado no sentido de que, nas circunstâncias específicas dos litígios nos processos principais, não se opõe a uma decisão de um órgão jurisdicional supremo pela qual este último declara o caráter abusivo das cláusulas de limitação da taxa de juro variável (cláusulas «suelo»), determina a cessação da sua utilização e a sua eliminação dos contratos em vigor, declara a sua nulidade, embora limite, por circunstâncias excecionais, os efeitos, nomeadamente restitutórios, dessa nulidade à data do seu primeiro acórdão proferido nesse sentido.


1       Língua original: francês.


2       Como testemunha a vaga de reenvios prejudiciais sobre este tema que foram submetidos ultimamente ao Tribunal de Justiça. V., neste sentido, acórdão de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252), e processos pendentes C‑349/15, C‑381/15, C‑431/15, C‑525/15, C‑554/14, C‑1/16 e C‑34/16.


3       Cuja versão consolidada foi aprovada pelo Real Decreto Legislativo 1/2007 por el que se aprueba el texto refundido de la Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios y otras leyes complementarias (Decreto Real legislativo 1/2007, que aprova o texto consolidado da Lei geral de proteção dos consumidores e utilizadores e outras leis complementares), de 26 de novembro de 2007 (BOE n.o 287, de 30 de novembro de 2007).


4 —      Acórdão n.o 241/12 (ES:TS:2013:1916).


5 —      C‑484/08, EU:C:2010:309.


6 —      C‑484/08, EU:C:2010:309.


7 —      O qual define as qualidades que uma cláusula deve ter para ser declarada transparente.


8 —      Resulta dos autos que a segunda fiscalização é apresentada como uma nova exigência do Tribunal Supremo. Este considerou que, para que as cláusulas «suelo» possam satisfazer esta fiscalização reforçada, é necessário que, no momento da celebração do contrato, o consumidor tenha tomado conhecimento de simulações de diversos cenários relacionados com a evolução razoavelmente previsível das taxas de juro ou de informações sobre o custo em relação a outras modalidades de empréstimos propostos pelo mesmo estabelecimento. Voltarei mais tarde na minha análise ao caráter pretensamente inovador da posição Tribunal Supremo.


9 —      Acerca destes dois critérios, o Tribunal Supremo referiu‑se ao acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (C‑92/11, EU:C:2013:180).


10 —      O Tribunal Supremo considerou que i) as cláusulas «suelo» eram lícitas, ii) a sua inclusão nos contratos a taxa variável justificava‑se por razões objetivas, iii) não se tratava de cláusulas inéditas ou invulgares, iv) a sua utilização tinha sido tolerada pelo mercado durante muito tempo, v) o seu caráter abusivo foi declarado não pelo caráter intrinsecamente ilícito dos seus efeitos mas pela sua falta de transparência, vi) a falta de transparência resultava de uma insuficiência de informação, vii) a regulamentação nacional foi respeitada, viii) a finalidade da determinação da taxa de juro mínima responde à necessidade de obter um rendimento mínimo dos ativos dos mútuos hipotecários e as cláusulas eram calculadas de modo a não implicarem alterações significativas das prestações a pagar, ix) a sub‑rogação do credor é permitida por lei, de forma que um consumidor insatisfeito poderia facilmente mudar de estabelecimento de crédito e x) é evidente que a restitutio in integrum a partir da data da celebração do contrato implicaria graves perturbações económicas.


11 —      Respetivamente, acórdãos n.o 139/2015 (ES:TS:2015:1280) e n.o 222/2015 (ES:TS:2015:2207).


12 —      V., nomeadamente, acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349).


13 —      O Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Alicante (Tribunal do Comércio n.o 1 de Alicante) declarou que, uma vez que o Tribunal Supremo tinha declarado a nulidade de uma cláusula idêntica no seu acórdão de 9 de maio de 2013, a declaração de nulidade da cláusula em questão no litígio pendente nesse tribunal era inútil tendo em conta o facto de o BBVA ser um dos três estabelecimentos financeiros partes no processo no Tribunal Supremo.


14 —      O Banco Popular Español não era um dos três organismos de crédito partes no processo no Tribunal Supremo que deu origem ao acórdão de 9 de maio de 2013.


15 —      A Audiencia Provincial de Alicante (Tribunal Provincial de Alicante) baseia‑se aqui, nomeadamente, nos acórdãos de 26 de abril de 2012, Invitel (C‑472/10, EU:C:2012:242), e de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340).


16 —      C‑92/11, EU:C:2013:180.


17 —      V. artigo 8.o da Diretiva 93/13. Todavia, observo que este artigo faz referência à possibilidade de os Estados‑Membros manterem ou preverem «disposições» mais rigorosas e pergunto‑me em que medida o acórdão de um órgão jurisdicional, ainda que supremo, pode ser considerado uma «disposição» na aceção do artigo 8.o da Diretiva 93/13. Saliento também que a Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores (JO 2011, L 304, p. 64), introduziu um novo artigo 8.o‑A na Diretiva 93/13 que obriga os Estados‑Membros, quando adotem disposições nos termos do artigo 8.o desta última, a informar a Comissão desse facto.


18 —      O Tribunal de Justiça não deixou de recordar que tem competência «para interpretar o conceito de ‘cláusula abusiva’ […], assim como os critérios que o órgão jurisdicional nacional pode ou deve aplicar na apreciação de uma cláusula contratual à luz das disposições da Diretiva [93/13], sendo certo que compete ao referido órgão jurisdicional pronunciar‑se, tendo em conta os referidos critérios, sobre a qualificação concreta de uma cláusula contratual particular em função das circunstâncias concretas do caso em apreço» [acórdãos de 26 de abril de 2012, Invitel (C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 22 e jurisprudência referida), e de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (C‑92/11, EU:C:2013:180, n.o 48). V., neste sentido, acórdãos de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 45); de 23 de abril de 2015, Van Hove (C‑96/14, EU:C:2015:262, n.o 28); e de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 46)]. Tendo o Tribunal Supremo baseado o seu raciocínio, nomeadamente no artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13, teria sido desejável, em nome da cooperação jurisdicional característica do ordenamento jurídico europeu, que tivesse pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar não só quanto à problemática relativa à fiscalização da transparência das cláusulas que estabelecem o objeto essencial dos contratos mas também quanto à conformidade com o direito da União da possibilidade de limitar no tempo os efeitos do seu acórdão fundador na matéria.


19 —      C‑26/13, EU:C:2014:282.


20 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 67).


21 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 68).


22 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 69).


23 —      C‑92/11, EU:C:2013:180.


24 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 70).


25 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 71).


26 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 72).


27 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 75).


28 —      Acórdão de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 74).


29 —      C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447.


30 —      Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 50).


31 —      Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 51).


32 —      Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 56).


33 —      Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 61).


34 —      Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura (C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 62).


35 —      C‑26/13, EU:C:2014:282.


36 —      C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447.


37 —      C‑92/11, EU:C:2013:180.


38 —      Acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (C‑92/11, EU:C:2013:180, n.os 43 e 44). O Tribunal de Justiça dedicou sempre uma atenção especial ao nível de informação do consumidor. V., neste sentido, nomeadamente, acórdão de 27 de junho de 2000, Océano Grupo Editorial e Salvat Editores (C‑240/98 a C‑244/98, EU:C:2000:346, n.o 25). Além disso, não se podia afirmar que decorria qualquer ambiguidade do acórdão de 3 de junho de 2010, Caja de Ahorros y Monte de Piedad de Madrid (C‑484/08, EU:C:2010:309). Neste último, o Tribunal de Justiça reconheceu, é verdade, que a regulamentação espanhola em causa no processo principal, ao autorizar a fiscalização jurisdicional do caráter abusivo das cláusulas contratuais relativas à definição do objeto principal do contrato ou à adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os serviços ou os bens a fornecer em contrapartida, por outro, permitia assegurar um nível de proteção mais elevado que o estabelecido pela Diretiva 93/13. Assim sendo, essa regulamentação autorizava essa fiscalização incluindo quando essas cláusulas estavam redigidas de maneira clara e compreensível [v. acórdão de 3 de junho de 2010, Caja de Ahorros y Monte de Piedad de Madrid (C‑484/08, EU:C:2010:309, n.os 24 e 42)].


39 —      Acórdão de 21 de março de 2013 (C‑92/11, EU:C:2013:180).


40 —      Acórdão de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (C‑92/11, EU:C:2013:180, n.o 58 e jurisprudência referida).


41 —      Acórdão de 21 de março de 2013 (C‑92/11, EU:C:2013:180).


42 —      Acórdão de 30 de abril de 2014 (C‑26/13, EU:C:2014:282).


43 —      Acórdão de 9 de julho de 2015 (C‑348/14, EU:C:2015:447).


44 —      Resulta claramente da redação do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 que uma cláusula que incide sobre o objeto principal do contrato, quando não responde às exigências de clareza e de compreensibilidade, pode ser objeto de uma avaliação do seu caráter abusivo nas condições estabelecidas pelo artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13.


45 —      O vigésimo primeiro considerando da Diretiva 93/13 parece até colocar essa não vinculação no futuro («não serão […] vinculados»).


46 —      Uma comparação rápida das diferentes versões linguísticas disponíveis não parece mais esclarecedora. Assim, o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 prevê que as cláusulas abusivas, em língua espanhola, «no vincularán», em língua alemã, «unverbindlich sind», em língua inglesa, «shall […] not be binding», em língua italiana, «non vincolano», e, em língua portuguesa, «não vinculem».


47 —      472/10, EU:C:2011:806, n.o 48.


48 —      V., também, nota 70 das presentes conclusões.


49 —      V., entre jurisprudência abundante, acórdãos de 21 de março de 2013, RWE Vertrieb (C‑92/11, EU:C:2013:180, n.o 41 e jurisprudência referida), e de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.o 22); e despacho de 16 de julho de 2015, Sánchez Morcillo e Abril García (C‑539/14, EU:C:2015:508, n.o 24). V., também, conclusões do advogado‑geral M. Szpunar nos processos apensos Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:15, nota 21).


50 —      V., entre jurisprudência abundante, acórdão de 26 de abril de 2012, Invitel (C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 34), e despacho de 16 de julho de 2015, Sánchez Morcillo e Abril García (C‑539/14, EU:C:2015:508, n.o 25 e jurisprudência referida).


51 —      V. despacho de 16 de julho de 2015, Sánchez Morcillo e Abril García (C‑539/14, EU:C:2015:508, n.o 27).


52 —      V., entre jurisprudência abundante, acórdãos de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 31 e jurisprudência referida), e de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 41 e jurisprudência referida).


53 —      V., nomeadamente, acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 67 e jurisprudência referida).


54 —      V., nomeadamente, acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 68, que cita o artigo 7.o da Diretiva 93/13).


55 —      V., nomeadamente, acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 61 e jurisprudência referida).


56 —      V. acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 62).


57 —      V. acórdãos de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 63), e de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340, n.o 41) e Asbeek Brusse e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 49). V., também, despachos de 3 de abril de 2014, Sebestyén (C‑342/13, EU:C:2014:1857, n.o 35), e de 17 de março de 2016, Ibercaja Banco (C‑613/15, EU:C:2016:195, n.o 35).


58 —      Acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 65). O sublinhado é meu.


59 —      V. acórdãos de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340, n.o 41) e Asbeek Brusse e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.os 49 e 57), e de 21 de abril de 2016, Radlinger e Radlingerová (C‑377/14, EU:C:2016:283, n.o 98).


60 —      V. acórdãos de 30 de maio de 2013, Asbeek Brusse e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 58), e de 21 de janeiro de 2015, Unicaja Banco e Caixabank (C‑482/13, C‑484/13, C‑485/13 e C‑487/13, EU:C:2015:21, n.o 31).


61 —      V. acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.os 69 e 70).


62 —      V. acórdãos de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 78), e de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.os 21 e 39).


63 —      V. acórdãos de 3 de dezembro de 2015, Banif Plus Bank (C‑312/14, EU:C:2015:794, n.o 27), e de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.o 25).


64 —      C‑472/10, EU:C:2012:242.


65 —      V. acórdão de 26 de abril de 2012, Invitel (C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 39).


66 —      Acórdão de 26 de abril de 2012, Invitel (C‑472/10, EU:C:2012:242, n.o 40).


67 —      Acórdão de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340, n.o 43).


68 —      C‑482/13, C‑484/13, C‑485/13 e C‑487/13, EU:C:2015:21, n.o 41. O sublinhado é meu. V., também, despacho de 17 de março de 2016, Ibercaja Banco (C‑613/15, EU:C:2016:195, n.o 37).


69 —      Recorde‑se também que relatório da Comissão sobre a aplicação da Diretiva 93/13[COM(2000) 248 final de 27 de abril de 2000] já observava que, «[d]evido à diversidade das tradições legais existentes, [o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13] foi integrad[o] de maneira diferente (variando as sanções civis entre a inexistência, nulidade, anulabilidade, ineficácia ou a inaplicabilidade de tais cláusulas abusivas). […] Além disso, a decisão judicial que considera uma cláusula como abusiva deve produzir efeitos a partir da conclusão do contrato (ex tunc) […]. É bastante difícil apreciar em que medida os diferentes sistemas nacionais conduzem a tais resultados, sendo de temer que nem sempre isso aconteça» (pp. 19 e 20). A atenção do legislador da União já estava desperta para este problema. Ora, saliento que a Diretiva 93/13 foi alterada pela Diretiva 2011/83 e que nenhuma das alterações introduzidas respeitou ao artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13.


70 —      V. leitura conjugada do artigo 1303.o do Código Civil e do artigo 83.o da LGDCU.


71 —      V., recentemente, acórdão de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.o 31).


72 —      V., por analogia, acórdãos de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 38); de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 46); de 21 de fevereiro de 2013, Banif Plus Bank (C‑472/11, EU:C:2013:88, n.o 26); de 14 de março de 2013, Aziz (C‑415/11, EU:C:2013:164, n.o 50); de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340, n.o 29) e Asbeek Brusse e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 42); de 5 de dezembro de 2013, Asociación de Consumidores Independientes de Castilla y León (C‑413/12, EU:C:2013:800, n.o 30); de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovosť (C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 46); de 10 de setembro de 2014, Kušionová (C‑34/13, EU:C:2014:2189, n.o 50); de 18 de fevereiro de 2016, Finanmadrid EFC (C‑49/14, EU:C:2016:98, n.o 40); de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.o 32); e de 21 de abril de 2016, Radlinger e Radlingerová (C‑377/14, EU:C:2016:283, n.o 48).


73 —      V., nomeadamente, acórdão Pohotovosť (C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 47).


74 —      V. n.o 95 das observações escritas do Governo espanhol nos processos C‑307/15 e C‑308/15.


75 —      Aqui, menos que uma disposição, trata‑se mais de uma prática jurisdicional que não está verdadeiramente codificada. Com efeito, em resposta a uma questão do Tribunal de Justiça colocada durante a audiência, o representante do Governo espanhol afirmou que o Tribunal Supremo baseia a prerrogativa de limitar os efeitos restitutórios da nulidade na interpretação que faz do artigo 1303.o do Código Civil.


76 —      V. acórdãos de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 39 e jurisprudência referida); de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 49); de 21 de fevereiro de 2013, Banif Plus Bank (C‑472/11, EU:C:2013:88, n.o 33); de 14 de março de 2013, Aziz (C‑415/11, EU:C:2013:164, n.o 53); de 30 de maio de 2013, Jőrös (C‑397/11, EU:C:2013:340, n.o 32); de 5 de dezembro de 2013, Asociación de Consumidores Independientes de Castilla y León (C‑413/12, EU:C:2013:800, n.o 34); de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovosť (C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 51); de 10 de setembro de 2014, Kušionová (C‑34/13, EU:C:2014:2189, n.o 52); de 18 de fevereiro de 2016, Finanmadrid EFC (C‑49/14, EU:C:2016:98, n.os 43 e 44); de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.o 34); e de 21 de abril de 2016, Radlinger e Radlingerová (C‑377/14, EU:C:2016:283, n.o 50).


77 —      A menos que, com certeza, se assegure que é fornecida informação suficiente ao consumidor.


78 —      V. nota 11 das presentes conclusões.


79 —      V. n.os 44 e segs. das presentes conclusões.


80 —      V. acórdão Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615).


81 —      Com efeito, o princípio da restitutio in integrum pode, no momento da sua execução, entrar em conflito com as regras relativas à prescrição dos créditos.


82 —      Acórdão de 21 de março de 2013 (C‑92/11, EU:C:2013:180).


83 —      Por conseguinte, a inexistência de uma regra claramente identificável não possibilita uma análise do tipo da que o Tribunal de Justiça fez no âmbito do acórdão de 14 de abril de 2016, Sales Sinués e Drame Ba (C‑381/14 e C‑385/14, EU:C:2016:252, n.os 32 e segs.).


84 —      Nos termos do artigo 1.o, n.o 6, do Código Civil.