Language of document : ECLI:EU:C:2015:38

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

28 de janeiro de 2015 (*)

«Reenvio prejudicial ― Política social ― Diretiva 2000/78/CE ― Igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional ― Artigo 2.°, n.os 1 e 2, alínea a) ― Artigo 6.°, n.° 1 ― Discriminação em razão da idade ― Regulamentação nacional que subordina a contagem, para efeitos da determinação da remuneração, do tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade a um prolongamento dos prazos de progressão ― Justificação ― Aptidão para alcançar a finalidade prosseguida ― Faculdade de contestar o prolongamento dos prazos de progressão»

No processo C‑417/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Oberster Gerichtshof (Áustria), por decisão de 27 de junho de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 23 de julho de 2013, no processo

ÖBB Personenverkehr AG

contra

Gotthard Starjakob,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Segunda Secção, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev (relator) e J. L. da Cruz Vilaça, juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: A. Impellizzeri, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 15 de maio de 2014,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação de G. Starjakob, por M. Orgler, Rechtsanwalt, e D. Rief,

¾        em representação da ÖBB Personenverkehr AG, por C. Wolf, Rechtsanwalt,

¾        em representação do Governo austríaco, por G. Hesse, na qualidade de agente,

¾        em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann e D. Martin, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 3 de julho de 2014,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 21.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e dos artigos 7.°, n.° 1, 16.° e 17.° da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO L 303, p. 16).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe G. Starjakob à ÖBB‑Personenverkehr AG (a seguir «ÖBB») a propósito da licitude do regime profissional de remuneração adotado pelo legislador austríaco para eliminar uma discriminação em razão da idade.

 Quadro jurídico

 Diretiva 2000/78

3        Nos termos do seu artigo 1.°, a Diretiva 2000/78 «tem por objeto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à atividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento».

4        O artigo 2.° dessa diretiva prevê:

«1.      Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°

2.       Para efeitos do n.° 1:

a)      Considera‑se que existe discriminação direta sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável;

[...]»

5        O artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da referida diretiva prevê que a mesma é aplicável, dentro dos limites das competências atribuídas à Comunidade Europeia, a todas as pessoas, tanto no setor público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito às condições de emprego e de trabalho, incluindo, nomeadamente, as condições de remuneração.

6        O artigo 6.°, n.° 1, da mesma diretiva tem a seguinte redação:

«Sem prejuízo do disposto no n.° 2 do artigo 2.°, os Estados‑Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objetiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objetivo legítimo, incluindo objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objetivo sejam apropriados e necessários.

Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

a)      O estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, nomeadamente condições de despedimento e remuneração, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua proteção;

b)      A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego;

[...]»

7        O artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 prevê que, «[a] fim de assegurar a plena igualdade na vida ativa, o princípio da igualdade de tratamento não obsta a que os Estados‑Membros mantenham ou adotem medidas específicas destinadas a prevenir ou compensar desvantagens relacionadas com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.°».

8        Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, dessa diretiva, «[o]s Estados‑Membros podem introduzir ou manter disposições relativas à proteção do princípio da igualdade de tratamento mais favoráveis do que as estabelecidas na presente diretiva».

9        O artigo 16.°, n.° 1, alínea a), da referida diretiva prevê que os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que sejam suprimidas as disposições legislativas, regulamentares e administrativas contrárias ao princípio da igualdade de tratamento.

10      O artigo 17.° da Diretiva 2000/78, relativo às sanções, dispõe:

«Os Estados‑Membros determinam o regime de sanções aplicável às violações das disposições nacionais aprovadas em execução da presente diretiva, e adotam as medidas necessárias para assegurar a aplicação dessas disposições. As sanções, em que se pode incluir o pagamento de indemnizações à vítima, devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas. Os Estados‑Membros notificam a Comissão de tais disposições o mais tardar em 2 de dezembro de 2003, e notificá‑la‑ão o mais rapidamente possível de qualquer posterior alteração às mesmas.»

 Direito austríaco

 Lei relativa à igualdade de tratamento

11      A Diretiva 2000/78 foi transposta na Áustria através da Lei relativa à igualdade de tratamento de 2004 (Gleichbehandlungsgesetz, BGBl. I, 66/2004, a seguir «GlBG»). Essa lei prevê, no § 26, n.°2:

«Se, em consequência da violação pelo empregador do princípio da igualdade de tratamento consagrado no § 17, n.° 1, ponto 2, um trabalhador ou uma trabalhadora receber, pelo mesmo trabalho ou por um trabalho de valor comparável, uma remuneração inferior à de um trabalhador ou trabalhadora que não seja alvo de uma discriminação por qualquer um dos motivos referidos no § 17, esse trabalhador ou essa trabalhadora tem direito ao pagamento, pelo empregador, da diferença e de uma indemnização pelos danos morais sofridos.»

12      O § 29, n.° 1, da GlBG prevê:

«O prazo para invocar judicialmente os direitos que decorrem do § 26, n.os 1 e 5, é de seis meses. Esse prazo começa a correr a partir da data do indeferimento da candidatura ou da promoção. O prazo para invocar judicialmente os direitos que decorrem do § 26, n.° 11, é de um ano. […] Relativamente aos direitos decorrentes do § 26, n.os 2, 3, 4, 6, 8, 9 e 10, é aplicável a prescrição de três anos prevista no § 1486 [do Código Civil (Allgemeines Bürgerliches Gesetzbuch, a seguir ‘ABGB’)].»

 ABGB

13      O § 1480 do ABGB diz respeito à prescrição. Por força desta disposição, «[o]s créditos relativos a prestações anuais em atraso, em especial juros, pensões, prestações de natureza alimentar, prestações aos ascendentes e de amortização do capital de anuidades acordadas, caducam no prazo de três anos; o direito enquanto tal prescreve por falta de exercício durante trinta anos».

14      O § 1486 do ABGB, com a epígrafe «Prazos de prescrição especiais», prevê:

«Prescrevem no prazo de três anos: os créditos

[...]

5.      dos trabalhadores respeitantes à sua remuneração e ao reembolso de despesas emergentes dos contratos de trabalho dos operários, dos trabalhadores à jorna, dos trabalhadores do serviço doméstico e de todos os trabalhadores privados, bem como dos empregadores relativamente a adiantamentos feitos sobre esses mesmos créditos.

[...]».

 Regulamento de 1963 relativo ao regime salarial nos caminhos de ferro

15      Os trabalhadores dos caminhos de ferro austríacos admitidos até 31 de dezembro de 1995 estão abrangidos pelo sistema de progressão definido pelo § 3 do Regulamento de 1963 relativo ao regime salarial nos caminhos de ferro (Bundesbahn‑Besoldungsordnung 1963, BGBl. 170/1963, a seguir «BO 1963»), que prevê:

«(1)      A data de referência para efeitos de progressão deve ser determinada de forma a que ― com exceção dos períodos completados antes do 18 anos de idade e sem prejuízo das disposições restritivas dos n.os 4 a 7 ― os seguintes períodos anteriores sejam considerados precedentes ao dia da admissão:

a)      os períodos indicados no n.° 2, na sua totalidade,

b)      os outros períodos, em metade.

(2)      Nos termos do n.° 1, alínea a), considera‑se que são precedentes ao dia da admissão:

1.      O tempo de trabalho completado numa atividade que represente, no mínimo, metade do tempo previsto para um trabalhador a tempo inteiro no âmbito de uma relação de trabalho ao serviço dos caminhos de ferro austríacos. [...]

[…]

(6)      É proibido ter em conta mais que uma vez um único e mesmo período ― exceção feita à dupla contagem prevista no § 32 do [Regulamento de 1974 relativo ao regime salarial nos caminhos de ferro (Bundesbahn‑Besoldungsordnung 1974, BGBl. 263)]. [...]»

 Lei dos caminhos de ferro federais

16      Na sequência de um acordo entre os parceiros sociais, a Lei dos caminhos de ferro federais (Bundesbahngesetz, BGBl. n.° 852/1992, a seguir «ÖBB‑G») foi alterada por uma Lei de 2011 (BGBl. I, 129/2011, a seguir «Lei de 2011»). Esta lei altera, designadamente, o sistema consagrado ao § 3 do BO 1963. Agora, o § 53a da ÖBB‑G prevê:

«(1)      Para os trabalhadores e pensionistas que entrem ou tenham entrado ao serviço dos caminhos de ferro austríacos (ÖBB) [...] até 31 de dezembro de 2004 e cuja data individual de referência para efeitos de progressão seja ou tenha sido fixada com base no § 3 do [BO 1963], esta data será objeto de nova determinação, depois da comunicação do tempo de serviço a ter em conta, em conformidade com as disposições seguintes:

1.      A data de referência para efeitos de progressão deve ser determinada de forma a que sejam considerados precedentes ao dia da admissão […] os períodos a ter em conta (Z 2), posteriores a 30 de junho do ano em que completarem ou tenham sido completados nove anos de escolaridade após a entrada no primeiro nível de ensino escolar.

2.      Os períodos a ter em conta resultam das regras de contagem em vigor, definidas pelas disposições aplicáveis do BO 1963 [...]

(2)      Em caso de fixação da nova data individual de referência para efeitos de progressão em conformidade com o n.° 1, são aplicáveis as disposições seguintes:

1.      Cada período necessário para efeitos de progressão em cada um dos três primeiros escalões é prolongado em ano.

2.      A progressão tem lugar em 1 de janeiro seguinte ao cumprimento de cada período necessário para efeitos de progressão (data da progressão).

3.      A fixação da nova data individual de referência para efeitos de progressão não produz efeitos se implicar uma diminuição salarial em relação à data estabelecida anteriormente.

[...]

(4)      Para a fixação da nova data de referência para efeitos de progressão, a prova do tempo de serviço a ter em conta, em conformidade com o n.° 1, deve ser devidamente apresentada pelos trabalhadores e pensionistas, por meio de formulário fornecido pelo empregador. Para as pessoas que não apresentem essa prova ou que a apresentem de forma incorreta ou incompleta, mantém‑se, em relação a elas, a data de referência para efeitos de progressão anteriormente aplicável [...].

(5)      Relativamente aos créditos salariais provenientes da fixação da nova data de referência para efeitos de progressão, o período entre 18 de junho de 2009 e a data da publicação da [Lei de 2011] não entra no cálculo do prazo de prescrição de três anos.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17      G. Starjakob, nascido em 11 de maio de 1965, começou a trabalhar em 1 de fevereiro de 1990 numa sociedade em cujos direitos a ÖBB sucedeu. A data de referência para efeitos de progressão foi estabelecida tendo em conta metade do tempo de aprendizagem completado a partir do seu 18.° aniversário, ao passo que o tempo completado antes desta idade não foi contabilizado, em conformidade com o § 3 do BO 1963.

18      Em 2012, baseando‑se no acórdão Hütter (C‑88/08, EU:C:2009:381), G. Starjakob intentou contra a ÖBB uma ação para pagamento da diferença salarial que lhe teria sido devida, relativamente ao período de 2007 a 2012, se a data de referência para efeitos de progressão tivesse sido calculada tendo em conta o tempo de aprendizagem completado antes do seu 18.° aniversário.

19      O Landesgericht Innsbruck (Tribunal Regional de Innsbruck) julgou a ação improcedente, por considerar que o § 53a da ÖBB‑G tinha eliminado a discriminação em razão da idade. Declarou que G. Starjakob só podia exigir que a data de referência para efeitos de progressão fosse calculada em conformidade com o n.° 1 da referida disposição se aceitasse as consequências associadas a essa nova data de referência expostas no n.° 2 da mesma disposição, relativamente ao prolongamento dos períodos necessários para a progressão, e se apresentasse a prova do tempo de serviço a ter em conta nos termos do n.° 4 da mesma disposição (dever de cooperação). Uma vez que G. Starjakob ainda não tinha apresentado essa prova, a data de referência fixada para efeitos da sua progressão nos termos do § 3 do BO 1963 mantinha‑se.

20      Em sede de recurso, o Oberlandesgericht Innsbruck (Tribunal Regional Superior de Innsbruck) deu provimento ao pedido de G. Starjakob. Entendeu que, na falta dessas provas, a situação jurídica aplicável a este último era a prevista pelo BO 1963, mas que este último era discriminatório. Por consequência, considerou que se devia determinar uma nova data de referência para efeitos de progressão de G. Starjakob que tivesse em conta o período de aprendizagem completado antes dos 18 anos de idade, sem lhe aplicar o prolongamento dos períodos exigidos para a progressão.

21      Nestas condições, chamado a decidir em sede de recurso, o Oberster Gerichtshof (Tribunal Supremo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Devem as disposições conjugadas do artigo 21.° da [Carta assim como] do[s] artigo[s] 7.°, n.° 1, […] 16.° e […] 17.° da Diretiva 2000/78 ser interpretadas no sentido de que:

a)      um trabalhador [relativamente ao] qual a entidade patronal fixou inicialmente uma data de referência errada para efeitos de [progressão], com base num regime legal de contagem do tempo de serviço [constitutivo de uma discriminação] em razão da idade, tem, em qualquer caso, direito ao pagamento da diferença de salário resultante da aplicação [de uma] data de referência não discriminatória […],

b)      ou, pelo contrário, [devem ser interpretadas no sentido] de que o Estado‑Membro [em causa também] tem a possibilidade de eliminar [a discriminação em razão da idade], mediante uma contagem não discriminatória do tempo de serviço […] sem compensação financeira (através da […] determinação [de uma nova] data de referência para efeitos de [progressão] e [de um prolongamento do] período [exigido] para efeitos de [progressão]), em especial quando esta solução neutra em termos de salário, se destina[r] a manter a liquidez da entidade patronal e a evitar [a sobrecarga de trabalho necessária aos] novos cálculos?

2)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea b)]:

Pode [essa] contagem não discriminatória do tempo de serviço […]

a)      também [ser introduzida pelo legislador] com efeito retroativo (no caso vertente [pela Lei de 2011] ou

b)      essa contagem só é aplicável desde a data da adoção ou [da] publicação das novas normas de contagem e de progressão?

3)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea b)]:

Devem as disposições conjugadas do artigo 21.° da [Carta assim como] do[s] artigo[s] 2.°, n.os 1 e 2, e […] 6.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 ser interpretadas no sentido de que:

a)      um regime legal que [exige] um período […] de progressão mais longo no início da carreira, e que, por conseguinte, dificulta a progressão para o nível salarial seguinte, constitui uma discriminação indireta com base na idade,

b)      e, em caso de resposta afirmativa, no sentido de que esse regime [é adequado e necessário], atendendo à reduzida experiência profissional no início da carreira […]?

4)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea b)]:

Devem as disposições conjugadas dos artigos 7.°, n.° 1, […] 8.°, n.° 1, e […] 6.°, n.° l, da Diretiva [2000/78] ser interpretadas no sentido de que a manutenção de um regime antigo [constitutivo de uma discriminação] em razão da idade apenas para proteger o trabalhador das desvantagens, em termos salariais, decorrentes de um regime novo, não discriminatório (cláusula de salvaguarda salarial), é admissível e justificável por motivos de proteção dos direitos [adquiridos] e da confiança legítima?

5)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea b),] e à [terceira questão, alínea b)]:

a)      [A fim de] determinar o tempo de serviço a ter em conta, [pode o legislador] estabelecer [um dever] (uma obrigação) de cooperação por parte do trabalhador […] e fazer depender a passagem para o novo sistema de contagem e de progressão do cumprimento desta obrigação?

b)      [U]m trabalhador que não coopera, como é razoavelmente esperado, na determinação da nova data de referência para efeitos de progressão nos termos do novo sistema de contagem e de progressão, [não discriminatório], e que, por conseguinte, não invoca de forma consciente o regime não discriminatório e permanece voluntariamente no antigo sistema de contagem e de progressão, [constitutivo de uma discriminação] em razão da idade, [pode] alegar uma discriminação baseada na idade decorrente do antigo sistema, ou constitui [o facto de permanecer] no antigo sistema, discriminatório, apenas para poder invocar direitos pecuniários um abuso de direito?

6)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea a),] ou [à primeira questão, alínea b), e à segunda questão, alínea b)]:

Exige o princípio da eficácia, consagrado no direito da União [no] artigo 47.°, n.° 1, da [Carta] e [no] artigo 19.°, n.° 1, TUE, que o prazo de prescrição [dos] direitos decorrentes da ordem jurídica da União não comece a correr antes de a situação jurídica ter sido esclarecida de maneira inequívoca através da publicação de uma decisão pertinente do Tribunal de Justiça da União Europeia?

7)      No caso de resposta afirmativa à [primeira questão, alínea a)], ou [à primeira questão, alínea b), e à segunda questão, alínea b)]:

Exige o princípio da equivalência [do] direito da União que uma suspensão da prescrição prevista no direito nacional para [as ações no exercício] de direitos [baseados num] novo sistema de contagem e de [progressão] (§ 53a, n.° 5, [da ÖBB‑G]) seja alargada [às ações para pagamento] de diferenças salariais [resultantes] de um antigo sistema [constitutivo de uma discriminação] em razão da idade?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão, alínea b), e à quarta questão

22      Com a primeira questão, alínea b), e a quarta questão, que importa analisar em conjunto e em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o direito da União, em especial os artigos 2.° e 6.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como o que está em causa no processo principal, que, para pôr termo a uma discriminação em razão da idade, toma em consideração o tempo de serviço anterior à idade de 18 anos e, em simultâneo, prolonga em um ano o período exigido para a progressão em cada um dos três primeiros escalões de remuneração.

23      Num primeiro momento, importa apurar se resulta da aplicação do § 53a da ÖBB‑G uma diferença de tratamento, na aceção do artigo 2.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78. A este respeito, há que recordar que, nos termos desta disposição, «entende‑se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°» da referida diretiva. O artigo 2.°, n.° 2, alínea a), da mesma diretiva precisa que, para efeitos da aplicação do n.° 1 daquele artigo, existe discriminação direta sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.°, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que outra pessoa que se encontre numa situação comparável.

24      No processo principal, as categorias de pessoas pertinentes para efeitos dessa comparação são, por um lado, os trabalhadores cuja experiência tenha sido, ainda que em parte, adquirida antes dos 18 anos de idade (a seguir «trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior») e, por outro, os que obtiveram, após terem atingido essa idade, uma experiência de idêntica natureza e de duração comparável (a seguir «trabalhadores favorecidos pelo regime anterior»).

25      No que diz respeito à existência de uma diferença de tratamento entre estas duas categorias de trabalhadores, resulta dos autos à disposição do Tribunal de Justiça que, na sequência do acórdão Hütter (EU:C:2009:381), o legislador austríaco instituiu, mediante a adoção do § 53a da ÖBB‑G, um regime de remuneração e de progressão que permite tomar em consideração, para efeitos da determinação da data de referência para a progressão, o tempo de serviço posterior a 30 de junho seguinte ao fim da escolaridade obrigatória geral de nove anos, quer tenha sido completado antes ou após atingir os 18 anos de idade. Como o órgão jurisdicional de reenvio observou, essa data de referência passou a ser determinada sem discriminação em razão da idade.

26      No entanto, há que examinar se o § 53a da ÖBB‑G continua a aplicar um tratamento diferente às duas categorias de trabalhadores em causa.

27      A este respeito, importa referir que os trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior, que, com fundamento no § 53a, n.° 4, da ÖBB‑G, conseguem que seja tido em conta o tempo de serviço anterior ao seu 18.° aniversário, ficam sujeitos ao n.° 2 da mesma disposição, que prevê que cada período exigido para a progressão em cada um dos três primeiros escalões é prolongado em um ano, o que aumenta em três anos o prazo para obter uma nova progressão.

28      Em contrapartida, quanto aos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior, cumpre concluir que não têm nenhuma razão para pedir a aplicação, ao seu caso, do novo cálculo da data de referência para efeitos de progressão, na medida em que não cumpriram tempo de serviço antes dos 18 anos. Em todo o caso, o § 53a, n.° 2, ponto 3, da ÖBB‑G prevê que a fixação da nova data individual de referência para efeitos de progressão não produz efeitos se implicar uma diminuição salarial por comparação com o método de fixação anterior a essa data. Ora, na medida em que, por força da aplicação desta disposição, o período exigido para obter uma progressão é aumentado um ano em cada um dos três primeiros escalões de remuneração, o que implicaria no seu caso uma diminuição salarial, a referida disposição não se aplicará aos ditos trabalhadores favorecidos, ao invés dos trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior que tenham cooperado para efeitos do cálculo da sua nova data de referência.

29      Assim, ao adotar o § 53a, n.° 2, ponto 1, da ÖBB‑G, o legislador austríaco introduziu uma disposição que continua a aplicar um tratamento diferente entre os trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior e os que foram favorecidos por esse regime, no que diz respeito à sua posição na tabela e à remuneração correspondente.

30      Deste modo, a regulamentação nacional em causa no processo principal não só neutraliza a vantagem decorrente da contagem de tempo de serviço cumprido antes dos 18 anos, como decorre do n.° 27 do presente acórdão, mas também prejudica apenas os funcionários desfavorecidos pelo regime anterior, uma vez que o prolongamento dos prazos de progressão na carreira só é suscetível de se aplicar a estes últimos. Consequentemente, os efeitos desfavoráveis deste regime relativamente a estes funcionários não deixaram totalmente de existir (acórdão Schmitzer, C‑530/13, EU:C:2014:2359, n.° 34).

31      Na medida em que o prolongamento em um ano de cada período exigido para a progressão em cada um dos três primeiros escalões só se pode aplicar aos trabalhadores que cumpriram tempo de serviço antes de terem atingido os 18 anos de idade, há que concluir que a regulamentação nacional em causa no processo principal contém uma diferença de tratamento diretamente fundada na idade, na aceção do artigo 2.°, n.° 2, alínea a), da Diretiva 2000/78 (v., neste sentido, acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 35).

32      Importa, num segundo momento, examinar se esta diferença de tratamento pode ser justificada.

33      O artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2000/78 precisa, com efeito, que os Estados‑Membros podem prever que uma diferença de tratamento com base na idade não constitui uma discriminação se for objetiva e razoavelmente justificada, no quadro do direito nacional, por objetivos legítimos, incluindo objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para alcançar esses objetivos sejam apropriados e necessários (acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 37).

34      O Tribunal de Justiça tem reiteradamente declarado que os Estados‑Membros dispõem de uma ampla margem de apreciação na escolha não só da prossecução de determinado objetivo, entre outros, em matéria de política social e de emprego mas também na definição das medidas suscetíveis de o realizar (acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 38 e jurisprudência referida).

35      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a regulamentação em causa no processo principal destina‑se, antes de mais, a estabelecer um regime de remuneração e de progressão não discriminatório. No âmbito dessa reforma, as regras que sujeitam a revisão das datas de referência a um pedido de cada interessado, bem como as regras relativas ao prolongamento dos prazos de progressão, visam objetivos de neutralidade financeira, de economia administrativa, de respeito dos direitos adquiridos e de proteção da confiança legítima.

36      No que diz respeito, por um lado, ao objetivo de neutralidade financeira da regulamentação nacional em causa no processo principal, importa recordar que o direito da União não impede os Estados‑Membros de tomarem em conta considerações orçamentais paralelamente a considerações de ordem política, social ou demográfica, contanto que, ao fazê‑lo, respeitem, em particular, o princípio da proibição de discriminações em função da idade. A esse propósito, embora considerações de ordem orçamental possam estar na base das opções de política social de um Estado‑Membro e influenciar a natureza ou o alcance das medidas que pretende adotar, tais considerações não podem constituir, por si sós, um objetivo legítimo na aceção do artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78 (acórdão Fuchs e Köhler, C‑159/10 e C‑160/10, EU:C:2011:508, n.os 73 e 74). O mesmo se passa no que respeita às considerações de ordem administrativa referidas pelo órgão jurisdicional de reenvio e o Governo austríaco (v., neste sentido, acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 41 e jurisprudência referida).

37      Por outro lado, relativamente ao respeito dos direitos adquiridos e à proteção da confiança legítima dos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior no que se refere à respetiva remuneração, há que referir que constituem objetivos legítimos de política de emprego e do mercado de trabalho que podem justificar, durante um período transitório, a manutenção das remunerações anteriores e, por consequência, de um regime discriminatório em razão da idade (acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 42 e jurisprudência referida).

38      No caso em apreço, há que concluir que, na medida em que o § 53a, n.° 2, ponto 1, da ÖBB‑G prevê que a fixação da nova data individual de referência para efeitos da progressão não produz efeitos se implicar uma diminuição salarial dos trabalhadores em causa, o novo sistema de remuneração salvaguarda os direitos adquiridos destes últimos no que respeita à sua remuneração.

39      Todavia, estes objetivos não podem justificar uma medida que mantém definitivamente, ainda que apenas em relação a algumas pessoas, a diferença de tratamento em função da idade que a reforma de um regime discriminatório, em que essa medida se insere, visa eliminar. Tal medida, embora suscetível de assegurar a proteção dos direitos adquiridos e da confiança legítima em relação aos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior, não é adequada para estabelecer um regime não discriminatório para os trabalhadores desfavorecidos pelo referido regime (acórdão Schmitzer, EU:C:2014:2359, n.° 44).

40      Decorre de todas as considerações precedentes que importa responder à primeira questão, alínea b), e à quarta questão que o direito da União, em especial os artigos 2.° e 6.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, para pôr termo a uma discriminação em razão da idade, toma em consideração tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, mas que, simultaneamente, inclui uma regra, aplicável apenas aos trabalhadores vítimas dessa discriminação, que prolonga em um ano o período exigido para a progressão em cada um dos três primeiros escalões de remuneração e que, ao fazê‑lo, mantém definitivamente uma diferença de tratamento em razão da idade.

 Quanto à primeira questão, alínea a)

41      Com a primeira questão, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 16.° e 17.° da Diretiva 2000/78 devem ser interpretados no sentido de que uma regulamentação nacional que visa pôr fim a uma discriminação em razão da idade deve necessariamente permitir que um trabalhador cujo tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade não foi tomado em consideração no cálculo da sua progressão obtenha uma compensação financeira correspondente ao pagamento da diferença entre a remuneração que teria auferido na inexistência de tal discriminação e a que efetivamente auferiu.

42      A este respeito, importa observar que o artigo 17.° da Diretiva 2000/78 não é pertinente para a questão submetida, a qual não diz respeito à violação de disposições nacionais adotadas em aplicação dessa diretiva, mas à aplicação de uma regulamentação nacional que, como resulta da resposta à primeira questão, alínea b), e à quarta questão, contém ela própria uma discriminação em razão da idade, contrária à referida diretiva.

43      Em seguida, há que recordar que, em conformidade com o artigo 16.° da Diretiva 2000/78, os Estados‑Membros têm a obrigação de suprimir as disposições legislativas, regulamentares e administrativas contrárias ao princípio da igualdade de tratamento.

44      Esse artigo não impõe aos Estados‑Membros ou a um empregador privado uma medida determinada em caso de violação da proibição de discriminação, mas deixa‑lhes a liberdade de escolherem entre as diferentes soluções adequadas para realizar o objetivo que visa, em função das diferentes situações que possam ocorrer.

45      Por conseguinte, há que considerar que o referido artigo deve ser interpretado no sentido de que uma regulamentação nacional que visa pôr termo a uma discriminação em razão da idade não deve necessariamente permitir que um trabalhador cujo tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade não foi tomado em consideração no cálculo da sua progressão obtenha uma compensação financeira correspondente ao pagamento da diferença entre a remuneração que teria auferido na inexistência de tal discriminação e a que efetivamente auferiu.

46      Como tal, por força de jurisprudência constante, quando seja detetada uma discriminação contrária ao direito da União, e enquanto não forem adotadas medidas que restabeleçam a igualdade de tratamento, o respeito do princípio da igualdade só pode ser assegurado pela concessão, às pessoas da categoria desfavorecida, das mesmas vantagens de que beneficiam as pessoas da categoria privilegiada, regime este que, na falta da aplicação correta do direito da União, é o único sistema de referência válido (v. acórdãos Jonkman e o., C‑231/06 a C‑233/06, EU:C:2007:373, n.° 39, e Landtová, C‑399/09, EU:C:2011:415, n.° 51).

47      O Tribunal de Justiça precisou que essa solução só se pode aplicar em presença de um sistema de referência válido (v. acórdão Specht e o., C‑501/12 a C‑506/12, EU:C:2014:2005, n.° 96). Ora, é esse o caso no processo principal.

48      Como resulta da resposta à primeira questão, alínea b), e à quarta questão, após a adoção da regulamentação nacional em causa no processo principal ainda não foi feita uma aplicação correta do direito da União, em especial da Diretiva 2000/78. O regime aplicável aos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior continua, portanto, a ser o único sistema de referência válido. Como tal, o restabelecimento da igualdade de tratamento, num caso como o do processo principal, implica a concessão aos trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior de vantagens idênticas às que os trabalhadores favorecidos puderam ter ao abrigo desse regime, no que diz respeito quer à contagem de tempo serviço completado antes dos 18 anos de idade quer à progressão na escala das remunerações.

49      Em face do exposto, importa responder à primeira questão, alínea a), que o direito da União, em especial o artigo 16.° da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que uma regulamentação nacional que visa pôr termo a uma discriminação em razão da idade não deve necessariamente permitir que um trabalhador cujo tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade não foi tomado em consideração no cálculo da sua progressão obtenha uma compensação financeira correspondente ao pagamento da diferença entre a remuneração que teria auferido na inexistência de tal discriminação e a que efetivamente auferiu. Todavia, num caso como o que está em causa no processo principal e enquanto não for adotado um sistema que proceda à supressão da discriminação em razão da idade de uma maneira conforme ao que prevê a Diretiva 2000/78, o restabelecimento da igualdade de tratamento implica a concessão aos trabalhadores desfavorecidos pelo regime anterior de vantagens idênticas às que os trabalhadores favorecidos puderam ter ao abrigo desse regime, no que diz respeito à contagem de tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, mas igualmente à progressão na escala das remunerações.

 Quanto à segunda e terceira questões

50      Atendendo à resposta dada à primeira questão, alínea b), e à quarta questão, não é necessário responder à segunda e terceira questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

 Quanto à quinta questão

51      Com a quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o direito da União, em especial a Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que o legislador nacional preveja, para efeitos da contagem de tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, uma obrigação de cooperação por força do qual o trabalhador deve fornecer ao seu empregador as provas relativas a esses períodos e que, na falta dessa cooperação, seja mantida a data de referência para efeitos de progressão que lhe era anteriormente aplicável. Esse órgão jurisdicional pergunta igualmente se o facto de um trabalhador não dar cumprimento a esta obrigação e permanecer, assim, voluntariamente no anterior sistema com o único motivo de poder invocar pretensões pecuniárias constitui um abuso de direito.

52      A este respeito, resulta dos autos à disposição do Tribunal de Justiça que a determinação da nova data individual de referência necessita da cooperação do trabalhador em causa e que, em conformidade com o § 53a, n.° 4, primeira frase, da ÖBB‑G, este deve dar conhecimento ao empregador do tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade. Por força do § 53a, n.° 4, segunda frase, da ÖBB‑G, se o trabalhador não fornecer essas informações, a data de referência para efeitos da sua progressão, determinada em aplicação do § 3 do BO 1963, mantém‑se.

53      Esta cooperação é necessária para poder calcular uma data de referência para efeitos da determinação de uma progressão isenta de discriminação, na medida em que não se pode razoavelmente exigir do empregador que ele próprio determine o tempo de serviço completado anteriormente para cada um dos seus trabalhadores. Importa, além disso, referir que estão em causa os interesses pessoais do trabalhador e que a obrigação de cooperação é um passo prévio necessário para que o empregador possa dar cumprimento às suas obrigações legais, em particular as que decorrem do § 53a, n.° 1, ponto 1, da ÖBB‑G, adotado a fim de ter em conta os ensinamentos decorrentes do acórdão Hütter (EU:C:2009:381).

54      Por conseguinte, há que concluir que nem o 16.° da Diretiva 2000/78 nem nenhuma outra disposição desta diretiva obsta a que uma disposição, como o § 53a, n.° 4, da ÖBB‑G, preveja uma obrigação de cooperação por força da qual o trabalhador deve fornecer ao seu empregador, para efeitos da respetiva contagem, as provas relativas ao tempo de serviço anterior aos 18 anos de idade.

55      Quanto à eventual existência de um abuso de direito, cumpre recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os particulares não podem abusiva ou fraudulentamente invocar em seu benefício as normas da União Europeia (v., designadamente, acórdãos Halifax e o., C‑255/02, EU:C:2006:121, n.° 68; SICES e o., C‑155/13, EU:C:2014:145, n.° 29; e Torresi, C‑58/13 e C‑59/13, EU:C:2014:2088, n.° 42).

56      A verificação da existência de uma prática abusiva exige a reunião de um elemento objetivo e de um elemento subjetivo. No que se refere ao elemento objetivo, deve decorrer de um conjunto de circunstâncias objetivas que, apesar do respeito formal das condições previstas na regulamentação da União, a finalidade prosseguida por essa regulamentação não foi alcançada. Quanto ao elemento subjetivo, deve ficar claro que existe uma vontade de obter uma vantagem indevida resultante da regulamentação da União, criando artificialmente as condições exigidas para a sua obtenção (v. acórdão Torresi, EU:C:2014:2088, n.os 44 a 46 e jurisprudência referida).

57      No processo principal, resulta da resposta dada à primeira e quarta questões que a regulamentação nacional em causa continua a incluir uma discriminação em razão da idade. Nestas condições, e atendendo ao que foi exposto nos n.os 46 a 48 do presente acórdão, a recusa de G. Starjakob de cooperar para efeitos da aplicação dessa regulamentação e a sua ação destinada a obter o pagamento da diferença de remuneração que lhe teria sido devida pelo período entre 2007 e 2012 se a data de referência para efeitos de progressão tivesse sido calculada tomando em consideração o tempo de serviço completado antes do 18.° aniversário, com o fim de restabelecer a igualdade de tratamento relativamente aos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior, não podem ser consideradas um abuso de direito destinado a obter da regulamentação da União uma vantagem indevida.

58      Em face do exposto, há que responder à quinta questão que o direito da União, em especial o artigo 16.° da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o legislador nacional preveja, para efeitos da contagem do tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, uma obrigação de cooperação por força da qual o trabalhador deve fornecer ao empregador as provas relativas ao referido período. No entanto, não constitui um abuso de direito o facto de um trabalhador recusar cooperar para efeitos da aplicação de uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que contém uma discriminação em razão da idade, contrária à Diretiva 2000/78, bem como a sua ação que visa obter um pagamento destinado a restabelecer a igualdade de tratamento relativamente aos trabalhadores favorecidos pelo regime anterior.

 Quanto à sexta questão

59      Com a sexta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o princípio da efetividade deve ser interpretado no sentido de que impõe que um prazo nacional de prescrição de direitos que têm o seu fundamento no direito da União não deve começar a correr antes da data de prolação do acórdão do Tribunal de Justiça que clarificou a situação jurídica na matéria.

60      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o tribunal de recurso considera que, até à prolação do acórdão Hütter (EU:C:2009:381), existia uma obstáculo jurídico à ação destinada a exercer os diferentes direitos à reavaliação e que, como tal, o prazo de prescrição não podia ter começado a correr antes de 18 de junho de 2009, data de prolação desse acórdão.

61      A este respeito, importa recordar que, por força de jurisprudência constante, na falta de regulamentação da União na matéria, compete à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das ações judiciais destinadas a assegurar a plena proteção dos direitos que os particulares retiram do direito da União, desde que essas modalidades não sejam, no entanto, menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência) nem tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direito conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (v., designadamente, acórdão Fiamingo e o., C‑362/13, C‑363/13 e C‑407/13, EU:C:2014:2044, n.° 63 e jurisprudência referida).

62      No que se refere ao princípio da efetividade, o Tribunal de Justiça considerou compatível com o direito da União a fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de preclusão, no interesse da segurança jurídica, na medida em que esses prazos não sejam suscetíveis de tornar impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (acórdão Pohl, C‑429/12, EU:C:2014:12, n.° 29 e jurisprudência referida).

63      No que respeita à questão de saber se a data de prolação do acórdão Hütter (EU:C:2009:381) afetou a determinação do início de um prazo de prescrição fixado pelo direito nacional, importa recordar que a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça a uma norma de direito da União, no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.° TFUE, esclarece e precisa, sempre que seja necessário, o significado e o alcance dessa norma, tal como deve ser ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor. Por outras palavras, um acórdão prejudicial não tem valor constitutivo, mas puramente declarativo, com a consequência de que esses efeitos remontam, em princípio, à data da entrada em vigor da norma interpretada (acórdão Pohl, EU:C:2014:12, n.° 30 e jurisprudência referida).

64      No que respeita ao início do prazo de prescrição, o Tribunal de Justiça precisou que este resulta, em princípio, do direito nacional e que a eventual declaração pelo Tribunal de Justiça de uma violação do direito da União não afeta, em princípio, esse ponto de partida (acórdão Pohl, EU:C:2014:12, n.° 31 e jurisprudência referida).

65      Portanto, há que assinalar que a data de prolação do acórdão Hütter (EU:C:2009:381) não afeta o início do prazo de prescrição em causa no processo principal e, assim, não é pertinente para apreciar a observância do princípio da efetividade no presente processo (v., neste sentido, acórdão Pohl, EU:C:2014:12, n.° 32).

66      Como resulta do pedido de decisão prejudicial, em conformidade com o § 1480 do ABGB, o direito de pedir uma reavaliação da remuneração e uma retificação da classificação prescreve por falta de exercício durante 30 anos. Esse prazo de prescrição começa a correr, no processo principal, no dia em que a classificação do trabalhador foi efetuada pelo empregador, ou seja, na data de início da relação de trabalho.

67      Não se pode negar que esse prazo constitui um prazo razoável de recurso sob pena de preclusão no interesse da segurança jurídica, na aceção da jurisprudência recordada no n.° 62 do presente acórdão.

68      Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio observa que, no processo principal, o direito de G. Starjakob de pedir a determinação de uma nova data de referência não prescreveu.

69      Em face do exposto, há que responder à sexta questão que o princípio da efetividade deve ser interpretado no sentido de que, num caso como o que está em causa no processo principal, não se opõe a que um prazo nacional de prescrição de direitos fundados no direito da União comece a correr antes da data de prolação de um acórdão do Tribunal de Justiça que clarificou a situação jurídica na matéria.

 Quanto à sétima questão

70      Com a sétima questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o princípio da equivalência deve ser interpretado no sentido de que a suspensão da prescrição prevista por uma nova regulamentação nacional para as ações destinadas à contagem de tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade deve ser alargada às ações destinadas a obter o pagamento da diferença entre a remuneração que teria sido auferida na inexistência de discriminação em razão da idade e a que foi efetivamente auferida em conformidade com uma anterior regulamentação que prevê essa discriminação.

71      Importa recordar, além da jurisprudência referida no n.° 61 do presente acórdão, que o princípio da equivalência exige que a totalidade das regras aplicáveis às ações ou aos recursos se aplique indiferentemente às ações ou aos recursos fundados na violação do direito da União e às ações ou recursos semelhantes baseados na violação do direito interno (acórdãos Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.° 33, e Barth, C‑542/08, EU:C:2010:193, n.° 19).

72      Como resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça, uma ação para pagamento de créditos salariais, como a do processo principal, está sujeita à prescrição trienal que resulta das disposições conjugadas do § 1486, n.° 5, do ABGB e do § 29, n.° 1, da GlBG. Em contrapartida, os trabalhadores que tenham cooperado nos termos previstos no § 53a, n.° 4, da ÖBB‑G beneficiam da suspensão da prescrição prevista no n.° 5 dessa disposição. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, atendendo ao princípio da equivalência, a suspensão da prescrição prevista por esta última disposição deveria ser igualmente aplicável às ações e aos recursos destinados ao pagamento de créditos salariais fundados na discriminação em razão da idade que decorre do anterior regime.

73      Todavia, há que concluir que uma disposição como a do § 53a, n.° 5, da ÖBB‑G é uma disposição processual que rege as ações e os recursos baseados na violação, não do direito nacional, mas do direito da União, na medida em que foi adotada a fim de ter em conta os ensinamentos que decorrem do acórdão Hütter (EU:C:2009:381), abrangendo a referida suspensão, aliás, o período entre o dia da prolação desse acórdão e o da publicação da Lei de 2011.

74      Daqui decorre que, visto o respeito do princípio da equivalência pressupor a aplicação indiferenciada de uma regra nacional às ações fundadas numa violação do direito da União e às ações fundadas na violação do direito nacional, este princípio não é pertinente numa situação como a que está em causa no processo principal, que diz respeito a dois tipos de ações fundadas, uma e outra, numa violação do direito da União.

75      Em face das considerações precedentes, o período de equivalência não é pertinente numa situação como a que está em causa no processo principal.

 Quanto às despesas

76      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      O direito da União, em especial os artigos 2.° e 6.°, n.° 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, para pôr termo a uma discriminação em razão da idade, toma em consideração tempo de serviço anterior aos 18 anos de idade, mas que, simultaneamente, inclui uma regra, aplicável apenas aos trabalhadores vítimas dessa discriminação, que prolonga em um ano o período exigido para a progressão em cada um dos três primeiros escalões de remuneração e que, ao fazê‑lo, mantém definitivamente uma diferença de tratamento em razão da idade.

2)      O direito da União, em especial o artigo 16.° da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que uma regulamentação nacional que visa pôr termo a uma discriminação em razão da idade não deve necessariamente permitir que um trabalhador cujo tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade não foi tomado em consideração no cálculo da sua progressão obtenha uma compensação financeira correspondente ao pagamento da diferença entre a remuneração que teria auferido na inexistência de tal discriminação e a que efetivamente auferiu. Todavia, num caso como o que está em causa no processo principal e enquanto não for adotado um sistema que proceda à supressão da discriminação em razão da idade de uma maneira conforme ao que prevê a Diretiva 2000/78, o restabelecimento da igualdade de tratamento implica a concessão aos trabalhadores cuja experiência foi, ainda que em parte, adquirida antes dos 18 anos de idade de vantagens idênticas às que puderam ter os trabalhadores que obtiveram, após atingir essa idade, uma experiência da mesma natureza e de duração comparável, no que diz respeito à contagem de tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, mas igualmente à progressão na escala das remunerações.

3)      O direito da União, em especial o artigo 16.° da Diretiva 2000/78, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o legislador nacional preveja, para efeitos da contagem de tempo de serviço completado antes dos 18 anos de idade, uma obrigação de cooperação por força da qual o trabalhador deve fornecer ao empregador as provas relativas ao referido período. No entanto, não constitui um abuso de direito o facto de um trabalhador recusar cooperar para efeitos da aplicação de uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que contém uma discriminação em razão da idade, contrária à Diretiva 2000/78, bem como a sua ação que visa obter um pagamento destinado a restabelecer a igualdade de tratamento relativamente aos trabalhadores que obtiveram, após ter alcançado essa idade, uma experiência da mesma natureza e de duração comparável à sua.

4)      O princípio da efetividade deve ser interpretado no sentido de que, num caso como o que está em causa no processo principal, não se opõe a que um prazo nacional de prescrição de direitos fundados no direito da União comece a correr antes da data de prolação de um acórdão do Tribunal de Justiça que clarificou a situação jurídica na matéria.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.