Language of document : ECLI:EU:C:2018:231

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 11 de abril de 2018 (1)

Processo C43/17 P

Liam Jenkinson

contra

Serviço Europeu para a Ação Externa,

Conselho da União Europeia,

Comissão Europeia,

Eulex Kosovo

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Pessoal das missões internacionais da União Europeia — Direito aplicável e competência para decidir sobre os litígios relativos a contratos de trabalho — Contratos de trabalho a termo sucessivos — Decisão de não renovar o último contrato — Pedido de indemnização — Determinação da parte demandada»






 Introdução

1.        O presente processo de recurso de decisão do Tribunal Geral tem origem num litígio que opõe um antigo empregado da Missão Eulex Kosovo (2), Liam Jenkinson (a seguir «recorrente»), ao Conselho da União Europeia, à Comissão Europeia, ao Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) e à Missão Eulex Kosovo (a seguir «recorridos»), relativo à não renovação, pela Missão Eulex Kosovo, do último contrato do recorrente numa série de contratos a termo (a seguir «CT») celebrados pelo recorrente e por três missões da União Europeia entre 1994 e 2014 (3).

2.        Com o seu recurso, o recorrente pede ao Tribunal de Justiça que anule o despacho proferido no processo Jenkinson/Conselho e o. (4) pelo qual o Tribunal Geral julgou improcedente a sua ação que tinha por objeto, a título principal, um pedido com base no artigo 272.o TFUE e destinado, por um lado, a obter a requalificação da relação contratual do recorrente como contrato de trabalho sem termo e a indemnização pelos danos que o recorrente alegadamente sofreu devido à utilização abusiva de CT sucessivos e a um despedimento sem justa causa e, por outro, a obter a declaração de que o SEAE, o Conselho e a Comissão trataram o recorrente de forma discriminatória e, por conseguinte, a condená‑los no pagamento de uma indemnização e, a título subsidiário, um pedido baseado na responsabilidade civil extracontratual das instituições europeias.

3.        No âmbito do primeiro fundamento invocado em apoio do primeiro pedido do seu recurso, o recorrente censura ao Tribunal Geral vários erros de direito e uma fundamentação insuficiente do despacho recorrido, relativamente ao alcance da competência dos órgãos jurisdicionais da União para conhecerem da vertente contratual do litígio.

4.        Com este fundamento, o recorrente suscita uma questão inédita que merece atenção. Embora o Tribunal de Justiça já se tenha pronunciado sobre o alcance de uma cláusula compromissória, na aceção do artigo 272.o TFUE, relativa a uma relação laboral continuada com base numa sucessão de CT (5), com efeito, é pela primeira vez chamado a pronunciar‑se no presente processo sobre o alcance de uma cláusula deste tipo que figura no último contrato celebrado pelas partes, quando os contratos anteriores previam uma cláusula compromissória a favor dos tribunais de Bruxelas. Em conformidade com o desejo do Tribunal de Justiça, as presentes conclusões limitar‑se‑ão à análise desta questão precisa.

 Quadro jurídico

 Ação Comum 2008/124

5.        O artigo 1.o da Ação Comum 2008/124, com a epígrafe «Missão», estabelece que a União Europeia estabelece uma Missão para o Estado de direito no Kosovo designada «Eulex Kosovo».

6.        O artigo 2.o desta ação comum, com a epígrafe «Mandato», dispõe, no seu primeiro parágrafo:

«A EULEX KOSOVO apoia as instituições, as autoridades judiciais e os serviços de aplicação da lei do Kosovo nos seus progressos na via da sustentabilidade e da responsabilização, bem como no desenvolvimento e reforço de um sistema judicial independente multiétnico e de uma polícia e um serviço aduaneiro multiétnicos, assegurando que estas instituições não sofram interferências políticas e adiram aos padrões internacionalmente reconhecidos e às melhores práticas europeias».

7.        A referida ação comum foi prorrogada várias vezes (6). Foi, nomeadamente, prorrogada até 14 de junho de 2016 pela Decisão 2014/349/PESC (7), aplicável aos factos do caso em apreço.

8.        Esta decisão inseriu na referida ação comum o artigo 15.o‑A, que dispõe:

«A EULEX KOSOVO tem a capacidade de adquirir serviços e fornecimentos, celebrar contratos e convénios administrativos, contratar pessoal, ser titular de contas bancárias, adquirir e alienar bens, liquidar obrigações […]»

9.        Por último, a Ação Comum 2008/124 foi prorrogada até 14 de junho de 2018 pela Decisão (PESC) 2016/947 (8).

 Antecedentes do litígio

10.      Os antecedentes do litígio, conforme resultam do despacho recorrido, podem ser sintetizados da seguinte forma.

11.      Em primeiro lugar, o recorrente foi contratado durante o período compreendido entre 20 de agosto de 1994 e 5 de junho de 2002, ao abrigo de uma sucessão de CT, na Missão de Vigilância da União Europeia (9). Em seguida, foi contratado durante o período compreendido entre 17 de junho de 2002 e 31 de dezembro de 2009, ao abrigo de uma sucessão de CT, pela Missão de Polícia da União Europeia (10). Por último, o recorrente foi contratado pela Missão Eulex Kosovo, durante o período compreendido entre 5 de abril de 2010 e 14 de novembro de 2014, através de onze CT sucessivos (11).

12.      Durante a execução do contrato de trabalho que abrange o período compreendido entre 15 de junho e 14 de outubro de 2014, o recorrente foi informado, por carta do chefe da Missão Eulex Kosovo de 26 de junho de 2014, do fim da sua missão e da não renovação do seu contrato de trabalho após 14 de novembro de 2014.

13.      Foi celebrado um último CT entre a Eulex Kosovo e o recorrente para o período compreendido entre 15 de outubro e 14 de novembro de 2014 (a seguir «último CT»), que não foi renovado. O artigo 21.o do último CT prevê a competência do Tribunal de Justiça da União Europeia para qualquer litígio relativo ao contrato, com base no artigo 272.o TFUE (12).

 Tramitação no Tribunal Geral e despacho recorrido

14.      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral, em 23 de outubro de 2015, o recorrente intentou uma ação na qual pedia ao Tribunal, a título principal, por um lado, que requalificasse a sua relação contratual como contrato de trabalho sem termo, que declarasse a violação, pelos demandados, das suas obrigações contratuais, designadamente da obrigação de enviar um pré‑aviso no âmbito da rutura de um contrato sem termo, que declarasse que o seu despedimento era sem justa causa e, por conseguinte, que os condenasse na reparação do dano sofrido devido à utilização abusiva de CT sucessivos, à violação da obrigação de enviar um pré‑aviso e ao despedimento sem justa causa. Pedia ao Tribunal, por outro lado, que declarasse que o Conselho, a Comissão e o SEAE o tinham tratado de forma discriminatória no decurso do seu contrato com as missões, no que diz respeito à sua remuneração, aos seus direitos a pensão e a outras vantagens, que declarasse que o demandante devia ter sido recrutado como agente temporário de um dos demandados e, por conseguinte, os condenasse numa indemnização. A título subsidiário, pedia ao Tribunal Geral que condenasse os demandados, com base na sua responsabilidade extracontratual, a indemnizá‑lo pelos danos resultantes da violação das suas obrigações.

15.      No despacho recorrido, o Tribunal Geral declarou‑se manifestamente incompetente para se pronunciar sobre os dois pedidos principais e considerou que o pedido subsidiário era manifestamente inadmissível. Por conseguinte, o Tribunal Geral julgou a ação improcedente e condenou o recorrente nas despesas.

 Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

16.      O recorrente pede ao Tribunal de Justiça que anule o despacho recorrido, dê provimento à ação e condene os demandados nas despesas das duas instâncias. O Conselho e a Comissão concluem pedindo que seja negado provimento ao recurso e que o recorrente seja condenado nas despesas. O SEAE e a Eulex Kosovo pedem ao Tribunal de Justiça, a título principal, que se declare incompetente para julgar o recurso e, a título subsidiário, que negue provimento ao recurso e condene o recorrente nas despesas. Por outro lado, o Conselho e o SEAE concluem pedindo que, caso seja dado provimento ao recurso, o Tribunal de Justiça julgue a ação e o recurso da decisão do Tribunal Geral inadmissíveis no que lhes diz respeito.

17.      No Tribunal de Justiça, o recurso seguiu a tramitação escrita. Foi dirigido às partes um pedido de concentração das alegações sobre o primeiro fundamento invocado em apoio do primeiro pedido. A audiência teve lugar em 17 de janeiro de 2018.

 Análise do primeiro fundamento invocado em apoio do primeiro pedido do recurso

 Argumentos das partes

18.      O primeiro fundamento invocado em apoio do primeiro pedido do recurso tem por objeto a apreciação pelo Tribunal Geral do alcance da competência dos órgãos jurisdicionais da União para conhecer da vertente contratual do litígio. Articula‑se, em substância, em quatro partes.

 Quanto à primeira parte, relativa a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral e à falta de fundamentação no que respeita à determinação da sua competência para conhecer de toda a relação contratual

19.      O recorrente acusa o Tribunal Geral de não ter respondido ao argumento, apresentado em primeira instância, segundo o qual considera que, se a competência do Tribunal de Justiça para conhecer dos litígios contratuais só puder resultar da sua designação pelas partes numa cláusula compromissória inserida num contrato, desde que este seja válido, é, no entanto, à luz do direito nacional aplicável ao contrato, no caso vertente, o direito belga, que importa analisar a validade, o alcance e os efeitos da cláusula controvertida.

20.      Além disso, segundo o recorrente, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao decidir as exceções de inadmissibilidade sem analisar o processo quanto ao mérito. Com efeito, por força da legislação belga, o contrato deve ser assinado antes de o trabalhador iniciar a sua atividade e, quando tal não se verifica, as cláusulas contratuais tornam‑se inoponíveis, o que tem como consequência que só o recorrente pode invocar uma cláusula compromissória.

21.      Em todo o caso, no que se refere à interpretação e ao alcance da cláusula controvertida, o recorrente alega que o Tribunal Geral devia ter analisado, à luz do direito belga, a vontade real das partes aquando da assinatura do último CT no que respeita à cláusula compromissória, uma vez que este direito prevê que, em caso de dúvida, prevalece a interpretação mais favorável à parte mais fraca no contrato. Ora, uma vez que a cláusula compromissória tem como objeto uma relação contratual de longa duração, resulta do contexto da assinatura desta cláusula que não era intenção das partes cindir o litígio, atribuindo aos órgãos jurisdicionais da União competência para conhecer apenas do último CT. Segundo o recorrente, a interpretação adotada pelo Tribunal Geral significa, além disso, que basta às missões prever uma cláusula atributiva de competência diferente em cada CT para evitar que os trabalhadores possam recorrer aos tribunais, em conformidade com o direito a um processo equitativo que lhes é reconhecido, e para que estes devam, assim, dirigir‑se a tantos tribunais como os CT que celebraram. O despacho recorrido carece, pois, de fundamentação a este respeito e é juridicamente incorreto.

22.      O SEAE, o Conselho, a Comissão e a Eulex Kosovo contestam os argumentos invocados pelo recorrente em apoio da primeira parte.

 Quanto à segunda parte, relativa a um erro de direito respeitante à violação do disposto no direito belga e do princípio da litispendência

23.      O recorrente critica o Tribunal Geral por ter declinado a sua competência, no n.o 41 do despacho recorrido, considerando que os tribunais belgas se declarariam competentes para resolver o litígio relacionado com o conjunto dos CT, com exceção do último. Segundo o recorrente, não se pode excluir que os tribunais belgas interpretem a cláusula compromissória do último CT no sentido de que esta se aplica à integralidade da sua relação contratual com os recorridos. Em todo o caso, os tribunais belgas estão impossibilitados de anular um ato administrativo individual notificado pela missão ou pelas instituições ou que lhes é imputável: quando muito, podem suspender os seus efeitos. Por conseguinte, o despacho recorrido está viciado não só de falta de fundamentação mas também de erros de direito relativos ao direito belga e ao princípio da litispendência.

24.      O SEAE e a Comissão contestam os argumentos do recorrente em apoio desta segunda parte.

 Quanto à terceira parte, relativa a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral ao considerar que não era competente para se pronunciar sobre os efeitos dos contratos de trabalho anteriormente celebrados entre o recorrente e os recorridos

25.      O recorrente censura ao Tribunal ter considerado, sem razão, no n.o 39 do despacho recorrido, que, na medida em que era competente apenas no que respeita ao último CT, não podia pronunciar‑se sobre os efeitos dos contratos de trabalho celebrados anteriormente. Segundo o recorrente, a requalificação de contrato sem termo de toda a sua relação contratual não pode em caso algum ser isolada da existência do último CT e, mais precisamente, do fim deste contrato. Com efeito, segundo este, é impossível para o recorrente obter a requalificação da sua relação contratual em parte nos tribunais nacionais e em parte nos tribunais da União. O Tribunal Geral não respondeu, assim, à argumentação apresentada e viciou o despacho recorrido de um erro de direito.

26.      O SEAE e a Comissão contestam os argumentos do recorrente.

 Quanto à quarta parte, relativa à inexistência de análise do pedido relacionado com o último CT

27.      O recorrente sustenta que, em todo o caso, o Tribunal Geral não examinou o seu pedido relativo à notificação de documentos sociais relativos ao fim do contrato previsto pelo direito belga no momento da cessação do último CT e considera que essa omissão corresponde a uma denegação de justiça.

28.      O Conselho e a Comissão contestam os argumentos expostos pelo recorrente no âmbito da quarta parte.

 Apreciação

29.      A presente análise diz apenas respeito à questão do alcance da competência dos órgãos jurisdicionais da União para conhecer da vertente contratual do litígio e que decorre da cláusula compromissória com base no artigo 272.o TFUE. Por conseguinte, esta análise implica uma interpretação autónoma desta disposição. Estas conclusões não prejudicam, assim, a questão da requalificação da relação contratual, objeto do litígio. Com efeito, esta questão deve ser apreciada à luz da lei aplicável ao mérito da causa (13).

 Quanto ao alcance do artigo 272.o TFUE

30.      Em primeiro lugar, importa recordar que, no que respeita ao órgão jurisdicional competente para decidir os litígios em que a União é parte, o artigo 274.o TFUE prevê que, «[s]em prejuízo da competência atribuída ao Tribunal de Justiça da União Europeia pelos Tratados, os litígios em que a União seja parte não ficam, por este motivo, subtraídos à competência dos órgãos jurisdicionais nacionais». Segundo o Tribunal de Justiça, o sistema da repartição de competências jurisdicionais instituído pelo Tratado FUE «não permite às partes optar pela competência do órgão jurisdicional comunitário ou pela dos órgãos jurisdicionais nacionais em litígios». Com efeito, em conformidade com este sistema, a competência do órgão jurisdicional da União «exclui a dos órgãos jurisdicionais nacionais» (14).

31.      No que se refere à competência exclusiva dos órgãos jurisdicionais da União, o artigo 272.o TFUE dispõe que «[o] Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir com fundamento em cláusula compromissória constante de um contrato de direito público ou de direito privado, celebrado pela União ou por sua conta» (15). Este artigo constitui uma disposição específica que permite recorrer ao juiz da União com fundamento numa cláusula compromissória estipulada pelas partes em contratos de direito público ou de direito privado (16). A competência do Tribunal de Justiça está, portanto, ligada à existência, por um lado, de um contrato celebrado entre a instituição, o órgão ou a autoridade da União e a parte privada e, por outro, de uma cláusula compromissória constante do contrato em causa (17).

32.      Com efeito, embora, no quadro de uma cláusula deste tipo estabelecida ao abrigo do artigo 272.o TFUE, o Tribunal de Justiça possa ser chamado a decidir o litígio aplicando o direito nacional que rege o contrato (18), este já declarou que a sua competência para conhecer de um litígio relativo a este contrato é apreciada exclusivamente com base nas disposições daquele artigo e nas estipulações da cláusula compromissória, sem que lhe possam ser opostas disposições do direito nacional que alegadamente obstem à sua competência (19). Por conseguinte, para determinar a sua competência, o Tribunal de Justiça deve verificar a existência de uma cláusula deste tipo no contrato objeto do litígio. A existência de tal cláusula implica, portanto, a exclusão da competência de qualquer outro tribunal (20).

33.      Assim, resulta de uma leitura conjugada dos artigos 272.o e 274.o TFUE que, regra geral, os litígios relativos a contratos em que a União seja parte ou, em todo o caso, em que um dos cocontratantes atue em representação da União são da competência do órgão jurisdicional nacional (21). Todavia, a competência dos órgãos jurisdicionais da União exclui a dos órgãos jurisdicionais nacionais (22). Uma vez que os órgãos jurisdicionais da União considerem que os pedidos formulados no âmbito de uma ação estão abrangidos por uma cláusula compromissória, os órgãos jurisdicionais nacionais deixam de ser competentes para conhecer da ação. Estes órgãos jurisdicionais devem, pois, declarar a sua incompetência em razão, por um lado, do princípio do primado do direito da União (23) e, por outro, do respeito da vontade das partes.

34.      Colocam‑se, porém, problemas quando outro órgão jurisdicional é igualmente designado como competente, quer no mesmo contrato (competências concorrentes) (24) quer, como no caso em apreço, em CT anteriores a um último contrato, celebrados no âmbito de uma relação laboral (25).

35.      Segundo a jurisprudência, a competência do Tribunal de Justiça baseada numa cláusula compromissória, uma vez que é derrogatória do direito comum, deve ser interpretada restritivamente. Com efeito, o Tribunal de Justiça só pode conhecer dos pedidos que derivam do contrato celebrado pela União e que contém a cláusula compromissória ou que têm uma relação direta com as obrigações que dele decorrem (26).

36.      Neste contexto, tendo em conta que todos os pedidos do recorrente, no âmbito do primeiro fundamento, se baseiam ou na utilização abusiva de CT sucessivos ou no seu despedimento sem justa causa, devemos interrogar‑nos sobre as relações entre, por um lado, os pedidos do recorrente e, por outro, os diferentes CT (incluindo o último CT) ou as obrigações que deles decorrem.

 Quanto à qualificação do vínculo laboral entre o recorrente e a Eulex Kosovo

37.      A título prévio, para saber se os pedidos do recorrente no âmbito do primeiro fundamento derivam diretamente do último CT celebrado entre as partes e que contém uma cláusula compromissória ou se esses pedidos têm uma relação direta com as obrigações que decorrem do último CT, há que clarificar a questão de saber se a relação laboral entre o recorrente e a Eulex Kosovo, fundada numa série de onze CT, deve ser qualificada de relação laboral única e continuada ou se, pelo contrário, o último CT constitui a base sobre a qual assenta uma relação laboral distinta da dos anteriores CT.

38.      Recordo que o recorrente esteve empregado durante quase vinte anos por três diferentes missões da União no âmbito da PESC. No que respeita, em especial, à relação laboral do recorrente na Eulex Kosovo, cumpre constatar que a atividade que o recorrente exerceu por conta desta missão durante o período compreendido entre 5 de abril de 2010 e 14 de novembro de 2014 deu origem a uma relação laboral baseada em onze CT sucessivos.

39.      Daqui resulta que o vínculo laboral entre o recorrente e a Eulex Kosovo é uma relação laboral de natureza contratual. Todavia, coloca‑se a questão de saber se esta relação contratual constitui ou não uma relação laboral única e continuada.

40.      Não há qualquer dúvida quanto ao facto de que esta questão requer uma resposta afirmativa. Em primeiro lugar, como decorre dos antecedentes do litígio, o último CT foi celebrado entre a Eulex Kosovo e o recorrente para o período compreendido entre 15 de outubro e 14 de novembro de 2014. Na carta de 26 de junho de 2014, o chefe da missão informou o recorrente da não renovação, após 14 de novembro de 2014, do seu «último CT» por parte da Eulex Kosovo. Esta carta faz, pois, referência à data de fim do último CT, ou seja, 14 de novembro de 2014. Com efeito, o facto de se referir ao último CT demonstra que este se inscrevia na mesma relação laboral entre o recorrente e a Eulex Kosovo. Em segundo lugar, como a própria Eulex Kosovo admitiu em resposta a uma pergunta colocada durante a audiência, relativa à natureza da relação laboral entre as partes, na medida em que o recorrente começou a trabalhar para a Eulex Kosovo em 2010, o posto de trabalho que este ocupou até o final do seu último CT existia desde aquela data e a tarefa executada pelo recorrente era de natureza idêntica à executada no âmbito dos CT anteriores.

41.      Por conseguinte, entendo que essa relação laboral, no âmbito da qual o recorrente trabalhou durante o período compreendido entre 5 de abril de 2010 e 14 de novembro de 2014 por conta da Eulex Kosovo com base numa série de CT, deve ser qualificada de relação laboral única e continuada entre as partes.

 Quanto ao órgão jurisdicional competente para conhecer de uma relação contratual laboral baseada numa sucessão de CT

42.      Em primeiro lugar, há que recordar que os CT sucessivos celebrados entre o recorrente e a Eulex Kosovo durante o período compreendido entre 5 de abril de 2010 e 14 de outubro de 2014 preveem uma cláusula compromissória a favor dos tribunais de Bruxelas. Todavia, o último CT prevê, no artigo 21.o, a competência do Tribunal de Justiça da União Europeia com base no artigo 272.o TFUE. Este artigo estipula que a competência dos órgãos jurisdicionais da União diz respeito a qualquer litígio relativo ao contrato.

43.      Neste contexto, coloca‑se a questão de saber qual é o órgão jurisdicional competente no âmbito das relações contratuais baseadas numa sucessão de CT em que a maioria destes atribui a competência aos órgãos jurisdicionais de um Estado‑Membro, enquanto o último contrato que sustenta essa relação contém uma cláusula compromissória com base no artigo 272.o TFUE que atribui a competência aos órgãos jurisdicionais da União (27).

44.      Para responder a esta questão, há que escolher entre duas possibilidades. Assim, o órgão jurisdicional competente para conhecer dos litígios relativos a uma mesma relação laboral seria o órgão jurisdicional previsto na maioria dos CT nos quais se baseia a relação laboral (no caso em apreço, os tribunais belgas) ou o órgão jurisdicional previsto no último CD (no caso em apreço, os órgãos jurisdicionais da União). Estou convencido de que, entre essas duas possibilidades, há que escolher a segunda.

45.      A este respeito, há que referir o processo que deu origem ao Acórdão Porta/Comissão [Acórdão de 1 de julho de 1982 (109/81, EU:C:1982:253)], que tinha por objeto uma relação laboral análoga à do presente caso e dizia respeito a uma série de contratos sucessivos que T. Porta tinha celebrado anualmente com o diretor do Centro Comum de Investigação de Ispra para ministrar cursos de língua italiana durante um período de quinze anos, os primeiros cinco anos sem contratos escritos e, posteriormente, com base em cartas‑contrato. Durante os últimos quatros anos, a relação laboral entre as partes tinha sido baseada em contratos mais elaborados que incluíam uma cláusula compromissória, na aceção do artigo 181.o CEE (atual artigo 272.o TFUE), segundo a qual o Tribunal de Justiça era o «único competente para decidir sobre todos os litígios relativos à validade, à interpretação ou à execução dos referidos contratos».

46.      No seu acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que «[o] facto de a mesma cláusula [compromissória] não figurar nos contratos anteriores e de, no que se refere aos primeiros anos, não haver sequer contratos escritos[…] não pode obstar a que o Tribunal de Justiça tome em consideração, na sua apreciação das relações existentes entre as partes, todos os contratos celebrados» (28). Assim, apesar de apenas os últimos contratos conterem uma cláusula compromissória que remetia para o Tribunal de Justiça da União Europeia, o Tribunal teve em conta, na apreciação da situação, o conjunto de relações anteriores existentes entre as partes.

47.      No caso em apreço, há que recordar que as pretensões do recorrente estão ligadas à existência de uma relação laboral única e continuada com base numa sucessão de CT. Assim, é claro que tanto o pedido do recorrente baseado no recurso abusivo a CT como o que respeita ao despedimento sem justa causa se baseiam no conjunto dos contratos celebrados entre 5 de abril de 2010 e 14 de novembro de 2014, o que inclui sem dúvida o último CT. Com efeito, é a não renovação deste último CT que pôs fim à relação laboral do recorrente com a Eulex Kosovo, como decorre da carta de pré‑aviso (29). O fim da relação laboral entre as partes não pode em nenhum caso ser analisada sem se fazer referência ao último CT em causa. Por conseguinte, é a cláusula compromissória inserida neste último CT que deve determinar o órgão jurisdicional competente para todos os litígios relacionados com a totalidade da relação laboral. Entendimento contrário seria suscetível de provocar uma cisão de um litígio relativo a uma única relação laboral, em função do número de cláusulas compromissórias — que atribuem competência a diferentes órgãos jurisdicionais. Este entendimento seria contrário ao direito a um recurso efetivo.

48.      Por conseguinte, tendo em conta a unicidade da relação laboral no âmbito da qual o recorrente trabalhou para a Eulex Kosovo entre 2010 e 2014, o tribunal competente para todos os litígios relativos a esta relação laboral baseada numa sucessão de CT deve ser, à luz do princípio da segurança jurídica e do direito a um recurso efetivo (30), o previsto no último CT. Com efeito, é evidente que o facto gerador da cessação da relação laboral do recorrente com a Eulex Kosovo — a sua não renovação — está ligado ao último CT, independentemente do momento do envio da carta de pré‑aviso.

49.      Este raciocínio é corroborado pelo facto de a escolha das partes de inserir uma cláusula compromissória com base no artigo 272.o TFUE no último CT demonstrar a vontade deliberada de submeter a sua relação laboral à competência do Tribunal de Justiça. Recordo, a este respeito, o princípio de direito segundo o qual é a vontade das partes expressa em último lugar que deve prevalecer. Assim, o respeito deste princípio implica, nomeadamente, a competência do Tribunal de Justiça para decidir um litígio relativo a uma relação contratual existente no momento das primeiras diligências pré‑contenciosas (31). Por conseguinte, se, neste contexto, as partes escolheram alterar o órgão jurisdicional competente para conhecer dos litígios relacionados com a sua relação contratual, há que respeitar a sua escolha.

 Análise das conclusões do Tribunal Geral

50.      As críticas formuladas pelo recorrente no âmbito do seu primeiro fundamento incidem, por um lado, sobre os n.os 23 a 26 e, por outro, sobre os n.os 39 e 41 do despacho recorrido.

51.      Nos n.os 23 a 26 do despacho recorrido, o Tribunal Geral declarou, baseando‑se na jurisprudência relativa ao artigo 272.o TFUE, que só era competente para o que dizia respeito ao último CT, por força da cláusula compromissória que este continha, e que era, pois, manifestamente incompetente para julgar litígios que pudessem resultar da execução dos contratos de trabalho do recorrente anteriores ao último CT, uma vez que estes continham uma cláusula que atribuía expressamente competência aos tribunais belgas.

52.      Observo que esta argumentação jurídica não pode ser admitida no âmbito de uma relação laboral única e continuada entre o recorrente e o seu empregador e baseada numa série de CT sucessivos.

53.      Como salienta o recorrente, esta interpretação do Tribunal Geral significa que bastaria às missões prever uma cláusula atributiva de jurisdição diferente em cada um dos CT dos empregados para evitar que estes pudessem intentar uma ação judicial, em conformidade com o direito a um recurso efetivo que lhes é reconhecido.

54.      No n.o 39 do despacho recorrido, o Tribunal Geral analisou a alegação do recorrente relativa à requalificação de toda a relação contratual como contrato sem termo.

55.      A este respeito, o Tribunal Geral salientou que a sua competência, limitada ao último CT, não lhe permitia pronunciar‑se sobre os efeitos dos contratos de trabalho anteriormente celebrados e que, por conseguinte, era manifestamente incompetente para conhecer dos pedidos relacionados com a notificação do pré‑aviso e de documentos sociais relativos ao fim do contrato, prevista no direito belga na cessação do último CT.

56.      No n.o 41 do despacho recorrido, o Tribunal Geral declinou a sua incompetência com o fundamento de que os tribunais belgas se declarariam competentes para decidir o litígio relacionado com o conjunto dos CT, com exceção do último.

57.      Observo que, como resulta do n.o 47 das presentes conclusões, o Tribunal Geral não teve em conta que a cessação da relação laboral entre as partes não pode ser compreendida sem a existência do último CT. Com efeito, o facto gerador do fim da relação laboral do recorrente com a Eulex Kosovo — a sua não renovação — está ligado ao último CT.

58.      Conforme expus nos n.os 48 e 49 das presentes conclusões, uma vez que o litígio suscita a questão do caráter contínuo da relação laboral, e portanto da unicidade desta relação, é a cláusula compromissória que figura no último CT que deve determinar o órgão jurisdicional competente para todos os litígios relacionados com a relação laboral na sua integralidade.

59.      Daqui decorre, uma vez que o raciocínio do Tribunal Geral não tem em conta o caráter continuado da relação laboral entre o recorrente e a Eulex Kosovo nem a consequência da vontade das partes livremente expressa na cláusula compromissória, que este não podia basear a sua decisão na consideração de que o alcance da cláusula compromissória está expressamente limitado aos litígios relativos ao último CT e não se pode alargar aos contratos anteriores, sob pena de cometer um erro de direito.

60.      Uma vez que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito a respeito da sua competência para conhecer da ação, não há que examinar os argumentos do recorrente relativos à falta de fundamentação do despacho recorrido e à inexistência de análise do pedido relacionado com o último CT.

61.      Por conseguinte, há que julgar procedente o primeiro fundamento do recurso da decisão do Tribunal Geral.

62.      Tendo em conta todo o exposto, proponho a anulação do despacho recorrido, na medida em que o Tribunal Geral entendeu que era manifestamente incompetente para conhecer da ação do recorrente.

 Quanto às consequências da anulação do despacho recorrido

63.      Em conformidade com o artigo 61.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Pode, neste caso, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento.

64.      Considero que o litígio não está em condições de ser julgado. Com efeito, a análise do mérito dos argumentos do recorrente conduziria o Tribunal de Justiça a decidir sobre questões de facto com base em elementos que não foram apreciados pelo Tribunal Geral no despacho recorrido, uma vez que este considerou que era manifestamente incompetente para conhecer da ação. Além disso, as alegações de facto quanto ao mérito do litígio não foram debatidas perante o Tribunal de Justiça.

 Conclusão

65.      À luz do exposto, considero que o primeiro fundamento invocado pelo recorrente em apoio do primeiro pedido do recurso deve ser acolhido e proponho ao Tribunal de Justiça, por este único motivo e sem prejuízo da análise dos outros fundamentos do recurso, que anule o Despacho do Tribunal Geral da União Europeia de 9 de novembro de 2016, Jenkinson/Conselho e o. (T‑602/15, EU:T:2016:660), e remeta o processo ao Tribunal Geral, para que este decida sobre o mérito da causa, reservando para final a decisão quanto às despesas.


1      Língua original: francês.


2      Ação Comum 2008/124/PESC do Conselho, de 4 de fevereiro de 2008, sobre a Missão da União Europeia para o Estado de Direito no Kosovo, EULEX KOSOVO (JO 2008, L 42, p. 92).


3      Importa notar que resulta dos autos do processo que o recorrente foi contratado entre 1994 e 2014 por três missões diferentes da União que se inscrevem no âmbito da política externa e de segurança comum (PESC) ao abrigo, para cada uma dessas missões, de uma sucessão de CT (v. n.os 11 a 13 das presentes conclusões).


4      Despacho de 9 de novembro de 2016 (T‑602/15, a seguir «despacho recorrido», EU:T:2016:660).


5      V. Acórdão de 1 de julho de 1982, Porta/Comissão (109/81, EU:C:1982:253, n.o 10).


6      Em primeiro lugar, foi prorrogada até 14 de junho de 2012 pela Decisão 2010/322/PESC do Conselho, de 8 de junho de 2010, que altera e prorroga a Ação Comum 2008/124/PESC (JO 2010, L 145, p. 13), em seguida, até 14 de junho de 2014 pela Decisão 2012/291/PESC do Conselho, de 5 de junho de 2012, que altera e prorroga a Ação Comum 2008/124/PESC (JO 2012, L 146, p. 46).


7      Decisão do Conselho, de 12 de junho de 2014, que altera a Ação Comum 2008/124/PESC (JO 2014, L 174, p. 42).


8      Decisão do Conselho, de 14 de junho de 2016, que altera a Ação Comum 2008/124/PESC (JO 2016, L 157, p. 26).


9      A Missão de Vigilância da Comunidade Europeia (ECMM) estava presente nos Balcãs Ocidentais desde 1991 e foi estabelecida por um memorando de entendimento assinado em Belgrado, em 13 de julho de 1991. A Missão de Vigilância da União Europeia foi criada pela Ação Comum 2000/811/PESC do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativa à Missão de Vigilância da União Europeia (JO 2000, L 328, p. 53). Resulta dos antecedentes do litígio que houve apenas uma interrupção de dezasseis dias entre o fim do contrato do recorrente com a Missão de Vigilância da União Europeia e o início do contrato com a Missão de Polícia da União Europeia.


10      Esta missão foi criada pela Ação Comum 2002/210/PESC do Conselho, de 11 de março de 2002, relativa à Missão de Polícia da União Europeia (JO 2002, L 70, p. 1).


11      Resulta dos antecedentes do litígio que houve uma interrupção de três meses entre o fim do último contrato com a Missão de Polícia da União Europeia e o início da sua relação contratual com a Eulex Kosovo.


12      No seu recurso da decisão do Tribunal Geral, o recorrente salienta ter assinado, nas referidas missões, cerca de quarenta CT sucessivos. Salienta também ter realizado, antes e depois do fim do seu último CT, as diligências para iniciar um processo de arbitragem, diligências às quais a Eulex Kosovo não deu nenhum seguimento.


13      Mesmo se estamos no âmbito da PESC, sou da opinião de que as missões da União devem, em conformidade com o dever de lealdade que sobre elas recai, ter em consideração, no seu comportamento como empregador, as disposições legislativas adaptadas à escala da União. V., por analogia, Acórdão de 13 de dezembro de 2016, IPSO/BCE (T‑713/14, EU:T:2016:727, n.o 106). Em qualquer caso, importa, na minha opinião, salientar dois elementos importantes. Em primeiro lugar, embora a Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo (JO 1999, L 175 p. 43), que implementa o acordo‑quadro, seja dirigida aos Estados‑Membros, as regras e os princípios previstos ou derivados desta diretiva podem ser invocados contra instituições (órgãos e outras autoridades) da União se estes corresponderem, em si, à expressão concreta de regras fundamentais do Tratado e de princípios gerais que se impõem diretamente às referidas instituições. V., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2003, Rinke (C‑25/02, EU:C:2003:435, n.os 24 e 25). Assim, o princípio da proibição do abuso de direito, por força do qual ninguém pode invocar abusivamente normas jurídicas, faz parte dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo juiz. Em segundo lugar, tendo em conta que, no âmbito de uma cláusula celebrada ao abrigo do artigo 272.o TFUE, o Tribunal de Justiça pode ser chamado a decidir o litígio aplicando o direito nacional que rege o contrato, saliento que as regras nacionais transpuseram a Diretiva 1999/70 e, por conseguinte, que essas regras são aplicáveis a uma série de CT, como a que está na origem do presente litígio.


14      V. Acórdão de 9 de outubro de 2001, Flemmer e o. (C‑80/99 a C‑82/99, EU:C:2001:525, n.o 41). O processo que deu origem a este acórdão dizia respeito a indemnizações a determinados produtores de leite ou de produtos lácteos que tinham sido temporariamente impedidos de exercer a sua atividade e o artigo 238.o CE (atual artigo 272.o TFUE) não era, pois, aplicável.


15      No que respeita à natureza da cláusula compromissória, na aceção do artigo 272.o TFUE, alguns autores consideram que o termo «cláusula compromissória» pode revelar‑se «enganador» ou inapropriado, uma vez que os órgãos jurisdicionais da União competentes com base neste tipo de cláusulas não atuam enquanto árbitros mas enquanto tribunais que proferem acórdãos suscetíveis de serem diretamente aplicáveis. V., a este respeito, Lenaerts, K., Maselis, I., e Gutman, K., EU Procedural Law, Oxford University Press, Oxford, 2014, capítulo 19, pp. 686 a 699, em especial ponto 19.8. No mesmo sentido, v. Kremlis, G., «De quelques clauses d’élection de for et de droit applicable stipulées dans les contrats de droit privé conclus par les Communautés européennes dans le cadre de leurs activités d’emprunt et de prêt», Diritto comunitario e degli scambi internazionali, Milão, 1986, p. 782: «[Q]uando um litígio é submetido [ao Tribunal de Justiça] ao abrigo de uma cláusula deste tipo, este não se transforma em tribunal arbitral […]». Para considerar a cláusula compromissória não como uma cláusula arbitral, mas como uma cláusula atributiva de jurisdição, v. considerações desenvolvidas por D’Alessandro, E., «L’art. 272 del Trattato sul funzionamento dell’Unione europea: mero accordo attributivo della competenza giurisizionale o convenzione arbitrale? (nota a Trib. dell’Unione europea, 17 dicembre 2010, causa T‑460/08)», Rivista dell’arbitrato, Roma, 2011, n.o 4, pp. 622 a 628.


16      V., neste sentido, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Planet/Comissão (C‑564/13 P, EU:C:2015:124, n.o 23).


17      Importa recordar que o Tribunal de Justiça já se considerou competente com base numa cláusula compromissória inserida num «projeto de convenção» não assinado que serviu de prelúdio às relações das partes. V., a este respeito, Acórdão de 7 de dezembro de 1976, Pellegrini/Comissão e Flexon‑Italia (23/76, EU:C:1976:174, n.os 8 a 10). V., igualmente, Conclusões do advogado‑geral H. Mayras no processo Pellegrini/Comissão e Flexon‑Italia (23/76, não publicadas, EU:C:1976:143): «Mas afigura‑se‑nos que seria fazer prova de um formalismo excessivo negar qualquer validade a uma cláusula compromissória pelo simples motivo de o projeto de convenção só foi objeto de uma simples mas expressa referência nas cartas que confirmam o acordo das partes». Em contrapartida, na inexistência de cláusula compromissória, na aceção do artigo 272.o TFUE, os órgãos jurisdicionais da União não são competentes para decidir sobre a renovação de um contrato de trabalho celebrado entre o recorrente e a Comissão no âmbito de uma cooperação técnica entre a União e um Estado terceiro financiada pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento. V. Acórdão de 20 de maio de 2009, Guigard/Comissão (C‑214/08, não publicado, EU:C:2009:330, n.o 41).


18      Sobre a lei aplicável aos contratos de direito privado que contêm uma cláusula compromissória, v. Kohler C., «La Cour de justice des Communautés européennes et le droit international privé», Droit international privé: travaux du Comité français de droit international privé, 12.o ano, 1993‑1995, Éditions A. Pedone, Paris, 1996, pp. 71 a 95, em especial, p. 78: «[D]evem ser aplicadas [à União], na medida do possível, as regras de direito comum, na dupla aceção do termo, o que conduz quase necessariamente à Convenção de Roma».


19      V. Acórdãos de 18 de dezembro de 1986, Comissão/Zoubek (426/85, EU:C:1986:501, n.o 10); de 8 de abril de 1992, Comissão/Feilhauer (C‑209/90, EU:C:1992:172, n.o 13); e de 26 de fevereiro de 2015, Planet/Comissão (C‑564/13 P, EU:C:2015:124, n.o 21).


20      Acórdão de 26 de novembro de 1985, Comissão/CO.DE.MI. (318/81, EU:C:1985:467, n.o 9).


21      V. Conclusões do advogado‑geral A. Tizzano nos processos apensos Flemmer e o. (C‑80/99 a C‑82/99, EU:C:2001:57, n.o 41).


22      V. Acórdão de 9 de outubro de 2001, Flemmer e o. (C‑80/99 a C‑82/99, EU:C:2001:525, n.o 39).


23      V. Lenaerts, K., Maselis, I., e Gutman, K., op. cit., p. 689, ponto 19.9: «If the clause confers an exclusive right on the Court of Justice of the EU to hear and determine disputes concerning a contract, courts in Member States must decline jurisdiction by reason of the primacy of Union Law (i.e. compliance with the arbitration clause concluded pursuant to art. 272 TFEU)».


24      Por vezes, é até prevista uma competência concorrente do Tribunal de Justiça da União Europeia e de determinados órgãos jurisdicionais nacionais (cláusulas concorrentes). V. Kohler, C., op. cit., p. 78. É nomeadamente o caso de certas cláusulas constantes dos contratos de empréstimos celebrados entre a União e um ou vários bancos que formam um sindicato para realizar a operação. As cláusulas concorrentes podem suscitar problemas relacionados com os conflitos positivos de jurisdição. Sobre esta questão, v. Kremlis, G., «De quelques clauses d’élection de for et de droit applicable stipulées dans les contrats de droit privé conclus par les Communautés européennes dans le cadre de leurs activités d’emprunt et de prêt», Diritto comunitario e degli scambi internazionali, Milão, 1986, pp. 777 a 792, em especial p. 783.


25      V. Lenaerts, K., Maselis, I., e Gutman, K., op. cit., p. 689, ponto 19.9: «If a number of Courts, including the GC, are entitled to determine disputes under the arbitration clause, a problem of lis alibi pendens may arise. No specific rules are set forth in the Treaties for resolving this problem».


26      V. Acórdão de 18 de dezembro de 1986, Comissão/Zoubeck (426/85, EU:1986:501, n.o 11).


27      Importa notar que no processo Bitiqi e o./Comissão e o. [Despacho de 30 de setembro de 2014 (T‑410/13, não publicado, EU:T:2014:871, n.o 8)], relativo a uma decisão do chefe da Missão da Eulex Kosovo de não renovar os contratos de trabalho do pessoal contratual, o Tribunal Geral julgou a ação dos demandantes improcedente, considerando‑se manifestamente incompetente. Todavia, no âmbito deste processo, todos os CT continham uma cláusula segundo a qual os litígios decorrentes desses contratos eram da competência dos tribunais de Bruxelas. Assim, não figurava nesses contratos nenhuma cláusula compromissória, na aceção do artigo 272.o TFUE.


28      V. Acórdão de 1 de julho de 1982, Porta/Comissão (109/81, EU:C:1982:253, n.o 10). V., também, Conclusões do advogado‑geral F. Capotorti no processo Porta/Comissão (109/81, não publicadas, EU:C:1982:143, n.o 2): «Podemos também questionar‑nos sobre se o facto de a cláusula atributiva de competência apenas figurar nos contratos celebrados a partir de 1977 impede o Tribunal de Justiça de verificar a natureza da relação existente entre as partes durante o período anterior, de 1963 a 1977. A resposta deve ser negativa, desde que o litígio suscite a questão do caráter continuado ou não e, portanto, da unicidade da relação laboral no âmbito da quala recorrente lecionou no Centro Comum de Investigação de 1963 a 1980». O sublinhado é meu.


29      V. n.o 40 das presentes conclusões.


30      A este propósito, o artigo 47.o, primeiro parágrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia prevê que toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal nos termos previstos neste artigo. De acordo com o segundo parágrafo do mesmo artigo, toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. V., por analogia, Acórdão de 12 de julho de 2012, Reapreciação Arango Jaramillo e o./BEI (C‑334/12 RX, EU:C:2012:468).


31      V. nota de pé de página 12.