Language of document : ECLI:EU:C:2014:42

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 30 de janeiro de 2014 (1)

Processo C‑382/12

MasterCard e o.

contra

Comissão Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Concorrência — Artigo 81.° CE — Sistema de pagamento através de cartões de débito, de pagamento único e de crédito — Comissões interbancárias multilaterais supletivas — Decisões de uma associação de empresas — Restrições da concorrência pelo efeito — Conceito de «restrição acessória» — Caráter objetivamente necessário — Acordos sobre comissões interbancárias multilaterais no EEE aplicadas pela MasterCard às transações transfronteiriças efetuadas através de cartões de pagamento — Condições para beneficiar da isenção nos termos do artigo 81.°, n.° 3, CE — Processo no Tribunal Geral — Requisitos de admissibilidade dos anexos à petição»





I –    Introdução

1.        O presente caso tem por objeto um recurso interposto pela sociedade holding MasterCard Incorporated e as suas duas filiais (a seguir, respetivamente, «MasterCard Inc.», «MasterCard International Inc.» e «MasterCard Europe» e, conjuntamente, «recorrentes no recurso principal»), bem como dois recursos subordinados interpostos, respetivamente, pela The Royal Bank of Scotland plc (a seguir «RBS»), pelo Lloyds TSB Bank Plc (a seguir «LTSB») e pelo Bank of Scotland Plc (a seguir «BOS») contra o acórdão de 24 de maio de 2012, MasterCard e o./Comissão (a seguir «acórdão recorrido») (2), através do qual o Tribunal Geral negou provimento ao recurso de anulação da Decisão da Comissão C (2007) 6474 final, de 19 de dezembro de 2007, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (processos COMP/34.579 — MasterCard, COMP/36.518 — EuroCommerce, COMP/38.580 — Cartões Comerciais) (a seguir «decisão impugnada»).

2.        No cerne deste caso encontra‑se a organização de pagamento representada pelas recorrentes no recurso principal (a seguir «organização de pagamento MasterCard» ou «MasterCard»). Esta organização era detida e administrada pelas instituições bancárias participantes até 25 de maio de 2006. Nessa data, e enquanto decorria o procedimento administrativo que conduziu à adoção da decisão impugnada, a MasterCard Inc. foi objeto de uma introdução na Bolsa de Nova Iorque (Estados Unidos) (a seguir «IPO»), que modificou a sua estrutura e a sua gestão.

3.        A MasterCard gere um sistema de cartões bancários qualificado como um sistema «aberto» (ou «quadripartido»). Ao contrário de um sistema fechado (ou «tripartido»), como o da American Express, no qual o proprietário do sistema celebra os contratos com os titulares dos cartões bancários e com os comerciantes, um sistema aberto, a que se podem associar diferentes instituições financeiras sob uma marca comum de cartões bancários, implica três níveis de interação: o primeiro, entre o proprietário do sistema e os bancos associados, o segundo, entre os bancos de emissão (ou os emitentes)(3) e de aquisição (ou os adquirentes) (4) e o terceiro entre estes bancos e os respetivos clientes, a saber os titulares dos cartões bancários e os comerciantes (5). Num sistema deste tipo, o seu proprietário, além de deter e promover o logotipo dos cartões de pagamento, coordena geralmente as práticas dos bancos associados e pode agir como operador de rede, fornecendo uma infraestrutura informática para a transmissão das mensagens eletrónicas que concluem as transações. Fatura taxas e comissões aos bancos pela participação no sistema e, quando age como operador de rede, comissões pelo tratamento dos pagamentos através de cartões bancários (6).

4.        Na presente lide, são visadas, mais precisamente, as decisões da MasterCard que fixam as comissões multilaterais interbancárias supletivas aplicadas no Espaço Económico Europeu (EEE) ou na zona euro, ou seja na falta de comissões interbancárias fixadas bilateralmente entre bancos de emissão e de aquisição ou de comissões interbancárias fixadas coletivamente a nível nacional (a seguir «CIM») (7). Estas comissões são liquidadas pelos bancos de aquisição aos bancos de emissão em qualquer transação efetuada através de cartões de pagamento com o logotipo MasterCard ou Maestro (8) (a seguir, conjuntamente, «cartões MasterCard») entre os Estados‑Membros do EEE ou da zona euro. Em princípio, as CIM estão integralmente incluídas nas comissões faturadas pelos bancos de aquisição aos comerciantes [«merchant service charges», taxas pelo serviço prestado ao comerciante (a seguir «MSC»)] (9) e, deste modo, repercutem‑se sobre estes como custos de produção comuns (10). Segundo a tese defendida pelas recorrentes no recurso principal durante o procedimento administrativo, que foi aceite pela Comissão como base para a sua apreciação, as CIM constituem um «mecanismo para contrabalançar as exigências dos titulares de cartões, por um lado, e dos comerciantes, por outro lado», para repartir o custo da prestação do serviço entre os emitentes e os adquirentes do sistema (11).

5.        Até 25 de maio de 2006, as CIM eram fixadas pelo Conselho de Administração Regional para a Europa da MasterCard (a seguir «Conselho de Administração Europeu»), que agrupava os representantes dos bancos estabelecidos no EEE. Após esta data, o Conselho de Administração Mundial da MasterCard, com a sua nova composição, passou a ser o único órgão com competência para adotar as decisões relativas às CIM.

6.        Na decisão impugnada, a Comissão considerou que as decisões de fixação das CIM, que qualificou como decisões de uma associação de empresas, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, restringem a concorrência entre os bancos adquirentes e violam o referido artigo e o artigo 53.° do Acordo EEE, porque correspondem, de facto, à fixação de um preço mínimo para as MSC (12). Consequentemente, a Comissão intimou a organização de pagamento MasterCard e as recorrentes no recurso principal, sob cominação de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória diária, (13) a porem termo à infração no prazo de seis meses, ou seja, até 21 de junho de 2008, revogando as CIM, (14) e alterando consequentemente as regras aplicáveis à rede da associação, anulando todas as decisões em matéria de CIM (15) e ainda comunicando as ações levadas a cabo às instituições financeiras pertencentes à rede MasterCard. (16)

7.        As ora recorrentes no recurso principal pediram ao Tribunal Geral, a título principal, a anulação integral da decisão impugnada e, a título subsidiário, a anulação dos artigos 3.° a 5.° e 7.° desta mesma decisão, através dos quais a Comissão fixou as medidas corretivas acima referidas, bem como a sanção pecuniária compulsória diária. Seis instituições financeiras, entre as quais as três recorrentes nos recursos subordinados, intervieram em apoio dos referidos pedidos, ao passo que o Reino‑Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, bem como duas associações, uma que representa os retalhistas do Reino‑Unido e outra o comércio a retalho por grosso e internacional na União Europeia, a saber, respetivamente, a British Retail Consortium (a seguir «BRC») e a Eurocommerce, intervieram em apoio dos pedidos da Comissão, para que fosse negado provimento ao recurso. O Tribunal Geral, depois de ter examinado todos os fundamentos suscitados em apoio dos pedidos a título principal e a título subsidiário e tendo declarado inadmissíveis determinados anexos à petição, negou provimento ao recurso e condenou as recorrentes nas despesas.

8.        Em 12 de junho de 2008, a MasterCard suprimiu provisoriamente as CIM transfronteiriças e continuou as negociações com a Comissão. Estas acabaram por resultar em compromissos assumidos pela MasterCard, relativamente, entre outros, à adoção de uma nova metodologia de cálculo das CIM, que deveria reduzir substancialmente o respetivo montante, comparativamente ao considerado contrário às regras de concorrência do Tratado (17).

9.        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de agosto de 2012, a MasterCard International Inc. e a MasterCard Europe interpuseram o recurso principal no presente processo. Intervieram em apoio dos pedidos das recorrentes, além da RBS, da LTSB e da BOS, que interpuseram igualmente recurso subordinado, a MBNA Europe Bank Ltd. (a seguir «MBNA») e a HSBC Bank PLC (a seguir «HSBC»). Intervieram em apoio dos pedidos da Comissão para que fosse negado provimento ao recurso principal a BRC, a Eurocommerce e o Reino‑Unido.

II – Quanto aos recursos das decisões do Tribunal Geral

A –    Quanto à admissibilidade

10.      A Comissão manifesta dúvidas sobre a admissibilidade dos recursos subordinados, atendendo a que estes não estão em conformidade com os requisitos de forma previstos no artigo 176.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, que entrou em vigor em 1 de novembro de 2012. Esta disposição, que alterou o anterior regulamento de processo, estabelece que o recurso subordinado deve ser apresentado em requerimento separado, distinto da resposta.

11.      No caso em apreciação, os recursos subordinados da RBS, da LTSB e da BOS foram enviados por correio eletrónico em 31 de outubro de 2012, tendo os correspondentes articulados originais sido recebidos pela Secretaria do Tribunal Geral, respetivamente, em 2 e 5 de novembro de 2012. Ora, nos termos do artigo 57.°, n.° 7, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça «a data e a hora em que uma cópia do original assinado de um ato processual […] dá entrada na Secretaria por telecopiador ou por qualquer outro meio técnico de comunicação de que o Tribunal disponha, são tomadas em consideração para efeitos do respeito dos prazos processuais, na condição de o original assinado do ato, acompanhado dos anexos e das cópias referidas no n.° 2, ser apresentado na Secretaria, o mais tardar, dez dias depois». Uma vez que os recursos subordinados foram apresentados na Secretaria do Tribunal Geral antes de 1 de novembro de 2012, a exceção de inadmissibilidade invocada pela Comissão reporta‑se a fatos inexistentes e deve, portanto, ser julgada improcedente.

12.      A Comissão apresenta igualmente um conjunto de alegações quanto a inadmissibilidades pontuais, que visam a maior parte dos fundamentos e dos argumentos suscitados em apoio do recurso principal e dos recursos subordinados. As referidas alegações serão examinadas separadamente, no quadro da análise desses diferentes fundamentos e argumentos.

B –    Quanto ao mérito

13.      A MasterCard Inc., a MasterCard International Inc. e a MasterCard Europe invocam três fundamentos de recurso. Os dois primeiros são relativos a erro de direito e/ou a falta de fundamentação, e afetariam as partes do acórdão recorrido nas quais o Tribunal Geral examinou, respetivamente, o caráter objetivamente necessário da alegada restrição da concorrência e a natureza de associação de empresas da MasterCard. Através do seu terceiro fundamento, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral indevidamente julgou inadmissíveis vários anexos à petição apresentada na primeira instância.

14.      Para apoiar o seu recurso subordinado, a RBS invoca um único fundamento, relativo a erro de direito cometido pelo Tribunal Geral na apreciação da existência de um efeito restritivo na concorrência. Por sua vez, o recurso subordinado conjunto da LTSB e da BOS (a seguir, conjuntamente, «LBG»), assenta em dois fundamentos. O primeiro, à semelhança do primeiro fundamento invocado em apoio do recurso subordinado da RBS, é relativo a um erro de direito que afetaria a apreciação do Tribunal Geral relativamente aos efeitos das CIM na concorrência. Através do seu segundo fundamento, a LBG alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na sua análise para efeitos do artigo 81.°, n.° 3, CE. A RBS e a LBG defendem e desenvolvem o primeiro e o segundo fundamento do recurso principal.

15.      Com exceção do terceiro fundamento do recurso principal, os diferentes fundamentos e argumentos de apoio dos recursos, principal e subordinados, podem ser agrupados em torno das quatro temáticas seguintes: a qualificação da MasterCard como uma associação de empresas, a existência de efeitos restritivos na concorrência, o caráter necessário da restrição e a aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE.

16.      Antes de abordar cada uma destas temáticas, é necessário examinar o terceiro fundamento do recurso principal, na medida em que, tendo sido alegado que o Tribunal Geral ilegalmente não admitiu determinados documentos anexos à petição, este fundamento pretende, no essencial, demonstrar que o Tribunal Geral baseou a sua apreciação num quadro probatório incompleto.

1.      Quanto ao terceiro fundamento do recurso principal, relativo ao facto de o Tribunal Geral ter indevidamente julgado inadmissíveis determinados anexos à petição apresentada em primeira instância.

17.      As recorrentes no recurso principal alegam que o Tribunal Geral cometeu erros de direito por ter declarado inadmissíveis determinados anexos que estas lhe apresentaram. Em primeiro lugar, contestam a existência da base legal justificativa da abordagem seguida no acórdão recorrido. As disposições a que se refere o Tribunal Geral no referido acórdão exigiriam apenas que, na sua petição, o recorrente referisse o objeto do litígio e apresentasse uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Em contrapartida, não existiria qualquer base legal para impedir um recorrente de corroborar os seus fundamentos através da inclusão de argumentos em anexos, desde que aqueles estejam claramente resumidos na petição. Entendeu assim que o critério demasiado restritivo seguido pelo Tribunal Geral viola o princípio da proteção jurisdicional efetiva, garantido simultaneamente pelo artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e pelo artigo 6.°, n.° 1, CEDH, devendo qualquer restrição ao mesmo ser prevista por lei, e o princípio da proporcionalidade. Em segundo lugar, as recorrentes no recurso principal contestam o tratamento concreto de determinados anexos, efetuado pelo Tribunal Geral.

18.      No que diz respeito, em primeiro lugar, à alegação relativa à base legal para o tratamento dos anexos, é necessário assinalar que, nos n.os 68 e 69 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral se baseou no artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Por força destas disposições, a petição deve indicar o objeto do litígio e a exposição sumária dos fundamentos invocados.

19.      No que respeita a estas disposições, o Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de clarificar que as mesmas devem ser interpretadas no sentido de que, para que um recurso seja admissível, é necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do próprio texto da petição e que, embora o corpo da petição possa ser escorado e completado, em pontos específicos, por remissões para determinadas passagens de documentos que a ela foram anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexos à petição, não pode suprir a falta dos elementos essenciais da argumentação jurídica, os quais, por força das disposições acima recordadas, devem constar da petição. No mesmo contexto, o Tribunal de Justiça esclareceu que as exigências são análogas quando, em apoio de um fundamento se invoca um argumento(18). Esta interpretação baseia‑se na função puramente probatória e instrumental dos anexos, a qual implica que, na medida em que o documento anexado à petição contenha elementos de direito em que assentam determinados fundamentos articulados na petição, tais elementos devem figurar no próprio texto da petição ao qual este esse documento é anexo ou, pelo menos, estar suficientemente identificados neste articulado. Com efeito, à luz desta função dos anexos, não compete ao Tribunal procurar e identificar nos anexos os fundamentos e argumentos que este poderia ter em consideração para constituírem o fundamento do recurso (19).

20.      Esta interpretação do artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, de forma alguma, é contrária ao princípio da proteção jurisdicional efetiva. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH») relativa à interpretação do artigo 6.°, n.° 1, CEDH, à qual deve ser feita referência em conformidade com o artigo 52.°, n.° 3, da Carta, que o direito a um tribunal não é absoluto. O exercício desse direito tem limites, designadamente quanto às condições de admissibilidade de um recurso (20) e, portanto, a fortiori, de um fundamento, de um argumento ou de um anexo aos articulados das partes. Estas limitações só serão admissíveis, de acordo com o mesmo Tribunal, quando visem um fim legítimo e na condição de serem proporcionais em relação a esse fim e de não restringirem o acesso ao juiz concedido ao particular, de uma forma que prejudique a essência do próprio direito(21). Adicionalmente, embora os interessados devam prever que estes limites serão aplicados, a aplicação que deles é feita não deve, no entanto, impedir os particulares de recorrerem a um meio processual disponível(22).

21.      Ora, quanto ao fim prosseguido pelo artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e pelo artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a saber, o de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, as próprias recorrentes no recurso principal reconhecem que este é legítimo. Além disso, uma abordagem que exige que os recorrentes exponham na petição, pelo menos sumariamente, os elementos essenciais, de facto e de direito, em que se baseiam os fundamento e os argumentos invocados não se afigura desproporcionada relativamente àqueles fins e nem é suscetível de violar a essência do direito a um tribunal.

22.      Resulta do exposto que, uma vez que o acórdão recorrido, designadamente nos seus n.os 68 e 69, faz assentar o seu critério de tratamento dos anexos aos articulados das partes nas disposições referidas anteriormente no n.° 20, conforme são interpretadas pelo Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito.

23.      É necessário, em segundo lugar, analisar a aplicação concreta destas disposições feita pelo Tribunal Geral, no que se refere aos anexos cujo tratamento é contestado pelas recorrentes no recurso principal. Os argumentos reportam‑se especificamente à análise constante dos n.os 183 a 190 do acórdão recorrido e, designadamente, ao tratamento dos anexos A.13, A.14 e A.15, bem como à análise constante dos n.os 275 a 282 do acórdão recorrido e, designadamente, ao tratamento do anexo A.20. As recorrentes no recurso principal alegam que resumiram os fundamentos na petição e que o Tribunal Geral e a Comissão compreenderam os argumentos que estas apresentaram. Além disso, os elementos expostos nos anexos eram elementos de facto. Ora, quando os anexos contenham apenas elementos de facto, estes elementos não devem ser apresentados no corpo da petição. O Tribunal Geral deveria, portanto, ter concluído que a petição era suficientemente precisa no que se referia aos fundamentos e aos argumentos invocados e, consequentemente, que os referidos anexos eram admissíveis.

24.      No que se refere, desde logo, ao tratamento dos anexos A.13, A.14 e A.15, a leitura da petição que as recorrentes no recurso principal na apresentaram em primeira instância mostra que o Tribunal Geral considerou acertadamente que estas tinham apresentado a sua alegação — relativa ao exame dos elementos de prova económicos apresentados no procedimento administrativo — de uma forma tão sucinta que não era possível identificar no texto da petição uma argumentação suscetível de a sustentar. Com efeito, os argumentos que suportam esta alegação encontram‑se, e devem ser procurados, na íntegra nos referidos anexos. É o que, de resto, resulta claramente dos n.os 185 e 186 do acórdão recorrido. Esta análise é também válida quanto ao tratamento do anexo A.20, referido no n.° 280 do acórdão recorrido. Com efeito, no que se refere a este anexo, não se pode deixar de observar que as recorrentes no recurso principal, na sua petição para o Tribunal Geral, se limitaram a efetuar uma remissão global para esse anexo numa nota de pé de página, sem nenhuma outra especificação. Nestes termos, entendo que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro no tratamento dos referidos anexos.

25.      Quanto ao argumento segundo o qual, quando os anexos contenham apenas elementos factuais, esses elementos não devem ser apresentados no corpo da petição, há que recordar que, nos termos da jurisprudência acima referida no n.° 19, os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia o recurso ou um fundamento ou mesmo um argumento não só devem ser expostos sumariamente na petição, mas devem também resultar, de um modo coerente e compreensível, do seu próprio texto, o que, como acima resulta do n.° 24, não sucede no caso.

26.      À luz destas considerações, entendo que o fundamento relativo a erros de direito respeitantes à admissibilidade de determinados anexos deve ser julgado improcedente.

2.      Quanto à natureza de associação de empresas da MasterCard (segundo fundamento do recurso principal)

a)      Acórdão recorrido

27.      O Tribunal Geral abordou a questão da qualificação da MasterCard e das decisões de fixação das CIM à luz do artigo 81.°, n.° 1, CE, nos n.os 241 a 260 do acórdão recorrido. Primeiro, circunscreveu o âmbito desta questão do ponto de vista de saber se, «apesar das alterações introduzidas pela IPO, a organização de pagamento MasterCard continua[va] a ser uma forma institucionalizada de coordenação do comportamento dos bancos» (n.° 244) e se as CIM eram uma expressão desta coordenação(23). Em seguida, por um lado, observou, nos n.os 245 a 247, que, posteriormente à IPO, «os bancos continuaram a exercer um poder decisório coletivamente sobre aspetos essenciais do funcionamento da organização de pagamento MasterCard, tanto a nível nacional como a nível europeu», e que a manutenção desse poder decisório «tend[ia] a relativizar consideravelmente as consequências a retirar da IPO». Por outro lado, nos n.os 250 a 258, decidiu que, dada a existência de uma comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos na fixação das CIM num montante elevado, a Comissão tinha podido validamente concluir que «as CIM refletiam os interesses dos bancos, apesar de estes já não controlarem a MasterCard desde a IPO». O Tribunal Geral decidiu, portanto, à luz dos mesmos elementos de continuidade em que se tinha apoiado a Comissão, que esta tinha acertadamente mantido a qualificação da MasterCard como uma associação de empresas, bem como a de decisões de uma associação de empresas, relativamente às decisões dos órgãos da MasterCard que fixam as CIM.

b)      Recurso da decisão do Tribunal Geral

28.      As recorrentes no recurso principal, apoiadas pela RBS, pela LBG, pela HSBC e pela MBNA, alegam que a conclusão do Tribunal Geral, segundo a qual a MasterCard age como uma associação de empresas quando fixa as CIM, enferma de erro de direito e/ou de falta de fundamentação. Defendem, por um lado, que o primeiro fundamento do acórdão recorrido para corroborar esta conclusão, a saber, o facto de, posteriormente à IPO, os bancos terem mantido um poder decisório residual no seio da organização de pagamento MasterCard, não seria pertinente, dado que esse poder se exerce quanto a questões diferentes da fixação das CIM e que o próprio Tribunal Geral reconheceu, no n.° 245 do acórdão recorrido, que as decisões relativas a estas comissões «[eram] adotadas pelos órgãos da organização de pagamento MasterCard e que os bancos não participam nesse processo decisório». Por outro lado, as recorrentes no recurso principal alegam que o segundo fundamento em que se baseia o Tribunal Geral, a saber, a alegada existência de interesses comuns entre a organização de pagamento MasterCard e os bancos, na fixação das CIM, não é relevante, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça, nem suficiente para demonstrar a existência de uma associação de empresas, a qual não pode, designadamente, ser inferida unicamente com base na circunstância de uma sociedade poder ser levada a ter em consideração, nas suas decisões comerciais, os interesses dos seus clientes. Além disso, o raciocínio do Tribunal Geral equivaleria a defender que os bancos adquirentes também têm interesse em que as CIM sejam fixadas num montante elevado, apesar de isso implicar um aumento dos seus custos e, portanto, uma diminuição potencial dos seus proveitos.

c)      Análise

29.      A questão da qualificação da MasterCard e das suas decisões à luz do artigo 81.°, n.° 1, CE, após a introdução da MasterCard Inc. na bolsa inscreve‑se, desde o procedimento administrativo, numa dialética de rutura e de continuidade. Apesar de as recorrentes no recurso principal — que não impugnaram a qualificação da MasterCard uma associação de empresas no período anterior a 25 de maio de 2006 — terem insistido na importância das alterações ao nível da estrutura e da gestão da organização após esta data, a Comissão e o Tribunal Geral constataram uma identidade substancial do seu modo de funcionamento antes e depois da IPO e concluíram que esta não tinha alterado o equilíbrio preexistente dos interesses recíprocos dos diferentes atores do sistema, nem a realidade económica das CIM.

30.      Embora, neste contexto, as alegações em análise contenham diversos elementos de crítica às apreciações factuais operadas pelo Tribunal Geral, estas suscitam, contudo, contrariamente ao que defende a Comissão, uma questão de direito, relativa à interpretação e à aplicação ao caso concreto do conceito de associação de empresas na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE.

i)      Quanto à alegada violação da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativamente ao conceito de associação de empresas

31.      Em primeiro lugar, as recorrentes no recurso principal alegam que o Tribunal Geral se afastou da jurisprudência do Tribunal de Justiça respeitante a este conceito. Entendem que, segundo esta jurisprudência, uma entidade só poderá ser qualificada de associação de empresas, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, se for composta por uma maioria de representantes das empresas em causa e se, atendendo à legislação nacional aplicável, esta puder livremente tomar as suas decisões no interesse exclusivo das referidas empresas.

32.      Preliminarmente, diria que esta interpretação me parece demasiado restritiva. Apesar de, efetivamente, se basear nos dois critérios, respeitantes à composição e ao enquadramento legal das atividades da entidade em questão, que decorrem da jurisprudência do Tribunal de Justiça, defende, contudo, uma aplicação estrita dos referidos critérios, que não é compatível com a vocação do artigo 81.° CE para abranger qualquer forma de cooperação entre empresas contrária aos objetivos prosseguidos por esta disposição nem com a amplitude do âmbito que a jurisprudência atribui ao conceito de associação de empresas.

33.      Conforme o Tribunal Geral recordou acertadamente no acórdão recorrido (24), resulta, de uma maneira geral, da jurisprudência, que os conceitos de «acordo», de «prática concertada» e de «decisões de associações de empresas» constantes do artigo 81.°, n.° 1, CE pretendem abranger qualquer forma de colusão entre empresas que tenda a produzir os efeitos proibidos por essa disposição, independentemente da forma como se manifesta (25). Deste modo, as empresas não se podem furtar à proibição prevista pela referida disposição pelo simples facto de coordenarem o seu comportamento no mercado através de um órgão ou de uma estrutura comum ou de confiarem essa coordenação a um organismo independente (26). No que se refere especificamente ao conceito de associação de empresas, este foi interpretado num sentido amplo e designa qualquer organismo, mesmo que desprovido de personalidade jurídica e prossiga um fim não lucrativo (27) e independentemente da sua qualificação jurídica à luz do direito nacional (28) e da circunstância de os seus membros serem pessoas individuais ou coletivas ou, eles próprios associações de empresas (29). Foi acolhida uma interpretação em sentido amplo também no que respeita ao conceito de decisão de uma associação de empresas. Com efeito, resulta da jurisprudência que este abrange qualquer ato, mesmo que não tenha um caráter obrigatório (30), que, independentemente da sua exata natureza jurídica, constitua a expressão fiel da vontade da associação de coordenar o comportamento dos seus membros (31).

34.      Contrariamente ao que alegam as recorrentes no recurso principal, não é possível deduzir dos precedentes jurisprudenciais por estas indicados, e designadamente do acórdão Wouters, (32) que os dois critérios anteriormente referidos podem ser aplicados independentemente do organismo em causa. No processo que esteve na origem deste acórdão, à semelhança de outros casos que referem as recorrentes no recurso principal (33), não estavam em causa organismos privados de natureza puramente comercial, como a MasterCard, mas sim organismos públicos, designadamente de cariz profissional, aos quais a lei frequentemente atribui poderes regulamentares, e que prosseguiam, além do interesse coletivo dos seus membros, fins de interesse público (34). Em todos estes casos, tratava‑se essencialmente da questão de saber se, atendendo ao regime de direito público a que estavam sujeitos, esses organismos agiam no mercado de uma forma autónoma, porquanto os seus comportamentos, os atos que aprovavam ou em cuja adoção participavam, poderiam ser considerados acordos, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE. No âmbito desta apreciação, o Tribunal de Justiça teve, por vezes, como sucedeu no processo Wouters e, mais recentemente, no processo Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (35), que dissociar as atividades nas quais a entidade em questão agia como organismo investido de poderes públicos e/ou prosseguia fins de interesse público, daquelas em que esta se comportava como uma associação que age no interesse exclusivo dos seus membros.

35.      Foi neste contexto de amálgama entre poderes e interesses públicos e privados que o Tribunal de Justiça elaborou e aplicou os dois critérios em que se apoiam as recorrentes no recurso principal. Foi também neste contexto que o Tribunal de Justiça seguiu a abordagem funcional igualmente evocada por aquelas, segundo a qual uma entidade pode constituir‑se como uma associação de empresas na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE quando desempenha determinadas tarefas, mas não outras, pelo que, para efeitos da sua correta qualificação à luz das regras de concorrência, releva unicamente a natureza das funções que esta exerça quando adota o ato que determina a violação destas regras.

36.      Ora, é incontestável que a MasterCard é um organismo de direito privado que prossegue um objetivo comercial. Não está sujeita a um regime de direito público, nem encarregue de um serviço público e as decisões adotadas pelos seus órgãos são unicamente em função de interesses privados. Nestas circunstâncias, atendendo às considerações acima desenvolvidas nos n.os 34 e 35, não se impunha o recurso aos referidos critérios, elaborados para apreciar contextos substancialmente diferentes do caso vertente, pelo que o Tribunal Geral podia, sem violar o conceito de associação de empresas, conforme interpretado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, tomar em consideração outros elementos de apreciação.

ii)    Quanto à alegada irrelevância dos elementos em que se baseou o Tribunal Geral

37.      As recorrentes no recurso principal alegam, em seguida, que os elementos em que se baseou o Tribunal Geral, a saber, por um lado, a circunstância de que os bancos mantiveram um poder decisório residual dentro da organização de pagamento MasterCard e, por outro lado, a alegada comunidade de interesses entre esta organização e os bancos na fixação das CIM, não são pertinentes para apreciar se estamos em presença de uma associação de empresas na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE e, em qualquer caso, são insuficientes para caraterizar este tipo de associação.

38.      No que se refere ao primeiro destes elementos, argumentam que o facto de os bancos terem mantido poderes decisórios depois da IPO não é irrelevante, na medida em que esses poderes não dizem respeito à fixação das CIM. Ao apoiar‑se nesta circunstância para concluir que a MasterCard agia como uma associação de empresas quando fixava as CIM, o Tribunal Geral violou a abordagem funcional seguida pelo Tribunal de Justiça no acórdão Wouters.

39.      A este respeito, sem entrar no mérito da apreciação efetuada pelo Tribunal Geral quanto à importância atribuída aos referidos poderes decisórios, observo, a título preliminar, que esta apreciação diverge da defendida pelas recorrentes no recurso principal, que tendem a apresentar estes poderes como substancialmente negligenciáveis. No n.° 247 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, salientou, com efeito, que o Conselho de Administração Europeu manteve a sua competência para decidir sobre «questões essenciais», relativas a diferentes aspetos do funcionamento da organização a nível regional.

40.      Feito este esclarecimento, remeto para as considerações prévias, constantes dos n.os 34 e 35, bem como para as considerações feitas anteriormente no n.° 36, das quais decorre que o Tribunal Geral não estava vinculado, nas circunstâncias do caso vertente, a seguir o referido critério funcional e podia, assim, tomar em conta, enquanto elemento de apreciação, os poderes decisórios que os bancos conservaram após a IPO, sem ter que verificar, como pretendem as recorrentes no recurso principal, se estes poderes podiam ter impacto na fixação das CIM.

41.      No que se refere ao segundo dos elementos acima referidos, a saber, a existência de uma comunidade de interesses entre a MasterCard e os bancos na fixação das CIM, as recorrentes no recurso principal defendem, essencialmente, que inferir de uma simples coincidência de interesses entre dois ou mais operadores económicos a existência de uma associação de empresas, conduziria a aplicar o artigo 81.° CE quando não existe qualquer prova de colusão, a qual implica uma concordância de vontades.

42.      Este argumento, em meu entender, não colhe. Com efeito, no caso em apreciação, o Tribunal Geral deu por provada a existência de um quadro institucionalizado ao qual os bancos aderem e no âmbito do qual cooperam entre si e com a MasterCard com vista à realização de um projeto comum, que implica limitações da sua autonomia comercial e que define as linhas da sua ação recíproca. Trata‑se, assim, de um caso muito diferente daquele em que existe um simples paralelismo de comportamentos, referido pelas recorrentes no recurso principal, no qual o interesse das empresas envolvidas de não entrarem em concorrência é prosseguido por cada uma delas autonomamente, alinhando o seu comportamento pelo dos seus concorrentes. O presente caso distingue‑se igualmente do caso Bayer (36), referido pela LBG. Embora seja verdade que, nesse caso, o Tribunal Geral decidiu que, por não ter ficado provada a concordância de vontades entre a Bayer e os seus grossistas para reduzir o comércio paralelo, a Comissão concluíra incorretamente pela existência de um acordo nos termos do artigo 81.° CE, essa conclusão baseou‑se na constatação de que a vontade respetiva das partes tinha sido erradamente interpretada e na constatação de que nem a intenção da Bayer de impor uma proibição à exportação, nem a concordância, ainda que tácita, dos grossistas com esta imposição tinham sido demonstradas (37).

43.      Resulta da análise desenvolvida anteriormente nos n.os 32 a 35 que um organismo se enquadra no conceito associação de empresas na aceção desta disposição quando constitui o quadro no âmbito do qual, ou o instrumento mediante o qual, as empresas coordenam os seus comportamentos no mercado, desde que essa coordenação ou os seus resultados não sejam impostos por poderes públicos. Resulta, além disso, desta análise que, atendendo à função que os conceitos de «associação de empresas» e de «decisão de uma associação de empresas» desempenham na economia do artigo 81.°, n.° 1, CE, a questão de saber se estes se aplicam num determinado caso concreto deve ser apreciada tendo em conta o conjunto dos elementos relevantes para o caso em apreciação, entre os quais se deve destacar a vontade das empresas em causa de coordenarem o seu comportamento no mercado através de uma estrutura coletiva ou de um órgão comum.

44.      Ora, a relevância dos dois elementos anteriormente referidos no n.° 37 não pode ser contestada nas circunstância do caso vertente, no qual a questão da qualificação da MasterCard como uma associação de empresas na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE implicou essencialmente apreciar o impacto da IPO no seu modo de funcionamento, nas suas relações com os bancos filiados, bem como, de maneira mais geral, nos seus equilíbrios internos. A este respeito, recordo que os argumentos que as recorrentes no recurso principal apresentaram na primeira instância para contestar esta qualificação assentavam essencialmente na afirmação de que não podia ser imputada qualquer coordenação aos bancos após 25 de maio de 2006 no que se referia à fixação das CIM, que passaram a ser fixadas pela MasterCard e aplicadas aos bancos associados no quadro de uma relação fornecedor‑cliente.

45.      Quanto ao ponto de saber se, no caso, os referidos elementos eram suficientes para confirmar a qualificação da MasterCard como uma associação de empresas, operada pela Comissão, entendo, com base no conjunto de considerações anteriores, que a priori não pode ser excluída a qualificação de um organismo como associação de empresas, ainda que, como no caso da MasterCard, as decisões que este adota não sejam tomadas pela maioria dos representantes das empresas em causa, nem no interesse exclusivo destas, dado que, como resulta da apreciação do conjunto de circunstâncias do caso vertente, as referidas empresas acordam, ou pelo menos aceitam, coordenar o seu comportamento no mercado através destas decisões e que os seus interesses coletivos coincidem com os interesses levados em conta na adoção das referidas decisões. Esta qualificação também não pode excluída a priori num contexto como o do caso vertente, no qual as empresas em questão prosseguiram, durante vários anos, o mesmo objetivo de regulação em comum do mercado no âmbito da mesma organização, embora sob formas diferentes.

46.      Ora, baseando‑se na sua apreciação dos factos e das circunstâncias do caso vertente, o Tribunal Geral decidiu que as decisões do Conselho de Administração Mundial da MasterCard Inc., de fixação das CIM, continuavam a refletir os interesses coletivos dos bancos filiados no sistema e que estes continuavam a coordenar deliberadamente a sua política em matéria de comissões interbancárias transfronteiriças através das referidas decisões, apesar de os bancos já não fazerem parte do processo decisório que levava à sua adoção. Esta apreciação, salvo em caso de desvirtuação dos fatos e/ou dos elementos de prova (38), encontra‑se subtraída à sindicância do Tribunal de Justiça.

47.      A este respeito, deve ser afastada a crítica que as recorrentes no recurso principal, apoiadas pela HSBC, dirigem ao Tribunal Geral, por este ter confirmado a afirmação da Comissão de que os bancos adquirentes também tinham interesse na fixação de CIM elevadas. Em primeiro lugar, esta crítica pretende pôr em causa a apreciação dos factos e dos elementos de prova efetuada pelo Tribunal Geral, sem invocar uma desvirtuação destes, e sem apresentar uma demonstração que vá além de meras afirmações (39). Em segundo lugar, contrariamente ao que alegam as recorrentes no recurso principal, o Tribunal Geral não se limitou, nesta matéria, a constatar que os bancos adquirentes tinham a possibilidade repercutir as CIM sobre os seus clientes, tendo esclarecido que um sistema de fixação multilateral supletiva das comissões interbancárias, como o das CIM, dava aos bancos adquirentes a segurança de que o aumento ocasionado no montante das MSC não teria influência na sua posição concorrencial (40). Por último, quanto à referência feita pelo Tribunal Geral à regra do sistema MasterCard, segundo a qual os bancos que pretendessem ser adquirentes de transações deviam ter igualmente uma atividade de emissão de cartões, as recorrentes no recurso principal não podem fundamentar a sua irrelevância invocando simplesmente a circunstância de esta regra ter sido aplicada até 31 de dezembro de 2004 e já não estar em vigor à data da IPO. Com efeito, resulta do n.° 254 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral confirmou a explicação da Comissão, segundo a qual, devido à regra anteriormente referida, o sistema tinha evoluído no sentido de a quase totalidade dos bancos que dispunham de uma atividade de aquisição serem igualmente emitentes de cartões bancários, beneficiando nestes termos das CIM, o que se manteve mesmo depois da abolição da referida regra. Resulta, além disso, do mesmo número do acórdão recorrido, que as recorrentes não apresentaram ao Tribunal Geral elementos cuja natureza permitisse contestar o mérito desta explicação.

48.      Em conclusão, o exame destas alegações não permitiu demonstrar que, ao confirmar a qualificação da MasterCard como uma associação de empresas, efetuada pela Comissão, o Tribunal Geral tenha violado o conceito de associação de empresas, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, conforme interpretado pelo julgador da União.

3.      Quanto à existência de efeitos restritivos na concorrência (fundamento único do recurso subordinado da RBS e primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG)

a)      Decisão impugnada e acórdão recorrido

49.      Por razões de clareza, será necessário retomarmos sumariamente as diversas passagens da análise constante da decisão impugnada relativamente aos efeitos das CIM na concorrência. Nesta decisão, a Comissão concluiu que, na medida em que estas influenciavam o montante das comissões interbancárias cobradas pelos bancos emitentes aos bancos adquirentes (41), os quais repercutiam este custo nas despesas imputadas aos comerciantes, as CIM produziam efeitos restritivos na concorrência através dos preços no mercado de aquisição, em detrimento dos comerciantes e dos seus clientes (42). Para chegar a esta conclusão, a Comissão, em primeiro lugar, constatou, apoiando‑se em duas análises quantitativas, que as CIM constituíam um montante mínimo para os encargos imputados pelos bancos adquirentes aos comerciantes independentemente da sua dimensão (43). Em segundo lugar, deduziu de um inquérito aos comerciantes conduzido pela própria Comissão em 2004 (a seguir «Estudo de Mercado de 2004») que as CIM impediam uma redução das MSC abaixo de um determinado montante. Em terceiro lugar, após ter rejeitado os argumentos da MasterCard para refutar a tese do efeito restritivo das CIM na concorrência no mercado da aquisição (44), a Comissão examinou os efeitos das CIM no mercado da emissão, e concluiu que os bancos presentes nesse mercado tendiam a favorizar as atividades que geravam rendimentos interbancários superiores e que essa estratégia era suscetível de aumentar ainda mais o custo da aceitação dos cartões bancários no mercado da aquisição (45). Em quarto lugar, observou que a concorrência intersistemas (entre as diferentes redes de pagamento através de cartões bancários, essencialmente entre a Visa e a MasterCard) não só não impedia que a MasterCard mantivesse as comissões interbancárias num montante elevado, mas ainda exercia sobre estas uma pressão no sentido de uma subida, amplificando as distorções da concorrência no mercado da aquisição (46). Em quinto lugar, constatou que as CIM não estavam sujeitas a nenhuma limitação por parte dos bancos adquirentes, nem por parte dos comerciantes (47). Quanto a este último ponto, a Comissão tomou em consideração, entre outros fatores, a regra da rede MasterCard que obrigava os comerciantes (e os bancos adquirentes) a aceitar todos os cartões bancários, a saber, todos os produtos que a MasterCard oferecia no mercado de emissão independentemente do banco de emissão (Honour‑All‑Cards Rule, a seguir «HACR»). Por último, a Comissão considerou que os membros da MasterCard exerciam coletivamente um poder de mercado relativamente aos comerciantes e aos clientes destes, e que as CIM lhes permitiam explorá‑lo.

50.      O Tribunal Geral examinou a questão dos efeitos das CIM na concorrência nos n.os 123 a 193 do acórdão recorrido. Em primeiro lugar, abordou e considerou improcedentes as alegações relativas a erro na análise do jogo da concorrência num sistema que funcionasse sem as CIM. Neste contexto, rejeitou, por um lado, as críticas referentes à tomada em consideração, pela Comissão, na sua análise contrafactual, de uma regra que proibisse a tarifação a posteriori (48) como uma regra supletiva que substituísse as CIM (n.° 132 do acórdão recorrido) e, por outro lado, as críticas relativas à referência, feita pela Comissão no quadro desta análise, ao facto de existirem negociações bilaterais entre os bancos de emissão e os bancos adquirentes, que conduziriam, a prazo, ao desaparecimento das comissões interbancárias (n.° 133). Em seguida, rejeitou os argumentos em que se criticava a Comissão por não ter demonstrado que a supressão das CIM aumentaria o grau de concorrência existente entre adquirentes (n.os 135 a 136) e, designadamente, o relativo à comparação das CIM a um custo de entrada comum, neutro do ponto de vista da concorrência (n.° 143). Em segundo lugar, nos n.os 168 a 182 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral abordou e rejeitou um determinado número de alegações relativas ao exame do mercado dos produtos, confirmando a análise do mercado feita na decisão impugnada. No que se refere, designadamente, à existência de um mercado autónomo da aquisição, salientou que, embora exista uma certa complementaridade entre as vertentes «emissão» e «aquisição», por um lado, se podia distinguir entre os serviços prestados aos titulares de cartões e aos comerciantes e que, por outro, os titulares de cartões e os comerciantes exerciam pressões concorrenciais separadas, respetivamente, sobre os bancos de emissão e sobre os bancos de aquisição (n.os 176 e 177). Neste mesmo contexto, considerou que as críticas relativas à falta de tomada em conta da natureza dualista do mercado realçavam as vantagens económicas decorrentes das CIM, e deste modo, não eram pertinentes no âmbito de um fundamento relativo à violação do artigo 81.°, n.° 1, CE. Por último, o Tribunal Geral considerou improcedente a alegação relativa ao exame dos elementos de prova económicos apresentados durante o procedimento administrativo defendida pelas recorrentes no recurso principal (v. n.° 139 e segs. das presentes conclusões), bem como a alegação de falta de fundamentação, decorrente da alteração do critério da Comissão em relação à Decisão Visa, de 24 de julho de 2002 (49).

b)      Quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS

i)      Quanto à alegação de erro de direito na análise contrafactual conduzida pelo Tribunal Geral

51.      Através do único fundamento do seu recurso, a RBS, apoiada pelas recorrentes no recurso principal, acusa, em primeiro lugar, o Tribunal Geral de não ter verificado se a hipótese elaborada pela Comissão, no âmbito da sua análise contrafactual, baseada na aplicação de uma regra que proíbe aos bancos emitentes a tarifação a posteriori, teria podido produzir‑se credivelmente, caso as CIM não existissem. Limitando‑se a afirmar a viabilidade económica desta regra, o Tribunal Geral teria confundido a análise dos efeitos das CIM na concorrência com a da necessidade objetiva da restrição por ela produzida.

52.      Segundo jurisprudência constante, para apreciar se um acordo (ou uma decisão de uma associação de empresas) deve ser considerado proibido devido aos seus efeitos sobre o mercado, é necessário examinar o jogo da concorrência no quadro real em este que se produziria se não existisse o acordo (ou a decisão) controvertido (50). O método de análise indicado pelo Tribunal de Justiça implica, assim, uma comparação entre a estrutura concorrencial induzida pela alegada restrição e aquela que teria prevalecido caso a referida restrição não existisse.

53.      Uma vez que o segundo fator desta comparação é o resultado de uma apreciação baseada em hipóteses, não se pode pedir que seja feita prova de que o cenário construído no âmbito desta apreciação se produziria inevitavelmente, caso a alegada restrição não existisse (51). Contudo, este cenário deve ser suficientemente realista e plausível, e portanto, não apenas teoricamente possível, à luz de uma análise de todos os fatores relevantes, como, designadamente, as caraterísticas dos produtos ou dos serviços visados, a posição das partes no acordo no mercado em causa (52), a estrutura deste, bem como o contexto económico, jurídico e técnico que regem o seu funcionamento (53), as condições da concorrência atual e potencial (54), a existência de barreiras à entrada (55), o grau de saturação do mercado e a fidelidade dos consumidores às marcas existentes (56), a existência ou o exercício de direitos de propriedade intelectual.

54.      No caso em apreciação, a Comissão examinou o processo concorrencial que se teria desenvolvido no mercado de aquisição caso as CIM não existissem nos n.os 458 a 460 da decisão impugnada, para concluir que, caso as CIM não existissem e com uma proibição da tarifação a posteriori, os preços faturados aos comerciantes pelos adquirentes «seriam fixados tomando apenas em consideração os custos marginais do adquirente e a sua margem comercial». Segundo a Comissão, «a incerteza dos bancos adquirentes quanto ao montante das comissões interbancárias que os seus concorrentes aceitariam, numa base bilateral, pagar aos emitentes exerceria uma restrição sobre os adquirentes», pelo que «a longo prazo, podemos esperar que este processo conduza ao estabelecimento de créditos e de débitos interbancários pelo valor nominal do pagamento, ou seja sem dedução de qualquer comissão interbancária». No n.° 133 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral confirmou esta análise. Assim, contrariamente ao que alegou A RBS e as recorrentes no recurso principal, designadamente na audiência, a decisão impugnada não está desprovida de uma análise contrafactual e o acórdão do Tribunal Geral não enferma de erro de direito por não ter sancionado a Comissão por esta alegada omissão.

55.      A RBS contesta a afirmação constante do n.° 132 do acórdão recorrido segundo a qual «a circunstância de que a hipótese de um sistema MasterCard que funciona sem CIM — unicamente com base numa regra que proibisse as tarifações ex post — parece ter um caráter economicamente viável é suficiente para justificar que seja tomada em consideração, no âmbito da sua análise dos efeitos das CIM na concorrência».

56.      Para compreender o sentido e o alcance deste ponto, é necessário salientar que, no acórdão recorrido, o Tribunal Geral abordou as alegações relativas a erros de apreciação no decorrer da análise dos efeitos das CIM na concorrência, na sequência das alegações relativas ao exame errado do caráter objetivamente necessário das CIM. Com efeito, o Tribunal Geral considerou, atendendo às críticas suscitadas contra a apreciação da Comissão nos termos do artigo 81.°, n.° 1, CE, que era preferível verificar o caráter economicamente viável de um sistema MasterCard que funcionasse sem as CIM, antes de apreciar, como é exigido pela jurisprudência acima indicada no n.° 52, como funcionaria a concorrência no mercado de aquisição no âmbito deste tipo de sistema.

57.      Este processo conduziu o Tribunal Geral a transportar para o quadro do exame dos efeitos das CIM na concorrência as conclusões a que tinha chegado no final do seu exame relativamente ao caráter objetivamente necessário destas. Assim, tendo concluído, no final deste exame, que a Comissão concluíra acertadamente que um mecanismo de liquidação supletivo incluindo CIM de valor positivo não era objetivamente necessário à viabilidade do sistema MasterCard, e que este teria podido funcionar baseando‑se numa alternativa menos restritiva, a saber uma regra que proibisse a tarifação a posteriori, considerou, no referido n.° 132, que era possível que esta instituição tivesse assumido como ponto de partida da sua análise do jogo da concorrência caso as não existissem CIM, um cenário caraterizado por esta regra. Contrariamente ao alegado pela RBS na audiência, este cenário contrafactual não foi elaborado pelo Tribunal Geral para preencher uma lacuna da decisão impugnada, já figurando na referia decisão (57).

58.      Portanto, o Tribunal Geral não confundiu os critérios da análise dos efeitos de uma restrição da concorrência e os aplicáveis ao exame do caráter objetivamente necessário de uma restrição acessória, nem violou os princípios fixados pela jurisprudência acima recordada no n.° 52, substituindo o «quadro real» no âmbito do qual deve ser apreciado o jogo da concorrência no caso da alegada restrição não existir, por um quadro «economicamente viável». No acima referido n.° 132 do acórdão recorrido, limitou‑se, no essencial, a recordar, com base nos resultados da sua apreciação do caráter objetivamente necessário das CIM, as condições em que, caso a alegada restrição não existisse, o sistema da MasterCard teria podido continuar a funcionar.

59.      No que se refere à alegação, que as recorrentes no recurso principal reiteraram na sua resposta no recurso subordinado da RBS, segundo a qual a introdução de uma regra que proibisse a tarifação supletiva não seria realista, que esta regra não representaria o resultado das forças do mercado e que nunca teria sido adotada pela MasterCard, exceto se a isso fosse obrigada por uma intervenção reguladora, remeto para as considerações desenvolvidas nos n.os 101 a 106, infra, no contexto do exame da necessidade objetiva das CIM. Neste estádio, limito‑me a assinalar que, em primeira instância, as recorrentes no recurso principal insistiram abundantemente, por um lado, no facto de um mecanismo de liquidação das transações supletivas ser uma exigência essencial de qualquer sistema quadripartido caraterizado pela HACR e, por outro lado, na inexistência de processos do mercado entre bancos de emissão e bancos adquirentes. Nestas circunstâncias, pergunto‑me se este mecanismo supletivo não será necessariamente o resultado de uma intervenção externa às forças de mercado, quer se trate de uma decisão adotada no âmbito do sistema de pagamento(58), ou de uma intervenção da autoridade da concorrência (59).

60.      Assim, estamos perante um caso muito diferente, comparativamente ao que esteve na origem do acórdão O2 (60), igualmente indicado pelas recorrentes no recurso principal na sua contestação ao recurso subordinado da RBS. Neste acórdão, o Tribunal Geral censurou a Comissão por não ter corretamente reconstruído a estrutura concorrencial que teria prevalecido no caso de inexistência do acordo controvertido, na medida em que esta, designadamente, considerara adquirida a presença da O2 no mercado da telefonia móvel 3G, quando este dado não estava fundamentado e era, além disso, contrariado pela análise que a Comissão tinha efetuado para efeitos do artigo 81.°, n.° 3, CE. No caso em apreciação, em contrapartida, alega‑se, no essencial, que a Comissão examinou a situação concorrencial do mercado da aquisição caso as CIM não existissem sem tomar em conta o mecanismo supletivo que a MasterCard teria provavelmente decidido adotar para substituir as CIM.

61.      Atendendo aos motivos expostos, parece‑me que a alegação da RBS relativa a erro de direito que afeta a análise contrafactual conduzida pelo Tribunal Geral deve ser declarada improcedente.

ii)    Quanto à alegação relativa à análise insuficiente dos efeitos das CIM na concorrência

62.      A RBS censura, em seguida, a Comissão e o Tribunal Geral por não terem baseado a sua análise dos efeitos das CIM sobre a concorrência em provas específicas e concretas, tendo‑se limitado a considerações de ordem geral e a simples conjeturas, seguindo uma abordagem que seria, no caso de se presumir uma alegada restrição pelo objetivo adequada, mas não, como no caso vertente, uma restrição pelo efeito.

63.      Esta alegação é pouco circunstanciada, limitando‑se, no essencial, a referir o caráter genérico das afirmações do Tribunal Geral, e procede a uma leitura seletiva do acórdão recorrido. Contrariamente ao que deixa entender a RBS, através da remissão para as expressões utilizadas na segunda frase do n.° 143 do acórdão recorrido (61), o Tribunal Geral não se limitou a inferir os efeitos restritivos das CIM unicamente a do facto de estas fixarem um montante mínimo para as MSC. Pelo contrário, em primeiro lugar, o Tribunal Geral recordou, no n.° 140 do acórdão recorrido, o conteúdo do artigo 81.°, n.° 1, alínea a), CE, salientando que o seu objeto é «proibir as empresas de falsearem a evolução normal dos preços no mercado». Em segundo lugar, considerando improcedente a alegação de que as CIM agem como um custo de entrada comum, explicou que «as CIM limitam a pressão que os comerciantes podem exercer sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC reduzindo as possibilidades de os preços diminuírem abaixo de um determinado limiar» (n.° 143, terceira frase). Em terceiro lugar, abordou e considerou improcedentes as alegações e os argumentos apresentados pelas recorrentes no recurso principal e pelos intervenientes contra a análise dos efeitos restritivos das CIM constante da decisão impugnada. Neste contexto, examinou e confirmou a apreciação feita pela Comissão no que se refere, designadamente, às questões de saber se esta tinha feito prova bastante de que as CIM fixavam um mínimo para as MSC (n.os 159 a 165) e se a pressão exercida pelos comerciantes sobre as CIM era insuficiente (n.os 157 e 158), se a Comissão tinha corretamente definido o mercado dos produtos (n.os 169 a 173) e estabelecido como mercado autónomo e relevante o da aquisição (n.os 175 a 178) e se esta tinha validamente afastado da sua análise a pressão concorrencial exercida por outros meios de pagamento sobre o montante das CIM (n.° 180), bem como a natureza dualista do mercado (n.os 181 e 182). Por último, o Tribunal Geral examinou e confirmou a fiabilidade e o valor probatório dos documentos nos quais a Comissão se tinha baseado, a saber, por um lado, as declarações de uma companhia petrolífera, de uma cadeia de supermercados situada no Reino Unido, de uma companhia aérea e de um estabelecimento de mobiliário (n.os 146 e 147) e, por outro lado, o Estudo de Mercado de 2004 (n.os 148 a 158).

64.      Atendendo ao exposto, o Tribunal Geral não pode, em meu entender, ser censurado por ter efetuado, conforme é apontado pela RBS, uma análise insuficiente no que se refere a uma restrição pelo efeito. Em qualquer caso, embora na decisão impugnada, a Comissão não tenha tomado uma posição definitiva quanto a um possível objeto anticoncorrencial das CIM e, portanto, tivesse o dever de apreciar os seus efeitos no mercado, é certo que, quando se trata, como no caso vertente, de um acordo que afeta diretamente o mecanismo de formação dos preços, a capacidade deste para falsear a evolução normal dos preços no mercado pode, em concreto, ser relativamente mais fácil de demonstrar. A este respeito, assinalo que, no acórdão relativo aos bancos austríacos (62), o Tribunal Geral, sem ter sido contrariado pelo Tribunal de Justiça em sede de recurso (63), afirmou que, para concluir se um acordo sobre os preços, adotado pelas empresas que nele participaram, teve um impacto concreto no mercado, «basta que os preços acordados tenham servido de base para a fixação dos preços de transação individuais, limitando assim a margem de negociação dos clientes» (64). É verdade que o acordo em causa no processo que esteve na origem do referido acórdão tinha sido considerado restritivo pelo objetivo e que a Comissão só tinha tomado em conta os seus efeitos no mercado na avaliação da gravidade da infração para efeitos da determinação da coima. Contudo, não se pode considerar que um menor grau de rigor na prova dos efeitos de um acordo no mercado seja exigido para efeitos da determinação do montante da coima, salvo para apreciar se este é abrangido pelo artigo 81.°, n.° 1, CE (65).

iii) Quanto à alegação relativa a uma contradição que afeta a fundamentação do acórdão recorrido

65.      A RBS assinala, por último, uma contradição que diz respeito à capacidade dos comerciantes para influenciarem a política da MasterCard e dos seus membros em matéria de preços, entre o que é afirmado no n.° 143 do acórdão recorrido e as constatações contidas nos n.os 150, 157 e 158 do mesmo acórdão.

66.      Esta alegação deve ser, em meu entender, igualmente considerada improcedente. Com efeito, a «coação» que está em causa nos n.os 150, 157 e 158 do acórdão recorrido é a que os comerciantes poderiam exercer sobre o montante das CIM, recusando ou desencorajando a utilização dos cartões MasterCard, coação essa que, com base no Estudo de Mercado de 2004, a Comissão e o Tribunal Geral concluíram ser insuficiente, devido às repercussões negativas que este comportamento dos comerciantes teria podido causar à sua clientela (66). Em contrapartida, no n.° 143 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral refere‑se à «pressão» que os comerciantes podem exercer sobre os bancos adquirentes aquando da negociação das MSC, pressão essa que se encontra limitada pelas CIM — que constituem o limiar abaixo do qual não é suscetível que as MSC desçam — mas que seria mais forte num mercado de aquisição que funcionasse sem a existência das CIM. Portanto, é manifesto que não existe qualquer contradição entre os números do acórdão recorrido indicados pela RBS, uma vez que se referem a situações diferentes.

iv)    Conclusões quanto ao fundamento único do recurso subordinado da RBS

67.      Com base no conjunto de considerações anteriores, entendo que o fundamento único do recurso subordinado da RBS, e, logo, o próprio recurso subordinado, devem ser julgados improcedentes.

c)      Quanto ao primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG

68.      No âmbito do seu primeiro fundamento de recurso, a LBG apresenta, no essencial, três críticas contra o acórdão recorrido.

69.      Alega, em primeiro lugar, que o Tribunal Geral não apresentou uma fundamentação adequada sobre a razão pela qual as CIM falseiam a concorrência no mercado da aquisição, apesar de constituírem um custo de entrada comum. A este respeito, basta recordar que o Tribunal Geral considerou improcedente a alegação relativa de que as CIM teriam agido como um custo de entrada comum no n.° 143 do acórdão recorrido, em que explicou que, em comparação com um mercado de aquisição que funcionasse sem a sua existência, «as CIM limitam a pressão que os comerciantes podem exercer sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC reduzindo as possibilidades de os preços diminuírem abaixo de um determinado limiar». Esta explicação vem acompanhada de uma remissão para a constatação efetuada pela Comissão, e confirmada pelo Tribunal Geral, referente ao caráter viável de um sistema MasterCard que funcionasse sem as CIM. No seu conjunto, esta fundamentação, que é baseada na existência de uma relação inversamente proporcional entre a margem de negociação dos comerciantes sobre as MSC e o montante das CIM, bem como na afirmação do caráter artificial e não objetivamente necessário das CIM, é, em meu entender, suficiente para permitir a compreensão do raciocínio seguido pelo Tribunal Geral.

70.      Em segundo lugar, a LBG censura, no essencial, o Tribunal Geral por ter considerado que existia um acordo sobre os preços no mercado da emissão, embora tenha examinado os seus efeitos no mercado a jusante da aquisição. Limita‑se, quanto a esta matéria, a remeter para os argumentos desenvolvidos nos n.os 48 a 52 da suas alegações de intervenção no Tribunal Geral, a que este não teria respondido.

71.      Segundo a Comissão, esta alegação é inadmissível porquanto, na sua qualidade de interveniente, a LBG não podia invocar os referidos argumentos, que suscitavam, na realidade, um fundamento novo, relativamente aos invocados em apoio da petição, o qual diz respeito a um erro na definição do mercado relevante. Nesta matéria, assinalo que, nos pontos acima indicados do articulado de intervenção apresentado na primeira instância pela LBG, este pretendia, no essencial, censurar a Comissão, em primeiro lugar, por ter optado, na sua análise contrafactual, por uma hipótese — a saber um sistema MasterCard que funcionasse sem as CIM mas com uma regra que proibisse a tarifação a posteriori — que tinha o mesmo impacto sobre a concorrência entre bancos adquirentes do que as CIM (n.os 49 e 50), em segundo lugar, por esta se ter apoiado no Estudo de Mercado de 2004, cujo valor probatório é posto em causa (n.° 51) e, em terceiro lugar, por ter adotado uma abordagem «não usual», quando examinou os efeitos restritivos das CIM no mercado da aquisição e não no da emissão, no qual o acordo sobre os preços foi aplicado (n.os 52 a 54). Ora, o Tribunal Geral respondeu às duas primeiras alegações, ou a alegações praticamente similares suscitadas na primeira instância pelas recorrentes no recurso principal, respetivamente nos n.os 143 e 149 a 156 do acórdão recorrido. Quanto à terceira alegação, esta confunde‑se, em parte, com a alegação relativa à falta de tomada em conta da natureza dualista do mercado, igualmente suscitada pela LBG em primeira instância e objeto da terceira crítica por esta apresentada no âmbito do fundamento em análise, examinada nos n.os 73 a 75 adiante, e, em parte, visa questionar a escolha do mercado relevante feita pela Comissão. Quanto a este último aspeto, o Tribunal Geral respondeu nos n.os 168 a 178 do acórdão recorrido. Portanto, em princípio, era admissível que a LBG alegasse a existência de eventuais erros de direito nas apreciações constantes dos números acima referidos do acórdão recorrido.

72.      No que se refere à crítica relativa a uma alegada omissão de pronúncia, a alegação em análise deve, no entanto, ser considerada improcedente, dado que, como acabei de referir, o Tribunal Geral, na realidade, respondeu, nos pontos acima referidos, aos diferentes argumentos apresentados pela LBG no seu articulado de intervenção. Quanto ao remanescente, dada a inexistência de impugnações especificamente dirigidas contra os números do acórdão recorrido que contêm a referida resposta, a mera afirmação de que o Tribunal Geral não teria «tratado de forma adequada» os argumentos e os elementos que lhe foram apresentados não pode deixar de ser interpretada como um pedido de reapreciação dos referidos argumentos e elementos dirigida ao Tribunal de Justiça, o qual é, neste sentido, inadmissível, em sede de recurso de segunda instância.

73.      O mesmo se aplica à terceira crítica apresentada pela LBG contra o acórdão recorrido, que visa censurar o Tribunal Geral por não ter tomado em conta a importância das pressões exercidas pelos «outros sistemas de pagamento» no mercado da emissão, nem a natureza dualista do mercado.

74.      Com efeito, a LBG limita‑se, no essencial, a afirmar que o Tribunal Geral afastou erradamente estas questões da sua análise para efeitos do artigo 81.°, n.° 1, CE, e que reconheceu a sua relevância apenas para efeitos da aplicação do n.° 3 deste artigo, sem todavia explicar as razões pelas quais este procedimento seria errado, limitando‑se apenas a reiterar os argumentos já apresentados no âmbito da sua primeira e segunda críticas e a remeter para o conteúdo das suas alegações de intervenção apresentadas em primeira instância. A este respeito, assinalo que, nos n.os 180 e 181 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que as críticas relativas à falta de tomada em conta da natureza dualista do mercado eram «irrelevantes no âmbito de um fundamento relativo à violação do artigo 81.°, n.° 1, CE», uma vez que «realçam as vantagens económicas que decorrem das CIM». Ora, a LBG não apresentou, no seu recurso subordinado, nenhum argumento que permita pôr em causa esta interpretação dos argumentos por si apresentados sobre a matéria na primeira instância, ou explicar que vantagens deviam ter sido tomadas em conta pelo Tribunal Geral para efeitos do artigo 81.°, n.° 1, CE e as razões pelas quais se revelava necessário tomá‑las em conta no caso em apreciação, atendendo, designadamente, à jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral nesta matéria. Assinalo igualmente que, contrariamente ao que parece defender a LBG, nos n.os 179 e 180 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral abordou e considerou improcedente o argumento relativo ao facto de a Comissão não ter tomado em consideração «os outros meios de pagamento, quer no quadro de um mercado único, quer, em qualquer caso, como meios para exercer pressão concorrencial». Também neste caso, a LBG não apresenta qualquer contestação contra a apreciação realizada pelo Tribunal Geral. Na falta de uma argumentação mais circunstanciada, o Tribunal de Justiça seria levado a exercer o seu controlo baseando‑se apenas na simples invocação de uma análise alegadamente insuficiente do Tribunal Geral.

75.      Na medida em que a crítica em apreço invoca a falta de fundamentação quanto aos números em causa, esta deve, em meu entender, ser considerada improcedente, uma vez que a fundamentação relevante do acórdão recorrido permite compreender o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral.

76.      Com base nas considerações anteriores, o primeiro fundamento do recurso subordinado da LBG deve, em meu entender, ser considerado totalmente improcedente.

4.      Quanto ao caráter objetivamente necessário das CIM (primeiro fundamento do recurso principal)

a)      Acórdão recorrido

77.      O Tribunal Geral abordou a questão da necessidade objetiva das CIM nos n.os 77 a 121 do acórdão recorrido. Antes de realizar este exame, esclareceu, no n.° 75, que a referência feita pelas recorrentes no recurso principal ao alegado caráter objetivamente necessário das CIM devia ser entendida «no sentido de que a Comissão deveria ter concluído que constituíam uma restrição acessória relativamente ao sistema MasterCard e que, portanto, não podia analisar os seus efeitos na concorrência de forma autónoma, antes devendo tê‑los examinado conjuntamente com os do sistema MasterCard ao qual estavam ligados».

78.      Após ter recordado sumariamente os princípios estabelecidos pelo acórdão M6 e o./Comissão (67) em matéria de restrições acessórias, o Tribunal Geral examinou e considerou improcedente a alegação apresentada pelas recorrentes no recurso principal, relativa à aplicação de critérios jurídicos errados (n.os 84 a 92 do acórdão recorrido). Em seguida, analisou separadamente a alegada necessidade objetiva das CIM, enquanto modalidade de liquidação supletiva das transações (n.os 94 a 99) e mecanismo de transferência de fundos em proveito dos bancos de emissão (n.os 100 a 121). No âmbito do primeiro exame, confirmou a apreciação da Comissão, segundo a qual a introdução no sistema MasterCard de uma regra que impusesse a proibição da tarifação a posteriori constituiria uma alternativa menos restritiva do que as CIM com consequências positivas. No final da sua análise, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão tinha decidido acertadamente que as CIM não eram objetivamente necessárias ao funcionamento do sistema MasterCard.

b)      Quanto ao primeiro fundamento do recurso principal

79.      Através do seu primeiro fundamento, as recorrentes no recurso principal, apoiadas pela RBS, MBNA, HSBC e pela LBG, censuram o Tribunal Geral por diversos erros de direito e por falta de fundamentação referente à avaliação da necessidade objetiva das CIM. Este fundamento divide‑se em quatro partes, relativas, respetivamente, à aplicação de um critério jurídico errado, ao facto de a restrição da concorrência não ter sido examinada no seu contexto, à substituição da apreciação do Tribunal Geral pela da Comissão e à aplicação de um nível de fiscalização insuficiente.

i)      Quanto à primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal, relativa à aplicação de um critério jurídico errado

80.      Através da primeira parte do seu primeiro fundamento, as recorrentes no recurso principal alegam que o Tribunal Geral violou o critério jurídico aplicável ao exame do caráter objetivamente necessário de uma restrição acessória, conforme definido, designadamente, nos acórdãos, do Tribunal de Justiça, DLG (68), e do Tribunal Geral, M6 e o./Comissão (69). Apesar de, nesses precedentes, o juiz da União ter esclarecido que uma restrição é objetivamente necessária quando, caso não existisse, o objetivo prosseguido pela operação principal se tornaria impossível de atingir ou ficaria enfraquecido a capacidade das partes para o prosseguir, isto é, quando esta operação «se mostra dificilmente realizável ou mesmo irrealizável» (70), no n.° 89 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, tornou esse critério mais rígido, afirmando que só as restrições que sejam necessárias para que a operação principal possa, em qualquer hipótese, funcionar podem ser consideradas abrangidas pela teoria das restrições acessórias». Segundo as recorrentes no recurso principal e as intervenientes, o critério correto a aplicar deveria ser «realista do ponto de vista comercial» e não exigir uma necessidade estrita no plano lógico. Este deveria permitir considerar objetivamente necessária uma restrição cuja inexistência «impedisse materialmente o funcionamento efetivo» da operação principal ou a sua capacidade para funcionar «de uma forma eficiente».

81.      É necessário recordar que, segundo o acórdão M6 e o./Comissão, já referido, cujas citações constam abundantemente dos n.os 77 a 82 do acórdão recorrido, «a noção de restrição acessória abrange toda e qualquer restrição que esteja diretamente ligada e seja necessária à realização de uma operação principal» (71). Segundo este acórdão, para apreciar o caráter necessário de uma restrição deste tipo, «é conveniente procurar, por um lado, se [esta] é objetivamente necessária à realização da operação principal e, por outro, se ela é proporcionada em relação a esta» (72). No que se refere ao exame do caráter objetivamente necessário da restrição, o referido acórdão esclarece que se trata «não de analisar se, face à situação concorrencial no mercado em causa, a restrição é indispensável para o sucesso comercial da operação principal, mas sim de determinar se, no âmbito particular da operação principal, a restrição é necessária à realização dessa operação» e que, se «não havendo restrição, a operação principal se mostra dificilmente realizável ou mesmo irrealizável, a restrição pode ser considerada objetivamente necessária à sua realização» (73).

82.      É igualmente necessário notar que nem as recorrentes no recurso principal nem as intervenientes contestaram o critério jurídico propriamente dito, aplicável ao exame da necessidade objetiva de uma restrição acessória conforme foi definido pelo acórdão M6 e o./Comissão, já referido, tendo‑se limitado a defender que o Tribunal Geral só aplicou este critério parcialmente, tendo, designadamente, omitido a apreciação sobre se a eliminação das CIM teria tornado o sistema MasterCard «dificilmente realizável». É necessário, deste modo, por um lado, definir exatamente o âmbito deste critério e, por outro lado, verificar se o Tribunal Geral cometeu o erro de que é acusado.

83.      No que respeita ao primeiro aspeto, assinalo que, no direito da União, a teoria das restrições acessórias tem a sua origem num conjunto de precedentes do Tribunal de Justiça, a partir do acórdão Metro (74), nos quais este considerou que não constituem restrições da concorrência na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, as limitações à autonomia das partes num acordo que sejam «necessárias» para atingir um determinado objetivo comercial legítimo. Nestes precedentes, a condição da necessidade da restrição foi interpretada e aplicada de maneira relativamente estrita, e o Tribunal de Justiça, regra geral, exigiu que a limitação em causa fosse necessária para permitir a realização da operação comercial considerada, em termos de «possibilidade», de «efetividade» e de «viabilidade» (75).

84.      A razão para este rigor deve‑se, principalmente, ao facto de estas restrições, em princípio, beneficiarem automaticamente da apreciação de compatibilidade com o artigo 81.°, n.° 1, CE, da qual beneficia o acordo. Este tratamento é uma consequência da apreciação positiva reservada pela ordem jurídica da União à função jurídico‑económica desempenhada pelo acordo e da prioridade que esta ordem jurídica reconhece ao objetivo legítimo que este prossegue, tolerando as eventuais restrições (moderadas) da concorrência que se revelem necessárias para atingir este objetivo. Coerentemente com esta ratio, só se poderá atribuir a qualificação de restrição acessória objetivamente necessária às restrições sem as quais o acordo não pode realizar plenamente a função jurídico‑económica que o carateriza e/ou a sua execução se torne irrealizável ou seriamente comprometida. É neste sentido que, em meu entender, se deve interpretar a referência constante do acórdão DLG, já referido, ao «bom funcionamento» da operação principal, bem como a constante do acórdão M6 e o./Comissão, já referido, ao caráter «dificilmente realizável» desta (76).

85.      A necessidade de evitar que o exame respeitante ao caráter objetivamente necessário de uma restrição acessória se sobreponha ao efetuado nos termos do artigo 81.°, n.° 3, CE foi igualmente evocada no quadro da apreciação da necessidade objetiva de uma restrição acessória (77). Assim, ficou esclarecido que é no contexto desta disposição, e não no do n.° 1 do mesmo artigo, que devem ser tomadas as conta as restrições que permitem facilitar a realização da operação principal, aperfeiçoar a sua eficácia ou garantir o seu sucesso comercial e, em geral, aquelas que são «indispensáveis» à luz da situação concorrencial do mercado (78).

86.      Irei agora, portanto, examinar se, ao apreciar a necessidade objetiva das CIM em relação ao sistema MasterCard, o Tribunal Geral se afastou do critério jurídico acima definido.

87.      A este respeito, assinalo que o Tribunal Geral recordou, inicialmente, nos n.os 77 a 82 do acórdão recorrido, os princípios estabelecidos no acórdão M6 e o./Comissão, já referido, incluindo o esclarecimento contido no n.° 109 deste acórdão relativamente ao caráter «dificilmente realizável» da operação principal. Em seguida, nos n.os 88 e 89, indicou que as vantagens que as CIM constituem para o sistema MasterCard, bem como as considerações que dizem respeito ao caráter indispensável destas à luz da situação concorrencial do mercado em causa, não fazem parte da análise do caráter objetivamente necessário da restrição, ao abrigo da teoria das restrições acessórias (79). No mesmo contexto, esclareceu, no n.° 89 do acórdão recorrido, que «só as restrições que sejam necessárias para que a operação principal possa, em qualquer hipótese, funcionar podem ser consideradas abrangidas [por esta teoria]» e, no n.° 90, concluiu que «o facto de a inexistência das CIM poder ter consequências negativas no funcionamento do sistema MasterCard não implica, em si mesmo, que as CIM devam ser consideradas objetivamente necessárias, se resultar do exame do sistema MasterCard no seu contexto económico e jurídico que continua a ser capaz de funcionar sem elas». Contrariamente ao que afirmam as recorrentes no recurso principal, não me parece que estas passagens possam ser interpretadas isoladamente do seu contexto, como uma tentativa do Tribunal Geral para restringir posteriormente os critérios de apreciação, já estritos, fixados pela jurisprudência acima recordada, no n.° 83.

88.      Esta interpretação não é confirmada pela leitura do conjunto dos fundamentos do acórdão recorrido, consagrados à exposição destes critérios, nem pela apreciação feita pelo Tribunal Geral no caso em análise. Com efeito, este concluiu, no final da sua análise, que as dificuldades provocadas pela eliminação das CIM para o funcionamento do sistema MasterCard, identificadas pelas recorrentes no recurso principal e pelas intervenientes, não impediam o funcionamento concreto deste sistema, apreciado no seu contexto económico e jurídico. A este respeito, sublinho que, na sua petição na primeira instância, as recorrentes no recurso principal defenderam que a eliminação das CIM punha em causa a própria sobrevivência do sistema MasterCard — o qual não poderia funcionar apenas com base em acordos bilaterais entre bancos de emissão e bancos adquirentes relativamente às comissões interbancárias se não existisse uma regra supletiva ‑ e não que apenas tornava mais difícil a sua realização.

89.      À luz do anteriormente exposto, entendo que a primeira parte do primeiro fundamento do recurso principal deve ser julgada improcedente.

ii)    Quanto à segunda parte do primeiro fundamento do recurso principal, relativa à falta de um exame da restrição da concorrência no seu contexto

90.      No âmbito da segunda parte do seu primeiro fundamento, as recorrentes no recurso principal apresentam, no essencial, cinco alegações.

–       Quanto à alegação relativa à adoção de uma alternativa menos restritiva que não resulta das forças do mercado

91.      As recorrentes no recurso principal contestam, em primeiro lugar, a afirmação contida no n.° 99 do acórdão recorrido, segundo a qual a Comissão «não tinha de demonstrar que o jogo do mercado levava os bancos de emissão e de aquisição a decidir por si próprios a adoção de uma regra menos restritiva de concorrência que as CIM». Entendem que a hipótese contrafactual adequada para apreciar o caráter objetivamente necessário de uma restrição deve necessariamente resultar das forças do mercado e não de uma intervenção da autoridade reguladora, sob pena de violação da jurisprudência referida anteriormente no n.° 53, a qual impõe que seja tomado em conta o «quadro real» que se produziria se não existisse o acordo, a decisão de associação de empresas ou a prática concertada.

92.      A Comissão contesta a admissibilidade desta alegação. A argumentação desta consiste em afirmar que as recorrentes no recurso principal não podem invocar, para apoiar o seu fundamento relativo ao caráter objetivamente necessário das CIM, um argumento, a saber, o do caráter inadequado de uma hipótese contrafactual baseada na proibição da tarifação ex post, que foi por estas apresentado na primeira instância para sustentar um fundamento diferente, a saber, o relativo à inexistência de uma restrição da concorrência. Esta contestação deve, em meu entender, ser rejeitada. Com efeito, na medida em que o Tribunal Geral respondeu a este argumento na parte da fundamentação do acórdão recorrido consagrada à apreciação da necessidade objetiva das CIM na qual as recorrentes no recurso principal contestam a validade legal dessa resposta no mesmo contexto, a alegação em causa é, em meu entender, admissível.

93.      Quanto ao mérito, assinalo que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral que a condição relativa ao caráter necessário de uma restrição implica que se averigue, por um lado, se a referida restrição é «objetivamente necessária à realização de uma operação principal» e, por outro lado, se é proporcionada relativamente à referida operação principal, ou seja, se «o seu âmbito de aplicação material e geográfico não excedem o que é necessário para a realização da referida operação», se estão estritamente limitados ao que é necessário para a realização da referida operação (80).

94.      Este exame da proporcionalidade implica que, se existir uma alternativa menos restritiva que permita atingir os objetivos legítimos prosseguidos pela restrição em causa, esta não pode ser considerada necessária à realização da operação principal sendo, assim, abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE. A possibilidade desta alternativa deve ser apreciada à luz do conjunto de elementos pertinentes e, como afirma o Tribunal Geral no n.° 99 do acórdão recorrido, deve ser realista, designadamente do ponto de vista económico.

95.      Em contrapartida, não se pode, em meu entender, pedir à Comissão, para poder estabelecer um cenário alternativo menos restritivo no quadro do exame do caráter proporcionado de uma restrição acessória, que demonstre que, caso a referida restrição não existisse, as forças do mercado conduziriam a este cenário.

96.      A este respeito, as recorrentes no recurso principal não se podem apoiar na jurisprudência acima referida no n.° 53, que não diz respeito, especificamente, ao exame da necessidade objetiva de uma restrição acessória. Com efeito, o Tribunal de Justiça reconheceu, na linha desta jurisprudência, que, para apreciar se uma restrição é objetivamente necessária para a realização da operação principal com a qual está relacionada, é necessário examinar qual seria o jogo da concorrência caso esta não existisse (81), para determinar se, nesse caso, a referida operação se mostra dificilmente realizável ou mesmo irrealizável (82). Contudo, não se pode interpretar esta exigência no sentido de que, quando a Comissão entende que existe uma alternativa menos restritiva, esta deverá demonstrar que a mesma resultaria do jogo da concorrência, caso não existisse a limitação imposta pelas partes à operação principal e, muito menos, que as partes provavelmente decidiriam adotá‑la (83).

97.      Em contrapartida, decorre da jurisprudência que o que releva, nesse contexto é, por um lado, que a referida alternativa seja viável, designadamente do ponto de vista económico (84), e, por outro lado, que esta seja capaz de responder aos objetivos legítimos em função dos quais a restrição em causa foi criada, sem exceder o que é necessário para esse efeito, permitindo a realização da operação principal (85).

98.      Por último, observo, a este respeito, que a apreciação do caráter proporcionado de uma restrição acessória, cujo objeto seja verificar a existência de alternativas menos restritivas que possam substituir‑se às estipulações acordadas entre as partes da operação e ao equilíbrio das obrigações recíprocas pretendido pelas referidas partes, apresentará necessariamente uma vertente de tipo «regulatório», para empregar a expressão utilizada pelas recorrentes no recurso principal.

–       Quanto à alegação relativa ao caráter não credível da introdução no sistema MasterCard de uma regra que proíba a tarifação ex post

99.      Em segundo lugar, as recorrentes no recurso principal censuram o Tribunal Geral por ter «permitido» à Comissão que se baseasse em factos e num cenário alternativo «não credíveis».

100. Esta alegação deve, em meu entender, ser julgada inadmissível na medida em que visa, na realidade, obter do Tribunal de Justiça uma nova apreciação dos factos. Além disso, a argumentação em que se baseia a referida alegação deve igualmente ser rejeitada por ser inoperante. Com efeito, quando afirmam que «é virtualmente inconcebível» que, depois de eliminadas as CIM, as forças do mercado compelissem a MasterCard a excluir outras formas de remunerar os bancos de emissão pelas vantagens que estes conferem aos bancos adquirentes e aos comerciantes, proibindo a tarifação a posteriori e que seria muito mais lógico o contrário, as recorrentes no recurso principal ignoram a circunstância de que, em resultado do exame desenvolvido nos n.os 100 a 119 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral chegou à conclusão de que não seria necessário nenhum mecanismo de transferência de fundos dos bancos adquirentes para os bancos de emissão. Assim, contrariamente ao que defendem as recorrentes no recurso principal, o Tribunal Geral não aceitou implicitamente que as CIM de valor positivo eram necessárias para o funcionamento da MasterCard, tendo antes expressamente afirmado o contrário. Quanto à introdução no sistema MasterCard de uma regra que proíbe a tarifação ex post, a argumentação das recorrentes no recurso principal ignora o facto de que esta possibilidade foi evocada, nos n.os 95 e 96 do acórdão recorrido, como uma alternativa menos restritiva às CIM, para evitar que os bancos de emissão possam, fixando unilateralmente o montante das comissões interbancárias, explorar os bancos adquirentes, vinculados pela HACR.

101. Assinalo, por último, de forma incidental, que, na medida em que estas consideram as CIM como um mecanismo de remuneração pelos serviços que os bancos de emissão prestam aos bancos adquirentes e aos comerciantes, as recorrentes no recurso principal parecem ter reconsiderado a posição que defenderam durante o procedimento administrativo, bem como perante o Tribunal Geral, a saber, que as CIM são essencialmente um mecanismo para contrabalançar as exigências dos titulares de cartões e dos comerciantes e para repartir o custo do serviço entre os emitentes e os adquirentes do sistema (86).

–       Quanto à falta de tomada em conta, pelo Tribunal Geral, do argumento segundo o qual a proibição da tarifação ex post teria os mesmos efeitos na concorrência que as CIM, e quanto à falta de fundamentação quanto a esta matéria.

102. Em terceiro lugar, as recorrentes no recurso principal censuram o Tribunal Geral por não ter tomado em conta os argumentos que estas invocaram na primeira instância, relativamente à identidade substancial, do ponto de vista dos efeitos na concorrência, entre, por um lado, as CIM e, por outro lado, a proibição da tarifação ex post. Com efeito, em ambos os casos está em causa uma regra supletiva, adotada a nível central pela MasterCard, que «fixa o preço aplicado entre emitentes e adquirentes».

103. A este respeito, é suficiente assinalar, como já se fez anteriormente no n.° 69 no exame a uma alegação semelhante, invocada pela LBG no seu recurso subordinado, que o Tribunal Geral respondeu aos referidos argumentos no n.° 143 do acórdão recorrido, onde esclareceu que a diferença entre as duas situações reside na circunstância de que, «em comparação com um mercado de aquisição a funcionar sem elas, as CIM limitam a pressão que os comerciantes podem exercer sobre os bancos de aquisição na negociação das MSC reduzindo as possibilidades de os preços diminuírem abaixo de um determinado limiar». Na verdade, decorre desta explicação que o Tribunal Geral focou a sua atenção nos aspetos relacionados com o nível dos preços, ao passo que os argumentos apresentados pelas recorrentes no recurso principal visavam essencialmente os conexos com a estrutura dos preços. Contudo, esta diferença de abordagem, por si só, não é suficiente para conduzir à aceitação da alegação em análise, a qual é relativa a uma falta de apreciação (87). A apreciação contida neste ponto está, além disso, subtraída à fiscalização do Tribunal de Justiça, exceto em caso de desvirtuação dos factos ou dos elementos de prova, o que não foi alegado no caso presente.

104. Deve igualmente ser declarada improcedente a alegação relativa a falta de fundamentação quanto a esta mesma questão, uma vez que o referido n.° 143 do acórdão recorrido revela, de maneira clara e inequívoca, o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral.

–       Quanto à alegação relativa à falta de tomada em conta dos efeitos restritivos de uma regra que proíbe a tarifação ex post na «vertente emissão» do sistema MasterCard

105. Em quarto lugar, as recorrentes no recurso principal argumentam que «a fixação a zero das CIM proposta pela Comissão cria igualmente uma restrição do outro lado de um mercado dualista porque impede os emitentes de receberem dos adquirentes o pagamento dos serviços que lhes prestam». Salientam, a este respeito, que «a Comissão recusou centrar‑se nesse efeito inevitável e, pelo contrário, preocupou‑se unicamente com um dos lados do mercado dualista, a saber o efeito sobre os comerciantes».

106. É forçoso constatar que esta crítica se dirige unicamente à apreciação conduzida pela Comissão e não identifica os números nem os fundamentos do acórdão recorrido visados, nem os erros de que estes padeceriam. Em qualquer caso, na medida em que é necessário entender que esta crítica pretende censurar indiretamente o Tribunal Geral por não ter corretamente apreciado os efeitos na concorrência de uma redução das CIM a zero, em comparação com as CIM existentes, pelo facto de não ter tomado em conta as restrições que esta redução causaria na outra vertente do mercado dualista, assinalo que, por um lado, o Tribunal Geral respondeu aos argumentos que visavam pôr em causa a apreciação da Comissão, por esta ter circunscrito a sua análise económica unicamente ao mercado da aquisição, nos n.os 172 a 182 do acórdão recorrido, nos quais validou, no essencial, a definição dos mercados da emissão e da aquisição como mercados autónomos. Por outro lado, observo que as recorrentes no recurso principal não explicam por que razão uma limitação das relações entre os bancos de emissão e os bancos adquirentes teria efeitos restritivos na concorrência no mercado da emissão (88). A este respeito, recordo, por último, que a explicação segundo a qual as CIM constituiriam um mecanismo de remuneração pelos serviços que os bancos de emissão prestam aos bancos adquirentes e aos comerciantes foi abandonada pelas recorrentes no recurso principal durante o procedimento administrativo.

–       Quanto à alegação relativa a uma desvirtuação da decisão impugnada conforme interpretada pela Comissão na primeira instância

107. Em quinto, e último, lugar, as recorrentes no recurso principal defendem que o Tribunal Geral caracterizou de maneira errada a hipótese contrafactual que foi considerada pela Comissão, tendo esta clarificado, na tréplica, que esta hipótese consistia em suprimir totalmente as CIM e em recomendar negociações bilaterais entre os bancos, tendo a proibição da tarifação a posteriori sido acrescentada apenas a título subsidiário.

108. A este respeito, é necessário assinalar que, no n.° 95 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral reproduziu inteiramente o conteúdo do considerando 554 da decisão impugnada, no qual a Comissão considerava, como uma possível alternativa menos restritiva do que as CIM, uma regra que impusesse uma proibição da tarifação ex post. Após ter entendido, no n.° 96 do acórdão recorrido, que o raciocínio seguido neste considerando estava isento de erros manifestos de apreciação, o Tribunal Geral baseou a sua análise subsequente na hipótese aí formulada. Ora, ainda que se admita, como as recorrentes no recurso principal defendem, que, efetivamente, a Comissão modificou substancialmente a sua posição no decurso da instância, a abordagem do Tribunal Geral, que consistiu em cingir‑se ao conteúdo do ato recorrido, de resto claro no que respeita ao considerando em questão, não é, em si mesmo, criticável.

–       Conclusões quanto à segunda parte do primeiro fundamento do recurso principal

109. À luz destas considerações, entendo que a segunda parte do primeiro fundamento do recurso principal deve ser julgada improcedente.

iii) Quanto à terceira segunda parte do primeiro fundamento do recurso principal, relativa à substituição da apreciação da Comissão pela apreciação do Tribunal Geral

110. No quadro da terceira parte do seu primeiro fundamento, as recorrentes no recurso principal argumentam que, na sua análise do caráter objetivamente necessário das CIM, o Tribunal Geral substituiu a apreciação da Comissão pela sua, dado que apenas tomou em consideração um número limitado de fundamentos sobre os quais aquela se tinha baseado na decisão impugnada.

111. A este respeito, recordo que, segundo jurisprudência constante, invocada pelas recorrentes no recurso principal, em sede de recurso de anulação, o julgador da União não pode substituir pela sua própria fundamentação a fundamentação do autor do ato impugnado (89), nem, aquando da fiscalização das apreciações económicas complexas efetuadas pela Comissão, substituir pela sua própria apreciação económica a desta instituição (90).

112. Em primeiro lugar, as recorrentes no recurso principal criticam o Tribunal Geral, «no que respeita à possibilidade de aplicar uma regra que proíba a tarifação a posteriori, [por ter] aceite esta conclusão sem qualquer análise da razão pela qual isso se verificou». Esta alegação visa, na realidade, censurar o Tribunal Geral por ter realizado uma análise deficiente, e não por ter substituído pela sua própria apreciação, a da Comissão e, desde modo, confunde‑se com os argumentos invocados para apoiar a quarta alegação do fundamento em análise, relativo a uma fiscalização jurisdicional insuficiente. Em qualquer caso, observo que o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral nos n.os 95 a 99 do acórdão recorrido segue estritamente o da Comissão. Consequentemente, não pode estar em causa, neste ponto, uma substituição da apreciação e/ou dos fundamentos contidos na decisão impugnada.

113. Em segundo lugar, as recorrentes no recurso principal alegam que o Tribunal Geral «atribuiu muito mais peso» do que a Comissão ao «contexto mais geral dos recursos e vantagens económicas conferidos aos bancos pela sua atividade de emissão de cartões» bem como à falta de impacto no sistema MasterCard na Austrália da diminuição das comissões interbancárias imposta pelo banco central da Austrália (a seguir «exemplo australiano») (91).

114. A este respeito, entendo que não se pode impedir o julgador da União, ao qual tenha sido submetido um recurso de anulação, de atribuir, no quadro da fiscalização da legalidade por este exercida quanto ao ato impugnado, mais importância a determinados elementos da fundamentação deste ato, em comparação com outros, desde que esta abordagem não altere a lógica interna do ato em causa a tal ponto que os fundamentos e a apreciação que este contém sejam, de facto, substituídos. Não é o que sucede, em meu entender, no caso vertente. Com efeito, embora o Tribunal Geral foque a sua atenção na análise dos rendimentos que os bancos retiram da sua atividade de emissão e atribua uma importância especial ao exemplo australiano, nem a apreciação da Comissão nem os fundamentos da decisão impugnada, que se baseiam igualmente nesses elementos (92), parecem ter sido ignorados ou substituídos.

iv)    Quanto à quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal, relativa à aplicação de um grau de fiscalização insuficiente

115. No quadro da quarta parte do seu primeiro fundamento, as recorrentes no recurso principal, apoiadas pelo MBNA, pelo HSBC, pela RBS e pela LBG, criticam o Tribunal Geral por este ter efetuado uma fiscalização jurisdicional muito limitada, no que respeita ao caráter objetivamente necessário das CIM. Por um lado, atendendo à entrada em vigor da Carta e à jurisprudência do TEDH, o Tribunal Geral deveria ter realizado uma fiscalização completa destas apreciações, não limitada ao erro manifesto. Por outro lado, não teria respeitado o grau de fiscalização jurisdicional exigido pelo Tribunal de Justiça, na medida em que o Tribunal Geral, primeiro, teria aplicado o critério do erro manifesto a certas constatações da Comissão que não implicavam apreciações económicas verdadeiramente «complexas» e, segundo, teria substituído este critério por outro critério, menos rigoroso, limitado à verificação do seu «caráter razoável».

116. Antes de proceder ao exame destas alegações, observo que, no quadro da parte em análise, as recorrentes no recurso principal reiteram igualmente um determinado número de argumentos que se sobrepõem aos invocados na terceira parte anteriormente examinada. Trata‑se, designadamente, da alegação de que o Tribunal Geral se teria baseado unicamente numa parte dos fundamentos constantes da decisão impugnada, tendo atribuído a alguns desses fundamentos uma importância maior do que aquela que a Comissão lhes atribuiu e teria substituído a apreciação da Comissão pela sua. Uma vez que estes argumentos já foram discutidos no exame da referida parte do fundamento em causa, limito‑me a remeter, a este respeito, para as considerações acima desenvolvidas nos n.os 110 a 114, sem deixar de assinalar uma certa contradição de fundo entre as referidas alegações e a afirmação de que o Tribunal Geral teria demonstrado uma deferência excessiva perante o poder de apreciação da Comissão em matéria económica.

117. Esclarecido isto, assinalo que as alegações em análise suscitam, uma vez mais, perante o Tribunal de Justiça, a questão delicada de saber qual é o âmbito da fiscalização jurisdicional a que devem estar sujeitas as decisões da Comissão que punem empresas por infrações às regras de concorrência (93).

118. Esta fiscalização é, em primeiro lugar, regida pelo tipo de sindicância que o juiz da União é chamado a exercer no quadro da função jurisdicional que lhe é confiada pelo Tratado. Exceto em matéria de coimas, relativamente às quais este goza de uma competência de plena jurisdição, nos termos do artigo 261.° TFUE e do artigo 31.° do Regulamento 1/2003, (94) este juiz efetua, em conformidade com o artigo 263.°, n.° 1, TFUE, um controlo da legalidade, o que lhe permite unicamente negar provimento a um recurso de anulação ou anular uma decisão recorrida, mas não alterá‑la, ou rever a sua oportunidade. Um segundo limite, destacado pela jurisprudência, é de ordem institucional e resulta da repartição de competências entre a Comissão e os órgãos jurisdicionais da União, tendo o Tratado confiado à primeira uma missão de vigilância no domínio do direito da concorrência, a qual inclui, além da tarefa de instruir e reprimir as infrações às regras de concorrência, a de desenvolver e prosseguir uma política geral «dirigida à aplicação […] dos princípios fixados pelo Tratado e a orientar neste sentido o comportamento das empresas» (95). Neste contexto, a jurisprudência reconheceu que não competia ao juiz da União, no âmbito da sua fiscalização da legalidade das decisões da Comissão em matéria de concorrência, substituir pelo seu ponto de vista o ponto de vista desta instituição, nem reformar a decisão impugnada, sob pena de perturbação do equilíbrio interinstitucional previsto pelo Tratado (96). Um terceiro limite diz respeito, por último, à natureza das apreciações que a Comissão deve efetuar, nas suas decisões ao abrigo do artigo 81.° CE. Foi‑lhe reconhecida uma certa margem de apreciação quando efetua apreciações económicas ou técnicas complexas, com base no entendimento de que essas apreciações podem exigir competências técnicas e conhecimentos económicos superiores, bem como implicar decisões de política económica que competem à Comissão. Daí resulta que a fiscalização dessas decisões pelo juiz da União é, consequentemente, limitada. Assim, segundo jurisprudência constante, esta fiscalização limita‑se «à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, bem como da exatidão material dos factos, da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder» (97).

119. Nos últimos anos, o âmbito de aplicação da jurisprudência sobre fiscalização marginal foi consideravelmente reduzido (98), também em consequência da progressiva penalização do direito da concorrência da União. Deste modo, nos acórdãos KME e Chalkor/Comissão, o Tribunal de Justiça esclareceu que «apesar de a Comissão dispor de uma margem de apreciação em matéria económica, em domínios que originam apreciações económicas complexas, tal não implica que o juiz da União se deva abster de fiscalizar a interpretação, feita pela Comissão, de dados de natureza económica. Com efeito, o juiz da União deve designadamente verificar não só a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência mas também fiscalizar se estes elementos constituem o conjunto dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram» (99). O Tribunal de Justiça, além disso, acrescentou que «compete ao juiz da União efetuar a fiscalização da legalidade que lhe incumbe com base nos elementos apresentados pelo recorrente para alicerçar os fundamentos invocados» e que, nesta fiscalização, o juiz não se pode apoiar na margem de apreciação de que dispõe a Comissão «renunciando ao exercício de uma fiscalização aprofundada, tanto de direito como de facto» (100). O exato alcance deste esclarecimento, com potencial para neutralizar, de facto, o princípio do reconhecimento de uma margem de apreciação económica à Comissão, ainda não é claro (101). Em contrapartida, está perfeitamente demonstrado que a intenção do Tribunal de Justiça é reduzir, tanto quanto possível, a incidência desta margem de apreciação no âmbito da fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão que apliquem uma sanção por violação do artigo 81.° CE (102).

120. No que respeita à questão de saber se o âmbito da fiscalização jurisdicional exercida pelo juiz da União, conforme anteriormente descrita, é compatível com o respeito pelo direito a um recurso jurisdicional efetivo e a um processo equitativo, é necessário salientar que, nos acórdãos KME e Chalkor/Comissão, já referidos, o Tribunal de Justiça afirmou que «não se verifica que a fiscalização da legalidade prevista no artigo 263.° TFUE, completada pela competência de plena jurisdição a respeito do montante da coima, prevista no artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, seja contrária às exigências do princípio da proteção jurisdicional efetiva que figura no artigo 47.° da Carta» (103). Além disso, no seu recente acórdão Schindler Holding e o./Comissão, o Tribunal de Justiça confirmou esta decisão de conformidade igualmente à luz do artigo 6.° CEDH, com base no qual devem ser definidos o sentido e o âmbito do artigo 47.° da Carta, por força do seu artigo 52.°, n.° 3 (104).

121. O artigo 6.°, n.° 1, CEDH, que é aplicável neste caso na sua vertente penal (105), não impede que uma sanção de natureza repressiva seja aplicada por uma autoridade administrativa, embora sob a condição de a decisão desta autoridade poder ser sujeita à fiscalização posterior de um órgão judiciário com «plena jurisdição». Entre as características de um órgão deste tipo figura, segundo o TEDH, «o poder de [alterar] em todos os pontos, de facto e de direito, a decisão recorrida» bem como a «competência para se debruçar sobre todas as questões, de facto e de direito, pertinentes para o litígio que lhe é submetido» (106). Apesar de parecer que este enunciado (107) exige que o órgão ao qual é confiada a fiscalização jurisdicional diferida, exigida pelo artigo 6, n.° 1, CEDH, seja dotado de competências que ultrapassam as que podem ser exercidas numa fiscalização da legalidade (108), bem como de poderes para proceder a um verdadeiro exame do caso (109), a aplicação que dele foi feita, concretamente, pelo TEDH, é extremamente flexível (110).

122. Em especial, e este é um fator de convergência metodológica particularmente importante entre a jurisprudência do TEDH e a da União (111), segundo o TEDH, o que conta para efeitos da aplicação do artigo 6.° CEDH, não é tanto a enunciação abstrata pelo juiz do tipo de fiscalização («fraca» ou «forte») que este é competente ou pretende realizar no caso em análise, mas sobretudo, que através do exercício desta fiscalização, os direitos enunciados por esta convenção tenham sido efetivamente protegidos. Esta abordagem casuística foi confirmada, implícita (112) mas evidentemente, pelo TEDH no recente acórdão Menarini Diagnostics Srl c. Itália (113). Naquele contexto, embora, como o Tribunal de Justiça implicitamente afirmou no acórdão Schindler Holding e o./Comissão, pareça que a fiscalização exercida pelas jurisdições da União sobre as decisões da Comissão que aplicam uma sanção por violação das regras de concorrência poderá respeitar as exigências do artigo 6, n.° 1, CEDH (114), tudo irá depender da forma como essa fiscalização será exercida em concreto.

123. É com base nos princípios expostos anteriormente que será necessário examinar se, no caso vertente, o Tribunal Geral exerceu uma fiscalização jurisdicional suficiente sobre as considerações da Comissão referentes ao caráter objetivamente necessário das CIM.

124. A este respeito, é necessário, em primeiro lugar, rejeitar a objeção da Comissão segundo a qual competia às recorrentes no recurso principal provar que as CIM eram objetivamente necessárias ao funcionamento da MasterCard para evitar a proibição prevista pelo artigo 81.°, n.° 1, CE. Com efeito, ainda que se admita que esta afirmação é correta, o Tribunal Geral deverá, no entanto, exercer uma fiscalização tendencialmente completa do conjunto das apreciações efetuadas pela Comissão, incluindo quando estas visem a rejeição dos argumentos defensivos das empresas em causa.

125. Em seguida, é necessário assinalar que, no n.° 82 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, através da remissão para os acórdãos M6 e o./Comissão e Remia, já referidos, recordou que o juiz da União exerce uma fiscalização limitada sobre as apreciações económicas complexas efetuadas para avaliar o caráter objetivamente necessário de uma restrição acessória. Como foi observado anteriormente, esta enunciação abstrata dos critérios que definem o âmbito da fiscalização que o Tribunal Geral pretende exercer não é, em si mesma, criticável, se se revelar que, em concreto, este efetuou um controlo aprofundado, de direito e de facto, conduzido à luz dos elementos apresentados em apoio dos fundamentos invocados perante si (115).

126. As recorrentes no recurso principal alegam, primeiro, que o Tribunal Geral não teria exercido uma fiscalização suficiente sobre a afirmação da Comissão segundo a qual as CIM teriam podido ser substituídas, enquanto regra supletiva, por uma proibição da tarifação a posteriori.

127. É verdade que, quanto a esta questão, o Tribunal Geral se limitou, nos n.os 95 e 96 do acórdão recorrido, a reproduzir integralmente o considerando 554 da decisão impugnada e a afirmar que o raciocínio aí exposto estava isento de erros manifestos de apreciação (116). Contudo, decorre da leitura da petição apresentada na primeira instância que as alegações invocadas pelas recorrentes no recurso principal eram essencialmente relativas à natureza regulatória da hipótese de um sistema MasterCard que funcionasse com uma proibição de tarifação ex post, à inexistência de uma análise do contexto concorrencial, bem como à omissão, pela Comissão, de fazer prova de que esta proibição tinha um alcance menos restritivo da concorrência que as CIM. Ora, o Tribunal Geral abordou estes diferentes argumentos nos n.os 97 a 99 e 143 do acórdão recorrido. Em contrapartida, entre estas alegações, não figurava a que estas agora invocam, relativa ao caráter alegadamente irrealista de uma regra supletiva que proibisse os bancos de emissão de obterem uma compensação pelos serviços que prestam aos bancos adquirentes. Como já anteriormente observei no n.° 105, e decorre, designadamente, do n.° 19 do acórdão recorrido e dos n.os 146 a 155 da decisão impugnada, a tese segundo a qual as CIM constituíam um preço pago pelos bancos adquirentes aos bancos de emissão pelos serviços que estes lhes prestam, inicialmente apresentada pelas recorrentes no recurso principal durante o procedimento administrativo, foi posteriormente abandonada a favor da qualificação destas como um mecanismo para contrabalançar as exigências dos titulares de cartões e dos comerciantes. Pelo seu lado, a HSBC limita‑se a fazer uma remissão para a declaração de um dos seus empregados, anexada às suas alegações de intervenção apresentadas em primeira instância, na qual se afirma que a introdução de uma regra de tarifação ex post teria provavelmente conduzido ao abandono do mecanismo de fixação das comissões interbancárias numa base bilateral. Não explica, contudo, por que razão este resultado, admitindo que o mesmo se verificava, teria tido no sistema MasterCard um impacto tal que tornasse inexequível um mecanismo supletivo baseado na proibição da tarifação ex post, nem a razão pela qual o facto de o Tribunal Geral não ter tomado em conta este resultado, admitindo que tenha sido o caso, teria tido influência no caráter efetivo da sua fiscalização jurisdicional.

128. As recorrentes no recurso principal argumentam, em seguida, que o Tribunal Geral não teria exercido uma fiscalização suficiente sobre as constatações da Comissão quanto ao caráter objetivamente necessário das CIM enquanto mecanismo de transferência de fundos em proveito dos bancos de emissão.

129. A este respeito, assinalo que a análise do Tribunal Geral nesta matéria, constante dos n.os 100 a 119 do acórdão recorrido, não denota qualquer «deferência» em relação à alegada margem de apreciação da Comissão e que, pelo contrário, esta análise é de tal maneira autónoma que, paralelamente, foi objeto, no recurso principal, de uma alegação relativa a uma alegada substituição da apreciação da Comissão pela do Tribunal Geral. Com efeito, é à luz da sua própria análise dos dados constantes da decisão impugnada relativamente às vantagens económicas que os bancos do sistema MasterCard retiram da sua atividade de emissão de cartões bancários — em si mesma subtraída à sindicância do Tribunal de Justiça exceto em caso de desvirtuação, que não foi invocada ‑ que o Tribunal Geral considerou, no n.° 110 do acórdão recorrido, que se podia razoavelmente concluir que a diminuição daquelas vantagens, no caso da eliminação das CIM, não era suficiente para pôr em causa a viabilidade do sistema MasterCard e foi igualmente com base numa apreciação autónoma dos resultados da análise dos efeitos da diminuição, pelo banco central da Austrália, do montante das comissões interbancárias da MasterCard, que o Tribunal Geral considerou, no n.° 111 do acórdão recorrido, que esta análise corroborava a conclusão de que a abolição das CIM não provocaria o colapso do sistema MasterCard (117).

130. Na sua argumentação, as recorrentes no recurso principal e a LBG não se limitam, contudo, a constatar a existência de «contenção judicial» relativamente às apreciações da Comissão, mas também alegam a natureza «especulativa e superficial» da análise do Tribunal Geral, a falta de tomada em conta dos elementos que estas lhe apresentaram, bem como uma omissão de declarar esta deficiência quanto à análise constante da decisão impugnada. As recorrentes afirmam, designadamente, que o Tribunal Geral não abordou a questão de saber se a fixação supletiva de comissões interbancárias de valor positivo seria desnecessária atendendo à natureza dualista do mercado. O Tribunal Geral não teria, igualmente, tomado em conta os efeitos restritivos que as CIM à taxa zero produziam na outra vertente do mercado dualista, ou seja, a da emissão.

131. A este respeito, recordo que resulta dos n.os 101, 181 e 182 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral considerou que os argumentos relativos à falta de tomada em conta da natureza dualista do mercado, bem como aos efeitos da eliminação das CIM na vertente «emissão» desse mercado não eram pertinentes no âmbito da análise para efeitos do n.° 3 do artigo 81.° CE, quer sob a perspetiva da necessidade objetiva das CIM, quer da análise dos seus efeitos na concorrência. Além disso, o Tribunal Geral confirmou, nos n.os 176 a 178 do acórdão recorrido, a qualificação do mercado da emissão como mercado relevante, bem como o seu caráter autónomo, o que justificava, na economia do seu raciocínio, que a Comissão tivesse limitado a esse mercado a sua análise dos efeitos das CIM na concorrência. Ora, as recorrentes no recurso principal não apresentaram argumentos que permitam demonstrar que os fundamentos do acórdão recorrido anteriormente referidos enfermam de erro de direito, e a LBG limita‑se, nesta matéria, a afirmações muito gerais.

132. Por último, as recorrentes no recurso principal argumentam que a circunstância de o Tribunal Geral ter evocado, para confirmação do seu raciocínio, o exemplo australiano, que diz respeito a uma hipótese de diminuição e não de eliminação das CIM, «põe em evidência o caráter lacunar» da sua análise.

133. A este respeito, limito‑me a assinalar que o Tribunal Geral abordou e rejeitou os argumentos relativos à alegada irrelevância do exemplo australiano nos n.os 112 a 114 do acórdão recorrido. Uma vez que põe em causa a apreciação contida nestes números sem invocar nenhum argumento que a contrarie, e muito menos, um vício de desvirtuação, a crítica em análise deve, em meu entender, ser considerada improcedente.

134. Em face do exposto, entendo que a quarta parte do primeiro fundamento do recurso principal deve ser julgada improcedente e, por conseguinte, que esse fundamento deve ser julgado integralmente improcedente.

5.      Quanto à aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE (terceiro fundamento do recurso principal)

135. No seu recurso subordinado, a LBG, apoiada pelas recorrentes no recurso principal, acusa o Tribunal Geral de ter cometido diversos erros de direito na aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE. As alegações da LBG e das recorrentes no recurso principal podem dividir‑se em três partes.

a)      Quanto ao grau de prova e ao princípio in dubio pro reo

136. Em primeiro lugar, segundo a LBG, o Tribunal Geral deveria ter reconhecido que a Comissão cometeu erros de direito por ter imposto um grau de prova excessivo. O grau de prova para a apreciação das condições previstas no artigo 81.°, n.° 3, CE deveria ter sido o da ponderação das probabilidades. No caso vertente, esta apreciação deveria ter sido efetuada relativamente ao sistema Mastercard na íntegra, que apresentaria vantagens importantes para os consumidores e para os comerciantes. Seria juridicamente incorreto exigir que a MasterCard justificasse o montante específico das CIM, em vez de demonstrar, simplesmente, com base em elementos de prova sólidos, que a metodologia que esta segue para a fixação das CIM é legítima. No mesmo contexto, as recorrentes no recurso principal defendem que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, sem, de resto, oferecerem uma explicação suficiente, por ter concluído que o princípio in dubio pro reo não era aplicável quando, como sucede no caso em apreciação, a empresa que invoca a aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE apresentou provas que, no mínimo, levantam dúvidas sobre a aplicabilidade desta disposição, e a Comissão não dissipou inteiramente essas dúvidas.

137. No que respeita, em primeiro lugar, à alegação relativa ao grau de prova exagerado, não se pode deixar de observar que a crítica invocada pela LGB no seu recurso subordinado se baseia numa argumentação apresentada de modo bastante lacónico e vago. A LGB não identifica os números do acórdão recorrido que enfermariam de erro e limita‑se a alegar que o grau de prova imposto terá sido exagerado, sem especificar quais são os elementos do acórdão recorrido que critica. Para confirmar a sua argumentação, a LBG limita‑se a efetuar uma remissão generalizada para os argumentos desenvolvidos nos seus articulados de intervenção, que apresentou ao Tribunal Geral. Nestas condições, duvido seriamente da admissibilidade desta alegação à luz do artigo 168.°, n.° 1, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

138. Em qualquer caso, entendo que esta alegação também é improcedente.

139. Em primeiro lugar, quanto ao argumento relativo à alegada necessidade de avaliar as CIM no âmbito da totalidade do sistema MasterCard, recordo que, no n.° 207 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, uma vez que as CIM não constituem restrições acessórias, a Comissão tinha examinado corretamente se existiam vantagens objetivas sensíveis decorrentes especificamente das CIM, sem tomar em conta o sistema Mastercard na íntegra. Ora, por um lado, é forçoso admitir que a LBG, no seu recurso subordinado, não apresentou nenhum elemento ou argumento para pôr em causa esta conclusão do Tribunal Geral. Por outro lado, à luz da análise desenvolvida anteriormente nos n.os 79 a 134, proponho que sejam julgadas improcedentes as alegações apresentadas pelas recorrentes no recurso principal contra os fundamentos do acórdão recorrido relativamente à necessidade objetiva das CIM.

140. No que respeita, em seguida, ao argumento relativo a que o grau de prova para a apreciação das condições previstas pelo artigo 81.°, n.° 3, CE deveria ter sido o da ponderação das probabilidades, é, desde logo, necessário recordar que o artigo 2.° do Regulamento 1/2003 n.° 1/2003 dispõe que incumbe à empresa que invoca o benefício do disposto no artigo 81.°, n.° 3, CE o ónus da prova do preenchimento das condições nele previstas, sem no entanto, estabelecer o grau de prova exigido para este efeito.

141. Segundo jurisprudência constante, e como recordou acertadamente o Tribunal Geral no n.° 196 do acórdão recorrido, quem invoca o benefício dessa disposição deve fazer prova, através de argumentos e de elementos de prova convincentes, de que estão preenchidos os pressupostos para beneficiar de uma isenção e, em especial, no que respeita à primeira condição prevista no artigo 81.°, n.° 3, CE, de que o acordo em questão deve apresentar vantagens objetivas sensíveis, de modo a compensar os inconvenientes que o acordo implica no plano da concorrência (118). É igualmente necessário notar que, no acórdão GlaxoSmithKline Services, já referido, o Tribunal de Justiça afirmou que, no quadro da análise para efeitos do artigo 81.°, n.° 3, CE, é suficiente que a Comissão, com base nos argumentos e meios de prova apresentados, tenha adquirido a convicção de que a ocorrência da vantagem objetiva sensível é suficientemente provável para se considerar que o acordo implica essa vantagem (119). Todavia, é não se pode deixar de observar que, como resulta explicitamente do n.° 93 do referido acórdão, esta afirmação se inscreve no contexto da aplicação da isenção prevista no artigo 81.°, n.° 3, CE, em vigor antes da adoção do Regulamento n.° 1/2003, o qual previa um sistema de autorizações prévias concedidas pela Comissão (120). Neste contexto, a análise que a Comissão devia efetuar era de natureza prospetiva e previsional quanto às prováveis vantagens que seriam geradas pelo acordo que lhe era notificado.

142. Ora, há que observa que, nos seus articulados, a LBG e as recorrentes no recurso principal não especificaram os números do acórdão recorrido que enfermariam de erro, limitando‑se a afirmar, em geral, que o grau de prova a aplicar deveria ser o da ponderação das probabilidades, e também não especificaram, de modo algum, as razões pelas quais o referido grau de prova deveria ser aplicado no caso presente, em que, por um lado, não competia à Comissão efetuar uma análise prospetiva, e, por outro lado e em contrapartida, cabia às recorrentes no recurso principal apresentar elementos de prova convincentes sobre as vantagens objetivas sensíveis apresentadas pelas CIM, que deveriam permitir compensar os inconvenientes identificados pela Comissão.

143. Nestas condições, entendo que, caso o Tribunal de Justiça entenda que a alegação é admissível, deverá a referida alegação, relativa ao caráter exagerado do grau de prova ser julgada improcedente.

144. No que se refere, em segundo lugar, à alegação relativa à violação do princípio in dubio pro reo, invocada pelas recorrentes no recurso principal, é necessário recordar que este princípio é um corolário do princípio da presunção de inocência (121) que opera quando se trata de apreciar a prova de uma infração (122). Nos termos deste princípio, a prova da infração deve ser feita de modo integral e as dúvidas e incertezas quanto a essa prova devem funcionar em benefício daquele a quem é imputado o comportamento e, portanto, constituem um obstáculo a que lhe sejam aplicadas sanções.

145. O argumento das recorrentes no recurso principal diz respeito ao n.° 237 do acórdão recorrido, no qual, ao concluir a sua análise relativa aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE, o Tribunal Geral considerou que, na medida em que as recorrentes não tinham feito prova da exceção que invocavam, improcedia a alegação relativa à violação do princípio in dubio pro reo.

146. Entendo que esta apreciação não enferma de erro. Com efeito, em meu entender, o princípio in dubio pro reo pode ser aplicado à análise que a Comissão efetua nos termos do artigo 81.°, n.° 1, CE no quadro da qual deve provar a existência de uma infração à referida disposição cometida pela empresa em questão. Neste contexto, este princípio exige que os elementos de prova apresentados pela Comissão demonstrem de maneira completa a existência dessa infração, para que não subsista qualquer dúvida quanto à sua prática.

147. Em contrapartida, não me parece que o princípio in dubio pro reo possa ser invocado, como fazem as recorrentes no recurso principal, para tentar diminuir o grau de prova exigido para a aplicação da isenção prevista pelo artigo 81.°, n.° 3, CE. Como salientei anteriormente no n.° 141, segundo jurisprudência constante, compete à empresa que invoca o artigo 81.°, n.° 3, CE demonstrar, através de argumentos e de elementos de prova convincentes, que as condições requeridas para beneficiar de uma isenção estão reunidas. Não é, portanto, suficiente, como parecem entender as recorrentes no recurso principal, fornecer elementos de prova que se limitam a suscitar dúvidas quanto à aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE.

148. É verdade que, como recordou o Tribunal Geral no n.° 197 do acórdão recorrido, em alguns casos, os argumentos e os elementos factuais invocados pela empresa que pretende beneficiar da isenção podem obrigar a outra parte, ou seja, a Comissão, a fornecer uma explicação ou uma justificação, sob pena de se poder concluir que o ónus da prova foi cumprido (123).Todavia, é forçoso constatar que as recorrentes no recurso principal não contestam a conclusão a que chegou o Tribunal Geral no n.° 231 do acórdão recorrido, segundo a qual a Comissão examinou e refutou validamente a argumentação que estas desenvolveram no procedimento administrativo, tendo‑se limitado a alegar que o Tribunal Geral teria admitido no acórdão recorrido que subsistiam dúvidas quanto à aplicabilidade do artigo 81.°, n.° 3, CE às CIM. Todavia, estas dúvidas não existem no acórdão recorrido e, designadamente, não constam da frase contida no início do n.° 233 do acórdão recorrido, referida pelas recorrentes no recurso principal. Pelo contrário, no n.° 237 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu claramente, sem expressar qualquer dúvida, que a Comissão tinha concluído validamente que as recorrentes não tinham feito prova de que as condições de aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE estavam reunidas.

149. Por último, na medida em que a crítica em questão pode ser interpretada como uma alegação de falta de fundamentação do acórdão recorrido relativamente à aplicabilidade do princípio in dubio pro reo, e à luz das considerações anteriormente apresentadas nos n.os 30 e 31, entendo que, uma vez que o Tribunal Geral concluiu que não tinha sido feita prova do preenchimento das condições exigidas para a aplicação da isenção prevista no artigo 81.°, n.° 3, CE, este não tinha o dever de fornecer mais explicações quanto às razões pelas quais, no caso vertente, não se devia aplicar o princípio in dubio pro reo.

b)      Quanto à alegada abordagem errada, à luz do mercado no qual as vantagens previstas pelo artigo 81.°, n.° 3, CE são criadas, bem como à luz das categorias de utilizadores em causa

150. Em segundo lugar, a LBG, apoiada pelas recorrentes no recurso principal, defende que o Tribunal Geral seguiu uma abordagem inexata no que se refere ao mercado no qual as vantagens previstas pelo artigo 81.°, n.° 3, CE devem ser criadas. A LBG alega que, apesar de reconhecer que segundo a jurisprudência as referidas vantagens podem ser tomadas em conta relativamente a qualquer mercado que beneficie com a existência do acordo e que, apesar de aceitar a relação existente entre os dois lados do mercado em causa (ou seja os titulares dos cartões bancários e os comerciantes), o Tribunal Geral se focou exclusivamente nas vantagens para os comerciantes. Ao proceder deste modo, o Tribunal Geral teria ignorado as vantagens importantes provenientes do sistema MasterCard e das próprias CIM para os titulares dos cartões, bem como a natureza dualista do mercado e a otimização do sistema, para as quais contribuem as CIM. As recorrentes no recurso principal alegam que o Tribunal Geral não explicou a razão por que as duas primeiras condições do artigo 81.°, n.° 3, CE não se podiam considerar verificadas unicamente com base nas vantagens decorrentes das CIM para os titulares dos cartões, desde que estas vantagens permitissem compensar todas as alegadas desvantagens decorrentes dos efeitos restritivos das CIM para os comerciantes. Não existiria nada no teor do artigo 81.°, n.° 3, CE que corroborasse a tese do Tribunal Geral, segundo a qual, quando existem duas ou mais categorias de consumidores em causa, todas estas categorias deverão beneficiar das mesmas vantagens decorrentes de uma restrição da concorrência, para considerar a restrição compatível com o artigo 81.° CE.

151. As alegações da LBG e das recorrentes no recurso principal dizem respeito à análise contida nos n.os 228 e 229 do acórdão recorrido, em que, após ter recordado a sua jurisprudência nos termos da qual as vantagens previstas pela primeira condição do artigo 81.°, n.° 3, CE se podem produzir não apenas no mercado em causa mas também em qualquer outro mercado em que o acordo em questão possa produzir efeitos benéficos, o Tribunal Geral considerou, no entanto, que, uma vez que os comerciantes constituíam um dos dois grupos de utilizadores abrangidos pelos cartões de pagamento, era necessário, para se poder aplicar o artigo 81.°, n.° 3, CE, que a existência de vantagens objetivas sensíveis imputáveis às CIM fosse igualmente demonstrada a respeito destes. Por esta razão, o Tribunal Geral conclui que, não tendo feito essa prova, o argumento relativo à insuficiente tomada em consideração das vantagens das CIM para os titulares de cartões era, em todo o caso, inoperante.

152. As referidas alegações referem‑se à aplicação da isenção prevista pelo artigo 81.°, n.° 3, CE num contexto caraterizado pela existência de dois mercados distintos nos quais o acordo restritivo é suscetível de produzir os seus efeitos. No caso vertente, estão em causa os mercados da aquisição e da emissão que, sendo distintos, apresentam todavia importantes interações e complementaridades (124). Nesta matéria, é necessário assinalar que, embora a definição do mercado relevante feita pela Comissão tenha sido confirmada pelo Tribunal Geral, este aspeto do acórdão recorrido não, contudo, é objeto do recurso submetido ao Tribunal de Justiça.

153. A LGB e as recorrentes no recurso principal alegam, no essencial, que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, por ter ignorado as vantagens decorrentes das CIM para os titulares de cartões bancários, utilizadores diretos dos serviços prestados no mercado da emissão, uma vez que estas vantagens poderiam, potencialmente, contrabalançar os efeitos restritivos provocados pelas CIM para os comerciantes, utilizadores diretos dos serviços prestados no mercado da aquisição.

154. A questão de direito subjacente a esta crítica é, portanto, a de saber se, para que a isenção prevista pelo artigo 81.°, n.° 3, CE possa ser aplicável neste contexto, é necessário que uma parte equitativa dos benefícios resultantes do acordo, conforme previsto no artigo 81.°, n.° 3, CE, seja reservada aos utilizadores diretos dos serviços prestados no mercado em que se verificam os efeitos restritivos da concorrência — no caso em apreciação, designadamente, os comerciantes − ou se será possível considerar que os efeitos restritivos que prejudicam estes utilizadores podem ser compensados pelos benefícios produzidos para os utilizadores dos serviços prestados num mercado conexo, ou seja, neste caso, os titulares de cartões.

155. Preliminarmente, é necessário recordar que a segunda condição do artigo 81.°, n.° 3, CE exige, para que um acordo restritivo possa beneficiar da isenção prevista nesta disposição, que uma parte equitativa do lucro resultante do referido acordo seja reservada aos utilizadores.

156. A este respeito, é necessário, em primeiro lugar, assinalar, que se deve considerar que os utilizadores a que a referida disposição se refere são os utilizadores diretos ou indiretos dos produtos ou dos serviços abrangidos pelo acordo. Em segundo lugar, resulta da jurisprudência constante que, para que um acordo restritivo da concorrência possa beneficiar da isenção nos termos do artigo 81.°, n.° 3, CE, as vantagens objetivas sensíveis geradas por esse acordo devem permitir compensar os inconvenientes que o acordo implica no plano da concorrência (125). Podemos inferir desta jurisprudência que, para que um acordo restritivo possa beneficiar da isenção, é necessário que as vantagens dele decorrentes garantam aos utilizadores a compensação integral dos efeitos prejudiciais, reais ou prováveis, que estes deverão suportar em resultado da restrição da concorrência decorrente do acordo. Dito de outra forma, as vantagens decorrentes do acordo restritivo devem contrabalançar os seus efeitos negativos.

157. Todavia, em meu entender, esta compensação deverá dizer respeito aos utilizadores que sejam direta ou indiretamente afetados pelo acordo (126). Com efeito, são os utilizadores que sofrem os prejuízos causados pelos efeitos restritivos do acordo em causa que devem, em princípio, beneficiar da compensação deste prejuízo, da parte equitativa do lucro resultante do referido acordo, a que se refere o artigo 81.°, n.° 3, CE.

158. Com efeito, entender que seria possível tomar em consideração as vantagens decorrentes de um acordo para uma categoria de utilizadores de determinados serviços para contrabalançar os efeitos negativos sobre outra categoria de utilizadores de outros serviços num outro mercado, seria equivalente a permitir que se favorecesse a primeira categoria de utilizadores em detrimento da segunda. Ora, as lógicas distributivas deste tipo afiguram‑se, em princípio, estranhas ao âmbito de ação do direito da concorrência (127). Este direito visa, com efeito, proteger a estrutura do mercado, e através disso, da concorrência, no interesse dos concorrentes e, em último lugar, dos consumidores (128) em geral. Não visa, em contrapartida, favorecer uma categoria de consumidores em detrimento de outra (129).

159. A este respeito, deve ainda assinalar‑se que estas considerações não estão necessariamente em contradição com a jurisprudência assente do Tribunal Geral, indicada no n.° 228 do acórdão recorrido, nos termos da qual nada impede que se possam tomar em consideração as vantagens decorrentes do acordo que se verifiquem num mercado diferente daquele em que o acordo produz efeitos restritivos. Com efeito, essas vantagens podem ser tomadas em consideração quando, por exemplo, a categoria de consumidores afetada pelo acordo nos dois mercados distintos seja a mesma (130).

160. No caso vertente, o Tribunal Geral considerou que, para se poder aplicar a isenção prevista no artigo 81.°, n.° 3, CE, era necessário que a existência de vantagens objetivas sensíveis decorrentes das CIM fosse, em qualquer caso, demonstrada a respeito dos comerciantes. Ora, na medida em que os comerciantes constituem a categoria de consumidores diretamente afetados pelos efeitos restritivos das CIM no mercado em que estes efeitos se verificam, entendo que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito.

161. Daí resulta que os argumentos das recorrentes no recurso principal e o argumento da LBG, segundo o qual o Tribunal Geral teria ignorado as vantagens importantes criadas pelas CIM (131) para os titulares dos cartões, não podem ser aceites. A mesma conclusão é válida, dado que não foi contestada a definição de mercado relevante, quanto ao argumento relativo a não ter sido tomada em consideração a natureza dualista do mercado. Por último, resulta igualmente do anteriormente exposto que, contrariamente ao que defendem as recorrentes no recurso principal, o Tribunal Geral, nos n.os 228 e 229 do acórdão recorrido, não considerou que, quando existem duas ou mais categorias de consumidores abrangidos, todas as categorias devem beneficiar das mesmas vantagens resultantes de uma restrição de concorrência, para se poder considerar a restrição compatível com o artigo 81.° CE. Considerou apenas que deviam ser demonstradas as vantagens objetivas decorrentes das CIM para os comerciantes.

162. À luz do conjunto de considerações anteriores, entendo, por conseguinte, que improcedem integralmente as alegações da LBG e das recorrentes no recurso principal relativas a uma abordagem alegadamente inexata à luz do mercado no qual devem ser criadas as vantagens previstas pelo artigo 81.°, n.° 3, CE e à luz das categorias de consumidores que devem ser tomadas em conta.

c)      Quanto à aprovação de um critério demasiado rigoroso para a aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE

163. Em terceiro lugar, a LBG defende que o Tribunal Geral cometeu um erro por ao confirmar um critério demasiado rigoroso para a aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE. A LBG refere‑se designadamente ao n.° 233 do acórdão recorrido no qual o Tribunal Geral daria a entender que o único elemento a tomar em consideração para determinar se as CIM foram fixadas num montante adequado seria a contrapartida dos comerciantes pelos custos suportados pelos bancos de emissão, pelos serviços prestados a estes ou de que estes beneficiavam manifestamente e que o cálculo da contrapartida deveria tomar em conta os outros rendimentos auferidos pelos bancos de emissão. A LBG defende que também a Comissão, em casos mais recentes, parece ter adotado uma abordagem cujo único enfoque é o das vantagens para os comerciantes, no sentido de que esta teria utilizado uma metodologia restritiva designada por «critério do turista» (132). A aplicação desta abordagem seria, segundo a LBG, impraticável e inadequada e a própria Comissão estaria impossibilitada de aplicar este critério devido à falta de dados. Nestas circunstâncias, a LBG questiona‑se sobre como se poderia razoavelmente esperar que a MasterCard e, a fortiori, os bancos titulares de uma licença, que não dispõem dos dados completos sobre o mercado, a aplicassem. A metodologia escolhida seria igualmente impossível de aplicar na prática, porquanto exigiria que fossem fornecidos elementos de prova precisos para justificar os montantes das CIM específicas. Contudo, não é possível apresentar estes elementos de prova. Nem a Comissão nem o Tribunal Geral teriam fornecido a menor orientação quanto à metodologia precisa que deveria ser seguida pela MasterCard para fixar as CIM num montante justificado. A ambiguidade resultante desta abordagem geraria grandes incertezas nos operadores do mercado e poderia causar prejuízos ao consumidor por bloquear a inovação no mercado.

164. Esta alegação baseia‑se, em meu entender, numa leitura errada do acórdão recorrido. Com efeito, no n.° 233, o único número do acórdão recorrido visado especificamente por esta alegação, o Tribunal Geral não afirmou que a compensação dos encargos suportados pelos bancos de emissão em contrapartida dos serviços prestados era o único elemento a tomar em consideração para determinar se as CIM estavam fixadas num montante adequado. No referido número do acórdão recorrido, o Tribunal Geral respondeu ao argumento que lhe foi apresentado, relativo à inexistência de dados que permitam satisfazer o grau de prova económica exigido pela Comissão. As considerações constantes do n.° 233 do acórdão recorrido devem, assim, ser lidas à luz do número anterior no qual o Tribunal Geral explicou que a dificuldade em satisfazer o grau de prova económica exigido pela Comissão tem a sua origem na argumentação desenvolvida pelas recorrentes no recurso principal durante o procedimento administrativo.

165. Quanto à alusão à metodologia designada como «critério do turista», não se pode deixar de observar que não existe nenhuma referência a esta metodologia no acórdão recorrido, nem na decisão impugnada, pelo que o argumento que se baseia nesta metodologia não é pertinente. De resto, a LBG não fornece nenhum elemento para explicar de que forma a referência feita a essa metodologia poderia permitir identificar um erro no acórdão recorrido.

166. Quanto ao argumento de que a Comissão e o Tribunal Geral não teriam fornecido a menor orientação sobre a metodologia precisa que a MasterCard devia seguir para a fixação das CIM, não foi possível identificar qualquer erro de direito do Tribunal Geral no acórdão recorrido, pelo que é inoperante.

167. Decorre do anteriormente exposto que também a terceira parte do fundamento relativo à violação do artigo 81.°, n.° 3, CE não pode singrar e, portanto, que o referido fundamento deve ser julgado integralmente improcedente.

III – Conclusão

168. Em face destas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que decida da forma seguinte:

1)         É negado provimento ao recurso principal e aos recursos subordinados.

2)         A MasterCard Incorporated, a MasterCard International Incorporated e a MasterCard Europe SPRL são condenadas nas despesas referentes ao recurso principal.

3)         The Royal Bank of Scotland Plc é condenada nas despesas referentes ao recurso subordinado.

4)         A Lloyds TSB Bank Plc e a Bank of Scotland Plc são condenadas nas despesas referentes ao seu recurso subordinado.

5)         A MBNA Europe Bank Ltd., a HSBC Bank PLC e o Reino‑Unido suportarão as suas próprias despesas.


1 —      Língua original: francês.


2 —      T‑111/08.


3 —      Os estabelecimentos de crédito que colocam o cartão bancário à disposição do titular e que permitem que este o utilize.


4 —      Os estabelecimentos de crédito que têm uma relação contratual com um comerciante para a aceitação do cartão bancário num ponto de venda. Os bancos emitentes transmitem aos bancos adquirentes os dados relativos ao titular do cartão e ao cartão bancário (autenticação, autorização, etc.) e procedem à transferência dos fundos por intermédio da infraestrutura informática da rede, enquanto os bancos adquirentes encaminham as transações a partir do terminal dos pontos de venda dos comerciantes até ao centro de tratamento dos emitentes, transmitem os dados para autorização e participam na compensação e no tratamento da transação.


5 —      V. os considerandos 234 a 238 e 242 da decisão impugnada.


6 —      V. os considerandos 239 a 241 da decisão impugnada.


7 —      V. os considerandos 118 e segs. da decisão impugnada.


8 —      Trata‑se, mais precisamente, dos cartões de crédito e de pagamento único com o logotipo da MasterCard, bem como dos cartões de débito com o logotipo MasterCard ou Maestro (v. artigo 1.° da decisão impugnada).


9 —      Estas comissões incluem o fornecimento dos terminais de pagamento e de outros serviços técnicos e financeiros e constituem uma percentagem do valor da transação ou uma comissão de valor fixo (v. considerandos 246 e 247 da decisão impugnada).


10 —      V. considerando 248 da decisão impugnada.


11 —      V. considerandos 146 a 155 da decisão impugnada, e especialmente, o considerando 153.


12 —      V. artigo 1.° da decisão impugnada. É necessário salientar que a Comissão já se tinha debruçado sobre as comissões interbancárias no quadro dos sistemas de pagamento através de cartões bancários, designadamente na decisão de 24 de julho de 2002 (COMP/D1/29.373, Visa, JO L 318, p. 17), na qual as CIM inter‑regionais da Visa na União Europeia foram declaradas isentas, durante um período de cinco anos, sob reserva de determinadas condições, sendo a principal a de que estas comissões estivessem relacionadas e fossem limitadas, ao nível de determinados custos. Uma segunda decisão Visa foi adotada pela Comissão em 8 de janeiro de 2010 (COMP/D‑1/39.398, Visa MIF), que tornou obrigatórios os compromissos propostos pela Visa, incluindo, entre outros, uma limitação das suas CIM. Em janeiro de 2012, a Comissão publicou o Livro Verde — Para um mercado europeu integrado dos pagamentos por cartão, por Internet e por telemóvel [COM(2011) 941 final] e lançou uma consulta pública que abordou igualmente certos aspetos relativos às comissões interbancárias multilaterais no quadro de sistemas de pagamento através de cartões bancários.


13 —      V. o artigo 7.° da decisão impugnada.


14 —      Bem como as comissões interbancárias supletivas do SEPA (Single Euro Payments Area) internas na zona euro.


15 —      Bem como as comissões interbancárias supletivas SEPA/internas na zona euro. V. artigos 2.° e 3.° da decisão impugnada.


16 —      V. artigo 5.° da decisão impugnada. Este artigo impõe igualmente que a MasterCard disponibilize no seu sítio Internet, durante um determinado lapso temporal, as informações constantes do Anexo 5 da referida decisão.


17 —      V. o Comunicado de Imprensa da Comissão, de 1 de abril de 2009 (IP/09/515). A referência aos compromissos subscritos pelas recorrentes no recurso principal consta do n.° 60 do acórdão recorrido.


18 —      Acórdão de 13 de junho de 2013, Versalis/Comissão (C‑511/11 P, n.° 115).


19 —      Acórdão de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colet., p. I‑5425, n.os 97 e 99).


20 —      V. acórdão de 28 de fevereiro de 2013, Réexamen Arango Jaramillo e o./BEI (C‑334/12 RX‑II, n.° 43), e despacho de 16 de novembro de 2010, Internationale Fruchtimport Gesellschaft Weichert/Comissão (C‑73/10 P, Colet., p. I‑11535, n.° 53), que contêm referências à jurisprudência do TEDH.


21 —      V., designadamente, neste sentido, n.° 83 das minhas conclusões no processo Gestoras Pro Amnistía e o./Conselho (acórdão de 27 de fevereiro de 2007, C‑354/04 P, Colet., p. I‑1579), nas quais se encontram outras referências à jurisprudência do TEDH. V., igualmente, despacho Internationale Fruchtimport Gesellschaft Weichert/Comissão, já referido, n.° 53, bem como o n.° 73 das conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalon no processo que deu origem ao acórdão de 26 de setembro de 2013, PPG e SNF/ECHA (C‑625/11 P).


22 —      V. acórdão Réexamen Arango Jaramillo e o./BEI, já referido, n.° 43, e n.° 73 das conclusões apresentadas pelo advogado‑geral P. Cruz Villalon no processo PPG e SNF/ECHA, já referidas.


23 —      Apoiando‑se num conjunto de elementos relativos, designadamente, às regras de funcionamento da organização, às relações entre os seus órgãos dirigentes e os bancos associados, ao sistema de filiação na rede, bem como à natureza das decisões relativas às CIM e ao seu caráter obrigatório para os bancos associados, a Comissão concluiu, na decisão impugnada, que a MasterCard constituía uma associação de empresas, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE (considerandos 344 a 349) até 25 de maio de 2006, data da IPO, e que as decisões que esta adotava relativamente às CIM eram, até àquela data, «decisões de uma associação de empresas» na aceção da mesma disposição (considerando 371).


24 —      V. n.os 241 e 242.


25 —      V. acórdãos de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni (C‑49/92 P, Colet., p. I‑4125, n.° 131), de 23 de novembro de 2006, Asnef‑Equifax e Administración del Estado (C‑238/05, Colet., p. I‑11125, n.os 31 e 32), e de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o. (C‑8/08, Colet., p. I‑4529, n.° 23); v., igualmente, acórdão do Tribunal Geral de 16 de junho de 2011, FMC Foret/Comissão (T‑191/06, Colet., p. II‑2959, n.° 102).


26 —      V. as conclusões do advogado‑geral P. Leger no processo Wouters, já referido, n.° 62. Resulta igualmente da jurisprudência que, num sistema fechado deste tipo, a Comissão não poderia ser impedida de qualificar a atuação do cartel de empresas alternativamente de acordo, prática concertada ou decisão de uma associação de empresas (v., por exemplo, acórdão do Tribunal Geral de 20 de abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão (T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colet., p. II‑931, n.° 697), e, em último lugar, acórdão de 5 de dezembro de 2013, Solvay‑Solexis/Comissão (C‑449/11 P, n.os 61 e 62).


27 —      V. acórdão de 29 de outubro de 1980, van Landewyck e o./Comissão (209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.° 88).


28 —      V. acórdãos de 30 de janeiro de 1985, Clair (123/83, Recueil., p. 391, n.° 17), de 18 de junho de 1998, Comissão/Itália (C‑35/96, Colet., p. I‑3851, n.° 40), e de 12 de setembro de 2000, Pavlov e o. (C‑180/98 a C‑184/98, Colet., p. I‑6451, n.° 85).


29 —      V. acórdãos do Tribunal Geral de 26 de janeiro de 2005, Piau/Comissão (T‑193/02, Colet., p. II‑209, n.° 69), e de 13 de dezembro de 2006, FNCBV/Comissão (T‑217/03 e T‑245/03, Colet., p. II‑4987, n.° 49), confirmados pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de dezembro de 2008, Coop de France bétail et viande e o./Comissão (C‑101/07 P e C‑110/07 P, Colet., p. I‑10193).


30 —      V. acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2005, DaimlerChrysler/Comissão (T‑325/01, Colet., p. II‑3319, n.° 210).


31 —      V., neste sentido, acórdão de 27 de janeiro de 1987, Verband der Sachversicherer/Comissão (45/85, Colet., p. 405, n.° 32).


32 —      Referido na nota 26.


33 —      Designadamente, acórdãos de 17 de novembro de 1993, Reiff (C‑185/91, Colet., p. I‑5801), de 9 de junho de 1994, Delta Schiffahrts‑ und Speditionsgesellschaft (C‑153/93, Colet., p. I‑2517), de 18 de junho de 1998, Comissão/Itália (C‑35/96, Colet., p. I‑3851, n.os 36 a 38), de 5 de outubro de 1995, Centro Servizi Spediporto (C‑96/94, Colet., p. I‑2883), e de 17 de outubro de 1995, DIP e o. (C‑140/94 a C‑142/94, Colet., p. I‑3257) e Comissão/Itália, já referido (n.os 36 a 38).


34 —      No processo Wouters, já referido, estava em causa a Ordem dos Advogados neerlandesa, no processo Comissão/Itália, já referido, o Conselho Nacional de Despachantes Alfandegários, nos processos Reiff e Delta Schiffahrts‑und Speditionsgesellschaft, já referidos, as Comissões competentes para a fixação, respetivamente, das tarifas dos transportes rodoviários de mercadorias de longa distância, e das tarifas do tráfico comercial por via fluvial na Alemanha, no processo Centro Servizi Spediporto, já referido, o Comité encarregado pela lei italiana da manutenção do registo nacional dos transportadores rodoviários de mercadorias e implicado na fixação das tarifas para esses transportes e, por último, no processo DIP, já referido, as Comissões Municipais intervenientes no procedimento de concessão de autorizações de abertura de estabelecimentos comerciais de venda a retalho em Itália.


35 —      Acórdão de 28 de fevereiro de 2013 (C‑1/12).


36 —      Acórdão de 6 de janeiro de 2004 (C‑2/01 P e C‑3/01 P, Colet., p. I‑23).


37 —      Ao confirmar o acórdão da primeira instância, o Tribunal de Justiça, de resto, esclareceu que, «para que se possa considerar concluído por aceitação tácita um acordo […], é necessário que a manifestação de vontade de uma das partes contratantes, com um objetivo anticoncorrencial, constitua um convite à outra parte, quer seja expresso ou implícito, para a realização comum de tal objetivo, tanto mais que tal acordo não é à primeira vista do interesse da outra parte, ou seja dos grossistas» (v. n.° 102).


38 —      Nas suas contestações respetivas a LBG e a HSBC invocam uma desvirtuação dos factos, alegando que o Tribunal Geral não tomou em conta as provas testemunhais que estes lhe tinham apresentado, das quais resultaria que, após a IPO, os bancos deixaram de ter qualquer controlo e qualquer influência sobre a fixação das CIM, relativamente às quais não eram previamente consultados nem informados, a não ser depois da sua adoção. A este respeito, basta assinalar que Tribunal Geral não se baseou, na sua apreciação dos factos, num qualquer envolvimento dos bancos no processo de adoção das CIM. Pelo contrário, no n.° 245 do acórdão recorrido, qualificou como «pacífico» o facto de «desde a IPO, as decisões relativas às CIM [serem] adotadas pelos órgãos da organização de pagamento MasterCard e que os bancos não participam nesse processo decisório». Assim, se estas alegações não forem declaradas inadmissíveis, por serem novas relativamente ao recurso principal e por não terem sido invocadas no âmbito de um recurso subordinado, serão inoperantes.


39 —      As recorrentes no recurso principal limitaram‑se a afirmar o caráter «manifestamente incorreto» do raciocínio do Tribunal Geral e a alegar que os bancos emitentes têm interesse em baixar os seus custos e em aumentar os seus proveitos sobre as MSC.


40 —      V. n.os 253 e 134 do acórdão recorrido.


41 —      Esta influência exercia‑se quer no caso das transações transfronteiriças, às quais as CIM eram aplicáveis quando não existissem comissões interbancárias mais específicas, quer no caso de transações nacionais, relativamente às quais as CIM eram aplicáveis quando não existissem comissões interbancárias «intrapays» ou serviam de referência na sua adoção (considerandos 412 a 424 da decisão impugnada).


42 —      Apesar de não ter excluído a possibilidade de as CIM, por restringirem a fixação dos preços da concorrência, poderem ter tido um objeto anticoncorrencial, a Comissão, contudo, decidiu não tomar posição a este respeito, considerando que já estavam claramente provados os seus efeitos restritivos (n.os 401 a 407).


43 —      Baseando‑se em dados relativos a 2002, a avaliação da Comissão concluiu que as CIM podiam representar em média até 73% desses encargos.


44 —      Considerandos 439 a 460.


45 —      Considerandos 461 a 466.


46 —      Considerandos 467 a 496.


47 —      Considerandos 497 a 521.


48 —      A saber, uma regra que proibia que os emitentes e os adquirentes definissem o montante das CIM depois de realizada uma compra por um detentor de um cartão bancário do emitente a um dos comerciantes do adquirente, tendo a transação sido apresentada para pagamento.


49 —      Decisão n.° 2002/914.


50 —      Acórdãos de 30 de junho de 1966, LTM (56/65, Colet., p. 337 e 360), de 11 de dezembro de 1980, L’Oréal (31/80, Recueil, p. 3775, n.° 19), de 12 de dezembro de 1995, Oude Luttikhuis e o. (C‑399/93, Colet., p. I‑4515, n.° 10), de 28 de maio de 1998, Deere/Comissão (C‑7/95 P, Colet., p. I‑3111, n.° 76), e New Holland Ford/Comissão (C‑8/95 P, Colet., p. I‑3175, n.° 90); de 21 de janeiro de 1999, Bagnasco e o. (C‑215/96 e C‑216/96, Colet., p. I‑135, n.° 33); acórdão do Tribunal Geral de 2 de maio de 2006, O2 (Germany)/Comissão (T‑328/03, Colet., p. II‑1231, n.° 68).


51 —      V. acórdão de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão (C‑389/10 P, n.° 39).


52 —      V., designadamente, acórdão LTM, já referido (Colet., p. 250).


53 —      V., igualmente, o acórdão O2 (Germany)/Comissão (já referido, n.° 72), no qual o Tribunal Geral salientou a importância do exame do jogo da concorrência no caso de não haver acordo quando estão em causa mercados em via de liberalização ou mercados emergentes.


54 —      Acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 1998, European Night Services e o./Comissão (T‑374/94, T‑375/94, T‑384/94 e T‑388/94, Colet. 1998, p. II‑3141, n.° 137).


55 —      V. acórdão O2 (Germany)/Comissão, já referido (n.° 72).


56 —      Acórdão de 28 de fevereiro de 1991, Delimitis (C‑234/89, Colet., p. I‑935).


57 —      V., designadamente, os considerandos 408, 410 da decisão impugnada nos quais a Comissão afirma que «os preços fixados pelos bancos adquirentes se [a regra multilateral ‘supletiva’] não existisse e se o sistema previsse uma regra que proibisse a tarifação a posteriori», bem como o n.° 460 anteriormente referido.


58—      Com base, designadamente, em considerações relativas à concorrência intrassistemas.


59 —      Evidentemente, isto em nada prejudica a análise da Comissão, segundo a qual caso as CIM não existissem, o jogo da concorrência entre bancos adquirentes conduziria, a prazo, à supressão de todas as comissões interbancárias.


60 —      Referido na nota 50.


61 —      A frase é a seguinte: «Se se admitir que as CIM fixam um mínimo às MSC e na medida em que a Comissão podia validamente considerar que um sistema MasterCard que funcionasse sem CIM era economicamente viável, daí decorre necessariamente que estas têm efeitos restritivos na concorrência.»


62 —      Acórdão do Tribunal Geral de 14 de dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão (T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colet., p. II‑5169).


63 —      Acórdão de 24 de setembro de 2009, Erste Group Bank e o./Comissão (C‑125/07 P, C‑133/07 P, C‑135/07 P e C‑137/07 P, Colet., p. I‑8681, n.os 116 a 119).


64 —      N.° 285 e jurisprudência aí referida.


65 —      V., neste sentido, as conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Erste Group Bank e o./Comissão, já referido.


66 —      O Tribunal Geral, primeiro, no n.° 150 do acórdão recorrido, recordou as conclusões que a Comissão retirou do Estudo de Mercado de 2004 quanto à incapacidade dos comerciantes de exercerem uma pressão suficiente sobre os montantes das CIM «pelo facto de um elemento essencial na aceitação dos pagamentos através de cartões pelos comerciantes ser constituído pelo atrativo que representavam para os consumidores e que, por conseguinte, a recusa ou a discriminação desse modo de pagamento podia ter efeitos negativos na sua clientela», e, em seguida, no n.° 157, constatou o fundamento das presentes conclusões e, por último, no n.° 158, debateu determinadas consequências.


67 —      Acórdão do Tribunal Geral de 18 de setembro de 2001 (T‑112/99, Colet., p. II‑2459).


68 —      Acórdão de 15 de dezembro de 1994 (C‑250/92, Colet., p. I‑5641).


69 —      Já referido na nota 67.


70 —      Ibidem, n.° 109.


71 —      Ibidem, n.° 104.


72 —      Ibidem, n.° 106.


73 —      No mesmo sentido, v. acórdão do Tribunal Geral de 29 de junho de 2012, E.ON Ruhrgas e E.ON/Comissão (T‑360/09). Os princípios estabelecidos pelo acórdão M6 e o./Comissão, já referido, foram igualmente aplicados por analogia no acórdão do Tribunal Geral de 12 de abril de 2013, Stim/Comissão (T‑451/08).


74 —      Acórdão de 25 de outubro de 1977 (26/76, Colet., p. 659, n.os 20 e 27). Neste acórdão, o Tribunal de Justiça, depois de ter afirmado que, em determinadas condições, os «sistemas de distribuição seletiva constituíam, entre outros, um elemento de concorrência, conforme ao artigo 8[1].°, n.° 1 [CE]», considerou que «[q]ualquer sistema de comercialização baseado na seleção dos pontos de distribuição implica necessariamente, sob pena de não ter qualquer sentido, para os grossistas integrados nessa rede, a obrigação de só abastecerem revendedores autorizados» e, por conseguinte, que as limitações que visam permitir o controlo da observância desta obrigação, «desde que não ultrapassem o fim pretendido, não podem constituir só por si uma restrição de concorrência, sendo antes o acessório da obrigação principal, cujo cumprimento ajudam a garantir». 


75 —      Assim, por exemplo, no acórdão de 11 de julho de 1985, Remia e o./Comissão (42/84, Recueil, p. 2545, n.os 19 e 20), o Tribunal de Justiça decidiu que as cláusulas de não‑concorrência incluídas nos contratos de cessão de uma empresa, na medida em que estas garantem, em princípio, «a possibilidade e a efetividade desta cessão», contribuem «para reforçar a concorrência através do acréscimo do número de empresas presentes no mercado em causa», desde que, no entanto, «estas sejam necessárias à transmissão da empresa objeto da cessão e que a sua duração e o seu âmbito de aplicação sejam estritamente limitados a este objetivo». Neste caso, o Tribunal de Justiça tinha observado que o acordo de cessão da empresa em causa «[não teria podido] realizar‑se» no caso de não existir a cláusula controvertida, porque «o vendedor, que [conhecia] particularmente bem as particularidades das empresas objeto da cessão [teria] conservado a possibilidade de atrair novamente a si a sua antiga clientela imediatamente após a cessão e de tornar, deste modo, inviável esta empresa». Adicionalmente, no acórdão Pronuptia (acórdão de 28 de janeiro de 1986, 161/84, Colet., p. 353 n.os 15 e segs. e n.° 1.B do dispositivo), o Tribunal de Justiça decidiu que um determinado número de cláusulas acessórias a contratos de franquia não eram abrangidas pela proibição estabelecida no artigo 81.°, n.° 1, CE na medida em que estas eram «indispensáveis» para que o sistema de franquia «possa funcionar». Por último, no acórdão DLG, já referido, no qual se apoiam as recorrentes no recurso principal, o Tribunal de Justiça decidiu «que uma disposição estatutária de uma associação cooperativa de compra, que proíbe os seus membros de fazerem parte de outras formas de cooperação organizada em concorrência direta com ela, não é atingida pela proibição prevista no artigo 8[1].°, n.° 1, [CE], desde que essa disposição estatutária se limite ao necessário para assegurar o bom funcionamento da cooperativa e para manter o seu poder contratual em relação aos produtores».


76 —      Deste modo, uma cláusula que se limite a facilitar a execução do acordo, sem ser necessária no sentido descrito, só poderá escapar à proibição contida no artigo 81.°, n.° 1, CE se não comportar uma restrição da concorrência ou quando puder beneficiar de uma isenção nos termos do artigo 81.°, n.° 3, CE.


77 —      V. acórdão M6 e o./Comissão, já referido (n.os 109 e 121).


78 —      Acórdão já referido (n.os 109 e 121), que remete, a este respeito, designadamente, para o n.° 24 do acórdão Pronuptia, no qual o Tribunal de Justiça declarou que a cláusula de exclusividade territorial em questão constituía uma limitação da concorrência na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, embora tenha reconhecido que, se essa proteção territorial não existisse, nenhum candidato a uma licença de distribuição se arriscaria a assumir o risco de se integrar na rede.


79 —      No mesmo sentido, no n.° 101 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, antes de iniciar o exame referente ao caráter objetivamente necessário das CIM enquanto mecanismo de transferência de fundos a favor dos bancos de emissão, esclareceu que «[n]ão se trata de efetuar uma comparação destinada a determinar se o sistema MasterCard funciona de forma mais eficaz com CIM do que unicamente com base numa proibição de tarifações ex post».


80 —      V. acórdãos, já referidos, Remia e o./Comissão (n.° 20) e M6 e o./Comissão (n.° 113).


81 —      V. acórdão, já referido, Remia e o./Comissão (n.os 18 e 19).


82 —      V. acórdão, já referido, M6 e o./Comissão (n.° 109).


83 —      Remeto, a este respeito, relativamente aos casos vertentes, para as considerações expostas anteriormente no n.° 66.


84 —      Embora outros elementos, como por exemplo considerações relacionadas com o contexto político no qual se insere a operação principal, possam igualmente ser tomados em conta; v., neste sentido, o acórdão E.ON Ruhrgas e E.ON/Comissão, já referido (n.° 75).


85 —      Assim, por exemplo, no acórdão Remia e o./Comissão, o Tribunal de Justiça confirmou a abordagem da Comissão, que consistiu em estabelecer uma duração de quatro anos para a cláusula de não concorrência constante do contrato de cessão da empresa em questão, em vez dos dez anos estipulados pelas partes, abordagem esta que se baseou na «convicção», adquirida após o exame de todas as circunstâncias do caso, «que apenas se justificava objetivamente uma duração de quatro anos» para permitir ao cessionário que introduza a sua nova marca e que consolide uma clientela, evitando uma nova penetração no mercado pelo cedente (n.° 30). De igual modo, quando, no acórdão Metro SB‑Groβmärkte/Comissão, já referido, o Tribunal de Justiça examinou o caráter proporcionado das cláusulas limitativas da liberdade de ação das partes, contidas num contrato de distribuição seletiva, a sua análise limitou‑se unicamente à questão de saber se aquelas cláusulas excediam o que era necessário para atingirem o seu objetivo, impondo às partes obrigações mais onerosas (designadamente, n.os 27, 37, 39). No acórdão M6 e o./Comissão, já referido, ao examinar a cláusula de exclusividade com uma duração de dez anos constante do acordo para a criação da sociedade Télévision par satellite, o Tribunal Geral concluiu que esta duração «parece excessiva» na medida em que a implantação dessa sociedade deveria estar concluída antes do final desse período, sendo «bastante provável» que a desvantagem concorrencial da referida sociedade se fosse reduzindo com o passar do tempo e, «por conseguinte, não é de excluir» que a difusão exclusiva em questão, embora destinada inicialmente a reforçar a posição concorrencial da referida sociedade no mercado da televisão por assinatura, «lhe permita eventualmente, após alguns anos, eliminar a concorrência nesse mercado». V., igualmente, o acórdão DLG, já referido (n.os 35 e 40) e, embora num contexto diferente, o acórdão Wouters e o., já referido (n.° 109), e os acórdãos, de 18 de julho de 2006, Meca‑Medina e Majcen/Comissão (C‑519/04 P, Colet., p. I‑6991, n.° 47), de 18 de julho de 2013, Consiglio Nazionale dei Geologi (C‑136/12, n.° 54) e Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, já referido (n.° 100).


86 —      V. n.° 19 do acórdão recorrido e considerandos 146 a 155 da decisão impugnada.


87 —      Seja como for, ainda que se admita que a tarifação ex post tem, no mercado da aquisição, efeitos «qualitativamente» semelhantes aos das CIM, uma vez que ambas eliminam a transparência dos custos relacionados com as comissões interbancárias, quando não existem acordos bilaterais, a verdade é que «quantitativamente», estes efeitos não são comparáveis. Recordo, a este respeito, que na decisão impugnada, a Comissão, apoiando‑se nos dados relativos ao ano de 2002, avaliou que as CIM podiam representar em média até 73% dos encargos faturados pelos bancos adquirentes aos comerciantes (v. considerandos 425 e 426). Além disso, mesmo admitindo a exatidão da argumentação subjacente das recorrentes no recurso principal, ou seja, que a Comissão contesta simplesmente o montante das CIM, recordo, em primeiro lugar, que a apreciação da Comissão foi efetuada com base nas CIM aplicáveis à data do procedimento administrativo, em segundo lugar, que não foi invocada na primeira instância qualquer alegação respeitante a um eventual limiar de sensibilidade da restrição respeitante ao montante das CIM ‑ e, em qualquer caso, não foi invocada no presente processo ‑ e, em terceiro lugar, que a parte do acórdão recorrido na qual o Tribunal Geral rejeita as alegações respeitantes ao caráter desproporcionado da medida imposta, a saber, a eliminação completa das CIM, relativamente ao facto de apenas o montante destas ter sido visado pela Comissão, não é objeto de discussão no âmbito do presente processo.


88 —      Não existe concorrência entre os bancos de emissão para os serviços prestados aos bancos adquirentes (para cada transação, o banco de emissão será sempre o da emissão do cartão bancário) e, deste modo, não é possível identificar um mercado para estes serviços.


89 —      Acórdão de 27 de janeiro de 2000, DIR International e o./Comissão (C‑164/98 P, Colet., p. I‑447, n.° 38 e 42). O Tribunal de Justiça esclarece, contudo, que, embora o Tribunal Geral possa interpretar a fundamentação do ato recorrido de uma forma diferente do seu autor, ou mesmo, em certas circunstâncias, recusar a fundamentação formal feita por este, não pode fazê‑lo quando nenhum elemento material justifique esse procedimento (n.° 42).


90 —      Acórdãos de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing (C‑525/04 P, Colet., p. I‑9947, n.° 57), e de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott (C‑290/07 P, Colet. 2010, p. I‑7763, n.° 66).


91 —      V. n.° 106 e segs. do acórdão recorrido.


92 —      V. os considerandos 609 a 614 da decisão impugnada.


93 —      No caso vertente, a decisão impugnada não aplica uma coima, embora preveja a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória diária em caso de incumprimento das medidas corretivas impostas.


94 —      Regulamento do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1).


95 —      V., por exemplo, acórdãos de 7 de junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão (100/80, 101/80, 102/80 e 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 105), e Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, já referido (n.° 149).


96 —      V., por exemplo, acórdão do Tribunal Geral de 10 de março de 1992, SIV e o./Comissão (T‑68/89, T‑77/89 e T‑78/89, Colet., p. II‑1403, n.os 160, 319 e 320).


97 —      Inicialmente confinada ao domínio de aplicação do artigo 81.°, n.° 3, CE, esta jurisprudência passou a ser extensível, a partir do acórdão Remia e o./Comissão (já referido, n.° 34), ao contexto da aplicação do n.° 1 desta disposição, v., inter alia, acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P, C‑219/00 P, Colet., p. I‑123, n.° 279). Pode‑se colocar a questão de saber se persistem, no momento presente, as razões subjacentes a esta deferência judiciária, atendendo, designadamente aos processos de descentralização da aplicação do direito antitrust da União, bem como à experiência neste domínio adquirida ao longo dos anos pelos órgãos jurisdicionais da União.


98 —      Inicialmente, este processo envolveu setores distintos, como o controlo das concentrações e dos auxílios de Estado; v. respetivamente, acórdãos de 15 de fevereiro de 2005, Comissão/Tetra Laval (C‑12/03 P, Colet., p. I‑987, n.° 39), e Espanha/Lenzing, já referido (n.os 56 e 57).


99 —      V. acórdãos de 8 de dezembro de 2011, KME e o./Comissão (C‑272/09 P, Colet., p. I‑12789, n.° 94), KME Germany e o./Comissão, já referido (n.° 121), e Chalkor/Comissão (C‑386/10 P, Colet., p. I‑13085, n.° 54).


100 —      Acórdãos, já referidos, KME Germany e o./Comissão (C‑389/10, n.° 129) e Chalkor/Comissão (n.° 62). V., igualmente, acórdão de 6 de novembro de 2012, Otis e o. (C‑199/11, n.os 59 e 61).


101 —      Atendendo ao seu teor e ao contexto no qual se insere, afigura‑se que esta se deveria confinar à escolha e à avaliação dos fatores que entram em linha de conta na determinação do montante da coima, e não abranger a fiscalização das apreciações efetuadas aquando da constatação da infração. Contudo, podemos questionar‑nos sobre se não se justificaria ainda mais a mesma abordagem restritiva no quadro deste tipo de fiscalização uma vez que, neste contexto, ao contrário do que sucede em matéria de fixação de coimas, o juiz da União não dispõe de poderes de plena jurisdição.


102 —      Indo mais longe nesta direção, o Tribunal da EFTA, no seu acórdão de 18 de abril de 2012, Posten Norge As/Autoridade de Vigilância da EFTA (E‑15/10, ainda não publicado), consagrou expressamente o abandono da fiscalização limitada ao erro manifesto das apreciações económicas complexas efetuadas pela Autoridade de vigilância da EFTA (n.° 102). Na fundamentação do acórdão, depois de ter interpretado a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais da União nesta matéria como uma referência aos limites da fiscalização da legalidade (n.° 96), este tribunal concluiu que, atendendo aos requisitos decorrentes da vertente penal do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, quando aplica coimas por infrações às regras da concorrência, a Autoridade de Vigilância da EFTA não goza de qualquer margem de discricionariedade nas apreciações económicas complexas para além do que que é inerente àqueles limites (n.° 100). Assim, segundo o Tribunal da EFTA, apesar de não competir ao juiz, no âmbito desta fiscalização, substituir a apreciação do autor do ato pela sua própria (e divergente) apreciação das situações económicas complexas, quando nenhuma objeção jurídica possa ser invocada contra as conclusões adotadas por aquele, este juiz deverá, no entanto, estar «convencido de que estas conclusões são suportadas pelos factos» (n.º 101).


103 —      Acórdãos, já referidos, Chalkor/Comissão (n.° 67), KME Germany e o./Comissão (C‑389/10, n.° 133), Otis e o. (n.os 59 a 63).


104 —      Acórdão de 18 de julho de 2013 (C‑501/11 P, n.os 30 a 39). De um ponto de vista formal, o exame baseou‑se no artigo 47.° da Carta e não no artigo 6.°, CEDH; v., designadamente, o n.° 32 do acórdão e a jurisprudência referida.


105 —      A natureza penal das sanções por violação do direito da concorrência da União para efeitos da aplicação da vertente penal do artigo 6.°, n.° 1, CEDH, decorre da aplicação dos critérios enunciados pelo TEDH no acórdão Engel e o./Países Baixos, de 8 de junho de 1976, n.° 5100/71. Neste sentido se pronunciou o Tribunal da EFTA no acórdão Posten Norgen/Autoridade de Vigilância da EFTA, já referido, n.° 88. Parece igualmente ter sido admitida pelo Tribunal de Justiça no acórdão Schindler Holding e o./Comissão, já referido (designadamente, n.° 33).


106 —      Acórdão Menarini Diagnostics Srl c. Itália, de 27 de setembro de 2011, n.° 43509/08, § 59 e jurisprudência referida.


107 —      Pelo menos na versão francesa dos acórdãos do TEDH, que fazem referência a um poder de reforma e não apenas de anulação, como sucede, por contraponto, no caso da versão inglesa.


108 —      A respeito tanto da determinação da sanção como da declaração da infração.


109 —      O alcance dessa fiscalização e a natureza dessas competências são descritos, em termos particularmente amplos, na opinião dissidente do juiz Pinto de Albuquerque no acórdão Menarini Diagnostics Srl c. Itália, já referido. Se devêssemos defender a abordagem preconizada nesta opinião, ser‑nos‑ia permitido duvidar da conformidade com o artigo 6.° CEDH da sindicância pelo juiz da União sobre as decisões de aplicação de uma sanção pela violação do direito da concorrência, limitada, no que se refere à declaração da infração, a uma fiscalização da legalidade.


110 —      V., neste sentido, as minhas conclusões no processo Elf Aquitaine, n.os 32 a 36 (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, Colet. 2011, p. I‑8947).


111 —      V. os acórdãos, já referidos, KME Germany e o./Comissão (C‑389/10) e Chalkor/Comissão, respetivamente, n.os 136 e 82.


112 —      V., para uma afirmação mais explícita da referida abordagem, a qual não é, contudo, isenta de críticas, do ponto de vista da segurança jurídica a opinião concordante do juiz Sajò no processo Menarini Diagnostics Srl c. Itália, já referido.


113 —      Já referido na nota 1066.


114 —      À semelhança do exercido pelo Tribunal Administrativo Regional de Lácio e pelo Conselho de Estado italiano a respeito das decisões da Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato, cuja conformidade com esta disposição foi afirmada pelo TEDH no seu acórdão Menarini Diagnostics Srl c. Itália, já referido.


115 —      V. acórdãos, já referidos, de 8 de dezembro de 2011, KME e o./Comissão (C‑272/09 P, n.° 63), KME Germany e o./Comissão (C‑389/10 P, n.° 136) e Chalkor/Comissão (n.° 82)


116 —      O esclarecimento que se segue a esta afirmação, no n.° 96, consiste apenas numa enunciação do princípio segundo o qual uma restrição acessória a uma operação principal não pode ser considerada objetivamente necessária quando exista uma alternativa menos restritiva.


117 —      Nos n.os 113 a 119 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, de resto, examinou e considerou improcedentes os argumentos apresentados pelas recorrentes no recurso principal e pelas intervenientes que pretendiam lançar dúvidas quanto à pertinência do exemplo australiano, relativos, em primeiro lugar, ao facto de a intervenção da autoridade reguladora australiana ter conduzido a uma diminuição e não à eliminação das CIM, e em segundo lugar, à impossibilidade de comparação entre as condições do mercado na Austrália e no EEE e, em terceiro lugar, às repercussões negativas que essa diminuição tinha implicado para os titulares dos cartões.


118 —      Acórdãos de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o. (C‑501/06 P, C‑513/06 P, C‑515/06 P e C‑519/06 P, Colet., p. I‑9291, n.° 92 (o sublinhado é meu).


119 —      Ibidem, n.° 93 (o sublinhado é meu).


120 —      V., em especial, artigos 4.°, 6.° e 9.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de fevereiro de 1962, Primeiro regulamento de execução dos artigos [81.°] e [82.°] do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22).


121 —      V. n.° 66 das conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak, apresentadas em 3 de maio de 2007 no processo o ZF Zefeser (acórdão de 18 de dezembro de 2007, C‑62/06, Colet., p. I‑11995).


122 —      V. n.° 70 das conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer, apresentadas em 8 de junho de 2006 no processo Van Straaten (acórdão de 28 de setembro de 2006, C‑150/05, Colet., p. I‑9327).


123 —      V., neste sentido, acórdão GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., já referido, n.° 83 e jurisprudência aí referida.


124 —      V. n.° 176 do acórdão recorrido.


125 —      V. acórdãos de 13 de julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão (56/64 e 58/64, Colet., n.° 423, n.° 502), e GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., já referido, n.° 92. V., igualmente, n.° 141, supra.


126 —      Em contrapartida, não será necessário reservar, para cada um destes utilizadores, individualmente, uma parte das vantagens objetivas, uma vez que é a incidência sobre todos os consumidores nos mercados pertinentes que deve ser tomada em consideração. V., neste sentido, acórdão de 23 de novembro de 2006, Asnef‑Equifax e Administración del Estado, já referido (n.os 70 e 72).


127 —      Estas considerações não estão em contradição com a afirmação do Tribunal de Justiça no acórdão Asnef‑Equifax e Administración del Estado, já referido, segundo a qual, para que se considere verificada a condição segundo a qual deve ser reservada aos utilizadores uma parte equitativa do lucro «é necessário que a incidência global sobre os consumidores nos mercados em causa seja favorável» (v. n.os 70 e 72). Como resulta da nota anterior, no processo Asnef‑Equifax e Administración del Estado, com efeito, colocava‑se a questão de saber se era necessário que cada membro da categoria de consumidores interessados beneficiasse individualmente das vantagens objetivas decorrentes do acordo restritivo, e não a questão do eventual favorecimento de categoria de consumidores em detrimento de outra.


128 —      V., neste sentido, acórdão GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., já referido, n.° 63.


129 —      Estas considerações não impedem, em meu entender, de modo algum, que, em casos especiais, a Comissão, no âmbito das escolhas em matéria de política da concorrência que lhe competem, possa atribuir o benefício da isenção a um acordo, pela razão de que esse acordo gera vantagens objetivas substanciais e claramente provadas para uma determinada categoria de utilizadores, apesar de provocar efeitos negativos limitados para uma outra categoria de consumidores, e produz um aumento considerável do bem‑estar total. Todavia, tais escolhas matéria de política da concorrência, que, em qualquer caso, me parecem dever ter caráter excecional, podem eventualmente caber à Comissão, mas escapam certamente às competências das partes do acordo, no âmbito da sua autoavaliação sobre a compatibilidade de um acordo com o artigo 81.° CE (atual artigo 101.° TFUE) de forma integral.


130 —      Era o que sucedia no caso que esteve na origem do acórdão do Tribunal Geral de 28 de fevereiro de 2002, Compagnie générale maritime e o./Comissão (T‑86/95, Colet., p. II‑1011), referido no n.° 228 do acórdão recorrido. Com efeito, neste processo, os dois serviços afetados pelas restrições da concorrência eram prestados em dois mercados distintos mas procurados pela mesma categoria de utilizadores, a saber os carregadores que contratavam serviços de transporte multimodal entre a Europa do Norte e o Sudoeste e Leste da Ásia (v., designadamente, n.os 112 e 343 a 345 do referido acórdão).


131 —      Quanto às vantagens provenientes diretamente do sistema Mastercard ou da sua otimização, estas, em qualquer caso, não teriam podido ser tomadas em consideração, atendendo a que o Tribunal Geral considerou que as CIM não constituíam uma restrição acessória do referido sistema.


132 —      A LBG explica que este critério visa apreciar se as CIM e as MSC foram fixadas num montante que um comerciante se disponha a pagar, caso tenha que comparar o custo da utilização pelo consumidor de um cartão de pagamento com o dos pagamentos não efetuados através de cartões bancários (em dinheiro).