Language of document : ECLI:EU:C:2015:92

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NILS WAHL

apresentadas em 12 de fevereiro de 2015 (1)

Processo C‑583/13 P

Deutsche Bahn AG

DB Mobility Logistics AG

DB Energie GmbH

DB Netz AG

DB Schenker Rail GmbH

DB Schenker Rail Deutschland AG

Deutsche Umschlaggesellschaft Schiene‑Straße mbH (DUSS)

contra

Comissão Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral ― Artigos 20.°, n.° 4, e 28.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho ― Poderes da Comissão em matéria de inspeção ― Direito fundamental à inviolabilidade do domicílio ― Direito fundamental a um recurso efetivo ― Jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux ― Ónus da prova ― Consequências de buscas ilegais efetuadas pela Comissão»





1.        A proteção jurídica contra as buscas ilegais a domicílios efetuadas por autoridades responsáveis pela aplicação da lei é normalmente considerada como um dos princípios que distinguem as sociedades baseadas no Estado de direito de outras formas de governo, mais repressivas.

2.        No entanto, é universalmente reconhecido que, mesmo nas comunidades regidas pelo Estado de direito, como é o caso da União Europeia, as autoridades públicas devem dispor de poderes de inquérito que lhes permitam investigar infrações objeto de suspeitas.

3.        Por conseguinte, é necessário que a legislação encontre um equilíbrio entre, por um lado, o direito à privacidade e, por outro, a aplicação eficaz da lei.

4.        O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a questão de saber se, no âmbito da legislação da União em matéria de concorrência, foi encontrado um equilíbrio adequado entre a necessidade de instrumentos de investigação eficazes e o direito à proteção contra buscas injustificadas. Mais precisamente, o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se sobre duas questões: i) é o atual sistema de inspeções da UE consagrado no Regulamento (CE) n.° 1/2003 (2) compatível com os artigos 7.° e 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»)? e ii) nesse sistema, quais são as consequências de uma busca ilegal ordenada pela Comissão?

I ―    Quadro jurídico

5.        O artigo 20.° do Regulamento n.° 1/2003 («Poderes da Comissão em matéria de inspeção») dispõe que:

«1.       No cumprimento das funções que lhe são atribuídas pelo presente regulamento, a Comissão pode efetuar todas as inspeções necessárias junto das empresas e associações de empresas.

2.       Os funcionários e outros acompanhantes mandatados pela Comissão para efetuar uma inspeção podem:

a)       aceder a todas as instalações, terrenos e meios de transporte das empresas e associações de empresas;

b)       inspecionar os livros e outros registos relativos à empresa, independentemente do seu suporte;

c)       tirar ou obter sob qualquer forma cópias ou extratos dos documentos controlados;

[...]

4.       As empresas e as associações de empresas são obrigadas a sujeitar‑se às inspeções que a Comissão tenha ordenado mediante decisão. A decisão deve indicar o objeto e a finalidade da inspeção, fixar a data em que esta tem início e indicar as sanções previstas nos artigos 23.° e 24.°, bem como a possibilidade de impugnação da decisão perante o Tribunal de Justiça.

[...]

6.       Quando os funcionários e outros acompanhantes mandatados pela Comissão verificarem que uma empresa se opõe a uma inspeção ordenada nos termos do presente artigo, o Estado‑Membro em causa deve prestar‑lhes a assistência necessária, solicitando, se for caso disso, a intervenção da força pública ou de uma autoridade equivalente, para lhes dar a possibilidade de executar a sua missão de inspeção.

7.       Se, para a assistência prevista no n.° 6, for necessária a autorização de uma autoridade judicial de acordo com as regras nacionais, essa autorização deve ser solicitada. Essa autorização pode igualmente ser solicitada como medida cautelar.

8.       Sempre que for solicitada a autorização prevista no n.° 7, a autoridade judicial nacional controla a autenticidade da decisão da Comissão, bem como o caráter não arbitrário e não excessivo das medidas coercivas relativamente ao objeto da inspeção. Ao proceder ao controlo da proporcionalidade das medidas coercivas, a autoridade judicial nacional pode pedir à Comissão, diretamente ou através da autoridade do Estado‑Membro responsável em matéria de concorrência, informações circunstanciadas, em especial quanto aos motivos que tem a Comissão para suspeitar de violação dos artigos [101.° e 102.° TFUE], bem como quanto à gravidade da infração suspeita e à natureza do envolvimento da empresa em causa. No entanto, a autoridade judicial nacional não pode pôr em causa a necessidade da inspeção, nem exigir que lhe sejam apresentadas informações que constem do processo da Comissão. O controlo da legalidade da decisão da Comissão encontra‑se reservado exclusivamente ao Tribunal de Justiça.»

6.        Além disso, o artigo 28.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1/2003 estabelece o seguinte:

«Sem prejuízo da aplicação dos artigos 12.° e 15.°, as informações obtidas nos termos dos artigos 17.° a 22.° apenas podem ser utilizadas para os fins para que foram obtidas.»

II ― Antecedentes do litígio

7.        Em 2011, a Comissão adotou três decisões em que ordenou uma inspeção às instalações da Deutsche Bahn AG e de várias das suas filiais (DB Mobility Logistics, DB Netz AG, DB Energie GmbH, DB Schenker Rail GmbH, DB Schenker Rail Deutschland AG e Deutsche Umschlagegesellschaft Schiene‑Straße mbH) (a seguir, conjuntamente, «Deutsche Bahn» ou «recorrentes»). A Deutsche Bahn é uma empresa que exerce a sua atividade no setor nacional e internacional do transporte de mercadorias e passageiros, da logística e da prestação de serviços acessórios no transporte ferroviário.

8.        A primeira decisão de inspeção (3) foi notificada à Deutsche Bahn no dia 29 de março de 2011, quando os inspetores da Comissão solicitaram o acesso às instalações da Deutsche Bahn em Berlim, em Frankfurt am Main e em Mainz (Alemanha). A decisão dizia respeito ao tratamento preferencial potencialmente injustificado concedido pela DB Energie a outras filiais da Deutsche Bahn sob a forma de um sistema de descontos para o fornecimento de energia elétrica de tração (a seguir «primeira infração objeto de suspeita».

9.        Durante as inspeções, os inspetores da Comissão encontraram nas instalações da Deutsche Bahn documentos (a seguir «documentos DUSS») que a Comissão considerou poderem indiciar a existência de outros comportamentos anticoncorrenciais e, consequentemente, em 31 de março de 2011, enquanto ainda decorria a primeira inspeção, a Comissão notificou à Deutsche Bahn uma nova decisão de inspeção (a seguir «segunda decisão de inspeção»). A segunda decisão de inspeção visava a suspeita de infrações às regras da concorrência cometidas pela Deutsche Umschlagegesellschaft Schiene‑Straße (a seguir «DUSS») através do recurso estratégico a infraestruturas geridas pela Deutsche Bahn (a seguir «segunda infração objeto de suspeita») (4).

10.      A primeira e a segunda inspeções terminaram, respetivamente, em 31 de março e 1 de abril de 2011.

11.      Posteriormente, foi adotada uma decisão de inspeção adicional (a seguir «terceira decisão de inspeção») (5), que foi notificada à Deutsche Bahn em 26 de julho de 2011. A terceira inspeção visava também suspeitas de infrações às regras da concorrência cometidas pela DUSS. A terceira inspeção teve lugar entre 26 e 29 de julho de 2011.

III ― Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

12.      Na sequência da realização das inspeções, a Deutsche Bahn interpôs perante o Tribunal Geral recursos de anulação das três decisões de inspeção (a seguir «decisões controvertidas»), com fundamento na violação do direito da Deutsche Bahn ao respeito pela vida privada, do seu direito a um proteção jurisdicional efetiva, dos seus direitos de defesa e do princípio da proporcionalidade.

13.      Por acórdão de 6 de setembro de 2013, proferido nos processos apensos T‑289/11, T‑290/11 e T‑521/11, Deutsche Bahn e o./Comissão (a seguir «acórdão recorrido») (6), o Tribunal Geral negou integralmente provimento a esses recursos e condenou a Deutsche Bahn no pagamento das despesas.

IV ― Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

14.      No seu recurso interposto no Tribunal de Justiça em 18 de novembro de 2013, as recorrentes pedem que o Tribunal de Justiça se digne:

¾        anular o acórdão recorrido;

¾        anular as decisões controvertidas;

¾        condenar a Comissão nas despesas.

15.      A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar as recorrentes nas despesas.

16.      O Governo espanhol e o Órgão de Fiscalização da EFTA (a seguir «OFE») apresentaram observações escritas em apoio da Comissão, tendo igualmente apresentado observações orais na audiência que teve lugar em 4 de setembro de 2014, tal como as recorrentes e a Comissão.

V ―    Apreciação dos fundamentos do presente recurso

17.      As recorrentes invocaram quatro fundamentos para o recurso, que apreciarei sucessivamente. Antes de o fazer, abordarei sucintamente alguns aspetos fundamentais do regime estabelecido no Regulamento n.° 1/2003 relativamente às inspeções ordenadas pela Comissão.

A ―    Introdução

18.      A legalidade de uma inspeção realizada pela Comissão nas instalações de uma empresa depende do conteúdo da decisão da Comissão que ordena a essa empresa que se submeta a uma inspeção. De acordo com o artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003, a decisão deve «indicar o objeto e a finalidade da inspeção». Em consequência, na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça entendeu que, em princípio, a Comissão está obrigada a indicar tão precisamente quanto possível os elementos de prova que pretende recolher e a matéria a investigar, embora não lhe seja exigido que proceda à delimitação precisa do mercado relevante, ou à qualificação jurídica exata das alegadas infrações, ou à indicação do período durante o qual essas infrações terão sido cometidas (7). Este dever de fundamentação específico tem sido reiteradamente descrito pelo Tribunal de Justiça como «uma exigência fundamental tendo em vista não só demonstrar o caráter justificado da intervenção preconizada nas empresas visadas mas também colocar as empresas em situação de conhecer o alcance do seu dever de cooperação, preservando ao mesmo tempo o[s] seu[s] direito[s] de defesa» (8).

19.      Ao contrário do que acontece nas inspeções de outras instalações [não profissionais], (artigo 21.° do Regulamento n.° 1/2003), no caso da inspeção de uma empresa nos termos do artigo 20.° deste regulamento, não se exige à Comissão que tenha uma suspeita específica da prática de irregularidades por parte dessa empresa, sendo suficiente a suspeita de que a empresa possa dispor de informações relevantes.

20.      Não obstante estar sujeita aos requisitos acima descritos, a decisão da Comissão não é, em si mesma, objeto de fiscalização jurisdicional ex ante. A decisão de inspeção só está sujeita a uma fiscalização jurisdicional incidental nos casos em que estão previstas medidas coercivas e a legislação nacional aplicável exige, para esse efeito, uma autorização judicial prévia. Porém, tendo em conta as limitações impostas pelo artigo 20.°, n.° 8, do Regulamento n.° 1/2003 a esse controlo judicial, é improvável que um órgão jurisdicional nacional não autorize a imposição de medidas coercivas num caso concreto. Ainda que assim acontecesse, a recusa da empresa em questão em se submeter à ordem de inspeção poderia sempre dar lugar à aplicação de sanções nos termos dos artigos 23.° e 24.° do Regulamento n.° 1/2003 (9).

21.      Segundo o artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003, salvo nas exceções previstas no regulamento, quaisquer documentos ou informações obtidos durante uma inspeção apenas poderão ser utilizados para os fins para que foram obtidos. Conforme o Tribunal de Justiça declarou, este requisito visa a proteção dos direitos de defesa das empresas em causa. Tais direitos ficariam gravemente comprometidos se a Comissão pudesse invocar contra as empresas provas obtidas no decurso de diligências de instrução, mas que fossem estranhas ao objeto ou à finalidade dessa instrução concreta (10).

22.      No entanto, tal como sustentado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Dow Benelux, aquela disposição não veda à Comissão a abertura de um procedimento de inquérito para verificar a exatidão de informações de que tenha tomado conhecimento casualmente no decurso de outras diligências de instrução, ou de as completar, caso essas informações sugiram a possível existência de outra infração às normas de concorrência da União. Tal proibição constituiria um obstáculo injustificado aos poderes de inquérito da Comissão, já que a empresa suspeita da prática da infração é livre de exercer os seus direitos de defesa de forma plena no âmbito da nova investigação (11). Por conseguinte, não existe qualquer proibição de utilização das informações obtidas fortuitamente, desde que uma nova investigação seja aberta e conduzida em conformidade com o Regulamento n.° 1/2003.

23.      Por último, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que as empresas objeto de uma inspeção ordenada pela Comissão têm o direito de impugnar a decisão que a ordenou, perante o juiz da União. Se a decisão for anulada, não será lícito à Comissão utilizar, para os efeitos de um procedimento por suspeita de infração às regras da União em matéria de concorrência, quaisquer documentos ou outros meios de prova obtidos durante essa investigação, sob pena de o juiz da União anular a decisão relativa à infração na medida em que se baseie em tais meios de prova (12).

24.      É neste contexto que apreciarei os quatro fundamentos de recurso.

B ―    Primeiro fundamento de recurso

25.      No primeiro fundamento, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral interpretou e aplicou incorretamente o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, consagrado no artigo 7.° da Carta e no artigo 8.° da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH»).

26.      Nos n.os 42 a 102 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral afirmou, fazendo referência à jurisprudência constante do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH» ou «Tribunal de Estrasburgo»), que um grau aceitável de proteção contra as ingerências que atentam contra o artigo 8.° da CEDH implica a existência de um quadro legal e de limites estritos. O Tribunal Geral explicou ainda que existem cinco tipos de garantias: i) a fundamentação das decisões de inspeção; ii) os limites impostos à Comissão durante a realização das inspeções; iii) a impossibilidade de a Comissão executar uma inspeção pela força; iv) a intervenção das autoridades nacionais; e v) a existência de vias de recurso a posteriori. Após a análise dos factos e das normas estabelecidas pelo Regulamento n.° 1/2003, o Tribunal Geral concluiu que os cinco tipos de garantias estavam assegurados no caso em apreço. Por esse motivo, o Tribunal Geral rejeitou o primeiro fundamento invocado em primeira instância, relativo a uma violação do direito à inviolabilidade do domicílio devido à falta de autorização judicial prévia para as inspeções da Comissão.

27.      No essencial, as recorrentes defendem que o Tribunal Geral fez uma interpretação errada da jurisprudência do TEDH relativa ao artigo 8.° da CEDH, segundo a qual, numa situação como a das decisões controvertidas, a Comissão está obrigada a obter uma autorização prévia do Tribunal Geral ou de um órgão jurisdicional nacional. Por um lado, no entender das recorrentes, o Tribunal Geral interpretou erradamente as decisões do TEDH nos acórdãos Colas Est (13), Liotard Frères (14), e Canal Plus (15), na medida em que considerou que a inexistência de autorização judicial prévia era apenas um dos elementos considerados pelo TEDH ao concluir que o artigo 8.° da CEDH tinha sido violado. As recorrentes alegam que o Tribunal Geral deveria antes ter considerado que a necessidade de autorização judicial prévia constitui um elemento essencial das conclusões do TEDH. Além disso, na sua perspetiva, o Tribunal Geral interpretou mal os acórdãos Harju (16) e Heino (17), ao afirmar que a inexistência de um mandado judicial prévio poderia ser compensada por uma fiscalização jurisdicional ex post exaustiva. Na verdade, nesses dois processos, os atos praticados pelas autoridades públicas eram motivados por razões de urgência. No caso em apreço, uma vez que a Comissão não pediu autorização judicial prévia, não obstante não existir urgência, o Tribunal Geral deveria ter concluído que a Comissão violou o princípio da proporcionalidade.

28.      A Comissão, apoiada pelo OFE e pelo Governo espanhol, contrapõe que o Tribunal Geral avaliou corretamente a compatibilidade das decisões controvertidas com o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e que não interpretou incorretamente a jurisprudência do TEDH nessa matéria.

29.      O primeiro fundamento de recurso suscita, essencialmente, a questão de saber se o atual regime de inspeções da União, estabelecido no artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003, é compatível com o respeito pelo direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, consagrado no artigo 7.° da Carta e no artigo 8.° da CEDH. Pede‑se ao Tribunal de Justiça, em especial, que determine se a Comissão está obrigada a solicitar uma autorização judicial prévia como regra geral ou, pelo menos, quando não tiver motivos para atuar com urgência.

30.      Tal como a Comissão, o Governo espanhol e o OFE, entendo que o Tribunal Geral não interpretou nem aplicou incorretamente a jurisprudência resultante dos acórdãos do TEDH indicados pelas recorrentes. Na verdade, de acordo com a jurisprudência atual do Tribunal de Estrasburgo, não é possível defender (como pretendem as recorrentes) que a proteção dos direitos consagrados no artigo 8.° da CEDH exige que a autoridade da concorrência obtenha sempre uma autorização judicial antes de realizar inspeções nas instalações das empresas. Tão‑pouco se pode afirmar que, por razões de proporcionalidade, essa autorização apenas pode ser dispensada quando existam fundamentos para uma intervenção urgente por parte das autoridades públicas.

31.      Cumpre recordar, desde logo, que, ao estender as garantias consagradas no artigo 8.°, n.° 1, da CEDH às pessoas coletivas, como as empresas, o Tribunal de Estrasburgo tem sido cauteloso, afirmando que estas não são totalmente equiparáveis às pessoas singulares (18) e não tratando as instalações das empresas como os domicílios privados. Com efeito, desde o acórdão Niemietz (19), o TEDH tem declarado repetidamente que, quando estão em causa instalações profissionais e de empresas, as autoridades públicas podem interferir de forma mais ampla no exercício dos direitos protegidos pelo artigo 8.°

32.      Em segundo lugar, e mais importante, ao contrário das recorrentes, não vislumbro de que modo os mencionados acórdãos Colas Est, Liotard Frères e Canal Plus do TEDH, podem ser interpretados no sentido de que exigem, como regra geral, que a autoridade da concorrência obtenha uma autorização judicial prévia, sob pena de violação do artigo 8.° da CEDH. Tão‑pouco estou convicto de que a jurisprudência resultante dos acórdãos Harju e Heino seja irrelevante para o presente processo.

33.      Desde logo, devo referir que, enquanto o acórdão Colas Est diz especificamente respeito a uma violação do artigo 8.° da CEDH, nos acórdãos Liotard Frères e Canal Plus, o Tribunal de Estrasburgo debruçou‑se exclusivamente sobre uma alegada violação do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH. Por conseguinte, as recorrentes não podem criticar, com razoabilidade, o Tribunal Geral por referir apenas o acórdão Colas Est na apreciação do fundamento relativo à violação do artigo 7.° da Carta.

34.      De qualquer modo, creio que o Tribunal Geral fez uma análise pormenorizada de todos esses acórdãos e concluiu, acertadamente, que a falta de mandado prévio constituía apenas um dos elementos considerados pelo TEDH nesses processos, quando decidiu sobre as violações da CEDH alegadas pelas partes (20). Aliás, foi sempre com base numa apreciação global de todas as circunstâncias factuais e jurídicas pertinentes do caso concreto que o Tribunal de Estrasburgo proferiu a sua decisão. Mais concretamente, o TEDH analisou, entre outros elementos, o alcance dos poderes atribuídos à autoridade pública competente, as circunstâncias em que teve lugar a ingerência no direito fundamental, e a questão de saber se o regime jurídico em questão previa outras garantias, especialmente a possibilidade de uma fiscalização jurisdicional ex post eficaz.

35.      Dois acórdãos recentes do TEDH, relativos, precisamente, a alegadas violações do artigo 8.° da CEDH, parecem confirmar esta interpretação da jurisprudência acima referida.

36.      No acórdão Bernh Larsen, o TEDH foi chamado a pronunciar‑se sobre a questão de saber se o artigo 8.° da CEDH obstava a que as autoridades tributárias norueguesas pedissem a três empresas, no âmbito de uma auditoria fiscal, a disponibilização de uma cópia de segurança do servidor de um computador para efeitos de inspeção às instalações dessa autoridade. O Tribunal de Estrasburgo referiu que, embora não fosse comparável a uma apreensão em sede de processo‑crime nem exigível sob pena de sanções penais, tal pedido era juridicamente vinculativo para as três empresas, às quais poderiam ser aplicadas sanções administrativas, no caso de incumprimento. Consequentemente, concluiu que o referido pedido constituía uma ingerência nos direitos dessas empresas ao respeito do domicílio e da correspondência. Porém, não obstante o mesmo pedido não ter sido objeto de autorização prévia de qualquer órgão jurisdicional, o TEDH considerou que essa ingerência era justificada. O Tribunal de Estrasburgo teve em conta, entre outros elementos, o facto de a legislação nacional impor restrições importantes aos poderes das autoridades em questão e de proporcionar garantias efetivas e adequadas contra os abusos (21).

37.      Além disso, no seu recente acórdão Delta Pekárny, o TEDH apreciou a questão de saber se uma inspeção efetuada, em 2003, pela autoridade da concorrência da República Checa nas instalações de uma empresa constituía uma violação do artigo 8.° da CEDH. O Tribunal de Estrasburgo considerou que, relativamente à empresa em causa, a inspeção controvertida tinha infringido o direito à inviolabilidade do domicílio. Porém, a razão invocada foi que a decisão que autorizou a inspeção não estava sujeita a fiscalização jurisdicional ex ante ou ex post. Na verdade, os recorrentes só podiam contestar a legalidade da inspeção no âmbito de um processo em que fossem examinadas as conclusões materiais da autoridade da concorrência. Desse modo, tinham ficado excluídas da fiscalização jurisdicional questões como a necessidade, a duração e o âmbito da inspeção, bem como a sua proporcionalidade (22).

38.      É importante salientar que, no acórdão Delta Pekárny, o TEDH afirmou expressamente que a falta de um mandado judicial prévio pode ser compensada por uma fiscalização jurisdicional ex post eficaz de todas as questões de direito e de facto. Nesse contexto, o TEDH fez referência expressa, entre outros, ao seu acórdão Harju, cuja relevância para o presente processo foi contestada pelas recorrentes, conforme acima mencionado (23). No mesmo sentido, no seu acórdão Bernh Larsen, o TEDH considerou que não tinha havido violação do artigo 8.° da CEDH, sem mesmo analisar se os atos praticados pelas autoridades públicas se justificavam por razões de urgência.

39.      Nestas circunstâncias, tenho de concluir que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito na interpretação da jurisprudência do TEDH referida pelas recorrentes. O Tribunal Geral também não cometeu qualquer erro de direito na aplicação dessa jurisprudência ao caso em apreço.

40.      Com efeito, no âmbito do sistema da União, a fiscalização jurisdicional ex post que pode ser realizada pelo juiz da União assegura um nível adequado de proteção do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. Na minha opinião, não existem dúvidas de que a competência do juiz da União abrange todas as questões de facto e de direito que possam ser relevantes para a fiscalização da legalidade das decisões de inspeção (24), em conformidade com a jurisprudência resultante dos acórdãos Chalkor e KME Germany (25). Acresce que, conforme referido no n.° 23 supra, a anulação de uma decisão de inspeção impede a Comissão de fazer uso dos documentos obtidos nessa inspeção.

41.      Por conseguinte, considero que as recorrentes não demonstraram a existência de qualquer violação do artigo 8.° da CEDH. Além disso, as recorrentes não sustentam que o artigo 7.° da Carta pode impor um nível de proteção mais elevado do que aquele que é proporcionado pela CEDH (26). De qualquer modo, não vejo nenhuma disposição de direito primário ou de direito derivado da União que aponte para essa conclusão. Na verdade, a letra do artigo 7.° da Carta é muito semelhante à do artigo 8.°, n.° 1, da CEDH. Além disso, o Regulamento n.° 1/2003 exige expressamente uma autorização judicial prévia apenas para as inspeções efetuadas nos termos do seu artigo 21.°, o que exclui de forma implícita a necessidade dessa autorização para as inspeções realizadas com base no seu artigo 20.°, n.° 4.

42.      Por estes motivos, considero que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito ao rejeitar os argumentos em que as recorrentes alegam uma violação do direito à inviolabilidade das instalações das empresas. Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça julgue improcedente o primeiro fundamento de recurso.

C ―    Segundo fundamento de recurso

43.      No segundo fundamento de recurso, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral interpretou e aplicou incorretamente o direito fundamental a uma proteção jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 47.° da Carta.

44.      Tanto a Comissão como os intervenientes contestam esse entendimento.

45.      O segundo fundamento de recurso constitui, em larga medida, uma repetição dos argumentos apresentados no primeiro fundamento de recurso. As recorrentes limitam‑se a alegar que a falta de autorização judicial prévia de uma inspeção priva as empresas de uma proteção judicial adequada, em violação dos direitos consagrados no artigo 47.° da Carta e no artigo 6.°, n.° 1, da CEDH. As recorrentes invocam, uma vez mais, os acórdãos do TEDH, já referidos, Colas Est, Canal Plus e Liotard Frères (27).

46.      Assim, basta repetir o que já foi explicado: assiste às empresas que foram objeto de uma inspeção o direito de impugnar perante o juiz da União a legalidade da decisão de inspeção da Comissão. Essas ações judiciais podem ser intentadas imediatamente após a notificação da decisão da Comissão à empresa (normalmente, no início da inspeção), sem que seja necessário esperar pela decisão final da Comissão relativa à suspeita de infração das regras da concorrência da União.

47.      Além disso, não existem dúvidas de que o juiz da União é competente para apreciar todos os aspetos jurídicos e factuais das decisões de inspeção, nomeadamente a questão de saber se a Comissão utilizou corretamente os seus poderes discricionários, e para as anular, no todo ou em parte, em todas os pontos (28).

48.      Este aspeto constitui uma diferença significativa entre o regime da União em apreço no presente processo e o regime nacional analisado pelo TEDH nos acórdãos Canal Plus e Liotard Frères. Nesses processos, em que estava em causa uma violação do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, a decisão do Tribunal de Estrasburgo concentrou‑se em dois pontos fundamentais: i) as empresas só podiam impugnar a decisão de inspeção no âmbito de um recurso sobre uma questão de direito («cassação»), que não lhes permitia contestar a matéria de facto em que se baseava a decisão (29); e ii) a decisão de inspeção só podia ser impugnada conjuntamente com a decisão final da autoridade da concorrência, o que tornava incerta e, em qualquer caso, atrasaria vários anos a impugnação da decisão de inspeção (30).

49.      Estas questões foram explicadas com clareza pelo Tribunal Geral nos n.os 109 a 112 do acórdão recorrido.

50.      Mais uma vez, não vislumbro (nem as recorrentes fizeram qualquer tentativa de explicar ao Tribunal de Justiça) o motivo pelo qual, nesta matéria, o artigo 47.° da Carta imporia à UE normas mais rígidas do que as que decorrem para o Tribunal de Estrasburgo do artigo 6.°, n.° 1, da CEDH.

51.      Não creio que a mera circunstância de a fiscalização judicial ocorrer ex post constitua uma violação do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, pelos motivos já explicados.

52.      Por conseguinte, concluo que as decisões de inspeção podem ser sujeitas a uma forma de fiscalização judicial que preencha os requisitos de efetividade impostos pelo artigo 47.° da Carta. Consequentemente, o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito na sua interpretação e aplicação daquele princípio. Nesse sentido, também o segundo fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

D ―    Terceiro fundamento de recurso

53.      No terceiro fundamento de recurso, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral errou ao considerar que os documentos DUSS, descobertos durante a primeira inspeção, foram encontrados «por acaso», na aceção do acórdão Dow Benelux (31). Na realidade, a Comissão reconheceu que os seus funcionários que realizaram a inspeção tinham sido previamente informados da existência de uma denúncia relativa a outra violação das regras da concorrência por parte das recorrentes. As recorrentes sustentam que essa circunstância constituía uma irregularidade que tinha afetado o exercício dos seus direitos de defesa.

54.      Em primeiro lugar, a Comissão defende a inadmissibilidade deste fundamento de recurso, na medida em que as recorrentes contestam um facto dado como provado pelo Tribunal Geral. De qualquer modo, a Comissão considera que os argumentos apresentados pelas recorrentes não procedem.

1.      Admissibilidade

55.      Na minha perspetiva, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão deve ser julgada improcedente. No essencial, as recorrentes não criticam o Tribunal Geral pelo facto de os documentos DUSS terem sido encontrados por acaso, mas sim pelo facto de não poderem ser considerados como tal na aceção do acórdão Dow Benelux. No presente caso, o recurso tem como objeto a qualificação jurídica dos factos por parte do Tribunal Geral e as conclusões jurídicas deles extraídas.

2.      Mérito

56.      Mais uma vez, começo por recordar que, nos termos do artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003 e salvo as exceções nele previstas, quaisquer documentos ou informações obtidos durante uma inspeção apenas podem ser utilizados para os fins para que foram obtidos. No entanto, resulta do acórdão Dow Benelux que, em derrogação do princípio consagrado no artigo 28.°, os documentos e as informações encontrados que não estiverem abrangidos pelo objeto da inspeção podem servir para abrir uma nova investigação.

57.      No seu acórdão, o Tribunal Geral concluiu, em face dos argumentos e provas apresentados pelas partes, que os documentos DUSS não foram alvo de uma busca dirigida a eles, uma vez que foram encontrados casualmente, em locais das instalações da empresa que a Comissão estava a inspecionar com a finalidade de obter informações sobre o objeto da primeira inspeção. Com base neste fundamento, e principalmente por referência à jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux, o Tribunal Geral rejeitou os argumentos das recorrentes sobre uma alegada irregularidade durante a primeira inspeção (32).

58.      A circunstância de os documentos DUSS terem sido encontrados durante a busca de outros tipos de documentos constitui matéria de facto que, em princípio, não pode ser apreciada em sede de recurso pelo Tribunal de Justiça. Todavia, a questão fundamental consiste em saber se isso é suficiente para se considerar que os direitos de defesa e o direito à vida privada das recorrentes foram devidamente respeitados durante a primeira inspeção. Por outras palavras, o Tribunal Geral aplicou corretamente o artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003 e a jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux?

59.      Não creio que assim seja.

60.      Na minha opinião, para se compreender por que motivo o Tribunal Geral aplicou incorretamente a jurisprudência do Tribunal de Justiça, é necessário analisar a razão de ser das regras consagradas no Regulamento n.° 1/2003, de acordo com a interpretação do Tribunal de Justiça.

61.      É indiscutível que o Regulamento n.° 1/2003 concede à Comissão amplos poderes de inquérito, que representam uma ingerência séria em determinados direitos fundamentais das empresas e dos indivíduos. Conforme já foi referido, esses poderes são exercidos com pouco ou nenhuma fiscalização jurisdicional ex ante. Além disso, há que sublinhar que as verificações e os controlos internos que normalmente têm lugar quando a Comissão pretende adotar decisões e outros atos juridicamente vinculativos (33) não se aplicam plenamente às decisões previstas nos artigos 20.° e 21.° do Regulamento n.° 1/2003. Na verdade, o poder de adotar decisões nos termos dessas disposições foi confiado (34) ao comissário responsável pela política de concorrência, que, por sua vez, subdelegou esse poder no diretor‑geral da Direção‑Geral da Concorrência da Comissão (a seguir «DG Concorrência») (35). Daqui decorre que as decisões de inspeção são, na prática, adotadas exclusivamente pelos funcionários da DG Concorrência, tendo os restantes serviços da Comissão pouca ou nenhuma intervenção no processo decisório.

62.      Contudo, é geralmente aceite que a Comissão deve possuir tais poderes alargados e uma adequada discricionariedade no seu exercício, uma vez que as violações das regras da concorrência constituem infrações graves às leis económicas nas quais assenta a União Europeia. Do mesmo modo, é razoável que a adoção de decisões de inspeção seja delegada no comissário responsável pela política de concorrência, a fim possibilitar a execução célere das inspeções, minimizando o risco de fugas de informação (36).

63.      Ao mesmo tempo, porém, precisamente devido ao grande alcance desses poderes, à amplitude da margem de discricionariedade e à escassez dos controlos prévios (jurisdicionais ou administrativos) do processo de decisão, compete ao juiz da União assegurar o pleno respeito pelos direitos das empresas e dos cidadãos objeto de uma investigação (37). Por outras palavras, durante as investigações no domínio da concorrência, é lícita a ingerência (por vezes séria) da Comissão nos direitos fundamentais das empresas e dos cidadãos. Não pode, porém, escapar ao domínio da lei, sob pena de comprometer a inviolabilidade da essência desses direitos fundamentais, protegida pelo direito da União (38).

64.      O artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003 deve ser interpretado neste contexto. Um dos objetivos desta disposição é impedir que a Comissão faça «investigações prospetivas», usando como pretexto uma investigação em curso sobre uma possível violação das regras da concorrência. A Comissão não pode procurar outros elementos de prova relativos a potenciais violações das regras da concorrência da União para além das violações que constituem o objeto da investigação.

65.      Por outro lado, a ratio decidendi da jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux é, no meu entender, que não se pode exigir à Comissão que ignore provas documentais eventualmente encontradas, de forma puramente casual, que pareçam indiciar outra possível violação das regras da concorrência da União. Com efeito, ao não ignorar essas provas, a Comissão não está a violar nem a eludir qualquer norma processual. Por exemplo, essa situação pode ser comparada, mutatis mutandis, à de uma autoridade competente para a aplicação da lei que, ao efetuar uma inspeção in loco, no âmbito de uma suspeita de evasão fiscal, encontra informações que indiciam um possível caso de branqueamento de capitais. Não existe nenhum motivo válido para essa autoridade ignorar informações genuinamente encontradas por acaso. O mesmo vale para a Comissão no âmbito das investigações realizadas ao abrigo do Regulamento n.° 1/2003.

66.      Nesse sentido, o cerne do caso em apreço é o seguinte: a Comissão eludiu a regra estabelecida no artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003?

67.      No acórdão recorrido, o Tribunal Geral verificou que, imediatamente antes da realização da inspeção, todos os funcionários da Comissão já tinham sido informados especificamente sobre a receção de outra denúncia contra as recorrentes e sobre o seu objeto. Na verdade, a Comissão reconheceu abertamente esse facto, tanto durante o processo em primeira instância como no presente recurso. Porém, o Tribunal Geral não criticou esse comportamento, que aparentemente considerou irrelevante no contexto da já mencionada jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux. O Tribunal Geral limitou‑se a afirmar que «se [devia] considerar que era legítimo informar os agentes do contexto geral do processo», sem indicar os motivos dessa legitimidade (39).

68.      Nas suas observações escritas, a Comissão defende o raciocínio do Tribunal Geral, alegando que era de grande utilidade para os seus funcionários estarem ao corrente do contexto em que a inspeção seria realizada.

69.      Em princípio, concordo com a Comissão que, antes do início de uma inspeção, é fundamental que os seus funcionários sejam informados do contexto pertinente da investigação. Para este efeito, parece‑me razoável e útil facultar a esses funcionários todas as informações suscetíveis de contribuir para a eficácia da busca de provas relativas ao objeto da inspeção. Tal inclui, por exemplo, informações úteis para a compreensão da natureza e do alcance da eventual infração (os produtos em causa, o mercado geográfico afetado, outras empresas envolvidas, o nome das pessoas implicadas em representação da empresa investigada, etc.), bem como informações relacionadas com o aspeto logístico da inspeção (gabinetes a revistar, tipos de documentos relevantes, palavras‑passe ou outro tipo de informações específicas a procurar). A posse destas informações pode não só aumentar a eficácia da busca e, consequentemente, assegurar que cumpra o seu objetivo, mas também limitar a ingerência nos direitos das empresas objeto de inspeção, uma vez que pode tornar a busca mais direcionada e menos morosa.

70.      Dito isto, é‑me extremamente difícil compreender a que se refere a Comissão quando, no processo em apreço, menciona o «contexto» da inspeção. Tão‑pouco compreendo por que motivo a segunda infração objeto de suspeita deve ser considerada, nas palavras do Tribunal Geral, como parte do «contexto geral» da primeira infração objeto de suspeita.

71.      Interrogada na audiência, a Comissão teve dificuldade em explicar ao Tribunal Geral por que motivo as informações sobre a segunda infração objeto de suspeita eram relevantes no contexto das buscas de informações relativas à primeira infração objeto de suspeita. A Comissão sustentou que as duas situações podiam estar relacionadas a dois níveis: primeiro, porque o autor da denúncia era o mesmo em ambas as investigações; segundo, porque, à data, a Comissão não podia excluir a possibilidade de ambos os comportamentos investigados constituírem a expressão de uma estratégia geral adotada pela Deutsche Bahn para conceder aos seus concorrentes acesso discriminatório às infraestruturas das suas filiais.

72.      A debilidade e a imprecisão dos argumentos da Comissão nesta matéria demonstram que, na realidade, as duas situações nada têm em comum, além do facto de dizerem respeito a filiais da Deutsche Bahn (e não à mesma filial). O facto de a mesma empresa se encontrar, em ambas as situações, entre os autores da denúncia não parece ser relevante, já que as linhas de comportamento criticadas são bastante diferentes e têm lugar em mercados distintos.

73.      Relativamente à alegação de que a Comissão não podia excluir a possibilidade de as duas linhas de comportamento serem a expressão de uma estratégia única, nada no processo parece apoiar tal afirmação. Na verdade, a descrição dos factos apresentada pela própria Comissão sugere o contrário. A Comissão admitiu que os seus funcionários tinham sido informados sobre o objeto da segunda denúncia antes de ter sido efetuada a primeira inspeção, mas acrescentou que, nessa ocasião, já lhes tinha sido recordado que a finalidade dessa inspeção era o objeto da primeira denúncia, e não da segunda. Como é óbvio, se a Comissão tivesse suspeitado de que ambas as linhas de comportamento constituíam a expressão de um único plano, esse aviso teria sido não só desnecessário, mas até contraproducente. Na realidade, a infração objeto de suspeita teria revestido uma natureza e uma importância muito mais significativas. Portanto, teria sido lógico que a Comissão procurasse ativamente possíveis ligações entre as duas situações.

74.      Além disso, na audiência, a Comissão explicou que, inicialmente, tinha decidido não investigar a segunda denúncia, uma vez que parecia dizer respeito a um comportamento com impacto muito limitado. No entanto, é difícil conciliar esta afirmação com o argumento apresentado pela Comissão de que, à data, não podia excluir a possibilidade de a Deutsche Bahn estar a pôr em prática uma estratégia mais abrangente, com vista a proporcionar aos seus concorrentes acesso discriminatório às suas infraestruturas.

75.      Em todo o caso, para mim é claro que, se a Comissão tivesse realmente suspeitas sobre a existência de uma estratégia da Deutsche Bahn de tão grande alcance, não deixaria de fazer uma referência nesse sentido na primeira decisão de inspeção. Mesmo depois de os documentos DUSS terem sido descobertos durante a primeira inspeção, nenhuma referência a essa possível estratégia foi feita na segunda ou na terceira decisão de inspeção. Isto parece, por um lado, contrariar frontalmente os argumentos da Comissão e, por outro, levantar ainda mais dúvidas sobre a legalidade das decisões controvertidas.

76.      Por último, na resposta a outra questão formulada na audiência, a Comissão admitiu que a busca de informações relativa à primeira infração objeto de suspeita não tinha necessariamente sido mais eficaz pelo facto de os seus funcionários terem sido informados previamente sobre o objeto da segunda infração objeto de suspeita.

77.      Atendendo à manifesta inexistência de qualquer ligação clara entre as duas infrações objeto de suspeita e ao facto de a Comissão ter reconhecido que as informações prestadas aos seus funcionários sobre a segunda infração objeto de suspeita não foram verdadeiramente úteis para a busca de informações sobre a primeira infração, creio que é inevitável concluir que terá havido outra razão para a prestação de tais informações aos funcionários da Comissão. No meu entender, a única explicação plausível é que as informações sobre a infração da DUSS foram transmitidas aos funcionários da Comissão para que estes mantivessem «os olhos abertos» e procurassem provas relacionadas com a segunda denúncia.

78.      Com efeito, não é garantido que, sem essas informações prévias, os funcionários da Comissão tivessem compreendido o significado dos documentos DUSS. Tanto mais que, nesse caso, a infração objeto de suspeita não constituía uma violação típica e facilmente identificável do artigo 101.° TFUE (como é o caso dos documentos relacionados com cartéis graves), mas correspondia a um comportamento cujos possíveis efeitos anticoncorrenciais só podem ser avaliados com o auxílio de uma análise algo complexa (40).

79.      Essencialmente, este raciocínio tem de conduzir à conclusão de que, deliberadamente ou por negligência, a Comissão eludiu as regras estabelecidas pelo Regulamento n.° 1/2003 em matéria de inspeções, servindo‑se de uma inspeção para procurar documentos respeitantes a uma questão diferente, sem relação com o objeto da inspeção.

80.      Neste contexto, é quase desnecessário salientar que, quando (como acontece no caso em apreço) tenha sido informada sobre outra alegada infração das regras da concorrência, diferente e distinta, praticada por empresas que já são alvo de uma investigação, a Comissão pode investigar ambas as linhas de comportamento em simultâneo. Especificamente, estando preenchidas as condições aplicáveis, nada impede a Comissão de adotar duas decisões de inspeção dirigidas à mesma empresa, cada uma no âmbito de uma investigação diferente, a executar simultaneamente. Porém, se for esta a sua intenção, a Comissão terá de o fazer abertamente, seguindo os procedimentos fixados no Regulamento n.° 1/2003 e assegurando o devido respeito por todas as salvaguardas e garantias previstas a favor das empresas objeto da inspeção.

81.      No caso em apreço, a Comissão tinha inicialmente optado por não adotar em simultâneo duas decisões diferentes e por investigar formalmente apenas uma alegada infração. Não obstante, a Comissão instruiu os seus funcionários, explícita ou implicitamente, para estarem atentos a informações relacionadas com uma segunda infração, diferente.

82.      Este não é seguramente o tipo de comportamento que o Tribunal de Justiça pretendeu autorizar com a jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux. Na minha opinião, não existe qualquer diferença entre uma situação em que a Comissão efetua uma inspeção sem uma decisão válida e uma situação em que a Comissão atua com base numa decisão válida, mas procura informações relativas a outra investigação, não abrangida por essa decisão.

83.      Em conclusão, o facto de a Comissão ter eludido as disposições do artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003 resultou não só na violação dos direitos de defesa das recorrentes, mas também (e mais importante) na violação manifesta do direito à inviolabilidade do domicílio. Por este motivo, o terceiro fundamento de recurso deve ser considerado procedente e o acórdão do Tribunal Geral deve ser anulado na parte em que rejeitou o fundamento, invocado pelas recorrentes em primeira instância, relativo à irregularidade da primeira inspeção.

E ―    Quarto fundamento de recurso

84.      No quarto fundamento de recurso, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao impor às recorrentes o ónus da prova de que os documentos DUSS não tinham sido encontrados «por acaso». As recorrentes sustentam que, ao invés, o Tribunal Geral devia ter imposto à Comissão o ónus de provar o preenchimento das condições estabelecidas na jurisprudência resultante do acórdão Dow Benelux.

85.      A Comissão defende que este fundamento de recurso é inadmissível e improcedente. Quanto à questão da sua admissibilidade, a Comissão sustenta que, no essencial, as recorrentes pretendem que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre a apreciação feita pelo Tribunal Geral relativamente às provas aduzidas pelas recorrentes no processo em primeira instância, com o propósito de demonstrar que os documentos DUSS não foram encontrados por acaso. O Tribunal Geral considerou que tais provas não apoiavam os argumentos apresentados pelas recorrentes e, por conseguinte, aquela apreciação não pode ser objeto de recurso.

86.      No que respeita ao mérito do fundamento de recurso em apreço, a Comissão considera que não era, de modo algum, impossível às recorrentes terem apresentado elementos de prova que apoiassem a sua alegação de que, durante a primeira inspeção, a Comissão também tinha procurado documentos relativos à segunda infração objeto de suspeita. Com efeito, no processo em primeira instância, as recorrentes tinham apresentado um conjunto de provas documentais que alegadamente demonstravam a ilegalidade da conduta da Comissão, mas que o Tribunal Geral (corretamente, no entender da Comissão) não considerou convincentes.

87.      Evidentemente, este fundamento de recurso também diz respeito à rejeição pelo Tribunal Geral do fundamento invocado pelas recorrentes relativo à utilização, por parte da Comissão, dos documentos DUSS encontrados durante a primeira inspeção como justificação para a adoção da segunda e da terceira decisões de inspeção. Por conseguinte, se o Tribunal de Justiça concordar com a minha análise do terceiro fundamento de recurso, não será necessário apreciar o quarto fundamento de recurso. Neste sentido, limitar‑me‑ei a analisar sucintamente este fundamento de recurso, por uma questão de exaustividade e para a eventualidade de o Tribunal de Justiça considerar inadmissível ou improcedente o terceiro fundamento de recurso.

1.      Admissibilidade

88.      Desde logo, os argumentos da Comissão segundo os quais este fundamento é inadmissível não me convencem. A crítica das recorrentes não é dirigida à apreciação que o Tribunal Geral fez das provas aduzidas para corroborar a sua alegação, mas antes ao facto de lhes ter sido imposto o ónus de provar a verdadeira intenção da Comissão. Portanto, a questão suscitada pelas recorrentes consiste na atribuição do ónus da prova, que constitui claramente uma questão de direito e, como tal, é suscetível de apreciação pelo Tribunal de Justiça em sede de recurso.

2.      Mérito

89.      No essencial, este fundamento de recurso suscita a questão de saber se, nos processos perante os tribunais da União, cabe às empresas fazer prova de que documentos encontrados numa inspeção mas não relacionados com o objeto declarado dessa inspeção foram utilizados ilegalmente pela Comissão noutro contexto, ou vice‑versa.

90.      Desde logo, parece‑me útil salientar novamente que os poderes exercidos pelos funcionários da Comissão durante uma inspeção nos termos do artigo 20.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1/2003 são limitados pela decisão de inspeção que identifica o objeto desta. No entanto, durante a inspeção, a Comissão deve poder examinar todos os documentos relacionados com a atividade da empresa que, segundo um critério de razoabilidade, considere constituírem uma fonte de informações relevantes para a investigação. Isto significa que, para apreciar a sua relevância, os funcionários da Comissão examinarão inevitavelmente um grande número de documentos que poderão escapar ao objeto da inspeção. No entanto, só é permitido aos funcionários da Comissão fazer cópias dos documentos considerados relevantes para a investigação (41).

91.      Assim, desde que a Comissão faça cópias apenas dos documentos abrangidos pela decisão de inspeção, deve presumir‑se que o seu comportamento é lícito. Nesses casos, cabe à empresa objeto de inspeção fazer prova, perante o Tribunal Geral, da invalidade da decisão de inspeção (impugnando‑a diretamente nos tribunais da União) ou da ilegalidade do modo como a inspeção foi conduzida (normalmente, no âmbito de um recurso de anulação da decisão final adotada pela Comissão relativamente à infração objeto de suspeita) (42).

92.      Por outro lado, em princípio, é proibida qualquer utilização de informações que escapem ao âmbito da decisão de inspeção. Contudo, conforme esclareceu o acórdão Dow Benelux, os documentos encontrados por acaso durante uma inspeção e não relacionados com ela podem, ainda assim, ser utilizados para abrir uma nova investigação.

93.      Assim, se a Comissão utilizar documentos ou informações encontrados durante uma inspeção e não abrangidos pela decisão de inspeção, recairá sobre ela ― em caso de litígio ― o ónus de invocar uma exceção ao princípio geral acima referido, semelhante à exceção prevista no acórdão Dow Benelux, e de fazer prova do preenchimento das condições de aplicação dessa exceção (43).

94.      Em circunstâncias normais, se não existirem elementos que indiquem o contrário, é muito fácil cumprir o ónus da prova que impende sobre a Comissão. Com efeito, regra geral, não existe motivo para que a Comissão esteja interessada em examinar e recolher informações estanhas à investigação em curso. Por conseguinte, uma explicação sucinta sobre o modo como as informações estranhas foram obtidas é habitualmente suficiente para, prima facie, se considerar que a Comissão não cometeu um erro de direito durante a busca. Seguidamente, caberia à empresa em causa persuadir o juiz da União de que a Comissão tinha em vista, desde o início, os documentos em questão. Por outras palavras, considero que, salvo quando existam provas concretas em contrário, o Tribunal de Justiça pode partir do princípio de que a conduta da Comissão se enquadra no âmbito da regra estabelecida no acórdão Dow Benelux.

95.      No entanto, no presente caso, a situação é diferente. É pacífico entre as partes que: i) os documentos DUSS descobertos pela Comissão durante a primeira inspeção são estranhos ao objeto dessa inspeção; ii) esses documentos serviram de base à adoção de duas decisões que ordenaram a realização de duas inspeções subsequentes, cujo objeto era uma possível infração diferente; e que iii) os funcionários da Comissão foram informados sobre o objeto da segunda denúncia imediatamente antes do início da primeira inspeção.

96.      Nestas circunstâncias, partilho a convicção das recorrentes de que, em princípio, ao invocar a exceção prevista no acórdão Dow Benelux, cabia à Comissão o ónus da prova do preenchimento das condições de aplicação daquela exceção.

97.      Não obstante, esta questão é irrelevante para o caso presente. Com efeito, em minha opinião, o Tribunal Geral errou numa fase anterior do seu raciocínio no acórdão recorrido. Conforme acima explicado, a exceção prevista no acórdão Dow Benelux aplica‑se exclusivamente às descobertas genuinamente fortuitas, ou seja, às informações encontradas durante uma busca, efetuada de boa‑fé, de informações relacionadas com o objeto da inspeção. Em contrapartida, essa exceção não se pode aplicar aos casos em que a descoberta de documentos resulta de uma busca ilegal. No caso em apreço, como já foi referido, a primeira inspeção constituiu uma busca ilegal, na medida em que os funcionários da Comissão receberam expressa ou implicitamente instruções para procurar documentos que não estavam abrangidos pelo âmbito da inspeção delimitado na primeira decisão de inspeção. Por outras palavras, a primeira inspeção foi ilegal na medida em que abrangeu a busca dos documentos DUSS.

98.      Por conseguinte, o erro do Tribunal Geral não está relacionado com a questão de saber se cabia à Comissão provar o preenchimento dos critérios fixados no acórdão Dow Benelux ou se cabia às recorrentes provar o seu não preenchimento. O erro cometido foi mais extremo. Nas circunstâncias do presente caso, nem sequer se coloca a questão da atribuição do ónus da prova. Se o Tribunal Geral tivesse retirado as devidas ilações do facto de a Comissão ter efetuado uma busca ilegal relativamente aos documentos DUSS, não teria sido exigida às recorrentes nenhuma prova adicional para demonstrar uma violação dos seus direitos de defesa e do seu direito à vida privada. Do mesmo modo, nenhum elemento de prova aduzido pela Comissão poderia ter demonstrado que os documentos tinham sido encontrados por acaso e, como tal, licitamente.

99.      Por este motivo, considero que o quarto fundamento de recurso também deve ser jugado procedente.

VI ― Consequências da apreciação

100. Nos termos do primeiro parágrafo do artigo 61.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Neste caso, pode decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento.

101. Uma vez que concluí que o terceiro e o quarto fundamentos de recurso devem ser julgados procedentes, o acórdão recorrido deve ser anulado na parte (n.° 115 a n.° 165) em que julgou improcedentes os fundamentos das recorrentes em primeira instância relativos à violação dos seus direitos de defesa durante a primeira inspeção.

102. Face aos elementos de facto constatados e à troca de opiniões perante o Tribunal Geral e perante o Tribunal de Justiça, considero que o Tribunal de Justiça está em condições de decidir definitivamente o litígio.

103. Na sua petição apresentada ao Tribunal Geral, as recorrentes tinham pedido, inter alia, a anulação da segunda e da terceira decisões de inspeção, por se basearem em informações obtidas ilegalmente durante a primeira inspeção.

104. Pelos motivos já explanados, concluí que os direitos de defesa das recorrentes e o seu direito à inviolabilidade do domicílio foram violados devido a uma infração às regras estabelecidas no Regulamento n.° 1/2003. Neste contexto, a questão fundamental é a seguinte: constitui a violação dos direitos de defesa das recorrentes e do seu direito à inviolabilidade do domicílio uma base suficiente para a anulação da segunda e da terceira decisões de inspeção?

105. No meu entender, pelos motivos a seguir enunciados, a resposta a esta questão tem de ser afirmativa.

106. Em primeiro lugar, conforme já referido, o Tribunal de Justiça esclareceu que, na eventualidade de uma decisão de inspeção ser anulada pelo juiz da União, a Comissão fica impedida de utilizar, para efeitos de um processo por infração às regras da União em matéria de concorrência, quaisquer documentos ou elementos de prova eventualmente obtidos durante essa investigação. Caso contrário, a decisão poderia ser anulada pelo juiz da União, na medida em que se baseasse em tais meios de prova (44).

107. O princípio resultante desta jurisprudência reveste‑se de capital importância, uma vez que assegura a compatibilidade do regime previsto pelo Regulamento n.° 1/2003 com a jurisprudência do TEDH, já referida, relativa ao artigo 8.° da CEDH. Com efeito, o Tribunal de Estrasburgo tem repetidamente sustentado que a ingerência no direito à inviolabilidade do domicílio pode ser justificada, inter alia, nos casos em que a legislação prevê «garantias contra abusos» por parte das autoridades públicas. Estas garantias podem consistir, nomeadamente, em normas que preveem a restituição ou a destruição dos documentos ilegalmente apreendidos ou copiados, ou que consagram a proibição da utilização, para outros fins, das informações obtidas (45).

108. Em segundo lugar, observo que o artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003 está formulado em termos muito vagos. Em especial, o verbo empregado («utilizar») tem um significado abrangente. A regra consagrada nesta disposição é uma proibição geral de qualquer utilização de informações obtidas durante uma inspeção no âmbito de outra investigação, salvo quando for aplicável uma exceção específica. De resto, é lógico que assim seja, dado que este princípio, da maior importância, se destina a proteger não só o sigilo profissional das empresas em causa, mas também (e sobretudo) os direitos de defesa dessas empresas (46).

109. Por conseguinte, deduzo daqui que a Comissão não está apenas impedida de invocar tais informações como prova da prática de uma infração, mas também, mais genericamente, de utilizar essas informações como base de qualquer outra decisão desfavorável ou prejudicial para a empresa em questão (ou para qualquer outra empresa, a este respeito). Não vejo por que motivo essa proibição não deva abranger também as decisões que obrigam as empresas a sujeitar‑se a uma inspeção nos termos do artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003.

110. Em terceiro lugar, observo que, nos n.os 130 a 134 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral concluiu que as informações obtidas durante a primeira inspeção eram «de natureza a afetar a legalidade da segunda e da terceira decisões de inspeção». O facto de a Comissão ter recebido anteriormente uma denúncia sobre uma alegada infração cometida pela DUSS foi ― no meu entender, corretamente ― considerado irrelevante pelo Tribunal Geral, na medida em que o que desencadeou a segunda e a terceira inspeções foram as informações obtidas durante a primeira inspeção. Na realidade, os textos da segunda e da terceira decisões de inspeção faziam referência (expressa, na terceira decisão, e tácita, na segunda) às informações obtidas durante a primeira inspeção. A Comissão não contestou as conclusões do Tribunal Geral sobre este ponto.

111. Além disso, sublinho que, nas suas observações perante o Tribunal Geral, a Comissão reconheceu que os documentos encontrados durante a primeira inspeção acrescentaram informações importantes às que já constavam do seu dossiê. Em especial, a Comissão afirmou expressamente que os documentos DUSS pareciam indiciar uma possível infração cuja natureza e cujo alcance pareciam mais significativos do que os da infração objeto da denúncia anterior. Na audiência, a Comissão salientou ainda que, antes de a primeira inspeção ter sido realizada, as informações de que dispunha relativamente à segunda infração objeto de suspeita eram muito limitadas.

112. Por este motivo, não se pode descartar a possibilidade de as informações de que a Comissão dispunha antes de os documentos DUSS terem sido encontrados não serem suficientes para permitir a realização de uma inspeção nos termos do artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003. Em todo o caso, ainda que a Comissão dispusesse de provas bastantes para ordenar uma inspeção ad hoc relativa à segunda infração objeto de suspeita, não vejo como isso seria suficiente para sanar as consequências de uma violação manifesta do artigo 20.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003.

113. Em quarto lugar, é irrelevante que alguns documentos DUSS tenham sido fotocopiados apenas depois de as recorrentes terem sido notificadas da segunda decisão. Uma vez que a Comissão encontrou os documentos durante a primeira inspeção e os guardou para mais tarde os copiar, não é possível sustentar que foram originalmente descobertos com base numa nova decisão.

114. No que se refere à busca de informações relativas à segunda infração objeto de suspeita, esses documentos foram descobertos durante uma inspeção ilegal. Enquanto tal, este erro processual não pode ser sanado através da adoção de uma nova decisão de inspeção (nem, provavelmente, pela apresentação de um pedido de informações nos termos do artigo 18.° do Regulamento n.° 1/2003).

115. O entendimento oposto retiraria, basicamente, todo o efeito útil à proibição estabelecida no artigo 28.° do Regulamento n.° 1/2003. Na prática, a Comissão poderia ignorar as regras processuais previstas no regulamento, incluindo a regra do artigo 20.°, n.° 4, e eludir a proibição imposta pelo artigo 28.°, uma vez que qualquer documento obtido ilegalmente poderia muito facilmente ser «regularizado». Independentemente de suscitar questões de compatibilidade com a jurisprudência do TEDH, já referida, o Regulamento n.° 1/2003 não pode razoavelmente ser interpretado neste sentido.

116. É verdade que, no acórdão PVC, o Tribunal de Justiça defendeu que o mero facto de, em dada ocasião, a Comissão ter obtido, pela primeira vez, documentos sobre determinada matéria não confere a esses documentos um grau de proteção tão absoluto que não possam ser requisitados noutra situação, no exercício de competências legais, e utilizados como prova. Consequentemente, o Tribunal de Justiça concluiu que, uma vez que a Comissão tinha de novo obtido os documentos contestados naquele processo com base em autorizações ou decisões, e os tinha utilizado para a finalidade nelas indicada, os direitos de defesa das empresas em questão tinham sido devidamente respeitados (47).

117. No entanto, naquele processo, os factos eram substancialmente diferentes dos factos do presente caso. Com efeito, ao contrário do que acontece no presente processo, no acórdão PVC, nenhuma das partes alegou qualquer conduta irregular da Comissão durante a primeira inspeção. Além disso, na sequência de um pedido da Comissão, as empresas em questão entregaram voluntariamente uma nova cópia dos documentos em causa (48). Pelo contrário, no presente processo, a Comissão utilizou a cópia dos próprios documentos que obteve ilicitamente durante a primeira inspeção.

118. Na minha perspetiva, no acórdão PVC, o Tribunal Geral adotou uma posição razoável (49). Mais uma vez, o objetivo subjacente ao artigo 28.° é evitar que a Comissão eluda as regras, a fim de proteger os direitos das empresas objeto de investigação. Considerar que a obtenção de um documento no contexto de uma investigação pode impedir qualquer utilização futura desse documento noutro contexto, ainda que nenhuma regra processual seja eludida e que os direitos de defesa das empresas em causa sejam devidamente respeitados, seria fazer uma interpretação demasiado extensiva do alcance do artigo 28.° Por exemplo, não haveria razão para proibir a utilização de um documento incriminatório, encontrado pela Comissão durante uma inspeção ou obtido na sequência de um pedido de informações relativo a outra infração, numa investigação posterior (desde que posteriormente fosse encontrada ou obtida uma cópia do mesmo documento no contexto da nova investigação, em conformidade com as regras estabelecidas no Regulamento n.° 1/2003).

119. Porém, esse não é o caso no presente processo.

120. Em quinto e último lugar, considero igualmente irrelevante que, como salienta a Comissão nas suas observações, os representantes das recorrentes que acompanharam os funcionários da Comissão durante a inspeção não tenham levantado quaisquer objeções naquele momento (50) nem requerido o registo de uma queixa formal no relatório elaborado no fim da inspeção pelos funcionários da Comissão.

121. Primeiro, nenhuma disposição do Regulamento n.° 1/2003 ou do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça exige que as empresas suscitem uma possível questão imediatamente nessa fase, sob pena de essa questão não poder ser apreciada pelo juiz da União. O mero silêncio da empresa nesse momento não pode ser interpretado como a aceitação tácita de uma conduta potencialmente ilícita da Comissão. Segundo, pode ser difícil para os representantes das empresas detetar imediatamente uma eventual violação das regras processuais por parte da Comissão. Os funcionários da Comissão não estão obrigados a dar, nem é suposto darem, explicações ou justificações específicas sobre, por exemplo, o tipo de documentos ou materiais procurados, ou sobre os motivos para a realização de buscas num determinado escritório.

122. À luz do exposto, concluo que, uma vez que os documentos obtidos em violação das regras estabelecidas no Regulamento n.° 1/2003 foram utilizados pela Comissão como base para a adoção da segunda e da terceira decisões de inspeção, estas decisões devem ser anuladas.

VII ― Despesas

123. Se o Tribunal de Justiça concordar com a minha análise do presente recurso, em consequência, nos termos dos artigos 137.°, 138.°, 140.° e 184.° do Regulamento de Processo, as recorrentes ― tendo sido vencidas em dois dos quatro fundamentos de recurso apresentados ― devem ser condenadas a suportar metade das suas próprias despesas e a pagar metade das despesas incorridas pela Comissão com o presente recurso. Por seu lado, a Comissão deve pagar metade das despesas das recorrentes e suportar metade das suas próprias despesas relacionadas com o presente recurso.

124. No que respeita às despesas em primeira instância, por um lado, as recorrentes obtiveram a anulação da segunda e da terceira decisões de inspeção. Por outro lado, foi confirmada a validade da primeira decisão de inspeção. Por conseguinte, a Comissão deve pagar as despesas relativas aos processos T‑290/11 e T‑521/11, ao passo que as recorrentes devem pagar as despesas relativas ao processo T‑289/11.

125. O Órgão de Fiscalização da EFTA e o Governo espanhol, na qualidade de intervenientes, devem suportar as suas próprias despesas.

VIII ― Conclusão

126. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça:

¾        anule o acórdão de 6 de setembro de 2013, Deutsche Bahn e o./Comissão, proferido nos processos apensos T‑289/11, T‑290/11 e T‑521/11, na parte em que o Tribunal Geral julgou improcedente o fundamento relativo à violação dos direitos de defesa das recorrentes por irregularidades que viciam a realização da primeira inspeção;

¾        anule a decisão C (2001) 2365, de 30 de março de 2011, e a decisão C(2011) 5230, de 14 de julho de 2011;

¾        negue provimento ao presente recurso quanto ao resto;

¾        condene as recorrentes a suportar metade das suas próprias despesas e a pagar metade das despesas da Comissão relacionadas com o presente recurso, e condene a Comissão a suportar metade das suas próprias despesas e a pagar metade das despesas das recorrentes relacionadas com o presente recurso;

¾        condene a Comissão no pagamento das despesas relativas aos processos T‑290/11 e T‑521/11, e condene as recorrentes no pagamento das despesas relativas ao processo T‑289/11;

¾        condene o Governo espanhol e o Órgão de Fiscalização da EFTA a suportar as suas próprias despesas.


1 ―      Língua original: inglês.


2 ―      Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003 L 1, p. 1).


3 ―      Decisão C (2011) 1774, de 14 de março de 2011.


4 ―      Decisão C (2011) 2365, de 30 de março de 2011.


5 ―      Decisão C (2011) 5230, de 14 de julho de 2011.


6 ―      EU:T:2013:404.


7 ―      V., entre outros, acórdão Nexans e Nexans France/Comissão, C‑37/13 P, EU:C:2014:2030, n.° 36 e jurisprudência aí referida.


8 ―      Ibidem, n.° 34 e jurisprudência aí referida.


9 ―      Caso se verifique que a empresa infringiu as regras da União em matéria de concorrência, até um atraso na cooperação com a Comissão acarretaria o aumento da coima: v., por exemplo, acórdão Koninklijke Wegenbouw Stevin/Comissão, T‑357/06, EU:T:2012:488, n.os 220 a 240.


10 ―      V. acórdão Roquette Frères, C‑94/00, EU:C:2002:603, n.° 48 e jurisprudência aí referida.


11 ―      V. acórdão Dow Benelux/Comissão, 85/87, EU:C:1989:379 (a seguir «acórdão Dow Benelux»), n.os 17 a 19. V., também, acórdão Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, EU:C:2002:582 (a seguir «acórdão PVC»), n.° 301.


12 ―      V. acórdão Roquette Frères, EU:C:2002:603, n.° 49 e jurisprudência aí referida.


13 ―      Acórdão Société Colas Est e o. c. França, 16 de abril de 202, n.° 37971/97, TEDH 2002‑III.


14 ―      Acórdão Société Métallurgique Liotard Frères c. França, 5 de maio de 2011, n.° 29598/08, TEDH 2011.


15 ―      Acórdão Société Canal Plus e o. c. França, 21 de dezembro de 2010, n.° 29408/08, TEDH 2010.


16 ―      Acórdão Harju c. Finlândia, 15 de fevereiro de 2011, n.° 56716/09, TEDH 2011.


17 ―      Acórdão Heino c. Finlândia, 15 de fevereiro de 2011, n.° 56720/09, TEDH 2011.


18 ―      V., por exemplo, acórdão Bernh Larsen Holding AS e o. c. Noruega, 14 de março de 2013, n.° 24117/08, § 159 e jurisprudência aí referida, TEDH 2013.


19 ―      Acórdão Niemietz c. Alemanha, de 16 de dezembro de 1992, § 31, Série A n.° 251‑B. V., também, acórdão Société Colas Est e o. c. França, já referido na nota 13.


20 ―      V., em especial, n.os 64 a 73 e 108 a 110 do acórdão recorrido.


21 ―      Acórdão Bernh Larsen Holding AS e o. c. Noruega, já referido na nota 18.


22 ―      Acórdão Delta Pekárny AS c. República Checa, 2 de outubro de 2014, n.° 97/11, §§ 82 a 94, TEDH 2014.


23 ―      Ibidem, §§ 83, 87, 92 a 93.


24 ―      V. conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Nexans e Nexans France/Comissão, C‑37/13 P, EU:C:2014:223, n.° 85.


25 ―      V. acórdãos Chalkor/Comissão, C‑386/10 P, EU:C:2011:815, e KME e o./Comissão, C‑272/09 P, EU:C:2011:810.


26 ―      V. artigo 52.°, n.° 3, in fine, da Carta: «[…] Esta disposição não obsta a que o direito da União confira uma proteção mais ampla [do que a que é conferida pela CEDH]».


27 ―      V. notas 13 a 15. A este respeito, desejo salientar que as recorrentes não explicaram com clareza por que motivo o acórdão Colas Est é relevante para o presente recurso, uma vez que (conforme já mencionado) dizia apenas respeito a uma violação do direito ao respeito da vida privada e da vida familiar (artigo 8.° da CEDH).


28 ―      V. jurisprudência referida no n.° 40 supra. Relativamente à jurisprudência do TEDH, v., em especial, acórdão Menarini Diagnostics Srl c. Itália, 27 de setembro de 2011, n.° 43509/08, §§ 57 a 67 e jurisprudência aí referida, TEDH 2011.


29 ―      V. acórdãos Société Canal Plus e o. c. França, já referido na nota 15, § 37, e Société Métallurgique Liotard Frères c. França, já referido na nota 14, §§ 18 e 19.


30 ―      V. acórdão Société Canal Plus e o. c. França, já referido na nota 15, § 40.


31 ―      EU:C:1989:379.


32 ―      V. n.os 115 a 165 do acórdão recorrido.


33 ―      Tais verificações e controlos compreendem, em especial, uma deliberação do colégio dos comissários, após uma consulta interserviços.


34 ―      Em conformidade com o artigo 13.° do Regulamento Interno da Comissão [C(2000) 3614) (JO 2000 L 308, p. 26], com a redação que lhe foi dada recentemente pela Decisão da Comissão de 9 de novembro de 2011, que altera o seu Regulamento Interno (2011/737/UE, Euratom) (JO 2011 L 296, p. 58).


35 ―      V., principalmente, Decisões PV(2004) 1655, SEC(2004) 520/2 e PV(2006) 1763, SEC(2006) 1368 da Comissão.


36 ―      Sobre a legalidade dessa delegação, v. acórdãos AKZO Chemie e AKZO Chemie UK/Comissão, 5/85, EU:C:1986:328, n.os 28 a 40, e Dow Chemical Ibérica e o./Comissão, 97/87 a 99/87, EU:C:1989:380, n.° 58.


37 ―      V. conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, EU:C:2003:85, n.° 26. V., também, no mesmo sentido, acórdão Hoechst/Comissão, C‑227/92 P, EU:C:1999:360, n.os 14 e 15 e jurisprudência aí referida.


38 ―      V., em especial, artigo 52.°, n.° 1, da Carta.


39 ―      N.° 162 do acórdão recorrido.


40 ―      V., nesse sentido, em especial, n.os 15 e 22 do acórdão recorrido.


41 ―      V., neste sentido, conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Nexans e Nexans France/Comissão, EU:C:2014:223, n.° 62 e jurisprudência aí referida.


42 ―      V. acórdãos Dow Benelux, EU:C:1989:379, n.° 49, e Nexans e Nexans France/Comissão, T‑135/09, EU:T:2012:596, n.os 115 e seguintes e jurisprudência aí referida.


43 ―      V., por analogia, acórdãos Comissão/França, C‑24/00, EU:C:2004:70, n.° 53, e Comissão/Itália, 199/85, EU:C:1987:115, n.° 14.


44 ―      V. acórdão Roquette Frères, EU:C:2002:603, n.° 49 e jurisprudência aí referida.


45 ―      V. acórdãos Bernh Larsen Holding AS e o. c. Noruega, já referido na nota 18, §§ 171 e 172; Klass e o. c. Alemanha, 6 de setembro de 1978, n.° 5029/71, §§ 47 e 52, Série A n.° 28; Z c. Finlândia, 25 de fevereiro de 1997, § 103, Reports of Judgements and Decisions 1997‑I; e Delta Pekárny AS c. República Checa, já referido na nota 22,§ 92.


46 ―      V. acórdão Dow Benelux, EU:C:1989:379, n.° 18.


47 ―      V. acórdão PVC, EU:C:2002:582, n.os 294 a 307.


48 ―      V., em especial, n.os 470 e 471 do acórdão proferido em primeira instância: acórdão PVC, T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, EU:T:1999:80.


49 ―      Ibidem, n.° 477.


50 ―      Além disso, as afirmações da Comissão a este respeito não parecem corretas, uma vez que os documentos juntos ao processo indicam que vários advogados das recorrentes se opuseram inicialmente à busca dos documentos DUSS.